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da população em
situação de rua
Módulo
Presidente
Diogo Godinho Ramos Costa
Conteudista/s
Gustavo Clayton Alves Santana
Enap, 2019
3. Trabalho........................................................................................ 8
4. Saúde.......................................................................................... 12
5. Guarde na memória!................................................................... 15
6. Referências Bibliográficas............................................................ 16
1. Justificativa e objetivos
A condição em que as pessoas em situação de rua se
encontram acaba moldando as interações que a sociedade
geral vai construir com essas pessoas. É comum perceber
o medo e até mesmo a repulsa nos rostos de quem passa
apressado pelas ruas das cidades.
A situação de extrema vulnerabilidade das pessoas em situação de rua deve ser considerada para
que lhes seja oferecida a chance de fortalecer sua autonomia individual e de um efetivo retorno
à vida em comunidade. Nessa perspectiva, o acesso aos direitos sociais fundamentais de saúde,
educação e trabalho constituem vias para o encontro com a autonomia e para a saída efetiva das
ruas.
Este módulo abordará estes três direitos sociais. Ao concluir o módulo, você terá aptidão para
categorizar algumas das políticas públicas de trabalho, saúde e educação oferecidas pelo estado
brasileiro para a população em situação de rua.
Paulo Freire, um dos maiores educadores do mundo, estudado dentro e fora do Brasil, entendia
que a real humanização dos sujeitos não pode se concretizar se estes estiverem na indigência,
mas apenas com liberdade, possibilidade de decisão, de escolha e de autonomia. Estes são
exatamente os obstáculos estruturais enfrentados pela população em situação de rua em relação
às tentativas de retorno e continuação de sua escolarização.
Saiba mais
Paulo Freire (1921-1997) é tido como o mais célebre educador brasileiro, autor
de diversos livros, defendia que o objetivo da educação é ensinar o aluno a
"ler o mundo" para poder transformá-lo. Para ele, a educação pautada por
estes objetivos contribui para levar as parcelas desfavorecidas da sociedade a
entender sua situação de oprimidas e agir em favor da própria libertação. O
livro mais conhecido de Paulo Freire se chama Pedagogia do Oprimido.
A superação dessas dificuldades pode se dar de maneira mais rápida e concreta com a efetivação
do que é proposto pela ideia de educação libertadora e popular, na qual a emancipação, libertação
e produção de consciências críticas, permite a humanização da população em situação de rua,
no sentido de serem concebidos como sujeitos de direitos que merecem não apenas a liberdade
para comer, mas liberdade para criar e construir, para admirar e se aventurar, como diz Paulo
Freire.
Como uma prática educacional voltada para a conquista dos direitos sociais culturais, políticos
e geradora de possibilidades, a educação popular ajuda a compreender a realidade vivida pelos
grupos ou comunidades e aponta caminhos para a superação dos problemas encontrados. A
educação popular contribui, também, com as demais áreas tratadas neste módulo, no sentido
de atuar como uma ferramenta de organização na luta por justiça e dignidade das pessoas em
situação de rua.
Fato é que as escolas atuais não estão adaptadas para receber este público. Uma política
educacional para a população em situação de rua deve se pautar por ações estratégicas que
promovam a inclusão nos currículos das questões de igualdade social, gênero, raça, etnia, cultura
e comunicação discriminatórias, especialmente com relação à população em situação de rua. É
importante, ainda, pensar maneiras de a educação ser feita em meio aberto, onde as pessoas se
encontram.
Em setembro de 2018, havia 182 pessoas matriculadas na escola, que funciona pela manhã
e à tarde. Os alunos que são formados lá recebem o diploma de ensino fundamental e são
encaminhados a outras unidades públicas para continuar cursando o ensino médio.
Dica
Para conhecer um pouco mais sobre a Escola Meninos e Meninas do Parque,
assista ao vídeo abaixo: Link: https://www.youtube.com/watch?time_
continue=1&v=5SutUsUmGPg&feature=emb_title
3. Trabalho
O direito ao trabalho é um direito humano inalienável reconhecido pela Declaração Universal em
seu artigo 23, que diz:
II. Todo o homem, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual
trabalho.
III. Todo o homem que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que
lhe assegure, assim como a sua família, uma existência compatível com a dignidade
humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.
IV. Todo o homem tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção
de seus interesses.
A Constituição Federal de 1988, por sua vez, trata do direito ao trabalho individual do artigo
sétimo até o artigo onze. Nesses artigos, são assegurados a qualquer cidadão brasileiro o direito
a ter férias remuneradas com um terço a mais, os direitos dos empregados domésticos, a licença
paternidade, o Fundo de Garantia por tempo de Serviço (FGTS), entre outros avanços legais.
A inclusão do trabalho nesses textos legais tão importantes, como a Declaração Universal dos
Direitos Humanos e a Constituição Federal de 1988, reforça que o direito ao trabalho é um direito
social e um direito humano.
Como diz a música “um sorriso negro”, cantada pela sambista Dona Ivone Lara, “negro sem
emprego fica sem sossego”. De verdade, qualquer pessoa sem trabalho/emprego perde o
referencial de organização prática da vida, é o trabalho e o dinheiro obtido dele que possibilita
aos sujeitos satisfazerem suas necessidades mais básicas, como alimentação, vestuário, acesso à
saúde, acesso à educação, acesso ao lazer, entre outras coisas.
As sucessivas crises econômicas pelas quais o Brasil passou em todo século XX e agora neste início
do século XXI ampliaram a exclusão e os impedimentos de as pessoas chegarem ao mercado
de trabalho formal. Como parte de um sistema impiedoso, conforme desemprego, trabalho
precário e relações de trabalho opressivas aumentam com essas crises, identicamente, os índices
de pobreza e de vulnerabilidade da classe trabalhadora se elevam e, consequentemente, há uma
expansão da população em situação de rua.
Segundo a pesquisa, 47,7% dessa população nunca teve anotação na carteira de trabalho ou fazia
muito tempo que estava sem vínculo empregatício. Esses trabalhadores, apesar da precariedade
de sua formação, e contrapondo o senso comum preconceituoso que os identifica como
preguiçosos e pedintes, exercem atividades no dia-a-dia das ruas que lhes garantem uma renda
mínima diária. Na época da pesquisa, cerca de 52,6% dos entrevistados atuavam em atividades
informais, sendo 27, 5% como catadores de materiais recicláveis, 14,1% como guardadores de
carro, 6,3% atuando em atividades de limpeza e 3,1% como carregadores.
Conforme esses dados, uma parte considerável das trabalhadoras e trabalhadores que estão em
situação de rua atua na coleta de materiais recicláveis (27,5%). Esses trabalhadores recebem
assessoramento do Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População em Situação
de Rua e dos Catadores de Materiais Recicláveis (CNDDH) na defesa e garantia de seus direitos,
enfrentamento às violações, sistematização de dados, produção de conhecimento e formação.
Saiba mais
Para saber mais sobre as influências da escravidão na formação do
mundo do trabalho no Brasil, leia a tese de Alexandre de Freitas Barbosa,
denominada “A formação do mercado de trabalho no Brasil: da escravidão
ao assalariamento”. A tese está disponível em: http://bdtd.ibict.br/vufind/
Record/CAMP_29e2fec4ca6bc76e1c5873caaee32758
Incluir a população em situação de rua no mundo do trabalho é um dos desafios colocados pela
Política Nacional. Com esse objetivo, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro aprovou, em 2018,
uma lei que reserva o percentual de cinco por cento do total de vagas de trabalho disponibilizadas,
a partir das contratações de serviços e obras públicas municipais, para pessoas em situação de
rua que estejam sendo assistidas por políticas da Secretaria Municipal de Assistência Social e
Direitos Humanos daquela cidade.
Similarmente, há um projeto de lei que cria cota de contratação para pessoas em situação de rua
tramitando no Senado Federal. Este projeto foi aprovado na Comissão de Assuntos Sociais do
Senado (CAS) em 2018 e segue sendo analisado pelos senadores.
Economia solidária
Na economia solidária, o trabalho deixa de ser um modo de opressão para se tornar fator de
agregação das relações entre os diversos sujeitos que dele participam.
h,
Destaque,h
Entre os princípios da economia solidária, alguns merecem destaque:
Autonomia: o grupo deve ser capaz de tomar suas próprias decisões, evitando
qualquer influência externa.
Consumo consciente: o grupo deve adquirir somente o que precisar, sem criar
excedentes. As relações com empresas que agridam a natureza vão contra um
dos princípios da economia solidária.
Dica
Para concluir este tópico, assista ao vídeo sobre o encontro dos coletivos
de trabalho e economia solidária com população em situação de rua que
ocorreu no Rio Grande do Sul, link: https://www.youtube.com/watch?v=_
TvhdP1TBnU&feature=emb_title
4. Saúde
Viver no cotidiano das ruas expõe as pessoas a diversas condições que aumentam a vulnerabilidade
e expõem riscos à sua saúde. Situações constantes de invisibilidade social, impedimento de
acesso às políticas públicas, preconceito, violências, privação de sono, estado constante de
alerta, alimentação precária e pouca disponibilidade de água potável geram agravamentos à
saúde difíceis de serem resolvidos.
Apesar de o atendimento nas unidades de saúde ser um direito das pessoas em situação de
rua, muitas se recusam a ir até estes locais por já terem passado ou por saberem da ocorrência
de negação de atendimento, de mau atendimento e impedimento de que entrem por causa
da forma como estão vestidos ou por sua condição de higiene. A pesquisa nacional de 2007, já
citada aqui, revelou que 18,4% das pessoas em situação de rua ouvidas já haviam passado por
alguma experiência como estas.
Importante
A negação ou mau de atendimento para a população em situação de rua nos
serviços de saúde é algo combatido pelo Ministério da Saúde, que entre tantos
documentos, publicou a Portaria nº 940/2011, que dispensa aos ciganos,
nômades e pessoas em situação de rua a exigência de apresentar o endereço
do domicílio permanente para aquisição do Cartão SUS.
A Pesquisa também apontou que 29,7% tinham algum problema de saúde, tais como: hipertensão
10,1%, problemas psiquiátricos ou mentais 6,1%, HIV/AIDS 5,1%, e comprometimentos na visão
ou cegueira 4,6%. Muitas pessoas, aproximadamente 19%, fazem uso regular de remédios que
obtém em centros de saúde e postos locais.
Um grave problema de saúde que tem atingido a população em situação de rua no Brasil é a
tuberculose. Algumas pesquisas realizadas no Distrito Federal e nas cidades do Rio de Janeiro,
São Paulo e Porto Alegre demonstraram que a taxa de incidência de tuberculose entre as pessoas
que estão em situação de rua fica entre 1.576 casos por 100 mil habitantes e 2.750/100 mil. Um
número muito maior se comparados aos casos verificados na população geral, onde a taxa é de
38 ocorrências a cada 100 mil habitantes. Isso significa que a incidência de casos de tuberculose
na população em situação de rua pode ser até 70 vezes maior em relação à média de ocorrência
nacional.
A resolução organiza uma série de diretrizes e estratégias para o enfrentamento das desigualdades
no acesso à saúde pela população em situação de rua no contexto do Sistema Único de Saúde
(SUS). Para garantir o acesso da população em situação de rua às ações e aos serviços de saúde, a
resolução entende que é preciso reduzir os riscos à saúde que decorrem dos processos de trabalho
executados pelas pessoas na rua (como o devido armazenamento de materiais recicláveis, que
muitas vezes causam ferimentos ou contaminações) e das suas condições de vida em geral. Para
isso, as estratégias definidas para promoção da saúde se organizam em cinco eixos:
h,
Destaque,h
1. Inclusão da PSR no escopo das redes de atenção à saúde
Para isso é necessário a implantação de Consultórios na Rua; melhoria na
capacitação das equipes que fazem atendimentos de urgência e emergência;
bem como a garantia de acesso à atenção domiciliar nos lugares onde as
pessoas em situação de rua recebem acolhimento institucional.
Consultório na rua
Uma importante estratégia de atenção em saúde oferecida para as pessoas em situação de rua é
o consultório na rua. Composto por uma equipe multiprofissional, sua função é ampliar o acesso
da população em situação de rua aos serviços de saúde por meio de atendimento itinerante e,
quando necessário, em parceria com as equipes das Unidades Básicas de Saúde (UBS), presentes
nos territórios.
Entre suas atribuições, estão: a busca ativa e o cuidado aos usuários de álcool, crack e outras
drogas; o desempenho de atividades in loco (na rua), de forma itinerante, desenvolvendo
ações compartilhadas e integradas às Unidades Básicas de Saúde (UBS) e, quando necessário,
também com as equipes dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), dos serviços de Urgência e
Emergência e de outros pontos de atenção, de acordo com a necessidade do usuário.
Ainda sobre o consultório na rua, é importante destacar que ele é uma estratégia específica que
faz parte de um todo que é o SUS, e não é a única forma possível para atendimento da população
em situação de rua. Assim como qualquer cidadão brasileiro, a responsabilidade pela atenção
à saúde da população em situação de rua é algo que faz parte das ações de todo e qualquer
profissional do SUS, mesmo que ele não seja membro de uma equipe de consultório na rua.
Ou seja, o atendimento à população em situação de rua não pode ser negado ou repassado
para uma equipe de consultório na rua, caso alguém procure atendimento e alguma unidade de
saúde.
Saiba mais
Para saber mais a respeito da política de consultórios na rua, acesse: Consultório
na Rua, link: https://aps.saude.gov.br/ape/consultoriorua/
5. Guarde na memória!
• Neste módulo você aprendeu a respeito de três importantes direitos sociais e humanos,
trabalho, saúde e educação.
• Ainda nesse módulo, você recebeu informações gerais sobre as características de cada
um deles e sobre a situação da população em situação de rua diante deles.
• Por fim você conheceu algumas políticas públicas de trabalho, saúde e educação
oferecidas pelo estado brasileiro para a população em situação de rua.
ECOSOL Pop Rua - Formação em Economia Solidária para Pessoas em Situação de Rua. Porto
Alegre: CAMP - Centro de Assessoria Multiprofissional, 2017.
GHIRARDI, M. I. G.; LOPES, S. R.; ET AL. Vida na rua e cooperativismo: transitando pela produção
de valores. Interface - Comunic, Saúde, Educ, São Paulo, p. 601-610, set/dez 2005.
HINO, P.; SANTOS, J. D. O.; ROSA, A. D. S. Pessoas que vivenciam situação de rua sob o olhar da
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PAIVA , I. K. S. D.; LIRA, C. D. G.; ET AL. Direito à saúde da população em situação de rua: reflexões
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práricas para profissionais da assistência social. São Paulo: Secretaria Municipal de Assistência e
Desenvolvimento Social de São Paulo - SMDAS, 2016.