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CONDOMÍNIO:

Doutrina e
Jurisprudência


Teoria Geral do Condomínio – Condomínio Comum –
Condomínio Edilício – Loteamento Fechado – Time-
Sharing – Shopping Center – Direito Processual
Condominial

AMÉRICO LUÍS MARTINS DA


SILVA


1ª Edição atualizada de acordo com a Lei n°
13.105, de 16.03.2015 (Novo Código de
Processo Civil)
CONDOMÍNIO: Doutrina e Jurisprudência

Teoria Geral do Condomínio – Condomínio Comum – Condomínio Edilício – Loteamento Fechado – Time-
Sharing – Shopping Center – Direito Processual Condominial




1ª Edição atualizada de acordo com a Lei n° 13.105, de 16.03.2015
(Novo Código de Processo Civil)




AMÉRICO LUÍS MARTINS DA SILVA




Copyright © 2017 Américo Luís Martins da Silva


A obra foi registrada, em 16.03.2017, no Escritório de Direitos Autorais da Biblioteca Nacional, junto ao
registro nº 741.848, do Livro 1.437, à fl. 139 (protocolo 2017RJ_2652).


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Autorais).



E-mail do Autor de atendimento ao público leitor 913724rb.rj@uol.com.br



ISBN: 9781977084569
SOBRE O AUTOR

Américo Luís Martins da Silva (1955-) nasceu no Rio de Janeiro, Brasil. É
Procurador Federal; Professor de Direito Econômico, de Direito Empresarial,
Direito Imobiliário, Direito Civil e Planejamento Tributário da Escola de Pós-
Graduação em Economia - EPGE da Fundação Getúlio Vargas - FGV; Professor
da Fundação Getúlio Vargas – FGV; Professor de Direito Societário da Escola da
Magistratura do Rio de Janeiro - EMERJ; Professor de Direito Tributário do
Curso de Pós-Graduação em Direito Tributário da Universidade Cândido
Mendes – UCAM; Professor de Direito Comercial do Curso de Graduação em
Direito da Universidade Estácio de Sá. É Especialista em Direito Empresarial,
pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília - CEUB. É pós-graduado em
Direito Civil pela Escola Superior da Magistratura do Distrito Federal. É Mestre
em Direito Empresarial, pela Universidade Gama Filho - UGF do Rio de Janeiro.
É autor das seguintes obras jurídicas: 1) AS AÇÕES DAS SOCIEDADES E OS
TÍTULOS DE CRÉDITO [2ª edição]; 2) A ORDEM CONSTITUCIONAL
ECONÔMICA [3ª edição]; 3) A PARTICIPAÇÃO DOS EMPREGADOS NOS
LUCROS, NOS RESULTADOS E NA GESTÃO DA EMPRESA [2ª edição]; 4)
DIREITO DE FAMÍLIA E COSTUMES ALTERNATIVOS: ESTUDO
JURÍDICO, ANTROPOLÓGICO E SOCIAL DA FAMÍLIA (2 VOLUMES) [3ª
edição]; 5) CUMPRIMENTO DE SENTENÇA E EXECUÇÃO DA
OBRIGAÇÃO DE PAGAR CONTRA A FAZENDA PÚBLICA:
PRECATÓRIO-REQUISITÓRIO E REQUISIÇÃO DE PEQUENO VALOR
(RPV) [5ª edição]; 6) DIREITO DAS LOCAÇÕES IMOBILIÁRIAS [4ª edição];
7) O DANO MORAL E SUA REPARAÇÃO CIVIL [5ª edição]; 8)
INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL [3ª edição]; 9) A EXECUÇÃO
DA DÍVIDA ATIVA DA FAZENDA PÚBLICA [4ª edição]; 10) INTRODUÇÃO
AO DIREITO ECONÔMICO [2ª edição]; 11) REGISTRO PÚBLICO DA
ATIVIDADE EMPRESARIAL (2 volumes) [2ª edição]; 12) CONTRATOS
EMPRESARIAIS (2 volumes) [3ª edição]; 13) DIREITO DO MEIO
AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS (3 volumes) [2ª edição]; 14)
SOCIEDADES EMPRESARIAIS (2 volumes) [2ª edição]; 15) DIREITO
AERONÁUTICO E DO ESPAÇO EXTERIOR (4 volumes) [2ª edição]; 16)
DIREITO DOS MERCADOS FINANCEIROS (3 VOLUMES) [2ª edição]; 17)
DIREITO DA CONCORRÊNCIA EMPRESARIAL; 18) CONDOMÍNIO:
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA; 19) DIREITO DA PROTEÇÃO E
DEFESA DO CONSUMIDOR; e 20) DIREITO AQUAVIÁRIO E DA
NAVEGAÇÃO MARÍTIMA (3 VOLUMES). É também autor das seguintes
obras não jurídicas: 1) O VOO-SOLO E OUTROS CONTOS [categoria:
contos]; 2) UMA ODISSÉIA PELOS MARES ORIENTAIS [categoria:
romance]; 3) O RESGATE DE ALLAJI [categoria: romance]; 4) A SAGA DE
BARTOLOMEU BRASILEIRO [categoria: romance]; 5) BARTOLOMEU
BRASILEIRO, O BUCANEIRO [categoria: romance]; 6) O IMIGRANTE
PORTUGUÊS [categoria: romance]; 7) DESCONHECIDO CAVALEIRO DA
ORDEM DE CRISTO [categoria: romance]; 8) UM CONTINENTE LONGE
DEMAIS [categoria: romance]; 9) UMA PASSAGEM PARA A ESPERANÇA
[categoria: romance]; 10) A ÉPOCA DE BUENO MACHADO, DANÇARINO
E CABARETIER [categoria: crônica]; 11) POESIAS REUNIDAS DE UM
POETA EVENTUAL [categoria: poesias]; 12) OS MAIS FAMOSOS ATORES
DE HOLLYWOOD - DE 1940 A 1960 - VOLUME 1 [categoria: biografia]; 13)
OS MAIS FAMOSOS ATORES DE HOLLYWOOD - DE 1940 A 1960 -
VOLUME 2 [categoria: biografia]; e 14) AS MAIS FAMOSAS ATRIZES DE
HOLLYWOOD - DE 1940 A 1960 - VOLUME 1 [categoria: biografia].

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http://www.americoluismartinsdasilva.com.br (site pessoal)
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amazon.com)

DEDICATÓRIA


Dedico este livro à memória de Manoel de Angola.










ÍNDICE


SOBRE O AUTOR
DEDICATÓRIA
ÍNDICE
AGRADECIMENTOS
APRESENTAÇÃO
CAPÍTULO I – TEORIA GERAL DO CONDOMÍNIO
1.1 DEFINIÇÃO DE CONDOMÍNIO
1.2 COMUNHÃO, CONDOMÍNIO E SOCIEDADE
1.3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONDOMÍNIO
1.4 NATUREZA JURÍDICA DO CONDOMÍNIO
1.5 ESPÉCIES DE CONDOMÍNIO
1.6 PROBLEMAS DO CONDOMÍNIO HORIZONTAL
1.7 NOVAS FORMAS DE CONDOMÍNIO
1.7.1 Loteamento fechado e loteamento aberto ou convencional
(condomínio de fato)
1.7.2 Multipropriedade, propriedade compartilhada ou time-sharing
1.7.3 Comunidade condominial em shopping center
1.7.4 Clubes de campo
1.7.5 Cemitérios privados
CAPÍTULO II – CONDOMÍNIO TRADICIONAL, GERAL OU COMUM
2.1 DEFINIÇÃO DE CONDOMÍNIO TRADICIONAL, GERAL OU
COMUM
2.2 ESPÉCIES DE CONDOMINIO TRADICIONAL, GERAL OU COMUM
2.3 CONDOMINIO VOLUNTÁRIO OU CONVENCIONAL
2.3.1 Conceito de condomínio voluntário ou convencional
2.3.2 Regras gerais do condomínio voluntário ou convencional
2.3.3 Direitos dos condôminos no condomínio voluntário ou convencional
2.3.3.1 Direito de usar a coisa comum
2.3.3.2 Direito de reivindicar a coisa comum de terceiros
2.3.3.3 Direito de alienar a parte indivisa
2.3.3.4 Direito de gravar de ônus real a parte indivisa
2.3.3.5 Direito a divisão da coisa comum
2.3.3.6 Deveres dos condôminos no condomínio voluntário ou
convencional
2.3.3.6.1 Quota-parte como elemento indispensável para fixação das
obrigações de cada condômino
2.3.3.6.2 Rateio das despesas e dívidas
2.3.3.6.3 Regime jurídico dos frutos da coisa comum
2.3.3.7 Defesa do bem condominial
2.3.3.8 Alienação ou Oneração do bem comum
2.3.3.9 Administração do condomínio voluntário ou convencional
2.3.3.10 Extinção do condomínio tradicional, geral ou comum
2.3.3.10.1 Das formas de extinção do condomínio
2.3.3.10.1.1 Da divisão da coisa comum
2.3.3.10.1.2 Da alienação da coisa comum
2.3.3.10.2 Ação de extinção do condomínio
2.4 CONDOMINIO NECESSÁRIO OU LEGAL
2.4.1 Condomínio forçado
2.4.2 Condomínio fortuito, incidente ou eventual
CAPÍTULO III – CONDOMÍNIO EDILÍCIO OU POR UNIDADES
AUTÔNOMAS
3.1 DEFINIÇÃO DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO OU POR UNIDADES
AUTÔNOMAS
3.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO
3.3 NATUREZA JURÍDICA DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO
3.4 DA PERSONALIDADE JURÍDICA DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO
3.4.1 Da evolução na interpretação da Lei n° 4.591, de 16.12.1964
3.4.2 Da consolidação jurisprudencial em passado recente atribuindo
personalidade jurídica ao condomínio edilício
3.4.3 Da consolidação doutrinária em passado recente em torno do
reconhecimento da personalidade jurídica do condomínio edilício
3.4.4 Da aplicação do art. 5° da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro
3.4.5 Do reconhecimento da personalidade jurídica do condomínio no
Direito Comparado
3.5 ESPÉCIES DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO OU CONDOMÍNIO EM
EDIFICAÇÕES
3.6 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO
3.6.1 O ato de instituição do condomínio
3.6.2 A convenção do condomínio
3.6.3 O regulamento interno do condomínio
3.6.4 Os regulamentos especializados
3.7 DIREITOS E DEVERES DOS CONDÔMINOS DO CONDOMÍNIO
EDILÍCIO
3.7.1 Direitos do condômino
3.7.2 Deveres do condômino
3.8 DESPESAS DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO
3.8.1 Despesas condominiais em espécie
3.8.2 Orçamento das despesas e receitas do condomínio
3.8.3 Cota ou taxa de condomínio
3.8.4 Fundos e rateios extras
3.8.4.1 Fundos de reserva
3.8.4.2 Espécies de fundo e rateio
3.8.4.3 Quorum de aprovação e arrecadação
3.8.4.4 Participação de inquilinos e usufrutuários para formação de fundos
3.8.4.5 Gestão dos fundos
3.8.4.6 Inadimplência na arrecadação de fundos
3.9 SEGURO, INCÊNDIO, DEMOLIÇÃO E RECONSTRUÇÃO
OBRIGATÓRIA
3.9.1 Seguro da edificação
3.9.2 Sinistro e reconstrução ou venda do terreno e materiais
3.10 UTILIZAÇÃO DA EDIFICAÇÃO OU DO CONJUNTO DE
EDIFICAÇÕES
3.10.1 Utililização exclusiva de área comum
3.10.2 Limitações à utililização de área comum
3.10.3 Penalidades pela irregularidade na utililização de área comum
3.11 ADMINISTRAÇÃO DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO
3.11.1 A escolha do síndico
3.11.2 As atribuições do síndico
3.11.3 Remuneração do síndico
3.11.4 Prestação de contas do síndico
3.12 ASSEMBLEIA-GERAL DE CONDÔNIMOS
3.12.1 Espécies de assembleias
3.12.2 Presença dos condôminos nas assembleias
3.12.3 Uso excessivo de procurações nas assembleias
3.12.4 Ata de assembleia
3.13 CONSELHO CONSULTIVO OU CONSELHO FISCAL
3.14 EXTINÇÃO DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO
CAPÍTULO IV – LOTEAMENTO CONVENCIONAL FECHADO
4.1 LOTEAMENTO ABERTO OU CONVENCIONAL
4.2 LOTEAMENTO E SUA FUNÇÃO PÚBLICA
4.3 CONFUSÃO DOUTRINÁRIA A RESPEITO DAS ESPÉCIES DE
LOTEAMENTO
4.4 LOTEAMENTOS CONVENCIONAIS FECHADOS
4.5 TITULARIDADE DOMINIAL DOS BENS PÚBLICOS
4.6 O USO DOS BENS PÚBLICOS POR PARTICULARES
4.7 A CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO DAS ÁREAS
PÚBLICAS DOS LOTEAMENTOS CONVENCIONAIS
4.8 DA VIOLAÇÃO AO ARTIGO 17 DA LEI N° 6.766, DE 19.12.1979
4.9 RATEIO DAS COTAS DO LOTEAMENTO FECHADO E DO
CONDOMINIO DE FATO
CAPÍTULO V – MULTIPROPRIEDADE, PROPRIEDADE
COMPARTILHADA OU TIME-SHARING
5.1 DEFINIÇÃO DE MULTIPROPRIEDADE, PROPRIEDADE
COMPARTILHADA OU TIME SHARING
5.2 ETIOLOGIA HISTÓRICA DO TIME SHARING
5.3 NATUREZA JURÍODICA DO TIME SHARING
5.4 ESPÉCIES DE TIME SHARING
5.4.1 Deeded contracts (Contrato de Transferência)
5.4.2 Deeded ownership ou fractional ownership (Propriedade Fracionada)
5.4.3 Leasehold deeds (Título de Arrendamento)
5.4.4 Right-to-use contracts (Contrato de Direito de Uso)
5.4.5 Fixed Week Ownership (Propriedade de Semanda Fixa)
5.4.6 Floating-week ownership (Propriedade de Semanda Flutuante)
5.4.7 Rotating or flex week owership (Rotação ou Propriedade de Semanda
Flexível)
5.4.8 Points Programs (Programas de Pontos)
5.5 TIPOS E TAMANHOS DE TIME SHARING
5.6 LEGISLAÇÃO SOBRE TIME SHARING
5.7 REGULAMENTO DO SISTEMA DE TEMPO COMPARTILHADO EM
MEIOS DE HOSPEDAGEM DE TURISMO
5.7.1 Parte Geral do Regulamento do Sistema de Tempo Compartilhado
5.7.2 Funcionamento do Sistema de Tempo Compartilhado
5.7.3 Contrato de Tempo Compartilhado
5.7.4 Direitos e Obrigações da Partes do Contrato de Tempo Compartilhado
5.7.5 Responsabilidades do Empreendedor e do Comercializador
CAPÍTULO VI – CONDOMÍNIO EM SHOPPING CENTER
6.1 INTRODUÇÃO
6.2 NATUREZA JURÍDICA
6.3 CARACTERÍSTICAS CONTRATUAIS DO SHOPPING CENTER
6.3.1 Organização na forma de condomínio ordinário ou condomínio pro
indiviso
6.3.2 Organização na forma de condomínio edilício
6.3.3 Organização na forma de sociedade
6.3.4 Constituição jurídica da administração do shopping center: relação
entre os investidores e administradora
6.3.5 Operacionalidade do shopping center: relação entre investidores e
lojistas
6.3.5.1 Aspectos gerais dos contratos de locação de espaços em shopping
centers
6.3.5.2 Diversos contratos celebrados entre o empreendedor e o lojista de
shopping center
6.3.6 Registro da incorporação e organização em condomínio edilício
6.3.7 Receitas em shopping center
6.4 RESPONSABILIDADE CIVIL NOS SHOPPING CENTERS
CAPÍTULO VII – CONDOMÍNIO EM CLUBES DE CAMPO
7.1 CARACTERÍSTICAS DOS CLUBES DE CAMPO
7.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS CLUBES DE CAMPO
7.3 CONDOMÍNIO DE CLUBE DE CAMPO
CAPÍTULO VIII – CONDOMÍNIO EM CEMITÉRIOS PRIVADOS
8.1 INTRODUÇÃO
8.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CEMITÉRIO
8.3 ESPÉCIES DE CEMITÉRIOS
8.4 NATUREZA JURÍDICA DOS CEMITÉRIOS
8.4.1 Natureza jurídica dos cemitérios públicos
8.4.2 Natureza jurídica dos cemitérios privados
8.5 REGIME JURÍDICO DOS ESPAÇOS EM CEMITÉRIO E A TIME
SHARING
CAPÍTULO IX – DIREITO PROCESSUAL CONDOMINIAL
9.1 AÇÃO DE DEMARCAÇÃO OU DEMARCATÓRIA
9.2 AÇÃO DE DIVISÃO OU AÇÃO DE EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO
9.2.1 Fase contenciosa da ação de divisão de condomínio
9.2.2 Fase administrativa da ação de divisão de condomínio
9.3 AÇÃO DE ALIENAÇÃO JUDICIAL DA COISA COMUM
9.3.1 Introdução
9.3.2 Procedimento da ação de alienação de coisa comum
9.3.3 Do leilão judicial eletrônico
9.3.4 Do leilão judicial presencial
9.3.5 Normas de realização de leilão judicial
9.4 AÇÃO DE EXECUÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES ORDINÁRIAS OU
EXTRAORDINÁRIAS DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO
9.5 AÇÃO DE COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÕES ORDINÁRIAS OU
EXTRAORDINÁRIAS DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO
9.6 AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS
9.6.1 Introdução
9.6.2 Primeira fase da ação de exibição de contas
9.6.3 Segunda fase da ação de exibição de contas
9.7 DA IMPOSSIBILIDADE DE AJUIZAR AÇÃO DE EXECUÇÃO DE
CONTRIBUIÇÕES ORDINÁRIAS OU EXTRAORDINÁRIAS DE
CONDOMÍNIO EDILÍCIO NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
BIBLIOGRAFIA
AGRADECIMENTOS


À CRISTINA MARIA CÉSAR MARTINS DA SILVA, pelo auxílio na pesquisa para a
elaboração desta obra
.






APRESENTAÇÃO

Com o crescimento das comunidades humanas no sentido vertical, a vida
social foi tomada por inúmeras situações em que duas ou mais pessoas têm posse
ou propriedade sobre o mesmo bem. De fato, determinado direito pode pertencer
a várias pessoas ao mesmo tempo, caso em que temos a denominada
“comunhão”; se esta comunhão recai sobre um direito de propriedade, surge,
então, o que se costuma chamar de “condomínio, coposse ou copropriedade”. A
coposse, copropriedade ou condomínio constitui uma situação jurídica que vem
marcando profundamente os tempos mais recentes e atuais.
Neste diapasão, Condomínio é um livro dirigido aos profissionais do
Direito (advogados, juízes etc.) que atuam principalmente na área imobiliária,
bem como aos profissionais ligados à administração de imóveis e, porque não
dizer, dirigido também aos próprios proprietários que integram o condomínio.
Com efeito, embora dirigido prioritariamente a estudiosos da área
jurídica em geral e profissionais no exercício de suas atividades relacionadas ao
Direito, administradores de imóveis, por exemplo, poderão encontrar neste livro
algumas questões de interesse prático, como direitos e deveres de condôminos,
administração do condomínio, extinção do condomínio, condomínio em edifício
de apartamentos, etc.
Além disso, o leitor interessado em aprimorar seus conhecimentos a
respeito de da matéria ligada a administradores da coisa comum e condomínios,
encontrará neste livro algumas facilidades e seções dirigidas à Convenção, aos
Poderes Administrativos do condomínio, às administradoras que prestam
serviços ao condomínio, a parte financeira, a fiscalização dos síndicos ou
administradores, etc.
Os livros que se encontram disponibilizados no mercado especializado
restringem-se a comentar apenas a Lei n° 4.591, de 16.12.1964 (Lei do
Condomínio) e a parte do Código Civil de 2002 que trata desta matéria.
Ao contrário, a obra Condomínio tem por objetivo fornecer uma visão
muito mais abrangente das principais questões ligadas à disponibilização do
compartilhamento imobiliário de nosso tempo.
Queremos crer que ela seja única em sua abrangência, pois, dentro do
mesmo exemplar, em sete capítulos, trata da Teoria Geral do Condomínio;
Condomínio Tradicional, Geral ou Comum; Condomínio Edilício ou por
Unidades Autônomas; Loteamento Convencional Fechado; Multipropriedade,
Propriedade Compartilhada ou Time-Sharing; Condomínio em Shopping Center;
Condomínio em Clubes de Campo; Condomínios em Cemitérios Privados; e
Direito Processual Condominial.
A difícil relação entre condôminos; entre administração e condôminos; a
questão da personalidade jurídica do condomínio; o regulamento interno e seu
cumprimento por parte dos condôminos; as questões controvertidas a respeito
das frações ideais; o condomínio sem convenção ou com a sua convenção
desatualizada; o condomínio de fato, sem áreas comuns; o condomínio e as
questões trabalhistas; a administradoras que prestam serviços ao condomínio; os
setores prioritários na fiscalização dos síndicos e administradores; a segurança
contra incêndio e pânico nos prédios de apartamentos; as discussões sobre
garagens, vagas e abrigos; etc. Todas essas questões condominiais, de natureza
econômica, jurídica ou social, demonstram por si sós a importância deste livro
no contexto atual. Importância esta reforçada pela atualização dos temas
tratados, pela abrangência peculiar da matéria, pela organização didática dos
assuntos e pela facilidade da consulta a respeito dos temas específicos.
Trata-se de um livro jurídico, no qual se procura explicar, com clareza e
concisão, conceitos e problemas jurídicos fundamentais, de forma que os
estudantes e os profissionais possam ter uma melhor compreensão da realidade
condominial. Ele é o resultado da experiência do autor ministrando aulas de
Direito Imobiliário em cursos de graduação e pós-graduação, bem como em
cursos de extensão e especialização, para estudantes e profissionais das várias
áreas interessadas nos institutos jurídicos ligados aos condomínios.
Todas as nuances da teoria geral dos condomínios estão organizadas
sistematicamente na obra Condomínio. Não apenas isto! Encontram-se inseridos
nela, de maneira aprofundada, comentários a respeito das espécies de
condomínio imobiliário, informando, ainda, ao leitor a respeito das legislações
que regulamentam cada uma dessas espécies de condomínio.
Assim é que a obra comenta com minúcias os aspectos comuns dos
condomínios de um modo geral e especificamente dos condomínios regidos pela
Lei n° 4.591, de 16.12.1964 (Lei do Condomínio) e os condomínios regidos pelo
Código Civil de 2002.
Portanto o trabalho tem por finalidade apresentar estudo completo e
diversificado das espécies de condomínio, inclusive daqueles que geralmente
não são tratados pela literatura especializada. Por essa razão, a obra certamente
será de grande valia para estudo e acompanhamento de aulas pelos alunos
universitários, tanto da graduação como da extensão universitária e da pós-
graduação, bem como será de grande valia para consulta com o fim de sanar
dúvidas daqueles profissionais do Direito, que tratam costumeira ou
esporadicamente de temas relacionados com os condomínios.

Américo Luis Martins da Silva









CAPÍTULO I – TEORIA GERAL
DO CONDOMÍNIO

1.1 DEFINIÇÃO DE CONDOMÍNIO


O condomínio (copropriedade ou comunhão), termo proveniente do
latim condominium, ocorre quando existe um domínio de mais de uma pessoa
(condôminos), exercido simultaneamente sobre um determinado bem, ou partes
de um bem, ou a mesma coisa certa e comum (posse ou propriedade sobre o
mesmo bem).
O condomínio é uma espécie de propriedade, em que dois ou mais
sujeitos são titulares, em comum, de uma coisa indivisa, atribuindo-se a cada
condômino uma parte ou fração ideal da mesma coisa.[1] Por sinal, a indivisão é
situação jurídica daqueles que possuem propriedade em comum de um bem, sem
comportar divisão material de suas partes, seja por sua natureza, ou seja, por
causa da lei ou convenção das partes.
Condomínio é, pois, o estado da coisa indivisa sobre a qual duas ou mais
pessoas exercem, ao mesmo tempo, o direito de propriedade (relações jurídicas
em que se verifica uma pluralidade subjetiva com unicidade do objeto).[2]
No entanto, vale lembrar que esta ideia de condomínio tem origem no
Direito Romano, e por isso mesmo denominada condominium iuris romani
(condomínio do direito romano). Todavia ela não se confunde com o
condominium iuris germanici (condomínio do direito germânico), instituto este
que, por sinal, existe na Alemanha ao lado de outro instituto denominado
também de condomínio por quotas. É importante esclarecer que o sistema
germânico compreendia o condomínio de forma diversa, ou seja, no
condominium iuris germanici (condomínio do direito germânico), a coisa
pertence à coletividade e não aos condôminos, que, desta sorte, têm apenas
direitos de uso e gozo da coisa em razão da vinculação corporativa em que se
encontram e não em consequência de serem sujeitos, individualmente, de
direitos sobre a própria coisa. O elemento diferenciador do condomínio do
direito germânico reside, pois, no fato de se considerar como “propriedade
coletiva” ou “exercida como comunhão de mão comum” (Gesamnteigenthum ou
gemeinschaft zur gesammten Hand), isto é, cada consorte tinha direito de exercer
o domínio sobre a coisa. Não havia nessa comunhão a noção de parte ideal, pois
a coisa é objeto de uso e gozo comum. Trata-se de concepção do Direito Feudal.
[3]

A doutrina, de um modo geral, tem sustentado noções diversas quanto à


propriedade condominial, em discussões intermináveis relacionadas à sua
estrutura, pois na propriedade condominial verifica-se um fenômeno
aparentemente contraditório ao exercício do poder econômico de domínio, diante
do fato de mais de um titular exercer o mesmo direito sobre o bem. Contudo, a
doutrina tem atenuado esta aparente contradição, ou seja, a diversidade de
titularidade dos direitos de domínio, com a individualidade quanto ao exercício
de seu poder. Certo é que o direito real de propriedade se conserva intacto no
caso do condomínio, apenas se estendendo a cada um dos coproprietários o
exercício de sua parte ideal no direito comum sobre o mesmo bem. Assim,
considerando-se desta maneira, a propriedade de um bem vai pertencer, pro
indiviso, a mais de um titular, o mesmo ocorrendo, ainda que materialmente seja
divisível a coisa comum. No entanto, no estágio embrionário, as dificuldades na
conceituação do condomínio e em sua identidade e localização no direito
fizeram com que se desenvolvessem teorias para justificar e identificar o referido
instituto de Direito Civil. PIETRO BONFANTE [4] considerou estas teorias,
agrupando os entendimentos, da seguinte forma: a) teoria da propriedade
integral ou total (teoria coletiva), que vislumbra no condomínio um só direito,
de maneira que cada condômino tem direito à propriedade sobre toda a coisa
(sujeito do direito é a coletividade constituída pelos interessados), sendo que o
exercício desse direito é limitado pelos direitos dos demais consortes (não
havendo titulares individuais). Adepto desta doutrina é VITTORIO SCIALOJA,
[5]
ao asseverar que o condomínio constitui relação de igualdades, que
mutuamente se limitam, sendo a propriedade realmente comum ou coletiva. A
propriedade não pertence a várias pessoas, cada qual tendo a sua parte, mas a
todos os comunheiros em conjunto, ainda que não seja orgânico o estado de
indivisão. Não há, enfim, justaposição de parte individuais; [6] b) teoria das
propriedades plúrimas parciais (teoria individualista), para a qual cada
condômino só é dono apenas de sua parte ideal (direito de propriedade sobre a
parte abstrata resultante da divisão ideal), havendo no condomínio diversas
propriedades intelectualmente parciais, cuja reunião é que daria origem ao
condomínio.
É importante mencionar que o nosso direito positivo considerou a teoria
das propriedades plúrimas parciais, porque o art. 1.314 do Código Civil de
2002, da mesma forma que o Código Civil de 1916, estabelece o direito de cada
condômino ou consorte utilizar-se do bem, em conformidade com sua destinação
econômica, podendo exercer seus direitos em face de terceiros. Mas o
condomínio, ao contrário da propriedade individual, não tem o condão de se
perpetuar no tempo, justamente por se compor a propriedade de mais de um
indivíduo que podem, em determinado momento da relação condominial,
divergir quanto aos interesses comuns ou simplesmente querer se afastar de seu
exercício. A nossa atual lei civil bem alicerça a possibilidade de sua extinção,
quando no art. 1.320 do Código Civil de 2002, que tem o mesmo sentido do
caput do art. 629 do Código Civil de 1916, impõe que “a todo tempo será lícito
ao condômino exigir a divisão da coisa comum, respondendo o quinhão de cada
um pela sua parte nas despesas da divisão”. Portanto, pode-se, inclusive, extrair
os princípios que regem o condomínio geral, que seriam o da indivisibilidade de
seu exercício e da divisibilidade quanto à sua extinção.
No mesmo sentido, ARNOLDO WALD esclarece que “o direito
brasileiro admitiu a concepção romana do condomínio, baseada no conceito de
cota ideal, embora houvesse em nosso direito de família em resquício do
condomínio germânico, que é a comunhão universal de bens existente entre os
cônjuges. Efetivamente, nesta, todos os bens do casal pertencem
simultaneamente ao marido e à mulher, sem que, na vigência da sociedade
conjugal, se possa concretizar ou individualizar a cota ideal. Somente com a
dissolução da sociedade conjugal, em virtude de morte, da separação judicial ou
de divórcio é que recorremos a meação (cota ideal correspondente à metade)
para, no inventário, calcular o que cabe a cada um dos interessados. A meação
que, até então, era fluída e essencialmente variável, de acordo com as mutações
do patrimônio do casal, cristaliza-se no momento em que se dissolve a sociedade
conjugal”.[7]
Também CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA (1913 – 2004) menciona
que “dá-se o condomínio quando a mesma coisa pertencer a mais de uma pessoa,
cabendo a cada uma delas igual direito, idealmente, sobre o todo e cada uma das
partes. O poder jurídico é atribuído a cada condômino, não sobre uma parte
determinada da coisa, porém sobre ela em sua integralidade, assegurando-se a
exclusividade jurídica ao conjunto de coproprietários, em relação a qualquer
pessoa estranha, e disciplinando-se os respectivos comportamentos bem como a
participação de cada um em função da utilização do objeto”.[8]
Segundo a boa técnica jurídica e a legislação brasileira, a palavra
“condomínio” expressa, invariavelmente, a ideia do direito exercido por mais de
uma pessoa sobre o mesmo objeto, ou seja, o poder de disposição sobre
determinado bem se materializa em várias pessoas ao mesmo tempo, com a
consequência de que esta situação dominial se encontra reciprocamente limitada
no exercício dos direitos concorrentes, mas, por outro lado, se compensa as
vantagens e sacrifícios dos comunheiros. E isto está estampado no próprio
termo: “co” + “domínio”; “com” + “domínio”; ou seja, o domínio de mais de
um.
No Brasil tem-se o condomínio, quando a mesma coisa pertence a mais
de uma pessoa, e todas envolvidas têm igual direito, de forma ideal, sobre o todo
e cada uma de suas partes. Sendo assim, o poder jurídico atribuído a todos na sua
integralidade. Por sinal, esclarece a professora GISELE LEITE que,
considerando o aspecto objetivo do condomínio, trata-se de indivisão dominial,
correspondendo ao estado em que se encontra uma coisa sobre a qual várias
pessoas têm direitos concorrentes. Já no aspecto subjetivo, o condomínio se
representa uma situação dominial de comunhão. No entanto, não se pode perder
de vista que a comunhão pro diviso só existe de direito, não de fato, pois cada
condômino se localiza numa parte certa e determinada da coisa (fração ideal ou
quota da coisa). Exercem sobre uma fatia ou fração concreta todos os atos de
proprietário singular. Vale lembrar que comunhão pro indiviso é a que perdura de
fato e de direito, permanecendo a coisa em estado de indivisão perante os
condôminos, e estes não se localizam, per se, na coisa. A comunhão voluntária é
de origem negocial tal como a aquisição, doação e destinação em comum de bem
para duas ou mais pessoas podem estas usá-lo e fruí-lo. O casamento em regime
de comunhão universal de bens a estabelece e provoca a conversão da
propriedade individual de um dos cônjuges em condomínio.[9]
Portanto, cada condômino tem assegurada uma fração ideal ou quota da
coisa. Entretanto, esta fração ideal não significa uma parcela material da coisa.
De fato, cada quota ou fração ideal não que dizer que a cada um dos
coproprietários se reconhece a plenitude dominial sobre um fragmento físico do
bem, mas que todos os comunheiros ou condôminos têm direitos
qualitativamente iguais sobre a totalidade do referido bem, limitados, contudo,
na titularidade sobre o conjunto.
Valendo-se desse elemento conceitual, MARIA HELENA DINIZ
menciona que “concede-se a cada consorte uma cota ideal qualitativamente igual
da coisa e não uma parcela material desta; por conseguinte, todos os condôminos
têm direitos qualitativamente iguais sobre a totalidade da coisa, sofrendo
limitação na proporção quantitativa em que concorrem com os outros
comunheiros na titularidade sobre o conjunto. Deveras, as cotas-partes são
qualitativa e não quantitativamente iguais, pois, sob esse prisma, a titularidade
dos consortes é suscetível de variação. Só dessa forma é que se poderia justificar
a coexistência de vários direitos sobre um mesmo bem”.[10]
Inclusive, tanto HENRI DE PAGE (1894 - 1969),[11] MARCEL
PLANIOL (1853 - 1931), GEORGES RIPERT (1880 - 1958) e JEAN
BOULANGER (1900 – 1966),[12] bem como ROBERTO DE RUGGIERO (1875
- 1934), FULVIO MAROI (1881 – 1954) e CARLO MAIORCA,[13] VITTORIO
SCIALOJA (1856 – 1933),[14] HENRI MAZEAUD (1900 – 1993), LÉON
MAZEAUD e JEAN MAZEAUD,[15] e PIETRO BONFANTE (1864 – 1932),[16]
são unânimes em desatacar que somente assim se justifica a coexistência de
direitos sobre dada coisa, exercidos comunitariamente e sem conflito por uma
pluralidade de donos, e com exclusão de todos quantos sejam estranhos à
comunhão.
Mas esta ideia não se aplica necessariamente em outros países. Por
exemplo, no Direito Português, o termo “condomínio” expressa uma ideia
diferente, ou seja, diz respeito a uma situação em que determinadas parcelas de
um objeto são regidas por direitos de propriedade autônomos, o que implica que
os diversos titulares desses direitos tenham de conviver e contribuir nas despesas
necessárias para a manutenção de parcelas que são, sem qualquer outra
alternativa, usadas em comum. Na vida encontramos diversas situações em que
duas ou mais pessoas têm posse ou propriedade sobre o mesmo bem. Ademais, o
ordenamento jurídico nacional não pode deixar de reconhecer o exercício
simultâneo da propriedade por mais de um sujeito, uma vez que tal regime legal
se faz necessário para que a propriedade atinja suas funções sociais, em
benefício dos próprios coproprietários e da coletividade, em última análise.
Já a figura indispensável do condômino pode ser definida como a pessoa
que, com outra, exerce o direito de propriedade sobre um imóvel. É o chamado
coproprietário da coisa comum, podendo mesmo alienar a parte ideal que, no
condomínio, lhe cabe, guardando, entretanto, o direito de preferência que
compete aos demais condôminos.[17]


1.2 COMUNHÃO, CONDOMÍNIO E SOCIEDADE


O ponto de ajuste entre o condomínio estabelecido no Código Civil de
2002 e o condomínio horizontal, tipificado na Lei n° 4.591, de 16.12.1964, está
relacionado com as edificações ou conjuntos de edificações de um ou mais
pavimentos, construídas sob forma de unidades isoladas, onde cada condômino é
investido nas duas categorias de direito. No entanto, a realidade social não se
cristalizou, continuou criando novos fenômenos. Dos condomínios de unidades
autônomas nasceram novas situações, de maior complexidade, tais como a
multipropriedade, os loteamentos fechados, os cemitérios privados, os
condomínios de fato, etc., que se encontram, atualmente, em posição anômala
frente ao ordenamento jurídico existente. Diante desta nova faceta social surgiu
o termo comunhão, palavra que deriva do latim, que significa pluralidade,
coletividade ou reunião de elementos singulares.[18]
Os juristas, por sua vez, tomaram emprestado o termo do mundo
coloquial, e nele introduziram um sentido técnico para qualificar tudo aquilo que
é comum a sujeitos distintos, independentemente de se referir a coisas ou bens,
pois se trata simplesmente de comunhão de direitos. Desse modo, podemos
concluir que a comunidade é um gênero incidente nos diversos ramos do direito,
enquanto que o condomínio é apenas uma espécie deste gênero, cujo objeto
deverá sempre ser uma coisa, pois do contrário teríamos um a outra natureza de
comunhão. Condomínio e comunhão não possuem o mesmo sentido. O primeiro
apenas se origina do segundo, mas possui sua própria razão de ser.[19]
Com efeito, a comunhão não se confunde com o condomínio.
Do latim communĭo, o termo comunhão faz referência a participação no
comum de determinadas pessoas. É o compartilhamento ou posse entre duas ou
mais pessoas de uma só coisa. Portanto, a situação de concorrência de direitos
iguais na mesma coisa toma o nome genérico de comunhão. Há, pois, comunhão
de direitos ou obrigações quando duas ou mais pessoas possuem o mesmo bem
jurídico ou têm o dever da mesma prestação. Não se trata de direitos ou
obrigações idênticos, iguais, posto que diversos, mas de um único direito com
mais de um titular ou de uma única obrigação sobre a qual mais de uma pessoa
seja devedora. Observa-se que, nesse caso ambos os comunheiros serão titulares
de direitos, ou devedores de obrigações.
Por isso ousamos opinar que comunhão seria o gênero, enquanto o
condomínio uma das espécies de comunhão. Então todo condomínio será uma
comunhão, mas nem toda comunhão será condomínio. A comunhão é de
qualquer direito, como, por exemplo, pai e mãe têm o direito em comunhão de
educar os filhos; enquanto condomínio é apenas do direito de propriedade.
Segundo ORLANDO GOMES DOS SANTOS (1909 - 1988), são fontes
da comunhão: a) a vontade das partes (comunhão voluntária ou contratual); e b)
a lei (comunhão legal). Sendo que a comunhão legal subdivide-se em: a)
comunhão forçada (imposta por força do inevitável estado de indivisão de certos
bens); e b) comunhão fortuita ou incidente (resulta de circunstâncias).[20]
Já a denominação de condomínio é particularizada pela situação em que
a coisa indivisa tem vários proprietários, simultânea e concorrentemente.
De fato, como vimos, o termo condomínio é formado pela junção da
preposição com (junto, ao lado de) e do substantivo domínio (latim dominium, ou
seja, direito de propriedade) o que significa dizer que a propriedade pertence ao
mesmo tempo a mais de uma pessoa. Todavia, pode a propriedade de uma coisa
pertencer em comum a diversos titulares, de modo que a solução técnica é dada
pela admissão de uma pluralidade de titulares incidentes sobre um mesmo
direito subjetivo de propriedade e, ainda, pela construção da noção de fração
ideal, onde cada um possua a sua quando a coisa se achar indivisa. Sem fugir do
conceito que lhe foi outorgado pela civilística clássica, o termo condomínio
recebeu um novo conteúdo em razão da pressão social, ao se criar a lei do
condomínio horizontal, passando a designar também que a cada apartamento ou
unidade autônoma deve corresponder uma fração ideal no condomínio sobre o
terreno e partes comuns do edifício.[21]
Para J. A. DE FARIA MOTTA o conceito de comunhão é subjetivo e o
conceito de condomínio é objetivo. Segundo ele, o “termo condomínio ou
copropriedade exprime um conceito real, estado de fato modificação, modo de
ser da propriedade; o termo comunhão inculca um conceito pessoal, alusivo às
relações entre os condôminos; o primeiro refere-se à coisa; o segundo, às
pessoas nele interessadas”.[22]
Em suma, temos a comunhão quando determinado direito pode pertencer
a várias pessoas ao mesmo tempo. E temos o condomínio quando a comunhão
recai sobre objeto do Direito das Coisas.
Em relação à diferença entre condomínio e sociedade, podemos dizer
que, no condomínio, existe o domínio de mais de uma pessoa
concomitantemente em relação a um determinado bem, ou seja, um objeto que
pertença a mais de uma pessoa, sendo que todas possuam direitos iguais ante ao
objeto. Já a sociedade é um estado de coisa caracterizado pelo conjunto laboral
de diversos indivíduos, com finalidade onerosa. Em sentido contrário ao
condomínio, a sociedade pode não possuir igualdade na distribuição do objeto,
como por exemplo, um sócio tem 40% (quarenta por cento) das ações e o outro
60% (sessenta por cento), sendo que essa distribuição varia de acordo com o
investimento.
WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO que entre o condomínio e a
sociedade existem muitos pontos de contato. Em ambos os casos, é condição
essencial para a sua existência a pluralidade de sujeitos. Tanto numa como
noutro caso, torna-se mister que exista a res (coisa) comum, que, no condomínio,
é a coisa e, na sociedade, é o acervo social. Além disso, um e outro caso
reclamam conjugação de esforços para a respectiva administração, respondendo
todos, sócios e condôminos, pelas despesas. Todavia, estremam-se por caracteres
inconfundíveis. Na sociedade, os direitos dos sócios decorrem do contrato sócia,
ao passo que, no condomínio, derivam da situação da coisa pertencente a vários
titulares. Ademais, a sociedade só pode existir em virtude do acordo de vontade,
ou da affectio societatis, ao passo que o condomínio resulta não só desse acordo
como de outros acontecimentos estranhos à vontade dos condôminos, como a
herança e o testamento, bem como da própria lei. Acrescenta-se que, na
sociedade, falecendo um dos sócios, procede-se geralmente à sua dissolução e
liquidação, o que não sucede no condomínio, que prossegue com os herdeiros do
condômino falecido, podendo subsistir até contra a vontade daqueles que se
tornaram condôminos. Ainda não é tudo: as sociedades são administradas pela
forma prevista no contrato social, enquanto por lei é regulada a administração
do condomínio. Em suma, a sociedade é relação jurídica de natureza pessoal,
enquanto o condomínio participa da natureza real. Entretanto, vale alertar para o
fato de que o condomínio se rege por conjunto de normas que se filiam,
simultaneamente, à teoria da propriedade e das obrigações. Podemos dizer que
de toda sociedade resulta sempre um condomínio, mas a recíproca não é
verdadeira.[23]


1.3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONDOMÍNIO


O Direito Romano é praticamente a fonte que originou a constituição da
estrutura em que a maioria dos povos compilou as bases de suas instituições
jurídicas. Se não bastasse isto, a legislação brasileira da atualidade, sem sombra
de dúvida, também sofreu as influências jurídicas dos descobridores e
colonizadores portugueses, como era natural, a partir dos tempos das Ordenações
Filipinas.
Nessa sequência histórica de influências normativas, como não poderia
deixar de ser, os legisladores lusitanos, em suas Ordenações (Manuelinas,
Afonsinas e Filipinas), absorveram princípios fundamentais provindos do Direito
Romano, que não concordavam com a divisibilidade da propriedade horizontal,
considerando como usos e costumes medievais a aceitação da possibilidade
desse fracionamento.
Apenas a título de ilustração, o § 34 do Título 68 do Livro das
Ordenações, com toda característica, terminologia da época e sua complicada
ortografia, menciona o seguinte: “E, se huma casa for de dois senhorios, de
maneira que de hum deles seja o sótão e de outro o sobrado, não poderá aquele,
cujo for o sobrado, fazer janela sobre o portal daquele, cujo for o sótão, ou logea,
nem outro edifício algum”. A respeito desta antiga norma é importante destacar
que se trata de dispositivo inteligente e válido, pois, até hoje, passados séculos
de sua promulgação, os legisladores preservam o direito que dele flui, tanto que
toda legislação reguladora das relações entre condôminos protege o bem comum
contra as modificações de seu aspecto externo pretendidas por um só dos
coproprietários.
Desde os tempos do Brasil Colônia até a promulgação do Código Civil
Brasileiro de 1916, os princípios legais das Ordenações regeram as relações do
povo brasileiro. E, para comprovar o efeito comparativo, tanto o jurista
AUGUSTO TEIXEIRA DE FREITAS (1818-1886), responsável pela
extraordinária “Consolidação das Leis Civis brasileiras”, de 1858, como o
também jurista CARLOS AUGUSTO DE CARVALHO (1851-1905), autor da
“Nova Consolidação das Leis Civis” ou “Direito Civil Brasileiro Recopilado”,
publicada no ano de 1899, em Bruxelas, utilizaram-se da essência jurídica desse
mesmo § 34 do Título 68 do Livro das Ordenações, dando-lhe a seguinte
redação: “Se uma coisa é de dois donos, pertencendo a um as lojas, e ao outro o
sobrado, não pode o dono do sobrado fazer janela ou outra obra, sobre o portal
das lojas”.
Entretanto, até então, prevalecia à noção tradicional de propriedade
ligando-se à ideia de assenhoreamento de uma coisa com exclusão de qualquer
outro sujeito. Ideia esta contrária a atual concepção de condomínio que
compreende o exercício do direito dominial por mais de um dono,
simultaneamente. Entre a concepção antiga e a concepção atual há, portanto,
uma contradição acentuada: propriedade que é exclusiva e exclusivista, e
condomínio que assenta na comunidade de direitos. Esta incompatibilidade entre
a propriedade e a pluralidade de proprietários já impressionava os antigos
romanos a tal ponto, que um dos seus famosos jurisconsultos do período
clássico, PUBLIO JUVENCIO CELSO (nasceu por volta do fim do século I e
faleceu em meados do século II), o enunciava dizendo o seguinte: duorum vel
plurium in solidum dominium vel possessionem esse non potest (“não pode
existir a propriedade ou posse de duas ou mais pessoas”).[24] Vale dizer que a
propriedade, senhoria universal sobre a coisa, não pode pertencer a mais de um
dominus (senhor, dono, possuidor, proprietário) simultaneamente, sendo,
todavia, lícita sua pertinência a mais de um sujeito, pro partis (por partes).[25]
Certo é que fatores eventuais, como a sucessão hereditária, por exemplo,
criavam o fenômeno da propriedade pertencente a mais de um dominus. Por essa
razão, o Direito Romano engendrou a teoria condominial dentro do aspecto
paralelo do exercício da propriedade, tal como demonstra a codificação de
Justiniano: nemo ex sociis plus parte sua potest alienare, etsi totorum bonorum
socii sint (“nenhum dos sócios pode alienar mais do que os seu quinhão, embora
sejam sócios de todos os bens”).[26] Portanto, “a coisa comum não se diz
propriedade de um só”. Os cotitulares do direito de propriedade exercem-no ao
mesmo tempo em quotas ideais (frações ideais) sobre a propriedade indivisa. A
divisão não é material, mas idealizada. No sistema romano, como oportunamente
menciona SÍLVIO DE SALVO VENOSA, “a cota ideal é a medida da
propriedade”, e, “de acordo com essa fração, repartem-se os benefícios e ônus,
direitos e obrigações entre os comunheiros”.[27]
Vale registrar que o Brasil foi um dos primeiros países do mundo a
dinamizar a sistemática condominial através do Projeto de Lei n° 649, de 1927,
originário da Câmara dos Deputados. Tal Projeto de Lei acabou se
transformando, depois de longos estudos e debates, no Decreto n° 5.481, de
25.06.1928, que dispunha sobre a alienação parcial dos edifícios de mais de
cinco andares e dava outras providencias (publicado no Diário Oficial de
27.06.1982 e retificado no dia seguinte). Este Decreto rompeu o regime do
condomínio absoluto, que não admitia propriedades divididas em planos
horizontais, através de quotas ideais, podendo o condomínio dispor da coisa
fisicamente indivisível.
De maneira que, a partir da vigência do Decreto n° 5.481, de 25.06.1928,
se passou a admitir a propriedade plena de unidades autônomas em forma de
apartamentos, em edifícios de mais de 5 (cinco) andares, isolados entre si,
contendo cada um mais de 3 (três) peças e que se destinassem a escritórios ou
residências particulares, prevendo sua alienação no todo ou em parte, conforme
deixava logo claro o seu art. 1° na sua redação original.[28]
No entanto, paulatinamente, o Decreto n° 5.481, de 25.06.1928, foi se
tornando mais e mais abrangente. Com efeito, o Decreto- Lei n° 5.234, de
08.02.1943 deu outra redação ao referido art. 1°: “Os edifícios de três ou mais
pavimentos construídos de cimento armado, ou material similar incombustível,
sob a forma de apartamentos isolados, entre si, contendo cada um pelo menos
três peças, e destinados a escritórios, ou residência particular, poderão ser
alienados no todo ou em parte, objetivamente considerado, constituindo cada
apartamento uma propriedade autônoma, sujeita às limitações estabelecidas
nesta lei”. Posteriormente, a Lei n° 285, de 05.06.1948, modificou novamente:
“Os edifícios de dois ou mais pavimentos construídos de cimento armado ou
material similar incombustível, sob a forma de apartamentos isolados, entre si,
que contiverem cada um, pelo menos, três peças, e destinados a escritórios ou
residências particulares, poderão ser alienados, no todo ou em parte,
objetivamente considerados, e constituíra cada apartamento propriedade
autônoma sujeita às limitações estabelecidas nesta Lei”.
Todas essas modificações eram inevitáveis. À medida que a sociedade
foi se tornando complexa, devido à concentração da população nos centros
urbanos, uma nova forma de vida em comum foi criada, diante da necessidade
de aproveitamento de áreas de terrenos mais propícias à habitação. Surgiu então
a moradia em edifícios de dois ou mais pavimentos, que futuramente receberia o
nome de condomínio horizontal. Ressalte-se que após a primeira grande guerra,
a sociedade brasileira pressionou, de forma contundente, o estado, para que
buscasse um melhor aproveitamento dos terrenos urbanos, de modo a permitir
que o maior número de famílias pudesse utilizar, de maneira racional, uma única
parcela do terreno. Essa pressão exercida pela sociedade incidiu diretamente na
esfera jurídica, para onde as questões foram levadas, dando ensejo a um novo
conceito de condomínio, que veio a se chamar o condomínio horizontal.[29]
Finalmente, a Lei n° 4.591, de 16.12.1964, que dispõe sobre o
condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias, revogou o Decreto n
° 5.481, de 25.06.1928.
Por sinal, a Lei n° 4.591, de 16.12.1964, surgiu em razão da pressão
social, que tinha por escopo legalizar os condomínios já existentes, que eram
irregulares na ocasião, em virtude da defesa do interesse popular diante da
amplitude alcançada nas massas. A modalidade de condomínio permitida na
ocasião pelo Decreto n° 5.481, de 25.06.1928, que previa a copropriedade,
apenas, a prédio de 2 (dois) ou mais pavimentos, construídos de cimento armado
ou material similar e incombustível, sob forma de apartamentos isolados,
contendo cada um pelo menos 3 (três) peças destinadas a escritórios ou
residências particular. De maneira que a Lei n° 4.591, de 16.12.1964 (Lei sobre
Condomínio e Incorporação) instituiu uma nova modalidade de condomínio em
edifício, sem quaisquer limitações ou restrições quanto ao número de unidades e
ao tipo de material a ser empregado, firmando-se, inclusive, na figura das
edificações ou conjunto de edificações, que podem ser superpostas ou
geminadas, para fins residenciais, comerciais ou misto. Essa nova modalidade de
propriedade se origina diante da vontade de se submeter ao tipo de edificação
instituído em lei especial, cuja natureza dúplice faz com que coexistam ao
mesmo tempo o domínio singular próprio das unidades autônomas e o domínio
exercido em conjunto nas áreas de uso comum, o que significa dizer que cada
condômino é proprietário de sua unidade e coproprietário das áreas de uso
comum.[30]
A Lei n° 4.591, de 16.12.1964, se mantém em vigor até hoje, mas com
alterações ditadas pela Lei n° 4.864, de 29.11.1965 (que criou medidas de
estímulo à Indústria de Construção Civil), pelo Decreto-Lei n° 981, de
20.10.1969, pela Lei n° 6.434, de 15.07.1977, pela Lei n° 6.709, de 31.10.1979,
pela Lei n° 7.182, de 27.03.1984, pela Lei n° 9.267, de 25.03.1996, pela Lei n°
10.931, de 02.08.2004, pela Lei n° 12.424, de 16.06.2011.


1.4 NATUREZA JURÍDICA DO CONDOMÍNIO


Segundo o jurista baiano ORLANDO GOMES DOS SANTOS, 2 (duas)
teorias principais procuram explicar a natureza jurídica do condomínio: a) a
teoria individualista; e b) a teoria coletivista.[31]
Em relação à teoria individualista, destacamos que a propriedade é um
direito exclusivo. Por esta razão, parece estranho que várias pessoas possam ter
simultaneamente o domínio da mesma coisa. Uma excluiria a outra, eis que não
pode ser comum o que é próprio por natureza e essência. Para conciliar essa
antítese, a teoria individualista divide idealmente a coisa, atribuindo a cada
sujeito o direito de propriedade sobre a parte abstrata resultante da divisão ideal.
Embora os condôminos exerçam direitos sobre a coisa comum, são proprietários
de partes abstratamente divididas. Objeta-se que o domínio recaia sobre essa
cota-parte ideal, quando, por definição, há de ter por objeto uma coisa. Diz-se,
porém, que é uma situação provisória, pois, potencialmente, as partes abstratas
tendem à concretização, em face do direito assegurado aos condôminos de
pedirem, a todo tempo, a divisão da coisa comum. A indivisão, na concepção
individualista, é um estado inorgânico, uma situação excepcional, que não deve
durar, porque se contrapõe, econômica e socialmente, à forma de domínio.[32]
Em relação à teoria coletiva, podemos dizer que seus adeptos veem na
comunhão um só direito, tendo como sujeito a coletividade constituída pelos
interessados. Não há titulares individuais. A coisa é realmente comum, sendo,
então, a propriedade denominada como coletiva. O bem não pertence a várias
pessoas, cada qual tendo a sua parte, mas a todos os comunheiros em conjunto,
ainda que não seja orgânico o estado de indivisão. Não há enfim, justaposição de
partes individuais.[33]
Vale mencionar mais uma vez que o Direito Alemão conhece a figura da
propriedade de mão comum, cuja construção jurídica é distinta, senão oposta à
construção jurídica do condomínio. Ao contrário do que se verifica na
copropriedade, há uma vinculação recíproca entre todos os que participam da
relação jurídica, de modo que cada qual não tem direito sobre uma parte da
coisa, ainda que ideal, mas, sim, sobre o todo. Em consequência, nenhum pode
dispor de parte da coisa, nem exigir a sua divisão. Na administração do bem
comum, a prática dos atos está sujeita ao consentimento unânime, não
vigorando, pois, o princípio da maioria, que é próprio do condomínio. Os casos
mais importantes são: a propriedade de um grupo de pessoas associadas, a
indivisão hereditária e a comunhão universal de bens no casamento.[34]
ORLANDO GOMES DOS SANTOS acrescenta que a comunhão pode
ser concebida como limitação do direito de propriedade. Os direitos concorrentes
limitar-se-iam entre si, para coexistirem. E, assim, a cota de cada condômino
seria o limite do direito dos outros. Segundo ele, é justamente na comunhão
forçada que esse sentido de limitação ao direito de propriedade se revela de
modo mais incisivo.[35]
No entanto, as legislações em geral seguem a teoria individualista,
admitindo a existência da propriedade dividida em partes ideais, sob o nome do
condomínio. É o que se verifica, por exemplo, na jurisprudência de nossos
tribunais.

“O Código Civil Brasileiro, tomando partido entre correntes tão
diversas e tão embaraçosas, aceitou a teoria da subsistência, em
cada condômino, da propriedade sobre toda a coisa, delimitada
naturalmente pelos iguais direitos dos demais consortes; entre
todos se distribui a utilidade econômica da coisa; o direito de
cada condômino, em face de terceiros abrange a totalidade dos
poderes imanentes ao direito de propriedade; mas, entre os
próprios condôminos, o direito de cada um é autolimitado pelo de
outro, na medida de suas quotas, para que se torne possível sua
coexistência”.[36]

PIETRO BONFANTE (1864 - 1932), a seu turno, após examinar as
teorias do jurista alemão Rudolf Von Hering (1818 - 1892), do jurista italiano
Francesco Carnelutti (1879 - 1965), Karl Barth (1886 - 1968) e outros juristas
de renome, agrupando os entendimentos deles nas seguintes teorias que
procuram explicar a natureza jurídica do condomínio: a) teoria da propriedade
integral ou total: esta teoria vislumbra no condomínio um só direito, de maneira
que cada condômino tem direito à propriedade sobre toda a coisa, sendo que o
exercício desse direito é limitado pelos direitos dos demais consortes. Adepto
desta doutrina é o jurista italiano VITTORIO SCIALOJA (1856 - 1933), opina
que o condomínio constitui relação de igualdades, que mutuamente se limitam;
[37]
b) teoria das propriedades plúrimas parciais: para esta teoria cada
condômino só é dono apenas de sua parte ideal, havendo no condomínio diversas
propriedades intelectualmente parciais, cuja reunião é que daria origem ao
condomínio. No entanto, PIETRO BONFANTE acabou inclinando-se para a
teoria das propriedades plúrimas parciais, isto é, para concepção da
concorrência de propriedades parciais pela qual cada condômino tem um direito
autônomo que, pelo caráter e conteúdo, é propriedade, e, pela medida, limitada a
uma cota-parte.[38]
Com certeza o Direito Positivo Brasileiro adotou a teoria da propriedade
integral ou total, uma vez que o art. 1.314 do Código Civil de 2002,[39] da
mesma forma que o Código Civil de 1916, estabelece o direito de cada
condômino ou consorte utilizar-se do bem como um todo, em conformidade com
sua destinação econômica, podendo exercer seus direitos em face de terceiros.


1.5 ESPÉCIES DE CONDOMÍNIO


De acordo com a constituição, o condomínio pode ser de 3 (três)
espécies distintas: a) condomínio convencional: esta modalidade de condomínio
é aquela que nasce do contrato pelo qual duas ou mais pessoas que adquirem ou
colocam uma coisa em comum para dela usar ou fruir;[40] b) condomínio
incidental ou eventual: esta modalidade de condomínio é aquela que nasce não
da vontade das partes envolvidas (concurso de vontades), mas de uma
circunstância qualquer em que o estado de comunhão provém de um fato não
decorrente da manifestação volitiva dos comunheiros, como, por exemplo, da
sucessão hereditária ou dos direitos de vizinhança;[41] e c) condomínio legal ou
necessário: esta modalidade de condomínio nasce da imposição direta do
ordenamento jurídico. No entanto, o condomínio legal se divide didaticamente
em 2 (duas modalidades): i) condomínio forçado: esta subespécie é aquela que se
forma imperativamente, ou seja, resultante de inevitável estado de indivisão dos
bens, quer por imposição da ordem jurídica (por exemplo, módulo rural), quer
por cercas, pastos (compáscuos), vala, parede (parede-meia) e muros. Em outras
palavras, sempre que houver divisas, a lei forçadamente estabelece o
condomínio. Em todas esses hipóteses a presunção de condomínio é relativa. De
maneira que a parte interessada pode fazer prova em contrário, para dizer que
não houve condomínio para provar, por exemplo, que a parede foi feita por um
condômino apenas; e ii) condomínio fortuito: esta subespécie é aquela que se
forma aleatoriamente, como por exemplo, a sucessão hereditária (não se sabe
quem irá receber a herança primeiro).[42]
Já quanto à necessidade, o condomínio pode ser de 2 (duas) espécies
distintas: a) condomínio ordinário ou transitório: esta modalidade de
condomínio é aquela que, resultante ou não de contrato (convenção), vigora por
tempo certo ou enquanto não se lhe ponha termo, mas que pode cessar sempre; e
b) condomínio permanente: esta modalidade de condomínio é aquela que é
coativa ou forçada, insuscetível de se extinguir pela natureza mesma da coisa ou
da relação jurídica que o gerou, ou do exercício do direito correlativo.[43]
Como se pode ver, existem diversas espécies de condomínio, entretanto,
a mais importante das classificações em virtude de suas consequências práticas é
a relativa à possibilidade de divisão física, pois influi diretamente na forma ou
modo de ser do condomínio. Em assim sendo, segundo a classificação relativa à
possibilidade de divisão física o condomínio pode ser de 2 (duas) espécies
distintas: a) condomínio pro diviso; e b) condomínio pro indiviso.
Na modalidade de condomínio pro diviso, se exerce a posse, sempre no
mesmo lugar; consegue-se identificar a posse física, por isso é pro diviso. Em
outras palavras, esta espécie existe de direito, mas não de fato, uma vez que cada
condômino já se localiza numa parte certa e determinada da coisa. Exemplo
típico desta modalidade é o prédio cujos andares pertencem a proprietários
diversos, o condomínio nos edifícios de apartamentos.
Segundo MARIA HELENA DINIZ, tomando-se por base estas
características, o condomínio pro diviso é “aquele em que a comunhão existe
juridicamente, mas não de fato, já que cada coproprietário tem uma parte certa e
determinada do bem, como ocorre no condomínio em edifícios de apartamentos.
Ocorre quando os consortes, com aprovação tácita recíproca, instalam-se em
parte da área comum, exercendo sobre ela todos os atos de proprietários
singulares e com exclusão de seus condôminos, como se a gleba já tivesse sido
partilhada”.[44] CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, por sua vez, esclarece que
“as faculdades dos condôminos do prédio dividido horizontalmente, e fracionado
em apartamentos residenciais ou conjuntos comerciais não traduzem um poder
jurídico sobre a coisa toda, por quota ideal, mas implicam na utilização em
comum apenas das partes necessárias à soldadura da comunhão, importando
quanto mais no poder exercido sobre uma fração da coisa com exclusão de todos
os participantes da copropriedade”.[45]
Além disso, existe uma peculiaridade que pode ser de pronto assinalada
no condomínio pro diviso, a de que cada condômino de um edifício coletivo
guarda poder exclusivo sobre sua unidade, e se sujeita à comunhão do terreno,
dos alicerces, das paredes externas, do pórtico de entrada, das áreas de serviço,
dos elevadores, daquilo enfim que se torna indispensável à coesão orgânica de
um conjunto econômico-jurídico. Cada condômino há de ter a faculdade, em
princípio, de usar por si ou por outrem a coisa, e assim compete-lhes dar posse,
uso ou gozo da propriedade a estranhos, sem prévia audiência dos demais
condôminos. É certo que este poder às vezes encontra limitação no ajuste dos
consortes, mas esta restrição já em si mesma é a afirmação de um direito, pois
que se este é diminuído em seu exercício pela convenção livre dos titulares é
porque em princípio fora suscetível de fruição ampla. De maneira que a
copropriedade sobre o terreno e partes comuns não se pode destacar do direito
exclusivo sobre a unidade e, o proprietário de uma unidade autônoma pode
aliená-la independentemente de anuência dos demais.
Na modalidade de condomínio pro indiviso, o estado de indivisão é
jurídico e de fato. Isto é, a comunhão perdura de fato e de direito; todos os
condôminos permanecem na indivisão, tanto juridicamente como de fato. Sendo
assim, podemos dizer que a propriedade horizontal diverge da comunhão pro
indiviso tradicional, e coincidentemente insurge-se contra os seus princípios
básicos do domínio. Por exemplo, numa fazenda com 40 (quarenta) condôminos,
cada um é titular de 1/40, mas nenhum sabe o lugar de seu quinhão.
Segundo WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO, condomínio pro
indiviso “é aquele em que a comunhão perdura de fato e de direito. Todos os
comunheiros permanecem na indivisão, não se localizando bem, que se mantém
indiviso”.[46] Ademais, faz-se necessário manter-se a comunhão permanente e
perpétua, pois, não será possível a conservação útil do complexo jurídico do
condomínio pro indiviso, nem concebível a fruição da parte exclusiva de cada
condômino sem a permanência do estado de comunhão. Em consequência, está é
obrigatoriamente duradoura, em contraposição à comunhão clássica, que a lei
quer transitória.
Visto isto, devemos lembrar ainda que, se tomando por base a legislação
brasileira em vigor, temos 2 (dois) diferentes modelos de condomínio legais: a)
condomínio tradicional, geral ou comum, disciplinado pelos arts. 1314 a 1330
do Código Civil de 2002: este modelo caracteriza-se pela multiplicidade de
sujeitos; pela unicidade do objeto; pelo fato de a copropriedade ser exercida
sobre a mesma coisa; pelo exercício simultâneo do mesmo direito de
propriedade por duas ou mais pessoas; pelo fato de não haver nenhuma
infringência ao caráter exclusivista da propriedade (característica da
propriedade); e pelo fato de o condomínio manter a exclusividade, sendo que
essa exclusividade é exercida por duas ou mais pessoas. Nesta modalidade, toda
a coisa fica sujeita ao regime comum, sem se cogitar da propriedade individual,
e sua extensão incide sobre a integralidade da coisa, e não apenas em parte desta;
e b) condomínio edilício, especial, relativo, horizontal ou condomínio por
unidades autônomas, disciplinado nos arts. 1331 a 1358 do Código Civil de
2002 e na Lei n° 4.591, de 16.12.1964: este modelo caracteriza-se pela simbiose
(uma relação mutuamente vantajosa entre dois ou mais proprietários); pelo mix
(mistura) entre propriedade comum e propriedade coletiva; pelo fato de ser
necessariamente formado por unidades autônomas e partes comuns; e pelo fato
de não se admitir separação das unidades autônomas das partes comuns, pois se
houver essa divisão, importaria em extinção do condomínio edilício. Nesta
modalidade, além das partes comuns relativas a todos os proprietários, existem
as partes autônomas de propriedade de modo singular ou coletiva.[47] Em suma,
se tem presente que a simbiose edilícia implica uma inter-relação de tal forma
íntima entre os proprietários das unidades autônomas envolvidas que se torna
obrigatória; quando não existe obrigatoriedade na relação, não há condomínio
edilício. Vale acrescentar que o condomínio horizontal, hoje devidamente
tipificado, mas que teve sua origem baseada nos anseios sociais, bem antes da
sua criação legal, justamente por fugir aos moldes determinados pela lei civil
que tratava dos condomínios;[48] c) loteamento fechado, disciplinado pela Lei n°
6.766, de 19.12.1979, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano (dispõe
sobre as vias de circulação e os logradouros públicos, cuja utilização resta
assegura da apenas aos proprietários e aos moradores, mediante permissão ou
concessão de uso): a estrutura do loteamento fechado é muito semelhante ao do
condomínio horizontal. Ocorre, porém, uma diferença entre ambos os institutos
no que diz respeito aos espaços livres de uso comum de todos. Verifica-se que as
suas naturezas se distinguem, por ser a propriedade horizontal um verdadeiro
condomínio neste aspecto, pois os titulares possuem em comum o domínio
destes espaços, enquanto que no loteamento fechado, estes espaços livres
pertencem ao município, constituindo-se então numa comunhão de uso.


1.6 PROBLEMAS DO CONDOMÍNIO HORIZONTAL


Nenhuma outra modalidade de propriedade tem suscitado maior fonte de
problemas jurídicos e sociais do que a denominada propriedade horizontal, ou
seja, propriedade em planos horizontais ou propriedade em edifícios. Segundo
SÍLVIO DE SALVO VENOSA, os problemas da propriedade horizontal
começam pela própria denominação, sobre a qual não há um senso comum. Com
efeito, “a doutrina nacional e estrangeira refere-se a essa modalidade como
propriedade horizontal, propriedade em planos horizontais, condomínio sui
generis, condomínio por andares, condomínio edilício”.[49]
Entretanto, entre nós consagrou-se a expressão propriedade horizontal,
com certeza por influência da terminologia estrangeira, porém não isenta de
críticas, pois nem sempre essa modalidade de condomínio abrange apenas
propriedades em edifícios, com planos horizontais superpostos.
Antiga legislação brasileira, nela incluídas as disposições normativas do
Código Civil de 1916, não admitia a divisão de edifício por planos horizontais.
Permitia-se tão somente a divisão por planos verticais, geradores das chamadas
“casas de parede-meia”, sujeitas às normas reguladoras dos direitos de
vizinhança. No entanto, o desenvolvimento urbano do pós-guerra, a valorização
dos terrenos citadinos e a necessidade de aproveitamento de espaço nas
metrópoles suscitaram a ideia de instituir condomínio nos prédios de mais de um
andar, distribuindo-os por diversos proprietários.
Com o advento do Decreto n° 5.481, de 25.06.1928, alterado
posteriormente pelo Decreto- Lei n° 5.234, de 08.02.1943, e pela Lei n° 285, de
05.06.1948, que se estatuiu a regulamentação dos edifícios coletivos, divididos
em unidades autônomas, destinadas a finalidades residenciais, profissionais e
comerciais.
O crescimento da atividade empresarial da incorporação, com as
consequências diretas e indiretas, exigiam do legislador imobiliário uma
regulamentação mais específica e coerente com a realidade urbana de então, não
somente para atualizar o regime condominial dos edifícios de apartamentos e
similares, em flagrante desconformidade com as exigências modernas, como
ainda para coibir os abusos e disciplinar os negócios envolvendo a construção
edilícia, definindo os direitos e as obrigações dos incorporadores, construtores e
adquirentes de unidades autônomas em prédios coletivos. Em decorrência disso,
foi promulgada a Lei n° 4.591, de 16.12.1964, denominada de Condomínio e
Incorporações, a qual, logo em seguida, sofreu modificações impostas pela Lei n
° 4.864, de 29.11.1965 (que criou medidas de estímulo à Indústria de Construção
Civil).
Na natureza jurídica do condomínio edilício, disciplinado pela Lei n°
4.591, de 16.12.1964, existe nítida e distinta duplicidade de direitos reais: a) o
direito de propriedade da unidade autônoma; e b) o direito de propriedade das
áreas comuns.
O direito de propriedade da unidade autônoma, em que o ius utendi,
fruendi et abutendi é o mais amplo possível, tal como ocorre na propriedade em
geral, sofre restrições de vizinhança impostas pela convivência material da coisa,
em planos horizontais, sendo, então, considerado o titular da unidade autônoma
proprietário de um direito complexo. Não se distingue muito do direito de
propriedade comum que também sofre restrições de uso e gozo, tendo em vista
os direitos de vizinhança em geral, as normas edilícias e os princípios do abuso
de direito. Sendo assim, dúvida não resta que o direito de usar da unidade
autônoma encontra limites apenas nos princípios de ordem natural de
vizinhança, de um lado, e de outro nos ordenamentos particulares do
condomínio edilício e, à margem desse direito, em quase tudo igual à
propriedade exclusiva individual, coloca-se, portanto, a disciplina dirigida à
propriedade das partes comuns do edifício.
A questão nos chamados condomínios horizontais, que é de suma
importância, diz respeito aos direitos de vizinhança. Tal questão é evidenciada
pelo fato de a estatística indicar que os Juizados Especiais Cíveis recebem
diariamente cerca de 200 (duzentos) novos processos, sendo aproximadamente
30% (trinta por cento) de tais processos relativos a disputas entre vizinhos. As
principais causas das brigas entre vizinhos dizem respeito: 1) aos vazamentos (o
problema é saber qual das partes pagará a conta do conserto); 2) às áreas de lazer
(amigos de condôminos que utilizam as áreas de lazer mesmo que isso seja
proibido pelo condomínio); 3) aos animais de estimação (só o regulamento do
condomínio pode dizer quem tem razão: se o dono do animal ou o vizinho que se
incomoda com a presença do bicho); 4) aos ruídos (problemas relativos ao
barulho excessivo de uma reforma ou do aparelho de som ligado até mais tarde
numa festa); e 5) à má utilização do imóvel (muitos condôminos reclamam do
trânsito dos clientes que visitam os profissionais que trabalham em casa).[50]
Matéria controvertida nesta área é a respeito da indagação se edifício
pertencente a um só proprietário é ou não condomínio? Certamente que o
edifício com várias unidades residenciais ou comerciais pertencentes e
administradas por um só proprietário está fora da abrangência da Lei n° 4.591,
de 16.12.1964, porque se o prédio tem um único dono não é possível instituir o
condomínio já que o art. 1.332 do Código Civil de 2002,[51] e o art. 7° da Lei n°
4.591, de 16.12.1964,[52] prescrevem que o condomínio é instituído por atos entre
vivos através da convenção condominial. Portanto, a quantidade de proprietários
é o que caracteriza um condomínio, além da sua composição com identificação
individual das áreas úteis e áreas comuns de cada unidade. O imóvel construído
e mantido na posse de um único proprietário, mesmo composto por várias
unidades, não pode ser transformado em condomínio, podendo o seu detentor
alugar e administrar as unidades indistintamente.
Na prática, não é difícil ocorrer de os moradores locatários de um
determinado edifício desejarem escolher um administrador ou síndico, pois não
concordam com os aumentos das cotas que vêm sendo cobradas; o que atribuem
ao fato de ser a administração exercida por um único indivíduo, que é
exatamente o proprietário de todas as unidades residenciais. Em tais casos não
tem aplicação a Lei n° 4.591, de 16.12.1964 (Lei do Condomínio), mas sim o
§3° do art. 23 da Lei do Inquilinato (Lei n° 8.245, 18.10.1991).[53] O proprietário
é dono e administrador do edifício; impôs condições e os moradores locatários
aceitaram. Nessa particularidade é de se observar que, inexistindo o condomínio,
o rateio das despesas comportadas pelo proprietário para o normal
funcionamento do prédio, só poderá ser exercido após terem sido pago e
repassadas aos ocupantes a titulo de reembolso. Ou seja, o único proprietário
divide os gastos de manutenção, conservação, empregados, impostos,
contribuição previdenciária, seguro e outras despesas entre os moradores
locatários. Naturalmente, há um contrato que especifica as condições. A causa
está sob a égide da Lei do Inquilinato. Se há abuso, dolo, resta aos locatários
recorrer ao Poder Judiciário. Por sinal, a apresentação dos comprovantes de
despesas esta sujeita aos termos do contrato de locação, mas um locador correto
deve exibi-los quando o locatário o solicitar em termos.[54]
Entretanto, não se pode perder de vista que permanece a regra quanto ao
tipo de despesa, pois só são reembolsáveis aquelas destinadas ao normal
funcionamento do prédio. As despesas destinadas a aumentar a durabilidade do
edifício, principalmente benfeitorias, são de exclusiva responsabilidade do
proprietário.
Outra questão muito debatida na doutrina e jurisprudência se refere à
personalidade jurídica do condomínio edilício, assunto este que trataremos no
capítulo 3 desta obra.


1.7 NOVAS FORMAS DE CONDOMÍNIO


A doutrina brasileira vem, insistentemente, alertando para o fato de que,
face as constantes transformações que ocorrem no seio de nossa sociedade,
surgiram realidades em matéria de condomínio edilício que não se amoldam à
antiga estrutura do condomínio tradicional, bem como estão cada vez mais
distantes da tipicidade regulada pela Lei n° 4.591, de 16.12.1964, julgada como
perfeita há mais de quarenta anos atrás.
De maneira que novas modalidades de condomínio vêm surgindo de
forma descaracterizada da tipicidade estabelecida. Podemos citar como alguns
exemplos: a multipropriedade, o shopping center, o clube de campo, o cemitério
privado, os condomínios de fato, entre tantos outros. Os civilistas
contemporâneos têm se utilizado da expressão novas propriedades, para se
referir aos desmembramentos do condomínio horizontal.[55]


1.7.1 Loteamento fechado e loteamento aberto ou convencional (condomínio
de fato)


O processo de urbanização desordenada das cidades traz algumas
consequências negativas de ordem estrutural e social, tais como a deficiência do
sistema de transportes, o congestionamento do trânsito de veículos automotores,
a proliferação de habitações subnormais, a ocorrência de inundações (causadas,
por exemplo, pela impermeabilização do solo e ocupação de áreas de várzea), a
precariedade do saneamento básico, a “favelização” das áreas públicas invadidas
e a violência.
Inspirados na má qualidade de vida urbana, gerada pela desenfreada e
caótica ocupação do solo nos grandes centros, empresários do ramo imobiliário
têm optado por moradias dotadas de comodidade, luxo e segurança, além do
status de se morar bem. Estas são algumas das razões da proliferação de uma
modalidade de parcelamento do solo urbano, os loteamentos fechados, com
características especiais que os diferem dos convencionais. Geralmente
implantados na periferia das metrópoles ou fora do perímetro urbano, os
loteamentos fechados apresentam-se cercados por muros, com suas entradas
equipadas com guaritas e, de ordinário, fechadas por cancelas, vigiadas por
agentes privados de segurança que controlam seu acesso mediante prévia
identificação, permitindo o ingresso somente aos residentes ou às pessoas por
estes autorizadas, impedindo, assim, a livre entrada e circulação de pessoas
estranhas ao parcelamento, inclusive às praias do litoral, naqueles loteamentos
que margeiam a orla marítima.
Os loteamentos fechados, ordinariamente, também são conhecidos por
loteamentos especiais, loteamentos em condomínio, condomínios horizontais ou
condomínios especiais, como figuras afins, mas essa sinonímia é empregada
equivocadamente para identificar uma mesma figura e isto comporta muitas
críticas. Com efeito, em primeiro lugar os adjetivos “condomínio” e “fechado”,
aí atribuídos, não espelham os predicados dessa forma de parcelamento do solo.
Na concepção legal do loteamento tradicional estão sempre presentes as ideias
de individualidade dominial das novas unidades (ou seja, dos lotes), de criação
de espaços para áreas públicas e de inovação do sistema viário, perdendo a gleba
a sua indivisibilidade, dando azo ao surgimento de áreas de uso comum do povo
(inciso I do art. 4º, incisos II e III do art. 7º, inciso III do §2° do art. 9º e art. 22
da Lei n° 6.766, de 19.12.1979,[56] que dispõe sobre o parcelamento do solo
urbano, combinado com o inciso I do art. 99 Código Civil de 2002).[57]
A esse respeito SÍLVIO DE SALVO VENOSA também não perde a
oportunidade de chamar a atenção para o fato de serem frequentes os chamados
“loteamentos fechados” (bairros urbanizados, em periferia de grandes centros,
para fins residenciais, ou em regiões mais afastadas para finalidades de lazer).
Nesta realidade urbana, se as edificações ocorrem em dezenas de lotes, como nos
casos concretos, com vias públicas particulares, não há dúvida de que existem
partes comuns, coletivas e unidades autônomas. Não havendo dúvida a respeito
da existência de condomínio edilício (com partes comuns, coletivas e unidades
autônomas), emprega-se, no que não conflitar, a lei condominial (Lei n° 4.591,
de 16.12.1964).
No entanto, esta questão não está isenta de grandes controvérsias, pois os
loteamentos fechados com áreas comuns (condomínio de direito) e a figura do
fechamento de ruas públicas para administração privada (condomínio de fato)
quase se confundem, apesar de restar elementos diferenciadores.
Portanto, se a urbanização é feita pelo Município, não há propriedade
coletiva, não há partes comuns no condomínio, o que ocorre é apenas
fechamento de ruas públicas para administração privada (condomínio de fato).
Na verdade, esses tipos de loteamentos surgem violando legislação civil e
urbanística. São assim concebidos para favorecer, na prática, a privatização do
uso das áreas públicas dos loteamentos (áreas verdes e institucionais, sistemas de
lazer, ruas e praças, etc.), outrora vocacionadas, em sua origem, ao uso coletivo.
Mas são tolerados pelo Poder Público.
Portanto, o condomínio de fato consiste nos aglomerados de
proprietários que se reúnem informalmente comportando-se como condôminos,
sem que de direito haja uma efetiva situação condominial. O confronto que se
forma entre o tradicional e o vanguardista faz com que o operador do direito se
veja na posição de enfrentar as concepções pré-normativas, através da
jurisprudência e do legislador de exercer a sua função através de leis atualizadas
que reconheçam a nova realidade fática independente de requisitos ontológicos.
[58]

Quando as alterações oriundas do seio social tornam-se uma prática


reiterada em relação a um contexto de vida, é natural que seus efeitos se
projetem no mundo Jurídico, pois irão acarretar mudanças que dizem respeito a
um modo de vida. E foi exatamente o ocorrido com o instituto tradicional do
condomínio, que sofreu o embate das novas condições sociais, diante das atuais
necessidades ditadas pela vida contemporânea. Assim, o condomínio de fato
possui uma natureza jurídica híbrida e dúplice concomitantemente. É híbrida
porque possui, ao mesmo tempo, características do direito obrigacional e do
direito real. Ao sofrer influência do princípio da autonomia privada, os
proprietários de lotes constituem uma associação com o objetivo de atuarem de
forma condominial no que se refere aos seus interesses privados com incidência
sobre um bem público especificamente, de uso comum do povo. A natureza
dúplice atribuída ao condomínio de fato se dá devido à fusão de 2 (dois)
institutos tradicionais: o loteamento e o condomínio horizontal, que dão origem a
essa nova modalidade. Também adquire este caráter dúplice em razão da
titularidade do proprietário do lote que é plena nos moldes tradicionais, e
assemelha-se com a unidade autônoma do condomínio horizontal. O aspecto
condominial, propriamente dito, esta direcionado para os bens de domínio
público, em que os titulares dos lotes organizam-se de modo semelhante ao
instituídos na lei de condomínios e incorporações.[59]
Ao contrário, se existe acesso controlado, vias particulares entre os
imóveis, áreas de lazer e de uso comum, estará estabelecido o condomínio, sob o
regime de propriedade horizontal. Esta situação fática denomina-se “condomínio
fechado” porque as ruas, praças e áreas de lazer pertencem ao domínio privado,
autoregulamentado por convenções e assembleias do condomínio. É claro que há
necessidade de adaptação de normas condominiais na convenção, sem prejuízo
das regras gerais de vizinhança. A Lei n° 4.591, de 16.12.1964, admite
expressamente essa modalidade de condomínio em seu art. 8°.[60]


1.7.2 Multipropriedade, propriedade compartilhada ou time-sharing


Outra modalidade de condomínio que surgiu mais recentemente é o
sistema time-sharing (multipropriedade).
A multipropriedade já existe há alguns anos na América do Norte e em
países europeus, e aqui no Brasil teve suas primeiras manifestações no início da
década de 1980, através do sistema imobiliário e do sistema hoteleiro. Do
sistema imobiliário surgiu a multipropriedade imobiliária, em que diversos
proprietários repartem o aproveitamento econômico de certo imóvel em turnos
intercorrentes.
Face à grande força turística do Brasil com suas imensas praias e
reservas florestais inexploradas, vem ganhando força o time-sharing ou
compartilhamento do solo por divisão do tempo de uso (multipropriedade). Vale
destacar que a justificativa é encontrada para o fato de o turismo não ser só
direito do cidadão que trabalha, mas atividade que emprega milhares de pessoas
em todo o mundo. Particularmente, no Brasil, a multipropriedade vem
humanizar a propriedade societária, imobiliária e hoteleira turística.
Humanizando-a produz o aumento da frequência e fluência do lazer e o
crescimento do mercado de mão-de-obra, empregos e atividades.
Portanto, no sistema time-sharing o adquirente passa a ser titular de um
imóvel, sendo-lhe assegurando determinado período anual para usar e gozar da
coisa adquirida. A propriedade compartilhada, assim como qualquer
propriedade, vincula a pessoa diretamente à coisa objeto do direito, que para nós
é o bem imóvel. A diferença entre a propriedade comum e a propriedade
compartilhada não está no gênero da conceituação (direito de usar, gozar, dispor,
buscar e o dever de dar a função social devida à coisa objeto da propriedade), e
sim na espécie da definição com o acréscimo do espaço temporal de uso de cada
multiproprietário. No entanto, não se pode perder de vista que o time-sharing
diz respeito a sistema destinado aos locais de lazer ou turismo. Com efeito, a
aquisição de um imóvel para turismo ou lazer acaba com a dúvida e discussão de
aonde ir, dá a certeza da aceitação, acomodação e reserva, torna fácil o
orçamento das despesas, além, de fazer a pessoa conhecida e acreditada no local,
facilitando a solidariedade e apoio da comunidade, quando necessário.
Entretanto a aquisição de um imóvel para residência turística de boa
qualidade produz 3 (três) problemas: 1) o preço elevado de um apartamento ou
casa no local turístico; 2) a manutenção cara composta de ganhos de caseiros,
condomínios, serviços básicos e despesas de conservação durante todo o ano; e
3) a ociosidade do imóvel na maior parte do ano. Por outro lado, os que alugam
mostram-se desgostosos com os estragos por que passam as casas e
apartamentos. Neste complexo, a multipropriedade torna acessível às instalações
de férias, solucionando todos os empecilhos acima enumerados. Marca-se o
turno em que a unidade residencial será utilizada e é só coincidir as férias com
aquele período, realizando-se o sonho da propriedade de turismo ou lazer.


1.7.3 Comunidade condominial em shopping center


Segundo a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SHOPPING CENTERS –
ABRASCE, o shopping Center seria um centro comercial planejado sob uma
administração única, composto de lojas destinadas à exploração comercial e à
prestação de serviços, sujeitas a normas contratuais padronizadas, para manter o
equilíbrio da oferta e da funcionalidade, assegurando a convivência integrada e
pagando de conformidade com o faturamento.[61] Trata-se, pois, de verdadeiro
ente despersonalizado, desprovido de regramento legal específico, que se
assemelha em alguns aspectos, com o condomínio, como adiante se demonstrará.
Entretanto, é forçoso reconhecer a natureza impositiva desse ente, que pela sua
tão só existência, como centro comercial, é sinônimo de sucesso.
Todavia, os shoppings centers, normalmente tratados do ponto de vista
exclusivamente contratual, envolvendo os lojistas, também têm perfeitos
contornos condominiais, quando cada unidade comercial é alienada a um titular.
Embora seja o perfil típico do centro comercial lastreado numa
propriedade imóvel dividida pelo proprietário organizador em salões comerciais
ou lojas, é possível que se organize juridicamente como um condomínio
imobiliário resultante de incorporação. Quando, então, modifica-se, em certo
sentido, a estrutura da organização: os proprietários do imóvel são reunidos em
condomínio, por incorporação, segundo a Lei 4.591/64. Nessa hipótese,
impossível ao cessionário de cotas ingressar, em nome próprio,
independentemente de deliberação da assembleia de condôminos, com ação para
defesa dos interesses do condomínio que entende violados.
Com efeito, o shopping center, dadas suas peculiaridades, possui regras
específicas, que fogem à realidade de outros empreendimentos imobiliários. Por
exemplo, os encargos condominiais cobrados pelo shopping center a seus lojistas
possui características acentuadamente diversas daqueles exigidos em prédios
convencionais, sejam residenciais, sejam comerciais.
O contrato normativo do shopping funcionará como convenção
condominial. Na prática, porém, com maior frequência o administrador ou
empreendedor mantém a propriedade de todo o imóvel, dando as lojas em
locação ou a outro título.


1.7.4 Clubes de campo


Outra nova forma são os clubes de campo.
Clube de campo (em inglês country club) é um clube privado que
oferece uma variedade de facilidades esportivas e recreacionais, normalmente
localizado nas redondezas de uma cidade ou em áreas rurais. Os esportes
praticados mais comuns são tênis, golfe e pólo.
Nos clube de campo, quando se alienam imóveis residenciais em seu
interior, também se estabelece um condomínio, a exemplo dos loteamentos
fechados. A ideia ao se organizar um clube de campo nessas condições é que
cada membro seja proprietário de um lote e possua em condomínio áreas
comuns, desfrutando de serviços complementares. Há um complexo condominial
em que se chamarão à colação princípios de fração ideal de terreno, direitos de
vizinhança, regulamentos internos e convenções, etc.


1.7.5 Cemitérios privados


Outro fenômeno moderno é a existência de cemitérios privados.
Entende-se que os contratos concessivos do uso de sepulcros ou jus sepulchri
(direito à sepultura) poderão possuir natureza real apenas se assim for
considerado pela lei. A relação entre o administrador e titular do terreno do
cemitério e o adquirente de espaço para sepultura é de locação ou comodato,
entretanto, existem, nesse fenômeno, situações de direito condominial.
Conforme menciona SÍLVIO DE SALVO VENOSA, a tendência será a
ampliação do numerus clausus dos direitos reais, para permitir a adequação
social dessas novas formas de utilização da coisa imóvel.[62]











CAPÍTULO II – CONDOMÍNIO
TRADICIONAL, GERAL OU
COMUM

2.1 DEFINIÇÃO DE CONDOMÍNIO TRADICIONAL,
GERAL OU COMUM


CLÓVIS BEVILÁQUA menciona que “o condomínio ou
compropriedade é a forma anormal da propriedade, em que o sujeito do direito
não é um indivíduo, que o exerça com exclusão dos outros; são dois ou mais
sujeitos, que exercem o direito simultaneamente”.[63] A esta modalidade de
condomínio o Código Civil brasileiro de 2002 designa por condomínio geral.
O condomínio ou copropriedade, também chamado compropriedade
pelo Código Civil português, foi identificado como propriedade plural por
HENRI DE PAGE, que a definiu como l’ attribution de la propriété d’ um même
bien à plusiurs personnes á la fois (“a atribuição da propriedade de um mesmo
bem à várias pessoas ao mesmo tempo”).[64]
Vale destacar que o poder de disposição sobre a coisa se materializa
simultaneamente em várias pessoas, e se encontra reciprocamente limitado no
exercício dos direitos concorrentes, compensando-se as vantagens e sacrifícios
dos condôminos. Visto conforme o seu aspecto objetivo, o condomínio ou
copropriedade caracteriza-se mesmo pela indivisão da coisa comum,
correspondendo ao estado em que se encontra uma coisa sobre a qual várias
pessoas têm direitos concorrentes. Já no aspecto subjetivo, o condomínio ou
copropriedade caracteriza-se por ser essencialmente comunhão entre duas ou
mais pessoas.
Comunhão pro diviso só existe de direito, não de fato, pois cada
condômino se localiza numa parte certa e determinada da coisa. Exercem sobre
um fatia ou fração concreta todos os atos de proprietário singular. Comunhão pro
indiviso é a que perdura de fato e de direito, permanecendo a coisa em estado de
indivisão perante os condôminos, e estes não se localizam, per se, na coisa.
Vale destacar que o condomínio tradicional, geral ou comum é aquele
disciplinado pelos arts. 1.314 a 1.330 do Código Civil brasileiro de 2002, se
caracterizando, em suma, na situação jurídica em que uma determinada coisa
indivisa tem 2 (dois) ou mais proprietários (podendo ser pessoas físicas ou
jurídicas) em comum, sendo que todos os condôminos têm direitos
qualitativamente iguais sobre a totalidade do bem, sofrendo limitações na
proporção qualitativa. Por sinal, LEANDRA SANTANA DE OLIVEIRA e
MARCO ANTÔNIO SILVA SOUZA lembram que a expressão
“qualitativamente iguais” quer dizer que, junto a terceiros, cada condômino pode
exercitar o direito de propriedade em igualdade de condições com os demais,
reivindicando a coisa em poder de terceiro. O elemento qualitativo, no caso, diz
respeito à parte pertencente, individualmente, aos condomínios, ou seja, todos
possuem cotas ideais sobre o objeto da propriedade. Contudo, o elemento
qualitativo não tem importância perante terceiros, sendo relevante apenas
internamente, entre os condôminos para efeito de partilha dos frutos e das
despesas e, ainda, na hipótese de extinção da copropriedade, quando então não
se terá a divisão do direito, que é uno, mas de seu objeto.[65]
Mas não se pode perder de vista que os condomínios, por um lado, são
qualitativamente iguais e, por outro, quantitativamente diferentes.
Quantitativamente diferente porque cada um dos condôminos tem sua cota-parte,
ou fração ideal. Apesar de quantitativamente diferente, eles exercem o mesmo
direito; por isso que são qualitativamente iguais.
Portanto, quando os direitos elementares do proprietário pertencerem a
mais de um titular, existirá o condomínio tradicional, geral ou comum de um
determinado bem, devendo os respectivos condôminos se submeter às regras de
utilização da coisa comum previstas no Código Civil de 2002. De maneira que o
condomínio tradicional, geral ou comum caracteriza-se pela multiplicidade de
sujeitos e unicidade do objeto.
O condomínio é, na realidade, uma exceção à regra pela qual toda
propriedade é exclusiva (art. 1.231 do Código Civil de 2002).[66] O condomínio
também impede o exercício pleno da propriedade. Em outras palavras, trata-se
de um limite ao direito de propriedade, pois embora cada condômino possa usar
a coisa toda (caput do art. 1.314 do Código Civil de 2002), é preciso respeitar a
vontade dos outros condôminos (parágrafo único do art. 1314 do Código Civil
de 2002). No entanto, não há nenhuma infringência ao caráter exclusivista da
propriedade (característica da propriedade). O condomínio tradicional, geral ou
comum mantém a exclusividade, só que essa exclusividade é exercida por 2
(duas) ou mais pessoas, como, por exemplo, no casamento ou na união estável (a
partir do regime de bens passam a ter o condomínio tradicional, geral ou comum
dos bens que pertence a meação) e, também, na sucessão hereditária (onde há
condomínio tradicional, geral ou comum entre todos os herdeiros).
De maneira que, no condomínio tradicional, geral ou comum (voluntário
e necessário) existem temos mais de um sujeito ativo, que são os proprietários,
exercendo o domínio sobre um mesmo objeto, móvel ou imóvel, divisível ou
indivisível (por exemplo, carro, barco, casa, roupa, apartamento, fazenda,
terreno, etc.). Ou seja, o direito subjetivo da propriedade é constituído por 2
(duas) ou mais pessoas, físicas ou jurídicas. De maneira que, se por um lado a lei
permite o condomínio, por outro criou uma ficção jurídica, de modo que cada
condomínio, na verdade, só é dono de uma fração ideal, de uma cota [por
exemplo, 50% (cinquenta por cento) se são 2 (dois) donos; 33% (trinta e três por
cento) se são 3 (três) donos; ou 30% (trinta por cento) pra um e 70% (setenta por
cento) pra outro; etc.]. Embora cada um seja dono de uma cota, para viabilizar o
condomínio cada um deles pode usar a coisa toda (art. 1.314 do Código Civil de
2002).
A esse respeito, PAULO NADER esclarece que, na linguagem do
Código Civil brasileiro de 2002, o vocábulo condomínio é um termo análogo,
pois apresenta 2 (dois) sentidos e ao mesmo tempo afins. Na acepção ampla,
indica que um objeto possui mais de um proprietário. Dá-se na hipótese, por
exemplo, quando duas ou mais pessoas herdam um casa ou compram o mesmo
computador. Existe, igualmente, no acervo de bens pertencentes a pessoas
casadas no regime de comunhão universal de bens. O objeto pode ser a coisa
móvel ou imóvel, divisível ou indivisível.[67] Podemos dizer, assim, que, sob o
ponto de vista subjetivo (em relação aos sujeitos) há uma comunhão, mas, sob o
ponto de vista objetivo há uma indivisão.
Não há menor dúvida de que o condomínio tradicional, geral ou comum
se trata de uma propriedade simultânea e concorrente, de modo que todos são
donos ao mesmo tempo (por isso é simultânea), e todos podem usar a coisa toda
(por isso é concorrente), dentro dos limites da convivência pacifica. Muitas
vezes esta harmonia é dificílima, tanto que os antigos romanos alegavam que o
condominium est mater discordiarum (“o condomínio é a mãe das discórdias”)
ou que a communio mater rixarum (“a comunhão é mãe das brigas”),[68] e a
realidade revela a exatidão desta expressão romana. É muito difícil dividir um
carro ou uma roupa com um irmão: muitas vezes o condomínio é inviável. Um
direito amplo, complexo e importante como a propriedade muitas vezes não
pode ser exercido harmoniosamente por mais de uma pessoa sobre a mesma
coisa. Exatamente por isso que lei permite a extinção do condomínio: communio
solet discordias excitare, nemoque ideo cogitur in communione persistire (“a
comunhão costuma excitar discórdias, e, portanto, ninguém é obrigado a persistir
nela”).
Visto isto, podemos dizer que as características fundamentais do
condomínio tradicional, geral ou comum são as seguintes: 1) indivisibilidade de
seu exercício: característica que se manifesta pela possibilidade de existência de
cotas ideais desiguais e, não obstante, a coisa se mantém una e indivisa, de sorte
que possam todos os condôminos, quaisquer que sejam as suas cotas ideais, ter,
de igual modo, o exercício de seu direito sobre todos os fragmentos da coisa. Daí
o condomínio tradicional, geral ou comum chamar-se pro indiviso. Isso significa
que o condômino de cota ideal a mais reduzida tem, quanto ao exercício, o
mesmo direito que o condômino de cota ideal mais elevada; 2) divisibilidade
quanto à sua extinção: o condomínio tradicional, geral ou comum é temporário.
Tal se revela como um ponto marcante de sua caracterização. Concerne em ter
cada condômino o arbítrio de promover a extinção do condomínio a qualquer
tempo. É o direito assegurado a cada um de retirar-se da comunhão no instante
em que quiser.


2.2 ESPÉCIES DE CONDOMINIO TRADICIONAL,
GERAL OU COMUM


O condomínio tradicional, geral ou comum é classificado pela legislação
brasileira como: 1) condomínio voluntário ou convencional (arts. 1.314 e
seguintes do Código Civil de 2002); e 2) condomínio necessário, legal, fortuito
ou forçado (arts. 1.327 e seguintes do Código Civil de 2002).
A comunhão voluntária ou convencional é de origem negocial tal como
a aquisição, doação e destinação em comum de bem para 2 (duas) ou mais
pessoas podem estas usá-lo e fruí-lo. O casamento em regime de comunhão
universal de bens a estabelece e provoca a conversão da propriedade individual
de um dos cônjuges em condomínio. Há na nossa sistemática jurídica diferenças
marcantes entre o sistema de comunhão e o sistema de condomínio. Embora que,
em nosso direito de família, sobrevivam resquícios do conceito de condomínio
germânico, que prevê a comunhão universal dos bens existentes entre os
cônjuges. Enquanto que a comunhão legal divide-se didaticamente em
comunhão forçada e comunhão fortuita. A forçada resultante de inevitável
estado de indivisão dos bens quer por imposição da ordem jurídica (como por
exemplo, o módulo rural) quer por cercas e muros. Por sinal, a comunhão legal
pode ser passageira ou perene. No primeiro caso a lei tem razões pragmáticas
para defender, o tempo todo, sua extinção. Será permanente enquanto sobreviver
a causa.


2.3 CONDOMINIO VOLUNTÁRIO OU
CONVENCIONAL


2.3.1 Conceito de condomínio voluntário ou convencional


PAULO NADER define condomínio voluntário ou convencional como
aquele que se forma espontaneamente e instaura-se, por exemplo, quando 2
(duas) ou mais pessoas compram coisa móvel ou imóvel ou alguém aliena fração
ideal de um objeto.[69] Portanto é aquele no qual 2 (duas) ou mais pessoas
adquirem um mesmo bem, devendo, então, ser baseado na vontade das partes.
Portanto, estamos diante de um condomínio voluntário ou convencional
quando 2 (duas) ou mais pessoas [multiplicidade de sujeitos] adquirem 1 (um)
mesmo bem [unicidade do objeto], ou quando 2 (duas) ou mais pessoas exercem
composse e todas adquirem a propriedade da coisa pela usucapião. De maneira
que o condomínio será voluntário ou convencional quando formado pela vontade
das partes (como por exemplo, regime de bens escolhido pelo casal). Portanto,
ocorre a voluntariedade no condomínio geral quando duas ou mais pessoas
decidem, por livre deliberação de vontade, se tornar proprietários comuns de
uma mesma coisa ou bem a fim de usar e fruir tal coisa. Justamente por seu
caráter voluntário é que assim quiseram as partes criar, usufruir, dispor e
reivindicar o bem ou objeto de acordo com as suas vontades deliberadas, sem
que agente externo os obrigassem a isso. Igualmente, a duração do condomínio
voluntário será enquanto as partes quiserem mantê-lo.


2.3.2 Regras gerais do condomínio voluntário ou convencional


Inicialmente é importante fazer uma pequena abordagem a respeito do
regime que deve prevalecer no condomínio voluntário ou convencional,
principalmente para definir os direitos e obrigações próprios de tal situação de
comunhão. Antes de qualquer outa coisa, para definir tais direitos e obrigações e
essencial a noção exata de parte ideal ou quota-parte.
Como vimos no capítulo 1, parte ideal ou quota-parte é a fração que, na
coisa indivisa, corresponde a cada condômino. Portanto, há justaposição de
direitos de propriedade sobre cotas abstratas.[70] No entanto, como bem
esclarece o professor da Universidade de Bruxelas e de Gand, RENÉ
DEKKERS, cada proprietário pode se dizer dono, por sua parte, da coisa
comum, na sua integralidade. Seu direito não se circunscreve, com efeito, à
fração ideal. Estende-se a toda a coisa.[71] De maneira que, os condôminos têm
direitos e deveres sobre sua parte ideal ou quota-parte e sobre a coisa comum.
Cada condômino tem, pois, disposição material in solidum [por inteiro, por
todos] e pro parte [por sua parte].
Visto isto, podemos dizer que o condomínio voluntário ou convencional
se norteia pelas seguintes regras gerais: a) cada condômino exerce seu direito de
propriedade sobre a coisa toda, delimitado, naturalmente, por igual direito dos
demais condôminos (caput do art. 1.314 do Código Civil de 2002). Em outras
palavras, sobre a parte ideal ou quota-parte, pode o condômino comportar-se
como proprietário exclusivo, independentemente, por conseguinte, do
consentimento dos outros condôminos; b) a todos pertence a utilidade econômica
da coisa (caput do art. 1.314 do Código Civil de 2002), ou seja, cada condômino
pode usar e fruir a coisa comum sem lhe mudar a destinação e sem ferir o igual
direito dos outros condôminos; c) o direito de cada condômino, em face de
terceiros, abrange a totalidade dos poderes referentes ao direito de propriedade.
Assim, o condômino, ainda que minoritário, pode mover ação de despejo contra
um inquilino, mesmo ante a omissão ou declarada oposição dos demais. O
condômino só pode reivindicar o imóvel contra terceiro e não contra os demais
condôminos (caput do art. 1.314 do Código Civil de 2002); d) cada condômino
tem seu direito delimitado pelo dos outros, na medida de suas quotas (art. 1.315
do Código Civil de 2002);[72] e) as quotas-parte ideais são apenas elementos
aferidos do valor econômico pertencem a cada condômino, para que possa dispor
da coisa (art. 1.315 do Código Civil de 2002).


2.3.3 Direitos dos condôminos no condomínio voluntário ou convencional


Nas relações internas, os direitos dos condôminos estão limitados
quantitativamente, pois a sua extensão depende da cota parte ou fração ideal do
respectivo condômino sobre o bem comum. A propósito, é importante destacar
que a fração ideal é a expressão da medida do aproveitamento econômico de
cada um dos condôminos.
Em assim sendo, no condomínio voluntário ou convencional, os
condôminos possuem os seguintes direitos: a) direito de usar livremente da coisa
conforme sua destinação ou utilização prática e sobre ela exercer todos os
direitos compatíveis com a indivisão, desde que não impeça que os demais
condôminos possam também exercer seus direitos sobre ela (caput do art. 1.314
do Código Civil de 2002); b) direito de reivindicá-la de terceiros (jus
vindicandi) e defender sua posse contra outrem (outro condômino ou terceiro)
que venha a turbá-la ou esbulhá-la, recorrendo aos interditos possessórios; c)
direito de alienar a respectiva parte indivisa, respeitando o direito de
preferência dos demais consortes (art. 1.322 do Código Civil de 2002).[73]; d)
direito de gravar de ônus real a parte indivisa, haja vista que cada condômino
tem o direito de gravar a parte ideal, se indivisível for a coisa (caput do art.
1.314 do Código Civil de 2002); e e) direito de a qualquer tempo requerer a
divisão da coisa comum (art. 1.320 do Código Civil de 2002).[74]


2.3.3.1 Direito de usar a coisa comum


Há de se esclarecer que não é verdade que o condômino pode usar
livremente da coisa. Ao contrário, o condômino tem de se resignar com a
deliberação da maioria e assim não gozar da liberdade apregoada pelo legislador.
Portanto, caso seja respeitada a finalidade e natureza da coisa comum,
cada condômino exerce seu direito como um todo, independentemente de sua
cota. Vale ressaltar a importância de se respeitas a destinação do bem comum..
Assim, cada condômino encontra-se sujeito a limitações à faculdade de
uso e fruição da coisa comum, visto que tais poderes não atendem somente o
interesse de uma pessoa, mas sim a de todos os condôminos. As restrições que a
lei impõe à faculdade de uso e fruição da coisa comum são as seguintes: a)
utilização da coisa comum segundo a sua destinação: um determinado bem
comum, como uma fazenda, pode ser utilizada para os mais diversos fins. Tal
bem pode se destinar, por exemplo, à cultura, à criação de gado ou à indústria,
mas o que vai determinar a destinação de tal bem é a vontade da maioria dos
condôminos. É, portanto, neste sentido que se deve entender a restrição da
utilização da coisa comum segundo a sua destinação. O condômino não pode
utilizar o bem comum para fins diversos da destinação definida pela maioria dos
condôminos (para moradia, para empréstimo, para locação, para comércio, etc.).
De maneira que a destinação do bem comum deve ser, necessariamente, decidida
por maioria das quotas-partes dos condôminos, sendo que, de acordo com o
parágrafo único do art. 1.314 do Código Civil de 2002, um dos condôminos não
pode alterar, de modo algum, a destinação da coisa, sem a anuência dos demais
condôminos, ou seja, sem a deliberação deve ser unânime. Isso pode, como
advertem CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON ROSENVALD,
representar um “entrave à funcionalização da propriedade, pois o titular de
pequena fração ideal da coisa poderá impedir a concessão de uma destinação
viável ao imóvel por um terceiro, por exemplo, ao discordar da formulação do
direito de superfície”.[75] LUDOVICO BARASSI cita ainda como exemplo, o
caso de um terreno que comporta várias aplicações, podendo ser alugado,
cultivado ou reservado à pastagem; se os condôminos, em maioria, resolvem
destiná-lo à cultura, não pode um deles, manifestando-se em dissidência, exigir
que sua parte seja aplicada na invernagem de gado. Neste fato reside, sem
dúvida, a debilidade do condomínio, pois o condômino sabe que a vontade dos
demais pode decidir soberanamente sobre a destinação da coisa. Portanto, o
condômino pode usar a coisa, de acordo com sua destinação e de modo a não
impedir que os demais condôminos se utilizem também de seus direitos; o
direito de um tem de se afeiçoar ao direito dos demais condôminos, de forma a
não excluí-los ou a não prejudicá-los.[76] b) concessão de posse, uso ou gozo do
bem a terceiros: outra limitação às faculdades de uso e fruição é a de que a
concessão de posse, uso ou gozo do bem a terceiros também depende de
consenso dos demais titulares. Assim, o condômino não pode, sem autorização
dos demais titulares, celebrar contrato de locação, comodato, ou instituir direitos
reais de fruição como o usufruto e a superfície sobre o bem. Entretanto, tal
restrição não se aplica ao condomínio pro diviso, uma vez que nesta modalidade,
como visto, o espaço de atuação do condômino está devidamente delimitado,
não havendo razões para se exigir autorização dos demais; c) exercício de todos
os direitos compatíveis com a indivisão: essa restrição reforça a anterior, no
sentido de condicionar o exercício dos direitos à realização do objetivo comum
dos condôminos; d) restrições em relação aos frutos: o exercício do poder de
fruição permite que o proprietário possa extrair as utilidades renováveis do bem
principal, isto é, os frutos, assim como permite a extração dos produtos –
utilidades não renováveis. No entanto, existem regras específicas no condomínio
que regulam o aproveitamento e a divisão desses frutos e produtos entre os
condôminos. A primeira regra é a de que o condômino responde aos outros pelos
frutos que recebeu da coisa (art. 1.319 do Código Civil de 2002). Por exemplo, a
hipótese de um ex-casal que aguarda o julgamento de uma ação divórcio
litigioso, na qual está pendente a partilha definitiva de bens. Neste caso, o ex-
cônjuge que permaneceu com a posse direta de um imóvel e recebeu os alugueis
deve restituir ao outro o valor correspondente a 50% (cinquenta por cento) dos
rendimentos auferidos. Da mesma forma, se um imóvel for arrendado, os frutos
civis (alugueis) serão repartidos entre os demais condôminos, na falta de
estipulação contrária ou disposição de última vontade, na proporção do quinhão
de cada um. Se os quinhões não foram especificados, entende-se que são iguais.
Entretanto, que tais regras também não se aplicam na hipótese de condomínio
pro diviso.

“Direito civil. Família. Recurso especial. Ação de cobrança de
indenização entre ex-cônjuges, em decorrência do uso exclusivo
de imóvel ainda não partilhado. Estado de condomínio.
Indenização correspondente a metade do valor da renda de
estimado aluguel, diante da fruição exclusiva do bem comum por
um dos condôminos. Concorrência de ambos os condôminos nas
despesas de conservação da coisa e nos ônus a que estiver sujeita.
Possível dedução. Arts. 1.319 e 1.315 do CC/02. - Com a
separação do casal cessa a comunhão de bens, de modo que,
embora ainda não operada a partilha do patrimônio comum do
casal, é facultado a um dos ex-cônjuges exigir do outro, que
estiver na posse e uso exclusivos de determinado imóvel, a título
de indenização, parcela correspondente à metade da renda de um
presumido aluguel, devida a partir da citação. - Enquanto não
dividido o imóvel, a propriedade do casal sobre o bem
remanesce, sob as regras que regem o instituto do condomínio,
notadamente aquela que estabelece que cada condômino
responde aos outros pelos frutos que percebeu da coisa, nos
termos do art. 1.319 do CC/02. Assim, se apenas um dos
condôminos reside no imóvel, abre-se a via da indenização
àquele que se encontra privado da fruição da coisa. - Subsiste, em
igual medida, a obrigação de ambos os condôminos, na
proporção de cada parte, de concorrer para as despesas inerentes
à manutenção da coisa, o que engloba os gastos resultantes da
necessária regularização do imóvel junto aos órgãos competentes,
dos impostos, taxas e encargos que porventura onerem o bem,
além, é claro, da obrigação de promover a sua venda, para que se
ultime a partilha, nos termos em que formulado o acordo entre as
partes. Inteligência do art. 1.315 do CC/02. Recurso especial
parcialmente provido”.[77]

Chama-se a atenção para o fato de, se se tratar de prédio urbano, pode
um dos condôminos ocupá-lo para a sua moradia. Em tais casos discute-se se os
demais condôminos podem ou não exigir-lhe aluguel; a questão tem sido
solucionada de modo contraditório, mas predomina o entendimento no sentido
de que aquele que foi residir em prédio comum obrigado é a pagar aluguel aos
demais condôminos;[78]
Outra questão reside no caso de o prédio comum estar alugado para
terceira pessoa e um dos condôminos pedir para uso próprio, promovendo o
despejo do inquilino; em tais casos, o entendimento predominante é no sentido
de que a retomada pode ser feita sem anuência dos demais condôminos, mas
implica no pagamento de aluguel para os demais condôminos que se privaram da
utilização da coisa.[79]
Finalmente, acrescentamos que um dos condôminos pode perfeitamente
exigir que o vizinho da coisa comum faça determinada obra de reparação em seu
prédio.[80]


2.3.3.2 Direito de reivindicar a coisa comum de terceiros


O direito de reivindicar a coisa comum de terceiros é inerente ao
exercício do direito de propriedade em comunhão. É a reivindicatio. Quer dizer,
reaver de quem quer que a possua ou detenha, injustamente. Até mesmo porque
este poder individual resulta, provavelmente, em benefício de todos. A
possibilidade de manejo da ação reivindicatória decorre, pois, da previsão do art.
1.314 do Código Civil de 2002, que permite ao condômino reivindicar a coisa de
terceiro.
Tanto doutrina como jurisprudência sustenta que o condômino pode
lançar mão das ações possessórias contra outros condôminos, desde que exerça
posse pro diviso; mas não terá direito de propor ação reivindicatória para haver
qualquer excesso porventura ocupado por outro condômino na coisa comum.
Portanto, o condômino não pode reivindicar a coisa de outro condômino, pois
este a detém justamente, consigo, e tem o direito de usar a coisa comum. Com
efeito não pode figurar no pólo passivo da ação reivindicatória algum outro
condômino, vez que a ação petitória é a ação específica do proprietário não
possuidor contra o possuidor não proprietário.
Por outro lado, a ação cabível entre condôminos é a ação de
reintegração de posse. De fato, as ações possessórias podem ser propostas contra
condômino, para que ele cesse com a turbação. Lembramos que turbação é o ato
de perturbar, embaraçar, por em desordem, agitar; é o impedimento ilegal do
livre exercício dos direitos alheios. Assim, turbação da posse é, segundo
ORLANDO GOMES DOS SANTOS, o “ato que embaraça o livre e normal
exercício da posse, haja ou não dano, tenha ou não o turbador melhor direito
sobre a coisa, haja, ou não, dano, tenha o turbador, ou não, melhor direito sobre a
coisa”;[81] igualmente, segundo MARIA HELENA DINIZ , é o “ato ilegítimo que
estorva o exercício da posse e dá o direito ao possuidor turbado de propor a ação
de manutenção de posse”.[82]

“CIVIL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. ÁREA COMUM.
CONDOMÍNIO. NÃO CABIMENTO. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. 1. O
condomínio, representado pelo síndico, tem legitimidade para
propor ação reivindicatória em defesa da área comum contra
terceiro, mas não contra outro condômino, conforme dispõe o
artigo 623, II, do Código Civil de 1916. 2. Malgrado a tese de
dissídio jurisprudencial, há necessidade, diante das normas legais
regentes da matéria (art. 541, parágrafo único, do CPC c/c art.
255 do RISTJ), de confronto, que não se satisfaz com a simples
transcrição de ementas, entre trechos do acórdão recorrido e das
decisões apontadas como divergentes, mencionando-se as
circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos
confrontados. Ausente a demonstração analítica do dissenso,
incide a censura da súmula 284 do Supremo Tribunal Federal. 3.
Recurso especial não conhecido”.[83]

Portanto, tais ações intentadas por um dos consortes versarão sobre todo
o imóvel indiviso e não somente sobre a fração ideal daquele que as move. Da
mesma forma a sentença aproveitará a todos os comunheiros e não apenas ao
autor. Cada condômino poderá reivindicar de terceiro todo o bem indiviso e não
apenas a sua fração ideal, independentemente, sem a anuência dos demais
consortes e até mesmo contra a vontade destes (caput do art. 1.314 do Código
Civil de 2002).

“RECURSO ESPECIAL - AÇÃO REIVINDICATÓRIA -
TUTELA DE BEM DEIXADO PELO DE CUJUS - PARTILHA
AINDA NÃO VERIFICADA - CO-HERDEIRO -
LEGITIMIDADE ATIVA RECONHECIDA - RECURSO
ESPECIAL PROVIDO. 1. Sendo a herança uma universalidade,
é de rigor reconhecer-se que sobre ela os herdeiros detêm frações
ideais não individualizadas, pois, até a partilha. 2. Aberta a
sucessão, cria-se um condomínio pro indiviso sobre o acervo
hereditário, regendo-se o direito dos co-herdeiros, quanto à
propriedade e posse da herança, pelas normas relativas ao
condomínio (artigo 1791, parágrafo único, do Código Civil). 3.
Tal como ocorre em relação a um condômino, ao co-herdeiro é
dada a legitimidade ad causam para reivindicar,
independentemente da formação de litisconsórcio com os demais
co-herdeiros, a coisa comum que esteja indevidamente em poder
de terceiro, nos moldes no artigo 1314 da lei civil. 4. O disposto
no artigo 12, V, do Código de Processo Civil não exclui, nas
hipóteses em que ainda não se verificou a partilha, a legitimidade
de cada herdeiro vindicar em juízo os bens recebidos a título de
herança, porquanto, in casu, trata-se de legitimação concorrente.
5. Recurso especial provido”.[84]


2.3.3.3 Direito de alienar a parte indivisa


Inicialmente, esclarecemos que o poder de disposição compreende todos
os atos de alteração material ou jurídica da coisa. Por alteração material
entendem-se os atos que impliquem a destruição da substância da coisa, como o
ato de consumo, e a alteração jurídica, quando parcial, importa na instituição de
um gravame (ônus real) sobre o bem, e quanto total, representa mudança da
própria titularidade, como se dá na alienação inter vivos. Especificamente em
relação ao poder de disposição jurídica total (por exemplo, alienação onerosa
por ato inter vivos) ou poder de disposição jurídica parcial (por exemplo,
instituição de hipoteca) da coisa, não há restrições ao exercício deste direito,
que, portanto, pode ser transferido independentemente da autorização dos
demais condôminos (parte final do caput do art. 1.314 do código Civil de 2002).
Portanto, o condômino pode livremente alhear (alienar) ou gravar de ônus real a
sua fração ideal a terceiros. Observa-se que a liberdade é quanto à alienação da
fração ideal, o que significa, a contrario sensu, que o condomínio não poderá
alienar o todo sem autorização dos demais. Se isto acontecer, ter-se-á uma
hipótese de ineficácia relativa do negócio jurídico em relação aos demais
condôminos – venda a non domino.
De fato, o art. 1.314 do Código Civil de 2002 permite que cada
condômino possa sozinho alhear sua parte indivisa sem o consentimento dos
demais. Não há como os demais consortes impedirem a venda da fração ideal.
No entanto, se, por um lado, cada condômino tem o direito de alienar a
respectiva parte indivisa (quota-parte), por outro, deve ser respeitando, porém, o
direito de preferência dos demais consortes. Ou seja, o condômino que pretende
alienar a sua parte na coisa comum precisar, antes, oferecer aos demais
condôminos. Este é o exercício de preferência ou preempção.

“AÇÃO DE PREFERÊNCIA - RENÚNCIA DE USUFRUTO
EM FAVOR DE CO-PROPRIETÁRIOS - AUSÊNCIA DE
ALIENAÇÃO DE QUINHÃO - ARTIGO 504 DO CÓDIGO
CIVIL - CARÊNCIA DE AÇÃO O artigo 504 do Código Civil é
aplicável na hipótese de venda de quinhão a terceiros estranhos,
não se enquadrando neste dispositivo a renúncia de usufruto em
favor de co-proprietários”.[85]

Desta maneira um tabelião de notas não pode lavrar escritura pública de
compra e venda de parte ideal de imóvel indivisível em que o alienante seja um
dos condôminos, sem obter o consentimento dos demais.

“APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE PEREMPÇÃO - VENDA DE
PARCELA IDEAL CORRESPONDENTE A 50% DE BEM
IMÓVEL RURAL - AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO
CONDÔMINO PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO DE
PREFERÊNCIA - RELAÇÃO CONDOMINIAL PRO
INDIVISO QUE NÃO SUGERE A INDIVISIBILIDADE DO
BEM - INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 504 DO CÓDIGO
CIVIL - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO”.[86]

“AÇÃO ANULATÓRIA - DIREITO DE PREFERÊNCIA -
CONDOMÍNIO - ALIENAÇÃO DE PARTE DO IMÓVEL -
AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO CONDÔMINO - ARTIGO
504 DO CÓDIGO CIVIL - DEPÓSITO DO PREÇO -
ANULAÇÃO DO NEGÓCIO - TRANSMISSÃO DO BEM AO
CONSORTE. Encontrando-se o bem em estado de indivisão, o
condômino que desejar alienar sua fração ideal do condomínio
deve obrigatoriamente notificar os demais condôminos para que
possam exercer o direito de preferência na aquisição, nos termos
do art. 504 do Código Civil. O condômino que não teve a
oportunidade de exercer o direito de preferência poderá fazê-lo
após a alienação do imóvel, depositando o preço e havendo para
si a parte vendida sem seu conhecimento”.[87]

Com efeito, o caput do art. 504 do Código Civil de 2002,[88] o qual tem
redação idêntica à do Código Civil de 1.916, prescreve que não pode um
condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte
a quiser, tanto por tanto. Se vender para terceiro e não oferecer para os demais
condôminos, qualquer destes pode depositar, nos primeiros 180 (cento e oitenta)
dias, o valor pactuado, e o negócio será desfeito. Isto porque o mesmo
dispositivo legal estabelece que o condômino, a quem não se der conhecimento
da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos,
se o requerer no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de decadência.

“RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE
NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO c/c ADJUDICAÇÃO
DE FRAÇÃO IDEAL DE IMÓVEL - CESSÃO DE QUOTA
PARTE A CONDÔMINO - ACÓRDÃO DO TRIBUNAL
ESTADUAL QUE, AO REFORMAR A SENTENÇA, ADOTA
ENTENDIMENTO DE QUE A PREEMPÇÃO DEVE SER
OBSERVADA TANTO PARA ALIENAÇÃO A ESTRANHOS
QUANTO A COMUNHEIROS - INTERPRETAÇÃO DO
DISPOSTO NO ARTIGO 504 DO CÓDIGO CIVIL.
INSURGÊNCIA DO RÉU. DIREITO DE PREFERÊNCIA -
INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA - INAPLICABILIDADE
QUANDO SE TRATA DE NEGÓCIO JURÍDICO REALIZADO
ENTRE CONDÔMINOS. Hipótese: demanda visando à
declaração de nulidade de alienação de fração ideal a condômino,
ante o fundamento de inobservância ao direito de prelação dos
demais consortes. Tribunal a quo que, ao reformar a sentença de
improcedência, acolhe a pretensão veiculada na inicial, a fim de
declarar nula a cessão de quota parte do imóvel objeto da
demanda, assegurando aos autores o direito à aquisição do bem.
1. O direito legal de preferência atribuído aos condôminos de
bem indivisível (ou não dividido), nos termos do artigo 504 do
Código Civil, tem por escopo precípuo o de impedir o ingresso
de terceiros estranhos à comunhão, ante o potencial conflituoso
inerente a essa forma anômala de propriedade. 2. A
alienação/cessão de frações ideais entre condôminos refoge à
finalidade intrínseca ao direito de preferência, uma vez que não
se trata de hipótese de ingresso de terceiro/estranho à comunhão,
mas de manutenção dos consortes (à exceção daquele que alienou
integralmente a sua parcela), apenas com alterações no
percentual da parte ideal daquele que adquiriu a parte de outrem.
3. Inaplicabilidade dos artigos 1.322 do Código Civil e 1.118 do
Código de Processo Civil, visto que não instituem qualquer
direito de prelação, mas, tão-somente, os critérios a serem
adotados em caso de extinção do condomínio pela alienação da
coisa comum. Ademais, tratando-se de restrição à liberdade de
contratar, o instituto em comento - direito de preferência - deve
ser interpretado de forma restritiva. Assim, se a lei de regência -
artigo 504 - apenas o institui em relação às alienações a
estranhos, não cabe ao intérprete, extensivamente, aplicar tal
norma aos casos de compra e venda entre consortes. 4.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO, a fim de julgar
improcedentes os pedidos veiculados na inicial, restabelecendo-
se a sentença”.[89]

Não se pode perder de vista que o referido art. 504 do Código Civil de
2002 regulamenta o direito de preferência do condômino na aquisição do bem
indivisível. De maneira que a venda feita pelo condômino a estranho com
preterição dos demais só será definitiva após o decurso do prazo de decadência
de 180 (cento e oitenta) dias (contados a partir do momento em que cada
condômino teve conhecimento da venda) se reclamação alguma for apresentada
pelos demais condôminos. Portanto, a alienação, sem respeito à condicionante da
concessão do direito de preferência aos demais condôminos, fica eivada pela
ineficácia relativa, e não pela nulidade. Assim, o condômino traído em seu
direito de preferência tem o prazo de 180 (cento e oitenta) dias (prazo
decadencial) para desconstituir a alienação mediante o exercício potestativo de
depositar idêntico valor praticado àquela época e que fora pago por estranho. O
referido procedimento deve seguir a jurisdição voluntária, conforme o previsto
no inciso IV do art. 725 do Código de Processo Civil de 2015.[90] Vale destacar
que a disposição do art. 504 do Código Civil de 2002 opera distinção sobre a
possibilidade de constituição de ônus reais em bens divisíveis ou indivisíveis,
permitindo-se genericamente a constrição de bens que se encontrem em estado
de indivisão.

“AÇÃO DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO - NULIDADE
DA SENTENÇA - OFENSA AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE
FÍSICA DO JUIZ - PRECLUSÃO PRO JUDICATO - DIREITO
DE PREFERÊNCIA - ARTIGO 504 DO CÓDIGO CIVIL -
DEPÓSITO DO PREÇO NO PRAZO DE CENTO E OITENTA
DIAS - PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO
PROCESSO - INAPLICAÇÃO DO ARTIGO 284, CAPUT, DO
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. - A doutrina e a
jurisprudência pátrias têm proclamado que o principio da
identidade física do juiz não reveste-se de caráter absoluto,
merecendo prioridade os fins instrumentais do Processo Civil. -
Revela-se princípio salutar e comezinho do Direito Processual
Civil a inexistência de preclusão pro judicato ou em desfavor da
parte - temporal, consumativa ou lógica - no que tange ao
conhecimento de matéria de ordem pública, tal qual a
ilegitimidade das partes e demais discussões em torno das
condições da ação e pressupostos processuais e existência e
validade, podendo o interessado arguir estas questões
preliminares em qualquer tempo e grau de jurisdição, ainda que
tenha o magistrado delas conhecido e rejeitado em momento
anterior. - A comprovação de que o depósito do preço foi feito no
prazo de cento e oitenta dias constitui pressuposto de constituição
e desenvolvimento válido e regular do processo, sem o qual não
há como prosperar a ação de preferência de que trata o artigo 504
do Código Civil. - A falta de pressuposto de constituição e
desenvolvimento válido e regular do processo não se insere no
rol dos artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil, como
defeito que possa ser sanado no prazo do artigo 284, caput, do
mesmo diploma legal. Hipótese em que, ademais, o prazo do
artigo 504 do Código Civil é decadencial”.[91]

“APELAÇÃO. DIREITO DE PREFERÊNCIA. Artigo 504 do
Código Civil. PRAZO DECADENCIAL. Termo inicial a contar
do registro imobiliário. Decurso de prazo superior a 180 dias
entre o registro imobiliário e o ajuizamento da demanda. Recurso
improvido”.[92]

“DIREITO CIVIL. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS.
CONDOMÍNIO. INDIVISIBILIDADE. DIREITO DE
PREFERÊNCIA DOS CO-HERDEIROS. ART. 1139 DO
CÓDIGO CIVIL DE 1916 (ART. 504 DO CC EM VIGOR). 1.
"Os co-herdeiros, antes de ultimada a partilha, exercem a com
propriedade sobre os bens que integram o acervo hereditário 'pro-
indiviso', sendo exigível, daquele que pretenda ceder ou alhear
seu(s) quinhão(ões), conferir aos demais oportunidade para o
exercício de preferência na aquisição, nos moldes do que
preceitua o art. 1139, CC" (REsp n. 50.226/BA). 2. O art. 1.139
do Código Civil de 1916 (art. 504 do CC em vigor) não faz
nenhuma distinção entre indivisibilidade real e jurídica para
efeito de assegurar o direito de preferência ali especificado.
Interpretação em sintonia com a norma do art. 633 do mesmo
diploma legal, segundo a qual "nenhum condômino pode, sem
prévio consenso dos outros, dar posse, uso, ou gozo da
propriedade a estranhos" (art. 633). 3. Ao prescrever, do modo
taxativo, a indivisibilidade da herança, assim o fez o legislador
por divisar a necessidade de proteção de interesses específicos da
universalidade ali estabelecida, certamente não menos relevantes
do que os aspectos de ordem meramente prática que poderiam
inviabilizar a divisão física do patrimônio. 4. Recurso especial
provido”.[93]

No entanto, devemos alertar para o fato de que não é pacifico o
entendimento quanto ao inicio da contagem do prazo de decadência, neste caso.
Uma parte da doutrina acha que o termo inicial para a contagem do prazo
decadencial a que se refere o art. 504 do Código Civil de 2002, para o exercício
do direito de preferência, é a data do registro da escritura de compra e venda no
Registro de Imóveis, eis que o registro é que dá publicidade ao ato. Por sinal este
posicionamento está em consonância com o art. 1º da Lei n° 8.935, de
18.11.1994, a qual dispõe que os "serviços notariais e de registro são os de
organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade,
autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos". Por outro lado, há os que
sustentam que o prazo decadencial somente fluirá a partir da ciência inequívoca
pelo condômino preterido na venda do bem indivisível, independentemente de
estar ou não a escritura registrada no Cartório do Registro de Imóveis,
entendimento este ao qual entendemos por bem aderir.
Em relação ao direito de preferência, é importante ainda destacar que,
além da hipótese prevista no art. 504 do Código Civil de 2002, pode ocorrer
também a existência de direito de preferência do locatário ou sublocatário da
coisa em relação àquele que não é condômino, quando em condições iguais a
este último, caso o mesmo não exerça seu direito, ressalvado que é impossível o
exercício do direito de preferência se o contrato de locação não for previamente
averbado junto ao Registro de Imóveis, de acordo com o número 16 do inciso II
do art. 167 da Lei n° 6.015, de 31.12.1973 [“No Registro de Imóveis, além da
matrícula, serão feitos (...) a averbação (...) do contrato de locação, para os fins
de exercício do direito de preferência (...)”].
Por sinal, a Lei do Inquilinato (Lei n° 8.245, de 18.10.1991), ao tratar do
exercício do direito de preferência pelo locatário e pelo sublocatário em relação
ao imóvel locado, ressalva que, em havendo condomínio no imóvel locado, a
preferência do condômino terá prioridade sobre a do locatário e sublocatário.
Com efeito, o seu art. 33 menciona expressamente que “o locatário preterido no
seu direito de preferência poderá reclamar do alienante as perdas e danos ou,
depositando o preço e demais despesas do ato de transferência, haver para si o
imóvel locado, se o requerer no prazo de seis meses, a contar do registro do ato
no Cartório de Imóveis, desde que o contrato de locação esteja averbado pelo
menos trinta dias antes da alienação junto à matrícula do imóvel”.[94]

“APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO ORDINÁRIA
DECLARATÓRIA DE NULIDADE POR SIMULAÇÃO
CUMULADA COM CANCELAMENTO DE REGISTRO
IMOBILIÁRIO CONEXA À AÇÃO DE COBRANÇA DE
ALUGUERES - COPROPRIEDADE ENTRE IRMÃS EM
PARTES IGUAIS - PRELIMINAR ARGUIDA EM
CONTRARRAZÕES - INTEMPESTIVIDADE - NÃO
ACOLHIMENTO.RECURSO DE APELAÇÃO. 1- AÇÃO
DECLARATÓRIA DE NULIDADE POR SIMULAÇÃO
CUMULADA COM CANCELAMENTO DE REGISTRO
IMOBILIÁRIO - FRAÇÃO IDEAL DE IMÓVEL ALIENADA
POR DUAS VEZES - PRIMEIRO AJUSTE - HIGIDEZ -
CONTRATO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA
ATRELADO À PROCURAÇÃO PÚBLICA COM
CONTORNOS DE PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA -
AQUISIÇÃO CONFIGURADA - SEGUNDA COMPRA E
VENDA - SIMULAÇÃO CARACTERIZADA - NEGÓCIO
REALIZADO ENTRE IRMÃOS - COMPRADOR QUE TINHA
CIÊNCIA DA PRIMEIRA AVENÇA E TODAS AS
PARTICULARIDADES QUE A ENVOLVIA -
INTENCIONALIDADE DA SIMULAÇÃO, ACORDO ENTRE
AS PARTES E INTUITO DE PREJUDICAR TERCEIROS
EVIDENCIADOS - DIREITO DE PREFERÊNCIA - ARTIGO
5045 DO CÓDIGO CIVIL - DESATENDIMENTO - ÔNUS
SUCUMBENCIAL - INVERSÃO - VERBA HONORÁRIA
FIXADA SEGUNDO OS DITAMES DOS §§ 3º E 4º, DO
ARTIGO 20 DO CÓDIGO DE PROCESSO CVIL. Tribunal de
Justiça do Estado do ParanáRECURSO DE APELAÇÃO. 2-
SENTENÇA QUE EXTINGUIU O PROCESSO REFERENTE
À AÇÃO DE COBRANÇA DE ALUGUERES POR
AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR - MANUTENÇÃO,
AINDA QUE SOB OUTRO FUNDAMENTO - DECLARAÇÃO
DE NULIDADE DA ESCRITURA PÚBLICA DE VENDA E
COMPRA QUE IMPLICA NO RECONHECIMENTO DA
ILEGITIMIDADE ATIVA - AUTORES QUE NÃO
DEMONSTRARAM SER LOCADORES OU
COPROPRIETÁRIOS DO IMÓVEL. I- Simulação - Indubitável
que a relação de parentesco constitui indício relevante de
simulação. Assim sendo, demonstrando os autos que a Escritura
Pública de Venda e Compra formalizada entre irmãos, sendo que
o comprador possuía, confessadamente, ciência de que a mesma
cota-parte de imóvel havia sido vendida a outra irmã, por meio de
procuração em causa própria, em um interstício de tempo de
pouco mais de um ano, torna imperiosa a declaração de sua
nulidade, uma vez averiguada a intencionalidade da simulação, o
acordo malicioso e de má-fé entre as partes e o intuito de
prejudicar terceiro, na medida em que o ato, indiscutivelmente,
pretendia retirar da esfera patrimonial da primeira compradora o
bem objeto da lide. II- Direito de preferência - O exercício do
direito de preferência disciplinado no artigo 504, Código Civil
corresponde à hipótese de venda da fração-ideal a estranho que,
por sua vez, entende-se como aquele que não é condômino da
coisa, em detrimento dos demais comproprietários. Sua
inobservância, pela parte vendedora, com vistas ao panorama
fático-probatório evidenciado nos autos, denota a sua má-fé e,
por conseguinte, corrobora o entendimento de que a segunda
compra e venda sobre a mesma fração-ideal é simulada. III-
Sucumbência - O acolhimento integral do pedido inicial, em sede
recursal, implica na inversão do ônus sucumbencial distribuído
pelo Juízo primevo. IV- Verba honorária - Em se tratando de ação
de cunho meramente declaratório, a verba honorária a ser fixada
deve ser apreciada equitativamente, nos moldes dos §§ 3º e 4°, do
artigo 20 do Código de Processo Civil. Tribunal de Justiça do
Estado do ParanáV - Da ilegitimidade ativa para cobrança dos
alugueres - O reconhecimento da simulação e a consequente
declaração de nulidade da escritura de venda e compra aniquila a
pretensão de cobrança de alugueres formulada pelos ora
apelantes, considerando que não possuem vínculo algum com o
imóvel objeto da lide. RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDO.
RECURSO DE APELAÇÃO NÃO PROVIDO”.[95]

Em suma, se, por um lado, o condômino tem direito de alienar a parte
indivisa, por outro tem a obrigação de preferência aos demais condôminos. Mas
isto somente quando alguém quiser vender sua cota em coisa comum indivisível.
Com efeito, se a coisa comum é divisível (como, por exemplo, um terreno de
grandes dimensões) não precisa dar essa preferência (art. 504 do Código Civil de
2002). Outrossim, um dos condôminos pode alienar o todo da coisa comum e
indivisível, desde que haja a anuência dos demais condôminos.

“ADJUDICAÇÃO – CONDOMINOS. Aos condominos deve ser
estendido o direito de adjudicação, previsto na cabeça artigo 685-
A do Código de Processo Civil [art. 876 do CPC de 2015].
Inteligência dos artigos 504 do Código Civil c.c. o artigo 1118 do
Código de Processo Civil. RECURSO PROVIDO”.[96]

Por outro lado, conforme destaca CLÓVIS BEVILÁQUA, “não havendo
nenhuma das causas de preferência, o direito igual dos condôminos anula-se
reciprocamente, e a coisa será vendida ao estranho”.[97]


2.3.3.4 Direito de gravar de ônus real a parte indivisa


O §2° do art. 1.420 do Código Civil de 2002 [98] impede veemente que a
coisa comum seja dada em garantia na sua totalidade sem o consentimento de
todos, porém, permite que cada consorte possa dar sua fração ideal em garantia
(penhor, hipoteca ou anticrese), independentemente de sua natureza divisível ou
não.
Com efeito, cada condômino tem, de fato, o direito de gravar com ônus
real a sua quota-parte da coisa indivisível e comum. Como, por exemplo, o
condômino pode dar sua parte em penhora, hipotecá-la, dar em anticrese.

“TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE TERCEIRO. CO-
PROPRIEDADE. PENHORA. BEM INDIVISÍVEL.
POSSIBILIDADE. RESERVA DE VALOR. PREFERÊNCIA.
ARTIGOS 504, DO CÓDIGO CIVIL, E 1.118, DO CPC.
MEAÇÃO. 1. Em se tratando de bem indivisível, deve a penhora
recair sobre a totalidade do bem, sendo garantida, quando da
arrematação, a reserva do valor correspondente à parcela do co-
proprietário. 2. O co-proprietário goza de direito de preferência
na aquisição do bem, nos termos dos artigos 504, do Código
Civil, e 1.118, do CPC, podendo adquirir a parcela pertencente
àquele que promoveu alienação, consolidando o domínio. 3. A
proteção à meação do embargante está prevista no art. 655-B, do
CPC, o qual dispõe que ‘Tratando-se de penhora em bem
indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre
o produto da alienação do bem’”.[99]

Portanto, cada condômino pode, perfeitamente, dar seu quinhão em
hipoteca, mas não pode hipotecar, por exemplo, a propriedade sob condomínio,
em sua totalidade, sem o consenso dos demais coproprietários.
Esse consentimento, por igual, é indispensável, se indivisível a coisa,
porém, se divisível, desnecessária se torna a concordância dos demais
condôminos.


2.3.3.5 Direito a divisão da coisa comum


Há casos em que o condomínio perdura indefinidamente, como, por
exemplo, naqueles de condomínio necessário ou forçado, em que a lei não
permite divisão, ou esta é naturalmente excluída, por ser impossível, como por
exemplo, no caso de prédio indivisível, bem como no de tapumes divisórios,
quando comuns. No entanto, em se tratando de condomínio voluntário ou
convencional, objetivando coisa divisível, é transitório o estado de comunhão e a
qualquer condômino assiste o direito de exigir, a todo tempo, a divisão da coisa
comum.
Como dissemos em outra oportunidade e como destaca WASHINGTON
DE BARROS MONTEIRO, o direito assegurado no art. 1.320 do Código Civil
de 2002 baseia-se na experiência segundo a qual o condomínio, não raras vezes,
é “sementeira de discórdias”. Se não bastasse isto, está sobejamente
demonstrado que a propriedade individual sempre se evidencia mais fecunda e
mais produtiva que a propriedade comum.[100]

“APELAÇÃO – EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO – BEM
INDIVISÍVEL – ALIENAÇÃO JUDICIAL – POSSIBILIDADE
– DIREITO À MORADIA – INAPLICABILIDADE –
PRECLUSÃO TEMPORAL – OCORRÊNCIA. O condômino
poderá requerer, a qualquer tempo, a alienação da coisa comum,
a fim de se repartir o produto na proporção de cada quinhão
quando, por circunstância de fato ou por desacordo, não for
possível o uso e gozo em conjunto do imóvel indivisível,
resguardando-se o direito de preferência contido no art. 1.322 do
Código Civil. O direito a moradia não pode ser invocado para se
manter o condomínio de imóvel. A ausência da vontade de
manter a sociedade condominial é motivo legal para o seu
desfazimento. A inércia do litigante em praticar determinado ato
processual, a tempo e modo, o impede de perfazê-lo em momento
posterior”.[101]

Como visto, a qualquer momento o condômino insatisfeito com a
comunhão pode pedir a divisão ou alienação da coisa (art. 1.320 do Código Civil
de 2002). Esta regra sobre a possibilidade de extinguir o condomínio se justifica
em vista da frequência de discórdias em relação à utilização da coisa comum.
Assim é que se, por exemplo, 4 (quatro) pessoas são proprietárias de uma gleba
de terras e uma delas quiser vender tal coisa, sua vontade vai prevalecer sobre a
dos outros 3 (três) proprietários, e a gleba será vendida para dividir o dinheiro
apurado no negócio, salvo se estes 3 (três) proprietários quiserem comprar a
parte do condômino que quer vender. Igualmente, se 20 (vinte) pessoas têm um
determinado barco de pesca e apenas uma delas quiser vender, sua vontade vai
prevalecer sobre a dos outros 19 (dezenove), e a coisa comum será vendida para
dividir o dinheiro apurado na venda, salvo se estes 19 (dezenove) quiserem
comprar a parte do que quer vender (art. 1.322 do código Civil de 2002).
Portanto, o poder da maioria previsto no art. 1.325 do Código Civil de 2002,[102]
não prevalece em caso de venda da coisa comum, mas apenas em casos de
administração (como, por exemplo, explorar uma fazenda para pecuária ou
agricultura, alugar, emprestar, etc.), tal como disposto no art. 1.323 do Código
Civil de 2002.[103] De maneira que para vender a coisa comum basta apenas um
condômino querer, mas, para administrar a coisa comum, prevalece a vontade da
maioria.

“APELAÇÃO CÍVEL – EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO –
IMÓVEL – OPOSIÇÃO – DESCABIMENTO – DIREITO
POTESTATIVO DO CONDÔMINO – DIVISÃO DA COISA
COMUM OU ALIENAÇÃO DO BEM – HIPÓTESE LEGAL. I-
Havendo condomínio sobre o imóvel, não pode um condômino se
opor ao direito dos demais de exigir sua extinção, mediante a
divisão da coisa comum, conforme disposto pelo art.1.320 do
Código Civil. II- Caso constatada a impossibilidade de se dividir
o imóvel, impõe-se reconhecer o direito de qualquer dos
condôminos de requerer a sua alienação a terceiros, com a
divisão do valor da coisa, a teor do art. 1.322 do Código Civil. III
- Não comprovado nos os efetivos gastos com conservação e
manutenção da coisa comum, que excedam o que incumbe ao
morador, não há que se falar em compensação ou abatimento. IV-
A ausência de manifestação pelo juízo na primeira instância
sobre o pedido de gratuidade judiciária equivale ao deferimento
tácito do benefício. A mera declaração da parte, no sentido de
não possuir recursos suficientes para arcar com o pagamento das
despesas processuais, sem prejuízo do sustento próprio ou de sua
família, é suficiente para o deferimento do benefício, conforme o
art. 4º, da Lei nº 1.060/50. O indeferimento de plano do benefício
pelo julgador imprescinde da presença de fundadas razões para
tanto (art. 5º, da Lei nº 1.060/1950), inexistentes na espécie”.[104]

No entanto, não se pode perder de vista que a regra contida no caput do
art. 1.320 do Código Civil de 2002 [“A todo tempo será lícito ao condômino
exigir a divisão da coisa comum, respondendo o quinhão de cada um pela sua
parte nas despesas da divisão”] deve ser interpretada em harmonia com a regra
estabelecida pelo § 1º do mesmo artigo, que autoriza o acordo de indivisão pelo
prazo máximo de 5 (cinco) anos, suscetível de prorrogação, sendo que tal
prorrogação pode ser feita mais de uma vez e sem qualquer limite. Entretanto,
nos casos de doação e testamento a indivisão estabelecida não pode ser superior
a 5 (cinco) anos. Caso se tenha fixado prazo maior, este deverá ser reduzido
àquele máximo (§ 2° do art. 1.320 do Código Civil de 2002). Passado o referido
prazo, o efeito não deve ser a divisão imediata da coisa comum, mas sim a
conversão à divisibilidade, ou seja, a coisa passa a ser suscetível de divisão a
qualquer momento e por iniciativa de um, de vários ou de todos os condôminos.
Mas, se existirem motivos graves que justifiquem a divisão da coisa comum
antes de passado o prazo convencionado para o estado de indivisão, o juiz,
mediante requerimento de qualquer interessado, pode perfeitamente determinar
que se a divida, extinguindo-se assim o condomínio (§ 3° do art. 1.320 do
Código Civil de 2002). De maneira que esse tipo de condomínio não pode ser
acordado “senão pelo prazo relativamente curto de 5 (cinco) anos, atendendo,
dessa forma, ao caráter instável e provisório do condomínio. A ação de divisão
(actio communi dividendo) pode ser exercida, em qualquer tempo, por qualquer
dos condôminos, mesmo sendo minoritário e até se a maioria desejar continuar
com o condomínio (art. 1.320 do Código Civil de 2002)”.[105]

“APELAÇÃO CÍVEL – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL – INOCORRÊNCIA – EXTINÇÃO DE
CONDOMÍNIO – IMÓVEL – OPOSIÇÃO – DESCABIMENTO
– DIREITO POTESTATIVO DO CONDÔMINO – DIVISÃO DA
COISA COMUM OU ALIENAÇÃO DO BEM – HIPÓTESE
LEGAL. I- No caso, a sentença mostra-se cristalina,
encontrando-se devidamente fundamentada, tendo sido nela
apreciadas todas as questões levantadas dos autos, aplicando-se
as normas legais pertinentes à matéria, não havendo que se falar
em negativa de prestação jurisdicional. II- Havendo condomínio
sobre o imóvel, não pode um condômino se opor ao direito dos
demais de exigir sua extinção, mediante a divisão da coisa
comum, conforme disposto pelo art.1.320 do Código Civil. III-
Caso constatada a impossibilidade de se dividir o imóvel, impõe-
se reconhecer o direito de qualquer dos condôminos de requerer
sua adjudicação a um só, indenizando os outros, ou sua alienação
do bem a terceiros, com a divisão do valor da coisa, a teor do art.
1.322 do Código Civil, abatendo-se do preço auferido as
despesas tidas com a manutenção do imóvel”.[106]

O art. 1.321 do Código Civil de 2002 [107] prescreve que se aplicam à
divisão do condomínio, no que couber, as regras de partilha de herança,
previstas nos arts. 2.013 a 2.022 do Código Civil de 2002. Tais disposições
estabelecem as seguintes regras: 1) o condômino pode sempre requerer a
partilha, ainda que o instrumento de instituição do condomínio o proíba, cabendo
igual faculdade aos seus cessionários e credores (art. 2.013).[108] Portanto, os
cessionários e credores de condômino podem requerer a divisão, aplicando-se
supletivamente o disposto no art. 2.013 do Código Civil de 2002; 2) pode o
administrador indicar os bens e valores que devem compor os quinhões,
deliberando ele próprio a partilha, que prevalecerá, salvo se o valor dos bens não
corresponder às quotas estabelecidas (art. 2.014);[109] 3) se os condôminos forem
capazes, poderão fazer partilha amigável, por escritura pública, termo nos autos
de extinção do condomínio, ou escrito particular, homologado pelo juiz. (art.
2.015);[110] 4) será sempre judicial a partilha, se os condôminos divergirem, assim
como se algum deles for incapaz (art. 2.106);[111] 5) no partilhar os bens,
observar-se-á, quanto ao seu valor, natureza e qualidade, a maior igualdade
possível (art. 2.107);[112] 6) é válida a partilha feita por ascendente, por ato entre
vivos ou de última vontade, contanto que não prejudique quotas dos demais
condôminos (art. 2.018);[113] 7) os bens insuscetíveis de divisão cômoda, que não
couberem na quota de cada condômino ou na quota de um só condômino, serão
vendidos judicialmente, partilhando-se o valor apurado, a não ser que haja
acordo para serem adjudicados a todos (caput do art. 2.019);[114] 8) Não se fará a
venda judicial se um ou mais condôminos requererem lhes seja adjudicado o
bem, repondo aos outros, em dinheiro, a diferença, após avaliação atualizada
(§1° do art. 2.019); 9) se a adjudicação for requerida por mais de um condômino,
observar-se-á o processo da licitação (§2° do art. 2.019); 10) os condôminos em
posse dos bens comuns e o administrador do condomínio são obrigados a trazer
ao acervo os frutos que perceberam, desde a abertura da partilha; têm direito ao
reembolso das despesas necessárias e úteis que fizeram, e respondem pelo dano
a que, por dolo ou culpa, deram causa (art. 2.020);[115] 11) quando parte da coisa
comum consistir em bens remotos do lugar da partilha, litigiosos, ou de
liquidação morosa ou difícil, poderá proceder-se, no prazo legal, à partilha dos
outros, reservando-se aqueles para uma ou mais sobrepartilhas, sob a guarda e a
administração do mesmo ou diverso administrador, e consentimento da maioria
dos condôminos (art. 2021);[116] 12) ficam sujeitos a sobrepartilha os bens
sonegados e quaisquer outros bens comuns de que se tiver ciência após a partilha
(art. 2.022).[117]

EMENTA DO VOGAL: “APELAÇÃO – AÇÃO
DE EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO – IMÓVEL INDIVISÍVEL
– ALIENAÇÃO JUDICIAL – AUTO DE AVALIAÇÃO –
PROPORÇÃO PARA CADA PARTE – BENFEITORIAS –
VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL. – Nada impede a divisão da
coisa imóvel comum, requerida pelo condômino interessado,
mediante alienação judicial, se o bem for indivisível e os
condôminos não concordarem em que seja adjudicado a um só,
indenizados os demais. – O valor a ser apurado na venda de bem,
objeto de condomínio, deve ser dividido entre as partes conforme
o quinhão de cada uma e proporcionalmente às benfeitorias
realizadas no imóvel”. EMENTA DO RELATOR: “DIREITO
CIVIL E PROCESSO CIVIL – AÇÃO DE EXTINÇÃO DE
CONDOMÍNIO – IMÓVEL – ADJUDICAÇÃO DA COISA –
INTERESSE MÚTUO – SOLUÇÃO – ALIENAÇÃO
JUDICIAL DO BEM. Não mais sendo possível a continuação da
coisa comum, qualquer dos condôminos poderá requerer a
extinção do condomínio, o que se dará através da adjudicação do
todo a uma das partes, com indenização das demais, ou pela
venda da coisa, através de alienação judicial, nos termos dos
artigos 1.320 e 1.322 do Código Civil e dos artigos 1.117, II, e
1.118 do Código de Processo Civil”.[118]

A divisão do condomínio voluntário ou convencional pode ser feita de 2
(duas) maneiras distintas: amigável ou judicial. A divisão amigável efetua-se por
escritura pública, em que intervenham todos os condôminos, desde que maiores
e capazes; basta que seja um deles incapaz, ou não haja acordo, para que se
imponha a divisão judicial. A esse respeito, WASHINGTON DE BARROS
MONTEIRO esclarece que tanto a divisão amigável como a divisão judicial tem
por finalidade precípua declarar a porção real de propriedade, que corresponde à
quota ideal de cada condômino. Seu objetivo é a obtenção da autonomia de cada
quinhão, de modo a constituir um todo independente, perfeitamente individuado,
livre da ingerência dos demais condôminos e dos estranhos. Além do mais, põe
termo a situação indesejável, eterna fonte de conflitos econômicos, a comunhão,
contribuindo assim, poderosamente, para a paz social.[119]
A ação judicial cabível para se promover a divisão do condomínio
voluntário ou convencional é a ação de divisão (antiga communi dividundo). A
ação de divisão é disciplinada, atualmente, pelos arts. 946 a 949 e 967 a 981 do
Código de Processo Civil de 1973 (Lei n° 5.869, 11.01.1973) e, com a vigência
do novo diploma processual, passará a ser regulada pelos arts. 569 a 573 e 588 a
598 do Código de Processo Civil de 2015 (Lei n° 13.105, de 16.03.2015).
Em relação à venda da coisa comum, esclarece MARIA HELENA
DINIZ que, se ocorrer ausência, incapacidade ou desentendimento que venha a
impedir ou a tornar difícil o uso e gozo da coisa comum, sendo impossível a
divisão, competirá aos condôminos deliberar se ele deverá ser vendido, alugado
ou administrado. Ou seja, 3 (três) são as alternativas que se oferecem aos
condôminos em tais casos: a) venda; b) locação; e c) administração. Para que
haja venda da coisa em comum bastará que um só condômino queira. Tal venda
apenas se dará se a unanimidade dos consortes entender que não é conveniente.
Se todos concordarem que não se venda o bem, a maioria deverá deliberar sobre
a locação ou administração da coisa comum.[120]

“APELAÇÃO. AÇÃO DE EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO.
PRESENÇA DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO. PEDIDO
JURIDICAMENTE POSSÍVEL. CERCEAMENTO DE
DEFESA. INOCORRÊNCIA. IMÓVEL. ALIENAÇÃO DO
BEM. Há interesse de agir quando a provimento judicial
postulado é capaz de proporcionar uma situação jurídica mais
favorável aos autores da demanda. Não existindo vedação no
ordenamento jurídico quanto à pretensão firmada na petição
inicial não há que se acolher a preliminar de impossibilidade
jurídica do pedido. Reunindo o feito os elementos necessários
para a sua apreciação não é de se reconhecer o cerceamento de
defesa para se determinar a reabertura da instrução processual em
primeira instância. Nos termos do artigo 1117, inciso II, do
Código de Processo Civil, é possível se alienar judicialmente a
coisa comum indivisível ou que, pela divisão, se tornar imprópria
ao seu destino”.[121]

De maneira que, se a coisa for indivisível ou se os condôminos não a
quiserem adjudicar a um só, indenizando os demais, poder-se-á vender a coisa
comum, amigável ou judicialmente, repartindo-se o preço apurado entre os
condôminos proporcionalmente ao valor de suas quotas, observando-se na venda
as preferências gradativas (caput do art. 1322 do Código Civil de 2002): o
condômino em iguais condições prefere ao estranho; entre consortes, o que tiver
na coisa benfeitorias de maior valor, e, nãos as havendo, o de maior quinhão.[122]

“EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO - BEM IMÓVEL
INDIVISÍVEL - ALIENAÇÃO JUDICIAL - POSSIBILIDADE.
- O condômino poderá requerer, a qualquer tempo, a alienação da
coisa comum, a fim de se repartir o produto, na proporção de
cada quinhão, quando, por circunstância de fato ou por
desacordo, não for possível o uso e gozo em conjunto do imóvel
indivisível, resguardando-se o direito de preferência contido no
art. 1.322 do código civil”.[123]

Vale esclarecer que bens divisíveis são os que se podem fracionar sem
alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso
a que se destinam (art. 87 do Código Civil de 2002).[124] Portanto, coisas
indivisíveis são as que se não podem partir em porções reais e distintas,
formando cada qual um todo perfeito e as que, embora naturalmente divisíveis,
se considerem indivisíveis por lei ou por vontade das partes (art. 88 do Código
Civil de 2002).[125]
Assim, serão indivisíveis um prédio residencial de pequenas proporções,
uma fábrica, um quadro, um automóvel e um imóvel rural que, pela divisão,
impróprio se torne ao seu destino. Em todos esses casos, desde que não mais
convenha a continuação do condomínio, se impõe sua extinção, a pedido de
qualquer condômino, por uma das formas seguintes: 1) adjudicação a um único
condômino, indenizando-se os demais; 2) venda do bem comum, se não existir
acordo quanto à adjudicação em favor de um dos condôminos.[126]

“APELAÇÃO CÍVEL – ALIENAÇÃO JUDICIAL DE COISA
COMUM – EXTINÇÃO DO CONDOMÍNIO –
POSSIBILIDADE – RECONHECIMENTO DO DIREITO
REAL DE HABITAÇÃO – IMPOSSBILIDADE – PARTE
AUTORA – CÔNJUGE – SENTENÇA MANTIDA. 1. A todo
tempo será lícito ao condômino exigir a divisão da coisa comum,
respondendo o quinhão de cada um pela sua parte nas despesas
da divisão. 2. A ausência de acordo entre as partes, bem como a
impossibilidade fática de divisão do imóvel, a solução é a
decretação da extinção do condomínio, por intermédio da sua
alienação em hasta pública. 3. Não há como reconhecer o direito
de real de habitação, pois se trata de extinção do condomínio em
que a parte adversa é o ex-cônjuge que está sendo privado de seu
patrimônio. 4. Recurso conhecido e não provido”.[127]

Portanto, se, na hipótese de venda de coisa comum indivisível, nenhum
dos condôminos tiver feito benfeitorias, e sendo seus quinhões ideais iguais, far-
se-á licitação entre estranhos, e antes de se adjudicar o bem ao que oferecer
maior lance, procurar-se-á efetuar licitação entre os condôminos, para que a
coisa seja adjudicada ao que fizer a melhor oferta, preferindo-se, assim, em
condições iguais, o consorte e um estranho (parágrafo único do art. 1322 do
Código Civil de 2002).[128] Em outras palavras, a licitação, primeiro, implica na
disputa entre os condôminos (disputa interna). Não havendo condômino que
tivesse feito benfeitorias e sendo os quinhões iguais, a disputa será entre
condôminos e terceiros (fase externa). Se houver empate de oferta de um
condômino com um terceiro, será vencedor o condômino, pois este tem
preferência em relação ao terceiro. Antes de encerrar a licitação, portanto, dá-se
a oportunidade para os condôminos cobrirem a oferta de estranho.
A venda da coisa comum deve ser feita amigavelmente, caso não exista
divergência entre os condôminos interessados nela. No entanto, em não havendo
acordo quanto à adjudicação em favor de um dos condôminos, a extinção do
condomínio deve ser processada através de ação judicial. A ação judicial
cabível para se promover a venda judicial da coisa comum é a ação de alienação
judicial. A ação de divisão é disciplinada, atualmente, pelos arts. 1.113 a 1.119
do Código de Processo Civil de 1973 (Lei n° 5.869, 11.01.1973) e, com a
vigência do novo diploma processual, passará a ser regulada pelo art. 730,
combinado com os arts. 879 a 903, todos do Código de Processo Civil de 2015
(Lei n° 13.105, de 16.03.2015).

“DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL – AÇÃO DE
EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO – IMÓVEL – ALIENAÇÃO
JUDICIAL DO BEM – RECURSO DESPROVIDO. Não mais
sendo possível a continuação da coisa comum, qualquer dos
condôminos poderá requerer a extinção do condomínio, o que se
dará através da adjudicação do todo a uma das partes, com
indenização das demais, ou pela venda da coisa, através de
alienação judicial, nos termos dos artigos 1.320 e 1.322 do
Código Civil e dos artigos 1.117, II, e 1.118 do Código de
Processo Civil”.[129].

No entanto, caso os condôminos tenham deliberado pela opção de
entrega da coisa comum em locação, em condições iguais terá preferência o
condômino à pessoa estranha. Se, porventura, entre os concorrentes houver mais
de um consorte, com ofertas idênticas ao estranho, terão eles preferência sobre
este e entre eles terá preferência aquele que tiver na coisa benfeitorias mais
valiosas, e, não as havendo, o que possuir o maior quinhão, excluindo-se assim
os demais interessados.


2.3.3.6 Deveres dos condôminos no condomínio voluntário ou convencional


Os deveres de cada condômino estão previstos no parágrafo único do art.
1.314 e no art. 1.315, ambos do Código Civil de 2002. Tais deveres estão
relacionados ao fato de que cada condômino tem a obrigação: a) de concorrer,
na proporção de sua quota, para as despesas e conservação ou divisão da coisa
comum (art. 1.315); b) de suportar, na proporção de sua quota, os ônus a que a
coisa comum está sujeita, como, por exemplo, hipoteca, servidão, etc. (art.
1.315); c) de não alterar a destinação da coisa comum sem o consentimento dos
outros, mesmo que seja para valorizá-la (parágrafo único do art. 1.314); d) de
não dar posse, uso ou gozo da coisa comum a estranhos, sem o consenso dos
outros (parágrafo único do art. 1.314).


2.3.3.6.1 Quota-parte como elemento indispensável para fixação das
obrigações de cada condômino


A parte ideal ou quota-parte de cada condômino é o elemento que
possibilita calcular o montante das vantagens e dos ônus que poderão ser
conferidos a cada um deles. Em regra, a parte ideal ou quota-parte está fixada
no título instituidor do condomínio voluntário ou convencional, se não o estiver,
a lei entende que deverá presumir que todos os quinhões sejam iguais (parágrafo
único do art. 1.315 do Código Civil de 2002), inclusive para efeito de partilha
dos frutos e dos produtos.
No entanto a presunção legal é juris tantum por admitir prova em
contrário. Com efeito, nada obsta que os condôminos produzam prova que venha
a desfazer a dúvida relativa ao valor da cota condominial para que se faça uma
distribuição das vantagens e dos ônus de conformidade com o seu valor e não em
partes iguais.


2.3.3.6.2 Rateio das despesas e dívidas


As obrigações propter rem,[130] como, por exemplo, as despesas
condominiais devem ser rateados entre os condôminos. No entanto, advertimos
que o dever do condomínio de arcar com obrigações propter rem não decorre
precisamente do art. 1.315 do Código Civil de 2002, mas sim em razão de regras
específicas que classificam tais despesas como ambulatórias. Tanto é assim que
o credor pode, perfeitamente, exigir o valor integral do condômino simplesmente
por ser este um dos proprietários da coisa comum. No entanto, o parágrafo único
do art. 1.315 do Código Civil de 2002 menciona expressamente que, se não
houver estipulação expressa entre condôminos, presume-se a igualdade das cotas
abstratas no rateio das despesas desse tipo.

AÇÃO DE COBRANÇA. A reclamante alega, em síntese, que o
reclamado não efetuou pagamento das taxas condominiais,
somando o montante de R$ 11.061,37. sentença procedente.
condenou o reclamado ao pagamento de R$ 11.061,37 a título de
taxas condominiais. reclamado, em sede recursal, pretende a
reforma da sentença recorrida a fim de excluir a condenação.
Sustenta que o imóvel foi vendido, sendo responsabilidade do
comprador o pagamento das taxas condominiais. O art. 1.315 do
Código Civil estabelece que ‘o condômino é obrigado, na
proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de
conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que está
sujeita’. É cediço que a taxa condominial como obrigação propter
rem é de responsabilidade do proprietário do imóvel. consta da
matrícula n.º 51.183 (mov. 70.1) que o imóvel é de propriedade
de An Ping Chia, de modo que é responsável pelo pagamento das
referida taxas. Ainda que imóvel tenha sido vendido, o registro
da matrícula do imóvel não foi transferido, ao passo que persiste
a obrigação do reclamado no pagamento das taxas condominiais.
Sentença mantida, por seus próprios fundamentos, servindo a
ementa como voto. recurso conhecido e desprovido. Condenação
do recorrente ao pagamento das custas processuais e honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação.
unânime. resultado: recurso conhecido e desprovido”.[131]

Em relação às despesas e dívidas que pesam sobre a coisa comum,
podemos citar ainda as seguintes regras: a) cada condômino pode se isentar do
pagamento de despesas e dívidas como consequência de renúncia à parte ideal
(art. 1.316 do Código Civil de 2002);[132] b) quando o débito foi contraído por
todos condôminos, cada qual se obriga na proporcionalidade da sua parte ideal
ou quota-parte (art. 1.317 do Código Civil de 2002);[133] c) a dívida contraída
por um condômino em proveito da comunhão, e durante ela, obrigam o
contratante, mas terá este ação regressiva contra os demais (art. 1.318 do
Código Civil de 2002);[134] d) as despesas e dívidas de condomínio possuem
natureza jurídica de obrigação de direito pessoal, não havendo que se falar em
aplicação do Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei n° 8.078, de
11.09.1990), pois não há relação de consumo entre condomínio e condômino.

“CIVIL E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. COBRANÇA DE
DESPESAS CONDOMINIAIS. PRESSUPOSTOS
PROCESSUAIS. INÉPCIA DA INICIAL. INOCORRÊNCIA.
ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM REJEITADA.
INOVAÇÃO DO PEDIDO EM SEDE DE AUDIENCIA DE
CONCILIAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. NATUREZA
JURÍDICA DAS DESPESAS CONDOMINIAIS. APLICAÇÃO
DO CDC. IMPOSSIBILIDADE. DIREITO PESSOAL.
PRESCRIÇÃO. AFASTADA. COMPROVANTE DE
AGENDAMENTO DE PAGAMENTO E DEPÓSITO EM
CONTA-CORRENTE POR MEIO DE ENVELOPES
BANCÁRIOS. QUITAÇÃO NÃO COMPROVADA.
APLICAÇÃO DOS INSTITUTOS DA SUPRESSIO E
SURRECTIO. NÃO COMPROVAÇÃO. Verificando-se que todos
os pressupostos processuais restam atendidos, encontra-se o
processo apto para a providencia jurisdicional definitiva. A
obrigação de pagar as despesas condominiais, enquanto o
condomínio não tem conhecimento acerca da transferência do
imóvel, permanece com a pessoa que figura como proprietário
perante o ente despersonalizado. Precedentes desta e. Corte e do
C. STJ. Não inova no pedido o autor que apenas reduz o pedido,
para cobrar somente as parcelas que não foram pagas. As
despesas de condomínio possuem natureza jurídica de obrigação
de direito pessoal, não havendo que se falar em aplicação do
CDC, pois não há relação de consumo entre condomínio e
condômino. Ausente a prescrição da pretensão quando o credor
cobra judicial o debito dentro do prazo do art. 205 do Código
Civil. Os comprovantes de agendamento de pagamento e de
depósito em conta-corrente por meio de envelopes bancários não
são documentos aptos a comprovar a quitação do débito.
Inaplicáveis os institutos jurídicos da surrectio e da supressio
quando não comprovados a presença de seus requisitos”.[135]

“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE EXTINÇÃO DE
CONDOMÍNIO – ALIENAÇÃO JUDICIAL DE COISA
COMUM – BEM IMÓVEL – DIVISÃO CÔMODA –
IMPOSSIBILIDADE – VENDA – NECESSIDADE –
PROCEDÊNCIA DA DEMANDA. É possível a extinção do
condomínio por vontade de um ou alguns dos condôminos, com a
consequente alienação judicial do bem imóvel, quando a coisa for
indivisível ou não suportar cômoda divisão, indenizando-se os
outros, por força dos artigos 1.322 e seguintes do Código Civil.
Não restando comprovado nos autos a alegação de que a casa de
morada edificado no lote de terreno fora construída,
exclusivamente, por um dos condôminos, não se justifica o
pedido de indenização pelo bem requerida por um dos
condôminos”.[136]

Por sinal, inova substancialmente o art. 1.316 do Código Civil de 2002
ao permitir a renúncia à propriedade por parte do condômino que queira eximir-
se do pagamento dos débitos comuns, independentemente da natureza de tais
dívidas ou de quem se tenha obrigado ou não por elas. Por sinal, em termos
técnicos, a renúncia é ato jurídico unilateral, mas que não se confunde com o
abandono, que também é conhecido como derrelicção ou derelição (art. 1.275
do Código Civil de 2002).[137] Ambos são, na verdade, hipóteses de perda da
propriedade. A abdicação da parte ideal é a saída indicada pelo legislador
brasileiro para o condômino que não deseja participar do rateio das despesas.
Ainda na zona de interseção entre os dois institutos (renúncia e abandono), é
importante trazer à baila que, em ambos os casos, o bem rejeitado se torna coisa
sem dono (res nullius), já que nada se transmite; nada é adquirido por alguém.
Não era para menos, pois se a renúncia beneficiasse alguém, ela não seria um ato
de abdicação ou despojamento, mas sim verdadeira alienação (inclusive, a
renúncia à herança implica, excepcionalmente, aquisição patrimonial pelos
demais herdeiros da mesma classe).
O direito de renúncia à parte ideal, para não ter de arcar com o
pagamento de despesas e dívidas, previsto no art. 1.316 do Código Civil de 2002
é muito criticado pela doutrina. De maneira que, com a referida renúncia, surge o
direito de os outros condôminos assumirem essa quota-parte. É a assunção da
quota-parte do condômino renunciante. Não se pode perder de vista que, tanto
pelas despesas que ele não arca como pelas dívidas contraídas, haverá a extinção
do condomínio. Por exemplo, pela aplicação do referido art. 1.316 do Código
Civil de 2002, uma pessoa sendo proprietária de determinado apartamento em
condomínio com outras pessoas e mantem-se em dia com o pagamento das
despesas, mas o valor destas sobe de maneira insuportável para ela, que não tem
condições de pagar. Então esta pessoa renuncia a sua quota-parte e perde a
participação dominial no apartamento, que passa a ser dos condôminos
remanescentes, conforme as respectivas quotas-partes. Assim os demais
condôminos podem pagar a dívida e entrar na parte ideal do apartamento que
pertencia ao renunciante; mas, se ninguém pagá-la, haverá a extinção do
condomínio.
Indispensável, no entanto, como em qualquer caso de renúncia que esta
esteja devidamente formalizada em instrumento e registrado no ofício
imobiliário, hipótese bastante similar da renúncia à herança. Condiciona-se, no
entanto, que a eficácia da renúncia dependa do fato de um ou mais condôminos
assumam as despesas condominiais. Mas se nenhum dos demais condôminos
assumir tais encargos, só restarão duas vias: a visão amigável (por meio de
escritura pública entre maiores e capazes), ou a divisão judicial (em caso de
incapazes, ou falta de acordo dos capazes). Todavia, sendo indivisível o bem,
procede-se-à alienação do referido bem, com a divisão proporcional do preço
obtido.
Outrossim, na rubrica das despesas comuns podem ser incluídos
quaisquer custos, como tributos, cotas condominiais, valores gastos com reforma
do bem, etc. Aliás, algumas dessas despesas são obrigações propter rem e
vinculam o condômino mesmo sem ter ele se obrigado pessoalmente. Além
disso, as despesas relativas aos impostos, predial e territorial, e às cotas
condominiais dão azo à penhora da quota parte do condômino, mesmo em se
tratando de bem de família, por se referir à situação excepcional prevista no
inciso IV do art. 3º da Lei 8.009, de 29.03.1990 (dispõe sobre a
impenhorabilidade do bem de família).[138]

“PROCESSO CIVIL. PENHORA. UNIDADE RESIDENCIAL.
QUOTAS DE CONDOMÍNIO. A unidade residencial sob o
regime de condomínio está sujeita à penhora, se o respectivo
morador deixar de pagar o que, no rateio das despesas comuns,
lhe cabe; exceção, prevista na Lei nº 8.009, de 1990, à
impenhorabilidade do bem de família. Recurso especial não
conhecido”..[139]

Em relação às outras modalidades de despesas, tais como débitos
contraídos para a realização de benfeitorias, acessões, matéria prima para
atividade produtiva, etc., é necessário verificar se todos os condôminos ou
apenas um ou alguns deles se obrigaram pessoalmente. No primeiro caso, isto é,
se todos se obrigaram (dívida coletiva), cada um deles responde,
proporcionalmente, por tais despesas, exatamente como previsto nos arts. 1.315
e 1.317 do Código Civil de 2002, exceto se o contrato discriminou a parte de
cada um na obrigação ou contemplou cláusula de solidariedade. No entanto, se
apenas um ou alguns deles contraíram dívidas em proveito da comunhão, mas
sem prévia anuência dos demais condôminos (dívidas isoladas), somente os que
se obrigaram pessoalmente respondem pelo débito, exatamente como prescrito
no art. 1.318 do Código Civil de 2002.
A regra prevista no referido art. 1.318 do Código Civil de 2002 pode, a
primeira vista, parecer injusta, mas segue a lógica jurídica, pois o condômino
que contratou a dívida não atuou como representante/mandatário dos demais,
mas sim como mero gestor de negócio, que depende de ratificação dos demais
condômicos para vincular terceiros ao ato praticado por ele isoladamente. No
entanto, para evitar o enriquecimento sem causa, aquele que pagou tem o direito
de ajuizar ação regressiva contra os demais condôminos, assegurado pelo
referido dispositivo legal, pois, afinal, desde que tenha revertido algum proveito
em favor do condomínio. Portanto, em tais casos, os demais condôminos
respondem na medida da extensão de suas respectivas cotas ou frações ideais,
ressarcindo-se ainda aquele que arcou com a despesa isolada dos cutos das obras
caracterizadas como benfeitorias necessárias e úteis. Mas não se inclui na ação
regressiva a indenização das benfeitorias voluptuárias não autorizadas pelos
demais condôminos. Ademais, o condômino que não participou do negócio
responde perante o coproprietário, mas não em relação ao terceiro.
Conforme previsto no art. 1.315 do Código Civil de 2002, o rateio das
despesas e dívidas se dá proporcionalmente, ou seja, conforme o quinhão de
cada condômino. O condômino é obrigado, na proporção de sua parte ideal ou
quota-parte, a concorrer para as despesas de conservação ou divisão da coisa
comum, e a suportar os ônus a que estiver sujeita: multas, ônus fiscais, etc.

“PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. RECURSO ADESIVO.
PROTOCOLO EM VARA DIFERENTE. CONHECIMENTO.
PRESCRIÇÃO. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. IMÓVEL.
COTITULARIDADE. RATEIO DE DESPESAS. ART. 1315 DO
CÓDIGO CIVIL. INCIDÊNCIA. COMODATO. USUCAPIÃO
DE CONDÔMINO. PAGAMENTO DE ALUGUERES. 1.
Consoante o Superior Tribunal de Justiça, Conquanto fique
patente a manobra da recorrente para contornar a perda de prazo
para interposição de recurso de apelação autônomo, preenchidos
os requisitos legais do art. 500 do CPC, não pode o Tribunal
deixar de analisar o recurso adesivo. (...) (REsp 864.579/SP, Rel.
Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em
08/05/2007, DJ 29/05/2007, p. 276). 2.Viável superar o equívoco
da parte no protocolo tempestivo de recurso em vara incorreta, de
maneira a se reconhecer a tempestividade do recurso interposto.
3.Para fins de ressarcimento das despesas havidas com IPTU e
condomínio, realizadas por uma parte, sem a contribuição da
outra, considera-se o prazo prescricional de 3 (três) anos, previsto
no art. 206, §3°, inciso IV, do Código Civil, hipótese de
enriquecimento sem causa. 4. Uma vez demonstrada a
cotitularidade dos direitos patrimoniais incidentes sobre imóvel,
possuindo ambas as partes 50% (cinquenta por cento) dos
referidos direitos, após separação judicial, incide o disposto no
art. 1315 do Código Civil, segundo o qual “O condômino é
obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer com as despesas
de conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que
estiver sujeita. 5. O condômino tem legitimidade para usucapir
em nome próprio, desde que exerça a posse exclusiva com
animus domini e sejam atendidos os requisitos legais da
usucapião. 6. Demonstrada a configuração e o fim do comodato,
viável o pagamento dos aluguéis. 7. Preliminar de não
conhecimento do recurso adesivo rejeitada. Prejudicial de
prescrição rejeitada. Recurso adesivo não provido. Apelação não
provida”.[140]

“CIVIL. TAXA DE CONDOMÍNIO. FIXAÇÃO
PROPORCIONAL À FRAÇÃO IDEAL. LEGALIDADE. 1. A
fixação da taxa de condomínio com base na fração ideal é
decorrência direta da aplicação do art. 1315 do Código Civil, que
não contém inconstitucionalidade sendo portanto norma cogente.
2. A presunção de igualdade prevista no § único do artigo
supramencionado aplica-se aos imóveis pró-indiviso, situação
inexistente em condomínios edilícios onde a fração ideal consta
da própria escritura do imóvel. 3. A fixação da taxa condominial
pelo efetivo uso impõe a apreciação de diversos elementos
inestimáveis, como o andar ocupado, que afeta o uso de
elevadores e escadas, número e idade dos ocupantes do imóvel,
que afetam consumo de água e de uso de áreas comuns, hábitos
pessoais, e muitos outros, o que inviabiliza essa forma de
cobrança, sendo esta a razão mater da norma inscrita no art. 1315
do Código Civil, que estabelece critério objetivo de cobrança. 4.
Recurso conhecido mas improvido. sentença mantida por seus
próprios fundamentos, a teor do art. 46 da Lei nº 9.099/95,
servindo a súmula de julgamento de acórdão. 5. Recorrente
sucumbente arcará com custas processuais. Sem honorários eis
que revel o recorrido”.[141]

“AÇÃO DE RESSARCIMENTO. Sentença proferida em ACP
determinando a restauração de imóvel. Coproprietários. Um deles
deu inicio à execução do projeto. Pretensão de ressarcimento da
quota parte do outro. Revelia. Presunção de veracidade dos fatos.
Alegações que não prosperam. Falta de documento essencial à
propositura da ação. Escritura pública comprovando o
condomínio. A ação não é real, mas pessoal. Ademais o próprio
réu afirma que é condômino do autor. Alegação infundada acerca
da infringência do artigo 10 do CPC . Não há discussão no feito
acerca da propriedade do bem imóvel descrito na inicial. A ação é
pessoal. Não há se falar em litisconsórcio ativo necessário. O
presente feito é de cunho obrigacional. Art. 1315 do Código Civil
. Alegação de ausência de interesse (art. 3º do CPC ). Existência
de uma sentença determinando que fosse feita a restauração do
imóvel comum. O coproprietário não é obrigado a fica
aguardando a boa vontade do outro para dar inicio ao
cumprimento da sentença. - Não provimento”.[142]

No entanto, presumem-se iguais as partes ideais ou quotas-partes dos
condôminos. Isto é, há presunção de que todos os condôminos têm partes iguais,
mas essa presunção é relativa, cabendo ao condômino provar que sua cota parte
é menor, para poder contribuir com menos.
Outrossim, aquele que não quer participar do rateio das despesas, pode
renunciar, para escapar das despesas do rateio, conforme admitido no art. 1.316
do Código Civil de 2002.
Por força do art. 1.317 do Código Civil de 2002, quando a dívida houver
sido contraída por todos os condôminos, sem se discriminar a parte de cada um
na obrigação condominial, nem se estipular solidariedade, entende-se que cada
qual se obrigou proporcionalmente ao seu quinhão na coisa comum.
Há de se prestar a atenção na expressão “nem se estipular solidariedade”
do referido dispositivo legal: isto quer dizer que todos contraem a dívida em não
havendo solidariedade estipulada expressamente. Com efeito, não havendo
estipulação, não será o caso de solidariedade, pois a solidariedade resulta da lei
ou da vontade das partes. Deve estar expressa na lei ou no contrato (art. 265 do
Código Civil de 2002).[143] Portanto, cada um dos condôminos se obrigou,
segundo o seu respectivo quinhão (parte ideal ou quota-parte), a não ser no caso
de expressa solidariedade ou da discriminação da parte correspondente, no
quinhão. Por exemplo, uma pessoa combina de comprar um barco de pesca em
conjunto com outras; ela elabora contrato com os demais e compro a referida
embarcação, se obrigando com o vendedor; tem ela, pois, direito de regresso
contra cada um dos demais condôminos.
Por fim, lembra CRISTIANO DE FARIAS CHAVES e NELSON
ROSENVALD que, na hipótese de não haver quem faça os pagamentos das
despesas, a coisa comum deve ser divida, seja pela via amigável, por acordo
entre condôminos capazes, ou pela via contenciosa ou judicial, na hipótese de
litígio ou interesse de incapaz. Sendo indivisível o bem comum, procede-se à
alienação do bem, com a divisão proporcional do preço obtido na transmissão
para outrem.[144]


2.3.3.6.3 Regime jurídico dos frutos da coisa comum


Em relação às consequências pela utilização dos frutos da coisa comum,
tais frutos devem ser divididos entre os condôminos na proporção da parte ideal
ou quota-parte de cada um, e o condômino que causar dano à coisa deve
indenizar os demais nos termos do art. 1.319,[145] e do art. 1.326,[146] ambos do
Código Civil de 2002.

“AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE ALUGUEL. SENTENÇA
QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO.
CONDOMÍNIO SOBRE BEM IMÓVEL. USO EXCLUSIVO
DO BEM PELO EX-CÔNJUGE. PAGAMENTO DE ALUGUEL
QUE DEVE CORRESPONDER À PARTE IDEAL DO AUTOR.
TERMO INICIAL DO PAGAMENTO DE ALUGUEL.
CITAÇÃO. DESPESAS RELATIVAS AO IMÓVEL PAGAS
COM EXCLUSIVIDADE PELA RÉ. COMPENSAÇÃO. "Cada
condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da
coisa e pelo dano que lhe causou." (art. 1319 do Código Civil). O
uso exclusivo do imóvel e desprovido de remuneração não pode
prevalecer, sob pena de caracterizar enriquecimento indevido
(art. 884 do CC), de modo que incontroverso o condomínio
existente sobre o imóvel objeto da demanda, de rigor o
reconhecimento do direito do autor ao recebimento de aluguel. O
termo inicial de exigibilidade do aluguel deve coincidir com a
data de efetiva oposição à ocupação exclusiva, no caso a citação.
Dispõe o art. 1315 do Código Civil: "O condômino é obrigado,
na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de
conservação ou divisão da coisa, e a suportar o ônus a que estiver
sujeita". No caso, os valores comprovadamente pagos pela ré
com exclusividade a título de despesas relativas ao imóvel
deverão ser compensados com o valor do aluguel, observada a
sua quota parte ideal, tudo a ser apurado em regular liquidação de
sentença. Sentença parcialmente reformada. Recurso da ré
parcialmente provido. Negado provimento ao recurso do autor”.
[147]


Ou seja, cada condômino responde aos outros pelos frutos da coisa e
pelo dano que causou aos demais. Como exemplo, citamos a hipótese do casal
que resolve por fim ao casamento. Geralmente um dos cônjuges sai da residência
que era em comum enquanto o outro permanece utilizando-a. Se o imóvel é
comum, existe uma relação condominial. Aquele cônjuge que permanece no
imóvel comum deve, certamente, indenizar o outro que sai, pois acabou
utilizando-se sozinho da parte ideal ou quota-parte pertencente ao cônjuge-
condômino que ficou, assim, privado de usar a coisa comum. Portanto, tal
privação é compensada pelo recebimento do que, não raras vezes, é chamado de
“aluguel-indenização” (fruto civil ou rendimento), ou seja, o pagamento do
equivalente ao aluguel parte ideal ou quota-parte que está sendo utilizada sem
que tenha sido revertida ao seu patrimônio pessoal. O juiz, nesse caso, deve
mandar apurar o valor do aluguel da parte ideal ou quota-parte do cônjuge que
sai do imóvel comum e determinar ao que permaneceu proceder ao pagamento
para o outro até que seja efetivada a divisão da coisa comum, através da sua
alienação. Pode também determinar que os aluguéis-indenização apurados no
período de utilização seja descontado do saldo que tenha a receber como
resultado da venda do imóvel comum. De maneira que, se o imóvel comum foi
vendido por R$ 100.000,00, dos R$ 50.000,00 que caberia ao cônjuge que
permaneceu utilizando o imóvel comum deve ser descontado o saldo devedor
relativo aos aluguéis-indenização, caso eles não tenham sido pagos antes da
alienação do referido imóvel.

“AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE ALUGUEL. IMÓVEL.
COISA COMUM. SENTENÇA QUE JULGOU
PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO PARA
CONDENAR O RÉU AO PAGAMENTO DE 50% DO
ALUGUEL FIXADO EM R$ 1.500,00 NO PERÍODO DE
ABRIL A MAIO DE 2012 E, 25% DO ALUGUEL A PARTIR
DE MAIO DE 2012. IMÓVEL RECEBIDO NA SUCESSÃO DA
GENITORA E ESPOSA DAS PARTES. USO EXCLUSIVO DO
BEM PELO RÉU. PAGAMENTO DE ALUGUEL QUE DEVE
CORRESPONDER À PARTE IDEAL DA AUTORA. TERMO
INICIAL DO PAGAMENTO DE ALUGUEL. CITAÇÃO.
DESPESAS RELATIVAS AO IMÓVEL PAGAS COM
EXCLUSIVIDADE PELO RÉU. COMPENSAÇÃO. ‘Cada
condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da
coisa e pelo dano que lhe causou’ (art. 1319 do Código Civil). O
uso exclusivo do imóvel e desprovido de remuneração não pode
prevalecer, sob pena de caracterizar enriquecimento indevido
(art. 884 do CC), de modo que incontroverso o condomínio
existente sobre o imóvel objeto da demanda, de rigor o
reconhecimento do direito da autora ao recebimento de aluguel.
O réu, ao que tudo indica, doou 25% de sua parte ideal ao atual
cônjuge. Contudo, a doação ainda não foi registrada e não altera
a sua titularidade no imóvel. Ainda que o réu tenha doado 25%
de sua parte ideal ao seu cônjuge deve ser condenado ao
pagamento do aluguel correspondente à parte ideal da autora e
não à parte que ele tem no imóvel, visto que a autora está privada
dos frutos do imóvel pelo uso exclusivo do bem pelo réu. Há
entre as partes relação de condomínio. O réu usufrui de todas as
partes ideais do condomínio, inclusive a parte (50%) sobre a qual
recaem os direitos sucessórios dos herdeiros de sua esposa, no
caso, a parte ideal pertencente à autora. Logo, tem legitimidade
para responder por inteiro pelo aluguel da parte da autora,
proprietária de 50% do imóvel, recebido na sucessão de sua
genitora. O termo inicial de exigibilidade do aluguel deve
coincidir com a data de efetiva oposição à ocupação exclusiva,
no caso a citação. Dispõe o art. 1315 do Código Civil: ‘O
condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer
para as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar
o ônus a que estiver sujeita’. No caso, os valores pagos pelo réu
com exclusividade a título de despesas relativas ao imóvel
deverão ser compensados com o valor do aluguel, observada a
sua quota parte ideal, tudo a ser apurado em regular liquidação de
sentença. Sentença parcialmente reformada. Recursos
parcialmente providos”.[148]

“AÇÃO DE COBRANÇA. COISA COMUM. CONDOMÍNIO
SOBRE BEM IMÓVEL INSTITUÍDO POR OCASIÃO DA
SEPARAÇÃO JUDICIAL. PRETENSÃO DO AUTOR AO
RESSARCIMENTO DAS DESPESAS PARA A REFORMA DO
BEM EXCLUSIVAMENTE PELA RÉ. IMPOSSIBILIDADE.
APLICAÇÃO DO ART. 1.315 DO CÓDIGO CIVIL.
PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. APLICAÇÃO DO ART.
205 DO CÓDIGO CIVIL. INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO.
AÇÃO CAUTELAR. Sentença que julgou improcedente o
pedido. Na hipótese dos autos, o autor pretende ser ressarcido
integralmente pelas despesas que efetuou com reforma realizada
em imóvel em que foi instituído o condomínio entre as partes por
ocasião de acordo celebrado nos autos da separação judicial do
casal. Enquanto não dividido o imóvel, a propriedade do casal
sobre o bem remanesce, sob as regras que regem o instituto do
condomínio, nos termos do art. 1.315 do Código Civil: "O
condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer
para as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar
os ônus a que estiver sujeita". As despesas realizadas para a
reforma do imóvel devem ser dividas, em proporção igual, entre
as partes, afastada a pretensão do autor ao pagamento
exclusivamente pela ré. Prazo prescricional. Não há que se falar
em aplicação do prazo prescricional previsto no art. 206, §3°, do
Código Civil, pois não se caracterizou hipótese de ressarcimento
por enriquecimento indevido [art. 884 do Código Civil]. A
presente ação tem por objeto a cobrança de valores decorrentes
de reformas que foram realizadas no imóvel em que foi instituído
condomínio em razão da separação do casal, não se trata de
hipótese de ressarcimento por enriquecimento indevido. O
recebimento de aluguel pela ré, em razão da locação das salas de
sua propriedade não caracteriza enriquecimento à custa do réu,
visto que ambos são responsáveis pelas despesas do bem.
Aplicação do prazo prescricional previsto no art. 205 do Código
Civil. Interrupção da prescrição. Prescrição que foi interrompida
com o ajuizamento da ação cautelar de antecipação de provas.
Afastada a prescrição e reconhecido o direito do autor de haver o
seu crédito, a sentença deve ser reformada para condenar a ré ao
pagamento de apenas metade das despesas relativas à reforma do
imóvel mantido em comunhão. Sentença reformada. Recurso
parcialmente provido”.[149]


2.3.3.7 Defesa do bem condominial


Para prevenir conflitos entre os coproprietários ou perante a estranhos,
CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON ROSENVALD enumera 5
(cinco) formas de composição: a) utilização do bem conforme sua destinação
econômica, as decisões da maioria de certa forma cerceará e definirá qual sua
destinação econômica; Impossibilidade de condômino alterar sozinho a
destinação natural ou convencional da coisa; b) exercícios de todos os direitos
compatíveis com a indivisão; cada condômino encontra em seu consorte o limite
exato de seu direito de propriedade, vide o parágrafo único do art. 1.314 do
Código Civil de 2002, que ressalta as limitações ao exercício do domínio; c)
direito de reivindicar a coisa, ou seja, de exercer a pretensão reivindicatória do
vem contra terceiros que violam o dever genérico de não ofender ao direito
subjetivo de propriedade, podendo a referida ação ser intentada também contra
outro condômino., porém nenhum dos consortes pode opor propriedade sobre a
totalidade da coisa, pois esta se encontra fracionada; d) direito de exercer as
ações possessórias da mesma forma que qualquer possuidor, está autorizado a
ajuizá-las. A reintegração da posse mediante o esbulho, a manutenção da posse
frente à turbação e o interdito proibitório em face da iminente agressão dirigida a
posse (art. 1210 do Código Civil de 2002);[150] e) direito de alienar e gravar a
parte ideal é um corolário do direito de dispor a coisa pode ocorrer
individualmente desde que incidir em parte autônoma. [151]
Com efeito, segundo o art. 1.314 do Código Civil de 2002, em sua parte
final, cada condômino, independentemente de sua cota, pode reivindicar de
terceiro e defender a sua posse, ou seja, cada condômino pode exercer a ação
possessória e ação reivindicatória (posse ou propriedade) no todo ou em parte.
Portanto, o referido art. 1.314 do Código Civil de 2002 efetivamente disciplina
as relações intestinas entre os condôminos, e ainda com terceiros. Porém, perante
a terceiros, por mais ínfima e abstrata que seja o valor do quinhão do
condômino, este tem direito de ser respeitado. No entanto, para o manejo dos
interditos possessórias não basta ter a titularidade do direito de propriedade, se
deve mostrar ainda que exerce a condição de possuidor. Em assim sendo,
conforme menciona CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON
ROSENVALD, propriedade e posse estão em planos distintos.[152]
Muito se tem questionado se é possível que um condômino utiliza-se
ação possessória e ação reivindicatória contra outro condômino. Certo é que,
quanto a terceiros não há discussão, a utilização da ação possessória e da ação
reivindicatória é plenamente possível. No entanto, quanto a outro condômino, a
utilização da ação possessória e da ação reivindicatória depende das seguintes
situações: 1) quando um condômino embaraçar a posse de outro condômico
(exercer a posse com a exclusividade para si), com esbulho ou turbação, cabe a
ação possessória; 2) o esbulho e a turbação são situações diferente do que ocorre
com a ação reivindicatória, pois neste caso discute-se a propriedade em si; 3)
assim, sendo ambos proprietários, torna-se inviável o manejo da ação
reivindicatória.
Em relação à propriedade e ao domínio, sempre existiram problemas
históricos para estabelecer a diferenciação entre esses institutos do Direito Real,
ou seja, do ramo do direito privado que trata dos direitos de posse e propriedade
dos bens móveis e imóveis, bem como das formas pelas quais esses direitos
podem ser transmitidos. Os direitos reais, que abrangem o direito de propriedade
e os direitos reais sobre coisa alheia (porém, não abarcam o direito à posse),
possuem previsão legal no art. 1225 do Código Civil de 2002.[153] Este artigo é
um rol taxativo que enumera quais são os direitos reais admitidos no direito
brasileiro, motivo pelo qual não se pode dizer que direito à posse é um direito
real. Não se pode perder de vista que essa designação de nenhum modo atribui
direitos às coisas: são pessoas, seres humanos, exclusivamente, os que podem ter
direitos.
Propriedade é o direito real que dá a uma pessoa (denominada então
“proprietário”) a posse de uma coisa, em todas as suas relações. É também o
direito ou faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, além do direito de reavê-la
de quem injustamente a possua ou detenha (art. 1.228 do Código Civil de 2002).
[154]
ORLANDO GOMES DOS SANTOS descreve que é ainda um direito
complexo [se bem que unitário, consiste num feixe de direitos consubstanciados
nas faculdades de usar, gozar, dispor e reivindicar a coisa que lhe serve de
objeto], absoluto [confere ao titular poder de decidir se deve usar a coisa,
abandoná-la, aliená-la, destruí-la e, ainda, se lhe convém limitá-lo, constituindo,
por desmembramento, outros direitos reais em favor de terceiros – é oponível a
todos (oponibilidade erga omnes)], perpétuo [tem duração ilimitada e não se
extingue pelo não uso] e exclusivo [poder de proibir que terceiros exerçam sobre
a coisa qualquer senhorio – jus prohibendi].[155]
Já domínio é a supremacia sobre a coisa. É a situação fática de se poder
dirigir e governar a coisa de sua propriedade (direito de dispor da coisa).
Certamente, adquire-se a propriedade imóvel com a transcrição no
registro da escritura lavrada em cartório de ofício de notas no Cartório de
Registro de Imóveis (quem não registra seu título de aquisição não é
proprietário). Somente, pois, a partir do registro do título aquisitivo no Cartório
de Registro de Imóveis é que o adquirente se torna proprietário de um imóvel.
Mas, em alguns casos, pode se ter o direito de propriedade sobre este (direito de
dispor, usar e gozar da coisa) e não se ter a “posse” (no caso de ela estar
invandida, alugada, etc.). Em estando invadida a coisa e deixar que isso perdure
(sem se ajuizar ação de reintegração de posse), o invasor pode, perfeitamente,
ajuizar, a seu turno, ação de usucapião e, além da posse que adquiriu com a
invasão, também conseguir o domínio sobre a coisa.
Face a esta possibilidade assegurada ao invasor, podemos dizer que o
domínio ocorre quando a pessoa tem a simultaneidade dos 4 (quatro) poderes,
mesmo sem o título. Por exemplo, pessoa que reúne todos os requisitos para
ingressar com ação de usucapião.
Dai surge a seguinte questão: qual a ação judicial apropriada para aquele
que tem o domínio, mas não tem o título e quer defender o domínio? Certamente
não lhe cabe a ação reivindicatória exatamente em vista da falta do título, mas
lhe cabe a ação publiciana. Inclusive, deve-se ter em mente que a ação
publiciana é válida para a defesa do domínio sem título também no âmbito do
condomínio. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça – STJ, por sua vez, vem
entendendo que no caso de promessa de compra e venda, onde ainda não se tem
a propriedade, por ser direito real de aquisição, o titular da promessa (promitente
adquirente ou promitente comprador), malgrado ainda não seja proprietário já
pode se valer de ação reivindicatória.

“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REIVINDICATORIA.
PROMESSA DE COMPRA EVENDA REGISTRADA. 1. A
PROMESSA DE COMPRA E VENDA IRRETRATAVEL E
IRREVOGAVELTRANSFERE AO PROMITENTE
COMPRADOR OS DIREITOS INERENTES AOEXERCICIO
DO DOMINIO E CONFERE-LHE O DIREITO DE BUSCAR O
BEM QUESE ENCONTRA INJUSTAMENTE EM PODER DE
TERCEIRO. SERVE, POR ISSO,COMO TITULO PARA
EMBASAR AÇÃO REIVINDICATORIA. 2. RECURSO
ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO”.[156]

“AÇÃO REIVINDICATÓRIA. COMPROMISSO DE COMPRA
E VENDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO
DE MÉRITO POR CARÊNCIA DE AÇÃO. AUSÊNCIA DE
INTERESSE DE AGIR. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. –
Possibilidade de reivindicação de imóvel mesmo se tratando de
compromisso de compra e venda, desde que quitado o preço e
firmado em caráter irrevogável e irretratável. – ‘A promessa de
compra e venda irretratável e irrevogável transfere ao promitente
comprador os direitos inerentes ao exercício do domínio e
confere-lhe o direito de buscar o bem que se encontra
injustamente em poder de terceiro. Serve, por isso, como título
para embasar ação reivindicatória’ (REsp 252.020/RJ, Rel.
Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO,
TERCEIRA TURMA, julgado em 05/09/2000, DJ 13/11/2000 p.
144)”.[157]

Portanto, propriedade e ao domínio são intitutos de conteúdo distinto,
porém, o domínio está inserido no próprio direito de propriedade. Como dito, o
direito de propriedade é direito real que encerra diversas faculdades (faculdade
de dispor, faculdade de usar, faculdade de gozer, faculdade de reivindicar, etc.) e,
se consideradas em si mesmas, tornam-se outros direitos reais, tais como
usufruto, superfície, etc. Melhor dizendo, o domínio é considerado o conteúdo
mínimo do direito de propriedade. Fracionando-se o direito propriedade e se
tudo for tirado por outros direitos reais (face à constituição de usufruto, de
anticrese ou outro direito real), resta apenas o domíno na forma de posse indireta
do proprietário. Por isso é que alguns doutrinadores mencionam que o domínio
se reduz apenas ao registro, outros que seria a faculdade de dispor da coisa.
Assim, pode-se não ter os demais “direitos” (direito de usar, etc.) sobre um
determinado bem, mas se tendo o domínio, não se deixa de ser proprietário.
No entanto, o Código Civil de 1916 não tratou de diferenciá-los. Isso fez
com que toda a doutrina brasileira os utilizassem como sinônimos. Desta feita,
historicamente, a ação reivindicatória serviu tanto para assegurar a propriedade
como para assegurar o domínio. Por outro lado, a leitura atenta do art. 1.228 do
Código Civil de 2002 deixa claro que o proprietário tem a faculdade de usar,
gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que
injustamente a possua ou detenha. Portanto, a propriedade é a concomitância dos
4 (quatro) poderes acima e desde que também se tenha o título respectivo.
Em assim sendo, na propriedade em comum, ou condomínio, cada
condômino ou consorte pode reivindica-la de terceiro, nos termos do art. 1.314
do Código Civil de 2002, No entanto, na ação reivindicatória o direito que
assegura o sucesso da demanda deve ser demonstrado com o título de aquisição
devidamente levado ao registro no Cartório de Registro de Imóveis. Nessas
condições, a referida ação se mostra inidônea para a defesa do domínio. Caso
contrário, em não havendo título, a ação publiciana é que se mostra inidônea
para reivindicar o referido domínio.


2.3.3.8 Alienação ou Oneração do bem comum


É importanto, inicialmente, se ter em mente que existe diferença entre
alienar e onerar o bem comum da cota parte.
Se o condômino pretende alienar ou onerar (dar em garantia) bem
comum, ele necessariamente depende do consentimento de todos (§2° do art.
1.420 do Código Civil de 2002).[158] Se um dos condomínios imotivadamente não
der o seu respectivo consentimento, o juiz pode, perfeitamente, suprir o referido
impedimento, por ser abuso de direito. Desta feita, a objeção motivada não cabe
o suprimento judicial. Própria cota parte ou fração ideal não precisa do
consentimento dos demais condôminos, bastando apenas a sua vontade (§2° do
art. 1.420 do Código Civil de 2002).
No entanto, é assegurado o direito de preferência, ou seja, o art. 504 do
Código Civil de 2002 traz uma importante regra que é a da preferência do
condômino ou preempção: “não pode um condômino em coisa indivisível vender
a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino,
a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver
para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias,
sob pena de decadência” (caput do art. 504 do Código Civil de 2002). No
entanto, “sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de
maior valor e, na falta de benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem
iguais, haverão a parte vendida os comproprietários, que a quiserem,
depositando previamente o preço” (parágrafo único do art. 504 do Código Civil
de 2002).
Entretanto, não se pode perder de vista que só se exige a garantia de
preferência nas alienações onerosas. Nas alienações gratuitas não se exige, pois
a doação é mera liberalidade e, portanto, não existe direito de preferência dos
demais condôminos. Além disso, não exige garantia de preferência no
condomínio edilício.
É importante esclarecer que os arts. 27 e 28 da Lei n° 8.245, de
19.10.1991 (dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a
elas pertinentes)[159] são aplicados, por analogia, para se exercer o direito de
preferência que será materializado por meio de notificação, seja judicial ou
extrajudicial, com prazo mínimo de 30 (trinta) dias.
Se mais de um condômino pretende exercer o direito de preferência, eles
terão preferência na proporção de seu quinhão. Muito se tem questionado a
respeito das consequências no caso de condômino alienar, onerosamente, sem
respeitar o direito de preferência dos demais condôminos. Em tais casos, a
alienação onerosa praticada pelo condômino fica eivada de ineficácia relativa.
Isto é, o condômino preterido pode requerer a adjudicação compulsória no prazo
de 180 (cento e oitenta) dias a contar da data do conhecimento do fato (caput do
art. 504 do Código Civil de 2002). Mas, se o terceiro adquirente estiver de boa-
fé, fará jus a perdas e danos junto ao condômino alienante.
Na adjudicação compulsória do condômino preterido, o depósito deve
ser tanto por tanto (valor do depósito acrescido das despesas tais como registro
do imóvel). Ademais, na ação de adjudicação compulsória haverá litisconsórcio
passivo necessário unitário (condômino alienante e o estranho adquirente).


2.3.3.9 Administração do condomínio voluntário ou convencional


Quando a coisa ou bem condominial for considerado de uso impossível
ou inconveniente, a maioria dos condôminos pode deliberar a sua venda ou sua
locação. Entretanto, os condôminos podem deliberar pela administração da coisa
ou bem comum (1ª parte do art. 1.323 do Código Civil de 2002).[160]
É indiscutível que administração do condomínio é fundamental, para
coexistência pacífica entre todos os condôminos, pois a coisa comum com
muitos proprietários, se não existe uma gestão centralizada, acaba ficando
desgovernada e, consequentemente, o caos se instala. Gestão centralizada,
hierarquia e direção são muito importantes para o sucesso de qualquer negócio, o
que não dizer no âmbito dos condomínios.
A administração do condomínio está disciplinada pelos arts. 1.323,
1.324, 1.325 e 1.326 do Código Civil de 2002.
Se os condôminos decidirem que a coisa ou bem comum deva ser
administrada, a maioria absoluta deve escolher o administrador, o qual pode ser
tanto um condômino como um terceiro estranho ao condomínio (2ª parte do art.
1.323 do Código Civil de 2002). De maneira que a administração do condomínio
pode ser exercida por qualquer um dos coproprietários, mas que seja eleito por
maioria absoluta do valor dos quinhões e, não pelo número per carpita de
comunheiros. As deliberações serão tomadas baseadas no critério econômico,
pelos votos que sejam mais da metade do total dos quinhões (art. 1.325 do
Código Civil de 2002).
Assim, se a maioria dos condôminos decidir que a coisa comum deverá
ser administrada, os comunheiros deverão escolher um administrador, estranho
ou não, que passará a ser o procurador comum, logo, tudo que ele fizer obrigará
a todos, ainda que dissidentes. E, além disso, representará o condomínio, ativa e
passivamente. Por exemplo, arrendamento celebrado com terceiro, desde que se
trata de coisa normalmente destinada à locação, vinculará os demais
condôminos, embora em divergência.[161]
Se estranho for escolhido administrador, será bom delimitar seus
poderes. Os condôminos deverão ainda sobre o regime de administração, da
remuneração do administrador, funções deste e a prestação de contas de sua
gestão. Seja como for, o administrador do condomínio responde ativa e
passivamente pelo condomínio.
Com efeito, o administrador eleito pela maioria dos condôminos
representa ativa e passivamente o condomínio (art. 1.324 do Código Civil de
2002), em juízo ou fora dele, não precisando de procuração dos condôminos, por
se tratar de função inserida no âmbito da administração ordinária. A ata de sua
eleição ou outro documento indicativo da deliberação da maioria dos
condôminos é o instrumento hábil para a representação dos condôminos, razão
pela qual se recomenda o seu registro do Cartório de Títulos e Documentos. O
administrador representa toda a comunidade condominial (representante
comum), ainda que eleito por maioria de votos. No entanto, como visto, suas
atribuições resumem-se aos interesses comuns do prédio, não tendo legitimidade
para atuar no interesse particular dos condôminos. Para determinadas ações,
como, por exemplo, a cobrança judicial de cotas em atraso, independe de
autorização dos condôminos. Se se omitir, estarão quaisquer condôminos,
excepcionalmente, legitimados para tomar as medidas judiciais na defesa de seu
direito.[162]
O inciso IX do art. 12 do Código de Processo Civil de 1973 e inciso XI
do art. 75 do Código de Processo Civil de 2015, estabelecem que o condomínio
será representado pelo “administrador” (condomínio geral) ou pelo “síndico”
(condomínio edilício). Portanto tal dispositivo processual usa o termo
“administrador” para se referir ao gestor do condomínio geral, disciplinado pelos
arts. 1.314 e seguintes do Código Civil de 2002, e o termo “síndico” para se
referir ao gestor do condomínio, edilício disciplinado pela Lei n° 4.591, de
16.12.1964.
Esclarecemos que, no caso, maioria diz respeito ao maior voto, maior
dos quinhões, segundo seu valor, ou o somatório dos votos segundo o valordos
quinhões (caput do art. 1.325 do Código Civil de 2002).[163] De maneira que, se
“a maioria será calculada pelo valor dos quinhões”, não importa a quantidade de
condôminos, mas o tamanho de seus quinhões.
Maioria absoluta, por sua vez, é o primeiro número inteiro acima da
metade do total (§1° do art. 1.325 do Código Civil de 2002), ou seja, se existem
37 (trinta e sete) condôminos, a metade de 37 (trinta e sete) é 18,5 (dezoito
vírgula cinco) e a metade mais um seria 19,5 (dezenove vírgula cinco), portanto,
seria necessário o quorum de 20 (vinte) condôminos para se ter a maioria
absoluta. Portanto, “a metade mais um” é um erro, pois a maioria absoluta, em
verdade, é 19 (dezenove).
Mas, por exemplo, se um determinado condômino detém 50%
(cinquenta por cento) do valor dos quinhões; outro condômino detém 15%
(quinze por cento); e um terceiro condômino, 25% (vinte e cinco por cento). Se o
primeiro condômino vota de uma forma, mas o segundo e terceiros condôminos
de outra, quem resolverá a questão é o Poder Judiciário, em ação movida por
qualquer dos condôminos, ouvidos os demais (§2° do art. 1.325 do Código Civil
de 2002). Outrossim, havendo dúvida quanto ao valor do quinhão, deve ser este
avaliado judicialmente (§3° do art. 1.325 do Código Civil de 2002).
Há que se ter em mente o fato de o condômino que administrar sem
oposição dos outros presume-se representante comum, ou seja, se não há um
administrador escolhido pela maioria absoluta dos condôminos e existe um dos
condôminos que faz, as vezes ou continuamente, de administrador, ele tem
mandato tácito. Em tal caso, não existe ato específico de nomeação do
administrador; um deles, porém, por sua iniciativa, assume a gestão da coisa
comum. Tal hipótese constitui, sem sombra de dúvida, de mandato tácito (art.
1.324 do Código Civil de 2002)[164] e, como tal, deve ser gratuito, salvo se
houver prévio acordo dos comunheiros nesse sentido. Assim, o condômino que
assumir a direção condominial não será administrador, mas tão-somente um
mandatário comum, uma vez que pelo mandato tácito passará a representar os
demais, devendo prestar contas de todos os seus atos, tendo direito de ser
reembolsado das despesas feitas em prol do condomínio. Seus atos de gestão
ficarão limitados à simples administração (conservação, aquisição, dentre
outros.), não tendo quaisquer poderes para alienar o bem ou conferir sua posse a
estranho sem o consenso dos demais condôminos.
Já administrador do condomínio escolhido por maioria absoluta
constitui administrador regular.
No entanto, se os condôminos não se entenderem a respeito da gestão do
condomínio, a solução final é requerer a intervenção do juiz, que nomeará um
administrador.
O administrador será remunerado, ficando sob sua responsabilidade as
atribuições compatíveis como as prestações de contas.
Ademais, alertamos que o administrador, regular ou tácito, não pode
pedir usucapião da coisa comum, pois não possui ânimo de dono (animus
domini), salvo em situações extraordinárias, em que o aludido ânimo for
demonstrado através de circunstâncias especiais.
São atribuídos ao administrador regular ou tácito os poderes de simples
administração, não podendo praticar atos que exijam poderes especiais, tais
como alienar a coisa comum, receber citações e intimações judiciais dentre
outros; pode, no entanto, alienar bens que se destinam à venda, como frutos ou
produtos de propriedade agrícola.
Quanto aos frutos da coisa comum, somente é lícito o administrador
dispor de coisas, que comumente, são destinadas à venda, tais como alienação de
frutos e produtos de uma propriedade agrícola. Por sinal, não havendo, em
contrário, estipulação ou disposição de última vontade, os frutos da coisa comum
devem ser partilhados na proporção dos quinhões (art. 1.326 do Código Civil de
2002).[165]


2.3.3.10 Extinção do condomínio tradicional, geral ou comum


É cada vez mais indiscutível que condomínio é uma verdadeira fonte de
conflitos, pois diferentes interesses convivem no meio da comunhão. A extinção
do condomínio voluntário é absolutamente natural pois o condomínio não é
agraciado com a perpetuidade. Ao revés é de sua essência, a transitoriedade.
ORLANDO GOMES DOS SANTOS já mencionava que a indivisão é estado
inorgânico, excepcional e que não deve perdurar, porque se contrapõe, à índole
econômica e social da forma natural do domínio.[166] Em vista disso, o legislador
civil facilitou à extinção do condomínio. Ademais, a faculdade de divisão da
propriedade é emanação peculiar do direito de propriedade e não se sujeitando
aos prazos prescricionais, daí o art. 1.320 do Código Civil de 2002 utilizar a
expressão “a todo tempo será lícito ao condômino exigir a divisão da coisa
comum”.[167]


2.3.3.10.1 Das formas de extinção do condomínio


Dentre as características enumeradas para o direito de propriedade, uma
delas é, certamente, o seu caráter perpétuo, o qual significa ser o bem vinculado
ao respectivo titular de tal direito, se assim for da vontade deste, por toda a sua
vida, sendo posteriormente transmitida aos seus respectivos herdeiros. Todavia,
como o condomínio é geralmente conhecido como um “manancial de discórdia e
conflito de interesses”, não é possível lhe atribuir a característica da
perpetuidade. Muito pelo contrário, a maior parte da boa doutrina tem em conta
que se trata de instituto caracterizado pela transitoriedade. Tal caráter é da sua
essência.
No entanto, a coisa comum pode ser divisível ou indivisível. Em assim
sendo, a extinção do condomínio se dá por 2 (duas) formas distintas: a) a divisão
da coisa comum: quando a coisa comum é divisível (por exemplo, uma grande
fazenda), então a qualquer momento, em ação imprescritível, o condômino pode
pedir a divisão e cada um fica com a propriedade exclusiva de uma parte
proporcional a seu quinhão (art. 1.320 do Código Civil de 2002); e b) a
alienação da coisa comum: seja a coisa comum divisível ou indivisível, pode ser
alienada a qualquer tempo para se dividir o dinheiro, e acabar com o
condomínio, fonte de discórdias (art. 1.322 do Código Civil de 2002).


2.3.3.10.1.1 Da divisão da coisa comum


A divisão do bem comum é essencialmente direito potestativo do
condômino no sentido de este poder ser exercido a qualquer tempo e
independentemente da vontade do demais (art. 1.320 do Código Civil de 2002).
Mesmo sendo direito potestativo, existem situações nas quais o condômino não
pode pretender a divisão do bem comum. Por exemplo, nas hipóteses de
condomínio necessário, como é o caso dos muros, cercas e tapumes divisórios de
prédios contíguos, não faz sentido o condômino pretender a divisão, pois os
marcos divisórios servem para garantir o “direito de tapagem” que assiste ao
titular (art. 1.297 do Código Civil de 2002).[168]
No caso de ser possível a divisão do bem comum, qualquer dos
consortes pode exigir sua divisão, inerentemente do tamanho de sua cota, e caso
não tenham estes avençado que permaneça indivisa por tempo superior a 5
(cinco) anos, passível de mais uma prorrogação por igual período (§1° do art.
1.320 do Código Civil de 2002). Com efeito, o Código Civil de 2002, no seu art.
1.320, permite que seja possível extinguir o condomínio pela divisão da coisa
comum, ao prescrever expressamente que “a todo tempo será lícito ao
condômino exigir a divisão da coisa comum, respondendo o quinhão de cada um
pela sua parte nas despesas da divisão”.
Portanto, cada condômino pode requerer a todo tempo a divisão da coisa
comum, sendo, pois, imprescritível. Isso se dá por meio da ação de divisão,
prevista nos arts. 588 a 598 do Código de Processo Civil de 2015 (procedimento
especial). No entanto deve se ter em mente que a divisão apenas declara a
porção real da propriedade correspondente à parte ideal, eis que os direitos
estão previamente estabelecidos no título que gerou a indivisão. De maneira que
faz coisa julgada formal a sentença homologatória de divisão que tem natureza
executiva. Também nada impede a divisão parcial que é factível se todos os
comunheiros forem maiores e capazes. Ademais, conforme prescreve
expressamente o art. 1.321 do Código Civil de 2002, se aplica a divisão do
condomínio as regras alusivas a partilha da herança, naquilo que couber. Assim,
as regras de partilha, no caso da divisão do condomínio, são de natureza
supletiva.
Uma vez firmada, convencionalmente, a indivisão, o acordo vige não só
entre as partes, mas também para terceiros que venham a adquirir a fração ideal
de qualquer dos comunheiros, operando-se assim como se fosse uma obligatio
propter rem [obrigação real ou aquela que nasce de um direito real do devedor
sobre determinada coisa, a que aderem, acompanhando-o em suas mutações
subjetivas]. Na forma do §§ 1º e 2° do art. 1.320 do Código Civil de 2002, se o
condomínio se formou por doação ou testamento o prazo máximo é de 5 (cinco)
anos em que não poderá sofrer alteração, sendo tal prazo improrrogável e
ineficaz qualquer imposição excedente (§1° do art. 1.320 do Código Civil de
2002). Não se pode perder de vista que, no silêncio da liberalidade, o prazo será
mesmo de 5 (cinco) anos, evitando-se que perdure a indivisão ad infinitum.
Ao questionarem, francamente, se podem os condôminos
promiscuamente renovarem sucessivas prorrogações de 5 (cinco) anos,
CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON ROSENVALD opinam no
sentido de que isto não ´possível, pois, se isto fosse possível, se acabaria de
admitir a permanência da indivisão quase infinita do bem.[169] Assim o (§1° do
art. 1.320 do Código Civil de 2002) é peremptório, somente admitindo uma
única prorrogação.
No entanto, o prazo de indivisão pode ser mitigado, se houver grave
razão, e neste caso, o juiz pode determinar a divisão antes do prazo (§3º do art.
1.320 do Código Civil de 2002). Portanto qualquer dos condôminos tem acesso
ao Poder Judiciário para demonstrar que a indivisão é atentatória a função social
da propriedade, onde reste evidenciado o estado de animosidade e desagregação
vigentes entre os condôminos, situação que constitui grave razão para o
deferimento da antecipação do fim da indivisão.
Outra questão ligada a extinção do condomínio pela sua divisão refere-se
à hipótese em que a pretensão divisória pode sucumbir pela usucapião. Com
efeito, se um dos condôminos exercer posse qualificada sobre a totalidade do
bem, e preencher os demais requisitos legais, pode, perfeitamente, usucapir a
parte ideal dos demais condôminos.

“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE
INSTRUMENTO. USUCAPIÃO. CONDOMÍNIO. SÚMULA
7/STJ. MANUTENÇÃO DA DECISÃO HOSTILIZADA PELAS
SUAS RAZÕES E FUNDAMENTOS. AGRAVO IMPROVIDO.
I- Esta Corte firmou entendimento no sentido de ser possível ao
condômino usucapir se exercer posse exclusiva sobre o imóvel.
Precedentes. II- Não houve qualquer argumento capaz de
modificar a conclusão alvitrada, que está em consonância com a
jurisprudência consolidada desta Corte, devendo a decisão ser
mantida por seus próprios fundamentos. Agravo improvido”.[170]

Visto isto, o interessado em promover a divisão da coisa comum pode
optar pelas seguintes vias para se obter tal divisão do bem: 1) divisão pela via
extrajudicial: este tipo de divisão do bem comum pressupõe acordo de vontades
entre condôminos capazes, materializado em escritura pública ou instrumento
particular, conforme o caso; 2) divisão pela via judicial: este tipo de divisão do
bem comum é obtida diretamente perante o Poder Judiciário, de maneira
forçada, nas hipóteses de litígio ou quando um dos condôminos é incapaz. O
procedimento judicial para divisão do bem comum está previsto nos arts. 588 a
598 do Código de Processo Civil de 2015; 3) divisão pela venda judicial: este
tipo de divisão do bem comum é uma forma de extinção específica do
condomínio para bens material ou juridicamente indivisíveis. Esclarecemos que
são indivisíveis os bens cujo fracionamento acarreta a alteração da substância,
diminuição considerável do seu valor ou prejuízo do uso a que se destinam (art.
87 do Código Civil de 2002).[171] Melhor exemplo de bem juridicamente
indivisível é o imóvel urbano ou rural que não pode ser fracionado em prejuízo
do módulo mínimo determinado pelas leis de loteamentos urbanos ou pelo
Estatuto da Terra (Lei n° 4.504, de 30.11.1964), respectivamente. Por via de
consequência, peculiaridade a ser ressaltada na ação de venda do bem indivisível
é a de que o comunheiro tem preferência na aquisição do bem em relação a
terceiros (art. 504 c/c art. 1.322, ambos do Código Civil de 2002). Como visto,
no plano interno, ou seja, entre os comunheiros ou condôminos, prefere o que
tiver benfeitorias de maior valor ou, na falta destas, o que tiver o maior quinhão.
Persistindo, porém, a igualdade de quinhões, surge um terceiro e último critério,
que consiste na realização de uma licitação entre estranhos e entre os
condôminos, prevalecendo, em caso de empate, o lance oferecido pelo
comproprietário (parágrafo único do art; 504 do Código Civil de 2002).


2.3.3.10.1.2 Da alienação da coisa comum


Se a coisa comum for indivisível, o juiz ao invés de promover a divisão,
ele pode promover a licitação, ou seja, vender a coisa comum, para apurar a
melhor oferta. Neste caso, os condôminos preferem aos estranhos pelo mesmo
valor.
Além disso, sendo muitos os condôminos e havendo empate entre eles,
tem preferência o condômino que tiver realizado benfeitorias de maior valor, em
respeito à função social da propriedade, e, na falta de benfeitorias, o de quinhão
maior valor. Mas, se as partes forem iguais, haverão a parte vendida os
comproprietários, que a quiserem, depositando previamente o preço (parágrafo
único do art. 504 do Código Civil de 2002).[172]
Não se desejando a divisão da coisa comum, seja pala extinção mais
cômoda, seja para se manter o valor mercado da coisa comum, o professor de
Direito pela Universidade Estácio de Sá e desembargador do Tribunal de Justiça
do Estado do Rio de Janeiro MARCO AURÉLIO BEZERRA DE MELO
esclarece que nesta hipótese vai ser indispensável a venda onerosa do bem
comum. Realmente, se não houver por parte dos condôminos o interesse em
manter o condomínio, esta será a única solução cabível, pois, como bem afirma
ele: “Se os condôminos não quiserem, ou não puderem, assumir as despesas
legadas pelo renunciante, a única solução jurídica viável será a alienação onerosa
do bem, dividindo-se proporcionalmente o preço alcançado”.[173]


2.3.3.10.2 Ação de extinção do condomínio


A ação de extinção de condomínio decorre da existência de um direito
potestativo (a possibilidade que tem um possuidor de um direito de penetrar na
esfera de direito de outro). Por isso é que se que o condomínio se dá “quando a
mesma coisa pertencer a mais de uma pessoa, cabendo a cada uma delas igual
direito, idealmente, sobre o todo e cada uma das partes”.
Isto ocrre, por exemplo, quando existe uma propriedade imóvel, que
pertence 50% (cinquenta por cento) à madrasta, 28% (vinte e oito por cento) ao
um determinado enteado e 22% (vinte e dois por cento) a outro enteado. O
condomínio pode se estender depois da partilha, porque todos querem. Mas se
apenas um dos enteados decide acabar com o condomínio, ele pode ingressar no
Poder Judiciário com a ação de extinção de condomínio, porque tem o direito de
acabar com o condomínio. Em tais casos, não é necessário a concordância dos
outros dois comproprietários.
Vale destacar que a sentença que extingue o condomínio é declaratória.
Ademais é possível extinguir o condomínio judicial ou extrajudicialmente. Mas
se houver o interesse de menor incapaz envolvido, obrigatoriamente tem que ser
extinção pela via judicial, com a presença do Ministério Público, sob pena de
nulidade.


2.4 CONDOMINIO NECESSÁRIO OU LEGAL


O condomínio necessário, forçado ou legal (ex lege) é aquele que se
forma por força de lei, sendo regulado pelos arts. 1.327 a 1.330 do Código Civil
de 2002.
Portanto, podemos dizer que o condomínio necessário, forçado ou legal
é o estabelecido por lei incidente em certos bens que permanecem em indivisão,
tais como paredes, muros, cercas e valas. A finalidade dessas obras é separar
propriedades vizinhas, presumindo-se comuns aos proprietários confiantes.
Todavia, a presunção de comunhão é relativa, pois admite prova em contrário.
As principais características do condomínio necessário são as seguintes:
a) impossibilidade de divisão (indivisão): ao contrário do condomínio
voluntário, que tem a característica marcante da transitoriedade, o condomínio
necessário não permite a divisão do bem pelos condôminos, isto é, institui-se
estado de indivisão permanente para o bem comum, que não pode ser
fracionado; b) impossibilidade de transmissão das partes ideais isoladamente:
quer dizer que não faz sentido considerar a alienação da parte ideal de um bem
submetido a condomínio forçado, como no caso dos muros e cercas divisórios ou
da parede-meia. O adquirente de determinado bem sempre tem em vista a
extração das utilidades e obtenção de frutos que este bem pode proporcionar e
não faria sentido a aquisição da meação de uma parede meia se o adquirente não
possui o bem principal, ou seja, o próprio imóvel.
Os principais exemplos apontados de bens que se sujeitam a condomínio
necessário, forçado ou legal (ex lege) são os marcos divisórios que sevem ao
exercício do direito de tapagem (§1° do art. 1.297 do Código Civil de 2002)[174] e
a parede-meia, que se relaciona com o direito de construir (art. 1.306 do Código
Civil de 2002).[175] No entanto, outros exemplos podem ser encontrados, tais
como a comunhão forçada em pastagens, a formação de ilhas (art. 1.249 do
Código Civil de 2002),[176] a comistão (arts. 1272 a 1274 do Código Civil de
2002),[177] a confusão (arts. 1272 a 1274 do Código Civil de 2002) e a adjunção
(arts. 1272 a 1274 do Código Civil de 2002), o achado do tesouro (arts. 1264 a
1.266 do Civil de 2002)[178] e o condomínio edilício (arts. 1331 a 1358 do Código
Civil de 2002 e arts. 1° a 27 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964).
Em relação aos marcos divisórios e a parede-meia, a lei presume
relativamente que existe condomínio. A presunção é relativa porque a aquisição
da meação [fração de 50% (cinquenta por cento)] depende do pagamento do
valor correspondente à metade do custo do bem. Um proprietário de terreno
contíguo tem o direito potestativo de adquirir a meação da parede-meia e se
tornar condômino dela, desde que pague o valor das despesas realizadas para a
sua construção (art. 1.328 do Código Civil de 2002).[179] Havendo divergência
em relação ao custo da obra, esta será dirimida judicialmente por perícia (art.
1.329 do Código Civil de 2002).[180]
Portanto, só existi condomínio necessário se os proprietários confinantes
erigirem obra divisória conjuntamente, ou se um erigir e o outro adquirir a
meação. Caso contrário, não haverá condomínio.
Seja qual for a modalidade de condomínio necessário ou legal, para a
relação condominial necessária também não é estabelecida a temporariedade de
existência, sendo, pois, de caráter transitório ou perpétuo. Essa espécie de
condomínio pode ser exercido de 2 (duas) maneiras distintas: a) na forma pro
diviso, para os bens que puderem ser divididos; ou ainda, a contrário senso, b) na
forma pro indiviso, ocorrerá quando a coisa ou bem não puder ser dividida.
O condomínio necessário ou legal se subdivide em nas seguintes tipos:
a) condomínio forçado; e b) condomínio fortuito, incidente ou eventual.


2.4.1 Condomínio forçado


O condomínio forçado ocorre, justamente, na situação em que
determinada coisa ou bem não pode ser dividida, como no caso da construção de
muros e cercas. Tal tipo de condomínio legal ocorre sem, ou mesmo contra a
vontade dos sujeitos.
O condomínio forçado é, portanto, aquele que se forma
imperativamente. Diante da situação ocorrida, terá o condomínio por força de
lei.
Em outras palavras, é o que a lei estabelece em relação a certos bens cuja
divisão deve ser permanentemente mantida. Por ser forçado, esse condomínio
não é necessariamente obrigatório. Com essa qualificação, significa-se que não
admite partilha. Além disso, releva notar que as partes ideais dos diversos
condôminos não podem ser transferidas isoladamente. Por fim, importante
assinalar que os direitos dos proprietários da coisa comum têm extensão maior
do que os dos condôminos voluntários, no que toca ao bem em condomínio.
Podemos citar, como exemplo, a situação em que há doação a várias
pessoas. Além disso, sempre que houver divisas, a lei forçadamente estabelece
esta modalidade de condomínio. Por sinal, segundo ORLANDO GOMES DOS
SANTOS,[181] o condomínio forçado verifica-se nos seguintes casos: a) paredes
(parede-meia), cercas, muros, tapumes e valas divisórios (arts. 1.297 e 1.298 do
Código Civil de 2002);[182] b) árvores divisórias (art. 1282 do Código Civil de
2002);[183] c) pastos e pastagens (compáscuos ou comunhão de pastagens); d)
formação de ilhas (art. 1.249 do Código Civil de 2002);[184] e) comistão,
confusão e adjunção (arts. 1.272 a 1.274 do Código Civil de 2002);[185] e f)
achado do tesouro (arts. 1.264 a 1.266).[186]
Por sinal, conforme prescreve o art. 1.327 do Código Civil de 2002, o
condomínio por meação de paredes, cercas, muros e valas regula-se pelo
disposto nos arts. 1.297, 1.298 e 1.304 a 1.307, todos do Código Civil de 2002.
[187]

No entanto, espécie relevante de condomínio forçado é a que ocorre nos


edifícios de apartamentos em relação ao solo e as partes que se destinam a
utilização comum dos moradores e, cuja regulamentação é a da Lei n° 4.591, de
16.12.1964.
Em todos esses casos a presunção de condomínio é relativa. Em sendo
assim, a parte interessada pode fazer prova em contrário, a fim de se estabelecer
que não há condomínio, como no caso em que o muro foi feito por um apenas.
Seja como for, as paredes, cercas, muros e valas que dividem uma
propriedade pertencem, em condomínio, aos proprietários confrontantes. Assim,
cada proprietário tem o dever de concorrer com metade das despesas para sua
construção ou conservação. Portanto, aquele que assume sozinho as despesas
com a obra e se instala o condomínio, este terá o direito da repartição das
despesas.
No entanto, se um dos proprietários tiver interesse em executar a obra
divisória, tem de comunicar este fato ao vizinho para conseguir acordo a respeito
da divisão das despesas. Caso não obtenha a anuência do vizinho, deve ingressar
em juízo. Se houver omissão de tais formalidades e, apesar disso, o interessado
construir o tapume, há previsão legal no sentido de que, quem o fez a sua custa
deve possuí-la por inteiro, mas o confinante terá o direito de adquirir meação
nela, desde que embolse o seu autor da metade do valor atual, bem como do
terreno por ela ocupado (art. 1.328 do Código Civil de 2002).[188] Portanto, o
dono do prédio confinante terá direito à meação nas paredes, muros, valas, não
podendo o vizinho que os construiu a suas expensas recusá-la se o outro a
indenizar. Mas, se não chegarem os proprietários vizinhos a um entendimento
sobre o preço, este será arbitrado por peritos, expensas de ambos os confinantes,
e, segundo o que for decidido, instituir-se-á o condomínio. Não havendo
concordância entre os vizinhos, o valor da obra será, portanto, estipulado por
meio de arbitramento e rateado entre eles (art. 1.329 do Código Civil de 2002).
[189]
De maneira que o direito de haver a meação é imprescritível e insuscetível de
ser adquirido por usucapião, pois o art. 1.330 do Código Civil de 2002,[190] veda
ao vizinho o uso da parede, cerca, muro ou vala, enquanto não adquirir a
meação, mediante pagamento ou depósito.[191]


2.4.2 Condomínio fortuito, incidente ou eventual


O condomínio fortuito, incidente ou eventual, ao contrário, é aquele que
se forma aleatoriamente, isto é, surge por motivos estranhos à vontade dos
condôminos. Segundo ORLANDO GOMES DOS SANTOS, caracteriza-se,
pois, pela ausência de intenção e por ser provisório. De fato, a indivisão
hereditária é realmente uma situação provisória.[192] Por sinal o princípio da
indivisibilidade da herança encontra-se prescrito no art. 1.791 do Código Civil
de 2002.[193]
Ocorre, justamente, quando estabelecida pela relação entre herdeiros
quando da abertura do testamento para dar início ao processo da sucessão
hereditária, sendo finalizado o condomínio ao término da partilha.
Com efeito, na sucessão hereditária ocorre o condomínio fortuito porque
não se sabe quem irá receber primeiro a herança.

“CIVIL E PROCESSO CIVIL – AÇÃO DE EXTINÇÃO DE
CONDOMÍNIO C/C ALIENAÇÃO JUDICIAL DE BEM
IMÓVEL – EXISTÊNCIA DE INVENTÁRIO DO ESPÓLIO
DA PROPRIETÁRIA ANTERIOR DO IMÓVEL – AUSÊNCIA
DE REGISTRO DO FORMAL DE PARTILHA – FALTA DE
PRESSUPOSTO PROCESSUAL. 1. Quando um dos
coproprietários do imóvel indiviso já é falecido e há processo de
inventário em curso, como no presente caso, o registro do Formal
de Partilha na matrícula do imóvel é pressuposto processual para
a ação de extinção do condomínio de propriedade comum c/c
alienação judicial do imóvel, já que não há que se falar em
propriedade imobiliária dos herdeiros do de cujus sem a
necessária transcrição do documento que contém a sua
transferência no Cartório do Registro Imobiliário. 2. Nada
obstante o princípio de saisine, que rege o direito sucessório,
mesmo que formalmente constituído o condomínio entre os
sucessores legítimos/testamentários da de cujus com relação ao
bem imóvel em questão, impossível a alienação do bem a
terceiros sem que antes seja o mesmo inventariado e registrado o
respectivo formal de partilha perante a serventia competente, pois
a propriedade do imóvel, embora já transmitida aos herdeiros
pela morte da autora da herança, não poderá ser retransmitida a
terceiros (objetivo último da ação com a alienação judicial do
imóvel) sem que antes seja regularizada perante o Registro
Imobiliário, até mesmo em respeito ao requisito da continuidade,
sendo vedado o salto na cadeia de registros/averbações na
matrícula do imóvel. 3. O caso é, pois, de extinção do processo
por falta de pressuposto de desenvolvimento válido e regular do
processo”.[194]










CAPÍTULO III – CONDOMÍNIO
EDILÍCIO OU POR UNIDADES
AUTÔNOMAS

3.1 DEFINIÇÃO DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO OU
POR UNIDADES AUTÔNOMAS


Como visto no capítulo I desta obra, o termo em português
“condomínio” deriva do latim condominium, cujo termo é composto do prefixo
cum (que significa “com”) e de dominium (que significa “autoridade”). Portanto,
condomínio serve para designar influência ou soberania exercida em comum por
dois ou mais indivíduos, ou seja, o poder ou a propriedade exercida por mais de
um dono. Vale acrescentar que a palavra latina dominium está relacionada com
dominus, o qual significa soberano, autoridade e poder.
Certamente o termo “condomínio” sofreu significativa evolução ao
longo dos séculos, mas sem perder o significado primitivo. Com efeito,
atualmente ele tem também serve para exprimir despesas comuns pagas por
todos os moradores de um edifício ou de um conjunto de edifícios. No seu
sentido técnico, a palavra “condomínio”, segundo a legislação civil brasileira em
vigor, diz respeito ao direito exercido por mais de uma pessoa sobre a mesma
coisa (objeto coletivo ou coisa comum). No entanto, o termo é frequentemente
utilizado para definir o direito exercido por condôminos sobre suas unidades
condominiais e sobre as áreas de uso comum em edificações verticais bem como
horizontais.
O condomínio edilício é uma verdadeira interação orgânica entre duas
espécies de propriedade que se formam e mantem-se necessariamente juntas; é
um mix (mistura) entre propriedade individual e propriedade coletiva. De fato,
todo o condomínio edilício é necessariamente formado por unidades autônomas
(propriedade individual) e partes comuns (propriedade coletiva). Aplicam-se as
regras do condomínio edilício para vilas de casas, complexos empresariais, etc.
Portanto, não precisa ser um prédio. Não se admite separação das unidades
autônomas (propriedade individual) das partes comuns (propriedade coletiva),
pois se houver essa divisão, importa em extinção do condomínio edilício.
Inclusive, a doutrina brasileira, com alguma simpatia na jurisprudência, já
admite a existência no mundo jurídico do condomínio de fato, ou seja, aquele
que se forma por interesses comuns de proprietários autônomos (por exemplo,
ruas fechadas, etc).
Alertamos que o edifício pertencente a um só proprietário não é
condomínio.
Com efeito, tomemos o seguinte exemplo: os moradores de um edifício
desejam escolher um sindico ou administrador, pois não concordam com os
aumentos das taxas que vem sendo cobradas, o que atribuem ao fato de ser a
administração exercida por um cidadão, que é proprietário de todas as unidades.
Não se pode perder de vista que tal situação está fora dos efeitos da Lei n
° 4.591, de 16.12.1964, e dos arts. 1.331 a 1.358 do Código Civil de 2002, que
regem o condomínio edilício, pois quando se fala em “condomínio” pressupõe a
existência de mais de um proprietário sobre a mesma coisa e não mais de um
morador dentro do mesmo prédio. Portanto, tal situação se enquadra na esfera da
Lei do Inquilinato, ou seja, o proprietário é o único dono do prédio de
apartamentos e tem o direito de impor condições previstas na Lei do Inquilinato
e nos respectivos contratos de locação, principalmente dividir entre os inquilinos
ou moradores os gastos de manutenção, conservação, empregados, impostos
previdenciários e outros. Os inquilinos aceitaram tais condições. Se ocorrer
abuso ou dolo, resta aos inquilinos ou moradores recorrer ao Poder Judiciário
para sanar tal situação irregular. No entanto, é incabível em tal situação realizar
“assembleia” ou “destituir síndico ou administrador”.[195]
Outra questão que gera muita discussão é se a cobertura e a garagem e
seu horário de funcionamento fazem parte da área comum do condomínio.
Em relação à cobertura ou terraço, a regra geral é que, no silencio do
ato constitutivo do condomínio, a cobertura constitui efetivamente área comum,
repetindo, salvo disposição em contrário no ato de criação do condomínio. Se
um dos condôminos eventualmente desejar adquirir a parte comum, será possível
se houver decisão unânime dos demais condôminos. Assim, se um dos
condôminos não quiser anuir a tal aquisição, não pode ser efetivada a venda,
salvo se a recusa for abusiva (art. 187 do Código Civil de 2002),[196] caso em que
se soluciona a questão pelo suprimento judicial.

“RECURSO ESPECIAL - PRETENSÃO DE ANULAR
ASSEMBLEIA CONDOMINIAL QUE,POR MAIS DE DOIS
TERÇOS DOS VOTOS, EXPLICITOU A IMPOSSIBILIDADE
DE O USO EXCLUSIVO DE ÁREA COMUM (TERRAÇO)
SER TRANSMITIDO A TERCEIROS,ASSIM COMO IMPÔS
CONTRIBUIÇÃO PECUNIÁRIA PELO EXERCÍCIO DE TAL
DIREITO, DE MODO A ALTERAR SITUAÇÃO
CONSOLIDADA POR MAIS DE TRINTA ANOS -
RECONHECIMENTO DA IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO
PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. INSURGÊNCIA DOS
DEMANDANTES. 1. Hipótese em que os condôminos,
proprietários da unidade mais alta do edifício, a quem foram
conferidos o uso exclusivo de área comum (terraço) por ocasião
da especificação condominial - cujo exercício prolonga-se por
mais de trinta anos -, pretendem o reconhecimento da nulidade da
assembleia de condomínio que, por mais de dois terços dos votos,
explicitou a impossibilidade de transmissão de tal direito por ato
inter vivos ou causa mortis, bem como impôs contribuição não
inferior à taxa condominial pelo correlato exercício. 1.1. Ação
julgada improcedente pelas instâncias ordinárias, ao fundamento
de que as alterações, além de se encontrarem arrimadas em
quorum legal suficiente, não obstaram o uso da área comum,
conforme concedido no ato instituidor. 1.2. A mera explicitação
de que o uso exclusivo do terraço não é transmissível a terceiros,
além de convergir com a natureza transitória do instituto, não
frustra qualquer expectativa do condômino beneficiado.
Entretanto, a superveniente exigência de uma remuneração pelo
uso (não inferior à taxa condominial), após o transcurso de mais
de trinta anos de exercício sem contraprestação de ordem
pecuniária (apenas de conservação e manutenção) destoa da boa-
fé objetiva que deve permear as relação jurídica sub judice. 2. A
destinação da área comum, em princípio, é definida
necessariamente pela convenção condominial, de modo a refletir,
naquele momento, a vontade dos condôminos. Tal destinação, é
certo, pode ser eventualmente alterada por meio de assembleia,
denotando, assim, além da transitoriedade de tal estipulação, a
necessária atuação dos demais envolvidos de modo a viabilizar o
exercício do direito (Artigos 1351 do Código Civil e 9º da Lei n.
4.591/61). Assim, não se afigura possível atribuir feições de
direito real ao uso exclusivo de área comum. A alteração da
convenção de condomínio, apenas explicitando que o direito de
uso privativo do terraço não poderá ser transferida por ato
intervivos ou causa mortis, além de não frustrar qualquer
expectativa do condômino beneficiado, já que preserva o direito
de uso enquanto perdurar a sua propriedade, é consentânea com a
própria natureza transitória do instituto. Do contrário, estar-se-ia
consolidando, em verdade, os direitos inerentes à propriedade de
área comum nas mãos de um dos condôminos, o que destoa dos
contornos gizados no § 2º do artigo 1331 do Código Civil. 3. Em
se tratando de relação contratual sui generis, o comportamento
dos contratantes deve, igualmente, pautar-se pelos princípios da
probidade e da boa-fé objetiva, com observância destacada dos
deveres de lealdade e de confiança entre si. 3.1. Nessa medida, a
alteração do direito de uso exclusivo de área comum conferido a
algum condômino somente se aperfeiçoará se não frustrar as
legítimas expectativas auferidas pelas partes envolvidas,
provenientes não só da conclusão do contrato (convenção), como
também de sua execução (Artigo 422 do Código Civil). 3.2. A
superveniente imposição de pagamento de determinada quantia
não só limita ou condiciona o uso do terraço, alterando, por si só,
uma situação inegavelmente consolidada no tempo (trinta anos),
mas também, a considerar o valor da contraprestação, pode, por
via transversa, perfeitamente inviabilizar o próprio exercício do
direito subjetivo de uso conferido aos condôminos beneficiados.
3.3. A legítima perspectiva dos proprietários beneficiados,
consistente no uso privativo e permanente do terraço,
responsabilizando-se, tão-somente, pelas despesas provenientes
desta área (conservação, limpeza, etc), é oriunda do proceder
convencional do condomínio, que, durante longos e seguidos
anos, reconheceu a suficiência da contraprestação assim exigida,
deixando (ou renunciando tacitamente) de exercer o direito de
instituir a pretendida contribuição de ocupação. 4. Recurso
Especial parcialmente provido”.[197]

“PROCESSUAL. CIVIL. CONDOMÍNIO. ÁREA COMUM.
UTILIZAÇÃO EXCLUSIVA. USO PROLONGADO.
AUTORIZAÇÃO DA ASSEMBLEIA CONDOMINIAL.
PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. RAZÃO
PONDERÁVEL. INOCORRÊNCIA. - Detenção concedida pelo
condomínio para que determinado condômino anexe à respectiva
unidade, um fundo de corredor inútil para uso coletivo.
Decorrido longo tempo e constatada a boa-fé, o condomínio, sem
demonstrar fato novo, não pode retomar a área objeto da
permissão”.[198]

Em relação à garagem, existem 3 (três) diferentes regimes jurídicos para
ela: 1º) a garagem é área comum: neste caso o seu uso é definido pela
convenção. Na verdade, nesta hipótese, tecnicamente nem se poderia falar em
garagem, mas sim, estacionamento. Por sinal, se a área é comum, a convenção
pode modificar a qualquer tempo o modo de uso do estacionamento. Outrossim,
pode ensejar a supressão se eventualmente se criou ao condômino a expectativa
justa dele usar aquela garagem indefinidamente; 2º) a garagem é acessório da
unidade autônoma: neste caso, quando se adquire a unidade autônoma, ela vem
acompanhada da garagem (o acessório segue o principal). Define-se esta
situação pela previsão expressa da garagem na matrícula imobiliária da unidade
autônoma no Registro Geral de Imóveis; 3º) a garagem é unidade autônoma:
nesta hipótese, a garagem foi adquirida de forma autônoma. Esta garagem, que
foi adquirida autonomamente, pode ser vendida normalmente.
No entanto, só se sabe ao certo o regime da garagem de acordo com o
que consta no ato de constituição do condomínio. É preciso verificar o referido
ato para saber qual o regime jurídico da garagem.
Em relação ao aluguel de garagem, podemos dizer que é perfeitamente
possível alugar uma determinada garagem, salvo disposição contrária na
convenção do condomínio. No entanto, em tais casos, o art. 1.338 do Código
civil de 2002 [199]assegura o direito de preferência dos condôminos em relação ao
terceiro estranho ao condomínio. Portanto, Permitindo o aluguel de garagem, os
condôminos terão preferência a terceiros.
Ademais, lembramos que o terreno em que se levantam a edificação ou o
conjunto de edificações e suas instalações, bem como as fundações, paredes
externas, o teto, as áreas internas de ventilação, e tudo o mais que sirva a
qualquer dependência de uso comum dos proprietários ou titulares de direito à
aquisição de unidades ou ocupantes, constituirão condomínio de todos, e serão
insuscetíveis de divisão, ou de alienação destacada da respectiva unidade
autônoma (art. 3° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964).[200]


Outra questão que tem sido objeto de muitos debates é se as áreas
comuns de um determinado condomínio edilício estão sujeitas à usucapião. A
princípio se as áreas comuns são “insuscetíveis de divisão, ou de alienação
destacada da respectiva unidade autônoma”, evidentemente não poderia ser
objeto de aquisição pela usucapião. No entanto, a jurisprudência tem admitido
tal espécie de coisas.
Com efeito, apesar de insuscetível de usucapião a área comum de
condomínio edilício, o Superior Tribunal de Justiça – STJ vem admitindo o
supressio em relação a área comum de condomínio edilício.

“CIVIL. CONDOMÍNIO. É POSSÍVEL A UTILIZAÇÃO,
PELOS CONDÔMINOS, EM CARÁTER EXCLUSIVO, DE
PARTE DE ÁREA COMUM, QUANDO AUTORIZADOS POR
ASSEMBLEIA GERAL, NOS TERMOS DO ART. 9º, § 2º, DA
LEI Nº 4.591/64. ADECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM,
BASEADA NO CONJUNTO PROBATÓRIO, NÃO PODE SER
REEXAMINADA, EM FACE DA SÚMULA 7/STJ. 1. O
Tribunal a quo decidiu a questão com base nas provas dos autos,
por isso a análise do recurso foge à mera interpretação da Lei de
Condomínios, eis que a circunstância fática influi na solução do
litígio. Incidência da Súmula 07/STJ. 2. O alcance da regra do
art. 3º, da Lei nº 4.591/64, que em sua parte final dispõe que as
áreas de uso comum são insuscetíveis de utilização exclusiva por
qualquer condômino", esbarra na determinação da própria lei de
que a convenção de condomínio deve estabelecer o "modo de
usar as coisas e serviços comuns", art. 3º, § 3º, c, da mencionada
Lei. Obedecido o quorum prescrito no art. 9º, § 2º da Lei de
Condomínio, não há falar em nulidade da convenção. 3.
Consoante precedentes desta Casa: ‘o princípio da boa-fé
objetiva tempera a regra do art. 3º da Lei nº 4.591/64’ e
recomenda a manutenção das situações consolidadas há vários
anos.(REsp nºs. 214680/SP e 356.821/RJ, dentre outros). Recurso
especial não conhecido”.[201]

“Processual Civil. Civil. Recurso Especial. Prequestionamento.
Condomínio. Área comum. Utilização. Exclusividade.
Circunstâncias concretas. Uso prolongado. Autorização dos
condôminos. Condições físicas de acesso. Expectativa dos
proprietários. Princípio da boa-fé objetiva. - O Recurso Especial
carece de prequestionamento quando a questão federal suscitada
não foi debatida no acórdão recorrido. - Diante das circunstâncias
concretas dos autos, nos quais os proprietários de duas unidades
condominiais fazem uso exclusivo de área de propriedade
comum, que há mais de 30 anos só eram utilizadas pelos
moradores das referidas unidades, pois eram os únicos com
acesso ao local, e estavam autorizados por Assembleia
condominial, tal situação deve ser mantida, por aplicação do
princípio da boa-fé objetiva”.[202]

Se o condomínio gera uma expectativa em relação a determinado
condôminio, no sentido de usar a área comum, ocorre a supressio (abuso do
direito, ou seja, conduta ilícita daquele que criou a expectativa em determinada
pessoa de exercer um direito no lugar de outrem). O supressio é a proibição de se
criar expectativas ilegais. Não se discute o elemento subjetivo (intenção de
causar o dano).
Ademais, é possível se adquirir por usucapião área comum no
condomínio comum ou tradicional, desde que um dos condôminos estabeleça
posse com exclusividade, afastando os demais e sem prestar contas para
ninguém.


3.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONDOMÍNIO
EDILÍCIO


O condomínio edilício, que também é conhecido como condomínio por
unidades autônomas, condomínio em plano horizontal, propriedade coletiva
horizontal, condomínio sui generes, condomínio por andares ou, ainda,
“condomínio em edifícios de andares ou apartamentos pertencentes a
proprietários diversos”, é uma modalidade especial de condomínio necessário
que surgiu depois da 1ª Guerra Mundial (1914-1918), em razão da grave crise de
habitacional na ocasião, que provocou um desequilíbrio entre a oferta e a
procura, agravada por uma legislação de emergência sobre as relações de
locação, de certa maneira protraída e numero reduzido de construções e poderia
associar a esses fatores a implementação das atividades nas indústrias e também
o êxodo rural.[203]
Com o objetivo de amenizar tal situação, sobretudo, nas grandes cidades
com o aumento da população, gerando dificuldades na habitação e circulação,
surgiu o condomínio em edifícios de apartamentos. Esta substancial aceitação
ocorreu em virtude de 3 (três) fatores distintos: 1°) devido ao melhor
aproveitamento do solo, redundando, consequentemente, menores custos nas
construções. Esse tipo de empreendimento foi de grande aceitação no passado e
permanece assim até os dias atuais; 2°) as construções em edificação tornaram-
se mais econômicas, diminuindo a elevação do custo de vida com a coesão na
aquisição de grandes quantidades de materiais; 3°) passou a haver maior
facilidade na obtenção da casa própria, que a todos interessa fomentar, como
poderoso elemento de coesão familiar.[204] Segundo ANTONIO BUTERA, todo
homem deve cultivar a idéia de tornar-se proprietário da casa que habita. A
disseminação dos prédios de apartamentos, de certa forma, veio favorecer a
realização desse ideal;[205] 4°) com sua edificação, se possibilitou a fixação dos
respectivos donos nas imediações dos locais de trabalho.
Acrescenta WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO que, com o
decurso do tempo, a nova modalidade de condomínio obteve geral aceitação. Os
arranha-céus foram surgindo por toda parte. Tanto nos arrabaldes como nos
centros urbanos, conjuntos arquitetônicos e maciços, de grande envergadura,
ergueram-se do solo vazio numa rapidez de tirar o fôlego, imprimindo às cidades
aspecto grandioso e imponente. Nos dias atuais, esses edifícios, cada vez mais
altos, cada vez mais numerosos, se erguem de todos os lados, tanto para fins
residenciais, como para fins empresariais. Moradias, escritórios, hotéis, oficinas,
neles se instalam, podendo dizer-se que, atualmente, o progresso de uma cidade
se mede pelo seu sentido vertical.
Segundo ainda ele, o Código Civil de 1916 (Lei n° 3.071, de
01.01.1916), embora promulgado em plena 1ª Guerra Mundial, não teve intuição
do que viria a suceder em tal matéria. Por isso, amplamente justificável não se
encontrar entre suas disposições qualquer referência ao condomínio em prédios
de muitos pavimentos. De maneira que, nas suas origens, o “condomínio em
edifícios de andares ou apartamentos pertencentes a proprietários diversos”
passaram a serem disciplinados pelos usos e costumes, bem como pelas
disposições analógicas do condomínio geral (voluntário).
No entanto com o vertiginoso crescimento das edificações, fossem elas
residenciais ou empresariais, e devido a importância social e econômica, tornou-
se premente a elaboração de uma lei que regulasse as relações pertinentes a elas.
Assim, na segunda metade da década de 1920, foi emitido o Decreto n° 5.481, de
25.06.1928, que dispunha sobre a alienação parcial dos edificios de mais de
cinco andares, o qual tratava da disciplina do condomínio em prédios de muitos
pavimentos em seus arts. 2°, 4°, 5°, 6°, 8°, 9° e 10.[206] Todavia, relata JOSE
CANDIDO PIMENTEL DUARTE que na ocasião de sua emissão corria o
comentário de que o Decreto n° 5.481, de 25.06.1928, visava a proteger certo
capitalista que investira vultuosos capitais em imóveis.[207] Inclusive, o
respectivo projeto foi combatido no Congresso Nacional por Francisco Morato.
[208]
Posteriormente, o Decreto n° 5.481, de 25.06.1928, foi modificado pelo
Decreto-Lei n° 5.234, de 08.02.1943 (modificou o art. 1° do referido Decreto), e
pela Lei n° 285, de 05.06.1948 (modificou a redação do art. 1º do Decreto nº
5.481, de 25.06.1928, e revogou o Decreto-Lei n° 5.234, de 08.02.1943). Seja
como for, tais normas organizaram originariamente o disciplinamento jurídico do
condomínio em prédios de muitos pavimentos, sendo estas completadas por
outras disposições normativas avulsas, depois revogadas pela Lei n° 4.591, de
16.12.1964 (dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações
imobiliárias), com alterações da Lei n° 4.864, de 29.11.1965 (cria medidas de
estímulo à Indústria de Construção Civil).
No entanto, relata o magistrado, jurista e político brasileiro JOSÉ
PHILADELPHO DE BARROS E AZEVEDO (Rio de Janeiro, 13.03.1894 –
Haia, 07.05.1951) que as disposições sobre condomínio em edificações trazidas
pela vigência da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, foi, inicialmente, recebida com
certa desconfiança, pois temiam-s prováveis conflitos econômicos entre os
diversos proprietários, com inevitável repercussão na esfera judiciária.
Imaginou-se, realmente, que tais disposições se converteriam em fonte de
choques e de atritos. No entanto, tudo isto foi um falso alarme, pois não se
confirmaram esses prognósticos e relativamente poucos são os litígios oriundos
de prédios horizontalmente fracinados em partes autônomas e determinadas.
Entretanto, segundo JOSÉ PHILADELPHO DE BARROS E AZEVEDO, a
relativa promiscuidade nos babélicos edifícios de apartamentos trouxe vários
inconvenientes, porquanto neles maior se torna o devassamento do lar, cuja
intimidade pode ser ameaçada em muitos sentidos.[209]
A partir de 2003, o Código Civil de 2002 introduziu modificações
quanto à matéria referente ao condomínio, em relação ao seu antecessor (Código
Civil de 2016) e a principal novidade é justamente tratar também do condomínio
horizontal, objeto da contido na Lei n° 4.591, de 16.12.1964. O Código Civil de
2002 incluiu tais no capítulo VII (“Do Condomínio Edilício”) do Título III (“Da
Propriedade”) do Livro III (“Do Direito das Coisas”). Inclusive, o atual Código
Civil apresenta nova nomenclatura para o instituto, agora denominado de
“condomínio edilício”. De maneira que o condomínio edilício ou condomínio em
edificações é regulado, atualmente, pelos artigos 1331 a 1358 do Código Civil de
2002. Entretanto, não se pode olvidar que as disposições contidas no Código
Civil de 2002 sobre condomínio edilício não afastaram de nosso ordenamento
jurídico a Lei n° 4.591, de 16.12.1964, que se aplica quando a matéria nele
contida não estiver disciplinada no Código Civil de 2002.


3.3 NATUREZA JURÍDICA DO CONDOMÍNIO
EDILÍCIO


Esclarece WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO que são diversas
as teorias que tem por objetivo explicar a natureza jurídica do condomínio
edilício, ou seja, as relações que se estabelecem entre os proprietários das várias
unidades autônomas existinte na edificação.
Com efeito, ANTONIO BUTERA se ocupa pormenorizadamente de tais
[210]
teorias. Ele menciona que elas são as seguintes: 1) teoria acéfala: segundo
esta teoria se nega a existência de verdadeira propriedade no condomínio
edilício; 2) teoria das servidões: segundo esta teoria surgida no direito francês,
condomínio edilício se assemelha à uma servidão [direito real sobre imóvel
alheio (fração ideal) que se constitui em proveito de uma propriedade coletiva,
chamada de dominante, sobre outras propriedades individuais, denominadas
servientes, pertencentes a proprietários diferentes]; 3) teoria do direito de
superfície: segundo esta teoria surgida no direito alemão, condomínio edilício
está compreendido na parte relativa ao direito de superfície; 4) teoria da pessoa
coletiva ou jurídica: segundo esta teoria, no condomínio edilício ocorre a
existência de pessoa coletiva ou jurídica, proveniente da reunião dos vários
proprietários;[211] 5) teoria da associação ou associação de fato: segundo esta
teoria o condomínio edilício é instituído pela associação de fato de vários
proprietários individuais; 6) teoria da comunidade de direito: segundo esta teoria
o condomínio edilício é essencialmente uma comunidade de direito, de que são
titulares várias pessoas, incidindo sobre o mesmo objeto; 7) teoria da comunhão
relativa: esta teoria é defendida por MARCEL PLANIOL e GEORGES RIPERT,
os quais mencionam que, nos edifícios de andares ou apartamentos pertencentes
a proprietários diversos existe superposição de propriedades distintas e
separadas, complicada pela existência de comunhão relativa a determinadas
dependências de uso comum dos diversos proprietários;[212] 8) teoria da mistura
de propriedade exclusiva e condomínio: esta teoria é defendida por GABRIEL
BAUDRY-LACANTINERIE, o qual escreve que, considerando o aspecto
extravagante do condomínio edilício, defende-se que nele coexiste uma mistura
de propriedade exclusiva (unidades autônomas) e de condomínio (áreas
comuns).[213] Por sinal, FRANCISCO CAVALCANTI PONTES DE MIRANDA
também é adpto de tal teoria, pois menciona que no condomínio edilício há
misto de comunhão e de não comunhão, de divisão e de indivisão.[214]
A posição mais aceita é a da teoria da comunidade de direito, ou seja,
aquela que sustenta qure o condomínio edilício é uma comunidade de direito de
que são titulares várias pessoas, incidindo sobre o mesmo objeto. Neste sentido,
é possível se sustentar que, nos edifícios de andares ou apartamentos
pertencentes a diferentes proprietários, existem áreas privativas e áreas comuns.
Áreas comuns abrangem o solo em que a edificação foi construída, as suas
fundações, as pilastras, os tetos, os vestíbulos, as escadas, os elevadores, os
pátios, em suma, todo espaço destinado a uso comum dos diversos proprietários.
De maneira que todo proprietário de unidade autônoma pode usar as áreas de uso
comum, segundo sua destinação de origem, desde que não prejudique a
coletividade. Já a área privativa corresponde aos apartamentos, também
referenciados como unidades autônomas, delimitadas pelas paredes divisórias,
onde incide o direito de propriedade uno, exclusivo e quase absoluto.
Em assim sendo, fundem-se no instituto do condomínio edilício, 2 (duas)
modalidades de propriedades distintas: a) a propriedade individual de utilização
exclusiva; e b) a propriedade de uso coletivo, onde ambas devem submeter-se ao
conceito de condomínio que pressupõe o exercício do direito de domínio por
mais de um dono, simultaneamente. Portanto, estão reunidos numa só figura
jurídica o conceito de propriedade e o conceito de concopropriedade, ou seja, o
mesmo indivíduo é ao mesmo tempo titular de uma propriedade individual
(propriedade exclusiva) e de uma copropriedade (propriedade coletiva).
Com efeito, a exclusividade da propriedade individual ocorre
exatamente quando o uso, o gozo, ou disposição não dependem da anuência de
nenhum outro condômino, salvo no que tange à alienação ou locação de
garagens prevista no art. 1.338 do Código Civil de 2002.[215] A exclusividade da
propriedade individual é personificada nas propriedades autônomas como
apartamento, salas, escritórios, lojas, sobrelojas ou abrigos para veículos, com as
respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns (§1° do art. 1.331
do Código Civil de 2002, com redação dada pela Lei n° 12.607, de 04.04.2012).
[216]
A propriedade comum é aquela advinda de áreas comuns, onde, segundo o
§2° do art. 1.331 do Código Civil de 2002, podem ser utilizadas por todos os
condôminos, na medida da sua destinação.
Ainda dentro do tema natureza jurídica, devemos destacar que o
condomínio edilício escapa a regra da gravitação, ou seja, foge a regra de que o
acessório segue o principal. Se eventualmente um terceiro tiver um direito real
sobre o solo, ele não adquire o condomínio. Melhor exemplo disso é a
relativização do direito de hipoteca. Pode haver o direito de hipoteca sobre o
terreno, mas não sobre o prédio. Em relação ao recebimento do crédito, temos a
situação em que a hipoteca não será executada; será feita então a recuperação do
crédito por meio da indenização por perdas e danos. Isso ocorre muito no caso
de construtoras de prédios, quando elas hipotecam o terreno para poder construir
o prédio. Essa já é dominante no Superior Tribunal de Justiça – STJ, o qual
emitiu a Súmula nº 308: “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente
financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda,
não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”.[217]


3.4 DA PERSONALIDADE JURÍDICA DO
CONDOMÍNIO EDILÍCIO


A doutrina e jurisprudência atualmente têm considerado que a
comunidade condominial de natureza real dúplice não pode ser considerada
simplesmente pessoa jurídica, entendendo que lhes faltam vários requisitos. No
entanto, tal entendimento nos parece inconcebível, principalmente por que a lei
em si não se manifesta expressamente nesse sentido, muito pelo contrário,
admite o exercício de direitos que somente podem ser efetivados por pessoa
dotada de personalidade jurídica (adquirir patrimônio imobiliário, etc.).
Com efeito, para esta corrente doutrinária e jurisprudencial dos dias de
hoje, o condomínio edilício não tem personalidade jurídica. É ente
despersonalizado, razão pela qual, não tem direitos de personalidade e, por conta
disso, não pode sofrer dano moral.

“CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONDOMÍNIO. DANOS
MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE
PERSONALIDADE JURÍDICA. O condomínio não possui
personalidade jurídica de direito material, pois sua natureza
jurídica é tratada como uma massa patrimonial. Por certo que a
legislação reconhece que o condomínio possui capacidade de ser
parte no processo. A personalidade judiciária é a aptidão para, em
tese, ser sujeito da relação jurídica processual. Ora, o dano moral
representa uma violação à direito da personalidade, e se o autor
não possui personalidade jurídica de direito material, não pode
sofrer, em tese, danos morais. Ainda que se estabelecesse uma
analogia com as pessoas jurídicas de direito privado, o
condomínio autor não sofreria dano moral no presente caso.
Precedentes do TJERJ. Recurso manifestamente improcedente.
Seguimento negado”.[218]

Apesar de uma parte da jurisprudência negar a personalidade jurídica ao
condomínio edilício, ela mesma é forçada a reconhecer que este deve ter o
mesmo tratamento conferido à pessoa jurídica.

“CONDOMÍNIO. EQUIPARAÇÃO À PESSOA JURÍDICA.
DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE
PROVA DE OFENSA À HONRA OBJETIVA. PRECEDENTES
DO STJ. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL
DESPROVIDO. I. É ilegítima a suspensão do fornecimento de
energia elétrica, quando o débito decorrer de suposta fraude no
medidor de consumo de energia, apurada unilateralmente pela
concessionária. Precedentes do STJ. II. Embora o condomínio
não possua personalidade jurídica, deve-lhe ser assegurado o
tratamento conferido à pessoa jurídica, no que diz respeito à
possibilidade de condenação em danos morais, sendo-lhe
aplicável a Súmula 227 desta Corte, in verbis: ‘A pessoa jurídica
pode sofrer dano moral’. III. O acórdão recorrido encontra-se em
consonância com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que
a pessoa jurídica pode sofrer dano moral - no caso, o Condomínio
-, desde que demonstrada ofensa à sua honra objetiva. IV. O
Tribunal a quo concluiu, em face das premissas fáticas firmadas
pelo acórdão de origem, que não houve ofensa à honra objetiva
do agravante, ou seja, à sua imagem, conceito e boa fama, de
modo que a revisão de tal entendimento demandaria,
inequivocamente, incursão na seara fático-probatória dos autos,
inviável, na via eleita, a teor do enunciado sumular 7/STJ. V.
Consoante a jurisprudência do STJ, ‘o mero corte no
fornecimento de energia elétrica não é, a princípio, motivo para
condenação da empresa concessionária em danos morais,
exigindo-se, para tanto, demonstração do comprometimento da
reputação da empresa. No caso, a partir das premissas firmadas
na origem, não há fato ou prova que demonstre ter a empresa
autora sofrido qualquer dano em sua honra objetiva, vale dizer,
na sua imagem, conceito e boa fama. O acórdão recorrido firmou
a indenização por danos morais com base, exclusivamente, no
fato de que houve interrupção no fornecimento do serviço
prestado devido à suposta fraude no medidor, que não veio a se
confirmar em juízo. Com base nesse arcabouço probatório, não é
possível condenar a concessionária em danos morais, sob pena de
presumi-lo a cada corte injustificado de energia elétrica, com
ilegítima inversão do ônus probatório’ (STJ, REsp 1.298.689/RS,
Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe de
15/04/2013). VI. Agravo Regimental desprovido”.[219]

No entanto, o direito brasileiro é um dos poucos, senão o único que não
confere personalidade jurídica ao condomínio edilício.
Por outro lado, somos levados a alertar o leitor desavisado que não se
pode confundir personalidade com capacidade para exercer direitos. De fato,
apesar de esta corrente doutrinária e jurisprudencial advogar que o condomínio
edilício não tem personalidade, ela, em contradição, sustenta ser ele,
indiscutivelmente, um patrimônio personalizado, com capacidade processual,
com capacidade de realizar titulações, com capacidade de exercer certos direitos,
etc. Tanto é que o inciso XI do art. 75 do Código de Processo Civil de 2015
declara expressamente que o condomínio deve ser representado em juízo, ativa e
passivamente, pelo seu administrador.[220] Portanto, independentemente de ter ele
personalidade jurídica ou não, o condomínio goza de plena capacidade
processual, tanto ativa como passiva.
Outrossim, apesar de o § 3º do art. 63 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,[221]
expressamente, prescrever a viabilidade do registro de escrituras públicas e/ou
carta de adjudicação de imóveis com atribuição de propriedade ao condomínio
edilício, a jurisprudência atual parece tender a rejeitar o comando legal,
estabelecendo um posicionamento de difícil aceitação, face à notória falta de
coerência.

“APELAÇÃO. DÚVIDA REGISTRÁRIA. PROCEDIMENTO
DE NATUREZA ADMINISTRATIVA. REGISTRO DE
ESCRITURA DE COMPRA E VENDA EM FAVOR DE
CONDOMÍNIO EDILÍCIO. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE
PERSONALIDADE JURÍDICA. ITBI. FATO GERADOR. 1.
Nem todo grupo social constituído para a consecução de fim
comum é dotado de personalidade, porquanto, alguns, embora
detenham características peculiares à pessoa jurídica, não
apresentam os requisitos imprescindíveis à personificação,
porque são formados independentemente da vontade de seus
membros, ou por ato jurídico que vincula um corpo de bens
(Carlos Roberto Gonçalves. Direito Civil Brasileiro. volume I.
parte geral. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p.192). 2. Sílvio de
Salvo Venosa elucida que, apesar de o condomínio poder figurar
extrajudicialmente em aquisição de direitos e contratação de
obrigações, não existe a affectio societatis, haja vista que ‘quem
adquire um apartamento não está buscando nenhum
relacionamento com os co-proprietários. esse relacionamento
decorre de situação fática e não de uma situação jurídica’ (in
Direito Civil: Parte Geral. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2001,
p. 223). 3. Considerando-se a ausência de personalidade jurídica
do condomínio edilício, não se mostra viável o registro de
escrituras de compra e venda de imóveis com atribuição de
propriedade ao condomínio. 4. O fato gerador do itbi opera-se
com o efetivo registro do título translativo da propriedade do
imóvel no cartório de registro de imóveis, e não na data do
instrumento ou ato que servir de título à transmissão ou cessão do
bem imóvel (acórdão n. 314490, 20070020082037adi, relator:
José Divino de Oliveira, relator designado:natanael caetano,
Conselho Especial, data de julgamento: 06/05/2008, publicado no
dje: 19/08/2008. pág.: 8). 5. Deu-se provimento ao apelo do
Ministério Público, para julgar procedente a dúvida registrária”.
[222]


Se não bastasse isso, o inciso II do art. 4° da Instrução Normativa/RFB n
° 1.634, 06.05.2016, que dispõe sobre o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica
(CNPJ),[223] tanto quanto suas antecessoras,[224] prescreve expressamente que os
condomínios estão obrigados a inscrever-se no Cadastro Nacional de Pessoa
Jurídica – CNPJ. Portanto o condomínio tem direito/dever de ser cadastrado no
Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ, malgrado a referida corrente
doutrinária e jurisprudencial entender não ser ele pessoa jurídica. Trata-se de um
posicionamento confuso, muito longe do bom senso: dar um cadastro de pessoa
jurídica a determinado ente e reconhecer personalidade jurídica apenas para fins
tributários, para uma pessoa/patrimônio personalizado que a maioria da
doutrinaa e jurisprudêencia vem considerando que ela não o é.

“TRIBUTÁRIO. CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS.
PERSONALIDADE JURÍDICA PARA FINS DE ADESÃO À
PROGRAMA DE PARCELAMENTO. REFIS.
POSSIBILIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia em saber se
condomínio edilício é considerado pessoa jurídica para fins de
adesão ao REFIS. 2. Consoante o art. 11 da Instrução Normativa
RFB 568/2005, os condomínios estão obrigados a inscrever-se no
CNPJ. A seu turno, a Instrução Normativa RFB 971, de 13 de
novembro de 2009, prevê, em seu art. 3º, § 4º, III, que os
condomínios são considerados empresas – para fins de
cumprimento de obrigações previdenciárias. 3. Se os
condomínios são considerados pessoas jurídicas para fins
tributários, não há como negar-lhes o direito de aderir ao
programa de parcelamento instituído pela Receita Federal. 4.
Embora o Código Civil de 2002 não atribua ao condomínio a
forma de pessoa jurídica, a jurisprudência do STJ tem-lhe
imputado referida personalidade jurídica, para fins tributários.
Essa conclusão encontra apoio em ambas as Turmas de Direito
Público: REsp 411832/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira
Turma, julgado em 18/10/2005, DJ 19/12/2005; REsp
1064455/SP, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma,
julgado em 19/08/2008, DJe 11/09/2008. Recurso especial
improvido”.

“Agravo de instrumento. Execução de tíulo judicial. Ação de
cobrança de cotas condominiais. Alegação de ausência de
personalidade jurídica do condomínio agravado em razão do
cancelamento de seu CNPJ. A ciência processual, em face dos
fenômenos contemporâneos que a cercam, tem evoluído a fim de
considerar como legitimados para estar em juízo, portanto, com
capacidade de ser parte, entes sem personalidade jurídica, quer
dizer, possuidores, apenas, de personalidade judiciária. O
cancelamento administrativo da inscrição do autor no cadastro
Nacional de Pessoas Jurídicas da Receita Federal (CNPJ) não
tem o condão de lhe retirar a legitimação processual ou mesmo o
interesse em prosseguir na execução para o recebimento do seu
crédito já definido por coisa julgada. Recurso manifestamente
improcedente a que se nega seguimento com fulcro no artigo 557
do Código de Processo Civil”.[225]

No entanto, no âmbito das relações do trabalho, os nossos tribunais tem
reconhecido personalidade jurídica apenas aos condomínios edilícios
regularmente “constituídos mediante registro em cartório”. O que já é um grande
avanço.

“‘CONDOMÍNIO DA RUA KINGSTON”. INEXISTÊNCIA DE
REGISTRO EM CARTÓRIO. AUSÊNCIA DE
PERSONALIDADE JURÍDICA. ILEGITIMIDADE PASSIVA
CONFIGURADA. O ‘Condomínio da Rua Kingston”,
empregador indicado pelo Autor na inicial, é figura inexistente,
pois o condomínio é constituído mediante registro em cartório e
representado em juízo pelo síndico eleito pelos condôminos,
condições estas que não foram observadas no caso, restando
configurada a ausência de personalidade jurídica do Reclamado.
Assim, embora fosse reconhecida a prestação de serviços
diretamente com os moradores indicados em contestação, sem a
figura do condomínio, estaríamos violando o princípio do devido
processo legal. Isso porque, aqueles moradores não fizeram parte
da relação jurídica processual, não havendo exercido o direito
constitucional ao contraditório e à ampla defesa. Por conseguinte,
há de ser mantida a sentença que extinguiu o feito sem resolução
do mérito, nos termos do art. 267, IV, do CPC. Nego
provimento”.[226]


3.4.1 Da evolução na interpretação da Lei n° 4.591, de 16.12.1964


Partindo de uma visão formalista, nos primeiros tempos de vigência da
Lei n° 4.591, de 16.12.1964, cogitou-se em não se reconhecer a personalidade
judiciária do condomínio, sob o argumento exatamente de não se tratar de uma
pessoa jurídica, daí por que nas ações em que figurava como parte deveria se
fazer representar por todos os condôminos individualmente, em litisconsórcio
que, além de necessário, era unitário.
Mas, pouco a pouco, os tribunais brasileiros evoluíram no entendimento
de que o novo diploma legal, ao criar a figura de um condomínio especial
originou uma realidade jurídica denominada “pessoa formal”, legitimada para
em seu próprio nome e representada pelo síndico (administrador) atuar ativa ou
passivamente em juízo (art. 12 do antigo Código de Processo Civil de 1973)[227]
no resguardo dos direitos e interesses comuns, incluindo tudo o que fosse
relacionado com a manutenção do edifício e com a disciplina de sua utilização. E
assim aconteceu exatamente porque, se o Direito tem uma finalidade e o direito
processual é o meio para o seu resguardo, o instrumento deve ser manejado de
forma a cumprir, com a maior eficácia possível, a finalidade para a qual foi
desenvolvido: resolver os conflitos de interesse pela aplicação do Direito.[228]
Por sinal, RUBENS LIMONGE FRANÇA cita julgado com votação
unânime, relatado por Vieira de Moraes e com a participação dos juízes Lair
Loureiro e Yussef Cahali, onde se lê o seguinte: “(...) como vem ressaltando a
jurisprudência, (...) têm sido frequentes os casos em que determinadas
coletividades, tendo um patrimônio comum, buscam um fim de interesse geral,
sem constituir, no entanto, uma pessoa jurídica. É o que sucede com as
sociedades irregulares, consórcios e mesmo com adquirentes de unidades
residenciais, como na espécie, em que o incorporador abandona o
empreendimento. Não seria justo que ficassem ao desamparo os direitos e
interesses dessas pessoas, pela falta de capacidade jurídica. (...) É por isso que a
jurisprudência tem aceitado a presença em juízo desses comunheiros, tanto ativa,
como passivamente, emprestando-lhes não uma capacidade jurídica, mas
capacidade judiciária. Tais entidades têm, assim, capacidade de ser parte, ensina
Pontes de Miranda, são capazes processuais (cf. Comentários ao Código de
Processo Civil, t. II, p. 85)”.[229]
Portanto, do ponto de vista processual (personalidade judiciária), o
condomínio edilício é representado em juízo e fora dele pelo administrador ou
síndico (pessoa natural), nos termos do inciso IX do art. 12 do Código de
Processo Civil de 1973, e inciso XI do art. 75 da Lei n° 13.105, de
16.03.2015 (Código de Processo Civil de 2015).
Contudo, em que pese tais atributos, ainda não possui o condomínio
edilício personalidade jurídica plena, pois perante a lei civil não é considerado
pessoa jurídica, e o registro de sua instituição junto ao Serviço Imobiliário não
é, por si só, considerado apto a promover equiparação à pessoa jurídica, embora
de fato essa realidade já exista a partir da solene manifestação coletiva de
interesses comuns equalizados por meio de uma assembleia.
Ademais, no mundo dos negócios o condomínio edilício age tal qual
uma pessoa jurídica, sendo, inclusive, qualificado por SILVIO DE SALVO
VENOSA, como entidade com personificação anômala.[230] O condomínio
edilício compra e vende, contrata empregados, presta serviços, empresta, loca ou
dá em locação, transige, enfim, atua na vida negocial como qualquer pessoa
jurídica, dentro de seu âmbito de atuação. A realidade não admite outra solução.
O condomínio tem, portanto, existência formal.
Atenta contra a realidade do ordenamento o cartório imobiliário que, por
exemplo, se recusa a fazer registro em nome do condomínio edilício na
matrícula da unidade autônoma. Nada impede que a comunidade condominial
decida ser proprietária, por exemplo, de lojas ou estacionamento no edifício,
explorando-os comercialmente e com isso reduzindo as despesas condominiais
dos titulares das unidades autônomas. Nunca se negou a possibilidade de o
condomínio edilício deliberar e decidir locar dependência sua para restaurante
ou para outra finalidade mercantil. Além disso, apesar desse condomínio ter
Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ e atuar nas relações jurídicas
com terceiros, inclusive de direito real, como se fosse verdadeira pessoa jurídica,
esse é considerado por muitos massa amorfa sem personalidade jurídica.
Segundo JOÃO BATISTA LOPES existe “personificação do patrimônio
comum”.[231] No entanto, SÍLVIO DE SALVO VENOSA opina no sentido de que
“não concluímos pela existência de personalidade jurídica no condomínio,
afirmação sem fundamento legal, mas por essa conceituação de personificação
anômala conferida pela própria lei condominial e pelo Código de Processo Civil,
bem como decorrente de fato social”.[232]
A verdade é que o Código Civil de 2002, ao disciplinar constituição e
funcionamento das pessoas jurídicas, perdeu a grande oportunidade de atribuir
personalidade jurídica ao condomínio edilício. No entanto, o fato do codex não
ter trazido essa tão necessária adequação da lei aos fatos, entendemos, com todo
respeito a opiniões contrária, não coloca ponto final nesta questão, nem extingue
os problemas advindos dessa omissão legislativa.


3.4.2 Da consolidação jurisprudencial em passado recente atribuindo
personalidade jurídica ao condomínio edilício


Todavia, coube ao Tribunal de Justiça do antigo Estado da Guanabara o
pioneirismo em reconhecer a personalidade jurídica do condomínio edilício em
acórdãos relatados pelos desembargadores Olavo Tostes (apelação cível n°
68.800, publicada na DJGB de 21.01.71, p. 37) e Salvador Pinto Filho (apelação
cível n° 79.382, publicada na RT 453/217), em 1971, reportando-se este último
aos ensinamentos de JOSÉ MARIA DE SERPA LOPES, para quem o
condomínio edilício é “um fenômeno societário dotado de personalidade
jurídica”.[233]
Além disso, o primeiro acórdão chama a atenção para o que, com seu
elevado alinhamento com a realidade, considera “a inconsistência do ponto de
vista segundo o qual é indispensável o reconhecimento estatal da existência das
pessoas jurídicas”, na medida em que “os partidários da escola realística viam
nesse reconhecimento um ato meramente declarativo”.[234]
Logo após, o 3º Grupo de Câmaras Cíveis do mesmo Tribunal de Justiça
do antigo Estado da Guanabara reafirmou o entendimento de que “o
condomínio não só pode adjudicar os direitos do condômino inadimplente como
também transmiti-los a terceiros, seja durante, seja após a construção (RT
467/206)”. Por sinal, neste julgado, o relator desembargador Santiago Costa,
fundamentou seu voto da seguinte maneira: “(...) lamentar que o legislador ainda
se omitisse em declarar expressamente ser o condomínio pessoa jurídica distinta
da pessoa de cada um de seus membros, tanto que tem órgãos próprios
(assembleia), contrata serviços, inclusive de utilidade pública, faz e desfaz
contratos de trabalho, mantém e movimenta contas bancárias etc.: Para a prática
de todos esses e outros atos suscetíveis de criar direitos e obrigações, tem-se-lhe
reconhecido, pacificamente, capacidade jurídica. Que lhe falta então para se lhe
atribuir personalidade jurídica? Simplesmente a declaração formal e expressa da
lei, que, entretanto a reconhece implicitamente, a admitir que o condomínio seja
capaz para o exercício de atos que, normalmente, só as pessoas físicas ou
jurídicas podem praticar e aos quais a ordem jurídica brasileira confere
legitimidade e eficácia incontestáveis (...)”.[235]
Depois desse julgamento, vários outros acórdãos têm admitido a
personalidade jurídica do condomínio para adjudicar o imóvel em hasta pública
em execução ou cumprimento de sentença ou mesmo para aquisição pura e
simples, bem como obter os registros respectivos, mediante determinadas
premissas, entre as quais prevalece a deliberação unânime dos condôminos em
assembleia.
Inclusive, a tendência da jurisprudência brasileira é perfeitamente
identificável com a situação de fato verificada nos condomínios edilícios que, em
muito, se assemelham a uma associação, já que praticam atos da vida civil,
quando: a) obtém seu Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ perante a
Secretaria da Receita Federal – SRF; b) abrem e movimentam conta corrente
perante instituições financeiras; c) admitem e registram empregados pela
Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, para prestar serviços ao condomínio;
d) contratam empresa para prestação de serviços de segurança para o
condomínio; e) contratam empresa para administrar o condomínio.

“TRIBUTÁRIO. CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS.
PERSONALIDADE JURÍDICA PARA FINS DE ADESÃO À
PROGRAMA DE PARCELAMENTO. REFIS.
POSSIBILIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia em saber se
condomínio edilício é considerado pessoa jurídica para fins de
adesão ao REFIS. 2. Consoante o art. 11 da Instrução Normativa
RFB 568/2005, os condomínios estão obrigados a inscrever-se no
CNPJ. A seu turno, a Instrução Normativa RFB 971, de 13 de
novembro de 2009, prevê, em seu art. 3º, § 4º, III, que os
condomínios são considerados empresas - para fins de
cumprimento de obrigações previdenciárias. 3. Se os
condomínios são considerados pessoas jurídicas para fins
tributários, não há como negar-lhes o direito de aderir ao
programa de parcelamento instituído pela Receita Federal. 4.
Embora o Código Civil de 2002 não atribua ao condomínio a
forma de pessoa jurídica, a jurisprudência do STJ tem-lhe
imputado referida personalidade jurídica, para fins tributários.
Essa conclusão encontra apoio em ambas as Turmas de Direito
Público: REsp 411832/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira
Turma, julgado em 18/10/2005, DJ 19/12/2005; REsp
1064455/SP, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma,
julgado em 19/08/2008, DJe 11/09/2008. Recurso especial
improvido”.[236]

E, independentemente, inclusive, da situação jurídica do condomínio ser
irregular, por ausência de registro da Convenção de Condomínio no Cartório de
Registro de Imóveis (§1° do art. 9° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964), por
exemplo, o condomínio efetivamente pratica os mesmos atos antes mencionados,
a ponto de o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, reconhecendo tal
circunstância, em 1993, ter decidido que o “condomínio sem registro dos seus
atos constitutivos, no mundo fático e praticando atos da vida civil, possui
capacidade de direitos e obrigações”.

“EMENTA: AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS PELO
PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO - CONDOMÍNIO - FALTA
DE REGISTRO CARTORIAL - PERSONALIDADE JURÍDICA
- CAPACIDADE PROCESSUAL. OS ATOS CONSTITUTIVOS
DOS CONDOMÍNIOS EM ÁREAS URBANAS DO DF, EM
FACE DA REGULARIZAÇÃO PERANTE O PODER
PÚBLICO, DESDE QUE LIVREMENTE PACTUADOS EM
ASSEMBLEIAS REGULARMENTE CONVOCADAS E
TENDO SEUS TERMOS REGISTRADOS NO CARTÓRIO DE
TÍTULOS E DOCUMENTOS, CONFIGURAM A
EXISTÊNCIA DE PESSOAS JURÍDICAS, DE ACORDO COM
O ART. 18 DO CC. INOBSTANTE NÃO ESTEJAM
REGISTRADOS SEUS ATOS CONSTITUTIVOS, MAS
EXISTINDO O CONDOMÍNIO NO MUNDO FÁTICO E
PRATICANDO ATOS DA VIDA CIVIL, POSSUI
CAPACIDADE DE DIREITOS E OBRIGAÇÕES, HAVENDO
TAMBÉM QUE SUBMIR-SE ÀS REGRAS DA
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO ILÍCITO. Decisão:
CONHECER. PROVER. UNÂNIME”.[237]

Como se pode observar, o julgado do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal, acima transcrito, atribuiu ao condomínio edilício irregular (por
desatender o disposto no §1° do art. 9° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964), mas
registrado em Cartório de Títulos e Documentos, a qualidade de pessoa jurídica,
de conformidade com o disposto no art. 18 do Código Civil de 1916 [238] e art. 45
do Código Civil de 2002,[239] dotando-o, por conseguinte, de personalidade
jurídica.
Outro julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal foi mais além
em 2001, reconhecendo a personalidade jurídica ao condomínio, a partir de sua
constituição de fato, isto é, a partir da utilização das unidades condominiais, o
que definiria a existência de verdadeira comunhão de interesses, vinculando
todos os condôminos.

“EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COBRANÇA DE
TAXAS. IRREGULARIDADE DA CONSTITUIÇÃO DE
CONDOMÍNIO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM
JULGAMENTO DO MÉRITO. ILEGITIMIDADE AD
CAUSAM. A PERSONALIDADE JURÍDICA DO
CONDOMÍNIO E SUA CAPACIDADE PARA ESTAR EM
JUÍZO SURGEM COM SUA CONSTITUIÇÃO DE FATO, OU
SEJA, QUANDO UTILIZADAS AS UNIDADES QUE O
COMPÕEM, APRESENTANDO-SE UMA COMUNHÃO DE
INTERESSES QUE A TODA VINCULA. AINDA QUE
DESATENDIDOS OS REQUISITOS FORMAIS DO ART. 24,
DA LEI 4.591/64, POR AUSÊNCIA DO VÍNCULO
INSTRUMENTAL DE UM CONTRATO OU DA
FORMALIZAÇÃO DE SEU REGISTRO EM CARTÓRIO,
NÃO PODE O CONDÔMINO EXIMIR-SE DO PAGAMENTO
DE TAXAS ESTABELECIDAS EM ASSEMBLEIA. AS
DELIBERAÇÕES COLETIVAS TÊM VALIDADE
ENQUANTO NÃO ANULADAS. RECURSO CONHECIDO E
DESPROVIDO. Decisão: CONHECER. NEGAR. UNÂNIME”.
[240]


Adotando a mesma linha de entendimento do precedente de 1993, em
relação à existência e validade dos condomínios irregulares no mundo jurídico,
o julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, proferido em 1999, postou-
se no sentido de que esses condomínios constituiriam uma realidade que o
direito não pode ignorar.

“EMENTA: COBRANÇA - CONDOMÍNIO IRREGULAR -
LEGITIMIDADE ATIVA. CONDOMÍNIOS NÃO
REGISTRADOS OU INSUFICIENTEMENTE FORMADOS
CONSTITUEM REALIDADE QUE O DIREITO NÃO PODE
IGNORAR, PODENDO SER REPRESENTADAS EM JUÍZO
ATIVA E PASSIVAMENTE. RECURSO PROVIDO. Decisão:
CONHECER, PARA CASSAR A SENTENÇA. UNÂNIME”.[241]

No mesmo sentido, o juiz MARCELO GUIMARÃES RODRIGUES,
em sentença proferida no processo de dúvida deflagrada pelo 5º Serviço de
Registro de Imóveis de Belo Horizonte, na condição de titular, à época, da Vara
de Registros Públicos no Fórum Lafayette da Capital Mineira (como de fato
ocorrera igualmente em outros Estados) mostrou nitidamente que o § 3º do art.
63 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, atribui personalidade jurídica ao condomínio
edilício, ao reconhecer expressamente o direito desta pessoa abstrata adquirir a
unidade autônoma, quando da construção do edifício, no caso do
inadimplemento do condômino.

“Vara de Registros Públicos da Comarca de Belo Horizonte.
Proc. n. 024.05.801.569-4. Sentença. Dúvida deflagrada perante
este Juízo especializado pela Oficiala Substituta do 1º Serviço de
Registro de Imóveis de Belo Horizonte, a requerimento de
Condomínio do Edifício Algídia Ribas, a propósito de escritura
pública de compra e venda tendo por objeto o imóvel matriculado
sob o n. 46.288. Aponta a Oficiala Registradora que o imóvel foi
adquirido pelo condomínio, e que, de acordo com a orientação
doutrinária e jurisprudencial, condomínio não tem personalidade
jurídica para adquirir bens, salvo a hipótese do art. 63, § 3º, da
Lei n. 4.591, de 1964, o que não é o caso apresentado.
Irresignado com a recusa da Oficiala em registrar o título,
requereu a suscitação de Dúvida. Todavia, apesar de devidamente
notificado e transcorrido o prazo legal, não apresentou
impugnação. O Dr. Curador de Registros Públicos absteve-se de
exarar parecer em face da ausência de impugnação. É a síntese,
no essencial. DECIDO. Em melhor e detida análise do presente
caso, estou a firmar entendimento de que o condomínio possui
personalidade jurídica para adquirir imóvel, desde que
preenchidos alguns requisitos legais. É certo que a Lei n. 4.591,
de 1964, em seu art. 63, § 3º, atribui personalidade jurídica ao
condomínio para adquirir a unidade autônoma, quando da
construção do edifício, no caso do inadimplemento do
condômino. Entretanto, há uma lacuna na legislação concernente
aos condomínios edilícios e especiais com relação a esta matéria.
Em artigo de autoria de J. Nascimento Franco, publicado em
1982, este defendia o reconhecimento desta personalidade
jurídica ao condomínio. Ressalta o jurista que: ‘Em suma, não se
justifica mais a obstinação em se negar ao condomínio em
edifício, cujo instrumento de instituição esteja registrado no
Cartório de Registro de Imóveis, o direito de adquirir bens
imóveis, notadamente quando a assembleia geral autorizar o
síndico a celebrar os contratos e a assinar a respectiva escritura’.
‘O instrumento de instituição e convenção, uma vez registrado,
equipara o condomínio, quando mais não seja, às sociedades
irregulares, que praticam centenas de atos no mundo dos
negócios. Na realidade, o condomínio em edifício distingue-se
perfeitamente da pessoa de cada um dos condôminos.
Consequentemente, nada mais razoável do que considerá-lo com
personalidade jurídica para as aquisições de que necessite e
autorizadas por sua assembleia geral’ (Revista de Direito
Imobiliário do IRIB). Neste sentido, deve o Oficial Registrador
se ater a alguns requisitos para que possa registrar o título em sua
tábula, como a presença de ata da assembleia geral do
condomínio com deliberação e aprovação da aquisição ou
alienação do imóvel, pela unanimidade dos presentes à
assembleia. Ademais, o condomínio deverá estar quite com todas
as suas obrigações fiscais. Há de se ressaltar que já existem
decisões semelhantes em Tribunais Superiores, como se pode ver
pelo recente acórdão do Conselho Superior da Magistratura de
São Paulo, no qual se decidiu pela possibilidade de registro de
adjudicação em favor do condomínio, em caso similar ao dos
presentes autos: ‘Registro de Imóveis. Dúvida julgada
procedente. Registro de carta de adjudicação. Condomínio
Especial como adquirente. Ausência de personalidade jurídica.
Viabilidade de aquisição, em tese, mediante aplicação analógica
do artigo 63, § 3º, da Lei n. 4.591, de 1964. Necessidade de
aprovação da aquisição, em assembleia geral dos condôminos.
Recurso Provido’ (Ac. n 273-6/7, de 23.02.2005). Pelo exposto,
julgo improcedente a presente Nota de Dúvida, recomendando à
Oficiala Registradora a observância dos critérios aqui apontados
para o registro do título, sem prejuízo das demais formalidades
legais. Isento de custas. Com o trânsito, cumpra-se o disposto no
art. 203, II, da Lei n. 6.015, de 1973, seguindo-se à baixa e
arquivo dos autos. P. R. I. Belo Horizonte, 18 de outubro de
2005”.

Também entendemos importante citar que a promotora de justiça
DENISE MARIA DURO REIS, da Promotoria de Justiça Cível, Registros
Públicos e Acidentes do Trabalho de Porto Alegre, recebeu, em ofício enviado
pela 20ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul,
voto de louvor pelo parecer exarado nos autos da Apelação Cível nº
70018806737, por ocasião da sessão de julgamento daquele Tribunal. Com
efeito, o desembargador relator Carlos Cini Marchionatti reproduziu, e adotou
como razão de decidir em seu voto, parte do parecer da Promotora de Justiça,
consignando, expressamente, que o mesmo continha uma “análise jurídica
significativamente expressiva e por demais criteriosa no Processo”.

1. “A princípio, uma vez apresentado o título judicial – carta de
adjudicação – cumpre ao Oficial de Registro de Imóveis o exame
da documentação à luz das disposições legais e normativas e dos
princípios que norteiam a matéria registrária, no procedimento
que se chama de qualificação registrária”.
2. “Assevere-se que é cediço que mesmo os títulos judiciais se
submetem à qualificação registraria, eis que o registro depende
de atendimento de certos requisitos legais, bem como a
observância dos princípios que norteiam a matéria registral e tem
por fim garantir a segurança jurídica do tráfego imobiliário”.
3. “De outro lado, a qualificação registraria, como já definiu o
Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, não diminui,
contraria ou reduz os efeitos da decisão judicial, até por que tal
seria inconstitucional, apenas se prestaria a habilitar a ordem
judicial para que esta venha a produzir sua eficácia própria na
esfera de direitos de terceiros”.
4. “Portanto, é justamente para essa realização da conquista
eficacial plena que se torna necessária a verificação da afetação
ou interferência sobre direitos de terceiros, do que resulta a
necessidade de averiguação da observância dos princípios
registrários, dentre eles o da continuidade (art.195 da LRP, da
unitariedade, (art. 176, §1º, I, da LRP), da especialidade
(decorrente de todo texto legal), princípio da legitimação
registraria (art. 252 da LRP), e princípio da legalidade (art. 221
da LRP)”.
5. “A qualificação registral, em que pese seu alcance, não pode
impedir os efeitos de decisão judicial, salvo quando esta venha a
produzir efeitos estranhos ao próprio comando judicial (efeitos
não pretendidos pelo julgador), atingindo direito de terceiros não
envolvidos na lide. Afora tal situação, que confere à
“qualificação” prerrogativas para obstar os efeitos imediatos da
ordem, não há como se impedir os efeitos de decisão judicial. A
questão objeto da presente dúvida diz quanto á possibilidade do
registro de título judicial aquisitivo em favor de Condomínio
Edilício”.
6. “Examinando os precedentes jurisprudenciais, constata-se que
os Julgados do E. Conselho Superior da Magistratura de São
Paulo se mostram unânimes em declarar e reconhecer a ausência
de personificação dos CONDOMÍNIOS de que trata a Lei
4.591/64 e o atual Código Civil, concluindo que em face de tal
delineamento jurídico, não se encontram os CONDOMÍNIOS
EDILÍCIOS credenciados para a aquisição imobiliária”.
7. “As decisões sobre o tema apresentam argumentos consistentes
e coerentes, destacando que a FACULDADE que confere aos
CONDOMÍNIOS atributos postulatórios em juízo, não é se
afigura suficiente ou capaz de lhes outorgar PERSONALIDADE
JURÍDICA. Ademais, ressaltam que a previsão do art. 63, da Lei
4.591/64 que estabelece a possibilidade do CONDOMÍNIO
incorporador ADJUDICAR imóvel de adquirente inadimplente,
igualmente não atribui a este, a condição ou atributo de “pessoa
jurídica”. O entendimento jurisprudencial assinala e observa que
tal dispositivo representa uma “exceção” à regra geral, e como
tal, apenas se prestando para confirmar o conteúdo e alcance da
própria REGRA”.
8. “Todavia, independentemente da força dos argumentos,
pareceria que a questão poderia ser reexaminada, de forma a dar
maior alcance às funções hodiernamente desempenhadas pelos
Condomínios, a quem se atribui responsabilidade fiscal,
trabalhista, assim como perante os condôminos, em relação à
expressividade dos valores que administram, tudo objetivando o
interesse da coletividade”.
9. “O entendimento que considera que os condomínios especiais
têm apenas CAPACIDADE POSTULATÓRIA ou capacidade
para estar em juízo, mas não possuem PERSONALIDADE
JURÍDICA, se antagoniza com esta realidade, e decorre de uma
interpretação que visualiza em todos os dispositivos que
permitem vida jurídica plena aos CONDOMÍNIOS, a condição
de disposições excepcionais, que se prestam apenas para
confirmar a regra da despersonalização (Inclusione unius fit
exclusio alterius. Qui de uno dicit, de altero negat. Qui de uno
negat, de altero dicit)”.
10. “Observa-se que o próprio art. 12, do Código de Processo
Civil [art. 75 do CPC de 2015], em seu art. 12, trata em incisos
separados as sociedades sem personalidade jurídica e os
condomínios (incisos VII e IX), o que viria a reforçar a teste que
não se tratam de entidade idênticas”.
11. “Também por este prisma, seriam os "condomínios
registrados", PESSOAS DE DIREITO PRIVADO, e como tal,
dotados de personalidade jurídica como uma forma peculiar de
ASSOCIAÇÃO”.
12. “Como definição da personalidade jurídica, (aptidão genérica
para adquirir direitos e contrair obrigações), há que se reconhecer
que atualmente os CONDOMÍNIOS não têm quaisquer restrições
relativas à conquista de direitos ou mesmo pertinentes a assunção
de obrigações. Possuem todos os requisitos para exercer em sua
integralidade, a vida jurídica plena, posto que são dotados de
todo instrumental jurídico para o desempenho dos mais diversos
papeis nas relações rotineiras”.
13. “Possuem CNPJ (CGC); são empregadores; podem
subscrever os mais variados contratos; aplicam recursos
financeiros e tomam todas as decisões ligadas a seus interesses
peculiares e próprios. Assim como uma sociedade ou uma
associação, são os condomínios limitados ao respectivo estatuto.
No mais atuam com liberdade, inexistindo pacto ou contrato que,
em princípio, não possa ser celebrado validamente pelo
representante autorizado pelo órgão coletivo. O reconhecimento
de PERSONALIDADE JURÍDICA para os condomínios não
acarreta qualquer ameaça para os interesses dos condôminos,
pois é a ASSEMBLEIA CONDOMINIAL que, soberanamente,
decide sobre a gestão, os destinos e a forma de proceder do
CONDOMÍNIO autorizando ou negando a compra ou
adjudicação de imóvel ou dando ou negando poderes para o
síndico tomar decisão neste sentido”.
14. “Tendo personalidade jurídica o CONDOMÍNIO pode
adquirir imóvel de devedor inadimplente, quando tal conduta
atenda aos propósitos ligados a uma melhor e mais eficiente
arrecadação. O condomínio, no entanto, não poderá se distanciar
de seus objetivos, pois neste caso, estaria agindo contra legem”.
15. “A adjudicação ou arrematação de bem imóvel pelo
condomínio em ação de cobrança da taxa interna, atende,
evidentemente, os propósitos condominiais. Evidente que nestes
casos pode nascer uma nova obrigação tributária determinada
pelo eventual LUCRO IMOBILIÁRIO, o que não significa risco
ou prejuízo para os condôminos. As unidades autônomas sempre
estarão preservadas, pois não compõe o acervo coletivo ou
condominial, assim como a parte comum (que mesmo estando
registrada em nome do condomínio, representam frações que
tocam a cada um dos condôminos)”.
16. “Sobre a matéria, assim se posiciona FREDERICO
HENRIQUE VIEGAS DE LIMA: ‘A personalidade jurídica do
condomínio é um tema muito pouco desenvolvido na doutrina
que lhe confere pouca importância, justamente em virtude do
binômio referido entre propriedade exclusiva e co-propriedade’”.
17. “Dessa forma, para a grande maioria dos autores, o
importante é a figura dos condôminos e suas relações jurídicas,
quer sejam internas ou externas”.
18. “Contudo, não se pode negar que na atualidade, dada a
complexidade de atuações e relações jurídicas que um
condomínio desenvolve, não se pode negar a existência de uma
personalidade jurídica ampla, comparável com a das sociedades e
associações, sendo indispensável o elastecimento da
compreensão do art. 44 do CC – que possui o numerus clausus de
pessoas de direito privado, para contemplar também o
condomínio edilício”.
19. “Tanto é assim que as mesmas jornadas de direito civil
organizadas pelo Centro de Estudos do Conselho da Justiça
Federal, em seu Enunciado 90, embora de maneira tímida, já
realizavam a previsão da necessidade de se dotar os condomínios
edilícios de personalidade jurídica, embora de forma restrita. O
que não nos parece o mais adequado”.
20. “Estabelece o Enunciado 90: ‘Art. 1.331. Deve ser
reconhecida personalidade jurídica ao condomínio edilício nas
relações jurídicas inerentes à atividade de seu peculiar
interesse’”.
21. “Se por um lado, podemos visualizar um avanço quando o
referido enunciado idealiza a situação da possibilidade de se
conceder aos condomínios edilícios uma personalidade jurídica,
não nos parece admissível que ela seja restrita às atividades de
seu interesse”.
22. “Estar-se-ia criando uma personalidade jurídica de segunda
categoria em nítida contradição às garantias constitucionais de
igualdade entre as pessoas, nas quais não duvidamos incluir as
pessoas jurídicas”.
23. “Se essas razões não forem suficientes – mesmo porque
demandam um estudo mais aprofundado sobre o assunto, e não
uma simples sentença enunciativa – também é imperioso saber
quais as situações em que os condomínios edilícios exercem
atividades de seu peculiar interesse e quais as que agem
desinteressadamente”.
24. “‘Situações que, em nosso sentir, constituem uma linha tênue
de diferenciação, que deve ser objeto de melhor análise’”.
25. “Por fim, assevere-se que já existem entendimentos
jurisprudenciais no sentido do reconhecimento da personalidade
jurídica do Condomínio Edilício: ‘CONDOMÍNIO -
Legitimidade de parte - Ação proposta contra os condôminos em
virtude da falta de segurança no edifício - Inadmissibilidade –
Entidade jurídica distinta de cada um dos condôminos –
Ilegitimidade passiva reconhecida – Recurso não provido Uma
vez instituído esse condomínio constitui um ente jurídico que se
distingue perfeitamente dos titulares de cada uma das entidades
autônomas, da mesma forma pela qual se distingue da sociedade
a pessoa de cada um dos sócios. Numa fase primitiva do sistema,
poder-se-ia admitir que ao condomínio em edifícios faltasse
personalidade jurídica. Mas a jurisprudência e a doutrina vêm
evoluindo no sentido de lhe reconhecer ampla capacidade, e, com
esta, plena’ (CSM SP Agravo de Instrumento n. 219.610-1 – São
Paulo - 03.05.94)”.
26. “‘CARTA DE ADJUDICAÇÃO. CONDOMÍNIO.
PERSONALIDADE JURÍDICA. PENHORA. FAZENDA
NACIONAL. 1. A preferência decorrente da penhora é fato
processual. O Oficial registrador deve acatar as ordens judiciais
na justa e adequada medida de seus “efeitos”, reconhecendo a
preferência da penhora que em primeiro lugar foi registrada, mas
sem proceder a qualquer juízo de valor a este respeito. Existindo
penhoras anteriores, como prioridade sobre a última, estas não
podem ser desfeitas ou canceladas. Devem permanecer no fólio
conquanto o adjudicante recebeu o bem com tais onerações. Deve
o registrador, por averbação, declarar a higidez das penhoras
anteriores. 2. O condomínio tem legitimidade para adquirir bens
imóveis em decorrência de execuções’ [Decisão 1ª VRPSP, Data:
12/2/2004 Fonte: 000.03.130345-5 Localidade: São Paulo (5º RI)
Relator: Venício Antonio de Paula Salles Legislação: Lei
8.212/91 (art. 53, § 1º). Lei 8.953/94 e Lei 10.444/02]”.
27. “Ademais, é bom que se afirme que o reconhecimento da
personalidade jurídica teria se efetuado perante o Juízo que
expediu a carta de adjudicação, pois se entendesse que o
exequente não detém capacidade para adquiri bem imóvel
deveria ter negado a adjudicação, não se autorizando, desta
forma, que este Juízo, de cunho eminentemente administrativo
recuse título formalmente perfeito, sob argumentação de questão
de fundo, implicando, desta forma, em negar vigência ao
comando jurisdicional”.
28. “PELO EXPOSTO, opina pela improcedência da presente
dúvida, para o fim de determinar o registro da carta de
adjudicação apresentada, atribuindo-se efeito normativo à
decisão de forma a disciplinar situações análogas”.

Por sinal, até mesmo o Superior Tribunal de Justiça – STJ, não raras
vezes, tem se quedado ao fato de condomínio ter, sim, aptidão para adquirir e
exercer direitos e contrair obrigações e, ainda que não vise ao lucro, não pode
ser tratado como simples estado de indivisão de bens. Portanto, o condomínio
edilício é ente com personalidade jurídica (somente as pessoas físicas e jurídicas
tem capacidade para adquirir e exercer direitos e contrair obrigações – art. 1°
do Código Civil de 2002),[242] constituído para gerir um patrimônio comum, deve
realizar o seu mister com eficiência, objetivando sempre a preservação e o
cumprimento dos direitos e deveres que lhe são atribuídos pela Assembleia de
Condôminos.

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À
EXECUÇÃO. PENHORA DE MÃO PRÓPRIA.
EQUIPARAÇÃO A DEPÓSITO EM DINHEIRO. PENHORA
SOBRE ARRECADAÇÃO MENSAL DE CONDOMÍNIO. -
Embora a lei não trate expressamente da penhora de mão própria,
consistente na possibilidade da constrição recair sobre crédito
que o executado possui frente ao próprio exequente, tal
modalidade de penhora encontra viabilidade na dicção do art.
671, II, do CPC [inciso II do art. 855 do CPC de 2015], apenas
com a peculiaridade de que o terceiro devedor, nesta hipótese, é o
próprio exequente. - A penhora de mão própria só é possível se
ambos os créditos forem certos, líquidos e exigíveis, hipótese em
que, mais do que a garantia do juízo, haverá a compensação ope
legis, até o limite do crédito do executado frente ao exequente. -
Considerando que o crédito objeto de penhora de mão própria
terá como resultado final sua compensação automática com o
débito em execução, não há como deixar de incluí-lo em primeiro
lugar, juntamente com o depósito em dinheiro, na ordem de
gradação do art. 655 do CPC (art. 835 do CPC de 2015], visto
que esta segue o critério da liquidez, isto é, da maior facilidade
do bem ser utilizado para quitação da dívida. Se a compensação
opera-se automaticamente, dispensando até mesmo a necessidade
de conversão em moeda, conclui-se que essa forma de garantia
do juízo é a mais eficaz e célere, indo ao encontro dos princípios
constitucionais da economia processual e da razoável duração do
processo, bem como de realização da execução pelo modo menos
gravoso para o devedor. - A despeito da sua personalidade
restrita, é inegável que o condomínio tem aptidão para adquirir e
exercer direitos e contrair obrigações. Ainda que não vise ao
lucro, não pode ser tratado como simples estado de indivisão de
bens. O condomínio, enquanto ente constituído para gerir um
patrimônio comum, deve realizar o seu mister com eficiência,
objetivando sempre a preservação e o cumprimento dos direitos e
deveres de condôminos e terceiros. Diante disso, conclui-se pela
possibilidade de penhora sobre a arrecadação mensal do
condomínio. A medida, porém, além de ter de respeitar a
gradação legal do art. 655 do CPC, deve obedecer a outro
requisito, que já era jurisprudencialmente exigido por este STJ e
que agora se encontra no art. 655-A, § 3º, do CPC, qual seja, a
nomeação de “depositário, com a atribuição de submeter à
aprovação judicial a forma de efetivação da constrição, bem
como de prestar contas mensalmente, entregando ao exequente as
quantias recebidas, a fim de serem imputadas no pagamento da
dívida”. Na hipótese específica do condomínio, nomeia-se um
depositário, a quem incumbirá apresentar, para aprovação do
Juiz, a forma de levantamento dos recursos e o esquema de
pagamento do débito, cuidando inclusive para que o percentual
fixado sobre a arrecadação mensal do condomínio não inviabilize
o próprio funcionamento deste. Recurso especial parcialmente
provido”.[243]


3.4.3 Da consolidação doutrinária em passado recente em torno do
reconhecimento da personalidade jurídica do condomínio edilício


Reforçando a jurisprudência que reconhece personalidade jurídica do
condomínio edilício, CARLOS ALBERTO BITTAR menciona que as entidades
assim personalizadas chamam-se pessoas jurídicas, intelectuais, morais, ou
coletivas. São unidades jurídicas que resultam de comunidades humanas,
organizadas de forma própria e que, com o registro público correspondente,
assumem personalidades distintas das de seus componentes. Voltadas para certos
fins, em função dos quais se desenvolvem as respectivas atividades, essas
entidades assumem autonomia no cenário jurídico, com patrimônio, voz e
vontade própria, responsabilizando-se, em consequência, pelos atos e negócios
normais em seu nome exercitados. Têm suas linhas básicas traçadas no Código
Civil (arts. 13 e segs. do Código Civil de 1916 e arts. 40 e segs. do Código Civil
de 2002), regendo-se, no mais, pelas disposições de seu estatuto, ou de seu
contrato social, conforme o caso. Formam-se com a reunião de duas ou mais
pessoas, unidas pelo vínculo psicológico que as prende em torno das finalidades
perseguidas, observados os pressupostos e os requisitos necessários para sua
constituição, com o que ganham personalidade jurídica, ingressando como atores
no plano jurídico (sociedades e associações). Adquirem existência, patrimônio e
personalidade próprios, podendo exercer direitos e obrigações no plano da
realidade concreta; daí, porque prosperam ora as teorias realistas quanto à sua
natureza.[244]
Como se pode observar, a boa doutrina consagra o entendimento no
sentido de que o condomínio edilício se equipara a uma associação e somente
recebe diferente registro, porque lei especial (Lei n° 4.591, de 16.12.1964) assim
o determina, de modo que, se a associação tem personalidade jurídica, o
condomínio edilício também tem que o ter.
Esta premissa decorre da análise conjunta das disposições contidas no
art. 45 do Código Civil de 2002 [“começa a existência legal das pessoas jurídicas
de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro”],
com as disposições contidas no caput do art. 1.332 e do art. 1.333 do mesmo
diploma legal,[245] que apresenta como obrigatória à existência de uma
Convenção de Condomínio, registrada no Cartório Registro de Imóveis.
Destarte, uma vez praticado o ato de “registro”, indiscutivelmente, ocorre o
nascimento legal da pessoa jurídica do condomínio. Portanto, sem sombra de
dúvidas, a Convenção de Condomínio registrada (art. 1.332 do Código Civil) ou
a simples Minuta de Convenção de Condomínio arquivada (alínea j do art. 32 da
Lei n° 4.591, de 16.12.1964);[246] ou, ainda, a Minuta de Convenção de
Condomínio registrada em Cartório de Títulos e Documentos (art. 45 do Código
Civil de 2002), promovem a publicidade objetivada pelo art. 45 do Código Civil
de 2002, permitindo que o condomínio edilício pratique os atos da vida civil,
introduzindo-o no mundo do direito e lhe atribuindo personalidade jurídica, com
a qual pratica atos, principalmente os lícitos, que geram efeitos jurídicos,
incontestavelmente.
FRANCISCO CAVALCANTI PONTES DE MIRANDA, por sua vez,
menciona que a pessoa jurídica é tão oriunda de fático quanto à pessoa física. A
pessoa jurídica é tão real quanto à pessoa física. Ser pessoa é ser capaz de
direitos e deveres. Ser pessoa jurídica é ser capaz de direitos e deveres,
separadamente; isto é, distinguidos o seu patrimônio e os patrimônios dos que a
compõem, ou dirigem.[247]


3.4.4 Da aplicação do art. 5° da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro


É importante destacar que o reconhecimento da personalidade jurídica
no condomínio está diretamente ligado à diretriz imposta pelo art. 5° da Lei de
Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei n° 4.657, de
04.09.1942), o qual prescreve que “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins
sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.
Portanto, o emprego da norma contida no art. 5° da Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro, para identificação da personalidade jurídica no
condomínio, é medida que se impõe. CAIO MARIO DA SILVA PEREIRA
esclarece que, exatamente pelo fato de a Lei n° 4.591, de 16.12.1964, ter surgido
para proteger os adquirentes de imóveis ainda na planta, já muito prejudicados,
àquela época, pelos desmandos que vinham sendo praticados pelos construtores
e incorporadores, como bem frisa, é que não se pode negar a personalidade
jurídica ao condomínio edilício e, com isso, impossibilitar seu livre trânsito pelo
mundo do direito.[248]
Como se vê, na aplicação da lei, o juiz deve atender aos fins sociais a
que ela se destina e às exigências do bem comum. Portanto, o reconhecimento da
personalidade jurídica no condomínio edilício, criado pela Lei n° 4.591, de
16.12.1964, e, atualmente, também disciplinado pelo Código Civil de 2002, é
medida que se impõe como absolutamente necessária, frente à realidade e para
que o condomínio, enquanto ente constituído para gerir um patrimônio comum,
possa realizar o seu mister com eficiência, objetivando sempre a preservação e o
cumprimento dos direitos e deveres de condôminos e terceiros.


3.4.5 Do reconhecimento da personalidade jurídica do condomínio no Direito
Comparado


Não é necessário fazer um estudo muito aprofundado do Direito
Comparado para se concluir com segurança a respeito do tamanho do
descompasso entre a legislação brasileira e as principais legislações estrangeiras
que disciplinam a matéria.
Com efeito, na França, desde 1965, o art. 14 da Lei n° 60.577, de
10.7.65, reconhece pura e simplesmente a personalidade jurídica do que lá se
denomina syndicat des propriétaires (“sindicato de proprietários”).
Também na Colômbia, desde a vigência da Lei n° 675, de 2001, o
condomínio é dotado de personalidade jurídica expressa, após a devida inscrição
no órgão municipal próprio.
O mesmo ocorre na Argentina, já que com a vigência da Lei n° 13.512,
de 1948, é reconhecida a personalidade jurídica do condomínio, medida
normativa que apenas tratou de “confirmar o que já vinha sendo decidido e
aplicado pelos tribunais de todo o país com aplausos de todos os doutrinadores”.
[249]

Não vislumbramos, diante de tudo que foi colocado, qualquer obstáculo


para o reconhecimento do condomínio edilício como verdadeira pessoa jurídica,
com efetiva capacidade para adquirir imóveis (por adjudicação em vista de
condômino inadimplente, ou outro meio) comprar e vender, contratar
empregados, prestar serviços, emprestar, locar ou dar em locação, transigir,
enfim, atua na vida negocial como qualquer pessoa jurídica, dentro de seu
âmbito de atuação.


3.5 ESPÉCIES DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO OU
CONDOMÍNIO EM EDIFICAÇÕES

O condomínio edilício ou condomínio em edificações pode ser


classificado da seguinte maneira: a) condomínio convencional: espécie que se
origina da vontade dos condomínios, materializada numa convenção ou estatuto
(por exemplo, várias pessoas resolvem adquirir um prédio de apartamentos
pertencente a apenas uma pessoa; após a compra cada um dos compradores fica
como titular de um apartamento); b) condomínio eventual: espécie que resulta da
vontade de terceiros e não dos condôminos (por exemplo, da vontade do doador
do imóvel expressa em escritura pública, da vontade do testador expressa em
testamento público ou privado, etc.); e c) condomínio legal: aquele que é
imposto por força de lei.


3.6 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO
CONDOMÍNIO EDILÍCIO


São 3 (três) elementos constitutivos do condomínio edilício: 1) o ato de
criação ou ato de instituição do condomínio; 2) a convenção do condomínio; 3)
o regulamento interno ou regimento interno do condomínio; e 4) os
regulamentos especializados.
NARCISO ORLANDI NETO explica oportunamente que a instituição
do condomínio de apartamentos visa regular as relações jurídicas entre os
diversos proprietários, considerando uns em relação aos outros, e todos em
relação ao edifício, que é o objeto de seu domínio.[250] Com a instituição do
condomínio, segue a especificação, que corresponde à discriminação das
unidades autônomas exclusivas, das partes comuns e das frações ideais sobre o
terreno. Além disso, cumpre que seja elaborada a convenção do condomínio, que
é a norma regulamentar do condomínio, disciplinando o uso do edifício. A
convenção destina-se, pois, a todos os titutlares (proprietários condôminos) ou
moradores (dependentes do proprietário, locatários, etc.) de unidades autônomas.
A convenção enumera os direitos e as obrigações dos proprietários.[251]


3.6.1 O ato de instituição do condomínio


O ato de criação ou ato de instituição do condomínio é um ato
obrigatório. Tal ato é disciplinado pelo art. 1.332 do Código Civil de 2002,[252] o
qual dispõe o seguinte: “Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou
testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar
daquele ato, além do disposto em lei especial: I- a discriminação e
individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremada uma das
outras e das partes comuns: II- a determinação da fração ideal atribuída a cada
unidade, relativamente ao terreno e partes comuns; III- o fim a que as unidades
se destinam”.
Portanto, este ato pode ser realizado inter vivos (somente por escritura
pública) ou causa mortis (testamento público ou particular). A incorporação
imobiliária (ato realizado inter vivos) é a forma mais comum.
Por sinal, o parágrafo único do art. 28 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,
menciona que “considera-se incorporação imobiliária a atividade exercida com
o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de
edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas”. O
Código Civil de 2002 nada trata a respeito de incorporações imobiliárias.
A Lei n° 4.591, de 16.12.1964, prevê 3 (três) tipos de contratos de
incorporações: 1) Construção por conta e risco do incorporador, em que se
compromete ele a vender as unidades autônomas a prazo e preço certo. Tal
modalidade encontra-se caracterizada no caput do art. 41 da referida Lei n°
4.591, de 16.12.1964,[253] o qual menciona que “quando as unidades imobiliárias
forem contratadas pelo incorporador por preço global compreendendo quota de
terreno e construção, inclusive com parte de pagamento após a entrega da
unidade, discriminar-se-ão, no contrato, o preço da quota de terreno e o da
construção”; 2) Construção por empreitada. Tal modalidade encontra-se
caracterizada no art. 55 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,[254] o qual prevê 2 (duas)
subespécies: a) construção por empreitada a preço fixo (o preço da construção
será irreajustável, independentemente das variações que sofrer o custo efetivo
das obras e qualquer que sejam suas causas); e b) construção por empreitada a
preço reajustável por índices previamente determinados (o preço fixado no
contrato será reajustado na forma e nas épocas nêle expressamente previstas, em
função da variação dos índices adotados, também previstos obrigatóriamente no
contrato); 3) Construção por administração, de inteira responsabilidade dos
condôminos. Tal modalidade encontra-se caracterizada no art. 58 da Lei n°
4.591, de 16.12.1964,[255] o qual menciona que “nas incorporações em que a
construção for contratada pelo regime de administração, também chamado ‘a
preço de custo’, será de responsabilidade dos proprietários ou adquirentes o
pagamento do custo integral de obra”.
Seja como for, para que as unidades construídas existam como unidades
autônomas, se faz necessário realizar a instituição do condomínio, a fim de que,
a partir de então, reúnam-se e se articulem a propriedade coletiva (áreas
comuns) e a propriedade individual (unidades autônomas), o que vai exigir
também uma organização a fim de promover sua gestão e manutenção, os quais
serão reguladas pela convenção, Regimento Interno, assembleias gerais e a
administração do condomínio edilício.
Como visto, este ato de instituição do condomínio edilício precisa
atender a 3 (três) requisitos distintos: I- a discriminação e individualização das
unidades de propriedade exclusiva, extremadas uma das outras e das partes
comuns; II- a determinação (indicação) da fração ideal atribuída a cada unidade,
relativamente ao terreno e partes comuns; III- o fim a que as unidades se
destinam – finalidade condominial.
Qualquer um desses requisitos só pode ser modificado por unanimidade
dos condôminos. Se um dos condôminos se recusa injustificadamente, cabe
supressão judicial. Igualmente, a construção de outro pavimento, ou, no solo
comum, de outro edifício, destinado a conter novas unidades imobiliárias,
também depende da aprovação da unanimidade dos condôminos (art. 1.343 do
Código Civil de 2002).[256] E, ainda, o proprietário ou titular de direito à
aquisição de unidade autônoma somente pode fazer obra que modifique sua
fachada, se obtiver a aquiescência da unanimidade dos demais condôminos (§2°
do art. 10 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964).[257]
É oportuno lembrar que a primeira assembleia que ocorre no
condomínio edilício é a assembleia de instalação, momento em que a
construtora ou incorporadora transfere a administração aos condôminos. É o
momento adequado para os condôminos elegerem o primeiro síndico e conselho
fiscal, determinarem o valor da quota condominial, estabelecerem uma comissão
para analisar a minuta da convenção, dentre outras deliberações condominiais.
Em suma , para se instituir um condomínio em edificações deve ser
rigorosamente atendido os seguintes elementos: 1) elemento objetivo da
instituição do condomínio: existência de uma edificação com unidades
autônomas (apartamentos, casas, lojas, garagens, etc.); 2) elemento subjetivo da
instituição do condomínio: existência de 2 (dois) ou mais titulares diversos de
unidade autônoma (dois ou mais proprietários/condôminos); 3) elemento da
instituição do condomínio por ato inter vivos, com inscrição obrigatória no
Registro Geral de Imóveis – RGI; 4) inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa
Jurídica – CNPJ: mesmo com Cadastro Especifico do Instituto Nacional do
Seguro Social – CEI/INSS,[258] é obrigatória a inscrição do condomínio no
Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ, por força dos artigos 214 e 215
do Decreto n° 3.000, de 26.03.1999,[259] que regulamenta a tributação,
fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos
de Qualquer Natureza, e do inciso II do art. 4° da Instrução Normativa/RFB n°
1.634, 06.05.2016, que dispõe sobre o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica
(CNPJ).
Vale ressaltar ainda que, a jurisprudência tem admitido a cobrança
judicial de contribuições condominiais mesmo que irregularmente constituído o
condomínio edilício, também chamado “condomínio de fato”, caso o
proprietário tenha aderido a comunhão de fato e se beneficia efetivamente de
serviços ou benfeitorias do condomínio. Predomina o princípio do animus de
associar e o princípio contrário ao enriquecimento ilícito. Porém, cabe analisar o
caso concreto.

“AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CONDOMÍNIO
DE FATO. TAXA DE MANUTENÇÃO COBRADA POR
ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. REDIRECIONAMENTO
DA EXECUÇÃO AO NOVO PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL
QUE NÃO É ASSOCIADO NEM ANUIU COM O ENCARGO.
IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Para efeitos
do art. 543-C do CPC, firma-se a seguinte tese: ‘As taxas de
manutenção criadas por associações de moradores não obrigam
os não associados ou que a elas não anuíram’. (REsp
1439163/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA,
Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, SEGUNDA SEÇÃO,
julgado em 11/3/2015, DJe 22/5/2015). 2. Agravo regimental a
que se nega provimento”.[260]

“DIREITO CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONDOMÍNIO
DE FATO. AUSÊNCIA DE REGISTRO DA CONVENÇÃO DE
CONDOMÍNIO NO CARTÓRIO DE REGISTRO DE
IMÓVEIS. COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO PARA AS
DESPESAS COMUNS. INEXIGIBILIDADE. A jurisprudência
havia pacificado o entendimento de que o proprietário de lote
integrante de loteamento aberto ou fechado, sem condomínio
formalmente instituído, cujos moradores constituíram sociedade
para prestação de serviços de conservação, limpeza e
manutenção, deveria contribuir com o valor correspondente ao
rateio das despesas daí decorrentes, pois não se afiguraria justo
nem jurídico que se beneficiasse dos serviços prestados e das
benfeitorias realizadas sem a devida contraprestação. Sem
embargo, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça
decidiu que associação de moradores não tem autoridade para
cobrar taxa condominial ou qualquer contribuição compulsória
de quem não é associado. Frise-se, ainda, que o entendimento do
C. STJ encontra-se em consonância com o recente julgamento
proferido pelo E. Supremo Tribunal Federal, no RE 432106, no
dia 20.9.2011 de relatoria do Min. Marco Aurélio, no qual restou
decidido que descabe a associação de moradores, a pretexto de
evitar vantagem sem causa, impor mensalidade a morador ou a
proprietário de imóvel que a ela não tenha aderido. Por todo
exposto, considerando não só a inexistência de serviços
efetivamente prestados pelo demandante, onus probandi do qual
não se desincumbiu a parte autora, mas também, o fato de o
apelante não ter aderido a qualquer associação, há de se reformar
a sentença. Provimento do recurso”.[261]

Em suma, o instrumento de instituição, especificação e convenção é
realizado antes da construção, no caso de incorporação imobiliária; ou depois, se
um apenas é o proprietário. Como visto, admite-se a forma pública ou particular.
Deve ser levado tal instrumento ao Registro Geral dos Imóveis, observando-se
rigorosamente as disposições contidas na alínea r do inciso I [“No Registro de
imóveis serão feitas (...) a inscrição (...) dos memoriais de incorporação e das
instituições e convenções de condomínio a que alude a Lei n° 4.591, de 16 de
dezembro de 1964”] e na alínea g do inciso III [“No Registro de imóveis serão
feitas (...) a averbação (...) da individuação das unidades autônomas condominiais de que trata a Lei n
° 4.591, de 16 de dezembro de 1964, e o artigo 13 do Decreto n° 55.815, de 8 de março de
1965”], ambos do art. 168, e art. 176 da Lei n° 6.015, de 31.12.1973 (dispõe sobre
os registros públicos, e dá outras providências). No entanto, antes disso, deve ser
providenciada a averbação da construção, junto ao registro da incorporação
(matrícula-mãe no Registro Geral dos Imóveis). A averbação é ato que segue o
registro da incorporação, envolvendo a discriminação e a numeração das
unidades autônomas. Com a referida averbação inicia-se a existência formal do
condomínio. Por sinal, a regulamentação da realização da tal averbação
encontra-se prevista no art. 44 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964.[262]
Por sinal, é inviável o ingresso, no Registro de Imóveis, de título
referente a unidades autônomas de edifício sem que registrada a especificação do
condomínio e apresentada a carta de habitação.


3.6.2 A convenção do condomínio


A convenção do condomínio em edificações também é obrigatória e tem
natureza estatutária, já que, em face de sua natureza não negocial (não é contrato
e sim, estatuto), vincula terceiros. Assim, o terceiro que eventualmente ingresse
posteriormente a convenção, deverá obedecer as regras ali estabelecidas na
convenção.
Por sinal, a minuta de convenção do condomínio edilício é um dos
documentos obrigatórios para o Registro do Memorial de Incorporação. Porém,
cabe aos condôminos, a partir da instituição do condomínio, aprová-la pelos
condôminos que representem, no mínimo, 2/3 (dois terços) das frações ideais (§
2º do art. 9º da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,[263] e art. 1.333 do Código Civil de
2002).[264]
O § 3º do art. 9º da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, determina que, além de
outras normas aprovadas pelos interessados, a convenção do condomínio edilício
deve conter o seguinte: a) a discriminação das partes de propriedade exclusiva,
e as de condomínio, com especificações das diferentes áreas; b) o destino das
diferentes partes; c) o modo de usar as coisas e serviços comuns; d) encargos,
forma e proporção das contribuições dos condôminos para as despesas de
custeio e para as extraordinárias; e) o modo de escolher o síndico e o Conselho
Consultivo; f) as atribuições do síndico, além das legais; g) a definição da
natureza gratuita ou remunerada de suas funções; h) o modo e o prazo de
convocação das assembleias gerais dos condôminos; i) o quorum para os
diversos tipos de votações; j) a forma de contribuição para constituição de fundo
de reserva; l) a forma e o quorum para as alterações de convenção; m) a forma e
o quorum para a aprovação do Regimento Interno, quando não incluídos na
própria convenção do condomínio edilício.
As matérias obrigatórias da convenção do condomínio edilício também
estão previstas no art. 1.334 do Código Civil de 2002 e são as seguintes: 1) taxa
condominial; 2) modo de administração; 3) competência das assembleias; 4)
forma de sua convocação e quorum exigido para as deliberações; 5) as sanções
a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores; 6) necessidade ou não de
regimento interno; 7) sanções.
A experiência do dia-a-dia recomenda que sejam incluídas na minuta de
convenção do condomínio edilício as seguintes matérias, divididas em capítulos,
apropriadamente: 1) Finalidade; 2) Descrição e Caracterização [deve constar as
seguintes matérias: material empregado na construção, número de pavimentos e
o total de apartamentos; localização do apartamento do zelador, da casa de
máquinas e de bombas de água; determinação do local da garagem ou
estacionamento de carros; as áreas úteis e comuns do edifício devem ser
mencionadas com o número de metros quadrados]; 3) Partes Comuns e
Autônomas [todo edifício é assim constituído: as partes comuns, indivisíveis e
inalienáveis, de propriedade de todos os condôminos e as partes autônomas, de
uso privativo de seus respectivos proprietários; definição precisa do que constitui
a propriedade comum a que se refere o art. 3° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964:[265]
terreno, fundações, estruturas de concreto armado, paredes, escadas, máquinas,
elevadores, bombas, encanamentos, caixas-d’água, depósitos, medidores,
jardins, portarias, halls, condutores de águas pluviais, compactadores, antena
coletiva, instalações de incêndio, etc. Enfim tudo o que pela sua própria
natureza, for de uso do edifíci. Não deve ser omitidos, ainda, a garagem quando
pertencer ao condomínio, playground, piscina, casa de máquinas, residência do
porteiro, portaria, corredores de serviços, vestíbulos, etc. Condôminos com
direito a vagas ou boxe de garagem – deve haver menção indispensável desse
fato em um dos artigos da convenção. Em outro artigo deve ser denominada a
fração de avos que cabe a cada unidade]; 4) Direção do Edifício [deve constar
sua constituição em geral: Assembleia-Geral, Conselho Consultivo, Síndico e
Subsíndico, cujas atribuições serão mencionadas em capítulos próprios]; 5)
Assembleia-Geral; 6) Conselho Consultivo; 7) Síndico e Subsíndico [O art. 1.348
do Código Civil de 2002 [266] e o art. 22 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964.[267]
definem o que se deve mencionar neste capítulo da convenção, sobretudo a
responsabilidade, competência, eleição, destituição, delegação de poderes, pro
labore, quem pode ser escolhido síndico, bem como a eleição de subsíndico
(facvultativa)]; 8) Direitos e Deveres dos Condôminos [Este capítulo é o resumo
do Regulamento Interno do edifício, devendo-se atentar para o fato de que os
arts. 1.335 e 1.336 do Código Civil de 2002 [268] e o art. 10, 11, 19 e 20 da Lei n°
4.591, de 16.12.1964.[269]]; 9) Contribuições para as Despesas de Orçamentos;
Discriminação das Despesas Comuns do Condomínio [As Assembleias-Gerais
cabe aprovar o orçamento anual, bem como a forma de ratear, além de fixar a
época dos pagamentos, bem como as despesas extraordinárias e como cobrá-las
mediante rateio]; 10) Fundo de Reserva [O fundo de reserva está previsto na
alínea j do §3° do art. 9° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964. A convenção deve
prever o destino do que for arrecadado, juntamente com a quota de condomínio,
e os casos em que serão levados ao fundo de reserva quantias oriundas de
receitas extraoridinárias ou não previstas. A boa doutrina recomenda a inclusão
do seguinte artigo na convenção do condomínio: “As quotas arrecadadas a
qualquer título para o Fundo de Reserva serão mantidas, em conta separada, num
banco escolhido pelo Síndico, com a prévia aprovação do Conselho Consutivo.
Esta conta somente poderá ser movimentada com autorização do Conselho
Consultivo, devendo os respectivos cheques ser assinados pelo Síndico e pelo
Presidente do Conselho ou pelo seu substituto legal. Em caso de emergência, o
Síndico, previamente autorizado pelo Conselho, poderá utilizar, eventualmente,
recursos do Fundo de Reserva para realizar despesas ordinárias, até que seja
possível sua reposição com fundos específicos”];[270] 11) Estacionamento de
carros (Garagem) [Deve haver na convenção capítulo definindo o que é ou não
permitido fazer no local do estacionamento e quem tem o direito de usar as
vagas de garagem e seu exato local; bem como permissão para alugar a
moradores, horário, custeio, acidentes, roubos, etc. Deve haver ainda previsão
para o caso de arrendamento de empregados da garagem ao condomínio, bem
como disciplina, limpeza e responsabilidade]; 12) Penalidades; Multas [Deve
haver na convenção capítulo definindo a incidência de penalidades, seu
cabimento nos casos de atrasos nos pagamentos de quotas ou nos casos de
infrações das do Código Civil, da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, e das normas
internas do condomínio]; 13) Disposições Gerais e Transitórias [Em tal capítulo
deve-se dar destaque às obrigações em relação a seguros do condomínio,
observando o que determina os arts. 13 a 18 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, bem
como fixação do exercício administrativo e do financeiro. Deve haver também
previsão indispensável dos casos de alienação, locação ou cessão, a qualquer
título, de apartamentos a terceiros. Em casos tais, os condôminos devem ser
obrigados a fazer constar do respectivo instrumento a imposição como
compromisso irretratável ao adquirente, locatário ou titular do direito de uso, de
observar e cumprir fielmente os dispositivos da convenção e regulamento do
edifício, sob pena de nulidade da transação e incorrer o condômino infrator em
multa nunca inferior a 10 (dez) salários-mínimos da região. Neste capítulo deve-
se incluir os seguintes artigos: a) “Fica eleito o foro desta cidade para qualquer
ação ou execução decorrente da aplicação de qualquer de seus dispositivos”; b)
“Assinada a Convenção pelos Condôminos que representem pelo menos dois
terços do Condomínio, será efetuado seu registro no cartório do Registro de
Imóveis”; e para encerrar a convenção; c) “E por todo o exposto estarem justos e
acordados no que concerne aos direitos e obrigações constantes das cláusular
supra e retromencionadas, assinam a presente Convenção, para que produzam
seus efeits e direitos”].
Vale destacar que a convenção de condomínio deve ser feita em 2 (duas)
vias, rubricadas pelo síndico e pelo presidente do Conselho Consultivo. As
assinaturas, num número mínimo de 2/3 (dois terços) dos condôminos, devem
ser reconhecidas e seus subscrotores qualificados, inclusive mencionando o
Cadastro de Pessoa Física – CPF. Com efeito, a convenção é a verdadeira
constituição do condomínio edilício, pois é ela que vai estabelecer as regras do
condomínio. Por isso ela deve ser aprovada por 2/3 (dois terços) das frações
ideais. Assim está prescrito no caput do art. 1333 do Código Civil de 2002: “A
convenção que constitui o condomínio edilício deve ser subscrita pelos titulares
de, no mínimo, dois terços das frações ideais e torna-se, desde logo, obrigatória
para os titulares de direito sobre as unidades, ou para quantos sobre elas tenham
posse ou detenção”.
No entanto, nos termos do art. 44 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, para
que um condomínio venha ser regularizado é mister proceder-se, primeiramente,
a averbação de sua convenção. Dessa maneira, desaparece a incorporação, que
cede lugar ao condomínio, valendo-se lembrar, a propósito, a lição de CAIO
MARIO DA SILVA PEREIRA, no senti de que “o contrato de incorporação
extingue-se com a conclusão da edificação ou do conjunto de edificações e sua
entrega aos adquirentes em condições de habitabilidade, considerada esta
expressão no sentido de sua utilização”.[271]
Outrossim, o parágrafo único do art. 1.333 do Código Civil de 2002
prescreve que “para ser oponível contra terceiros, a convenção do condomínio
deverá ser registrada no Cartório de Registro de Imóveis”. No entanto, esta
disposição legal não se justifica, pois ela é oponível a terceiros pela sua própria
natureza, sua gênese estatutária, conforme vem entendo o Superior Tribunal de
Justiça – STJ.

“A convenção de condomínio aprovada, ainda que sem registro, é
eficaz para regular as relações entre os condôminos”.[272]

Portanto a convenção pode ser modificada por maioria de 2/3 das frações
ideais, conferindo o direito de voto ao condômino que estiver quite, com o
pagamento em dia.
Algumas questões polêmicas concernentes aos atos constitutivos tem
sido objeto de muita discussão.
A primeira delas diz respeito à permissão de entrada de animais. A
convenção do condomínio pode proibir de forma peremptória a entrada de
quaisquer animais. Tal proibição foi assegurada pelo Superior Tribunal de
Justiça – STJ, o qual entende que esta proibição decorre do principio da
razoabilidade, tendo por referência a segurança, o sossego e a saúde (art. 1.277
do Código Civil de 2002).[273]

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. CIVIL. CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO.
CRIAÇÃO DE ANIMAL. PROIBIÇÃO SOMENTE
DAQUELES QUE COMPROMETAM A HIGIENE E A
TRANQUILIDADE DO EDIFÍCIO. AUSÊNCIA DE PROVA
DE QUE O ANIMAL DO AGRAVADO TENHA SIDO ALVO
DE RECLAMAÇÕES ESPECÍFICAS. REVISÃO. SÚMULAS 5
E 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da
orientação jurisprudencial do eg. Superior Tribunal de Justiça
deve prevalecer o ajustado entre os condôminos na convenção do
condomínio acerca da criação de animal em unidade
condominial. Precedentes. 2. Na hipótese dos autos, a Corte de
origem esclareceu que a convenção condominial somente veda a
criação de animais que comprometam a higiene e a tranquilidade
do edifício, não havendo, ainda, a prova de reclamação específica
contra o animal do ora agravado. 3. Desse modo, infirmar as
conclusões do julgado demandaria a interpretação da convenção
condominial, bem como o revolvimento do suporte fático-
probatório da demanda, o que encontra vedação nos enunciados
das Súmulas 5 e 7 desta Corte Superior. 4. Agravo regimental a
que se nega provimento”.[274]

“DIREITO CIVIL. CONDOMINIO. ANIMAL EM
APARTAMENTO. VEDAÇÃO NA CONVENÇÃO. AÇÃO DE
NATUREZA COMINATORIA. FETICHISMO LEGAL.
RECURSO INACOLHIDO. I- Segundo doutrina de escol, a
possibilidade da permanencia de animais em apartamento
reclama distinções, a saber: a) se a convenção de condominio e
omissa a respeito; b) se a convenção é expressa, proibindo a
guarda de animais de qualquer especie; c) se a convenção é
expressa, vedando a permanencia de animais que causam
incomodo aos condominos. II- Na segunda hipotese (alinea b), a
reclamar maior reflexão, deve-se desprezar o fetichismo
normativo, que pode caracterizar o summum jus summa injuria,
ficando a solução do litigio na dependencia da prova das
peculiaridades cada caso”.[275]

“CIVIL. CONDOMINIO. ANIMAL EM APARTAMENTO. A
proposito de animal em apartamento, deve prevalecer o que os
condominos ajustaram na convenção. Existencia no caso de
clausula expressa que não atrita com nenhum dispositivo de lei.
Recurso especial conhecido e provido”.[276]

A segunda delas diz respeito ao culto religioso. Tal questão implica na
observância do direito à liberdade de crença em sede constitucional (aplicação
do principio da razoabilidade). Pode, portanto, proibir se houve interferências de
segurança, sossego e saúde (art. 1.277 do Código Civil de 2002).
A terceira delas diz respeito ao roubo e furto nas áreas comuns do
condomínio. O fato de ser um condomínio edilício, não há de se falar em
incidência do Código de Defesa do Consumidor (Lei n° 8.078, de 11.09.1990),
logo não se aplicando a Sumula n° 130 do Superior Tribunal de Justiça – STJ
(“A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de
veiculo, ocorrido em seu estacionamento”). Assim, se não há relação de
consumo, a regra geral, não cabe responsabilização do condomínio no caso de
roubo e furto nas áreas comuns.
No entanto, o próprio Superior Tribunal de Justiça – STJ vem
flexibilizando essa regra, com as seguintes exceções: 1) se a convenção
expressamente dispuser; taxa específica a empresa de segurança, deve proceder a
indenização cabível e exercer o direito de regresso em face da empresa de
segurança; 2) quando o furto for cometico pelo empregado do condomínio, este
responde pela indenização, não pela qualidade de condomínio, mas sim, pela
qualidade de tomador do serviço.

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO POR
FURTO EM ÁREA COMUM. NECESSIDADE DE PREVISÃO
EXPRESSA NA CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO.
AUSÊNCIA DA CONVENÇÃO OU REGIMENTO INTERNO
DO CONDOMÍNIO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE
NEGA PROVIMENTO. 1. Ausente a Convenção de
Condomínio, ou Regimento Interno do mesmo, inviável aferir se
há previsão expressa de responsabilidade nos casos de furto em
área comum. A presença da cláusula é condição para a
responsabilização do condomínio nos termos da jurisprudência
pacífica desta Corte. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se
nega provimento”.[277]

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE
INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL.
CONDOMÍNIO. FURTO EM UNIDADE AUTÔNOMA.
MATÉRIA DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. ALEGADA
EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA DE RESPONSABILIDADE.
SÚMULA 5/STJ. PREPOSTO. RESPONSABILIDADE
OBJETIVA DO CONDOMÍNIO. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ.
PRECEDENTES. 1. A Segunda Seção desta Corte firmou
entendimento no sentido de que ‘O condomínio só responde por
furtos ocorridos nas suas áreas comuns se isso estiver
expressamente previsto na respectiva convenção’(EREsp
268669/SP, Relator o Ministro ARI PARGENDLER, DJ de
26.4.2006). 2. Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido está
fundamentado no fato de que: (a) o furto ocorreu no interior de
uma unidade autônoma do condomínio e não em uma área
comum; (b) o autor não logrou êxito em demonstrar a existência
de cláusula de responsabilidade do condomínio em indenizar
casos de furto e roubo ocorridos em suas dependências. 3. Para se
concluir que o furto ocorreu nas dependências comuns do
edifício e que tal responsabilidade foi prevista na Convenção do
condomínio em questão, como alega a agravante, seria necessário
rever todo o conjunto fático probatório dos autos, bem como
analisar as cláusulas da referida Convenção, medidas, no entanto,
incabíveis em sede de recurso especial, a teor das Súmulas 5 e 7
desta Corte. 4. Impossibilidade de análise da questão relativa à
responsabilidade objetiva do condomínio pelos atos praticados
por seus prespostos por ausência de prequestionamento. 5.
Agravo regimental a que se nega provimento”.[278]

A quarta delas diz respeito à alteração de fachada. Esta alteração pode
ocorrer de 3 (três) formas: 1) se for alteração da fachada para benfeitoria útil
(necessária), ou seja, para mera conservação, é preciso a aprovação de de
maioria simples (metade mais um); 2) se a obra de alteração da fachada é para
benfeitoria voluptuária (embelezamento do prédio) é preciso a aprovação da
maioria de 2/3 (dois terços); 3) se se trata de mudança da natureza da fachada: é
preciso aprovação por unanimidade, bem como do arquiteto, pois a Lei de
Direito Autoral (inciso X do art. 7° e inciso IV do art. 24, ambos da Lei n° 9.610,
de 19.02.1998)[279] garante o direito de arquiteto preservar a criação
arquitetônica. De maneira que, se for mudada a fachada de imóveis imobiliários,
deve ter a concordância do arquiteto, sob pena de perda e danos.
Os banners publicitários colocados nos prédios podem ser autorizados
pela convenção de condomínio. Outrossim, quando condomínio comercial,
presume-se a possibilidade de se fazer a propaganda, podendo a convenção
impedir.

“Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Indenização.
Condomínio. Publicidade. Fundamentos não impugnados. 1.
Constatou o Tribunal a existência de acordo entre as partes,
representado o condomínio pela maioria, quanto à utilização do
espaço da cobertura do edifício, cujos termos devem ser
cumpridos. O entendimento do acórdão no sentido de que
incidente o artigo 635, § 1º, do Código Civil e de que não existe
qualquer causa de nulidade do acordo entre as partes não foi
impugnado, restando incólume. Devidamente esclarecido no
despacho ora agravado que o recorrente não indicou qualquer
dispositivo legal ou jurisprudência que pudesse afastar referido
entendimento, suficiente à manutenção do acórdão. 2. Agravo
regimental desprovido”.[280]

Todavia, é insuscetível a introdução de cláusula na convenção,
reservando para o incorporador o uso do telhado ou das paredes do prédio, para
fins de exploração com propaganda ou publicidade.[281] Por sinal, o art. 3° da Lei
n° 4.591, de 16.12.1964,[282] inclui as paredes e o telhado nas coisas comuns,
pertencentes à totalidade dos condôminos.


3.6.3 O regulamento interno do condomínio


Não é novidade o fato de que muitos condomínios edilícios não
possuírem um Regulamento Interno. No entanto, o Regulamento Interno é
indispensável para que um síndico possa bem administrar o edifício.
O Regulamento Interno contém várias regras de conduta e modo de agir
a serem seguidas não só pelos condôminos, mas por todos os moradores do
edifício, visitantes e serviçais, os quais devem respeitar tais regras em todas as
partes do edifício, tanto nas áreas comuns como nas unidades autônomas.
O Regulamento Interno está previsto no §2 do art. 10 [“O transgressor
ficará sujeito ao pagamento de multa prevista na convenção ou no regulamento
do condomínio, além de ser compelido a desfazer a obra ou abster-se da prática
do ato, cabendo, ao síndico, com autorização judicial, mandar desmanchá-Ia, à
custa do transgressor, se êste não a desfizer no prazo que lhe fôr estipulado”] e
no art. 18 [“A aquisição parcial de uma edificação, ou de um conjunto de
edificações, ainda que por fôrça de desapropriação, importará no ingresso do
adquirente no condomínio, ficando sujeito às disposições desta lei, bem assim às
da convenção do condomínio e do regulamento interno”], ambos da Lei n°
4.591, de 16.12.1964. Está também previsto no inciso V do art. 1.334 [“Além
das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados houverem por bem
estipular, a convenção determinará (...) o regimento interno”], no inciso IV do
art. 1.348 [“Compete ao síndico (…) cumprir e fazer cumprir a convenção, o
regimento interno e as determinações da assembleia”], e no caput do art. 1.350
[“Convocará o síndico, anualmente, reunião da assembleia dos condôminos, na
forma prevista na convenção, a fim de aprovar o orçamento das despesas, as
contribuições dos condôminos e a prestação de contas, e eventualmente eleger-
lhe o substituto e alterar o regimento interno”], todos do Código Civil de 2002.
No entanto, tal conjunto de regras tem a denominação de “Regulamento
Interno” nas disposições da Lei n° 4.591, de 16.12.1964. Denominação esta
modificada para “regimento interno” nas disposições do Código Civil de 2002.
Na prática, o Regulamento Interno ou Regimento Interno deve conter o
seguinte: 1) o horário de funcionamento de abertura e encerramento dos portões;
2) quem não pode usar o elevador social; 3) disciplina da utilização do
playground, salão de festas, piscina, o horário das crianças brincarem e o que
não podem fazer; 4) a quem não se pode alugar apartamentos ou lojas; 5)
proibição de obras, pinturas, decorações sem a devida autorização prévia; 6) não
ocupação de áreas comuns, sobretudo dos corredores, halls, passeios, etc., com
objetos ou veículos; 7) permanência de empregados e fornecedores no edifício;
8) uso de aparelhos de som, a realização de festas; 9) a proibição de estender
roupas e colocar vasos nas janelas, de atirar lixo, papéis, de cuspir, de bater
tapetes, de sacudir roupas pelas varandas e janelas; 10) como e quando utilizar o
tubo de lixo; 11) com o que o condomínio não se responsabiliza; 12) horário de
mudanças, responsabilidade por danos; 13) obrigatoriedade do preenchimento
dos cartões de moradores; 14) reclamações e sugestões ao síndico: como devem
ser feitas; 15) proibição ou não de manter aves e animais; 16) a retirada de
entulhos de obras; 17) a regulamentaão da colocação das antenas; 18) a
obrigação que nos contratos de locação das unidades autônomas deverá constar,
dos locatários e seus dependentes de respeitarem o Regulamento Interno ou
Regimento Interno, sob pena de despejo; 19) obrigatoriedade de aviso de
doenças contagiosas ao síndico; 20) não utilização dos empregados do edifício
para uso particular, durante o horário de trabalho; 21) proibição de colocação de
anúncios, avisos, etc., bem como de aglomerações, reuniões de qualquer caráter,
salvo as que visarem ao interesse do condomínio; 22) proibição de guarda de
explosivos ou inflamáveis no depósito e nas unidades autônomas; 23) quem
pode transitar pela porta social; 24) referência especial se houver garagem (nesse
caso, o mais recomendável é aprovar um Regulamento somente para a utilização
da garagem); 25) infrações sujeitas às multas impostas pelo síndico bem como a
menção expressa de que os casos omissos serão resolvidos pelo Conselho
Consultivo; 26) não instalação de aparelhos que possam produzir trepidações,
abalos, poluição ou ruídos, sons ou exalar odores desagradáveis, tóxicos ou
insalubres, que possam pôr em perigo a segurança ou tranquilidade do
condomínio; 27) proibição de lavar assoalhos, que só podem ser encerados,
envernizados ou plastificados, não permissão de estacionar carros na calçada
fronteira ou na entrada do edifício; 28) recomendação sobre as portas das
unidades autônomas que devem ser mantidas fechadas, sem “batê-las”, a fim de
não serem perturbados os moradores; 29) exoneração de responsabilidade do
condomínio por roubos, danos, inclusive por prejuízos que venham a verificar-se
por falta de água, por interrupção de luz, gás ou força, por enguiços de bombas
ou de outras instalações; 30) permissão apenas do uso de fogões a gás ou
eletricidade; 31) não consentimento de leilões, com exceção dos judiciais ou a
critério do síndico [as reparações necessárias em quaisquer instalações,
encanamentos, pisos, revestimentos, paredes internas, devem ser por conta dos
condôminos, até as linhas-tronco]; 32) permissão para que o síndico e seus
representantes possam, quando necessário, acompanhar obras ou reparos com o
ingresso nas unidades autônomas; 33) alusão ao porteiro, que é preposto do
condomínio, cabendo-lhe, pois, fiscalizar o fiel cumprimento do Regulamento
Interno ou Regimento Interno; 34) a responsabilidade decorrente das infiltrações
de água: matéria de relevante importância; 35) definição da que cabe ao
condomínio, ao(s) ocupantes(s) ou ao(s) vizinho(s) da(s) unidade(s) atingida(s);
36) menção de obrigação geral de zelar pela boa reputação do edifício, inclusive
no caso de visitas de estranhos, principalmente à noite; 37) proibição aos
carteiros, mensageiros, mecânicos de elevadores, lixeiros, mata-mosquitos e
congêneres de se dirigirem aos apartamentos sem prévia autorização dos
moradores, aos quais desta forma se proporciona maior índice de segurança e
sossego; 38) etc.[283]


3.6.4 Os regulamentos especializados


Para que um condomínio edilício possa ser bem administrado, sem
conflitos entre os condôminos e entre estes e a administração do prédio, não é
bastante a existência de convenção e de Regulamento Interno ou Regimento
Interno, salvo quando se tratar de edifício com reduzido número de unidades
autônomas.
Mas quando o prédio comporta grande número de unidades autônomas,
tendo em diversificadas áreas comuns para serem administradas, tais como
garagem, playground, piscina, salão de festas ou de reuniões, bem como um
quadro de empregados qualificados (bombeiro, eletricista, gasista, etc.), há então
necessidade de que se aprovem ainda, em reunião do Conselho Consultivo ou na
própria Assembleia-Geral, os chamados Regulamentos Especializados ou
Regulamentos com Capítulos Específicos.
Por exemplo, não é difícil encontrar condomínio que conta com
Regulamento Específico para Mudanças, cujas regras são de suma importância
para síndico, condôminos moradores de um prédio.
ADOLPHO SHERMANN relata que muitas ocorrências, situações
graves e de difícil solução se apresentam quando é realizada uma simples
mudança para dentro de uma unidade autônoma, ou para fora dela. Em tais
casos, pode acontecer desde o dano do que é transportado, até um tombo e
acidentes que podem ocasionar a morte, mesmo, de alguma pessoa, bem como
roubos, estragos nas instalações, em paredes, pinturas, mármores, portas,
esquadrias, alvenarias, vidros, lustres, etc. do condomínio, dos condôminos e dos
moradores, sem contar possíveis ofensas aos próprios transeuntes ou aos
visitantes. É comum ainda ocorrer na realização de mudanças defeito em
elevador, por excesso de peso e a queda no espaço de algo que venha atingir um
carro estacionado, ou mesmo ferir ou matar alguém.[284]
O Regulamento Específico para Garagem é um dos que são
considerados mais difíceis de elaboração, face as discórdias permanentes nas
relações dos condôminos que possuem veículo automotor, uns com os outros.
Por sinal, a garagem de um condomínio edilício é a responsável por grande
número de ações judiciais que tramitam nos tribunais. De maneira que um
Regulamento Específico para Garagem omisso ou mal elaborado pode resultar
em graves danos ou males ao síndico, aos moradores, aos proprietários dos
veículos automotores, aos seus motoristas, aos empregados que trabalham na
garagem ou diretamente ao próprio condomínio, inclusive até mesmo a pessoas
estranhas que não fazem parte dele.


3.7 DIREITOS E DEVERES DOS CONDÔMINOS DO
CONDOMÍNIO EDILÍCIO


Os arts. 1335 e 1336 do Código Civil de 2002 e supletivamente Lei n°
4.591, de 16.12.1964, são as normas legais que regulam os direitos e deveres dos
condôminos [proprietários de suas unidades privativas (habitacionais) como
também, proporcionalmente, das áreas comuns que são compartilhadas por todos
os moradores de um condomínio, tais como hall social, salão de festas, garagens,
piscina, etc.; por isso é dever de todos os moradores mantê-las e conservá-las], a
fim de que haja duradoura convivência pacífica e justa no condomínio, isto é,
entre as pessoas de diferentes origens, religiões e estilos de vida que moram num
mesmo espaço comum.
De maneira que, ao se estabelecerem nas unidades autôniomas que
compõem um condomínio edilício, necessariamente, os condôminos estão
sujeitos a esse conjunto de direitos e de deveres, que a seguir analisaremos.


3.7.1 Direitos do condômino


Segundo o professor espanhol de Direito Civil da Universidad de Murcia
MANUEL BATLLE VAZQUEZ (1905-1977), de um modo geral, pode-se dizer
que o direito de cada proprietário de uma unidade autônoma em condomínio
edilício é um direito que opera sob os princípios gerais da propriedade privada
individual. Cada um deles tem o direito de dispor do seu apartamento, adquirido
por ato entre vivos, gratuito ou oneroso, ou por causa mortis, e ao mesmo tempo
é obrigado a respeitar tanto os limites colocados a qualquer direito de
propriedade e os resultantes da situação especial de comunhão em que se
encontram.[285]

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIROS.
AVALIAÇÃO E EDITAL DE PRAÇA ALCANÇANDO BEM
DE TERCEIROS. DIREITO DO CONDÔMINO DE
DEFENDER O CONDOMÍNIO. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADO. – Os Embargos
de Terceiros constituem remédio processual adequado para que
alguém estranho ao Processo de Execução defenda bem
ameaçado equivocadamente de expropriação judicial. – Pode
opor embargos de terceiros o condômino que vê a totalidade do
condomínio posta à venda em edital de praça relativo a execução
contra outro condômino. No caso, os embargos limitam-se ao
resguardo da fração ideal pertencente ao condômino não
executado (Código Beviláqua, Art. 623). – A circunstância de
que a ameaça de expropriação indevida poderia ser afastada
mediante simples requerimento nos autos não retira do
condômino não executado, o direito de opor embargos de
terceiros”.[286]

Portanto, os direitos de cada condômino são aqueles inerentes ao direito
de propriedade privada individual em relação à sua unidade autônoma e, ainda,
aqueles inerentes a titularidade do domínio da propriedade privada comum ou
coletiva, em relação às áreas comuns do prédio.
Nesse mesmo sentido é que o art. 19 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,
prescreve que “cada condômino tem o direito de usar e fruir, com exclusividade,
de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interêsses,
condicionados, umas e outros às normas de boa vizinhança, e poderá usar as
partes e coisas comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais
condôminos ou moradores, nem obstáculo ou embaraço ao bom uso das mesmas
partes por todos”.

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DE AGRAVO. DECISÃO
TERMINATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE JULGAMENTO
MONOCRÁTICO. AFASTADA. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE
FAZER. INSTALAÇÃO DE CÂMARAS DE SEGURANÇA,
POR CONDÔMINO, EM ÁREA COMUM DE EDIFÍCIO DE
APARTAMENTOS. VIOLAÇÃO AO ESTATUTO DO
CONDOMÍNIO. SOPESAMENTO ENTRE O DIREITO DE
PRIVACIDADE E O DE SEGURANÇA. RECURSO
IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. 1.O relator pode
antecipar o julgamento que seria da competência do colegiado, se
os elementos do recurso forem suficientes para evidenciar a
completa falta de razão jurídica para sustentar a pretensão do
recorrente. 2.A instalação de câmaras na área comum de edifício
de apartamentos, e o que deve ser gravado, deve ser objeto de
consenso entre os moradores do condomínio, pois o direito à
segurança do agravante não pode ser exercido de forma que viole
o direito à privacidade dos demais condôminos, não menos
importante. 3.À unanimidade de votos, negou-se provimento ao
recurso”.[287]

“RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. FURTO DE
VEÍCULO EM GARAGEM DE CONDOMÍNIO.
RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO. AUSENTE.
CONTRATO DE SEGURO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE À
SEGURADORA. COBERTURA SEGURADA. DEVER DE
INDENIZAR CONFIGURADO. IMPROCEDÊNCIA DA
AÇÃO EM RELAÇÃO AO RÉU- DENUNCIANTE.
CONDENAÇÃO DA DENUNCIADA. 1. Não há
responsabilidade do Condomínio pelo furto de veículo
estacionado na garagem do edifício se o Regimento Interno o
exime dessa obrigação e se não há prestação de serviço de
segurança. 2. Denunciada da lide, a seguradora passa a integrar o
polo passivo da demanda, formando um litisconsórcio. (CPC, art.
75, I) 3. Verificada a cobertura do seguro para o caso de furto
qualificado de veículo, deve a seguradora- denunciada responder
pelos danos materiais obtidos, pois responsável pela situação.
APELAÇÃO PROVIDA”.[288]

De maneira que, na enumeração dos direitos de cada condômino,
devemos sempre começar pelos direitos principais que são o direito de usar,
gozar, dispor e reivindicar a sua unidade autônoma de quem injustamente a
possua ou detenha, conforme assegurado pelo art. 1.228 do Código Civil de
2002.[289]
Todavia, nunca é demais lembrar que o uso da área privativa ou
propriedade privada individual (unidade autônoma) não é tão livre como muitos
pensam. Além dos impedimentos de uso previstos em convenção de condomínio,
como o uso comercial ou para cultos religiosos, há outros, como a proibição
contida no art. 42 da Lei Federal das Contravenções Penais (Decreto-Lei nº
3.688, de 03.101941),[290] no sentido de que qualquer cidadão brasileiro está
sujeito a multa, ou reclusão de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, ao perturbar o
sossego alheio com gritaria e algazarra, por exercer profissão incômoda ou
ruidosa, abusar de instrumentos sonoros e provocar o barulho animal. No mesmo
sentido, a Lei do Estado do Rio de Janeiro nº 126, de 10.05.1977 (Lei do
Silêncio), que dispõe sobre a proteção contra a poluição sonora, estendendo, a
todo o estado do Rio de Janeiro, o disposto no Decreto-lei nº 112, de 12.08.1969,
do ex-Estado da Guanabara, com as modificações que menciona,[291] proíbe
qualquer ruído que passar dos 85 (oitenta e cinco) decibéis em ambiente exterior
ao recinto em que tem origem. Outros estados têm leis e decretos semelhantes,
como São Paulo (Decreto n° 34.569, de 06.10.1994, reestruturado pelo Decreto n
° 35.928 de 06.03.1996), Espírito Santo e Minas Gerais (Lei nº 7.302, de
21.07.1978).
Com efeito, ter vizinhos barulhentos é, quase sempre, um problema
sério. Especialmente quando se mora em um prédio de apartamentos. São festas
com música alta, crianças chorando, móveis sendo arrastados e latidos de
cachorro atrapalhando o seu sossego. Quando a política da boa vizinhança já não
basta e as reclamações na portaria são insuficientes, deve-se lançar mão das
instâncias superiores (delegacia de polícia, Ministério Público, etc.).

“CONTRAVENÇAO PENAL PERTURBAÇAO DO
TRABALHO OU DO SOSSEGO ALHEIOS POLUIÇAO
SONORA PROVA ALVARÁ O abuso de instrumentos sonoros,
capaz de perturbar o trabalho ou o sossego alheios, tipifica a
contravenção do art. 42, III, do Decreto-lei nº 3688/41, sendo
irrelevante, para tanto, a ausência de prova técnica para aferição
da quantidade de decibéis, bem como a concessão de alvará de
funcionamento, que se sujeita a cassação ante o exercício
irregular da atividade licenciada ou se o interesse público assim
exigir”.[292]

“CONTRAVENÇAO PENAL PERTURBAÇAO DO
TRABALHO OU SOSSEGO ALHEIOS SERESTA PROVA
PERICIAL A promoção de serestas sem a devida proteção
acústica, configura a infração prevista no art. 42 do Decreto-lei nº
3688/41, sendo desnecessária a prova pericial para comprovar a
sua materialidade”.

“CONTRAVENÇAO PENAL PERTURBAÇAO DO
TRABALHO OU SOSSEGO ALHEIOS CULTO RELIGIOSO
POLUIÇAO SONORA A liberdade de culto deve ater-se a
normas de convivência e regras democráticas, tipificando a
contravenção prevista no art. 42, I, do Decreto-lei nº 3688/41 os
rituais que, através de poluição sonora ou do emprego de
admoestações provocantes dirigidas aos vizinhos, perturbem a
tranquilidade destes”.[293]

Além disso, o art. 1.335 do Código Civil de 2002 é mais abrangente ao
pormenorizar os direitos de cada condômino: “São direitos do condômino: I-
usar, fruir e livremente dispor das suas unidades; II- usar das partes comuns,
conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais
compossuidores; III- votar nas deliberações da assembleia e delas participar,
estando quite”.
Por sinal, HERNÁN RICCIATTI esclarece que os direitos que
correspondem aos vários comunheiros ou condôminos são, em caso de indivisão
forçada (condomínio necessário), muito mais extensos do que no suposta
copropriedade ordinária (condomínio voluntário). Assim, admite-se que cada um
dos condôminos possa usar a totalidade da coisa comum e suas diversas partes
como sua própria, com a única condição de não fazê-la servir a usos distintos
daqueles que a coisa está destinada e não prejudicar o direito igual e recíproco
que corresponde aos demais condôminos.[294] De maneira que o direito de uso de
cada condômino tem de observar a natureza e destinação da coisa comum e não
pode ser empregado em proveito exclusivo de apenas um condômino ou grupo
de condôminos.

“PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO -
INADIMPLEMENTO - TAXAS CONDOMINIAIS -
RESTRIÇÃO DE DIREITOS DO CONDÔMINO -
CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO - INTERRUPÇÃO DO
FORNECIMENTO DE GÁS - LEGALIDADE - PROIBIÇÃO À
UTILIZAÇÃO DOS ELEVADORES - IMPOSSIBILIDADE -
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. Não há vedação legal à
previsão de penalidades na convenção do condomínio - além de
multas já expressamente previstas no Código Civil - passíveis de
aplicação ao condômino inadimplente. Tratando-se dos gastos
com gás e despesas ordinárias do condomínio, é lícita a
penalidade prevista na convenção que determina a interrupção do
fornecimento ao condômino inadimplente. A restrição ao uso dos
elevadores, ainda que prevista no parágrafo em convenção do
condomínio, sem dúvida, lança sobre o condômino devedor
punição que, além de vexatória, é também iníqua, haja vista
impor ao agravado a penalidade, configurada pela utilização das
escadarias do edifício como único acesso à unidade condominial
de sua propriedade, ferindo, portanto, um dos fundamentos do
Estado Democrático de Direito, qual seja, a dignidade da pessoa
humana (art. 1º , III , CR/88 ). v.v.: O fato de o condômino ser
inadimplente não gera direito ao agravante de adotar medidas
restritivas do direito daquele de usar e fruir das partes comuns,
inalienáveis e indivisíveis do condomínio. O recorrente goza de
ação própria para compelir o agravado a realizar o pagamento das
taxas condominiais”.[295]

“DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO. CONVENÇÃO E
REGULAMENTO INTERNO. CONDÔMINO
INADIMPLENTE. RESTRIÇÃO DE DIREITOS.
IMPOSSIBILIDADE. 1. Ante a impossibilidade no ordenamento
jurídico pátrio de regulamento autônomo, o regulamento interno
do condomínio deve obediência à convenção condominial e esta,
por sua vez, à lei de regência. 2. A inadimplência do condômino
em relação ao pagamento das taxas condominiais não pode obstar
o uso, gozo e usufruto das áreas comuns do edifício. 3. Para o
recebimento das taxas condominiais em atraso deve o recorrente
lançar mão, por intermédio do órgão competente, da ação
apropriada. o que não se apresenta lícita é a utilização de oblíqua
via para o mister. 4. Recurso a que se nega provimento”.[296]

“RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR
DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONDOMÍNIO QUE
IMPEDIU CONDÔMINO INADIMPLENTE DE UTILIZAR
SALÃO DE FESTAS. ATA DO CONDOMÍNIO COM
PROIBIÇÕES AO CONDÔMINO INADIMPLENTE COMO,
POR EXEMPLO, A VEDAÇÃO DA UTILIZAÇÃO DE SALÃO
DE FESTA, GARAGEM E PÁTIO DO CONDOMÍNIO.
VEDAÇÕES ABUSIVAS. RESTRIÇÕES EXCESSIVAS DE
DIREITOS DO PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. PROMESSA
DO CONDOMÍNIO DE RESERVA DO SALÃO DE FESTA AO
CONDÔMINO INADIMPLENTE. CONVITES DA FESTA DE
ANIVERSÁRIO ENVIADOS. SITUAÇÃO DE
CONSTRAGIMENTO A QUE O CONDÔMINO FOI
EXPOSTO. DANO MATERIAL E MORAL CONFIGURADOS.
SENTENÇA REFORMADA A FIM DE CONDENAR O
CONDOMÍNIO AO PAGAMENTO DE R$ 1.144,90 (UM MIL,
CENTO E QUARENTA E QUATRO REAIS E NOVENTA
CENTAVOS) E R$ 750,00 A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS. RECURSO CONHECIDO E
PROVIDO. 1. Relatório em sessão. 2. Voto. O recurso deve ser
conhecido uma vez que presentes os pressupostos processuais de
admissibilidade. No mérito entendo que comporta acolhimento. 2
Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais,
alegando a reclamante que foi impedida de utilizar o salão de
festas pelo condomínio reclamado em virtude do inadimplemento
de taxas condominiais. Sustenta que sofreu diversos prejuízos
material e moral, vez que iniciou a organização da festa infantil
de sua filha ante a promessa de utilização do salão de festas do
condomínio, tendo, inclusive, enviado convite para parentes e
amigos. Da análise dos autos, tem-se que a ata do condomínio
(mov. 1.9) impôs ao condômino inadimplente vedações abusivas,
quais sejam, ‘direito de usufruir do salão de festas’, ‘direito de
lavar tapetes’, ‘direito de usar garagem para seu automóvel’ e
‘direito de adentrarem com seu automóvel no pátio do
condomínio’. Ainda que seja autorizado ao condomínio a
imposição de restrições ao condômino inadimplente, estas
restrições não podem violar o direito de propriedade do
proprietário do imóvel, bem como limitar sua liberdade de ir e
vir. No caso dos autos, verifica-se que foi prometido a reclamante
a reserva do salão de festas, de modo que convites da festa de
aniversário foram enviados, expondo a reclamante a situação
constrangedora perante familiares e amigos. O arbitramento da
indenização pelo dano moral deve sempre ter o cuidado de não
proporcionar, por um lado, o enriquecimento ilícito do autor em
detrimento do réu, nem por outro, a banalização da violação aos
direitos do consumidor. Também deve ser considerada a dupla
finalidade do instituto, qual seja, a reparatória em face do
ofendido e a educativa e sancionatória quanto ao ofensor. Em
face desses critérios, levando em conta ainda os princípios da
proporcionalidade e razoabilidade, arbitro o valor da indenização
por danos morais em R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais),
acrescidos de correção monetária segundo índices do
INPC/IGPM a partir da decisão condenatória e juros moratórios
de 1% ao mês desde a citação, nos termos do enunciado n.º
12.13, ‘a’ das TRS/PR. De mesmo modo, restou comprovados os
prejuízos materiais auferidos pela reclamante (mov. 1.7),
impondo a condenação da reclamada ao pagamento de R$
1.144,90 (um mil, cento e quarenta e quatro reais e noventa
centavos), acrescidos de correção monetária segundo índices do
INPC/IGPM desde o efetivo desembolso e juros moratórios de
1% ao mês desde a citação”.[297]

Vale destacar que o art. 4° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964 [“A alienação
de cada unidade, a transferência de direitos pertinentes à sua aquisição e a
constituição de direitos reais sôbre ela independerão do consentimento dos
condôminos”], trata do mesmo direito previsto no §1° do art. 1.331 do Código
Civil de 2002, com redação dada pela Lei n° 12.607, de 04.04.2012 [“As partes
suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios,
salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras
partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e
gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que
não poderão ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo
autorização expressa na convenção de condomínio”], apenas apresentando uma
redação diferente.
Como se pode observar, a alienação de cada unidade autônoma não
depende de prévia anuência dos demais condôminos e nem está sujeita a
restrição do direito de preferência, que grava o condomínio voluntário. No
entanto, WALDEMAR LEANDRO alerta para o fato de que não se confunde
essa hipótese, com a de copropriedade entre duas ou mais pessoas, em uma única
unidade autônoma (condomínio voluntário). Nesse último caso, o Código Civil
estabelece um direito de preferência em relação a terceiros, a favor dos titulares
dos quinhões, de partes ideais na coisa comum (art. 1.322 do Código Civil de
2002). Só nessa derradeira hipótese o condôminio que quiser desfazer-se de seu
quinhão terá que oferece-lo, previamente, aos demais proprietários da unidade
autônoma de partes iguais.[298]
Todavia, os direitos dos condôminos do condomínio edilício não se
restrigem ao art. 1.335 do Código Civil de 2002 e ao art. 19 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964. Numa tentativa de esgotar a enumeração de tais direitos, podemos
dizer que eles são os seguintes: 1) dispor da sua unidade e das áreas comuns,
sem infringir as normas do Regulamento Interno, da Convenção e da legislação
vigente (art. 1.335 do Código Civil de 2002); 2) desde que esteja quite com as
despesas condominiais, votar em assembleias, participar de suas deliberações,
candidatar-se a cargos administrativos e a eles ser eleito. O voto tem peso
proporcional à fração ideal da unidade, salvo disposição diversa da Convenção
(arts. 1.335 e 1.352 do Código Civil de 2002);[299] 3) participar da decisão do que
é feito com os recursos financeiros comuns, em assembleia. A previsão
orçamentária anual deve ser aprovada em assembleia ordinária, e alterações
(aumentos das cotas de condomínio) devem ser submetidas a assembleia
extraordinária. A prestação de contas do ano anterior também é obrigatória. E
obras devem ser pré-aprovadas pela assembleia, com o quórum previsto no novo
Código Civil (arts. 1.341 e 1.350 do Código Civil de 2002);[300] 4) 1/4 (um
quarto) dos condôminos, juntos, podem convocar uma assembleia, sem
intermédio do síndico (art. 1.355 do Código Civil de 2002);[301] 5) a maioria
absoluta (metade mais um) dos condôminos pode destituir o síndico, em
assembleia especificamente convocada (art. 1.349 do Código Civil de 2002);[302]
6) votar sobre alterações nas áreas comuns do condomínio, na Convenção e no
Regimento Interno (arts. 1.341, 1.342, 1.343 e 1.351);[303] 7) pagar as despesas
de condomínio na proporção de sua fração ideal, e apenas no que diz respeito
aos gastos de que desfrute. Por exemplo: um condômino que não tem vaga na
garagem não paga pela manutenção do portão da mesma (art. 1.335 e 1.340 do
Código Civil de 2002);[304] 8) alugar sua vaga na garagem, de acordo com o
critério previsto no Código Civil: têm preferência os proprietários, em seguida os
inquilinos, e finalmente pessoas estranhas ao condomínio (art. 1.338 do Código
Civil de 2002);[305] 9) vender a vaga de garagem a outro condômino. A
comercialização só pode ser feita com não-condôminos se assim o permitir a
Convenção do condomínio (art. 1.339 do Código Civil de 2002).[306]


3.7.2 Deveres do condômino


No entanto, mais importantes que os direitos dos condôminos são os
seus deveres para com o condomínio e demais condôminos.
Além das obrigações inerentes a propriedade privada individual
(pagamento de tributos municipais, etc.), o condômino também tem várias
obrigações a cumprir dentro das regras estabelecidas pelo Código Civil de 2002,
para com o condomínio edilício. Tais regras estão consubstanciadas no seu art.
1.336.
Além disso, para disciplinar e delimitar a liberdade de cada condômino
existe a Convenção do Condomínio, o Regulamento Interno ou Regimento
Interno (específicos para cada condomínio) e o Regulamentos Especializados ou
Regulamentos com Capítulos Específicos.
Dispõe o caput do referido art. 1.336 do Código Civil de 2002, com as
modificações determinadas pela Lei nº 10.931, de 02.08.2004 (dispõe sobre o
patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, Letra de Crédito
Imobiliário, Cédula de Crédito Imobiliário e Cédula de Crédito Bancário), que
são deveres do condômino: I- contribuir para as despesas do condomínio, na
proporção de suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção;
II- não realizar obras que comprometam a segurança da edificação; III- não
alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas; IV- dar às
suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de
maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos
bons costumes.
Portanto, o primeiro desses principais deveres é o pagamento das
despesas do condomínio, recolhendo a quota-parte de tais despesas no prazo
previsto na convenção. Tal obrigação do condômino de manter o pagamento em
dia para poder usufruir de seus direitos, também está previsto no art. 12 da Lei n
° 4.591, de 16.12.1964.[307]
O atraso do condômiíno acarreta em multa e o acúmulo de parcelas
vencidas pode gerar uma cobrança judicial. Com efeito, o§ 1° do art. 1.336 do
Código Civil de 2002 prescreve que “o condômino que não pagar a sua
contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo
previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o
débito”.
De maneira que o condômino que não pagar a sua contribuição está
sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de 1%
(um por cento) ao mês e multa moratória de 2% (dois por cento) sobre o débito.
Inclusive, está penalidade pecuniária está igualmente prevista no §3° do art. 12
da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, com a diferença do percentual da multa
moratória, que é 20% (vinte por cento).
Vale dizer que o percentual de 2% (dois por cento) está mais em
harmonia com o percentual estabelecido no Código de Defesa do Consumidor
(Lei n° 8.078, de 11.09.1990) para a multa moratória. Esta está presente nos
contratos bancários, de compra e venda de imóveis, de prestação de serviços, e
não é vedada em nenhuma hipótese. Apenas tem suas limitações. Ela é exigível
juntamente com a obrigação principal, podendo compor a mesma ação judicial.
É o que dispõe o art. 411 do Código Civil de 2002.[308] Há algum tempo atrás,
não havia limites para a pactuação da multa moratória. Exigia-se apenas o bom
senso. A não ser nas relações de consumo, nas quais ela estava limitada a 10%
(dez por cento) sobre o valor da prestação. Porém, a Lei n° 9.298, de 01.08.1996,
veio a alterar o §1º do art. 52 do Código de Defesa do Consumidor,[309] limitando
a multa moratória a 2% (dois por cento) sobre o valor da prestação.
Consequentemente, os contratos sob a égide do Código de Defesa do
Consumidor (Lei n° 8.078, de 11.09.1990) devem prever multa no limite de dois
por cento sobre o valor da prestação a ser cumprida. Mesmo que as partes
pactuem percentual maior, ele não é válido, uma vez que, neste caso, não é
permitida a transação em desacordo com a norma de ordem pública. No entanto,
a aplicação deste limite percentual restringe-se apenas aos contratos firmados
após a vigência da Lei n° 9.298, de 01.08.1996. Por isso, os contratos celebrados
antes dela, ainda que regidos pelo Código de Defesa do Consumidor, não se
beneficiam desta limitação, podendo a multa moratória, nestes casos mais
antigos, ser de até 10 (dez por cento).
Entretanto, em se tratando de encargos condominiais, o § 1° do art.
1.336 do Código Civil de 2002 seguiu os limites para a multa moratória,
estabelecidos pela Lei n° 9.298, de 01.08.1996. Seja como for, a multa moratória
é necessária, pois o cumprimento das obrigações deve ser estimulado e
respeitado, na manutenção de uma ordem social. Os 2% (dois por cento)
previstos no § 1° do art. 1.336 do Código Civil de 2002, a nosso ver, é módico,
não servindo para inibir efetivamente a mora, devendo o legislador, neste
sentido, rever o limite percentual.

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE
CONDOMÍNIO. NULIDADE DO PROCESSO POR
AUSÊNCIA DO MP. JUROS DE MORA. CORREÇÃO
MONETÁRIA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MULTA.
NULIDADE PELA FALTA DE PARTICIPAÇÃO DO MP.
Inocorrente, na medida em que o MP, sempre quando chamado,
participou do processo de cobrança, inclusive, emitiu parecer
contrário aos interesses do recorrente. COMISSÃO DE
PERMANÊNCIA. Matéria não discutida nos autos, daí o não
conhecimento do recurso, no ponto. CORREÇÃO MONETÁRIA
E JUROS DE MORA. Que são devidos deste os vencimentos de
cada uma das parcelas em atraso. Multa de 2%. Exegese do art.
12, §3°, da Lei n. 4.591/64, em combinação com art. 1.336, §1°,
do CC. Sentença que se confirma. CONHECERAM, EM PARTE,
DO RECURSO E NA PARTE CONHECIDA, NEGARAM
PROVIMENTO AO APELO. UNANIME”.[310]

Outrossim, a falta de pagamento dos encargos condominiais impede a
transferência da unidade autônoma para terceiros. De fato, o parágrafo único do
art. 4° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, com redação dada pela Lei n° 7.182, de
27.03.1984,[311] prevê que “a alienação ou transferência de direitos de que trata
este artigo dependerá de prova de quitação das obrigações do alienante para com
o respectivo condomínio”. No entanto, a restrição ou impedimento da venda da
unidade autônoma, se o seu proprietário é devedor dos encargos condominiais,
se nos afigura despropositada, uma vez que o adquirente se sub-roga na
obrigação, sub-rogação esta prevista expressamente no art. 1.345 do Código
Civil de 2002.[312] Por sinal, ROBERTO BARCELLOS DE MAGALHÃES
chama a atenção para de que a Lei n° 7.182, de 27.03.1984 (que deu nova
redação ao parágrafo único do art. 4° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964), parece, à
primeira vista, ter feito tábula rasa do princípio tradicional de sub-rogação do
adquirente nas obrigações do transmitente, mas na realizade não o informou,
limitando-se a dizer que a alienação ou transferência dos direitos de que trata o
art. 4° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, dedenderá de prova de quitação do
alienante perante o condomínio. A sua falta, porém, não torna nulo o ato, o que
só poderá ocorrer com a taxação, pelo legislador, da nulidade expressamente
declarada na lei.[313]
Seja como for, o Código Civil de 2002 não manteve a restrição prevista
no parágrafo único do art. 4° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, com redação dada
pela Lei n° 7.182, de 27.03.1984.
Vale acrescentar que a quota-parte do rateio das despesas do condomínio
entre os respectivos condôminos deve levar em consideração a fração ideal
terreno para cada unidade autônoma, salvo disposição em contrário inserida na
convenção do condomínio. Tal regra encontra-se prevista tanto no §1° do art. 12
da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, como no inciso I do art. 1.336 do Código Civil
de 2002. Ademais, se ainda não alienados vários apartamentos, ao incorporador
recairá a responsabilidade pelas respectivas despaesas.

“PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
COBRANÇA DE TAXAS CONDOMINIAIS EM FACE DA
CONSTRUTORA. EXONERAÇÃO DA CONSTRUTORA EM
RELAÇÃO À TAXA CONDOMINIAL DAS UNIDADES NÃO
COMERCIALIZADAS. ABUSIVIDADE RECONHECIDA.
CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO ESTIPULADA
UNILATERALMENTE. DECISÃO LIMINAR MANTIDA.
AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. 1. Revela-se
abusiva a cláusula da convenção de condomínio que, estipulada
unilateralmente pela construtora, conceda a esta desproporcional
exoneração da obrigação de pagar as taxas condominiais, a ponto
de prejudicar a própria manutenção e conservação do
condomínio. 2. Impossibilidade de se exigir a alteração da
convenção por deliberação de 2/3 dos condôminos, nos termos do
art. 1.351, do CC, considerando que a construtora é titular de
mais de 1/3 das unidades imobiliárias. 3. Agravo de Instrumento
desprovido”.[314]

“AÇÃO DE COBRANÇA - SENTENÇA ULTRA PETITA -
ADEQUAÇÃO - CONDOMÍNIO - PARCELAS -
EXONERAÇÃO DA CONSTRUTORA - IMPOSSIBILIDADE -
RATEIO - ARTIGO 24 , DA LEI Nº 4.591 /64. A sentença que
ultrapassa o pedido formulado não deve ser invalidada, bastando
que seja expurgado o que excedeu os limites do pedido. As taxas
condominiais têm caráter obrigatório, conforme disposto no o art.
12 da Lei nº 4.591 /64, tendo o condômino o dever inafastável de
concorrer nas despesas de manutenção do condomínio”.[315]

“AÇÃO DE COBRANÇA DE DESPESAS CONDOMINIAIS -
FASE DE CONHECIMENTO - JULGAMENTO ANTECIPADO
DA LIDE - POSSIBILIDADE -OBRIGAÇÃO DE NATUREZA
PROPTER REM -INVALIDADE DA CLÁUSULA, IMPOSTA
PELA INCORPORADORA, QUE LHE CONCEDE O
PRIVILÉGIO DE DESCONTO DE 90% SOBRE OS VALORES
DEVIDOS PELAS UNIDADES EM SEU PODER, PELO
PRAZO DE 18 MESES - PRECEDENTE DO STJ ?
COBRANÇA DE PARCELAS FUTURAS - INCIDÊNCIA DO
ART. 290 DO CPC - SENTENÇA CORRETA. ‘É inválida a
cláusula que estabelece, em favor da construtora e incorporadora,
o privilégio da exoneração da obrigação de contribuir para as
despesas do condomínio, imposta na escritura de convenção por
ela outorgada’ 1. - Recurso desprovido”.

“DESPESAS DE CONDOMÍNIO - COBRANÇA -
CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO - Cláusula imposta pela
incorporadora que concede privilégio de desconto de 50% sobre
a taxa condominial devida pelas unidades não comercializadas ou
que estejam em sua posse - Impossibilidade. ‘Inválida a cláusula
que estabelece, em favor da construtora e incorporadora, o
privilégio da exoneração da obrigação de contribuir para as
despesas do condomínio, imposta na escritura de convenção por
ela outorgada’. Recurso improvido”.[316]

O segundo desses principais deveres do condômino (inciso II do § 2° do
art. 1.336 do Código Civil de 2002) é manter o bom uso das instalações e das
áreas em comum do condomínio. Isso implica em proibição de realização de
obras que comprometam a segurança do local ou mesmo que alterem
características originais do condomínio.

“Ação demolitória. Invasão, por condômino, de área comum do
condomínio. Sentença de procedência. Inconformismo.
Demonstrado o uso irregular de espaço situado no hall de entrada
de imóvel. Impossibilidade em face da proibição constante da
convenção condominial. Ademais, há prova quanto ao transtorno
ocasionado ao condômino do imóvel vizinho. Recurso
desprovido”.[317]

O terceiro desses principais deveres do condômino (inciso III do § 2° do
art. 1.336 do Código Civil de 2002) não alterar a forma e a cor da fachada, das
partes e esquadrias externas.

“AÇÃO DEMOLITORIA. CONDOMÍNIO. ALTERAÇÕES NA
FACHADA E EM ÁREA DE USO COMUM.
ENVIDRAÇAMENTO. CARACTERIZAÇÃO DE
ALTERAÇÃO DE FACHADA, ALTERAÇÃO DO CONJUNTO
ARQUITETÔNICO. DECISÃO DE PARCIAL
PROCEDÊNCIA. Interpretação do artigo 1.336, inciso III, do
Código Civil de 2002. Proibições constantes na Convenção de
Condomínio. Alteração de conjunto arquitetônico. Vedação
justificada. Condomínio com regramento imposto a todos os
condôminos. Violação desse regramento pode causar subversão
da ordem interna. Desrespeito à norma legal e condominial.
Determinação para desfazimento da alteração. Recurso não
provido”.[318]

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER
MOVIDA PELO RITO ORDINÁRIO. Condomínio apelante que
visa reforma de sentença que julgou improcedente o pedido de
reposição pela ré da cor e da forma da parte externa da janela da
unidade da qual é proprietária, conforme o conjunto do prédio.
Prova pericial concluindo que não há um padrão estabelecido
pelo condomínio, não se podendo inferir que a esquadria
utilizada pela ré para fechar a varanda represente uma
despadronização da fachada. Verificação de modificações
efetuadas por diversos outros condôminos, interferindo no padrão
da fachada do edifício. Proibição expressa constante da
convenção de condomínio. Circunstâncias do caso concreto que
impõem a mitigação da referida regra, instituída em 1946.
Ausência de violação a lei ou a convenção do condomínio, diante
do decurso do tempo, que causou danos à construção original,
tais como umidade e cupim, e das mudanças que foram sendo
operadas em diversas unidades frontais sem que tenha sido feita
uma regulamentação mais recente a respeito, seja em Regimento
Interno, seja em Assembleias. Mudanças efetuadas pela ré que
não destoaram das praticadas pelos demais condôminos. Razões
recursais insuficientes para a modificação pretendida. RECURSO
QUE SE CONHECE E SE NEGA PROVIMENTO”.[319]

O quarto desses principais deveres do condômino (inciso IV do § 2° do
art. 1.336 do Código Civil de 2002) é manter uma boa conduta e o bom convívio
entre moradores. É outra obrigação que abrange todos moradores de
condomínio. Cada condomínio tem suas próprias regras, mas, de modo geral,
esse bom convívio diz respeito a questões de segurança, privacidade e barulho
excessivo.
Com exceção do dever de contribuir para as despesas do condomínio, na
proporção de suas frações ideais, qualquer outro dever do condômino está sujeito
à prescrição contida no § 2° do art. 1.336 do Código Civil de 2002, o qual
determina que “o condômino, que não cumprir qualquer dos deveres
estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou
na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas
contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem;
não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por dois terços no
mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa”.
Todavia, os deveres dos condôminos do condomínio edilício não se
restrigem ao art. 1.336 do Código Civil de 2002 e ao art. 12 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964. Numa tentativa de esgotar a enumeração de tais deveres, podemos
dizer que eles são os seguintes: 1) utilização livre e defesa da coisa comum
conforme sua destinação, cujo limite é o direito dos demais condôminos (art.
1.314 do Código Civil de 2002); 2) arcar proporcionalmente com as despesas do
condomínio, na proporção de sua fração ideal (art. 1.335 do Código Civil de
2002); 3) o condômino que causar dano ao prédio deve indenizar o condomínio
(art. 1.319 do Código Civil de 2002); 4) Respeitar as disposições do
Regulamento Interno, da Convenção e da legislação vigente (art. 1.333 do
Código Civil de 2002); 5) não realizar obras em sua unidade que comprometam
a segurança da edificação ou alterem sua fachada (art. 1.336 do Código Civil de
2002); 6) pagar as multas e os juros previstos no Código Civil, na Convenção e
no Regulamento Interno, no que diz respeito a atrasos no pagamento de
despesas, e a infração de normas de convivência (arts. 1.334, 1.336 e 1.337 do
Código Civil de 2002).


3.8 DESPESAS DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO


3.8.1 Despesas condominiais em espécie


São vários os tipos de despesas que integram a listagem dos gastos
comuns para a manutenção do condomínio edilício. Entende-se por despesas
condominiais todos os gastos do condomínio que podem, inclusive, ser
classificados de acordo com os fins a que se destinam. Já receita é sinônimo das
cotas e outras entradas recebidas, que também podem ser classificados
basicamente em receitas patrimoniais (relativas a rendas geradas, por exemplo,
por utilização de salão de festas ou até mesmo por locação de espaços – outdoor,
antena de telefonia, etc.) e rendas extraordinárias (essencialmente oriundas de
operações financeiras, como aplicação financeira em Certificado de Depósito
Bancário – CDB, Recibo de Depósito Bancário – RDB, etc.).
VIRGÍLIO RUFFINO PEREYRA menciona o seguinte rol de despesas
condominiais: 1) impostos, contribuições e taxas; 2) gastos de reparações de toda
a ordem, exceto as de pequeno valor, que ocorram no interior das unidades
autônomas; 3) gastos com empregados, tais como porteiros, ascensoristas,
zeladores, faxineiros e guardas; 4) retribuição devida ao síndico, quando prevista
na convenção do condomínio; 5) despesas de luz nas partes comuns, como no
vestíbulo, nos corredores, no saguão, elevadores, garagens, etc.; 6) taxas de
excesso de água, bem como a taxa relativa ao consumo comum; 7) gastos
decorrentes da aquisição de bens destinados ao uso comum, como material de
limpeza, móveis para a sala de espera e o saguão de entrada, e tapetes; 8) seguro
do imóvel contra incêndio, acidentes e roubo; 9) despesa de pinturas de
fachadas, paredes externas e partes comuns no interior do prédio; etc. No
entanto, esta lista não esgota as despesas possíveis de serem arcadas pelo
condomínio edilício. De maneira que é impossível discriminar todos os itens
determinantes das contribuições, que se avolumam conforme o padrão do
edifício.[320]
Já as despesas da cobertura limitam-se aa respectivo proprietário, uma
vez que a apenas este cabe o correspondente proveito. Por sinal tal obrigação
está prevista no art. 1.344 do Código Civil de 2002.[321] Da mesma forma, os
custos ou gastos das partes comuns que ficam no uso exclusivo de um ou vários
condôminos somente a estes beneficiados cabe arcar com elas, conforme
estabelecido no art. 1.340 do Código Civil de 2002.[322]
No entanto, tal regra não se aplica no caso de despesas de elevadores,
relativamente ao condomínio que não o utiliza, por se encontrar sua unidade
autônoma localizada no andar térre. De fato, a menos que haja previsão em
contrário na convenção, tais despesas de elevadores devem ser suportadas
igualmente por ele. Inclusive a doutrina estrangeira vem sustentando tal
obrigação. MARIANO FERNANDEZ MARTIN GRANIZO, por exemplo,
menciona que a finalidade do elevador, destinado ao serviço de todos, não sendo
o uso ou a não utilização motivo de exclusão.[323]
No mesmo sentido, ARNALDO RIZZARDO esclarece que se instala o
elevador para o serviço de todos os condôminos, considerando-se que os
trabalhos dos serviçais e outros empregados, e inclusive do zelador e do
administrador, proporcionam o bem do condomínio em geral. Daí interessar a
conservação do aparelhamento, dizendo respeito ao condomínio como um todo,
a qualquer condômino. Em assim sendo, os encargos condominiais devem ser
suportados por todos os condôminos, não se eximindo aqueles situados no piso
térreo, que não necessitam de elevador e de outras conveniências usufruídas
pelos demais coproprietários, excetuada a hipótese de convenção condominial
contemplar a isenção.

“Tem responsabilidade pelo pagamento das cotas condominiais
quem, sendo condômino, embora não participando da assembleia
que determinou a alteração da anterior convenção, não tomou
qualquer providência para desconstituir a decisão condominial,
contra a qual se insurge em momento impróprio. Estabelecimento
comercial, no caso cinema, poderia ser uma loja, como tem sido
decidido, deve cumprir aquilo que está estabelecido na
Convenção. A alegação de que está no andar térreo e não se
beneficia de muitos serviços do condomínio não pode ser oposta,
contra a previsão condominial, votada e aprovada pela
assembleia de condôminos, conforme previsão legal, art. 9° da
Lei n° 4.591/64”.[324]

Portanto, o dever do condômino em contribuir para as despesas de
condomínio, arcando com os encargos pelo inadimplemento, conforme
determinado na convenção do condomínio, decorre do art. 1.336 do Código Civil
de 2002, obrigando todos os proprietários do imóvel, atuais e futuros, ao seu
cumprimento (art. 1.345 do Código Civil de 2002).[325]

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA DA
TAXA DE CONDOMÍNIO. IMÓVEL ARREMATADO EM
PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL.
RESPONSABILIDDE DO ADQUIRENTE PELAS DESPESAS
CONDOMINIAIS. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. FUNDO
DE RESERVA. 1. As taxas e contribuições do condomínio
constituem obrigação propter rem, ou seja, que adere ao bem
imóvel, respondendo o adquirente pelo adimplemento, ainda que
se trate de parcelas vencidas antes da sua aquisição. 2. O dever
do condômino em contribuir para as despesas de condomínio,
arcando com os encargos pelo inadimplemento, conforme
determinado na convenção do condomínio, decorre de lei (art.
1.336 do Código Civil vigente), obrigando todos os proprietários
do imóvel, atuais e futuros, ao seu cumprimento. 3. Afigura-se
legítima a cobrança do Fundo de Reserva, considerando sua
previsão na Convenção de Condomínio e, ainda, em Assembleia
Geral Ordinária realizada pelo condomínio. 4. Sentença
reformada. 5. Apelação provida”.[326]

Por fim, é importante esclarecer que, como não é possível indicar
taxativamente quais as despesas que devem constar no orçamento do
condomínio, porque elas variam segunto o tipo e a categoria do edifício, devem
ser levadas em conta aquelas expressamente previstas pela lei e que não podem
deixar de ser orçadas e rateadas. Entre as despesas obrigatorias por lei estão o
seguro do edifício, compulsoriamente previsto no art. 13 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964;[327] o salário dos empregados e encargos previdenciários; honorários
do administrador ou síndico, caso sejam tais funções remuneradas, na forma
prevista pela convenção do condomínio; impostos e taxas incidentes sobre a
totalidade do edifício, excluídos os que incidirem sobre as unidades autônomas;
despesas de consumo de luz, força, conservação de elevadores e de outras coisas
de uso comum e de utilização permanente; e despesas gerais de conservação e
manutenção das partes e coisas de uso comum.[328]


3.8.2 Orçamento das despesas e receitas do condomínio

As despesas do condomínio são rateadas entre os condôminos através da
cobrança de “cota de condomínio” ou “taxa condominial”. No entanto, é
deliberação da assembleia-geral que fixa a cota condominial resultante do rateio
das despesas do exercício previstas no orçamento (art. 12 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964), o qual é elaborado pelo síndico com parecer do Conselho
Consultivo.
Por sinal, lembramos que orçamento é a parte de um plano financeiro
estratégico que compreende a previsão de receitas e despesas futuras para a
administração de determinado exercício (período de tempo). Aplica-se tanto ao
setor governamental quanto ao privado, pessoa jurídica ou física. De maneira
que o orçamento condominial tem como objetivo identificar os componentes do
planejamento financeiro com a utilização de um sistema orçamentário, entendido
como um plano abrangendo todo o conjunto das operações anuais de um
condomínio edilício atravês da formalização do desempenho dessas funções
administrativas gerais.
Outrossim, o orçamento das despesas do condomínio deve ser previsto
com margem para que tenha um saldo credor ao final do exercício. Afinal, o que
sobrar pertence ao condomínio; não é uma despesa e sim um reforço para o
Fundo de Reserva, a ser aplicado no exercício seguinte.
Portanto, o orçamento, em contabilidade e finanças, é a expressão das
receitas e despesas, no nosso caso, do condomínio, relativamente a um período
de execução (ou exercício) determinado, geralmente anual, mas que também
pode ser mensal, trimestral, plurianual, etc. O orçamento condominial deriva do
processo de planejamento da gestão do síndico. A administração de qualquer
condomínio, sem fins lucrativos, deve estabelecer objetivos e metas para um
período determinado, materializados em um plano financeiro, isto é, contendo
valores em moeda, para o devido acompanhamento e avaliação da gestão
condominial.
Alerta ADOLPHO SHERMANN que também não se deve tomar por
base os gastos do último mê como média e aumentar o orçamento em tantos por
cento. Melhor deve ser o levantamento minucioso dos gastos feitos em cada
verba e estudar aumentos ou diminuições no que está sento elaborado.[329]
Orçamentos mal elaborados podem ocasionar sérias dificuldades
financeiras para o condomínio.
Por exemplo, não raras vezes, acontecem Convenções Coletivas do
Trabalho ou decretos de aumento de salário. Poucos são os condomínio que
prontamente reajustam suas cotas condominiais, deixando o acerto de suas
contas para s assembleias ordinárias que se realizam normalmente no primeiro
mês do ano seguinte. Como geralmente oscondôminos não possuem grandes
disponibilidades financeiras são as Administradoras obrigadas a recorrer a
bancos para fazer face aos aumentos de salários obrigatórios e a parte que recai
sobre 13° salário.
Quanto aos saldos devedores que certos condomínios edilícios mantêm
junto às suas Administradoras apresenta-se o seguinte quadro: 1) certa minoria
de prédios que constantemente aumentam o saldo devedor por votarem
orçamentos anuais deficientes, fazendo da sua Administradora, por mera
comodidade, a sua financeira, o que não deve ser objeto de uma Administradora,
cuja única finalidade deve ser de prestadora de serviços; 2) prédios envolvidos
em demandas judiciais contra condôminos relapsos que retardam o pagamento
de suas cotas, obrigando a Administradora a adiantá-las, por não terem sido
depositadas em tempo útil, para atendimento de despesas condominiais; 3) com
relação às taxas de administração cobradas pelas Administradoras, devem os
condôminos tomar em consideração que estas são empresas que vivem da venda
de serviços especializados. Por serem consideradas muito altas as taxas cobras
pelas Administradoras, muitos condomínios pretendem fazer administração
própria que no finl sai mais caro do que o cobrado pelos serviços de uma
conceituada empresa, que zela inclusive, pela pontualidade dos pagamentos, que
nem sempre é observado pela administração própria, sujeitanto o condomínio a
aborrecimentos de muitas das mais variadas formas. As Administradoras com a
prática que possuem elaboram normalmente orçamento que permite ao síndico
uma administração tranquila; 4) muitas vezes as assembleias-gerais de
condomínio, as quais devem aprovar os orçamentos, promovem cortes
injustificáveis nas verbas orçamentárias, que se esgotam antes de findar o ano,
obrigando o síndico a solicitar adiantamento à Administradora, e que no futuro
obriga à cobrança extra para cobrir os déficits gerados pelos referidos cortes. De
maneira que nenhum síndico consegue administrar bem sem verbas suficientes,
que não somente devem atender as despesas essenciais, mas também possibilitar
a boa conservação dos prédios. Por isso, devem os síndicos insistir para que lhes
sejam postas à disposição verbas que lhes facilitem o trabalho e em bases reais;
5) os orçamentos devem ser projetados para o período de 6 (seis) meses e não 12
(doze) meses, pois isto contribue para que bons resultados surjam ao longo da
administração do síndico, indicando um melhor cálculo estimativo para os
valores orçamentários; 6) nunca o valor da cota condominial deve ser diminuída,
salvo se realmente houve exagero nos cálculos das estimativas para os valores
previstos nos orçamentos. No orçamento deve ser evitada a exclusão das verbas
de seguros e da taxa de água. São despesas obrigatórias e calculáveis, como as
demais do orçamento; 7) os síndicos não devem ser intransigentes na cobrança
de multas e de juros de mora dos que se atrasam, às vezes por poucos dias.
Aplica-se essa cobrança contra aqueles que, invariavelmente, se atrasam no
pagamento das cotas por relaxamento, esquecimento ou por indesculpável má-
vontade. O síndico tem poderes para relevar essas multas e não está sujeito a ser
chamado à atenção pelo seu ato, por quem quer que seja. Por outro lado, a recusa
de atender um cliente por parte da Administradora, por já estar fechada a caixa
ou o expediente, sob a alegação de “ordem superior”, é um exagero que merece
reparos. A Administradora não deve sistematicamente responder ao condômino,
que tem ordem do síndico para só receber com o pagamento de juros ou multa;
deve, sim, analisar suas razões e leva-las à instância final do síndico. As
Administradoras recebem rigorosas instruções dos síndicos e, portanto, só
podem relevar as multas com ordem expressa deles, sem o que responderão por
elas.[330]
Em suma, apesar de ser planejado com mais ou menos cuidado, um
orçamento condominial pode ser cumprido à risca, ou com sobras ou com falta
de recursos planejados.
Seja como for, como são executivamente cobráveis apenas as despesas
constantes do orçamento condominial aprovado pela assembleia-geral, devem o
síndico e os membros do Conselho Consultivo ter todo o cuidado e atenção na
elaboração de tal instrumento de estimativa de despesas e receitas. Usando as
palavras de ADOLPHO SHERMANN, a previsão orçamentária é uma operação
delicada que exige pleno conhecimento da situação peculiar do edifício e das
despesas indispensáveis para o seu funcionamento regular, sob pena de se
cirarem dificuldades quando forem cobradas as cotas junto aos condôminos.[331]


3.8.3 Cota ou taxa de condomínio


A denominação “cota condominial”, também denominada genericamente
de “taxa condominial”, refere-se ao rateio (distribuição) entre os condôminos das
despesas condominiais, ou seja, dos gastos realizados nas partes de uso comum
do condomínio, observada a proporcionalidade de suas respectivas frações
ideais.
Em outras palavras, cotas condominiais ou cotas de condomínio são
pagamentos feitos por todos os condôminos ao condomínio para este ter fundos
suficientes para cobrir as despesas necessárias a sua manutenção. Certamente,
morar num prédio de apartamentos tem as suas vantagens (benefícios) e
desvantagens (ônus). As cotas de condomínio podem ser enquadradas num e
noutro caso, ou seja, podem fazer parte das vantagens ou das desvantagens,
dependendo de que ângulo elas são vistas. Se, por um lado, ajudam a manter a
qualidade de espaços comuns no prédio, por outro lado são ônus financeiros a
afetar o patrimônio individual de cada um dos condôminos.

“AÇÃO DE EMBARGOS DE TERCEIROS - PRETENSÃO DA
MUNICIPALIDADE DE RESERVA DE NUMERÁRIO PARA
PAGAMENTO DE TRIBUTOS INADIMPLIDOS - UNIDADE
CONDOMINIAL ARREMATADA EM HASTA PÚBLICA-
IMPOSSIBILIDADE - VALOR QUE PERTENCE A TODOS
OS CONDÔMINOS E NÃO APENAS AO QUE TEVE SUA
UNIDADE ARREMATADA - RECURSO IMPROVIDO. Em
face da ausência de personalidade jurídica do condomínio
edilício, o valor relativo às despesas condominiais que arrecada
pertence a todos os condôminos. Destarte, arrematada em hasta
pública determinada unidade devedora de despesas, o valor
respectivo pertence aos condôminos. Assim, não pode a
Municipalidade pretender cobrar-se de tributos inadimplidos pelo
titular da unidade levada a hasta pública com o numerário
advindo da arrematação, pois se trata de valor relativo a despesas
condominiais, do qual todos os condôminos são titulares”.[332]

As cotas condominiais normalmente representam a parte das despesas de
cada condômino em relação à sua unidade autônoma. Com efeito, como dito
antes, são pagas em função do valor das suas frações ideais em percentual. De
maneira que a assembleia-geral de condóminos decide, em reunião, como e
quando devem ser pagas as cotas de condomínio. Podem ser pagas tanto por
entrega ao administrador do condomínio, como por depósito ou transferência
bancária para este. Tais pagamentos podem ser feitos mensal, trimestral ou
semestralmente, conforme decidido em assembleia. Podem ainda existir cotas
extraordinárias caso a assembleia-geral de condôminos decida que é necessário
cobrir certa despesa especifica que ultrapasse o valor disponível no fundo
comum de reserva.
A cota ou taxa de condomínio constitui obrigação propter rem ou seja,
ela adere a coisa. Desta feita, significa que ela pode ser cobrada do adquirente,
ou seja, o novo proprietário deve pagar (art. 1.345 do Código Civil de 2002),
podendo ajuizar a ação de regresso posteriormente.
No entanto, a exigência da cobrança das despesas de condomínio, ou de
cotas condominiais, junto aos condôminos, depende de requisitos formais que
devem ser atendidos e que a lei estabelece para evitar cobranças abusivas ou
falta de critério no dispêncio dos recursos do condomínio por parte do síndico ou
da Administradora. Sem o atendimento desses requisitos, as despesas de
condomínio não são cobráveis através de um processo executivo, caso um
condômino resolva não paga-las.
De maneira que, é necessário fundamentar a cobrança das despesas
condominiais, através do atendimento aos seguitnes requisitos: 1) orçamento
prévio, devidamente aprovado por assembleia-geral ordinárias, para as despesas
ordinárias ou rotineiras [inclusive, tais despesas para custeio de conservação do
edifício ou do conjunto de edifícios, assim como para a manutenção de seus
serviços, devem ser pormenorizadamente especificadas no orçamento submetido
à assembleia-geral ordinária anualmente convocada], conforme o previsto no art.
24 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,[333] ou em assembleia-geral extraordinária,
regularmente convocada, para as despesas eventuais não previstas no orçamento
condominial, conforme previsto no art. 25 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964;[334] 2)
aprovação por quórum regular previsto na convenção do condomínio (inciso 2
do art. 24 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964); 3) exibição dos comprovantes; 4)
prévia comunicação pelo síndico, nos 8 (oito) dias subsequentes à assembleia-
geral, da previsão orçamentária e do rateio (§2° do art. 24 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964.
As cotas condominiais devem ser calculadas por estimativa, já que a sua
entrada no patrimônio do condomínio se dá antes da definição dos valores das
despesas. Assim, no início do exercício financeiro, há reuniões de condomínio
[encontro destinado a todos os condóminos, ou seus procuradores, tendo como
objetivo a discussão e tomada de decisões de interesse comum do respetivo
condomínio] que determinam o orçamento necessário para o decorrer do ano e
que analisam as contas e despesas do ano anterior para se fixar os valores
lançados em orçamento. Desta análise surge o orçamento anual que determina
quando cada condômino terá que pagar de cota, de acordo com a seguinte
fórmula: “cotas de condomínio = orçamento anual x (percentagem da fração
ideal ÷ 1000)”. Normalmente na ata da assembleia-geral encontra-se registrado o
valor que cada condômino deve pagar de cota condominial. Isto para evitar
futuros problemas.
Se algum condômino não pagar a cota condominial no prazo previsto em
convenção ou ata de assembleia geral, ou por ter dificuldades financeiras ou por
ser um rebelde, este é obrigado a pagar mais 2% (dois por cento) de multa
moratória, juros de mora convencionados ou, não sendo previstos, os de 1% (um
por cento) ao mês (§1° do art. 1.335 do Código Civil de 2002) e atualização
monetária dos valores, segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e
honorários de advogado (art. 395 do Código Civil de 2002),[335] em face ao valor
normal.
As dívidas de cotas condominiais devidas ao condomínio são um
problema relativamente comum no Brasil. Muitos são os relatos de histórias em
que a falta de pagamento das cotas condominiais por parte dos condôminos se
arrasta por longos períodos de tempo, correndo riscos de serem abrangidas pela
prescrição. O resultado está à vista de todos. Além dos prédios de apartamentos
estarem cada vez mais degradados, os administradores de condomínio se
deparam constantemente com aumento vertiginoso de dívidas incobráveis,
principalmente nos momentos de depressão e desemprego recorde que o país
atravessa.
Em relação à prescrição das cotas condominiais, com base no art. 205
do Código Civil de 2002,[336] tornou-se regra geral que o prazo prescricional,
para a cobrança de cotas condominiais, seria de 10 (dez) anos, a contar da
vigência do referido Código Civil, o qual não distingue prazo para prescrição
relativa às pretensões reais ou pessoais, nem mesmo entre ausentes ou presentes
na forma anteriormente prevista no art. 177 do Código Civil de 1916 ["As ações
pessoais prescrevem, ordinariamente, em 20(vinte) anos, as reais em 10(dez),
entre presentes, e entre ausentes em 15(quinze) anos, contados da data em que
poderiam ter sido propostas”]. Tal antigo dispositivo era complementado pelo
art. 179 do Código Civil de 1916 ["Os casos de prescrição não previstos neste
Código serão regulados, quanto ao prazo, pelo artigo 177”].
Desta forma, a sistemática disciplinada pelo revogado do Código Civil
de 1916, determinava que, excetuando-se os casos previstos no art. 178 que
descrevia hipóteses em que o lapso prescricional seria reduzido, podendo ser de
10 (dez) dias, 15 (quinze) dias, dois (dois) meses, 3 (três) meses, 6 (seis) meses
ou 5 (cinco) anos, e também o disposto em lei especial, todas as demais ações
pessoais prescreveriam em 20 (vinte) anos.
Como a Lei n° 4.591, de 16.12.1964, não continha norma disciplinando
especificamente o problema da prescrição das cotas condominiais, aplicava-se, a
regra geral contida no art. 177 do Código Civil de 1916, prescrevendo em 20
(vinte) anos a pretensão de cobrança judicial das cotas condominiais em atraso,
perecendo respectivo direito de ação.
Inovando em relação à doutrina da prescrição, o Código Civil de 2002,
estabeleceu em seu art. 205, prazo único prescricional de 10 (dez) anos, não mais
diferenciando como fazia o antigo Código Civil de 1916, as ações pessoais das
ações reais para o mister, e nestas últimas, não mais discriminando o lapso
temporal entre presentes e entre ausentes.
Assim, a sistemática do antigo Código Civil de 1916 foi parcialmente
preservada, ou seja, estabelece-se prazo geral como regra (dez anos para o atual
Código Civil de 2002), sendo esta apenas excepcionada nos casos previstos no
art. 206 do referido Código Civil de 2002 ou em lei especial, regulando
diversamente determinada matéria, sendo que, em qualquer caso, o lapso
temporal deve ser inferior ao cominado abstratamente à generalidade dos casos,
não podendo haver prazo prescricional superior ao decênio legal, cominado no
art. 205 do Código Civil de 2002.
Em relação à norma aplicável às cotas condominiais, o prazo de
prescrição deveria ser de 10 (dez) anos, somente não incidindo o decênio, se
enquadrada a hipótese em alguma das exceções elencadas taxativamente no art.
206 do Código Civil de 2002, ou então, se houvesse previsão diversa em lei
especial sobre matéria relativa à prescrição do direito de ação de cobrança de
cotas condominiais. Dentre os casos explicitados no art. 206 do Código Civil de
2002, em que o lapso prescricional é reduzido, 2 (dois) deles poderiam levantar
alguma dúvida quanto à situação das quotas condominiais, quais sejam: 1) o
prazo de prescrição do §2° do art. 206 do Código Civil de 2002 [“prescreve (...)
em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em
que se vencerem”]: este caso é facilmente afastável, podendo-se notar que a
subsunção é meramente aparente, já que apesar de as despesas condominiais
terem a mesma natureza de prestações periódicas, não compartilham do caráter
alimentar das prestações previstas nesse dispositivo legal; e 2) o prazo de
prescrição do inciso I do §5° do art. 206 do Código Civil de 2002 [“prescreve
(...) em cinco anos (...) a pretensão de cobrança de dívidas constantes de
instrumento público ou particular”]: a jurisprudência vem se pacificando no
sentido de que tal dispositivo aplica-se as cotas condominiais. O argumento
utilizado é que a cobrança de prestações condominiais, exigível dos condôminios
em virtude da realização de despesas de manutenção e limpeza das áreas comuns
e também contratação de pessoal para servir ao condomínio edilício, estaria
assentada na previsão de tal procedimento na respectiva convenção condominial,
sendo esse espécie de instrumento, particular ou público, conforme o caso, que
ampararia a pretensão do condomínio, ente com capacidade postulatória para
cobrar judicial ou extrajudicialmente, a parcela de cada condôminio
inadimplente para com suas obrigações condominiais.

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA.
COTAS CONDOMINIAIS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE.
NÃOOCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE
COBRANÇA DE QUOTAS CONDOMINIAIS. INCIDÊNCIA
DO 206, § 5º, I DO CC/02. 1. Ausentes os vícios do art. 535 do
CPC, rejeitam-se os embargos de declaração. 2. Na vigência do
CC/16, o crédito condominial prescrevia em vinte anos, nos
termos do seu art. 177. 3. Com a entrada em vigor do novo
Código Civil, o prazo prescricional aplicável à pretensão de
cobrança das quotas condominiais passou a ser de cinco anos,
nos termos do art. 206, § 5º, I, do CC/02, observada a regra de
transição do art. 2.028 do CC/02. 4. Recurso especial
parcialmente provido”.[337]

“DESPESAS CONDOMINIAIS COBRANÇA PRESCRIÇÃO.
‘Com a entrada em vigor do novo Código Civil, o prazo
prescricional aplicável à pretensão de cobrança das quotas
condominiais passou a ser de cinco anos, nos termos do art. 206,
§5°, I, do CC/02, observada a regra de transição do art. 2.028 do
CC/02’. REsp nº 1139030 RJ. Rel. Min. Nancy Andrigui.
COTAS VINCENDAS SÚMULA 13 DO TJSP. ‘Na ação de
cobrança de rateio de despesas condominiais, consideram-se
incluídas na condenação as parcelas vencidas e não pagas no
curso do processo até satisfação da obrigação (art. 290, CPC)’.
Ação de despesas condominiais parcialmente procedente e
recurso provido em parte”.[338]

Portanto, sempre que um condômino tem uma dívida perante o
condomínio aconselha-se a resolução da questão pelo acordo extrajudicial, sendo
que quando isto não resultar outros meios podem ser utilizados. No caso de
existir dívida antiga que não é paga, atento a jurisprudência predominante no
Superior Tribunal de Justiça – STJ, esta prescreve no prazo de 5 (cinco) anos, de
acordo com o inciso I do §5° do art. 206 do Código Civil de 2002.
Ao contrário, na hipótese de se haver pago em duplicidade a cota
condominial, sendo a ação de ressarcimento utilizada para impedir o
enriquecimento ilícito, o prazo prescricional vigente é o de 03 (três) anos,
previsto no inciso IV do § 3º do art. 206 do Código Civil de 2002 [“prescreve
(...) em três anos (...) a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem
causa”].

“RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE
COTAS CONDOMINIAIS. PRAZO PRESCRICIONAL DE
TRÊS ANOS. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA
ADMINISTRADORA DO CONDOMÍNIO MANTIDA.
RECURSO IMPROVIDO. I- Na ação de ressarcimento o que se
busca é a vedação ao enriquecimento ilícito. Assim, o prazo
prescricional vigente é o de 03 anos, previsto no artigo 206, § 3º,
IV, do CCB. II- Ilegitimidade passiva da administradora do
condomínio, eis que ausente imputação de falha na prestação de
serviço e de que tenha concorrido para a cobrança indevida por
qualquer modo. IV - Devolução em dobro indevida, por ausente
dolo ou má-fé. III- Retificação de ofício do março inicial da
prescrição, por erro material. Recurso a que se nega provimento”.
[339]


O Superior Tribunal de Justiça – STJ também vem entendendo que é
possível penhorar bem de família para pagamento de “cota de condomínio” ou
“taxa condominial”, porque há um interesse coletivo que supera o interesse
individual.

“PENHORA. Bem de família. Lei nº 8.009/90. Condomínio.
Contribuição condominial. A Quarta Turma alterou o seu
posicionamento anterior para passar a admitir a penhora de
imóvel residencial na execução promovida pelo condomínio para
a cobrança de quotas condominiais sobre ele incidentes. Recurso
conhecido pela divergência, mas improvido”.[340]


“COBRANÇA DE QUOTAS CONDOMINIAIS. PENHORA
INCIDENTE SOBRE DIREITOS DE COMPROMISSO DE
COMPRA E VENDA, RELATIVO A IMÓVEL FINANCIADO
PELO SFH. EMBARGOS DE TERCEIRO QUE VISAM
DESCONSTITUIR O ATO CONSTRITIVO, SOB A
ALEGAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL.
IMPENHORABILIDADE AFASTADA. PREVALÊNCIA DO
DIREITO DO CONDOMÍNIO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM.
SE A SUPOSTA AFRONTA A DISPOSITIVO LEGAL
OCORRER NO JULGAMENTO DA APELAÇÃO,
NECESSÁRIA A INTERPOSIÇÃO DOS EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO, A FIM DE QUE A MATÉRIA SEJA
PREQUESTIONADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM.
DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO. 1. Em sede de recurso
especial não se examina arguição de ofensa a texto da Lei Maior.
2. Se a questão federal surgir no julgamento da apelação, sem que
sobre ela tenha o Tribunal local se manifestado, cumpre ao
recorrente ventilá-la em embargos de declaração, sob pena de a
omissão inviabilizar o conhecimento do recurso por falta de
prequestionamento. 3. Precedentes das duas Turmas que integram
a Segunda Seção deste Tribunal, admitem a penhora de imóvel
financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação para pagamento
de taxas condominiais, não obstando o fato de ser considerado
bem de família, a teor do art. 3º, IV, da Lei nº 8.009/90. 4.
Hipótese em que o ato constritivo não recaiu sobre o imóvel em
si, mas sobre os direitos que exerce o compromissário-
comprador. 5 Ausência de interesse da entidade integrante do
SFH para arguir a impenhorabilidade prevista na Lei n.º
8.009/90. 6. Sendo a ação principal uma demanda de cobrança de
despesas condominiais (obrigação "propter rem"), não se pode
afirmar que o interesse da promitente-vendedora seja
predominante em relação ao do Condomínio. Precedente da 3ª
Turma. 7. No tocante ao dissídio interpretativo, a recorrente não
cuidou de cumprir o disposto no art. 541, parágrafo único, do
CPC e 255, § 2º, do RISTJ, mencionando as circunstâncias que
identifiquem ou assemelhem as hipóteses confrontadas. Recurso
não conhecido”.[341]

Todavia o mesmo Superior Tribunal de Justiça – STJ impede a cobrança
abusiva (não estar ainda na posse do imóvel; colocar o nome do inadimplente
dentro do elevador ou em quadro de avisos; etc) ou ainda suspensão de serviços
comuns. No entanto, a simples colocação do nome dos devedores no balanço
patrimonial, não gera dano moral.

“CONSUMIDOR. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE
IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA. COBRANÇA INDEVIDA
DE TAXAS CONDOMINIAIS ANTES DA ENTREGA DAS
CHAVES. DEVOLUÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. 1.
Cobrança indevida confere ao consumidor o direito à repetição
do indébito e, se demonstrada má-fé do credor, por valor igual ao
dobro do que pagou em excesso. Assim, o erro justificado pela
previsão contratual provoca a incidência da exceção prevista no
parágrafo único do artigo 42 do Código de Defesa do
Consumidor. 2. Recurso conhecido e não provido”.[342]

CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA
CUMULADA COM PEDIDO DE COMPENSAÇÃO POR
DANOS MORAIS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO
OCORRÊNCIA. INADIMPLEMENTO DE TAXAS
CONDOMINIAIS. DESPROGRAMAÇÃO DOS
ELEVADORES. SUSPENSÃO DE SERVIÇOS ESSENCIAIS.
IMPOSSIBILIDADE. EXPOSIÇÃO INDEVIDA DA
SITUAÇÃO DE INADIMPLÊNCIA. VIOLAÇÃO DE
DIREITOS DA PERSONALIDADE. DANOS MORAIS.
CARACTERIZAÇÃO. 1. Ação declaratória distribuída em
22.03.2011, da qual foi extraído o presente recurso especial,
concluso ao Gabinete em 26.09.2013. 2. Cinge-se a controvérsia,
além de apreciar a existência de omissão no acórdão recorrido, a
definir se é possível impor restrição ao condômino inadimplente
quanto à utilização dos elevadores e, caso verificada a ilegalidade
da medida, se a restrição enseja compensação por danos morais.
3. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os
embargos de declaração. 4. O inadimplemento de taxas
condominiais não autoriza a suspensão, por determinação da
assembleia geral de condôminos, quanto ao uso de serviços
essenciais, em clara afronta ao direito de propriedade e sua
função social e à dignidade da pessoa humana, em detrimento da
utilização de meios expressamente previstos em lei para a
cobrança da dívida condominial. 5. Não sendo o elevador um
mero conforto em se tratando de edifício de diversos pavimentos,
com apenas um apartamento por andar, localizando-se o
apartamento da recorrente no oitavo pavimento, o equipamento
passa a ter status de essencial à própria utilização da propriedade
exclusiva. 6. O corte do serviço dos elevadores gerou dano
moral, tanto do ponto de vista subjetivo, analisando as
peculiaridades da situação concreta, em que a condição de
inadimplente restou ostensivamente exposta, como haveria,
também, tal dano in re ipsa, pela mera violação de um direito da
personalidade. 7. Recurso especial provido”.[343]

Nos condomínios mistos (residencial e comercial). Não é dado aquele
que tem área comercial o direito de usar áreas de lazer, razão pela qual ele não
tem o dever de pagar tal serviço não disponibilizado nem útil.

“CIVIL. CONDOMÍNIO. LOJA AUTÔNOMA. DESPESAS
COMUNS. OMISSÃO DA CONVENÇÃO. COTA-PARTE
LIMITADA AOS SERVIÇOS DISPONÍVEIS E ÚTEIS.
RECURSO PROVIDO. I- A convenção do condomínio é que
deve prever o critério de rateio das despesas comuns, nos termos
do art. 12 da Lei 4.591/64. II- Sendo omissa a convenção, a
utilização ou não dos serviços comuns, a quantidade do seu uso e
a impossibilidade de renúncia do condômino aos serviços
prestados conduzem ao critério da disponibilização do serviço a
cada unidade, para fins de cálculo da cota-parte das despesas
condominiais”.[344]


3.8.4 Fundos e rateios extras


3.8.4.1 Fundos de reserva


Fundo de reserva é constituído através da arrecadação de recursos junto
aos condôminos, em separado do valor referente à cota condominial, objetivando
suportar as despesas não previstas no orçamento do condomínio, ou seja, é
criado para atender a gastos emergenciais, indispensáveis e imprevistos, tais
como vazamentos, rompimento de tubulações, etc., evitando, assim, a
necessidade de emissão de sucessivas cotas extras. Portanto, a principal
destinação do fundo de reserva é garantir a continuidade e o bom funcionamento
do condomínio em caso de despesas imprevistas e emergênciais, além de
acumular recursos para viabilizar a necessidade grandes reformas futuras, por
exemplo.
Não podemos nos furtar de mencionar que a obrigatoriedade de sua
instituição é polêmica. A discussão que gira em torno da revogação ou não da
Lei n° 4.591, de 16.12.1964 (Lei dos Condomínios) pelo Código Civil de 2002
parece não ter fim. Com efeito, a entrada em vigor do referido Código Civil fez
surgir 2 (duas) correntes doutrinárias conflitantes: uma que entende que o
Código Civil de 2002 revogou os artigos 1º a 27 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,
sob a alegação de que lei posterior revoga lei anterior; e outra, com fulcro no que
dispõe o §1° do art. 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro,
que entende ter havido a derrogação de parte da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, no
que tange aos artigos que sejam antagônicos ao Código Civil de 2002, uma vez
que este não exauriu toda a matéria de condomínios.
Como visto, a Lei n° 4.591, de 16.12.1964, prevê expressamente, na
alínea j do §3° do art. 9° da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, a obrigatoriedade da
constituição do fundo de reserva, uma vez que determina que a Convenção
condominial deve instituir a sua forma de contribuição, o que implicitamente
obriga os condomínios a constituírem o fundo de reserva através da sua
Convenção condominial. Por sua vez, o Código Civil de 2002 não faz menção
expressa à constituição do fundo de reserva. No entanto, ao dispor sobre as
normas a serem inseridas na Convenção condominial, ressalta, em seu art. 1.334,
que: “Além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados
houverem por bem estipular, a Convenção determinará (...)”. Assim, no que diz
respeito à criação do fundo de reserva, sob a ótica do Código Civil, ele pode ser
instituído e regulamentado através da Convenção condominial, do Regimento
Interno ou através de deliberação em assembleia, a quem caberá, também,
especificar os casos em que ele poderá ser utilizado, bem como a quem caberá
autorizar a sua movimentação.

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA DA
TAXA DE CONDOMÍNIO. IMÓVEL ARREMATADO EM
PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL.
RESPONSABILIDDE DO ADQUIRENTE PELAS DESPESAS
CONDOMINIAIS. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. FUNDO
DE RESERVA. 1. As taxas e contribuições do condomínio
constituem obrigação propter rem, ou seja, que adere ao bem
imóvel, respondendo o adquirente pelo adimplemento, ainda que
se trate de parcelas vencidas antes da sua aquisição. 2. O dever
do condômino em contribuir para as despesas de condomínio,
arcando com os encargos pelo inadimplemento, conforme
determinado na convenção do condomínio, decorre de lei (art.
1.336 do Código Civil vigente), obrigando todos os proprietários
do imóvel, atuais e futuros, ao seu cumprimento. 3. Afigura-se
legítima a cobrança do Fundo de Reserva, considerando sua
previsão na Convenção de Condomínio e, ainda, em Assembleia
Geral Ordinária realizada pelo condomínio. 4. Sentença
reformada. 5. Apelação provida”.[345]

“PRETENSÃO DECLARATÓRIA - CONDOMÍNIO MISTO
DE LOJAS E SALAS COMERCIAIS - PREVISÃO DA
CONVENÇÃO SOBRE O RATEIO DAS DESPESAS - FUNDO
DE RESERVA. PRETENSÃO DECLARATÓRIA -
CONDOMÍNIO MISTO DE LOJAS E SALAS COMERCIAIS -
PREVISÃO DA CONVENÇÃO SOBRE O RATEIO DAS
DESPESAS - FUNDO DE RESERVA. Previsão convencional
para obrigação dos condôminos no pagamento das despesas
comuns e do fundo de reserva, ficando estabelecida na
Convenção a divisão de rateios e despesas do grupo de
condôminos formado pelas lojas e o outro grupo dos condôminos
formado pelas salas comerciais integrantes do edifício do 3º ao
13º andares. Orçamentos e despesas separados com a declaração
de que um grupo não tem obrigação de contribuir para o fundo de
reserva do outro grupo e vice-versa. Acolhimento da pretensão
declaratória da inexigibilidade da contribuição das lojas para o
fundo de reserva das salas. Recurso provido”.[346]

Mesmo assim, entendemos que a existência do fundo de reserva e a
necessodade de ser pago por todos os condôminos revela-se em razão de uma
boa causa, ou seja, com o objetivo de fazer frente a despesas de conservação do
prédio. Afinal de contas, a conservação é necessária também para garantir a
segurança de todos os condôminos e moradores do prédio.
Normalmente, o fundo de reserva é expresso em percentual da cota ou
taxa condominial, previsto na convenção de condomínio que deve ser destinado
a conta do referido fundo. Em geral, esse percentual ou alíquota varia de 5%
(cinco por cento) a 10% (dez por cento), mas a quantia destinada ao fundo de
reserva pode ser superior a 10% (dez por cento), se assim for deliberado na
assembleia-geral de condôminos, mas não pode ser inferior ao percentual
aprovado.
Na prática, os fundos de reserva são, em essência, uma forma de separar
uma parcela de dinheiro da conta comum do condomínio. Assim, fica mais fácil
gerir uma arrecadação para certo fim. Por se tratar de uma arrecadação na
maioria das vezes de médio a longo prazo, fundos de reserva costumam
acumular valores consideráveis. Portanto, é importante que o montante
acumulado seja aplicado em instituições financeiras para não perder seu valor
real.

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONDOMÍNIO. AÇÃO
DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE MULTA E
OUTRAS VERBAS C.C. CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO.
DESPESAS EXIGIDAS EM BOLETO ÚNICO.
IMPUGNAÇÃO À COBRANÇA DE MULTA POR INFRAÇÃO
CONTRATUAL E VALOR ATINENTE A FUNDO DE
RESERVA. DECISÃO QUE REJEITOU A CONSIGNAÇÃO
DE VALORES EM JUÍZO. CABIMENTO DO DEPÓSITO
JUDICIAL, EMBORA TÃO-SOMENTE DOS VALORES
EXIGIDOS PELO CONDOMÍNIO, EXLUINDO-SE QUANTIA
REFERENTE À SANÇÃO IMPUGNADA. Havendo recusa
quanto ao desmembramento da cobrança de multa contratual no
boleto envolvendo outras despesas exigidas pelo condomínio,
afigura-se legítima a consignação em juízo das verbas, excetuada
a sanção, cuja exigibilidade demanda cognição ampla.
Consignação em pagamento admitida com fundamento nos
artigos 273 do CPC e 335, I, do Codigo Civil em vigor. Recurso
parcialmente provido”.[347]


3.8.4.2 Espécies de fundo e rateio


Aliás, o fundo de reserva é a única forma de arrecadação extra a figurar
nas convenções condominiais. No entanto, outras formas de arrecadação podem
existir, tais como fundo de obras, fundos para outros fins e rateios extras, porém
todos eles devem ser criados por assembleias-gerais de condôminos.
Seja com for, para que haja transparência no processo da criação de
fundos e rateios é importante que esteja expressamente previstas informações
básicas, tais como a duração da arrecadação, o quanto se quer levantar, e,
principalmente, seu objetivo.
Os tipos mais comuns de fundos e rateios são os seguintes: 1) fundo de
obras: este tipo de fundo serve para proporcionar melhorias na infraestrutura do
prédio. Troca de itens como canos, impermeabilização de lajes, pintura na
garagem. Esse tipo de reforma, comum em tantos condomínios, é, em geral,
custeada pelo fundo de obras; 2) fundo de equipagem: este tipo de fundo é muito
usado em condomínios novos; é voltado para compras diversas como carrinhos
de compras, tapetes, acolchoados para elevadores, lixeiras, acessórios para
banheiros de áreas comuns, mobiliário para piscina, e até em alguns casos, a
instalação de circuito fechado de tv e proteção perimetral. Nesse caso, como é
muito difícil prever o término desses custos, a arrecadação dura o tempo que for
necessário para sanar essas compras; 3) rateios extras: este tipo de arrecadação,
apesar de tão impopulares, constituem também fundos. Seu excesso deve ser
evitado, pois muitos rateios extras colaboram com a alta inadimplência e
também dão ideia de gestão fraca no condomínio. Oscondomínios se
provisionam com rateios extras ou quando um grande imprevisto acontece,
quando está para acontecer, como uma sentença judicial contrária ao
condomínio, ou para se provisionar para meses de maiores gastos, como
novembro e dezembro – quando há o pagamento do dissídio dos funcionários e
também do décimo terceiro salário.
Alertamos que o que mais incomoda os condôminos e moradores de um
condomínio é o uso de um fundo ou rateio para suprir outro problema não
previsto ou estranho aos motivos de sua criação. Mas o síndico pode, sim, se
utilizar daquela conta de fundo ou rateio para sanar alguma outra emergência,
como, por exemplo, um elevador parado por falta de conserto. Nesse caso, o uso
parcial ou total do fundo ou rateio deve ser reposto e para que não haja
questionamentos por parte dos condôminos, também deve ser ratificado em ata
na próxima assembleia-geral.
Mesmo assim, os usos possíveis do fundo de reserva, especificamente,
devem estar expressamente citados na convenção do condomínio. Caso não haja
menção a isso, quando houver necessidade do uso dessa arrecadação, uma
votação em assembleia-geral deve ratificá-la.


3.8.4.3 Quorum de aprovação e arrecadação


Seja através da criação de fundos (como um fundo de obras, por
exemplo) ou de rateios extras, para conseguir uma nova arrecadação, o síndico
deve contar com maioria simplesa fim de obter sua aprovação.
Uma vez aprovada a criação de fundos ou de rateios extras, o pagamento
das respectivas parcelas está ligado ao conceito de fração ideal, ou seja, quem
possuir 2 (duas) unidades autônomas deve pagar o dobro do que o proprietários
de uma única unidade autônoa terá de arcar. O mesmo vale para coberturas,
desde que respeitada a proporcionalidade das frações ideais correspondentes à
unidade autônoma.


3.8.4.4 Participação de inquilinos e usufrutuários para formação de fundos


Muito se questiona sobre a participação dos inquilinos para a formação
de fundos dos mais diversos em condomínios.
O aceito é que os inquilinos arquem com as despesas ordinárias, como
água, luz e pagamento de funcionários. Já condôminos, proprietários de unidade
autônoma, são os responsáveis por investir em melhorias, como pintura de
fachada, e obras no jardim – já que esse tipo de benfeitoria aumenta o valor do
imóvel.

“CONTRATO DE LOCAÇÃO. RESTITUIÇÃO DE COTAS DE
FUNDO DE RESERVA. Relata a reclamante, em síntese, que
reside no apartamento nº 901 do Edifício Radio Londrina, ora
reclamado, desde março de 1977. Aduz que embora o contrato de
locação esteja em nome de seu irmão sidney cury, todas as
despesas da locação (alugueis, taxas de condomínio, etc.), são
sempre foram custeadas pela reclamante. Sustenta que desde o
início da locação o valor da taxa referente ao fundo de reserva
que compõe o total da taxa de condomínio nunca foi restituído à
reclamante, por meio de abatimento no valor do aluguel.
sobreveio sentença que julgou extinto o processo sem resolução
do mérito, nos termos do art. 267, inciso VI, do CPC. Insurge-se
a reclamante. argumenta a recorrente que apesar de não constar
seu nome no contrato de locação firmado com o recorrido, mas
sim o nome do seu irmão, sr. Sidney Cury, o recorrido não negou
que tem conhecimento de que a reclamante é quem reside de fato
no imóvel. Aduz que possui legitimidade para reaver os valores,
pois foi a responsável pelos pagamentos. Preliminar de
ilegitimidade ativa. abstrai-se dos autos que o contrato, bem
como os boletos das taxas condominiais estão em nome de sidney
cury, locador do imóvel (mov. 1.5/1.15 e 36.2). A reclamante
alega ser a responsável pelos pagamentos, pois detém todos os
comprovantes em seu poder. Nos termos do art. 6° do Código de
Processo Civil: ‘Ninguém poderá pleitear, em nome próprio,
direito alheio, salvo quando autorizado por lei’. Trata-se de
demanda relacionada com contrato de locação, portanto, possui
legitimidade para propor a ação em comento apenas aquele que
figura como locatário no contrato entabulado entre as partes.
portanto, escorreita a sentença monocrática que declarou a
ilegitimidade ativa da reclamante. Sentença mantida na íntegra
pelos próprios fundamentos. Recurso conhecido e desprovido.
Condeno a recorrente ao pagamento dos honorários advocatícios
fixados em 10% sobre o valor da causa. Entretanto, resta
sobrestada referida condenação em razão das concessão dos
benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 12
da lei 1.060/50. Serve a presente ementa como voto. Unânime”.
[348]


“APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - INÉPCIA DA
INICIAL NÃO CONFIGURADA - SENTENÇA ULTRA
PETITA - REDUÇÃO AOS LIMITES DO PEDIDO - ARTIGOS
128 E 460 DO CPC - NULIDADE NÃO-OCORRENTE -
FUNDO DE RESERVA PARA DESPESAS
EXTRAORDINÁRIAS DE CONDOMÍNIO -
RESPONSABILIDADE DO LOCADOR. Não é inepta a petição
inicial que, embora singela, permita ao julgador e à parte adversa
apurar o teor da pretensão jurídica da parte autora. A petição
inicial só é inepta quando, da narração do fato não se puder
verificar qual a causa da lide ou, ainda, quando os fundamentos
jurídicos do pedido não se aplicarem à espécie, não se podendo,
outrossim, saber, com exatidão, qual o pedido. A lide deve ser
julgada nos exatos limites da postulação trazida pela parte, nos
ditames dos artigos 128 e 460, do Código de Processo Civil,
oferecendo uma resposta às questões inseridas no processo. A
sentença que decide além do pedido - ultra petita - não é nula,
apenas comportando decotes quanto ao excesso verificado. A
obrigação pelo pagamento do fundo de reserva compete ao
locador, por servir para cobrir despesas extraordinárias do
condomínio. Apelação principal desprovida e apelação adesiva
provida”.[349]

Outrossim, sendo os valores atinentes à constituição de fundos relativos
às despesa extraordinária, e não se tratando de despesa ordinária de conservação
das áreas comuns do condomínio, também não podem eles ser imputados ao
usufrutuário.

“APELAÇÃO - AÇÃO DE COBRANÇA - CONDOMÍNIO -
SENTENÇA SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADA -
AUSÊNCIA DE NULIDADE - REGRA DE DISTRIBUIÇÃO
DO ÔNUS DA PROVA (CPC, ART. 333)- INEXISTÊNCIA DE
OFENSA AO CONTRADITÓRIO - USUFRUTUÁRIO -
RESPONSABILIDADE PELAS DESPESAS ORDINÁRIAS DE
CONSERVAÇÃO DO BEM - FUNDO DE RESERVA -
DESPESA EXTRAORDINÁRIA - RESPONSABILIDADE
EXCLUSIVA DO PROPRIETÁRIO - JUROS MORATÓRIOS -
1% A.M. - MULTA - LIMITAÇÃO A 2% - CÓDIGO CIVIL DE
2002 - LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA - RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO. Da leitura do decisum de f. 43-
46, verifica-se que o julgador a quo expôs, suficientemente, as
razões de fato e de direito que o levaram a rejeitar a prefacial de
ilegitimidade passiva ad causam, consignando que as despesas
relativas à constituição de fundo de reserva, não obstante
qualificadas na Lei nº 8.245/91 como ‘extraordinárias’, se
destinam à conservação do bem, sendo, portanto, de
responsabilidade do usufrutuário. A jurisprudência tem entendido
que, apresentando a sentença, ainda que de forma sucinta, as
razões pelas quais se chegou a determinado resultado, não há que
se falar em nulidade, por ausência de fundamentação. Na
hipótese em tela, cuidando-se de ação de cobrança de taxas
condominiais, cuja obrigação de pagamento, a cargo do
condômino, decorre da lei (art. 12, da Lei nº 4.591/64), e tendo o
condomínio-autor instruído a inicial com a planilha de f. 13,
como forma de demonstrar o débito reclamado, competia à ré,
ora apelante, o ônus de desconstituir o direito do requerente, nos
termos do art. 333, II, do CPC. Portanto, o magistrado primevo,
ao imputar ao réu o ônus de comprovar que os valores cobrados
não são legítimos, limitou-se a aplicar a lei processual, não
deixando de observar o contraditório. Os valores atinentes à
constituição de fundo de reserva constituem despesa
extraordinária, razão pela qual, não se tratando de despesa
ordinária de conservação da coisa, não pode ser imputada ao
usufrutuário”.[350]

Para facilitar a contabilidade – e a separação das contas – o ideal é a
abertura de cadernetas de poupanças separadas: uma para despesas ordinárias e
outras para fundos específicos. Mas há também casos em que inquilinos devem
arcar com os rateios extras. Isto ocorre quando o rateio extra for criado para ser
usado em despesas ordinárias. Em casos de alta inadimplência, por exemplo,
pode-se usar arrecadação extra para pagar as contas do mês. Nesse caso, os
inquilinos devem, sim, contribuir para a sua restauração.


3.8.4.5 Gestão dos fundos


Os fundos e rateios extras o condomínio devem ser prontamente
depósitados numa instituição financeira e a sua gestão compete à assembleia-
geral de condôminos e ao administrador ou síndico, sendo que o este não deve
movimentar a referida conta sem a assembleia-geral o aprovar primeiro.
A conta do fundo ou do rateio extras deve ser providenciada pelo
administrador do condomínio, visto que isto faz parte das suas funções. É
preferível depósito a prazo para o fundo ou rateio, pois este serve para financiar
despesas de obras de manutenção, que são normalmente realizadas em geral de 8
(oito) em 8 (oito) anos, caso não sejam necessárias antes desse tempo.
No entanto, o fundo ou rateio não deve ser utilizado para obras em
unidades autônomas. Neste caso, os custos de tais obras fora das áreas comuns
devem ser suportados pelo condômino proprietário da fração ideal e não por
todos os condôminos do prédio.
Ademais, a reserva de capital, uma vez formada, incorpora-se ao
patrimônio do condomínio definitivamente. De maneir que o condômino que se
retira, por ter vendido a sua unidade autônoma, não se reembolsa da parte que
contribuiu para a sua formação, porque a própria destinação daquela verba a isso
se opõe.[351]
Seja como for, a reserva de capital bem administrada certamente evita
grandes desfalques nas finanças particulares de cada condômino, sem contar a
valorização do patrimônio comum que dai sobrevem. Ao contrário, a má
administração dos fundos comuns é a porta aberta para a imprevidência, para
constantes desabamentos totais ou parciais de edifícios, para incêndios
decorrentes de curtos-circuitos nas instalações elétricas das áreas comuns, para
acidentes com elevadores e até mesmo para envenenamentos provenientes de
encanamentos e tubulações deteriorados, ligados aos sistemas de gás, água,
esgoto e eletricidade.


3.8.4.6 Inadimplência na arrecadação de fundos


Se um dos condôminos decidir não contribuir para o fundo comum ou
rateio extra, a administração do condomínio deve sempre tentar um acordo
extrajudicial para a solução da inadimplência, pois tal problema pode não passar
de um mal-entendido.
No entanto, caso as tentativas de acordo extrajudicial não obtenham
resultado, o condomínio pode acionar, pelos meios legais disponíveis, para
conseguir a arrecadação do fundo comum ou rateio extra, devidamente aprovado
em assembleia-geral de condôminos. Neste caso, o administrador do condomínio
deve instruir a ação judicial com cópia autenticada da ata da assembleia em que
as contribuições de cada um foram deliberadas.

“AÇÃO DE COBRANCA DE ENCARGOS CONDOMINAIS E
RECONVENCAO. RECURSO TEMPESTIVO. E
TEMPESTIVA A APELACAO DEPOSITADA EM CARTORIO
DENTRO DE QUINZE (15) DIAS, AINDA QUE NESSE
PERIODO NAO SEJA DESPACHADA PELO JUIZ.
DESPESAS DE CONDOMÍNIO E FUNDO DE RESERVA.
CLASSIFICACAO, NATUREZA E DESTINO. O fundo de
reserva por se não confundir com as despesas ordinárias do
condomínio nao pode ser subtraido, separado daquela quota, por
ser um acréscimo, uma parcela a mais, a ser utilizada para as
despesas imprevisiveis e de carater urgente. Todas as ‘chamadas
extraordinarias’ aprovadas por deliberacao de assembleia geral
regular são obrigatorias para os condominos, e cobraveis por
parte do condomínio. A cobranca independe de realizacao das
obras ou melhorias a que se destinam. Juros e multa
convencionais. Inexistencia do registro imobiliario da convenção.
As regras da convenção obrigam a todos os condôminos do
edificio, independente do registro no album imobiliario, o qual
tem apenas a finalidade de ressalvar os direitos de terceiros, e não
dos proprietarios de unidades condominiais. Constituido em mora
o condomino, na forma e pelo prazo estabelecido pela
convenção, são devidos juros e a multa por ela fixados.
Preliminar rejeitada. Apelo improvido”.[352]

“DESPESAS DE CONDOMÍNIO. AÇÃO DE COBRANÇA.
PETIÇÃO APTA. INSTRUÇÃO DA PETIÇÃO INICIAL COM
ATAS DAS ASSEMBLEIAS E DEMAIS DOCUMENTOS
SOBRE A ORIGEM DA DÍVIDA. DESNECESSIDADE.
OBRIGAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO. INCLUSÃO DAS
PARCELAS VINCENDAS ATÉ A SATISFAÇÃO DA
OBRIGAÇÃO. EXEGESE DO ART. 290 DO CPC. MULTA
MORATÓRIA QUE DEVE INCIDIR SOBRE O FUNDO DE
RESERVA INADIMPLIDO. APLICAÇÃO INCORRETA DA
CORREÇÃO MONETÁRIA NÃO DEMONSTRADA. Não se
há de falar em inépcia da petição inicial, tendo em vista que da
narração dos fatos decorre logicamente a conclusão e o pedido é
juridicamente possível. Desnecessidade de ser a petição inicial
instruída com a ata da assembleia-geral ordinária que aprovou as
despesas. Por força do art. 290 do CPC, incluem-se as prestações
vincendas no pedido, integrando a condenação até que satisfeita a
obrigação. Convenção condominial que prevê a aplicação da
multa moratória em relação a todas as despesas condominiais.
Incidência sobre o fundo de reserva não adimplido. Incumbia aos
réus apresentarem planilha de cálculo a fim de demonstrar que a
correção monetária estava sendo aplicada incorretamente. Mera
alegação genérica de incorreção do cálculo que não merece
prosperar. Recurso desprovido”.[353]


3.9 SEGURO, INCÊNDIO, DEMOLIÇÃO E
RECONSTRUÇÃO OBRIGATÓRIA


3.9.1 Seguro da edificação


O art. 1.346 do Código Civil de 2002 é claríssimo: “É obrigatório o
seguro de toda a edificação contra o risco de incêndio ou destruição, total ou
parcial”.
Na realidade este dispositivo reafirma o que dispõe a Lei n° 4.591, de
16.12.1964, sobre o assunto, em seus arts. 13 a 16, bem como o art. 23 do
Decreto n° 61.867, de 11.12.1967 (regulamenta os seguros obrigatórios previstos
no artigo 20 do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966).[354] De maneira
que o seguro da edificação é obrigatório e tem como objetivo a prevenção contra
incêndio ou sinistro que cause destruição total ou parcial do edifício.

“APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO. CONDOMÍNIO
RESIDENCIAL. NÃO IMPLEMENTAÇÃO DAS
COBERTURAS PACTUADAS. AUSÊNCIA DE
CONTRATAÇÃO PARA DESABAMENTO DO IMÓVEL. 1. O
contrato de seguro tem o objetivo de garantir o pagamento de
indenização para a hipótese de ocorrer à condição suspensiva,
consubstanciada no evento danoso previsto contratualmente, cuja
obrigação do segurado é o pagamento do prêmio devido e de
prestar as informações necessárias para a avaliação do risco. Em
contrapartida a seguradora deve informar as garantias dadas e
pagar a indenização devida no lapso de tempo estipulado.
Inteligência do art. 757 do Código Civil. 2. Igualmente, é
elemento essencial deste tipo de pacto a boa-fé, caracterizado
pela sinceridade e lealdade nas informações prestadas pelas
partes e cumprimento das obrigações avençadas, nos termos do
art. 422 da atual legislação civil. 3. Contudo, desonera-se a
seguradora de satisfazer a obrigação assumida apenas na hipótese
de ser comprovado o dolo ou má-fé do segurado para a
implementação do risco e obtenção da referida indenização. 4.
Assim, caso seja agravado intencionalmente o risco estipulado,
ocorrerá o desequilíbrio da relação contratual, onde a seguradora
receberá um prêmio inferior à condição de perigo de dano
garantida, em desconformidade com o avençado e o disposto no
art. 768 da lei civil, não bastando para tanto a mera negligência
ou imprudência do segurado. 5. No caso em exame a parte autora
busca a cobertura securitária por desabamento de imóvel,
resultante de contrato de seguro firmado com a demandada. 6. No
entanto, como se pode observar da Apólice de Seguro
Condomínio Residencial colacionada aos autos, não foi
contratada a cobertura para desabamento do imóvel. 7. Note-se
que o desabamento do bem resultou de defeitos no projeto e na
construção, mais especificamente da perda de resistência
mecânica do pilar, segundo o inquérito policial colacionado ao
presente feito, além da péssima qualidade do material empregado
na obra. 8. Destarte, inexistindo cobertura para o evento descrito
na inicial, descabe a condenação da seguradora ao pagamento do
valor da indenização postulado pela parte autora. Negado
provimento ao apelo”.[355]

Em assim sendo, além de obrigatório os seguros para condomínios, estes
estão sujeitos as seguintes regras: 1) o seguro da edificação ou do conjunto de
edificações deve abranger todas as unidades autônomas e partes comuns tanto
contra incêndio como destruição total ou parcial, ou seja, tanto a Lei n° 4.591,
de 16.12.1964, como o Código Civil de 2002 estabelece a obrigatoriedade da
contratação de seguro, que cubra toda a edificação contra o risco de incêndio
ou outro evento qualquer, que possa causar destruição total ou parcial das
instalações seguradas (art. 1.346 do Código Civil de 2002 e caput do art. 13 da
Lei n° 4.591, de 16.12.1964).[356] Isto porque, no caso de sinistro, poderia afetar
também as unidades autônomas e não somente a parte de uso comum do
edifício; 2) entretanto, o seguro da edificação ou do conjunto de edificações não
cobre conteúdo da unidade autônoma (móveis e objetos pessoais, as benfeitorias
e outros bens que não integrem a unidade padrão), de propriedade privada do
condômino, ou seja, tais bens não estarão obrigatoriamente amparados pela
garantia do seguro. Cada condômino, assim desejando, pode contratar com
qualquer seguradora para garantia que julgar conveniente para os seus bens
particulares e que não integrem a unidade padrão; 3) os danos decorrentes de
incêndio ou destruição total ou parcial causados à unidade autônoma, os bens
que integram a unidade autônoma padrão (janelas, portas, vasos sanitários e
outros agregados ao imóvel na sua construção) e as partes comuns deverão, em
tese, ser cobertos pelo seguro obrigatório, mesmo que tenha o condômino dado
causa a ocorrência, salvo no caso de má-fé comprovada; 4) a contratação do
primeiro seguro deve ser realizada, no máximo, até 120 (cento e vinte) dias da
concessão do “habite-se”, sob pena de ficar o condomínio sujeito à multa mensal
equivalente a 1/12 (um doze avos) do Imposto Predial e Territrial Urbano –
IPTU, cobrável executivamente pelo Município onde está localizado o prédio
(parágrafo único do art. 13 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964. Portanto, a
fiscalização e a cobrança competem ao Municipio em razão de ser o responsável
pelo cumprimento das demais normas e posturas relativas á segurança e higiene
dos prédios urbanos; 5) a realidade recomenda, no entanto, que seja feita a
contratação do seguro da edificação ou do conjunto de edificações tão logo a
ocupação do imóvel seja iniciada; 6) as renovações do seguro da edificação ou
do conjunto de edificações devem ser continuadas, sem interrupções, e com uma
periodicidade anual quando não prevista na convenção; 7) o síndico, de acordo
com o inciso IX do art. 1.348 do Código Civil de 2002, responde ativa e
passivamente, em juízo ou fora dele, por qualquer inadequação ou insuficiência
de seguro constatada. No entanto, a obrigação de contratar o seguro do
condomínio não é apenas do síndico, mas subsidiariamente também dos
condôminos, pois o proveito desta proteção é de todos; 8) uma vez que a
legislação não especifica que outros eventos devem ser segurados além de
incêndio ou destruição, total ou parcial, deixando vaga a definição das
coberturas obrigatórias, deve-se contratar um seguro que garanta todos os
eventos a que o condomínio esteja efetivamente sujeito, entre os quais
destacamos: raio, explosão, queda de aeronaves, danos elétricos, vendaval,
impacto de veículos, quebra de vidros, roubo e os seguros de responsabilidade
civil do condomínio, síndico, dos portões e veículos. Portanto, o síndico deve
observar com cuidado as cláusulas e disposições da apólice de seguro, tal como
valor de cobertura, as situações descritas em que o dano pode ser verificado e em
que poderia ocorrer direito à indenização, bem como negociar com o corretor de
seguros ou companhia de seguros a possibilidade de ampliar a cobertura [os
principais tipos de apólices de seguros para condomínios são as seguintes: a)
responsabilidade civil do condomínio; b) incêndio, raio e explosão; c) quebra de
vidros e espelhos; d) morte e invalidez de empregados; e) responsabilidade civil
por guarda de veículo; f) danos elétricos; g) vendaval; h) impacto de veículos
terrestres; i) roubo de bens de moradores; j) desmoronamento; k) tumultos e
greves; l) roubo de bens do condomínio; m) portões eletrônicos; n) assalto e
sequestro; e o) projétil perdido]. De qualquer forma, outra alternativa neste caso,
é contratar seguro suplementar, tendo em vista melhoramentos que ocorreram no
edifício. Assim, deve constar na apólice complementar, a existência de seguro
básico de reposição da unidade padronizada e das benfeitorias no novo seguro
complementar; 9) não se pode perder de vista, outrossim, que as unidades
habitacionais adquiridas através de financiamento, possuem outro tipo de seguro
contratado no ato da compra, o seguro contratual. No entanto destacamos que,
apesar da existência deste seguro condominial contratual, derivado de contratos
de financiamento, ele não se sobrepõe ao Código Civil de 2002 e à Lei n° 4.591,
de 16.12.1964, que prescrevem a necessidade de toda edificação possuir o
seguro obrigatório da edificação ou do conjunto de edificações, pois o poder
regulamentar não pode contrariar disposição de lei.; 10) a responsabilidade pela
renovação do seguro da edificação ou do conjunto de edificações recai sobre o
síndico, em cujo mandato a apólice foi emitida, não se justificando a
insuficiência de coberturas em apólices vencidas, como isenção de
responsabilidade do síndico no caso de sinistro. A renovação do seguro da
edificação ou do conjunto de edificações é obrigação do condomínio que recai
sobre o síndico, considerando que a este compete a administração do
condomínio bem como a prática de todos os atos de defesa dos interesses
comuns dos condôminos. Sendo constatada a negligência, omissão e até
imperícia do síndico na mencionada renovação recairá sobre ele a
responsabilidade civil e até criminal. Assim, pois, inexistindo o seguro
obrigatório, a responsabilidade recairá sobre o condomínio, especificamente
sobre o síndico, uma vez que este tem o dever de contratar o seguro, na forma
como se expressa a lei; 11) é essencial a revisão de valores e de coberturas a
cada renovação; 12) o condômino não pode deixar de contribuir com o seguro
legal e obrigatório, no total de sua cota parte, mesmo que já tenha contratado
seguro estipulado pela financiadora do imóvel. Até mesmo porque, o seguro
contratual cobre apenas a unidade habitacional objeto do financiamento,
enquanto o seguro legal e obrigatório cobre toda a edificação, as unidades
habitacionais e áreas comuns não privativas. O seguro legal e obrigatório é mais
completo, abrangendo toda a estrutura edificada, para proteção dos condôminos,
áreas privativas, comuns e também terceiros; 13) ainda em relação a obrigação
de contribuir com o seguro, o §2° do art. 12 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, se
aplica ao seguro obrigatório, pois estabelece que “cabe ao síndico arrecadar as
contribuições, competindo-lhe promover, por via executiva, a cobrança judicial
das quotas atrasadas”; 14) para a contratação do seguro obrigatório, não há
necessidade de aprovação em assembleia-geral de condôminos, ao contrário das
coberturas opcionais. Portanto, o síndico não necessita de assembleia para
aprovar a contratação de seguros, mas deve propô-lo para escolher a companhia
e estabelecer a distribuição de valores para as unidades e partes comuns. De
maneira que os seguros obrigatórios devem ser computados como despesa
ordinária e, por via de consequência, até mesmo o inquilino deve contribuir, já
que os seguros estipulam a participação do condomínio como um todo
indivisível. Todas as unidades autônomas são incluídas na obrigação de arcar
proporcionalmente com o seguro legal e obrigatório e devem colaborar de
acordo com as frações ideais correspondentes.

“APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. AÇÃO DE COBRANÇA.
SEGURO CONDOMÍNIO. VENDAVAL. DANO EM
UNIDADE AUTÔNOMA. RISCO EXCLUÍDO DO
CONTRATO. DEVER DE INFORMAÇÃO OBSERVADO.
AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. INDENIZAÇÃO
SECURITÁRIA INDEVIDA. Trata-se de ação de cobrança de
indenização securitária decorrente de contrato de seguro
condomínio, julgada improcedente na origem. A possibilidade de
o segurador excluir determinados riscos do contrato possui
previsão legal no artigo 757 do Código Civil, desde que seja dado
ao segurado a devida ciência a respeito, ou seja, o contratante
deve ter conhecimento, ab initio, dos limites da cobertura
securitária. In casu, as condições gerais do contrato de seguro
foram acostadas aos autos pelo próprio segurado e a cláusula
restritiva se encontra redigida de forma clara e em destaque (em
negrito), razão pela qual, embora a relação havida entre as partes
seja de consumo, incidindo, por consequência, as regras do
Código de Defesa do Consumidor, não há falar em infringência
ao dever de informação, tampouco em abusividade de exclusão
de riscos, sendo legítima a recusa da seguradora, pois baseada em
cláusula contratual válida. Precedentes. A contratação da
cobertura denominada de "assistência condomínio", não dá
cobertura para danos causados a terceiros e/ou moradores, dando
direito apenas a prestação de serviços de assistência ao
condomínio. APELAÇÃO DESPROVIDA”.[357]

“RECURSO INOMINADO. SEGURO CONTRA INCENDIO
REALIZADO PELO CONDOMÍNIO ONDE SE LOCALIZA A
LOJA AUTORA. APOLICE QUE NÃO PREVÊ A
COBERTURA SOBRE O CONTEÚDO DA LOJA
(MERCADORIAS). Cláusulas gerais inseridas no manual do
segurado que devem ser interpretadas em conjunto com a apólice,
documento apto para verificar o que extamente foi segurado no
contrato realizado entre as partes. Não havendo cláusula expressa
a respeito de seguro das mercadorias dos lojistas que atuam no
condomínio, não há que se falar em indenização. Embargos de
declaração que não podem ser considerados como ma-fe
processual. Recurso provido”.[358]

“SEGURO DE CONDOMÍNIO RESIDENCIAL. RELAÇÃO
CONSUMERISTA EVIDENCIADA. APLICAÇÃO DO
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Quando se trata de
contrato de seguro, as relações contratuais securitárias
encontram-se ao abrigo do Código de Defesa do Consumidor,
conforme inteligência que dimana do artigo 3°, § 2°. A presença
da hipossuficiência do consumidor ou a verossimilhança das suas
alegações autoriza a inversão do ônus da prova, por aplicação do
disposto no artigo 6°, inciso VIII, do Código de Defesa do
Cosumidor. VENDAVAL. NEGATIVA EM COMPLEMENTAR
O PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA.
DEVER DE INDENIZAR. Comprovada a ocorrência do sinistro
- no caso, vendaval - deve a seguradora pagar a indenização ao
beneficiário, uma vez que o contrato de seguro encontrava-se
vigente na data do evento danoso, assim como comprovados os
danos mediante a prova pericial. SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO NÃO PROVIDO”.[359]

“Seguro facultativo – Condomínio residencial – Ação de
cobrança de diferença de indenização – Demanda de condomínio
segurado em face de seguradora – Sentença de improcedência –
Manutenção do julgado – Necessidade – Veículo de condômino
danificado por portão, que fechou repentinamente – Existência de
cobertura securitária para tal dano – Reparos no veículo que
ocorreram sem autorização da seguradora, em oficina não
referenciada – Vistoria realizada quando o bem já estava sendo
submetido aos reparos – Indenização paga com base em
estimativa de custos elaborada pela seguradora - Cabimento –
Diferença de indenização não devida. Apelo do autor
desprovido”.[360]

Vale acrescentar que o valor contratável deve abranger, necessariamente,
o da reconstrução do prédio, em caso de sinistro, sempre devidamente atualizado
na forma que convier as partes contratantes. Portanto, as seguradoras se obrigam
a indenizar apenas o custo da reconstrução.


3.9.2 Sinistro e reconstrução ou venda do terreno e materiais


Na hipótese de correr sinistro total ou que destrua mais de 2/3 (dois
terços) da edificação condominial, os condôminos devem se reunir em
assembleia especial (exclusivamente convocada para tal fim), com o objetivo
especifico de deliberarem sobre a reconstrução ou venda do terreno e materiais,
por quorum mínimo de votos que representem metade mais uma das frações
ideais do respectivo terreno. Portanto, os condôminos devem decidir se realizam:
1) a reconstrução do imóvel; ou 2) a venda do terreno e dos materiais que forem
salvos, aprovando-se a partilha do valor do seguro global entre os condôminos,
sem prejuízo do que receber cada um pelo seguro facultativo de sua unidade
autônoma (art. 14 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964).[361]
É importante observar que o Código Civil de 2002, em seu art. 1.357,[362]
ao tratar da extinção do condomínio pela destruição da edificação ou ameaça de
ruina, menciona expressamente a possibilidade de reconstrução ou de venda,
mas é omisso em relação ao seguro. Seja como for, prescreve o Código Civil
também que a deliberação da assembleia geral especial, para a reconstrução ou
para a venda, deve ser aprovada por quorum de metade mais uma das frações
ideias.
Esclarece ARNALDO RIZZARDO que o quorum estabelecido de
metade e mais uma das frações ideais do terreno requer que se compute o
número total dos votantes, presentes ou ausentes. Não se trata de contagem
envolvendo somente os votos dos presentes.[363]
Se for aprovada a reconstrução do prédio ou os reparos das partes
danificadas, deve ser observado, necessariamente, o mesmo destino original, a
mesma forma e a mesma disposição interna do prédio, a menos que haja
aprovação da assembleia em relação a modificações no destino, forma ou
disposição. No entanto, num ou noutro caso, a minoria (condôminos dissidentes)
não estão obrigados a aderir à reconstrução do prédio ou os reparos das partes
danificadas, sendo, neste caso, facultado à maioria proceder a adjudicação das
quotas dos condôminos dissidentes (§§ 2° e 3° do art. 14 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964).
Além disso, pode, perfeitamente, os condôminos eximirem-se do
pagamento das respectivas despesas de reconstrução do prédio ou os reparos
das partes danificadas (despesas com as obras que dizem respeito à estrutura
integral da edificação ou conjunto de edificações, ou ao serviço comum),
alienando os seus direitos a outros condôminos que convergiram no pertinente ao
total dos gastos, procedendo-se avaliação judicial de tais direitos (§ 1° do art.
1.357 do Código Civil de 2002).

“Condomínio. Despesas extraordinárias. Inovações introduzidas
na construção, com a feitura de sacadas, a que se opuseram
alguns condôminos. Impossibilidade de obrigá-los a concorrer
para o pagamento de tais despesas. Interpretação do artigo 12, §
4º da Lei 4.591/64”.[364]

A referida avaliação judicial dos direitos dos condôminos discordantes
deve seguir o procedimento de jurisdição voluntária disciplinado nos arts. 719 a
725 do Código de Processo Civil de 2015,[365] por força da previsão existente no
inciso V do art. 725 do mesmo diploma legal, bem como o disposto no art. 15 da
Lei n° 4.591, de 16.12.1964.[366] De maneira que, depois de ser apurado o valor
de tais direitos, seja extrajudicial ou judicialmente, o adquirente deve proceder o
depósito, o qual será levantado pelos condôminos que não aquiesceram com as
despesas da reconstrução, proporcionalmente ao valor das suas unidades
autônomas (§ 2° do art. 1.357 do Código Civil de 2002). Em assim sendo, sendo
levantado o depósito assegura-se a adjudicação das quotas ideias dos
condôminos discordantes.
Em caso de sinistro que destrua menos de 2/3 (dois terços) da edificação,
o síndico deve promover o recebimento do seguro e proceder a reconstrução ou
os reparos nas partes danificadas, não precisando de autorização de assembleia,
bastando para fazer a compra dos materiais necessários à reconstrução de no
mínimo 3 (três) orçamentos e obter a provação do Conselho Consultivo, por se
tratar de emergência (art. 16 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964).[367]
Ademais, sempre que a indenização for insuficiente, cabe o suprimento
pelos condôminos, mediante a apresentação do orçamento do custo das obras e o
cálculo do rateio da diferença entre todos, exigindo-se, antes da cobrança, a
prévia aprovação pela assembleia geral, por força do §4° do art. 12 da Lei n°
4.591, de 16.12.1964. No entanto, repetimos, a imposição aos condôminos do
referido suprimento a fim de fazer frente às despesas com as obras reconstrução
ou os reparos nas partes danificadas devem se restringire àquelas que dizem
respeito à estrutura integral da edificação ou conjunto de edificações, ou ao
serviço comum.
Os condôminos que representem pelo menos 2/3 (dois terços) do total de
unidades isoladas e frações ideais correspondentes a 80% (oitenta por cento) do
terreno e coisas comuns poderão decidir sobre a demolição e reconstrução do
prédio, ou sua alienação, por motivos urbanísticos ou arquitetônicos, ou, ainda,
no caso de condenação do edifício pela autoridade pública, em razão de sua
insegurança ou insalubridade (caput do art. 17 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,
com redação dada pela Lei n° 6.709, de 31.10.1979).[368]
Todavia, a minoria não está obrigada a contribuir para as obras, mas
assegura-se à maioria o direito de adquirir as partes dos dissidentes, mediante
avaliação judicial (§1° do art. 17 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, com redação
dada pela Lei n° 6.709, de 31.10.1979). Como vimos tal avaliação judicial deve
seguir o procedimento de jurisdição voluntária disciplinado nos arts. 719 a 725
do Código de Processo Civil de 2015, por força da previsão existente no inciso V
do art. 725 do mesmo diploma legal, bem como o disposto no art. 15 da Lei n°
4.591, de 16.12.1964.
Ocorrendo desgaste, pela ação do tempo, das unidades habitacionais de
uma edificação, que deprecie seu valor unitário em relação ao valor global do
terreno onde se acha construída, os condôminos, pelo quorum mínimo de votos
que representem 2/3 (dois terços) das unidades isoladas e frações ideais
correspondentes a 80% (oitenta por cento) do terreno e coisas comuns, poderão
decidir por sua alienação total, procedendo-se em relação à minoria (§2° do art.
17 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, com redação dada pela Lei n° 6.709, de
31.10.1979).
Outrossim, a aquisição parcial da edificação ou do conjunto de
edificações, ainda que por força de desapropriação, importa, necessariamente, o
ingresso do adquirente no condomínio, ficando este sujeito às disposições da Lei
n° 4.591, de 16.12.1964 e do Código Civil de 2002, bem assim às normas
previstas na convenção do condomínio e do Regulamento Interno ou Regimento
Interno (art. 18 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, com redação dada pela Lei n°
6.709, de 31.10.1979).[369]


3.10 UTILIZAÇÃO DA EDIFICAÇÃO OU DO
CONJUNTO DE EDIFICAÇÕES


3.10.1 Utililização exclusiva de área comum


Como vimos, o condomínio edilício possui espaços de propriedade de
todos os condôminos, chamadas de áreas comuns e as áreas de propriedade
exclusiva, utilizadas de forma independente. Entretanto, deve-se ter em mente
que, mesmo sendo a área comum suscetível de utilização por todos os
condôminos, observam-se situações em que é reservado ao titular da propriedade
habitacional o direito exclusivo de utilizar e usufruir dessas áreas, conferindo
destinação diversa daquela originalmente estipulada por lei. Aliás, áreas comuns
acessíveis por apenas uma unidade — fique ela na laje [uso pelo proprietário da
unidade autônoma do último andar] ou no térreo — não são exatamente algo
incomum nos prédios residenciais da cidade. Em especial, nos prédios mais
antigos.
Por exemplo, os §§1° e 2° do art. 1.331 do Código Civil de 2002
prescrevem que as partes comuns, dentro da edificação, não comportam divisão
e são inalienáveis, e de acordo com o art. 3º da Lei n° 4.591, de 16.12.1964 [“O
terreno em que se levantam a edificação ou o conjunto de edificações e suas
instalações, bem como as fundações, paredes externas, o teto, as áreas internas
de ventilação, e tudo o mais que sirva a qualquer dependência de uso comum dos
proprietários ou titulares de direito à aquisição de unidades ou ocupantes,
constituirão condomínio de todos, e serão insuscetíveis de divisão, ou de
alienação destacada da respectiva unidade. Serão, também, insuscetíveis de
utilização exclusiva por qualquer condômino”], é inadmissível o usucapião de
área comum do condomínio edilício.
Não obstante tal vedação, é entendimento pacífico da doutrina e já
consolidado nas decisões dos nossos Tribunais, que há a possibilidade de um
condômino utilizar, exclusivamente, da área comum, alterando a destinação legal
conferida a essa. Nesse mesmo sentido dispõe o enunciado n° 247, aprovado
pela III Jornada de Direito Civil do Superior Tribunal de Justiça – STJ: “Art.
1.331 do Código Civil – No condomínio edilício é possível a utilização
exclusiva de área ‘comum’ que, pelas próprias características da edificação, não
se preste ao ‘uso comum’ dos demais condôminos”.
Por sinal, CARLOS ALBERTO DABUS MALUF e MÁRCIO
ANTERO MOTTA RAMOS MARQUES sustentam que “a jurisprudência tem
entendido que o uso de propriedade comum exclusivamente por alguns
condôminos, por longo espaço de tempo, sendo eles os únicos com acesso ao
local, e com autorização assemblar, caracteriza essa área como propriedade
comum de uso exclusiva”.[370] No entanto, não se pode perder de vista que, para
tal situação, é necessária a anuência de todos os condôminos, sendo esta obtida
em assembleia-geral extraordinária e, devidamente formalizada na convenção de
condomínio, que deve ser registrada no Cartório de Registro Geral de Imóveis.
Ainda, em virtude do uso restrito da área comum, o condômino deve arcar com
as despesas correspondentes para manter essa unidade coletiva e ainda agregada
ao condomínio edilício.
A necessidade de obter a concordância dos condôminos e o registro da
respectiva alteração no Cartório de Registro Geral de Imóveis, sob o aspecto
formal da questão, justifica-se em vista de que, pelo transcurso do tempo e o
dinamismo das relações condominiais, ao depois, pode não ser mais da vontade
dos demais condôminos a permanência dessa situação, pretendendo, após perder
o interesse em que a área comum seja exclusivamente apenas de um morador,
reaver o uso da área comum por ele utilizada com exclusividade. Nesse caso,
mesmo existindo a copropriedade sobre as partes comuns, decisões do Superior
Tribunal de Justiça – STJ, apresentam-se favoráveis a manter a respectiva área,
sob os cuidados do titular da propriedade habitacional, considerando que falta
motivação relevante por parte do condomínio para a retomada da parte comum, a
ausência de utilidade da área para o funcionamento do prédio, bem como a
legítima confiança depositada pelo condômino, na estabilidade da situação.

“PROCESSUAL. CIVIL. CONDOMÍNIO. ÁREA COMUM.
UTILIZAÇÃO EXCLUSIVA. USO PROLONGADO.
AUTORIZAÇÃO DA ASSEMBLEIA CONDOMINIAL.
PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. RAZÃO
PONDERÁVEL. INOCORRÊNCIA. - Detenção concedida pelo
condomínio para que determinado condômino anexe à respectiva
unidade, um fundo de corredor inútil para uso coletivo.
Decorrido longo tempo e constatada a boa-fé, o condomínio, sem
demonstrar fato novo, não pode retomar a área objeto da
permissão”.[371]

“CIVIL. CONDOMÍNIO. É POSSÍVEL A UTILIZAÇÃO,
PELOS CONDÔMINOS, EM CARÁTER EXCLUSIVO, DE
PARTE DE ÁREA COMUM, QUANDO AUTORIZADOS POR
ASSEMBLEIA GERAL, NOS TERMOS DO ART. 9º, § 2º, DA
LEI Nº 4.591/64. A DECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM,
BASEADA NO CONJUNTO PROBATÓRIO, NÃO PODE SER
REEXAMINADA, EM FACE DA SÚMULA 7/STJ. 1. O
Tribunal ‘a quo’ decidiu a questão com base nas provas dos
autos, por isso a análise do recurso foge à mera interpretação da
Lei de Condomínios, eis que a circunstância fática influi na
solução do litígio. Incidência da Súmula 07/STJ. 2. O alcance da
regra do art. 3º, da Lei nº 4.591/64, que em sua parte final dispõe
que as áreas de uso comum são insuscetíveis de utilização
exclusiva por qualquer condômino, esbarra na determinação da
própria lei de que a convenção de condomínio deve estabelecer o
‘modo de usar as coisas e serviços comuns’, art. 3º, § 3º, ‘c’, da
mencionada Lei. Obedecido o quorum prescrito no art. 9º, § 2º da
Lei de Condomínio, não há falar em nulidade da convenção. 3.
Consoante precedentes desta Casa: ‘o princípio da boa-fé
objetiva tempera a regra do art. 3º da Lei nº 4.591/64’ e
recomenda a manutenção das situações consolidadas há vários
anos.(Resp' nº.s 214680/SP e 356.821/RJ, dentre outros). Recurso
especial não conhecido”.[372]

“PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. RECURSO ESPECIAL.
PREQUESTIONAMENTO. CONDOMÍNIO. ÁREA COMUM.
UTILIZAÇÃO. EXCLUSIVIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS
CONCRETAS. USO PROLONGADO. AUTORIZAÇÃO DOS
CONDÔMINOS. CONDIÇÕES FÍSICAS DE ACESSO.
EXPECTATIVA DOS PROPRIETÁRIOS. PRINCÍPIO DA
BOA-FÉ OBJETIVA. - O Recurso Especial carece de
prequestionamento quando a questão federal suscitada não foi
debatida no acórdão recorrido. - Diante das circunstâncias
concretas dos autos, nos quais os proprietários de duas unidades
condominiais fazem uso exclusivo de área de propriedade
comum, que há mais de 30 anos só eram utilizadas pelos
moradores das referidas unidades, pois eram os únicos com
acesso ao local, e estavam autorizados por Assembleia
condominial, tal situação deve ser mantida, por aplicação do
princípio da boa-fé objetiva”.[373]

Acrescenta-se que em tais casos, a jurisprudência também vem
entendendo que se o condômino utiliza exclusivamente a área comum por longo
tempo sem pagar nada ao condomínio, é considerado que este condômino tem
direito adquirido também em relação ao não pagamento da taxa de condomínio
referente à área comum utilizada exclusivamente por ele. Inclusive, é muito
comum ocorrer tais situações. As pessoas fazem um acordo, mas os anos
passam, os condôminos mudam, e os que chegam têm interesses diferentes. Tais
situações são mais comuns em prédios antigos que, ou não tem convenção, ou
têm convenções ultrapassadas, omissas sobre a utilização exclusiva de área
comum.
No entanto, o direito adquirido de não pagar taxa de condomínio sobre a
área comum de utilização exclusiva, não elide a obrigação de arcar com as
despesas relacionadas à ela. Com efeito, mesmo o fato de existir ressalva
[“disposição contrária da escritura de constituição do condomínio”] à regra geral
no sentido de que o terraço de cobertura é parte comum (por exemplo, o morador
da cobertura se utilizar dessa área com exclusividade se assim constar da
constituição do condomínio ou na convenção condominial).Porém,o Código
Civil de 2002, em seus artigos 1.340 e 1.341 autorizam o uso da área em comum
com exclusividade por um dos condôminos, obedecendo-se a alguns critérios: 1)
as despesas relativas a partes comuns de uso exclusivo de um condômino, ou de
alguns deles, incumbem a quem delas se serve (art. 1.340 do Código Civil de
2002). Vale lembrar que quanto a necessidade do condômino beneficiado com o
uso exclusivo da área arcar com sua despesa, o art. 1.340 do Código Civil de
2002 não tem correspondente no Código Civil de 1916 nem na Lei n° 4.591, de
16.12.1964. Este dispositivo legal consagra o entendimento sedimentado dos
tribunais sobre a matéria, com base na teoria que veda o enriquecimento sem
causa. O que visa tal preceito é evitar o enriquecimento sem causa, hoje
positivado como cláusula geral no art. 884 do Código Civil de 2002, do
condômino ou grupo de condômino em proveito dos quais reverte o proveito
exclusivo de certas despesas, pagas, porém, pela totalidade dos comunheiros;[374]
2) ao proprietário do terraço de cobertura incumbem as despesas da sua
conservação, de modo que não haja danos às unidades imobiliárias inferiores
(art. 1.344 do Código Civil de 2002). O art. 1.344 do Código Civil de 2002
também não tem correspondente no Código Civil de 1916 nem na Lei n° 4.591,
de 16.12.1964. O terraço de cobertura pode ser área comum ou privativa de uma
unidade autônoma. Caso seja comum, pode ser de uso privativo ou não da
unidade do último piso, consoante disposto na instituição de condomínio ou
deliberação unânime da assembleia. A regra, portanto, deve se lida do seguinte
modo: a manutenção e a conservação do terraço de cobertura incumbem ao
condômino quanto integrar a propriedade exclusiva da unidade autônoma ou,
ainda que de propriedade comum, for de uso exclusivo de um condômino, que
dele se serve. Por exclusão, terraços, lajes, e telhados de propriedade e uso
comum devem ser mantidos e conservados pelo condomínio. Prescreve o atual
Código Civil que a conservação deve ser feita de molde a não causar dano aos
demais condôminos. A responsabilidade, como ocorre no direito de vizinhança, é
objetiva e alcança tanto vazamentos como quedas e calhas, reboco e outros
objetos. Cabe aos condôminos prejudicados, ou sob risco, tanto ação de dano
infecto como indenizatórias, ou de execução de fazer ou não fazer, com tutela
específica, além de pedido cominatório.[375]
Além disso, CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON
ROSENVALD não se restringe aos limites das decisões Superior Tribunal de
Justiça – STJ. Com efeito, eles advogam a possibilidade de aquisição da área
comum, quando em assembleia-geral extraordinária, todos os condôminos
votarem e decidirem pela venda da área: “Mas, se a cobertura tiver sido
convencionada como área comum, poderá haver deliberação unânime dos
moradores em assembleia extraordinária no sentindo de conversão em área
particular a ser utilizada pelo morador do andar superior. Mais além, é possível
que um dos condôminos possa adquirir a área comum dos demais, com
alterações das frações ideais do imóvel, registrada no RGI”.[376]
Sendo assim, a convenção de condomínio edilício constitui instrumento
fundamental para definir a utilização exclusiva de áreas comuns, pois ela
vincula e obriga a todos ao cumprimento das normas impostas ao convívio social
e, ainda, fixa a destinação e utilização de tais espaços coletivos. Por tal razão,
não basta, para o uso e alienação, a permissão obtida em assembleia-geral de
condôminos, sendo essencial tal anuência estar prevista na convenção de
condomínio edilício e devidamente registrada, para valer contra terceiros,
demais condôminos e seus respectivos sucessores.


3.10.2 Limitações à utililização de área comum


Fora esta questão de utilização exclusiva de área comum por algum
condômino em especial, a regra geral é aquela contida no caput do art. 19 da Lei
n° 4.591, de 16.12.1964 [“Cada condômino tem o direito de usar e fruir, com
exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e
interêsses, condicionados, umas e outros às normas de boa vizinhança, e poderá
usar as partes e coisas comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos
demais condôminos ou moradores, nem obstáculo ou embaraço ao bom uso das
mesmas partes por todos”] e no §2° [solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede
geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e
refrigeração centrais, e as demais partes comuns, inclusive o acesso ao
logradouro público, são utilizados em comum pelos condôminos, não podendo
ser alienados separadamente, ou divididos], no §4° [“Nenhuma unidade
imobiliária pode ser privada do acesso ao logradouro público”] e no §5° [“O
terraço de cobertura é parte comum, salvo disposição contrária da escritura de
constituição do condomínio”], todos do art. 1.331 do Código Civil de 2002.
As limitações contidas no art. 19 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, e no
art. 1.331 do Código Civil de 2002, não se trata de limitação ao uso da unidade
autônoma e sim, da área comum, tais como corredores, elevadores, etc. A
posição da jurisprudência é ser possível, perfeitamente, estabelecer limites ao
uso de área comum, na medida em que se está protegendo o interesse coletivo
(comunidade de condôminos) e não de fazer prevalecer o interesse individual.
Ademais, aplicam-se ao ocupante do imóvel, a qualquer título (locatários,
usufrutuários, etc.), todas as obrigações referentes ao uso, fruição e destino da
unidade (art. 20 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964).[377]
O respeito ao direito de todos de utilizar as áreas de uso comum do
condomínio constitui, certamente, a grande maioria dos problemas verificados
nos condomínios edilícios. O uso indevido das áreas de uso comum ganha
destaque em qualquer análise que se faça a respeito do tema “condomínio
edilício”. Ao tentarmos enumerar o uso correto das áreas comuns, vem logo à
tona algumas observações: 1) uso da garagem: o número de vagas na garagem
do condomínio geralmente é dividido igualmente entre os seus condôminos, seja
discriminada ou indiscriminadamente. Os moradores do prédio devem entender
que, mesmo que existam alguns condôminos que não possuem automóveis, eles
têm direito a sua respectiva vaga (numerada ou não). O bom convívio
recomenda que não se deve ocupar desautorizadamente vaga que não lhe
pertence; 2) uso do salão de festas: geralmente os condomínios possuem salão
de festa pelo fato de os apartamentos não comportarem muitas pessoas em vista
do seu limitado tamanho. Este é beneficio que facilita a vida de todos os
condôminos, então nada mais correto do que zelar pelo cuidado do local. Cada
condômino deve se responsabilizar pelo comportamento de seus convidados e de
entregar o salão de festa da mesma forma a qual recebeu, sem nenhuma parte
danificada ou faltando alguns utensílios; 3) uso do playground e da área de
lazer: estas partes garantem aos moradores do prédio (principalmente aos mais
jovens) momentos de diversão e lazer. Cuidados como higiene, preservação e
manutenção dos equipamentos destes locais também são de responsabilidade de
todos os condôminos que os utilizam; 4) as áreas de uso em comum não são
aquelas que não pertencem a ninguém e sim aquelas que pertencem a todos os
condôminos. Estas áreas são verdadeiras extensões das unidades autônomas dos
condôminos, então nada mais correto do que preservá-las e fazer o uso da melhor
maneira possível.
Entre as irregularidades praticadas nas áreas comuns dos condomínios
edilícios, podem ser citados os seguintes casos: 1) em conjuntos de casas
geminadas, onde há áreas de circulação amplas e áreas livres localizadas nos
extremos do terreno, o coproprietário de uma unidade, às vezes, cerca parte
dessa área limítrofe, ignorando que ela pertence a todos os vizinhos; 2) da
mesma forma, num edifício, o dono de uma unidade autônoma viola a legislação
em vigor ao isolar com grade ou parede parte do corredor, do vão da laje ou área
do edifício, o que pode gerar, além de outros inconvenientes, a redução da
ventilação e da luminosidade para as unidades autônomas vizinhas; 3) há
também aquele condômino que coloca diversos vasos de plantas no corredor ou
na garagem, sendo que esta se destina obviamente à guarda de veículos e não à
floricultura, sendo obrigação legal deixar essas áreas comuns livres para
circulação de todos. Outras irregularidades são frequentes, sendo impossível
enumerar todas elas.
Seja como for, há normas legais para irregularidades praticadas nas áreas
comuns dos condomínios edilícios, dentre elas o art. 19 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964, que enumera os deveres dos condôminos e art. 1.336 do Código
Civil de 2002, com as alterações determinadas pela Lei n° 10.931, de 2004, que
os reproduz: I- contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas
frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção; II- não realizar obras
que comprometam a segurança da edificação; III- não alterar a forma e a cor da
fachada, das partes e esquadrias externas; IV- dar às suas partes a mesma
destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao
sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.


3.10.3 Penalidades pela irregularidade na utililização de área comum


Vale alertar para o fato de, mesmo que a convenção do condomínio seja
silente sobre as sanções por irregularidades praticadas no uso das áreas comuns
dos condomínios edilícios, na forma do art. 21 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,
[378]
do §2º do art. 1.336 [“O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres
estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou
na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas
contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem;
não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por dois terços no
mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa”] e do
art. 1337,[379] ambos do Código Civil de 2002, é possível aplicar ao condômino
infrator que descumprir seus deveres, multa prevista no ato constitutivo ou na
convenção condminial, não podendo ela ser superior a 5 (cinco) vezes o valor de
suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se
apurarem.
Não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por 2/3
(dois terços) no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da
multa (§2º, in fine, do art. 1.336 do Código Civil de 2002).
Entretanto, vale destacar que o Supremo Tribunal Federal – STF
entende que se aplica o devido processo legal nas relações privadas, ou seja, só
pode ser multado o condômino se for respeitado o princípio contraditório e da
ampla defesa.

“SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO
BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO
SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO
CONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO
DESPROVIDO. I. EFICÁCIA DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações
a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das
relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações
travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado.
Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição
vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando
direcionados também à proteção dos particulares em face dos
poderes privados. II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
COMO LIMITES À AUTONOMIA PRIVADA DAS
ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-constitucional brasileira não
conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à
revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos
postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da
Constituição da República, notadamente em tema de proteção às
liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomia
privada garantido pela Constituição às associações não está
imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram
o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A
autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem
jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito
aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles
positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade
não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e
atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas
e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força
normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de
suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. III.
SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. ENTIDADE
QUE INTEGRA ESPAÇO PÚBLICO, AINDA QUE NÃO-
ESTATAL. ATIVIDADE DE CARÁTER PÚBLICO.
EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DO DEVIDO
PROCESSO LEGAL. APLICAÇÃO DIRETA DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS À AMPLA DEFESA E AO
CONTRADITÓRIO. As associações privadas que exercem
função predominante em determinado âmbito econômico e/ou
social, mantendo seus associados em relações de dependência
econômica e/ou social, integram o que se pode denominar de
espaço público, ainda que não-estatal. A União Brasileira de
Compositores - UBC, sociedade civil sem fins lucrativos, integra
a estrutura do ECAD e, portanto, assume posição privilegiada
para determinar a extensão do gozo e fruição dos direitos autorais
de seus associados. A exclusão de sócio do quadro social da
UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do contraditório,
ou do devido processo constitucional, onera consideravelmente o
recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber os direitos
autorais relativos à execução de suas obras. A vedação das
garantias constitucionais do devido processo legal acaba por
restringir a própria liberdade de exercício profissional do sócio.
O caráter público da atividade exercida pela sociedade e a
dependência do vínculo associativo para o exercício profissional
de seus sócios legitimam, no caso concreto, a aplicação direta dos
direitos fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao
contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, CF/88). IV.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO”.[380]


3.11 ADMINISTRAÇÃO DO CONDOMÍNIO
EDILÍCIO


3.11.1 A escolha do síndico


A administração do condomínio edilício é legalmente exercida pelo
síndico ou administrador, no cumprimento dos poderes de representação e das
funções administrativas (gestão condominial), observando e fazendo observar a
convenção condominial, mas pode ser auxiliado por um Conselho Consultivo ou
Conselho Fiscal (os seus membros devem ser sempre condôminos), o qual deve
funciona como colegiado de consulta do síndico ou administrador e fiscalização,
para assessorá-lo na solução dos problemas que digam respeito ao condomínio,
podendo a convenção do condomínio definir suas atribuições específicas (art. 22
da da Lei n° 4.591, de 16.12.1964).[381]
O síndico ou administrador é escolhido pela assembleia-geral de
condôminos, para administrar o condomínio, por prazo não superior a 2 (dois)
anos, prazo este que pode ser renovado (art. 1.341 do Código Civil de 2002,[382] e
art. 22 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964),[383] porém a convenção pode impedir a
reeleição por mais de um encargo. Com efeito, não é adequada a perpetuidade no
cargo, mas a lei não proíbe inflexivelmente reeleições. Em assim sendo, ambos,
síndico e subsíndico (escolha facvultativa), são eleitos pela assembleia-geral de
condôminos por período de 2 (dois) anos, podendo ambos serem reeleitos.
Porém a convenção condominial pode estipular que o síndico ou administrador
seja, preferencialmente (e assim a experiência recomenda), morador do edifício,
proprietário ou não. De maneira que, o síndico ou administrador, com presença
e envolvimento constante na vida condominial, realiza o papel mais importante
do condomínio, não só porque concebe ativa e passivamente em juízo, mas
também porque cumpre as funções executivas de administrador, pertencendo ao
sindico o encargo de amparar direitos e interesses comuns dos condôminos
A eleição do síndico ou administrador é regulada pela convenção de
condomínio. A forma mais usual de escolha, na assmbléia-geral de condomínios
para tanto convocada, é aquela feita através de votação, com a presença de, pelo
menos, 2/3 (dois terços) das frações ideais do terreno (§ 5º do art. 22 da da Lei n
° 4.591, de 16.12.1964), evitando-se o critério da maioria simples (50%), como
geralmente consta das convenções condominiais. Mas, sem dúvida, em segunda
convocação, admite-se qualquer número de condôminos votantes, valendo as
decisões aprovadas pela maioria de presentes.[384]
No entanto, o caput do art. 1.352 do Código Civil de 2002,[385]
reformulando as regras da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, exige a maioria
representativa da metade das frações ideais (50%), a menos que diferentemente
venha ser estabelecido na convenção condominial. Além disso, nunca é demais
lembrar que, conforme previstono parágrafo único do art. 1.352 do Código Civil
de 2002, os votos devem ser proporcionais às frações ideais no solo e nas outras
partes comunspertencentes ao condomínio, salvo disposição diversa da
convenção de constituição do condomínio. Em segunda convocação, outrossim,
conforme estabelece o art. 1.353 do Código Civil de 2002,[386] a assembleia-
geral de condôminos pode deliberar por maioria dos votos dos presentes, salvo
quando exigido pela convenção condominial quorum especial. No entanto, não
se pode perder de vista que a assembleia-geral de condôminos não pode
deliberar se todos os condôminos não forem convocados para a reunião (art.
1.354 do Código Civil de 2002).[387]
Por outro lado síndico ou administrador pode não ser condômino ou
proprietário das unidades autônomas (pessoa física ou jurídica); pode ser tereiro
estranho ao quadro de condôminos (pessoa física ou jurídica). A partir dessa
aprovação da assembleia-geral de condôminos, passa o síndico ou administrador
a ser órgão executor de suas deliberações. Além disso, ele é o representente legal
dos condôminos, dos quais é considerado mandatário. Inclusive, o inciso XI do
art. 75 do Código de Processo Civil de 2015 é claríssimo: “Serão representados
em juízo, ativa e passivamente (...) o condomínio, pelo administrador ou
síndico”.[388]


3.11.2 As atribuições do síndico


O art. 1.348 do Código Civil de 2002,[389] e o art. 22 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964, tratam da competência do síndico ou administrador. As principais
atribuições dele são as seguintes: 1) representar ativa e passivamente, o
condomínio, em juízo ou fora dele, e praticar os atos de defesa dos interesses
comuns, nos limites das atribuições conferidas pela Lei n° 4.591, de 16.12.1964,
pelo Código Civil de 2002, ou pela convenção do condomínio (alínea a do art.
22 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, e inciso II do art. 1.348 do Código Civil de
2002); 2) exercer a administração interna da edificação ou do conjunto de
edificações, no que respeita à sua vigência, moralidade e segurança, bem como
diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns (patrimônio
condominial) e zelar pela prestação dos serviços que interessem a todos os
possuidores e moradores (alínea b do art. 22 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964 e
inciso V do art. 1.348 do Código Civil de 2002); 3) praticar os atos que lhe
atribuírem as leis, a convenção do condomínio e o Regulamento Interno ou
Regimento Interno (alínea c do art. 22 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964); 4) impor
as multas estabelecidas na lei, na convenção do condomínio ou no Regulamento
Interno ou Regimento Interno (alínea d do art. 22 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964); 5) cumprir e fazer cumprir a convenção do condomínio e o
Regulamento Interno ou Regimento Interno, bem como executar e fazer executar
as deliberações da assembleia-geral de condôminos (alínea e do art. 22 da Lei n°
4.591, de 16.12.1964); 6) prestar contas à assembleia-geral de condôminos,
anualmente e quando exigidas (alínea f do art. 22 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,
e inciso VIII do art. 1.348 do Código Civil de 2002); 7) manter em dia a
escrituração contábil do condomínio, rubricada por 2 (dois) ou mais condôminos
designados pela assembleia-geral de condôminos; 8) manter guardada durante o
prazo de 5 (cinco) anos para eventuais necessidade de verificação contábil, toda
a documentação relativa ao condomínio (alínea gdo art. 22 da Lei n° 4.591, de
16.12.1964); 9) convocar a assembleia-geral de condôminos (inciso I do art.
1.348 do Código Civil de 2002); 10) dar imediato conhecimento à assembleia-
geral de condôminos da existência de procedimento judicial ou administrativo,
de interesse do condomínio (inciso III do art. 1.348 do Código Civil de 2002);
11) elaborar o orçamento da receita e da despesa relativa a cada ano (inciso VI
do art. 1.348 do Código Civil de 2002); 12) cobrar dos condôminos as suas
contribuições, bem como cobrar as multas devidas pela sua imposição conforme
lei, na convenção do condomínio ou no Regulamento Interno ou Regimento
Interno, e promover a competente ação executiva ou ação de cobrança, conforme
o caso (inciso VII do art. 1.348 do Código Civil de 2002); 13) realizar o seguro
da edificação (inciso IX do art. 1.348 do Código Civil de 2002); 14) com
autorização judicial, mandar desmanchar, à custa do transgressor, se este não a
desfizer no prazo que lhe for estipulado, as obras irregulares feitas pelo
condôminos que: a) alterarem a forma externa da fachada; b) decorarem as
partes e esquadriais externas com tonalidades ou cores diversas das empregadas
no conjunto da edificação; c) destinarem a unidade autônoma a utilização
diversa de finalidade do prédio, ou usá-la de forma nociva ou perigosa ao
sossêgo, à salubridade e à segurança dos demais condôminos; d) embaraçarem o
uso das partes comuns (§1° do art. 10 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964);[390] 15)
executar ou contratar a execução de obras que interessarem à estrutura integral
da edificação ou conjunto de edificações e dos serviços comuns aprovados pela
assembleia-geral de condôminos (§4° do art. 12 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,
e caput do do art. 1.341 do Código Civil de 2002);[391] 16) admitir e demitir
empregados do condomínio, cumprindo as obrigações trabalhistas e outros
encargos legais; 17) ordenar a realização de obras necessária e urgentes,
especialmente as relativas a vazamento nos canos de água e esgoto, defeitos
elétricos, instalações hidráulicas e sanitárias, até o limite do valor permitido na
convenção do condomínio (§1° do art. 1.341 do Código Civil de 2002); 18) dar
ciência à assembleia-geral de condôminos, que deverá ser imediatamente
convocada, das obras ou reparos necessários e urgentes que importaram em
despesas excessivas (§2° do art. 1.341 do Código Civil de 2002).

“CIVIL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE
INDÉBITO. CONDOMINÍO. DESPESAS. PRÓ-LABORE. EX-
SÍNDICO. ÔNUS DA PROVA. HONORÁRIOS DE
ADVOGADO. Ação de repetição de indébito cumulada com
indenizatória fundada na má gestão do síndico porque recebia
pró-labore contra expressa previsão da convenção, apesar de
aprovado em assembleias ordinárias, e fez despesas com obras
sem prévia autorização da assembleia condominial. Embora
decretada por sentença transitada em julgado proferida em outra
lide, a nulidade das assembleias que deliberaram o pagamento do
pró-labore ao Réu, na verdade não ostentavam vício formal, por
isso caracterizam atos anuláveis, cujos efeitos se produzem
somente para depois da decisão judicial. Incontroverso que o Réu
celebrou contratos de serviços diversos, todos relativos a obras
necessárias, sem autorização prévia da assembleia. No entanto,
somente responderia pelos danos se comprovada a alegada má
gestão da receita, seja pelo valor pago, seja pela incapacidade do
prestador do serviço. O Autor em momento algum fez prova do
dano, o que era seu ônus. Além disso, tendo em vista que os
serviços foram efetivamente prestados, a restituição dos valores
importaria em enriquecimento sem causa. Ausente o dano moral,
pois o ilícito cometido pelo Réu (contratar obras sem autorização
da assembleia) não provoca lesão de ordem extrapatrimonial.
Honorários de advogado corretamente arbitrados na sentença.
Recursos desprovidos”.[392]

Portanto, o síndico ou administrador é quem admite, pune, demite e fixa
a remuneração dos empregados do condomínio, mas dentro das verbas
orçamentárias aprovadas em assembleia-geral de condôminos. O síndico
também escolhe a Administradora de Condomínios (quando for o caso) e indica
a Companhia Seguradora, mas sempre com ad referendum da assembleia-geral
de condôminos. O síndico ou administrador é quem determina os reparos, obras
urgentes, mas também dentro das verbas orçamentárias ou, então, até o limite
fixado à sua disposição. Excedido este, deve recorrer ao Conselho
Consultivo/Conselho Fiscal, ou à assembleia-geral de condôminos, segundo o
vulto a ser proposto. Conforme costuma-se dizer, o síndico é a chave de uma boa
ou má administração e responsável pela segurança, moralidade, respeito,
disciplina e patrimônio, e os artigos deste capítulo da convenção devem ser
minuciosos neste sentido. Também tem ele que aguardar no posto a passagem do
cargo e transmiti-lo ao seu sucessor, de maneira que não haja interrupção na
gestão do condomínio. No entanto, o síndico não é responsável, pessoalmente,
pelas obrigações contraídas em nome do condomínio, desde que tenha agido no
exercício regular de suas atribuições; porém responde pelo excesso de
representação e pelos prejuízos a que der causa por dolo ou omissão. Por tudo
isto, é oportuno alertamos para o fato que os condôminos presentes na
assembleia-geral de condôminos devem escolher com cuidado o síndico ou
administrador, quanto às suas qualidades de administrador, o qual deve
conhecer, especialmente, contabilidade e as Leis do Trabalho e as Leis da
Previdência Social.
Enfim, tal como escreve ADOLPHO SHERMANN, o candidato a
assembleia-geral de condôminos deve ser pessoa sadia, séria, enérgica, não
importando o seu sexo, Como é óbvio, nada de rodízios ou sorteios para escolha
do síndico. Este deve impor o respeito, e não ser ditador. Ele é acima de tudo um
sacrificado. Não deve ser confundido com um empregado (no caso de ser
também condômino). Se não houver outra solução o cargo deve ser entregue a
uma administradora ou a um especialista (morador ou não). Locatário e firmas
podem exercer essa função, tal a dificuldade em encontrar quem queira ser
síndico, mesmo bem remunerado.[393]
Outrossim, o §2° do art. 1.348 do Código Civil de 2002 autoriza o
síndico ou administrador a transferir a outrem (pessoa física ou jurídica,
estranha ao condomínio), total ou parcialmente, os poderes de representação ou
as funções administrativas, mediante aprovação da assembleia-geral de
condôminos, salvo disposição em contrário da convenção do condomínio. Ou
seja, não podendo o síndico ou administrador dedicar-se, direta e absolutamente,
à gestão do condomínio, pode ele delegar suas funções as empresas
especializadas, que lhe fará às vezes, sempre sob sua responsabilidade. Na
pratica, não é difícil testemunhar que a maioria dos prédios é dirigida por
empresas especializadas, que são organizadas para realizar o imprescindível, não
raro a árdua atribuição de receber dezenas e dezenas de condôminos, elaborar
orçamentos, provir à concorrência para fornecimentos e obras, etc. No entanto, a
assembleia-geral de condôminos, especialmente convocada para o fim de
aprovar a transferência, total ou parcialmente, dos poderes de representação ou
das funções administrativas, pode, por voto da maioria absoluta de seus
membros, destituir o síndico que praticar irregularidades, não prestar contas, ou
não administrar convenientemente o condomínio (art. 1.349 do Código Civil de
2002).[394]

“CIVIL E PROCESSO CIVIL. CONDOMÍNIO EDILÍCIO.
DESTITUIÇÃO DE SÍNDICO. QUÓRUM DE VOTAÇÃO EM
ASSEMBLEIA EXTRAORDINÁRIA. NULIDADE.
RECONDUÇÃO AO CARGO. RECEBIMENTO DE PRÓ-
LABORE. REGULARIDADE. DANOS MATERIAIS.
RECONVENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Prevendo a
convenção condominial, regra máxima entre os condôminos, o
quórum mínimo necessário para a aprovação da destituição do
síndico, em conformidade com a legislação civil sobre o tema, tal
regra deve ser observada, sob pena de nulidade da deliberação. 2.
Levando-se em consideração o fato de que a lei não contém
expressões inúteis, a maioria absoluta de que trata o artigo 1.349
do Código Civil não pode ser interpretada de forma a contrariar o
seu sentido técnico-jurídico, a fim de que seja considerada válida
votação obtida por maioria simples. 3. Reconhecida a nulidade da
votação que destituiu o autor do cargo de síndico e tendo este se
mantido na administração do condomínio durante esse período,
não é cabível a restituição do pró-labore respectivo. 4. Aapuração
de eventuais irregularidades na gestão do síndico e a consequente
reparação de danos ser objeto de ação de prestação de contas. 5.
Recurso conhecido e provido”.[395]


3.11.3 Remuneração do síndico


Nos dias de hoje a função de síndico ou administrador de condomínio
exige certo profissionalismo dada a complexidade do exercício de tal atribuição:
o síndico precisa saber gerir uma equipe de profissionais, sejam eles próprios ou
terceirizados, contratar prestadores de serviços e ainda lidar com conflitos entre
moradores. Tudo isso muitas vezes com um caixa diminuto, sacrificado pela alta
inadimplência, tão comum nos condomínios da atualidade. Tanto trabalho chega,
em alguns casos, a não ser remunerado: alguns síndicos contam com a isenção
da sua cota condominial (remuneração in natura); outros, nem isso (prestação de
serviços comunitários gratuitos). Investem tempo e energia em prol da
comunidade de condôminos sem receberem qualquer tipo de remuneração
(prestação de serviços comunitários gratuitos).
As remunerações dos síndicos ou administradores de condomínio
edilício (remuneração in pecunia) vão de 1 (um) a vários salários-mínimos ou
isenção do pagamento da quota de condomínio, mas nunca deve ser incluída
nessa remuneração a isenção de quota extra. Conta-se que uma síndica, no cargo
a 14 (quatorze) anos, administrando um condomínio com 7 (sete) torres, com
728 (setecentos e vinte e oito) apartamentos, com mais de 70 (setenta)
empregados, com cerca de 3.000 (três mil) moradores e com área de 44.000
(quarenta e quatro mil) metros quadrados, paga a cota condominial da sua
unidade autônoma, mas recebe remuneração de 12 (doze) salários mínimos. Na
realidade, valor da remuneração era de 2 (dois) salários mínimos e foi reajustado
numa assembleia-geral de condôminos. Tal remuneração consta da convenção
do condomínio, mas o valor foi alterado em assembleia-geral de condôminos, há
cerca de 10 (dez) anos. Conforme o desempenho do síndico, a assembleia-geral
de condôminos pode novamente modificar esse valor. Nesse caso síndico ou
administrador não é empregado do condomínio, mas fica o dia todo à disposição
do referido condomínio, sem ter vínculo empregatício, nem benefícios tais como
férias ou 13° salário. O que o síndico ou administrador recebe é pró-labore para
representar o condomínio. Ademais, a estrutura administrativa do mencionado
condomínio conta com um subsíndico por torre, os quais recebem a isenção da
cota de condomínio (apenas das despesas ordinárias). Já os conselheiros não
podem ser remunerados.[396]

“PRÓ-LABORE. REDUÇÃO DO VALOR DA
REMUNERAÇÃO NO CURSO DO MANDATO, EM
DESACORDO COM O DISPOSTO NA CONVENÇÃO DO
CONDOMÍNIO. INVALIDADE. PAGAMENTO DA
DIFERENÇA A TÍTULO DE PRÓ-LABORE DEVIDA.
RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA
CONFIRMADA. 1. Apresentam-se sem validade as deliberações
tomadas contrariamente às disposições da convenção do
condomínio. 2. Nos termos do parágrafo único do art. 28 da
convenção do condomínio em análise, a remuneração do síndico
geral e do síndico da quadra será fixada exclusivamente na
assembleia que o eleger (fl. 43). 3. Na hipótese, arguiu o
autor/recorrido a nulidade da deliberação tomada em assembleia
realizada em 09/05/2008, a qual reduziu o pró-labore do síndico
de R$1.000,00 para R$ 500,00, e pede a condenação do réu ao
pagamento da diferença de rendimentos resultante da indevida
minoração. Verifica-se que o autor foi eleito síndico em
assembleia geral extraordinária realizada em 03/05/2007, não
constando da ata o pró-labore para o período da gestão, pelo que
se deduz que não seria alterado o valor percebido pelo antigo
síndico. Não tendo o réu/recorrente produzido prova em
contrário, considera-se que o valor do pró-labore do síndico de
quadra, quando da eleição do autor, era R$ 1.000,00, nos termos
do documento de fl. 16. 4. Não aproveita ao réu/recorrente a
alegação de que a assembleia que instituiu o valor do pró-labore
em R$ 1.000,00, ocorrida em 2006 (fl.16), também se encontraria
eivada da mesma nulidade, posto que, o que se discute nos autos
é a vedação de alteração do pró-labore do síndico após a sua
eleição, constando da convenção condominial disposição
expressa no sentido de que a remuneração do síndico somente
poderá ser alterada ou instituída na mesma assembleia que dispor
sobre sua eleição. no mais, ainda que ocorrente irregularidade,
esta restou sanada porquanto ratificada na assembleia geral
extraordinaria realizada em 03/05/2007, a qual não dispos, nem
alterou a remuneração do síndico. 5. Portanto, configurada a
irregularidade na alteração dos rendimentos do autor, a título de
pró-labore, a procedência do pedido é medida que se impõe. 6.
Recurso conhecido e improvido. Sentença mantida por seus
próprios fundamentos, com súmula de julgamento servindo de
acórdão, na forma do art. 46, da Lei 9.099/95. Sem custas
adicionais e sem condenação em honorários advocatícios, em
razão da parte recorrida não ter oferecido contrarrazões”.[397]

Seja como for, o valor aprovado como remuneração do síndico ou
administrador deve, necessariamente, constar da convenção do condomínio. Não
apenas isto, o valor de tal remuneração deve ser objeto, necessariamente, de
deliberação da assembleia-geral de condôminos.

“DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO EDILÍCIO.
REMUNERAÇÃO DO SÍNDICO. PRO-LABORE.
PRESCRIÇÃO. OBRIGAÇÃO DE PAGAR. AUSÊNCIA DE
AUTORIZAÇÃO DA ASSEMBLEIA. 1- Prescrição.
Remuneração do síndico. A remuneração do síndico não se
encontra disciplinada em nenhuma das hipóteses de trata o art.
206 do Código Civil. Aplicável, pois, o prazo de prescrição
decenal, na forma do art. 205 do mesmo Código. Preliminar
suscitada pelo 1º Vogal que se afasta. 2- Remuneração do síndico.
Pro-labore. Ainda que haja previsão na Convenção de
Condomínio, a remuneração do síndico, a título pro labore, deve
ser objeto de deliberação da Assembleia de Condomínio,
conforme disposição convencional. Sem prova de que tenha
havido deliberação, a pretensão ao pagamento não tem
fundamento jurídico, mesmo porque a vedação ao trabalho
gratuito se restringe ao trabalho assalariado. Sentença que se
confirma pelos seus próprios fundamentos. 3- Recurso
conhecido, mas não provido”.[398]

“COBRANÇA. VÍCIO DE REPRESENTAÇÃO.
CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO.
RESSARCIMENTO DE VALORES DESEMBOLSADOS PELO
SÍNDICO PARA PAGAMENTO DE SERVIÇOS E PRODUTOS
QUE BENEFICIARAM O CONDOMÍNIO. PERÍCIA
CONTÁBIL. IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAR A
ORIGEM E AS CIRCUNSTÂNCIAS DAS DESPESAS. PRÓ-
LABORE DO SÍNDICO NÃO TRATADA EM CONVENÇÃO,
REGIMENTO INTERNO OU ATAS DE ASSEMBLEIAS.
HONORÁRIOS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Não merece
acolhida a preliminar suscitada de vício de representação se o
substabelecimento de procuração foi acostado aos autos no prazo
assinado pelo juiz singular. 2. O Código de Processo Civil não
confere ao julgador mera faculdade de rechaçar provas que
reputar inúteis, mas verdadeiro poder-dever, zelando pela
celeridade do processo. na espécie, prescindível a oitiva da
testemunha indicada, porquanto suficientes as provas documental
e pericial produzidas. 3. ‘A realização de obras no condomínio
depende de voto dos condôminos, sendo que as obras ou
reparações necessárias podem ser realizadas independentemente
de autorização, devendo, no último caso, o síndico ou o
condômino que tomou a iniciativa dar ciência à assembleia, que
deverá ser convocada imediatamente’ (CC, art. 1.341). 4. Se não
há documento nos autos que comprove a fixação do pró-labore
do síndico no período vindicado, imperioso o não acolhimento da
pretensão. 5. Tratando-se de ação com certa complexidade e o
tempo dispendioso para o causídico, no que diz respeito ao tempo
de trabalho e tramitação do feito, o arbitramento deve ficar na
média e nos termos do §3° do art. 20 do CPC, ou seja, em torno
de 10% (dez por cento) sobre o valor dado à causa. 6. Rejeitada a
preliminar. Recurso desprovido. Unânime”.[399]

Muitas vezes observa-se que a convenção do condomínio é omissa em
relação a tal tipo de remuneração para síndico proprietário ou morador ou nada
trata a respeito do assunto e a assembleia-geral de condôminos que elege o
síndico ou administrador pode determinar a remuneração; outras vezes, observa-
se que a convenção não permite expressamente remuneração para síndico
proprietário ou morador, caso em que não há como remunerá-lo, seja de forma
direta ou indiretamente. No entanto pode haver reembolso de despesas.
Entretanto, tais regras não se aplicam no caso de remuneração de síndico
contratado, ou seja, síndico profissional, pois prevalece o cumprimento da
obrigação contratual.

“AÇÃO ANULATÓRIA - CONDOMÍNIO - NULIDADE DA
SENTENÇA - AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO -
INOCORRÊNCIA - DEVOLUÇÃO DO PRÓ-LABORE -
SÍNDICO EM FÉRIAS - AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA
CONVENÇÃO - INOCORRÊNCIA DE DELIBERAÇÃO
SOBRE O ASSUNTO NA ASSEMBLEIA ORDINÁRIA QUE O
ELEGEU - SENTENÇA MANTIDA. 1) - Não há se falar em
nulidade da sentença por falta de fundamentação jurídica quando
a decisão se fundamenta na própria convenção de condomínio. 2)
- Dispondo a convenção do condomínio que a remuneração dos
administradores deve ser definida na assembleia que os eleger, as
matérias relativas ao assunto devem ser decididas no início da
gestão e não posteriormente. 3) - Carece de razoabilidade o
entendimento de que os condôminos podem determinar a
restituição de valores recebidos pelo síndico em época de férias
quando, antes do início de sua gestão, não havia disposição que o
proibisse de receber tais valores. 4) -Inviável a devolução de pró-
labore pelo síndico referente ao período que ele entrou de férias
quando não há disposição nesse sentido na assembleia geral
ordinária que amparou a sua eleição. 5) - Recurso conhecido e
não provido. Preliminar rejeitada”.[400]

“CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. PRÓ-LABORE. SÍNDICO.
ALEGAÇÃO DE A JUIZAMENTO DE AÇÃO DE
PRESTAÇÃO DE CONTAS PELO CONDOMÍNIO.
AUSÊNCIA DE PROVA DA EXISTÊNCIA DE FATO
IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO
DIREITO DO AUTOR. RECURSO CONHECIDO E
IMPROVIDO. 1. Confirma-se a sentença que julgou procedente
o pedido para condenar o condomínio a pagar ao síndico o valor
referente ao seu pró-labore, se o recorrente se limita apenas a
afirmar que a juizou ação de prestação de contas. 2. conforme a
expressa disposição do art. 333, do CPC, o ônus da prova
incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito, e ao
réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou
extintivo do direito do autor. 3. Recurso conhecido e improvido.
4. sentença mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos,
com súmula de julgamento servindo de acórdão, na forma do
artigo 46 da Lei nº 9.099/95. 5. Diante da sucumbência, nos
termos do artigo 55 da Lei dos Juizados Especiais (Lei nº
9.099/95), condeno o apelante ao pagamento das custas
processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez
por cento) sobre o valor corrigido da causa”.[401]

Verifica-se, ainda, convenções que permitem a remuneração ao síndico
ou administrador, porém restringem esse valor (nestes casos há restrição do
valor e a assembleia-geral de condôminos não pode alterá-lo, salvo na
contratação de síndico profissional); também há outros casos em que
asconvenções não restringem (cabe então à assembleia-geral de condôminos que
escolhe o síndico ou administrador definir o valor e forma de pagamento).[402]

“AÇÃO ORDINÁRIA - CONDOMÍNIO - SÍNDICO - PRÓ-
LABORE - RETIRADA INDEVIDA. I- Nos termos da
convenção do condomínio, cabe à assembleia geral extraordinária
eleger o administrador ou síndico, fixando o pró-labore. II-
Qualquer retirada acima do autorizado, mesmo que aprovada
pelo conselho fiscal, deve ser devolvida. III- Recurso conhecido
e não provido. Decisão unânime”.[403]

Daí podemos dizer que existem 3 (três) formas distintas de remuneração
do síndico ou administrador, a sabr: 1) remuneração direta (remuneração in
pecunia): remuneração por meio do pagamento de determinado valor
diretamente ao síndico ou administrador; 2) remuneração indireta (remuneração
in natura): remuneração por meio de isenção da sua cota condominial, ou seja, a
unidade autônoma do síndico ou administrador fica isenta do pagamento da
contribuição condominial ordinária; e 3) remuneração mista (remuneração
diversificada): tal tipo de remuneração se caracteriza quando, além da isenção da
sua cota condominial (remuneração in natura), é feito pagamento de parte da
remuneração em espécie (remuneração in pecúnia). Seja qual for a modalidade
utilizada para remunerar o síndico ou administrador, ela deve estar devidamente
especificada na convenção do condomínio ou aprovada por assembleia-geral de
condôminos (inciso II do art. 1334 do Código Civil. de 2002).[404]

“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO.
AÇÃO DE COBRANÇA. CONDOMÍNIO. SÍNDICO. PRÓ-
LABORE. TAXAS. ATRASADOS. CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA. EXISTÊNCIA DE CRÉDITOS/DÉBITOS
RECÍPROCOS. COMPENSAÇÃO. Se credor e devedor em um
processo são, inversamente, ao mesmo tempo, devedor e credor,
possível é a compensação das obrigações até o montante em que
se igualam, na forma prevista no artigo 368 , do Código Civil .
Exige-se apenas que os referidos créditos sejam líquidos, certos e
exigíveis. É o caso dos autos, mormente porque ambos os casos
encontram-se em fase de cumprimento de sentença. Apelação
conhecida e desprovida”.[405]

Outra questão que tem gerado muita discussão diz respeito ao
recolhimento de contribuição previdenciária devida em razão da remuneração
do síndico ou administrador. A respeito desse assunto, ROSELY BENEVIDES
DE OLIVEIRA SCHWARTZ menciona que, em tais casos, a contribuição
previdenciária deve ser recolhida até o dia 2 (dois) de cada mês; caso caia em
sábado, domingo ou feriado, deve ser antecipado para o dia anterior. Na guia de
recolhimento deve ser informado o valor do pró-labore do síndico ou, se for o
caso, do valor da isenção da sua cota condominial. Esclarece ela que a isenção
da sua cota condominial, como remuneração in natura devida ao síndico ou
administrador, é entendida como uma forma de remuneração e, portanto, sujeita
à incidência de contribuição previdenciária. O condomínio tem de pagar a parte
da contribuição previdenciária que lhe cabe, ou seja, 20% (vinte por cento)
sobre a remuneração e também retem 11% (onze por cento) para repassar ao
Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, totalizando 31% (trinta e um por
cento). O condomínio somente não retém os 11% (onze por cento) se o síndico
ou administrador comprovar que já recolhe tal valor ao Instituto Nacional do
Seguro Social – INSS pelo teto. De maneira que o não pagamento da
contribuição previdenciária pode sujeitar o responsável pela retenção e
recolhimento (condomínio) a multa.[406]

“TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O PRÓ-
LABORE E SOBRE A ISENÇÃO DA QUOTA
CONDOMINIAL DOS SÍNDICOS. ART. 1° DA LEI
COMPLEMENTAR Nº 84/96. CONDOMÍNIO.
CARACTERIZAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO. ACOLHIMENTO PARA FINS DE
ESCLARECIMENTO E MELHOR ADEQUAÇÃO DA
FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO EMBARGADO. I- A
contribuição social sobre o pagamento do pro-labore aos síndicos
de condomínios imobiliários, assim como sobre a isenção da taxa
condominial devida a eles é devida, segundo explicita, de forma
cristalina, a Instrução Normativa n. 06/96, posta nestes termos: "I
- A contribuição a cargo da empresa é de 15% (quinze por cento)
sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, a qualquer
título, no decorrer do mês, inclusive sobre os ganhos habituais
sob a forma de utilidades, pelos serviços que lhe são prestados
por: (...) síndico de condomínio". (grifamos). II- O acórdão
embargado tratou das características específicas do condomínio,
não sendo pertinente a argumentação que tende à mera reforma
do julgado, ante a inconformidade do embargante com a
conclusão de se constituir em pessoa jurídica, para fins da
tributação rechaçada. III- Afinal, relativamente a ter o aresto
enfrentando questão atinente à tributação imposta ao síndico, a
despeito de a ação vertente discutir "apenas a contribuição
exigida do condomínio diante da existência de síndico", com
razão o embargante, de modo que, não pertinente à hipótese, há
de ser afastada do acórdão embargado tal fundamentação. IV-
Embargos de declaração parcialmente acolhidos, sem efeito
modificativo”.[407]


3.11.4 Prestação de contas do síndico


Todo aquele que administra bens de outrem deve prestar contas. De
maneira que o síndico ou administrador de condomínio edilício está obrigado a
prestar contas da sua gestão, sendo que tal prestação de contas, por sua própria
natureza, tem evidentes reflexos na vida de todos os condôminos, uma vez que
tal obrigação importa na transparência e publicidade dos gastos efetuados com a
administração do condomínio no exercício encerrado, e serve de referência para
a previsão orçamentária do exercício seguinte. Em outras palavras cumpre,
legalmente, ao síndico ou administrador o gerenciamento da vida econômica e
social do condomínio e por ser seu representante legal, o mandatário dos
condôminos, deve satisfação sobre os atos de sua gestão.
No entanto, não se pode perder de vista que prestar contas significa
fazer alguém a outrem, pormenorizadamente, parcela por parcela, a exposição
dos componentes de débito e crédito resultantes de determinada relação jurídica,
concluindo pela apuração aritmética do saldo credor ou devedor, ou de sua
inexistência.[408] Acrescenta ADROALDO FURTADO FABRÍCIO que a
natureza jurídica dessa relação pode variar muito, de um modo geral pode-se
dizer que deve contas quem quer que administre bens, negócios ou interesses de
outrem a qualquer título. Há de prestar contas, por outras palavras, aquele que
efetua ou recebe pagamentos por conta de outrem, movimentando recursos
próprios ou daqueles em cujo interesse se realizam pagamentos e recebimentos.
[409]

De acordo com o art. 1.350 do Código Civil de 2002, a prestação de


contas e previsão orçamentária devem ser feitas e aprovadas anualmente em
assembleia-geral de condôminos, o que, na maioria dos condomínios, costuma
acontecer no início do ano. No entanto, a prestação de contas deve ser feita pelo
síndico ou administrador, não se admitindo delegação de tal atribuição,
consoante a alínea f do art. 22 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, e inciso VIII do
art. 1.348 do Código Civil de 2002. Além de a obrigatoriedade de sua prestação
ser exclusiva do síndico ou administrador, as contas devem se revestir de meios
que efetivamente demonstrem a homologação e comprovação das despesas
apresentadas.
Todavia, não podemos nos furtar de mencionar que, muito embora as
matérias colocadas em pauta nas assembleias-gerais de condôminos serem de
suma importância, o índice de abstenção dos condôminos nas assembleias
ordinárias realizadas para eleição de síndico, prestação de contas e aprovação de
rateio de cota extra é muito expressivo, e, em alguns casos, supera 50%
(cinquenta por cento) das frações ideais existentes no condomínio. Certamente, o
desinteresse da maioria dos condôminos pelos assuntos em pauta nas
assembleias ordinárias, principalmente aqueles que se relacionam com a gestão
do condomínio, muitas vezes, contribui para a permanência no cargo de síndicos
notoriamente incompetentes e, muitas vezes, despojados de princípios morais.
Por sinal, a melhor doutrina insiste em afirmar que tal anomalia acontece em
vista da permissividade da norma que autoriza a realização da assembleia, na
segunda convocação, com qualquer número de condôminos presentes (arts.
1.352 e 1353 do Código Civil de 2002), fato que acarreta expressivo número de
ausências.
Dúvida não resta de que a realização da prestação de contas, anualmente
e quando exigidas por quem de direito, na assembleia-geral de condôminos é
uma das principais obrigações atribuídas ao síndico ou administrador (alínea d
do art. 22 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, e inciso VIII do art. 1.348 do Código
Civil de 2002). De maneira que, cumpre ao síndico ou administrador convocar,
anualmente, a assembleia geral ordinária, dentro das condições previstas no art.
1.350 do Código Civil de 2002, para elaborar o orçamento de cada exercício
(inciso VI do art. 1.348 do Código Civil de 2002) e prestar contas dos gastos
efetuados em relação à receita obtida no período financeiro findo (inciso VIII do
art. 1.348 do Código Civil de 2002).
A obrigação de o síndico ou administrador prestar contas de sua gestão
decorre, não só dos dispositivos legais acima mencionados, mas também da
prescrição contida no art. 668 do Código Civil de 2002 [410] e da jurisprudência
predominante do Superior Tribunal de Justiça – STJ.

“PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS
EM FACE DO CONDOMÍNIO. ILEGITIMIDADE PASSIVA
AD CAUSAM. LEGITIMIDADE PASSIVA DO SÍNDICO.
ARTIGOS 22, § 1º, LETRA "G" E 24, § 1º, DA LEI Nº 4.591/64
E 560 E 914 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. INCIDÊNCIA DA
SÚMULA STJ/211. I. A matéria inserta nos arts. 22, § 1º, letra
‘g’ e 24, § 1º, da Lei nº 4.591/64 e 560 e 914 do Código de
Processo Civil, não foi objeto de debate no v. Acórdão recorrido,
carecendo, portanto, do necessário prequestionamento
viabilizador do Recurso Especial. Incidência da Súmula 211 do
Superior Tribunal de Justiça. II. O art. 22, § 1º, ‘f’ da Lei nº
4.591/64, que tem por objeto o condomínio em edificações e as
incorporações imobiliárias, expressamente, dispõe que, § 1º
Compete ao síndico:f) prestar contas à assembleia dos
condôminos. III. Logo, não há dúvidas a respeito da
responsabilidade do síndico, na qualidade de representante e
administrador do condomínio, de prestar contas de sua gestão, já
que lhe cabe administrar e gerir valores e interesses alheios. IV.
Forçoso, portanto, reconhecer a ilegitimidade do condomínio
para figurar no polo passivo da demanda. V. Recurso Especial
conhecido em parte e, nessa parte, provido”.[411]

“AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. EX-SÍNDICA.
CABIMENTO. CONTAS JÁ HOMOLOGADAS EM
ASSEMBLEIA CONDOMINIAL. EXONERAÇÃO DO
DEVER. 1. o síndico tem o dever de prestar contas de sua gestão
aos condôminos, nos termos do art. 1.348/VIII do Código Civil.
2. O pedido referente a período em que a contas já foram
aprovadas regularmente em assembleia não comporta
provimento. 3. Recurso da ré parcialmente provido”.[412]

Vale destacar ainda que o art. 23 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964, prevê a
eleição de Conselho Consultivo, a ser formado por 3 (três) condôminos, em
mandatos não superior a 2 (dois) anos, com função de atuar como órgão
consultivo do síndico, para assessorá-lo na solução dos problemas que digam
respeito ao condomínio, podendo, ainda, a convenção condominial definir outras
atribuições específicas. No entanto, o art. 1.356 do Código Civil de 2002 alterou
a nomenclatura “Conselho Consultivo”, de maneira a denominar tal órgão de
“Conselho Fiscal”, com participação livre, inclusive a de quem não possui a
qualidade de condômino (proprietário de unidade autônoma), facultando a sua
existência à deliberação de todos.
Seja como for, cabe, ainda, ao “Conselho Consultivo” ou “Conselho
Fiscal” examinar as contas apresentadas pelo síndico ou administrador e emitir
parecer recomendando, ou não, a sua aprovação. Muito embora seja indiscutível
a importância da manifestação do “Conselho Consultivo” ou “Conselho Fiscal”,
tal atribuição não é absoluta, já que, conforme disposição expressa do art. 1.350
do Código Civil de 2002, cabe exclusivamente à assembleia-geral de
condôminos, com representatividade dos condôminos, deliberar sobre a
aprovação das contas do síndico ou administrador relativas ao exercício findo.
Portanto, repetimos a prestação de contas não deve deixar qualquer dúvida
quanto à sua autenticidade e que o Conselho Fiscal do Condomínio tem
competência apenas para emitir parecer sobre as contas do síndico ou
administrador; a responsabilidade de aprovar, ou não, tais contas é da
assembleia-geral de condôminos.
De maneira que, em virtude da competência expressa da assembleia-
geral de condôminos para deliberar sobre a aprovação das contas do síndico ou
administrador relativas ao exercício findo, falece o condômino de legitimidade
para propor ação de prestação de contas, posto que somente àquela é conferida
competência para aprovar ou reprovar as contas do síndico ou administrador.
É importante deixar bem claro que a lei não se nega o direito do
condômino de ter acesso aos pormenores referentes à administração do
condomínio em que reside, inclusive comprovantes de despesas. Todavia, há de
se reconhecer a inviabilidade processual relativa à ilegitimidade do condômino
em demandar o síndico ou administrador, ainda que condômino acionasse o
condomínio, quando existe a aprovação das contas do síndico ou administrador
em assembleia-geral de condôminos, conforme vem entendendo a jurisprudência
de nossos Tribunais. No entanto, trata-se de exercício regular do direito do
condômino a proposição de anulação de deliberação de assembleia-geral que
aprovou anteriormente as contas do condomínio, se constatada, posteriormente, a
existência de possíveis irregularidades.

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. SÍNDICO.
REJEIÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS
ANTERIORMENTE APROVADAS PELO CONSELHO
FISCAL. DANOS MORAIS. NÃO OCORRÊNCIA.
EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO. NÃO PROVIMENTO.
1. Trata-se de exercício regular do direito a proposição de
anulação de deliberação de Assembleia Geral que aprovou
anteriormente as contas do Condomínio, se constatada,
posteriormente, a existência de possíveis irregularidades. 2.
Incabível a condenação dos réus ao pagamento de indenização
por danos morais à ex-síndica se não comprovada a má-fé ou
excessos no relato dos fatos que motivaram tal proposição. 3.
Negou-se provimento ao apelo da autora”.[413]

Em relação aos documentos necessários para a prestação de contas da
gestão do síndico ou administrador, para faze-la e apresenta-la na assembleia-
geral de condôminos, em síntese, podem ser enumerados da seguinte maneira: 1)
Certidões negativas do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, do Fundo de
Garantia por Temp de Serviço – FGTS e da Secretaria da Receita Federal –
SRF, do condomínio, da administradora, das empresas terceirizadas; 2) Auto de
Vistoria do Corpo de Bombeiros – AVCB e as cópias das Normas
Regulamentadoras – NRs n° 5 (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes –
CIPA), n° 7 (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional) e n° 9
(Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – PPRA) , além do certificado de
brigada de incêndio, pára raios, Relatório de Inspeção Anual – RIA dos
elevadores, seguro do prédio e dos empregados; 3) Atestado de dedetização,
lavagem das caixas d’agua e da última análise da potabilidade de água; 4) A
pasta de prestação de contas pode ser composta por: a) demonstrativo de
despesas (que deve ser de fácil compreensão e contar um resumo do número de
contas do balanço); b) balanço contábil: que deve ser abrangente e detalhado;
pode dividido em três contas: i) pessoal (que inclui salários, férias, cesta básica e
outros); ii) fixas (água, luz, telefone, taxas, contratos de manutenção de
elevadores, etc.); e iii) variáveis (limpeza da caixa d’água, recarga de extintores,
entre outros); 5) Documentação comprobatória de despesas e receita (a receita
basicamente se divide em duas: condôminos adimplentes e inadimplentes).
Em relação à apresentação da prestação de contas na assembleia-geral
de condôminos, podemos recomendar que ela seja feita de forma clara para os
condôminos presentes, observando-se o seguinte: 1) No início da assembleia-
geral de condôminos, recomenda-se que o síndico ou a Administradora do
Condomínio distribuia no início dos trabalhos uma folha com os detalhes que
serão discutidos na prestação de contas, como o comparativo com a previsão
orçamentária aprovada no ano anterior; 2) Deve-se comparar a previsão efetuada
no ano anterior com os gastos reais e respectivas distorções com explicações
claras, simples e sem deixar dúvidas sobre o motivo dos gastos; 3) Deve-se usar
a divisão por item como “Empregados”, “Consumo” (água, luz, telefone,
Internet), “Manutenção”, “Material de Consumo”, “Administrativos”, “Despesas
Diversas”, isso facilita o entendimento dos condôminos presentes; 4) Deve-se
informar que as pastas relativas à prestação de contas ficarão disponíveis na
administração do prédio; 5) Alguns especialistas pedem para evitar detalhar
demais as despesas, o que pode gerar alguma confusão. Outros, porém, dizem
que tudo deve ser colocado, pois, contabilmente, a compra de uma caneta, por
exemplo, é tão importante quanto a de um equipamento de elevador; 6) Se
houver críticas ou objeções, devem elas ser analisadas e, se realmente
procederem, deve-se adotá-las, caso contrário, devem ser dada as devidas
explicações claras e convincentes; 7) Deve-se procurar adequar-se às
necessidades do público, que irá manipular e aprovar ou não a pasta de prestação
de contas.
Além disso, existem alguns pontos que são fundamentais para que a
prestação de contas esteja completa, outros, no entanto, podem ser deixados de
lado, como, por exemplo: 1) Deve-se sempre ter em mente que, para o balanço
ser transparente, não pode faltar a receita, a lista de inadimplência e as despesas;
2) Deve-se ater-se somente ao período que está em pauta na assembleia-geral de
condôminos; 3) Nunca se deve esquecer das pastas e da documentação original
comprobatória de despesas e receita.


3.12 ASSEMBLEIA-GERAL DE CONDÔNIMOS


Nos condomínios edilícios, tudo que diz respeito a comunidade
condominial é decidido a partir das assembleias-gerais de condôminos. Nessas
reuniões de condôminos ou proprietários das unidades autônomas, a comunidade
está presente para decidir, através de votação, a aprovação de contas do síndico
ou administrador, a necessidade de realização de obra e até quem deverá ser o
próximo síndico ou administrador do prédio ou do conjunto de edificações.
Portanto, a regulamentação das assembleias-gerais de condôminos é
uma das matérias mais importantes da convenção de condomínio, pois as
cláusulas que trantam desse assunto devem esclarecer os seguintes pontos: a)
como a assembleia-geral de condôminos deve ser formada; b) quem pode
convocar a assembleia-geral de condôminos e forma de fazê-lo, prazo,
publicação (evitando jornais de grande circulação, cujos anúncios são muito
caros), etc.
De maneira que, por ser um evento de grande importância na vida em
condomínio, as assembleias-gerais de condôminos estão sujeitas as disposições
legais e normas previstas na convenção de condomínio, a elas aplicáveis. Desde
o momento da convocação até a sua finalização em ata, a reunião tem seus
detalhes, requerendo certa técnica para que os trabalhos fluam lícita e
corretamente. A competência, forma de convocação e quorum exigido para as
respectivas deliberações, são matérias que devem estar devidamente previstas na
convenção do condomínio, conforme prescreve o inciso III do art. 1.334 do
Código Civil de 2002.[414]


3.12.1 Espécies de assembleias


As assembleias-gerais de condôminos podem ser de 2 (duas)
modalidades distintas: 1) Assembleia-Geral Ordinária – AGO; e 2) Assembleia-
Geral Extraordinária – AGE.
A Assembleia-Geral Ordinária – AGO exige a lei que seja realizada,
obrigatoriamente, uma vez ao ano. Havendo omissão destes, poderá qualquer
dos condôminos denunciar esse fato ao Poder Judiciário, a quem incumbirá
decidir quanto a esta questão. No instrumento de convocação devem estar
presentes o seguintes elementos: a) o quorum para sua realização; b) a
obediência à “ordem do dia”, que deve ser clara e objetiva, prevendo data, hora e
local; e c) a assinatura de quem a convoca. Além disso, a convocação da
Assembleia-Geral Ordinária – AGO deve ser acompanhada do relatório anual e
das contas do síndico ou administrador, bem como do orçamento para o
exercício seguinte.
Quanto á forma da convocação, em especial, a forma escrita, com
comprovante de recebimento, é a que mais condiz com as normas legais que
regem o condomínio edilício, ahaja vista a nulidade da assembleia-geral
deliberativa que não contar com a convocação de todos os condôminos (art.
1.354 do Código Civil de 2002). É importante destacar que, para efeito de
comparecimento nas assembleias-gerais de condôminos, a lei equipara aos
proprietários, os compromissários compradores e os cessionários promitentes
das unidades autônomas, conforme determina o §2 do art. 1334 do Código Civil
de 2002 [“São equiparados aos proprietários, para os fins deste artigo, salvo
disposição em contrário, os promitentes compradores e os cessionários de
direitos relativos às unidades autônomas”]. Na verdade, a realidade está um
pouco distante do texto legal, pois não é novidade o fato de que alguns
condomínios deixam os inadimplentes participarem e votarem matérias
importantes para que estes futuramente não ingressem com ações na justiça
questionando seu direito de propriedade.
No entanto, os condôminos em débito com o condomínio edilício não
podem participar e votar nas deliberações da assembleia-geral de condôminos,
conforme prescrição expressa do inciso III do art. 1.335 do Código Civil de 200
[“São direitos do condômino (…) votar nas deliberações da assembleia e delas
participar, estando quite].
Certamente, o direito fundamental de defesa previsto no inciso LV [“aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes”] do art. 5° da Constituição Federal deve ser respeitado. Tal dispositivo
constitucional prevê a obrigação de se conceder de o direito de ampla defesa a
qualquer cidadão que for acusado em processo judicial ou administrativo,
inclusive na aplicação de penalidades à condôminos ou ocupantes. É pacífico o
entendimento de que os direitos fundamentais também são oponíveis entre
particulares (a chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais) e sendo
assim, nos condomínios edilícios, o presidente das assembleias-gerais de
condôminos deve permitir ao condômino ou ocupante da unidade autônoma a
apresentação de sua defesa. A fim de garantir que o condomínio não irá
prejudicar o direito do acusado de estar inadimplente, é de bom alvitre que, nas
deliberações que envolvem punições, se inclua “defesa do condômino/ocupante”
como item de pauta no edital de convocação das assembleias-gerais de
condôminos, para deixar clara a oportunidade de defesa do acusado. Igualmente,
é indiscutível a necessidade de tratamento adequado na convenção do
condomínio, concedendo mecanismos aos condôminos para que possam recorrer
à assembleia-geral contra decisões que lhes afetem. Tal providência representa
um grande passo para o condomínio, na medida em que favorece a resolução de
divergências internas sem intervenção judicial. Também exige cautela a questão
do condômino inadimplente não poder votar ou, sequer, participar de
assembleias-gerais de condôminos.[415]
Portanto, deve haver harmonia entre o direito do condomínio em
restringir o acesso do condômino inadimplente à assembleia-geral de
condôminos e o direito de defesa do condômino inadimplente. Se solicitado, o
presidente da assembleia-geral de condôminos deve permitir que condômino
inadimplente se manifeste em assembleia em prol de sua própria defesa.
Certo é que, ao contrário da antiga Lei de Condomínios, o Código Civil
de 2002 garante sérias restrições ao condômino inadimplente. Além dos
acréscimos legais ao principal da dívida para com o condomínio, o Código Civil
de 2002 permitiu que o inadimplente fosse proibido de participar e votar em
assembleias-gerais de condôminos. Não se trata de tratamento injusto ou
abusivo, mas tão somente tratamento proporcional ao descumprimento do dever
do condômino de contribuir com as despesas e cumprir as regras de convivência
comunitária. Afinal, se o condômino ignora tais deveres básicos, ele abdica do
direito de participação em assembleias-gerais de condôminos. No entanto, o
condômino inadimplente deve ser convocado mesmo assim, mas não poderá
participar ou votar.
Além disso, é importante mencionar que a realização de acordo de
parcelamento de débito em andamento não desqualifica a condição de
inadimplente do devedor, todavia, salvo disposição em contrário na convenção
do condomínio ou no termo do acordo (neste último caso, somente se a
convenção for omissa), suspende todas as penalidades aplicáveis ao
inadimplemento.

“DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO. DIREITO DE VOTO. Ação
cautelar com pedido de liminar em que objetivam os autores
exercer o direito de voto nas assembleias condominiais, não
obstante se encontrem cumprindo acordos administrativos.
Fumus boni iuris e periculum in mora presentes. Na hipótese
vertente, foi publicado Edital de Convocação para a Assembleia
Geral Ordinária do Condomínio-réu, que exigiu, como condição
para participação nas eleições de síndico, não se encontrar o
condômino com qualquer pendência, inclusive acordos em
andamento. Todavia, o condômino que está em dia com as
obrigações condominiais, mas cumpre acordo administrativo, o
qual está sendo quitado a medida dos vencimentos das
respectivas parcelas, não pode ser tido como inadimplente e, por
via de consequência não pode ser impedido de votar e ser votado
em assembleias condominiais. Precedente desta E. Corte. Verba
honorária corretamente fixada, em observância aos ditames do §
4º do artigo 20 do CPC, diante das circunstâncias do caso
concreto. Pedido procedente. Sentença mantida. Desprovimento
do recurso”.[416]

De maneira que ao inadimplente que está cumprindo acordo extrajudicial
ou judicial de parcelamento de débitos de obrigações condominiais (cotas
ordinárias, cotas extras ou multas) deve ser concedido direito de participar e
votar nas assembleias-gerais de condôminos.
Outrossim, independente da existência de acordo, alguns doutrinadores
entendem que os condôminos inadimplentes não podem ser impedidos de votar
em certos assuntos que afetem diretamente sua propriedade, classificadas como
“matérias de direito de propriedade stricto sensu”.[417]
Visto isto, destacamos que tanto o modo quanto á forma de convocação
das assembleias-gerais de condôminos deve ser objeto de tratamento na
convenção do condomínio, a fim de evitar futura contrariedade de
entendimentos.
A finalidade precípua da Assembleia-Geral Ordinária – AGO consiste
na aprovação do orçamento das despesas do condomínio, das contribuições dos
condôminos, da prestação de contas do administrador, de eventual eleição de seu
substituto e, ainda, na eventual deliberação para fins de alteração do
Regulamento Interno ou Regimento Interno (art. 1.350 do Código Civil de
2002);[418]
Na data e hora designada para realização da Assembleia-Geral Ordinária
– AGO deve ser providenciado os livros indispensáveis: a) livro de atas,
registrado; e b) livro de presenças, com folhas rubricadas pelo presidente do
Conselho Consultivo ou Conselho Fiscal. As procurações deverão ser
apresentadas em forma legal.
Para aprovação de contas passadas, previsão orçamentária e eleição
síndico ou administrador e corpo diretivo, é preciso, em 1ª (primeira)
convocação, o voto de condôminos que representem a maioria das frações ideais
ou das unidades, de acordo com o critério disposto na convenção do condomínio.
Se não houver este quorum em 1ª (primeira) convocação, em 2ª
(segunda) chamada a aprovação e eleição se dá por maioria dos votos dos
presentes (a não ser nos casos em que a legislação ou a convenção exijam
quorum especial, como obras, alterações no Regulamento Interno ou Regimento
Interno, mudanças na fachada e outros); 4) os votos, salvo disposição contrária
da convenção do condomínio, são correspondentes à fração ideal dos votantes.
O parágrafo único do art. 1352 do Código Civil de 2002 [419] e o §3° do
art. 24 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,[420] determinam que os votos, salvo
disposição diversa na convenção do condomínio, sejam proporcionais às frações
ideais do terreno (solo) e partes comuns pertencentes a cada condômino, mas a
maioria das convenções segue critério de 1 (um) voto para cada unidade
autônoma, o que é permitido, desde que expressamente previsto na convenção de
constituição do condomínio, e isto parece ser mais equitativo. Levando em conta
esse aspecto, há de se ter em mente que “o condômino titular de frações ideais
que representem mais de 50% (cinquenta por cento) do total terá, de fato e de
direito, o controle das assembleias e suas deliberações, podendo surgir a figura
que a doutrina denomina maioria de um só”. Para solução desse impasse, o
recurso mais viável é a via judicial para “por cobro á situação anômala como
essa”.[421]
Se as contas forem reprovadas pela Assembleia-Geral Ordinária – AGO,
esta deve deliberar as providências a serem tomadas. Por exemplo: instituir uma
auditoria, marcar Assembleia-Geral Extraordinária – AGE para a destituição do
síndico ou administrador.
Já a Assembleia-Geral Extraordinária – AGE pode ser convocada pelo
síndico ou administrador ou, se assim este não proceder, por ¼ (um quarto) dos
condôminos (art. 1.355 do Código Civil de 2002,[422] e art. 25 da da Lei n° 4.591,
de 16.12.1964),[423] quando se fizer necessário tratar de assuntos afetos á vida
condominial.

“APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR. NULIDADE DE
SENTENÇA (JULGAMENTO CITRA PETITA). ANALISADA
COM O MÉRITO. LEGITIMIDADE ATIVA. ACOLHIMENTO
PARCIAL. MÉRITO. CONDOMÍNIO. ASSEMBLÉIA GERAL
ORDINÁRIA/EXTRAORDINÁRIA. CONVOCAÇÃO POR
INADIMPLENTE. IRREGULARIDADE. PROVIMENTO. 1.
Preliminar de nulidade da sentença, face ao julgamento citra
petita, apreciada junto ao mérito, momento em que será
verificada a concordância jurídica dos fatos alegados no recurso.
Decisão por maioria. 2. Preliminar de legitimidade ativa acolhida
parcialmente. Demonstração da condição de proprietária da Sra.
Adriana Porto Ataíde através das Atas da Assembléia constantes
nos autos, tendo em vista o art. 7º, § 6º, da Convenção de
Condomínio e art. 1.335, II, do CC que asseguram o direito de
voto a condômino. Ilegitimidade ativa dos Srs. Jaime Porto
Ataíde, Antônio Cândido Porto de Ataíde e Aílton Coelho de
Ataíde Filho reconhecida. 3. Irregularidade de Convocação para
Assembléia Geral, visto que os condôminos convocantes, bem
como dois membros do Conselho Consultivo encontravam-se
inadimplentes, tudo em desconformidade com o art. 7º, § 6º da
Convenção e art. 1.355 do CC, sendo, portanto, a Assembléia
questionada, junto à ata e demais deliberações, nula. 4. Recurso
provido”.[424]

No entanto, a modificação da convenção exige o voto mínimo de
condôminos que represente 2/3 (dois terços) do total das frações ideais, salvo
estipulação diversa da convenção de condomínio, conforme a primeira parte do
art. 1.351 do Código Civil de 2002,[425] e parágrafo único do art. 25 da Lei n°
4.591, de 16.12.1964. Ademais, a mudança da destinação do edifício e de suas
unidades autônomas imobiliárias, depende da aprovação pela unanimidade dos
condôminos (segunda parte do art. 1.351 do Código Civil de 2002).
Em suma, podemos dizer que, dependendo da matéria a ser deliberada
nas assembleias-gerais de condôminos, a legislação em vigor fixa determinado
quorum para a sua aprovação, dela apurando-se a exigência de: a) subscrição,
pelos titulares, que representem no mínimo 2/3 (dois terços) das frações ideais,
para aprovação do instrumento público ou particular de convenção do
condomínio; b) votos representativos de 2/3 (dois terços) dos condôminos, no
mínimo, para deliberação quanto á cobrança de multa a ser aplicada ao
condômino que infringir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV
do art. 1.336 do Código Civil de 2002 (não realizar obras que comprometam a
segurança da edificação; não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e
esquadrias externas; dar ás suas partes de propriedade exclusiva, a mesma
destinação que tem a edificação, evitando a sua utilização de modo a acarretar
prejuízos de cunho perturbador quanto ao sossego, salubridade e segurança dos
possuidores, ou aos bons costumes), caso o ato constitutivo ou a convenção não
tenha previsão a esse respeito; c) votos representativos de 3/4 (três quartos) dos
condôminos, para fins de imposição de multa ao condômino ou possuidor que,
reiteradamente, descumprir com seus deveres perante o condomínio; d) votos de
2/3 (dois terços) dos condôminos para a execução de benfeitorias voluptuárias e,
da maioria, para a execução de benfeitorias úteis; e) votos de 2/3 (dois terços)
dos condôminos para a execução de obras nas partes comuns do edifício; f)
votação, por unanimidade, para fins de construção de outro pavimento, ou, no
solo comum, de outro edifício, destinado a conter novas unidades imobiliárias;
g) votos da maioria absoluta dos presentes, para fins de destituição do síndico;
h) votos de 2/3 (dois terços) dos condôminos para alterar a convenção ou
regimento interno do condomínio; i) votos da unanimidade dos condôminos
quando se objetivar a mudança da destinação do edifício, ou da unidade
imobiliária; j) votos da maioria dos condôminos presentes e representativos de
50% (cinquenta por cento) das frações ideais, no mínimo, para as deliberações
da assembleia, em primeira convocação, salvo quando exigido quorum especial;
k) votos da maioria dos condôminos presentes, para as deliberações da
assembleia, em segunda chamada, salvo quando exigido quorum especial; l)
votos representativos de 50% (cinquenta por cento) mais uma das frações ideais,
para fins de deliberação quanto á reconstrução ou venda da edificação, em caso
de destruição total ou parcial, ou quando ameace ruína.
A convocação da Assembleia-Geral Extraordinária – AGE deve ser feita
da mesma forma prevista para a Assembleia-Geral Ordinária – AGO, em razão
de que dispõe o inciso III do art. 1.334 do Código Civil de 2002 [“Além das
cláusulas referidas no art. 1.322 e das que os interessados houverem por bem
estipular, a convenção determinará (...) a competência das assembleias, forma de
sua convocação e quorum exigido para as deliberações”], o qual trata das
assembleias-gerais de condôminos sem distinção em deferência á espécie, como
acima se procurou identificar, para fins de melhor compreensão das
competências de cada uma delas.
É importante esclarecer que as eleições do síndico, subsíndico e do
Conselho Consultivo ou Conselho Fiscal são atributos, normalmente, das
Assembleias-Gerais Ordinárias – AGO, e das Assembleias-Gerais
Extraordinárias – AGE, no caso destituição do síndico ou administrador que
praticar irregularidades na sua gestão, não prestar contas ou não administrar
convenientemente o condomínio (art. 1.349 do Código Civil de 2002),[426] bem
como, salvo disposição em contrário, no caso de o síndico ou administrador
transferir a outrem, total ou parcialmente, os poderes de representação ou as
funções administrativas (§2° do art. 1.348 do Código Civil de 2002)[427]
Por último devemos mencionar que parte dos doutrinadores alerta para a
existência de apenas 2 (duas) modalidades de assembleias-gerais de condôminos
(Assembleias-Gerais Ordinárias – AGO e Assembleia-Geral Extraordinária –
AGE). Para eles a Assembleia-Geral Especial – AGEsp seria apenas uma
modalidade de Assembleia-Geral Extraordinária – AGE que definiria assuntos
de extrema relevância para o funcionamento do condomínio.


3.12.2 Presença dos condôminos nas assembleias


Várias pesquisas realizadas por entidades lidadas à administração de
condomínios indicam que as assembleias-gerais de condôminos contam, em
média, com a presença de apenas 15% (quinze por cento) dos condôminos.
Tais pesquisas apontam como elementos de desmotivação dos
condôminos a comparecerem nas assembleias-gerais de condôminos os
seguintes: 1) isenção: os condôminos ausentes preferem não se posicionar sobre
determinados assuntos; 2) desinteresse: os condôminos ausentes não participam
por pura comodidade ou porque os assuntos em pauta são pouco relevantes; 3)
aprovação: os condôminos ausentes estão satisfeito com tudo e confiam na
administração. Por isso, não veem necessidade de sua participação; 4) falta de
tempo: os condôminos ausentes não tem tempo para participar ou consideram o
tempo de duração muito elevado; 5) uso excessivo de procurações: apesar de ser
permitido por Lei, desde que a convenção não proíba ou determine limites, o uso
em excesso de procurações é muito criticado pelos demais condôminos. Trata-se
de uma prática que, se usada de forma abusiva, compromete (e muito) o objetivo
democrático de uma assembleia-geral de condôminos; 6) falta de objetividade
no tratamento dos assuntos em pauta: ficar mais de 2 (duas) horas falando sobre
aspectos nem sempre pertinentes a todos os moradores pode tornar-se um
verdadeiro “suplício”. A maioria das pessoas quer esclarecer todos os problemas
do condomínio nas assembleias-gerais de condôminos, com cada um
defendendo seu ponto de vista, desrespeitando o que foi definido na pauta. Desta
forma, perde-se o foco com questões que podem ser resolvidas apenas fazendo
uma sugestão ou crítica no livro de ocorrências do prédio, que geralmente fica na
portaria.[428]
Para combater o baixo comparecimento de condôminos nas assembleias-
gerais de condôminos é necessário o seguinte: 1) além do procedimento
convencional de convocação por edital, é aconselhável reforçar o acontecimento
por meio de comunicados no elevador, quadro de avisos e até e-mails. Pode-se
solicitar também ao porteiro ou zelador que ligue para todos os apartamentos
uma hora antes da primeira convocação; 2) as pautas devem ser claras,
pertinentes e necessárias; 3) se a administração do condomínio entender
conveniente, deve estipular e mencionar tempo máximo de duração da
assembleia-geral de condôminos [a média costuma ser de 2 (duas) horas];
4)deve-se colocar observações como as seguintes: “A sua presença é
indispensável para o bom andamento e valorização do nosso patrimônio”; “Os
ausentes, por Lei, deverão acatar com todas as decisões tomadas”; 5) a
administração do condomínio deve atentar se nesse dia haverá algum jogo de
futebol ou qualquer outro evento popular importante, ou se é próximo de feriado
prolongado; 6) a administração do condomínio deve pedir ao porteiro para
colocar nos elevadores, 1 (um) dia antes ou no dia da assembleia-geral de
condôminos, lembrete simples, tais como: “Não se esqueça: hoje, você tem um
compromisso com o seu condomínio!”. Essa atitude chama a atenção dos
moradores para a reunião; 7) assuntos mais chamativos: reajuste da mensalidade
condominial; cotas extras para reformas em geral: pintura e lavagem do prédio,
manutenção de elevadores, obras na fachada etc.; eleição de síndico; sorteio de
vagas de garagem; troca de funcionários próprios por terceirização.[429]
Ainda em relação ao tempo máximo de duração e horário de realização
da assembleia-geral de condôminos, as entidades ligadas à administração de
condomínios vem sugerindo o seguinte: 1) o tempo ideal de duração de uma
assembleia deve girar em torno de 1h30 a 2h; 2) no quesito horário, o mais
recomendado é entre 20h e 20h30, para dar tempo de as pessoas chegarem do
trabalho, e para que a reunião não termine muito tarde; 3) deve-se fazer a 1ª
(primeira) chamada entre 19h30 e 20h e aguardar até às 20h30, para o 2°
(segundo) e derradeiro aviso; 4) os trabalhos da assembleia-geral de condôminos
devem ser iniciados sempre no horário (geralmente na segunda chamada, uma
vez que a participação da primeira dificilmente é alcançada); 5) é sempre bom
ter em conta que entre segunda-feira e quarta-feira as pessoas estão no ritmo
mais intenso de trabalho e, provavelmente, mais disponíveis para participar de
reuniões. Muitos não descartam a quinta-feira como opção, desde que não seja
próxima de um feriado; 6) não é recomendado realizar assembleia-geral de
condôminos nos fins de semana. Entretanto, caso seja esta a opção, a
administração do condomínio deve prefirir o horário das 10h ou 15h, e aos
domingos – em caso extremo – às 10h ou 11h.[430]


3.12.3 Uso excessivo de procurações nas assembleias


Em relação ainda ao uso excessivo de procurações, apesar de ser
permitido por Lei, desde que a convenção do condomínio não proíba ou
determine limites, é muito criticado pelos demais condôminos, pois a utilização
excessiva de procurações em assembleias põe em risco o jogo democrático nos
condomínios. Trata-se de uma prática que, se possível, deve ser evitada, pois se
usada de forma abusiva, compromete (e muito) o objetivo democrático de uma
assembleia, desestimulando assim a presença dos demais participantes.

“CERCEAMENTO DE DEFESA - Inocorrência -
Desnecessidade de produção de novas provas - Nulidade
afastada. MEDIDA CAUTELAR – Exibição de documentos –
Condomínio - Procurações e atas - Ilegitimidade passiva no
tocante ao pedido de exibição de procurações outorgadas à
síndica para recondução ao cargo - Falta de interesse de agir em
relação aos demais pedidos - Documentos registrados em cartório
de títulos e documentos - Extinção mantida - Recurso
desprovido”.[431]

Com efeito, em democracia, vale a vontade da maioria ou, pelo menos,
deveria ser assim. Na prática, o conceito teima em fugir de seu termo, isto
porque, em diferentes situações cotidianas, uma minoria assume para si as
decisões, seja por outorga ou por omissão dos demais. É assim no conjunto da
sociedade brasileira e não poderia ser diferente nos condomínios edilícios.
Nessas verdadeiras “pequenas cidades” é a prática de conceder
indiscriminadamente procurações, a fim de evitar participar das assembleias, a
principal responsável por deliberações que nem sempre expressam o interesse do
conjunto dos moradores, tornando a gestão muito menos democrática do que
poderia e deveria ser.

“DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO. ASSEMBLEIA GERAL.
ANULAÇÃO. VÍCIO APONTADO. PROCURAÇÕES
OUTORGADAS AO SÍNDICO. IRREGULARIDADE.
INEXISTÊNCIA DE FIRMA RECONHECIDA.
LEGITIMIDADE ATIVA DOS CONDÔMINOS.
LEGITIMIDADE PASSIVA DO CONDOMÍNIO.
RATIFICAÇÃO DOS PODERES. IMPOSSIBILIDADE.
EXTEMPORANEIDADE. ART. 1.296, CC. RECURSO
DESACOLHIDO. I- Em se tratando de anulação de assembleia
geral de condomínio, por ter sido instalada como procurações
sem reconhecimento de firma, inviável a pretendida ratificação
após seu encerramento e somente depois da sentença proferida na
competente ação judicial instaurada. II- Os condôminos têm
legitimidade e interesse para pleitear a anulação de assembleia
geral do condomínio, se irregularmente foram iniciados os
trabalhos da reunião, sendo parte passiva legítima o condomínio,
por ser ele o que vai sofrer os efeitos da sentença de
procedência”.[432]

Vale destacar que alguns doutrinadores advogam a possibilidade de
aplicação por analogia do art. 115 da Lei n° 6.404, de 1976 (Lei das Sociedades
Anônimas).[433] Com efeito, utilizada subsidiariamente em casos de condomínios,
o caput do referido art. 115, com redação dada pela Lei nº 10.303, de
31.10.2001, prevê que “o acionista deve exercer o direito a voto no interesse da
companhia; considerar-se-á abusivo o voto exercido com o fim de causar dano à
companhia ou a outros acionistas, ou de obter, para si ou para outrem, vantagem
a que não faz jus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a companhia
ou para outros acionistas”. E o § 1º desse mesmo artigo menciona,
expressamente, que “o acionista não poderá votar nas deliberações da
assembleia-geral relativas ao laudo de avaliação de bens com que concorrer para
a formação do capital social e à aprovação de suas contas como administrador,
nem em quaisquer outras que puderem beneficiá-lo de modo particular, ou em
que tiver interesse conflitante com o da companhia”. De maneira que, com base
nesta disposição da Lei das Sociedades Anônimas, também será possível
considerar abusivo o síndico ou administrador votar munido de várias
procurações, obtendo vantagem indevida para si ou para outrem, causando
prejuízo ao condomínio, ou ainda aprovando suas contas irregulares.
Tramita o Projeto de Lei n° 6.960/2002 que acrescenta um parágrafo ao
art. 1.354 do Código Civil de 2002, estabelecendo limite de 3 (três) procurações
para cada condômino. Entretanto, enquanto ele não é aprovado, é majoritário o
entendimento de que maior participação dos moradores na vida condominial
pode resolver a questão. Basta que os condôminos escolham critérios e os
incluam como cláusula na convenção do condomínio para que tal limite tenha
força de lei.
Assim, se a convenção do condomínio não estabelece limites para isto, a
única saída é conseguir aprovação de 2/3 (dois terços) do total dos condôminos
para alterar a referida convenção, fazendo inserir no seu conteúdo o seguinte: 1)
o limite do número de procurações por pessoa; 2) a exigência do
reconhecimento de firma para as assinaturas nas procurações [o
reconhecimento de firma, ou seja, da assinatura do outorgante da procuração,
significa que o cartório atesta que a pessoa que assinou é de fato quem diz que é;
em outras palavras, que não houve falsificação de assinatura]; 3) prazo de
validade para as procurações que não se restrinjam a um determinado tema; 4)
o assunto ou tema para as procurações específicas.

“AÇÃO ANULATÓRIA DE ASSEMBLEIA CONDOMINIAL -
Autor que alega irregularidade na representação de condôminos
em votação e em representação junto ao conselho consultivo e
fiscal. - Convenção condominial que somente limita o número de
procurações por condômino e não número de representações por
terceiros. - Ausência de exigência de firma reconhecida para
validade das procurações. - Eleitos ao conselho consultivo e
fiscal aptos ao cargo. - Carga honorária fixada nos termos do
artigo 20, §1°, CPC. - Sentença mantida. Recurso improvido”.[434]

“PRESTAÇÃO DE CONTAS - DECLARATÓRIA DE
NULIDADE DE ASSEMBLEIA DE CONDÔMINOS -
APELAÇÃO - A assembleia é a destinatária da prestação de
contas do síndico. - Ilegitimidade ativa dos condôminos para
exigi-la individualmente. - Procuração para votar na eleição do
síndico. - Desnecessidade de firma reconhecida. - Inexistência de
impedimento do mandatário, diante do fato de ser ele candidato
ao cargo em disputa. Recurso não provido”.[435]

“DIREITO CIVIL - CONDOMÍNIO - ASSEMBLEIA GERAL
ORDINÁRIA - NULIDADE - INFRAÇÃO DE NORMA
CONVENCIONAL - OUTORGA DE PROCURAÇÃO AO
SÍNDICO - SUBSTABELECIMENTO - RECURSO
DESPROVIDO À UNANIMIDADE. I- Tem-se por nula a
decisão de assembleia geral ordinária de condomínio, se não
respeitadas as normas previstas na respectiva convenção. é que os
atos jurídicos a serem praticados estão atrelados aos rigores das
cláusulas convencionais. II- Não tendo sido questionada a
legalidade ou a aplicabilidade da convenção, esta se torna regra a
ser seguida no relacionamento jurídico mantido entre o
condomínio e seus condôminos. III- Não estando o síndico apto a
receber os poderes dos condôminos, conforme cláusula
convencional, não poderia substabelecê-los a terceiro, como
procedeu. assim o fazendo, tornou o ato jurídico imperfeito e
passível de anulação por meio de medida judicial. IV-Estando
viciada a outorga da procuração, consequentemente, fica
invalidado o substabelecimento, cabendo ao acessório a mesma
sorte do ato principal. aplicação do princípio accessorium
sequitur suum principale. V- Recurso conhecido e desprovido à
unanimidade”.[436]


3.12.4 Ata de assembleia


A ata é certificação ou testemunho escrito em que se apresenta o que
aconteceu, tratado ou acordado no momento de qualquer circunstância que
justifique, tais como a reunião de um consórcio, a escolha de uma pessoa para
uma posição que pode ser pública ou privada, a reunião do conselho de uma
empresa ou organização, a prova de nascimento ou qualquer outro evento que
exija a certificação legal de algo que ocorreu pela importância e porque no
futuro, de mediar à necessidade, pode servir como prova em um julgamento.
Em outras palavras, a ata é um registro escrito sobre todos os
acontecimentos e assuntos debatidos durante uma reunião ou outro tipo de
assembleia. A ata se configura como uma modalidade textual da linguagem
escrita, utilizada principalmente a nível profissional para manter o registro de
decisões e argumentos que foram previamente apresentados durante as reuniões.
Assim, pois, as decisões e todos os acontecimentos durante uma assembleia-
geral de condôminos são narrados em um documento chamado “Ata da
Assembleia”.
Por ter uma utilização formal, as Atas das Assembleias apresentam um
conjunto de normas de produção, que constituem a chamada “redação técnica”.
Algumas das regras básicas para a produção da Ata da Assembleia, por exemplo,
são as seguintes: 1) ausência de abreviaturas; 2) sem parágrafos ou alíneas; 3)
todos os números devem ser escritos por extenso; 4) não usar corretivos; 5) sem
rasuras ou emendas no texto; 6) verbos no pretérito perfeito do indicativo.
Caso o redator da Ata da Assembleia cometa algum erro durante a
produção da mesma, este deverá utilizar partícula retificativa no texto, como por
exemplo: “Aos trinta dias do mês de setembro, digo, de outubro, de dois mil e
quinze…”. No entanto, caso o erro só seja percebido depois de lavrada a Ata da
Assembleia, a correção deve ser feita em forma de errata. Por exemplo: “Onde se
lê setembro, leia-se outubro”.
Tal como ocorre com outros documentos públicos, a Ata da Assembleia
deve ter uma série de dados que serão cruciais para avaliar a sua validade e, no
entanto, geralmente é esculpida por um profissional ou pessoa familiarizada com
as técnicas de sua elaboração e que está autorizado a proceder em fazer isso. Tal
pessoa ou profissional deve ser eleita na assembleia-geral de condôminos. Com
efeito, vale lembrar que 2 (duas) pessoas, condôminos ou não, devem ser eleitas
como secretário e presidente para conduzir a assembleia-geral de condôminos e
redigir a Ata da Assembleia, os quais também devem assina-la.
Entre os dados que devem constar na Ata da Assembleia incluem os
seguintes: 1) data; 2) hora; 3) breve introdução sobre a causa do exposto; 4) ao
depois, no que é conhecido como um corpo da Ata da Assembleia, a pessoa
eleita para redigi-la faz a análise detalhada do que aconteceu no ato ou reunião
em questão, e que levou à realização deste ato em causa.
Estes são os dados mais básicos a serem incluídos na Ata da Assembleia,
e no caso, por exemplo, de ser uma reunião de condomínio, a qual é uma das
motivações para a criação de tal documento, deve-se consignar a lista de
condôminos participantes, resumo das discussões ocorridas durante o evento,
assim mesmo com as conclusões que foram alcançadas e se as mesmas chegaram
após uma votação, também conta como foi seu resultado.
Para dar a versão final, geralmente, se utiliza estilo de parágrafo onde
indica o momento em que o ato ocorrido chega ao fim e demarca no final as
assinaturas daqueles que estiveram presentes e prestaram plena conformidade.
Ademais, as Atas das Assembleias costumam, então, ser transcritas em
livros especialmente preparados e projetados para essa necessidade, com folhas
alinhadas e numeradas consecutivamente.
A Ata da Assembleia constitui documento que pode ser registrado em
cartório para ter validade contra terceiros.

“DIREITO CIVIL. REGISTRO DE ATA DE ASSEMBLEIA.
NEGATIVA. AJUIZAMENTO DA DÚVIDA INVERSA.
ILEGITIMIDADE. INTERESSE PROCESSUAL AUSENTE. 1.
Se o apresentante da ata para registro discorda da exigência feita
pelo oficial registrador deve suscitar o procedimento de dúvida
perante o cartório. esta será dirimida pelo juízo competente a
requerimento do oficial, havendo ilegitimidade do interessado
para ajuizar diretamente a dúvida inversa. 2. Recurso conhecido e
desprovido”.[437]


3.13 CONSELHO CONSULTIVO OU CONSELHO
FISCAL


Vimos que o art. 23 da Lei n° 4.591, de 16.12.1964,[438] prevê a eleição
de Conselho Consultivo, a ser formado por 3 (três) condôminos, em mandatos
não superior a 2 (dois) anos, com função de atuar como órgão consultivo do
síndico, para assessorá-lo na solução dos problemas que digam respeito ao
condomínio, podendo, ainda, a convenção condominial definir outras atribuições
específicas. No entanto, como dito antes, o art. 1.356 do Código Civil de 2002
[439]
alterou a nomenclatura “Conselho Consultivo”, de maneira a denominar tal
órgão de “Conselho Fiscal”, com participação livre, inclusive a de quem não
possui a qualidade de condômino (proprietário de unidade autônoma), facultando
a sua existência à deliberação de todos.
Portanto, o Código Civil de 2002 tornou opcional ou facultativo a
eleição de Conselho Consultivo ou Fiscal em condomínios edilícios. No entanto,
muito embora tenha se tornado facultativo, a sua constituição é de fundamental
importância para a boa gestão do condomínio. Tanto é que a não obrigatoriedade
atribuída pelo Código Civil de 2002 é, de certa forma, questionada até mesmo
por síndicos e administradores de condomínios. De maneira que, através das
convenções, eles determinam a existência de um Conselho Fiscal para que as
finanças do condomínio possam ser acompanhadas mais de perto.
É importante ter em mente que o Conselho Fiscal, formado por
condôminos, é órgão complementar do condomínio e jamais deve ser entendido
como uma função secundária ou burocrática. Cabe a esse importante grupo, com
integrantes eleitos em assembleia-geral, analisar as contas e emitir parecer
recomendando ou não a sua aprovação. Essas informações servirão de base para
que os demais condôminos ratifiquem a sua recomendação ou a contrariem, de
modo a evitar graves problemas nos caixas e na administração do condomínio.
Como função adicional, se prevista na convenção ou aprovada em assembleia-
geral, esse órgão condominial pode ainda assessorar o síndico ou administrador,
atuando como conselho consultivo. Vale registrar que é sempre importante o
síndico contar com uma equipe de pessoas participativas para “dividir“ as
decisões mais complexas que necessita tomar.[440]
Portanto, os artigos da convenção de condomínio devem prever, pelo
menos, o número de conselheiros do Conselho Fiscal com a indicação de
suplentes, estes com a atribuição principal de poder substituir os efetivos em
qualquer ausência das sessões, para ques estas não se efetuem com 2 (dois)
membros ou, pior ainda, com um só membro. É de toda a conveniência que os
conselheiros do Conselho Fiscal possam ser reeleitos, nunca, porém,
remunerados.
Alerta GABRIEL KARPAT que, em alguns casos, a execução das tarefas
do Conselho Fiscal gera confusão entre os condôminos, não sendo raro esse tipo
de problema. Tal problema ocorre quando há um grande equívoco por parte dos
membros de tal conselho, que entendem estarem aprovando ou não as contas da
gestão do síndico ou administrador, o que, de fato, não acontece. Existe apenas a
recomendação de sua aprovação ou reprovação, baseada nas justificativas
balizadas nas análises da contabilidade. A decisão final fica a cargo,
exclusivamente, pelos membros da assembleia-geral, ou seja, dos condôminos
reunidos justamente para este fim. O que se apresenta, geralmente, é ressalva nas
contas feitas pelo Conselho Fiscal e, na assembleia-geral, após esclarecimentos,
os condôminos tomam a decisão final sobre a prestação de contas. Mesmo na
ausência de atuação do Conselho Fiscal, o síndico deve cumprir sua obrigação
anual submetendo as finanças de sua gestão e buscar sua respectiva aprovação
junto aos condôminos. Porém, quando ocorre a ausência de aprovação, o síndico
deve tomar algumas providências para que sua gestão seja regularizada.Se julgar,
por exemplo, que a apreciação das contas foi insatisfatória pelo atual Conselho
Fiscal, com a aprovação dos demais membros da reunião, elege-se uma
comissão que fará uma nova avaliação. Se ainda for insatisfatória, esse trabalho
pode ser efetuado por uma empresa independente, especializada em auditoria.
Por sinal, em casos onde há a atuação de auditorias independentes, essas têm o
poder de analisar contas e fazer recomendações. Mas, a aprovação final dar-se-á
sempre única e exclusivamente pelos condôminos, reunidos em assembleia-
geral, especialmente convocada para esse fim.[441]
Nesse diapasão, ao Conselho Fiscal, cabe a avaliação das contas do
condomínio, sua exatidão e a correta aplicação dos recursos arrecadados e
aprovados na previsão orçamentária periódica. Os questionamentos, normais
nessa tarefa, sempre devem ser dirigidos ao responsável pela gestão, para que o
mesmo tenha oportunidade de esclarecer, se assim for o caso. Com essa forma de
conduta, síndico e condôminos terão a transparência que a gestão exige. E o
condomínio terá garantido a sua saúde financeira.

“APELAÇÃO CÍVEL. RESTITUIÇÃO AJUIZADA POR
CONDOMÍNIO. INOVAÇÃO RECURSAL. CONHECIMENTO
PARCIAL. PREJUDICIAL DE MÉRITO. REJEIÇÃO.
RESPONSABILIDADE DO SÍNDICO SOBRE ENCARGOS
DA MORA DEVIDOS AO INSS OCORRIDA NA SUA
GESTÃO. ALEGAÇÃO DE APROVAÇÃO DE CONTAS
PELO CONSELHO FISCAL. IRRELEVÂNCIA. RECURSO
PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA, NÃO PROVIDO.
1. Não se conhece do recurso na parte que versa sobre argumento
novo, não arguido no primeiro grau de jurisdição. 2. Afasta-se a
prejudicial de mérito, eis que não ultrapassado o prazo
prescricional legal entre a ciência do condomínio acerca das
irregularidades e o ajuizamento da ação. 3. Constatada a má-
gestão dos recursos do ente coletivo, o síndico deve responder
pelo excesso de representação e pelos prejuízos advindos da
ausência de recolhimento das contribuições previdenciárias dos
funcionários do condomínio. 4. Recurso conhecido em parte e,
nesta, não provido”.[442]

Como acontece com a escolha do síndico ou administrador, geralmente,
há um desinteresse geral em aceitar o cargo de conselheiros do Conselho Fiscal.
Todavia, os proprietários de imóvel que se apresentam em assembleia-geral para
participar do Conselho Fiscal devem saber que tal atuação exige dedicação.
Quando se candidata ao cargo de conselheiro, deve ter em mente a
responsabilidade de sua tarefa na conferência dos documentos e das contas que
compõem a movimentação financeira do período avaliado. Sua tarefa pressupõe
avaliação técnica. A sua divulgação antecipada ou avaliação precipitada não
condiz com uma conduta ética. Existe, aliás, uma tênue linha entre a ética e a
técnica. A quem se prontifica ocupar o cargo de conselheiro fiscal, cabe a função
de analisar as contas, sem deixar transpor qualquer que seja a sua preferência ou
gosto pessoal.

RECURSOS INOMINADOS - AÇÃO DE COBRANÇA
CONTRA SÍNDICO E CONSELHO FISCAL - AUTOR QUE
COMPROVA SUAS ALEGAÇÕES - REGRA DO ARTIGO 333,
I DO CPC CUMPRIDA - INDENIZAÇÃO DEVIDA -
RESPONSABILIDADE DO CONSELHO FISCAL
SUBSIDIARIA - SENTENÇA PARCIALMENTE
REFORMADA. Recurso do réu Nilton Cesar dos Santos
conhecido e desprovido. Recurso dos réus Manoel Divino
Chaves e Joeli Dias do Prado, conhecido e parcialmente provido.
Ante o exposto, esta Turma Recursal resolve, por unanimidade de
votos, CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso do
réu Nilton Cesar dos Santos e CONHECER e DAR PARCIAL
PROVIMENTO ao recurso dos réus Manoel Divino Chaves e
Joeli Dias do Prado, nos exatos termos deste voto”.[443]

Em relação ainda à competência do Conselho Consultivo ou Conselho
Fiscal, ela deve se restringir ao seguinte: a) elaborar com o síndico ou
administrador na administração do edifício e atender às suas consultas; b)
resolver os casos de caráter urgente que sejam submetidos à assembleia-geral de
condôminos e sobre eles emitir parecer; c) examinar e opinar sobre qualquer
assunto de caráter administrativo, perante o síndico ou a assembleia-geral de
condôminos; e) referendar o nome do banco indicado pelo síndico para a
manutenção da conta “Fundo de Reserva”; f) fiscalizar as atividades do síndico
ou administrador e comunicar aos condôminos, por carta protocolada, as
irregularidades porventura encontradas na gestão do condomínio; g) opinar sobre
os assuntos pessoais entre o síndico ou administrador e os condôminos; h)
autorizar obras de urgência imediata, de natureza imprevista, na impossibilidade
de ser ouvida a assembleia-geral de condôminos e quando o custo da mesma
ultrapassar o valor correspondente a 15 (quinze) vezes o salário-mínimo
regional. O Conselho Consultivo deve ser convocado sempre que necessário, por
seu presidente, por iniciativa deste ou a pedido do síndico ou administrador.

“PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE
NULIDADE DE ASSEMBLEIA-GERAL EXTRAORDINÁRIA
REALIZADA POR CONDOMÍNIO - DESTITUIÇÃO DA
SÍNDICA E DEVOLUÇÃO DE TAXAS CONDOMINIAIS -
IRREGULARIDADE NA CONVOCAÇÃO DA ASSEMBLEIA
- QUORUM INSUFICIENTE PARA AS DELIBERAÇÕES
EFETIVADAS - ART. 1.349 DO NCC - AÇÃO A JUIZADA
PELA EX-SÍNDICA CONTRA O CONDOMÍNIO -
SUPERVENIÊNCIA DE DECISÃO LIMINAR PROFERIDA
EM PROCESSO CAUTELAR RECONDUZINDO A AUTORA
À FUNÇÃO DE SÍNDICA - DECISÃO JUDICIAL NOS
AUTOS DA AÇÃO DECLARATÓRIA DETERMINANDO A
"ADEQUAÇÃO" DO PÓLO PASSIVO DA DEMANDA PARA
FAZER CONSTAR OS MEMBROS DO CONSELHO
CONSULTIVO DO CONDOMÍNIO EM RAZÃO DA
OCORRÊNCIA DO INSTITUTO DA CONFUSÃO -
PRELIMINAR - ILEGITIMIDADE DOS MEMBROS DO
CONSELHO CONSULTIVO - ACOLHIMENTO. I- Os
membros do Conselho Consultivo do condomínio são pessoas
flagrantemente ilegítimas para responder ação a juizada pela ex-
síndica, reconduzida ao cargo por força de liminar em processo
cautelar, porquanto não detêm a titularidade do direito material
controverso. cuida-se de membros do Conselho Consultivo
responsáveis pela convocação extraordinária da assembleia e que,
muito embora exerçam cargo diretivo do condomínio, não
possuem, isoladamente, representação. somente o condomínio
poderia sofrer os efeitos da declaração perseguida na inicial da
ação anulatória. acaso declarada a nulidade da assembleia, é
contra o condomínio que se estabelece a relação jurídica de
direito material. II- Não se há de cogitar, na hipótese, em
confusão conceitual entre autora e réu, por ser a autora também
representante do condomínio. isso porque, a legitimidade passiva
ad causam é do condomínio e não de sua representante legal. O
síndico, na condição de representante do condomínio, não pratica
atos em nome próprio, mas em nome exclusivo do condomínio.
III- recurso da autora julgado prejudicado em face do provimento
do apelo do réu para se acolher a preliminar de ilegitimidade
passiva”.[444]

Por fim, vale lembrar que uma vez eleitos pela assembleia-geral de
condôminos, os membros do Conselho Consultivo ou Conselho Fiscal somente
podem ser destituídos por meio de deliberação de Assembleia-Geral
Extraordinária – AGE.

“APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO
ANULATÓRIA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER.
DESTITUIÇÃO. CARGO DE CONSELHEIRO.
CONDOMÍNIO. DELIBERAÇÃO DO SÍNDICO. DECISÃO
UNÂNIME DA ASSEMBLEIA GERAL PARA RECONDUZIR
OS MEMBROS DO CONSELHO FISCAL. RECURSO
CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1.
Compete ao síndico cumprir e fazer cumprir a convenção de
condomínio. Todavia, para a destituição de membros do conselho
fiscal, órgão fiscalizador e consultivo do condomínio, devem ser
observadas as regras específicas para o assunto. 2. Adestituição
dos conselheiros fiscais deve se dar por meio de deliberação em
Assembleia Geral Extraordinária, especialmente convocada para
tal fim, nos termos do que dispõe a Convenção do Condomínio, e
não por ato unilateral do síndico. 3. AConvenção ainda
estabelece a competência da assembleia geral decidir em grau de
recurso os assuntos que tenham sido deliberados pelo síndico.
Assim, uma vez provido o recurso apresentado pelos
conselheiros, há que prevalecer referida decisão. 4. Há que se
respeitar a decisão da assembleia geral que restabelece todas as
competências aos conselheiros fiscais destituídos, por se
constituir em órgão soberano do condomínio, cabendo ao síndico
respeitar e cumprir as deliberações nela tomadas. 5. Recurso
conhecido e não provido”.[445]


3.14 EXTINÇÃO DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO


À princípio destacamos que o condomínio em edifício de apartamentos
consisti em condomínio especial ou forçado, não podendo os condôminos
extingui-lo por convenção ou por via judicial. De modo que, enquanto o prédio
subsistir em caráter coletivo, o condomínio é inextinguível. Há, então, que se
perder o caráter coletivo do prédio ou do conjunto de edificações para ser
possível a extinção do condomínio edilício.
A extinção do condomínio edilício pode de 6 (seis) maneiras diferentes::
1) extinção pela destruição involuntária, total ou de parte considerável do
prédio ou do conjunto de edificações, por qualquer motivo (1ª parte do art. 1.357
do Código Civil de 2002).[446] Apesar de o condomínio edilício ser condomínio
especial ou forçado, a realidade fática demonstra que ele pode perecer-se, ainda
que tenha o caráter de existência por prazo indeterminado.[447] No mesmo
sentido, Rodrigues menciona que “o condomínio em edificações extingue-se
pela destruição deste, se a maioria dos proprietários resolverem não reconstruir”.
[448]
Com efeito, em restando destruído o prédio ou o conjunto de edificações, o
terreno que, por ficção legal, era acessório do principal, cobra sua qualidade de
principal e os donos se encontram na situação de condôminos na forma
tradicional.; 2) extinção pela demolição voluntária do prédio ou do conjunto de
edificações por razões urbanísticas ou arquitetônicas, ou por condenação do
edifício pela autoridade publica, por motivo de insegurança ou insalubridade ou
por ameaça de ruína (1ª parte do art. 1.357 do Código Civil de 2002). Mesmo na
hipótese de haver seguro sobre todo o prédio e de se haver estipulado a
reconstrução, o primeiro condomínio em edificações efetivamente se extinguiu,
com a destruição do prédio; um outro poderá surgir com a construção nova, mas
aquele originário se acabou, está extinto. Este novo condomínio pode ser
material e juridicamente idêntico ao anterior, mas é um novo sistema, porque o
condomínio em edificações, com suas disposições, regras e especialidade,
decorre de uma situação de necessidade que implica a existência das partes
comuns e dos direitos mútuos, tal como as colunas estão para uma casa. Retira-
se as velhas colunas e a casa antiga deixa de existir; as colunas velhas retiradas
não servirão para sustentar outra casa, agora nova, a qual reclama novas colunas;
3) extinção pela alienação do prédio ou do conjunto de edificações: pode ser
alienada a qualquer tempo para se dividir o dinheiro, e acabar com o
condomínio, principalmente pela possibilidadede o prédio ou do conjunto de
edificações vir a ruir ou pela alienação pura e simples a uma pessoa jurídica ou
natural. Na primeira hipótese (possibilidade de ruir), devem por voto que
representem metade mais uma das frações ideais dos condôminos decidir pela
reconstrução ou pela alienação do prédio ou do conjunto de edificações. Uma
vez determinada a reconstrução, “promover-se-á o rateio da importância
apurada, proporcionalmente ao valor das unidades imobiliárias”,[449] mas o
condômino poderá eximir-se do pagamento das despesas referentes, alienando
seus direitos aos outros condôminos, mediante avaliação judicial. Se for decida a
alienação do prédio ou do conjunto de edificações, haverá preferência ao
condômino em relação ao estranho e o preço alcançado será repartido entre os
condôminos, proporcionalmente ao valor de suas unidades imobiliárias (§§ 1º e
2º do art. 1.357 do Código Civil de 2002); 4) extinção pela desapropriação: a
desapropriação, como modalidade de extinção do condomínio, pode ser em prol
da utilidade pública ou interesse social. O art. 1.358 do Código Civil de 2002
“preconiza a distribuição do produto da indenização entre os condôminos, na
proporção de suas frações ideais, excepcionando-se a desapropriação para fins
de função social urbana, paga por meio de títulos da dívida pública”.[450] Cm
efeito, nesta hipótese, a indenização será repartida entre os condôminos, na
medida de sua fração ideal, ou seja, na proporção do valor das unidades
imobiliárias (art. 1.358 do Código Civil de 2002).[451] Na realidade, na hipótese
de desapropriação, os valores das unidades autônomas pertencerão a cada
titular, repartindo-se por rateio o equivalente ás partes comuns, dividindo-se a
indenização pelas respectivas quotas; 5) extinção pela confusão: nesta hipótese
um condômino adquire para si o restante das unidades autônomas. No mesmo
sentido, NELSON ROSENVALD menciona que a confusão se dá “quando uma
pessoa – condômino ou terceiro – adquire todas as unidades autônomas e não
deseje manter a divisão para eventual alienação futura”.[452] Portanto, acerca do
fenômeno da confusão, o condomínio extingue-se pela concretização numa só
pessoa da propriedade de todas as unidades autônomas. Um proprietário poderá
ir adquirindo as unidades dos demais condôminos; e, como as partes comuns e o
terreno são acessórios do principal, apartamentos e andares, haverá um tempo
em que aludido adquirente se acabará se tornando dono do todo. Nessa ocasião,
feitas as declarações necessárias, terá desaparecido o regime de condomínio
edilício; 6) extinção pela decomposição do prédio ou do conjunto de
edificações: o condomínio edilício, além disso, extingue-se pela deliberação dos
condôminos, cuja unanimidade decidiu decompor o prédio num condomínio de
forma tradicional, cada proprietário tornando-se senhor de uma parte ideal do
todo. Nessa hipótese, cancela-se no Registro de Imóveis a autonomia das
unidades; anula-se a convenção condominial, e desaparece o regime de
condomínio edilício.








CAPÍTULO IV – LOTEAMENTO
CONVENCIONAL FECHADO

4.1 LOTEAMENTO ABERTO OU CONVENCIONAL


A Lei do Parcelamento do Solo Urbano conceitua o loteamento para fins
urbanos (espécie de parcelamento do solo) como sendo a “subdivisão de gleba
em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de
logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias
existentes” (§ 1º do art. 2º da Lei n° 6.766, de 19.12.1979).[453]
Na definição de EURICO DE ANDRADE AZEVEDO, o parcelamento
do solo é a divisão de uma gleba em lotes, que passam a ter vida autônoma, com
acesso direto à via pública. A gleba parcelada perde a sua individualidade, a sua
caracterização originária, dando nascimento a várias parcelas individualizadas,
que recebem o nome de “lotes”. Daí a denominação de “loteamento” (lotear uma
área urbana). Com efeito, o parcelamento para fins urbanos ou parcelamento
urbanístico destina-se a integrar a gleba na cidade, permitindo que ela passe a
ter usos urbanos, ou seja, uso residencial, comercial, industrial e institucional.
[454]

Já ÁLVARO PESSOA menciona que, no loteamento, “o terreno loteado


perde sua individualidade objetiva transformando-se em lotes que se
individualizam como unidades autarquicamente bastantes em si mesmas;
inexiste o estado e a pluralidade de comunhão; cria-se um bairro, cujo
equipamento urbano (inclusive as vias, estradas e caminhos, como públicos que
passam a ser com o registro imobiliário) passa a participar do sistema viário
local e do orbe municipal”.[455]
A esse respeito, a livre-docente em Direito Administrativo pela
Faculdade de Direito da PUC/SP LÚCIA VALLE FIGUEIREDO (1935-2009)
esclarece que, afora o aspecto da individualização dominial das frações (lotes)
do loteamento, sob a perspectiva das áreas públicas, que se cria com o ato de
lotear uma gleba, o Poder Público adquire bens por força da lei ou ministerio
legis.[456]
ROBERTO BARROSO, por sua vez, acrescenta que, uma vez “aprovado
o loteamento pela municipalidade, os espaços livres, as vias e praças, assim
como outras áreas destinadas a equipamentos urbanos tornam-se inalienáveis; e,
com o registro do loteamento, transmitem-se, automaticamente, ao domínio
público do Município, com a afetação ao interesse público especificado no Plano
do Loteamento. Tal transferência dos bens ao domínio público e sua afetação aos
fins públicos indicados no Plano do Loteamento independem de qualquer ato
jurídico de natureza civil ou administrativa (escritura ou termo de doação) ou ato
declaratório de afetação”.[457]
Analisando os fundamentos que justificam a transmudação de parcela
da propriedade privada para o domínio público (art. 4º da Lei n° 6.766, de
19.12.1979), ROBERTO BARROSO esclarece que ela se opera pelo chamado
concurso voluntário, instituto pelo qual “o loteador propõe e a Administração do
Município aceita a transferência à municipalidade do domínio e posse dos
espaços destinados às vias e praças e aos espaços de uso comunitário integrantes
do conjunto urbanístico cuja aprovação é proposta. Com o pedido de aprovação
do loteamento, o particular dá início ao processo de formação do concurso
voluntário, por via do qual passarão ao domínio público as áreas destinadas ao
sistema de circulação (ruas e praças), à implantação de equipamentos urbanos e
comunitários (escola, posto de saúde, etc.), bem como a espaços livres de uso
público, de proteção ambiental ou de preservação paisagística.
Esses espaços, destinados à afetação ao interesse público ou a acudirem
ao bem geral da comunidade passarão a integrar o patrimônio público municipal,
no qual haverão de ficar gravados de indisponibilidade, por constituírem parcela
do loteamento destinada à satisfação do interesse público, especialmente no
âmbito comunitário do bairro”.[458]


4.2 LOTEAMENTO E SUA FUNÇÃO PÚBLICA


Nas palavras de JOSÉ AFONSO DA SILVA, o loteamento é uma
modalidade de urbanificação, a qual se define como forma de ordenação
urbanística do solo ou “atividade deliberada de beneficiamento ou
rebeneficiamento do solo para fins urbanos, quer criando áreas urbanas novas
pelo beneficiamento do solo ainda não urbanificado, quer modificando solo já
urbanificado”. Por sinal, a urbanificação se distingue perfeitamente da
urbanização, a qual é “um fenômeno espontâneo de crescimento das
aglomerações urbanas em relação com a população rural”.[459]
Acrescenta ROBERTO BARROSO que o loteamento é, de ordinário,
matriz de um novo bairro residencial da cidade, um patrimônio da coletividade.
De fato, a nova realidade urbanística resultante da implantação do loteamento,
como é óbvio, afeta à cidade como um todo, sobrecarregando seus equipamentos
urbanos, sua malha viária e toda a gama de serviços públicos de infraestrutura da
cidade. Inclusive, a transcender desses direitos subjetivos dos proprietários de
unidades imobiliárias dos loteamentos, deve-se reconhecer, mesmo, a existência
de um direito comunitário, de todo o povo, ao desfrute do novo bairro, como
unidade urbanística do todo que é a cidade. O loteamento, sob essa visão, não é
patrimônio de um conjunto de pessoas, mas, sim, núcleo urbano de interesse
comum de todos.[460]
JOSÉ JESUS CAZETTA JUNIOR esclarece que, conquanto essa
atividade urbanística de lotear uma gleba seja de tradicional iniciativa de
particulares, proprietários de glebas indivisas, ainda assim, nos estudos
contemporâneos de Direito Urbanístico é firme a tendência de superar a
tradicional concepção de que haveria, nesse caso, simples exercício de faculdade
derivada do domínio, para qualificar a modificação ou a criação de áreas urbanas
como uma função pública, atribuída, essencialmente, ao Município. Por isso se
sustenta, na doutrina, que o particular, quando realiza um loteamento urbano e
nele executa obras e serviços de infraestrutura, está, em verdade, em nome
próprio, no interesse próprio e às próprias custas e riscos, exercendo uma
atividade que pertence ao poder público municipal, qual seja a de oferecer
condições de habitabilidade à população.[461]
Isso porque, para o ato de lotear, além das cláusulas convencionais
estabelecidas pelo loteador, há que se atender as normas civis e urbanísticas. Por
sinal, as cláusulas convencionais, que vinculam os adquirentes dos lotes,
constam do memorial descritivo do loteamento apresentado à Prefeitura (que
aprova o respectivo projeto) e do contrato-padrão, os quais são arquivados no
Registro de Imóveis, para a devida publicidade (inciso II do § 2º do art. 9º,[462]
inciso VI do art. 18,[463] e inciso VII do art. 26,[464] todos da Lei n° 6.766, de
19.12.1979). São aquelas que, por exemplo, proíbem ao proprietário do lote a
construção de muros frontais ou as edificações plurifamiliares (prédios de
apartamentos), obrigam a construir piscinas, a obedecer recuos maiores,
arborizar o passeio, etc. As normas civis, de edição exclusiva da União Federal
(inciso I do art. 22 da CF), regram, por exemplo, o direito de propriedade, na sua
substância e transformações dominiais (a translação da propriedade dos lotes,
seu modo e forma de aquisição e alienação), o trespasse de áreas privadas para o
domínio do município (com o registro do loteamento), as cláusulas contratuais
que protegem os adquirentes dos lotes (limites para a multa moratória, registro
do compromisso de compra e venda, outorga da escritura, devolução de quantias
pagas, etc.). Já as normas urbanísticas, notadamente as editadas pelo Município,
dizem respeito à ordenação do território, tendo em vista o traçado urbano, o
sistema viário, as áreas livres, a construção urbana, a estética da cidade,
expressas em limitações urbanísticas que organizam os espaços habitáveis,
propiciando ao homem melhores condições de vida em comunidade, regrando o
uso da propriedade.[465]
Em suma, usando as palavras de HELY LOPES MEIRELLES, “as
limitações urbanísticas incidem sobre a utilização da propriedade, enquanto que
as imposições civis incidem sobre o direito de propriedade em si mesmo”.[466]


4.3 CONFUSÃO DOUTRINÁRIA A RESPEITO DAS
ESPÉCIES DE LOTEAMENTO


Como vimos antes e como alerta oportunamente ELVINO SILVA
[467]
FILHO, a doutrina especializada costuma fazer confusão entre as espécies de
loteamentos, na medida em que se empregam as expressões loteamento fechado,
loteamento especial, loteamento em condomínio e condomínio horizontal como
sinônimas dessa forma de aproveitamento condominial do espaço para a
formação dos condomínios especiais de casas térreas ou assobradadas (art. 8º da
Lei n° 4.591, de 16.12.1964).[468]

“LOTEAMENTO FECHADO X CONDOMÍNIO FECHADO –
ASSOCIAÇÃO DE MORADORES QUE NÃO SE CONFUNDE
COM O CONDOMÍNIO – ART. 5°, XXI, DA CF/88 –
HIPÓTESE DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL QUE
EXIGE AUTORIZAÇÃO EXPRESSA – PREENCHIMENTO
DOS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS DELINEADOS PELO
STF – ILEGIMITIDADE ATIVA AFASTADA –
LOTEAMENTO IRREGULAR – RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA DO LOTEADOR,
ADMINISTRADOR/MANDATÁRIO E PRESTADORAS DE
SERVIÇOS – ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA –
CHAMAMENTO AO PROCESSO DO MUNICÍPIO –
IMPRESCINDIBILIDADE – PODER-DEVER DE
PROMOVER, PLANEJAR E CONTROLAR O USO,
PARCELAMENTO E OCUPAÇÃO DO SOLO –
INTELIGÊNCIA DO ART. 30, VIII, DA CF/88 –
POSSIBILIDADE DE APROVEITAMENTO DA PROVA
REALIZADA – SEGUNDA PERÍCIA PREJUDICADA – FATO
NOVO E PERDA DO OBJETO – IMPOSSIBILIDADE -
SENTENÇA ANULADA. 1. Loteamento fechado X condomínio
fechado. Diferente do condomínio edilício, horizontal ou vertical,
no parcelamento do solo urbano, a gleba original desaparece,
surgindo os lotes individuais, com individualidade própria, se
desprendendo daquela com total independência, com
confrontação própria, que os localiza, materialmente, com
precisão, no universo da primitiva gleba. Além disso, o que mais
diferencia o loteamento tradicional da Lei 6.766/1979 do
condomínio fechado, é que, com exceção dos novos lotes
constituídos, por força do artigo 22 do diploma, a partir do
registro do loteamento, ‘as vias e praças, os espaços livres e as
áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos
urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo’ passam
a integrar o domínio do Município, como bens de uso comum do
povo, tornando-se inalienáveis e afetados ao interesse público
(Artigo 99 do Código Civil). 2. Ilegitimidade ativa. Tratando-se
de ação individual movida por associação civil na defesa dos
direitos individuais de seus associados deve ser observado o
disposto no art. 5°, XXI, da Constituição Federal, que, na esteira
do entendimento do Supremo Tribunal Federal, cuida de hipótese
de representação processual, razão pela qual a autorização
expressa lá mencionada exige, cumulativamente, "(a) cláusula
estatutária de autorização e (b) manifestação autorizadora
específica do órgão deliberativo máximo, que é a assembleia
geral dos filiados", como pressupostos processuais para aferição
de sua capacidade para estar no processo em defesa de direitos
individuais homogêneos de seus membros, os quais foram
devidamente atendidos pela autora. Ilegitimidade ativa afastada.
3. Ilegitimidade passiva. A solidariedade não se presume: ou há
de resultar de disposição de lei ou de declaração de vontade. No
caso dos autos, todas as corrés são responsáveis pelos danos ao
loteamento, respondendo, cada qual, nos limites de sua atuação, o
que encerra, portanto, matéria de mérito e, como tal, deverá ser
oportunamente analisada, razão pela devem permanecer no polo
passivo da demanda. Ilegitimidade passiva afastada. 4.
Chamamento ao processo. No chamamento ao processo,
diferentemente da denunciação da lide, o réu da ação primitiva
convoca para a relação processual pessoa que, nos termos do art.
77, III, tem, em conjunto com ele, uma obrigação solidária
perante o autor da demanda principal e, embora não seja
obrigatório, se o réu lança mão do incidente, para obter título
executivo contra o devedor solidário, não é permitido ao juiz, em
regra, denegar tal pretensão. No caso, o Município tem o poder-
dever de promover, planejar e controlar o uso, parcelamento e
ocupação do solo urbano, e, nos termos do Lei 6.766/79, uma vez
aprovado o projeto, realizada a vistoria, efetuado o recebimento e
registrado o loteamento, em consonância com o inc. V do art. 18
e 22 da norma, as obrigações oriundas do referido parcelamento
passam à alçada municipal, uma vez que as vias e praças, os
espaços livres e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros
equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial
descritivo passam a integrar o domínio do Município. Sentença
anulada. 5. Prova Pericial. A Municipalidade tomará ciência do
laudo pericial encartado e, poderá, oportunamente, apresentar
seus quesitos complementares, hipótese em que deverá o expert
judicial apresentar um laudo complementar, se o caso,
considerando as alegações apresentadas por este último, bem
como suas críticas finais que deixou de ofertar em virtude da
notícia de fato superveniente, com o que se poderia aproveitar a
prova já realizada e complementá-la de modo a se garantir a
ampla defesa e o contraditório, em benefício de todas as partes,
sobretudo daquela recém-chegada. Ressalva-se, contudo, a
depender do posicionamento a ser adotado por esta última, a
possibilidade de o d. Juiz presidente do processo, a quem
compete o dever primário de efetivar o princípio do devido
processo legal, determinar o refazimento de toda a prova pericial,
pelo mesmo ou por outro perito, razão pela qual merece parcial
provimento o agravo retido interposto pela corré INDAIÁ. 6.
Fato novo. Não se depreende da causa de pedir constante da
exordial a falha nos projetos de terraplanagem da rua Carlos
Drummond de Andrade, objeto da segunda perícia, a configurar
fato novo e alheio à discussão assentada nesta ação, razão pela
qual deve ser resolvido em ação autônoma, em respeito ao
princípio da estabilização da demanda. Aliás, nem há de se
cogitar que o segundo laudo seria uma emenda do primeiro, a
despeito de ter sido realizado em resposta aos quesitos
‘complementares’ formulados pela associação-autora, vez que se
trata, em verdade, de quesitos novos. Deve ser reconhecida,
inclusive, a perda do objeto da segunda perícia, nos termos do
artigo 462, do CPC, uma vez que a rua encontra-se devidamente
reconstruída, conforme consta no andamento processual da
oposição de terceiros movidas pelos moradores da rua atingida,
no qual as partes conciliaram, bem como nas fotografias trazidas
aos autos pela associação autora. Segunda perícia prejudicada.
RESULTADO: agravos retidos das corrés Milano e Indaiá
conhecidos e desprovidos em relação à ilegitimidade ativa,
passiva e prescrição. Agravos retidos da corré Indaiá conhecidos
e providos para anular a sentença e determinar o chamamento ao
processo do Município de Embu das Artes; apelações
prejudicadas”.[469]

HELY LOPES MEIRELLES, por exemplo, em parecer versando sobre a
aprovação de empreendimento com dimensão de 392.328 m2, concebido pela
então consulente como condomínio (apesar da extensão da gleba) opinou assim
se expressou: “os loteamentos especiais, também conhecidos por condomínio
horizontal ou loteamento fechado, vêm sendo implantados consoante a
permissão genérica da Lei federal n° 4.591, de 16.12.1964 (art. 8º), mas, na
maioria dos casos, sem normas locais regulamentares de seus aspectos
urbanísticos. Tais loteamentos especiais ou fechados são bem diferentes dos
loteamentos abertos ou convencionais, pois que continuam como áreas
particulares, sem vias públicas e com utilização privativa de seus moradores”.
“Portanto, a lei aplicável aos loteamentos fechados ou condomínios horizontais é
a de Lei n° 4.591, de 16.12.1964, por força do art. 3º do Decreto-Lei n° 271, de
28.02.1967 (dispõe sobre loteamento urbano, responsabilidade do loteador
concessão de uso e espaço aéreo),[470] e aos loteamentos abertos ou
convencionais é a Lei n° 6.766, de 19.12.1979 (dispõe sobre o Parcelamento do
Solo Urbano)”.[471]

“1. Agravo inominado contra decisão monocrática do relator que
negou provimento à apelação. ação de cobrança de cotas
‘condominiais’. rito sumário. loteamente convencional que se
transformou em loteamenteo fechado. cotas de rateio instituídas
por associação de moradores. quando o morador da localidade
voluntariamente não se associa, deixando de aderir ao rateio das
despesas dos serviços, recusando-se a pagar a impropriamente
chamada ‘contribuição condominial’, não há como sustentar a
sua obrigatoriedade. apenas o condomínio organizado na forma
da Lei 4591/64 autoriza a cobrança de despesas condominiais nos
moldes nela previstos. prevalência do direito constitucional à
livre associação (art. 5°, XX, CF) sobre o princípio
infraconstitucional do enriquecimento sem causa. 2. O autor,
pessoa jurídica de direito privado, intitulando-se ‘condomínio
enseada mar do norte’, em rio das ostras,. postulou a condenação
do réu, proprietário do Lote 22, da Quadra C, ao pagamento de
R$ 30.616,82, referente a cotas condominiais vencidas, e não
pagas, a partir do mês de julho de 2004 até agosto de 2008,
corrigidas monetariamente, acrescidas de juros e multa, além das
cotas vincendas e honorários advocatícios no percentual de 20%
no total de R$ 30.616,82. 3. em contestação, o réu, proprietário
de lote de terreno, afirma que adquiriu seu terreno em loteamento
e não em condomínio. refuta a natureza das contribuições que lhe
estão sendo exigidas, afirmando que a certidão do ofício de
imóveis anexada com a inicial deixa claro que os sete
proprietários da área estavam aprovando não uma ata de
instalação de condomínio mas sim um projeto de loteamento com
270 lotes e providenciando o arquivamento do memorial como
exige o Dec. Lei 58/37, concluindo que o rateio ali previsto não
têm natureza de cotas condomíniais. acrescenta, em reforço a
essa tese, que o documento de fls. 08 (‘comprovante de inscrição
e de situação cadastral’) traz, no campo ‘nome empresarial’, a
designação ‘Condomínio Enseada Mar do Norte’ e , no campo
‘código e natureza jurídica’, a designação ‘302-6 – Associação’,
pelo que o rateio diz respeito às despesas instituídas pela
associação de moradores. diz que a cobrança de tais cotas estaria
prescrita, pois fundamentada em ressarcimento de
enriquecimento sem causa, cujo prazo é de 3 anos (art. 206, §3°,
IV, CC/2003). Acrescenta que anteriormente `a presente ação ele
ajuizou contra a ora autora, na mesma comerca de rio das ostras,
ação declaratória de negativa de débito, estando aquele juíz
prevento para esta demanda. 4. Sentença de procedência do
pedido para condenar o réu ao pagamento, em favor do
condomínio autor, do principal, mais juros e correção monetária,
incluídas as prestações vencidas e vincendas. o juiz entendeu que
o autor é um condomínio e não uma associação, ressaltando ‘que
o Autor não se trata de associação, eis que Condomínio
devidamente instituído através de escritura pública registrada no
Registro de Imóveis. Assevere-se que o fato de haver loteamento
não impede a constituição de condomínio, ainda que de fato’. 5.
Apelação do réu. decisão monocrática deste relator negando
seguimento à apelação, entendendo, igualmente, tratar-se de
‘.condomínio legalmente constituído’. 6. Agravo inominado do
réu pretendendo a reconsideração da decisão monocrática com a
reforma da decisão do juízo a quo. insiste na tese de que o autor
não passa de uma associação de moradores cobrando cotas de
rateio. agravo inominado que merece prosperar. reconsideração
da decisão. melhor reexaminando a prova produzida à luz da
doutrina e jurisprudência sobre loteamentos fechados, constata-se
que, no caso em tela, estamos diante de uma associação de
moradores constituída sobre um loteamento fechado (regido pela
Lei 6766/79), e não de um condomínio edilício, razão pela qual
não se aplica o artigo 8° da Lei 4591/64. Frise-se que o
condomínio edilício se constitui, nos termos do art. 1331 e 1332
do CC/2003, com a convenção, registrada no ofício de imóveis,
discriminando e individualizando unidades de propriedades
exclusivas, estremadas uma das outras, e partes comuns, bem
como determinando a fração ideal atribuída a cada unidade,
relativamente ao terreno e partes comuns, além de especificar o
fim a que as unidades se destinam. diferentemente, no loteamento
existem unidades de propriedade particular e áreas pertencentes
ao poder público. no caso em tela a convenção criou uma
associação de moradores para disciplinar o rateio das despesas
com segurança e limpeza das áreas pertencentes à prefeitura e de
uso comum (ruas, praças, etc, repito, pertencentes ao município)
despesas essas que, em princípio, por se tratar de área pública,
caberiam ao poder público, sabidamente omisso nesses serviços.
em se tratando de loteamento, a aprovação do seu projeto faz
com que os espaços institucionais, ruas e praças, sejam
transmitidos ao município, ficando afetados à finalidade pública,
cabendo ao município, como titular daqueles espeaços, assegurar
os serviços de segurança, iluminação, limpeza, entre outros.
Todavia, diante da conhecida omissão do poder público na
prestação desses serviços, o que se vê, cada vez mais, é a
privatização daqueles espaços públicos, o que é ilegal, já que se
trata de área pública de uso comum de todos, constitucionalmente
inalienável. é o que ocorreu também no caso em tela, em que um
loteamento convencional se transformou em loteamento fechado,
com uma associação de moradores instituindo cotas de rateio
para fazer face às despesas com área pertences à prefeitura Essas
cotas de rateio não têm natureza de cotas condominiais.
Instituídas por associações de moradores (o documento de fls. 08
não deixa dúvida a respeito, apontando no campo ‘código e
descrição da natureza jurídica: ‘302-6 – Associação’), só podem
ser exigidas dos que com ela anuiram. não há prova nos autos de
que o autor tenha aderido à associação autora. logo, não pode ser
compelido ao pagamento. Precedentes jurisprudenciais do STJ
em favor da defesa do réu. provimento do agravo inominado
para, reformando a sentença, julgar improcedente o pedido
autoral, invertendo-se o ônus da sucumbência”.[472]

Se não bastasse isto, HELY LOPES MEIRELLES reitera seu
pensamento da seguinte maneira: “loteamentos especiais estão surgindo,
principalmente nos arredores das grandes cidades, visando a descongestionar as
metrópoles. Para estes loteamentos não há, ainda, legislação superior específica
que oriente a sua formação, mas nada impede que os Municípios editem normas
urbanísticas locais adequadas a essas urbanizações. E tais são os denominados
loteamentos fechados, loteamentos integrados, loteamentos em condomínio, com
ingresso só permitido aos moradores e pessoas por eles autorizadas e com
equipamentos e serviços urbanos próprios, para autosuficiência da comunidade.
Essas modalidades merecem prosperar. Todavia, impõe-se um regramento legal
prévio para disciplinar o sistema de vias internas (que, em tais casos, não são
bens públicos de uso comum do povo) e os encargos de segurança, higiene e
conservação das áreas comuns e dos equipamentos de uso coletivo dos
moradores, que tanto podem ficar com a Prefeitura como com os dirigentes do
núcleo, mediante convenção contratual e remuneração dos serviços por preço ou
taxa, conforme o caso”.[473]
No mesmo sentido, EURICO DE ANDRADE AZEVEDO, ao defender a
implantação de condomínio de casas em imóvel com área de 1.000.000 m2,
colocou mais lenha na confusão, quando menciona o seguinte: “Diversamente do
loteamento convencional, o loteamento fechado, também chamado por
condomínio horizontal, vem sendo implantado sob a permissão genérica do art.
8º da Lei n° 4.591, de 16.12.64, mas sem nenhuma regulamentação de seus
aspectos urbanísticos. Trata-se de modalidade nova de aproveitamento do
espaço, em que se procura conjugar a existência de lotes individuais de uso
exclusivo com áreas de uso comum dos condôminos, à semelhança do que
ocorre nos edifícios de apartamentos. No loteamento fechado não há vias e
logradouros públicos; as áreas destinadas à circulação e lazer não são
transferidas ao Poder Público, pois continuam a pertencer aos proprietários da
gleba, que sobre elas têm utilização privativa”.[474]
Entretanto, JOSÉ AFONSO DA SILVA não cai no mesmo equívoco,
muito pelo contrário, traz oportuna luz à matéria, quando esclarece que, embora
os loteamentos fechados (condomínios de casas) se assemelhem aos loteamentos
convencionais, na verdade destes diferem, quer pelo seu regime, quer quanto aos
seus efeitos. Aqueles constituem modalidade especial de aproveitamento
condominial de espaço para fins de construção de casas residenciais térreas ou
assobradadas ou edifícios. Seu regime jurídico é o do direito privado, com
natureza jurídica de condomínio privado (art. 8º da Lei 4.591, de 16.12.64).[475]
JOSÉ AFONSO DA SILVA adverte ainda que o instituto previsto no art.
8º da Lei de Condomínio e Incorporações (Lei n° 4.591, de 16.12.64) tem sido
utilizado de forma abusiva, havendo situações de loteamentos fechados de
exageradas dimensões (como aqueles examinados nos dois pareceres de Hely
Lopes Meirelles e de Eurico Andrade Azevedo), alguns com mais de mil casas,
muitos deles proporcionando a criação de quadras que são divididas em lotes e
um verdadeiro arruamento, devendo ser evitados pelas Prefeituras, de modo a
exigir a execução de parcelamento do solo para fins urbanos, regido pelas
normas afins, ainda que se trate de subdivisão de quadra inteira em lotes, com o
aproveitamento do sistema viário.[476]
Para os defensores da viabilidade desses “loteamentos fechados” (os
grandes condomínios), nenhum problema podem estes acarretar, haja vista que,
além de serem mantidos pelos condôminos, sem gastos para o erário, no mais
das vezes eles estão situados fora dos grandes centros, distantes da maior
concentração urbana.[477]
No entanto, nos chamados loteamentos condominiais, regidos pelo art. 8º
da Lei n° 4.591, de 16.12.64, adverte JOSÉ AFONSO DA SILVA que, com o
passar do tempo, os encargos desse assentamento vão se tornando insuportáveis
para os condôminos. O incorporador, porque já vendeu todas as unidades, não se
interessa pela sorte do loteamento. As vias internas passam a não ter mais
conservação adequada. Recorre-se, então, à Administração Pública para que esta
assuma e aceite o sistema das vias internas, gerando conflitos de interesse
urbanístico, uma vez que nem sempre esse sistema corresponde às exigências
urbanísticas para a execução de loteamentos convencionais, como a largura das
ruas, sua declividade, alinhamento, etc. Ainda que situados fora do perímetro
urbano, esses problemas não deixarão de existir, pois esses loteamentos sempre
constituirão “um núcleo urbano com necessidades urbanas e, portanto,
manifestação do desenvolvimento urbano, especialmente se construído para
residência permanente, o qual, mais cedo ou mais tarde, vai requerer a
intervenção municipal, para suprir deficiências do regime condominial de
natureza privada e para corrigir distorções urbanísticas decorrentes do interesse
econômico que moveu os organizadores, incorporadores e executores da obra”.
[478]



4.4 LOTEAMENTOS CONVENCIONAIS FECHADOS


Os loteamentos convencionais regidos pela da Lei n° 6.766, de
19.12.1979, segundo JOSÉ AFONSO DA SILVA, são fechados por ato do
loteador ou de uma associação de moradores, demonstrando a sua ilegalidade.
Com efeito, “os tais loteamentos fechados juridicamente não existem; não há
legislação que os ampare, constituem uma distorção e uma deformação de duas
instituições jurídicas: do aproveitamento condominial de espaço e do loteamento
ou do desmembramento. É mais uma técnica de especulação imobiliária, sem as
limitações, as obrigações e os ônus que o Direito Urbanístico impõe aos
arruadores e loteadores do solo”.[479]
Na opinião de EROS ROBERTO GRAU, a proliferação dos loteamentos
em condomínio encontra razão de ser na indisfarçável forma de escapar às
exigências da Lei n° 6.766, de 19.12.1979, na medida em que sua instituição não
se dá em razão de iniciativa de incorporação imobiliária regida pela Lei n°
4.591, de 16.12.64, porque o empreendedor não assume a obrigação de neles
edificar as casas, como preceitua o art. 8º desse diploma. E arremata o jurista que
as chamadas áreas de passagem comum desses condomínios fechados “não
podem ser cercadas ou bloquedas, de modo que impeça o seu uso normal por
qualquer pessoa, evitando-se o acesso a quem quer que seja ao condomínio”.[480]
Da mesma forma, DIÓGENES GASPARINI, ao analisar a criação dos
chamados loteamentos privé, loteamentos integrados, loteamentos especiais,
loteamentos integrais, loteamentos fechados ou loteamentos em condomínio,
expressa o entendimento no sentido de que de reconhecer a ilegalidade do ato da
Administração que os autoriza. “Não se subsumindo tais loteamentos ao regime
do Código Civil e não se submetendo aos ditames da Lei de Condomínio, não se
tem como legalizá-los. O nosso ordenamento jurídico, pelo menos até o
momento, não os acolhe e a atividade administrativa para autorizá-los não se
legitima, dado que não está a presidi-la o princípio da legalidade”.[481]

“LOTEAMENTO. - Associação de moradores devidamente
constituída - Legitimidade ativa configurada - Cobrança de taxa
de manutenção e conservação - Não cabimento - Condomínio
fechado não caracterizado - Área aberta e sem cancelas -
Existência de estabelecimentos comerciais - Serviços prestados
pelo Poder Público - Taxas que só podem ser cobradas dos
associados - Recurso desprovido”.[482]

“Apelação. Ação de cobrança. Associação de moradores.
Loteamento não constituído como condomínio. Apesar de ser
possível, em tese, para que a associação possa cobrar taxa dos
moradores do loteamento, é necessária previsão no ato
convencional do loteamento. Ausência de comprovação de que o
loteamento seria fechado, além de não demonstração de adesão
do réu à associação. Elementos dos autos que indicam que seu
imóvel sequer era beneficiado pelo serviço de vigilância.
Pretensão improcedente. Honorários advocatícios fixados em R$
1.000,00. Litigância de má-fé não configurada. Recurso
parcialmente provido”.[483]

DIÓGENES GASPARINI e JOSÉ AFONSO DA SILVA são unânimes
em concluir que os Municípios não podem autorizar essa forma de loteamento
condominial. De maneira que Lei municipal que preveja ou regule sua
implantação contamina o ato de aprovação de flagrante ilegalidade, porque “o
Município não tem competência legislativa em matéria de condomínio”.[484]
No condomínio de fato, os proprietários de imóveis oriundos de
loteamento convencional, regido pela Lei n° 6.766, de 19.12.1979, reúnem-se
informalmente e passam a se comportar como condôminos regidos pela Lei n°
4.591, de 16.12.64, criando-se, assim, a figura de um condomínio aparente,
através das associações de moradores.[485]
A associação de moradores é o instrumento que os residentes de
determinado loteamento utilizam para realizar suas aspirações e para se
protegerem, principalmente, da violência urbana que assola o nosso país. Utiliza-
se, portanto, o instituto da associação, na forma dos arts. 53 a 61 do Código
Civil, e não o instituto das sociedades, pois se constituem as associações pela
união de pessoas que se organizam para fins não econômicos. Ressalvo que a
expressão “fins não econômicos” mencionada no art. 53 do Código Civil é
imprópria. Segundo CÉSAR FIUZA “as associações têm o mesmo conceito de
sociedade, possuindo, entretanto, diferença específica em sua definição, ou seja,
não visam ao lucro. Em outras palavras, as associações são sociedades que não
têm interesse no lucro, embora nada as impeça de ter lucro”.[486] Pois toda e
qualquer associação pode exercer ou participar de atividades econômicas. O que
é vedado é que essas atividades tenham finalidade lucrativa.[487]
O direito de associar-se é constitucionalmente assegurado, não podendo,
contudo, as pessoas serem obrigadas a associar-se ou a permanecer associadas,
tal é o disposto no artigo 5º, XVIII e XX da Constituição Federal, com a seguinte
redação, respectivamente: “a criação de associações e, na forma da lei, a de
cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em
seu funcionamento;” e, “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a
permanecer associado”.
Referente à ordem constitucional das associações, explica
ALEXANDRE DE MORAIS: “É plena a liberdade de associação, de tal forma
que ninguém poderá ser compelido a associar-se ou mesmo permanecer
associado, desde que para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar, sendo que
sua criação e, na forma da lei, a de cooperativa independem de autorização,
vedada a interferência estatal em seu funcionamento, constituindo-se um direito
que, embora atribuída a cada pessoa (titular), somente poderá ser exercido de
forma coletiva, com várias pessoas”.[488]
Como requisito legal para formação do condomínio de fato, através de
associação de moradores, deverá possuir, sob pena de nulidade: a denominação,
os fins e a sede da associação; os requisitos para admissão, demissão e exclusão
de associados; os direitos e deveres dos associados; as fontes de recurso para sua
manutenção; o modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e
administrativos; as condições para alteração das disposições estatutárias e para a
dissolução.
Todos os associados no condomínio atípico ou condomínio de fato
devem ter iguais direitos, mas pode o estatuto instituir categorias com vantagens
especiais, o que, na prática, permite criar categorias que diferenciem o valor do
rateio das despesas mensais entre casas e terrenos e cotas proporcionais à medida
dos imóveis.
O art. 58 do Código Civil de 2002 dispõe que “nenhum associado poderá
ser impedido de exercer direito ou função que lhe tenha sido legitimamente
conferido, a não ser nos casos e pela forma previstos em lei ou no estatuto”. Esta
norma vem limitar a discricionariedade no âmbito das associações e pode
interferir diretamente na administração do condomínio de fato, pois, na prática,
confere-se a possibilidade de incluir no estatuto do condomínio de fato as
penalidades para aqueles que não cumprirem regras impostas. Pode-se, ainda,
criar regulamento interno para uma melhor convivência social, desde que este
esteja expressamente previsto no estatuto. Outro exemplo de penalidade que
pode ser inserido no estatuto é a proibição do associado que não está em dia com
o pagamento das cotas condominiais de poder votar e ser votado nas
assembleias.
A associação de moradores, a autonomia privada e a busca de
segurança aglutinaram-se, pois, como ponto de partida ante a insuficiência do
poder público na prestação adequada de serviços, que levou os proprietários de
lotes individuais a se agruparem informalmente, de modo a comportarem-se
como condôminos, sem que houvesse uma efetiva relação condominial. Esses
proprietários, através de associações denominadas condomínios de adesão,
irregulares ou de fato, elegem a figura de um administrador, para que tome frente
face as suas necessidades, e, desse modo, contratam serviços de terceiros para
suprir a deficiência provocada pelo ente público.[489]
A doutrina destaca a legitimidade ad causam da associação de
moradores, para mover ação de cobrança de cotas condominiais, mesmo não
havendo convenção registrada, pois não tem apoio no direito autorizar que
aquele que é beneficiado pela manutenção das área comuns deixe de pagar as
despesas respectivas, prevista a incumbência da associação para esse fim,
vedando-se assim o enriquecimento sem causa.[490]
A representação da vontade dos proprietários através da associação de
moradores pode ser apreciada no relatório apresentado pelo eminente
desembargador Sergio Cavalieri Filho: “Tornaram-se comuns em nossos dias os
chamados condomínios de fato. Pessoas de posses adquirem imóveis residenciais
ou de veraneio em loteamentos fechados, normalmente em lugares aprazíveis,
em busca de conforto, comodidade, lazer, segurança, etc. Em muitos desses
loteamentos, mormente em região de praia ou serrana, os serviços públicos
essenciais ainda não chegaram, de sorte que são providos pelos próprios
interessados através de associação de moradores, empresa comercial ou sem fins
lucrativos, de modo a tornarem efetivos os objetivos a que se destina o
loteamento”.[491]
Assim, as associações de moradores são criadas para beneficiar as áreas
comuns que, por consequência, favorecem a propriedade individual, realizando
benfeitorias e serviços comuns, inclusive com a contratação de empregados para
cuidar da conservação e segurança de todos. Fica evidente que as despesas
comuns necessárias para a manutenção e conservação desse condomínio de fato
terão que ser rateadas entre todos os integrantes do loteamento, na proporção dos
benefícios recebidos, independentemente até de contrato escrito, convenção ou
estatuto social.
Quanto às características básicas do condomínio atípico ou condomínio
de fato, podemos dizer que elas são as seguintes: 1) as vias e espaços livres
pertencem ao Município, alterando-se apenas o direito de uso, que é retirado da
coletividade e assegurado aos moradores do local; 2) o proprietário do lote, casa
ou terreno goza do direito de propriedade de forma tradicional, ou seja, como
todo e qualquer titular do domínio; 3) as praças, ruas, vias de comunicação e
outros espaços livres tem seu uso limitado aos proprietários dos lotes; 4) há
domínio comum sobre determinados bens, tais como guaritas e seus acessórios,
bombas de água e reservatórios, materiais utilizados na manutenção e
conservação das vias e espaços públicos; 5) serviços de vigilância e segurança,
coleta de lixo, distribuição de água e rede de esgoto, pavimentação e
conservação das partes comuns e dos serviços; 6) administração e
funcionamento, normalmente a cargo de uma entidade associativa dos
moradores locais; 7) rateio de despesas necessárias a manutenção e conservação
das partes comuns e dos serviços.


4.5 TITULARIDADE DOMINIAL DOS BENS
PÚBLICOS


Em relação às áreas públicas dos chamados loteamentos fechados,
merecem que façamos um estudo a respeito da titularidade dos bens públicos e
sua utilização regular.
A tradicional classificação da dominialidade pública abrange 3 (três)
modalidades distintas: 1) os bens públicos de uso comum do povo (aqueles que,
por sua natureza ou determinação legal, são destinados à utilização coletiva:
ruas, estradas, praças, rios, etc.); 2) os bens públicos de uso especial (os que são
afetados à realização de serviços públicos: edifícios ou terrenos destinados a
serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou
municipal, inclusive os de suas autarquias); e 3) os bens públicos dominicais
(que pertencem ao patrimônio disponível das pessoas jurídicas de direito
público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades)
[arts. 98 a 103 do Código Civil de 2002].[492]. Os bens públicos de uso comum do
povo e os bens públicos de uso especial são bens inalienáveis, na forma da lei, e
estão fora do comércio (art. 100 do Código Civil de 2002). Já os bens públicos
dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei (art. 101 do
Código Civil de 2002).
Os bens de uso comum do povo pertencem ao domínio eminente do
Estado (lato sensu), que submete todas as coisas de seu território à sua vontade,
como uma das manifestações de soberania interna, mas seu titular é o povo. Não
constitui um direito de propriedade ou domínio patrimonial de que o Estado
possa dispor, segundo as normas de Direito Civil. O Estado é gestor desses bens
públicos e, assim, tem o dever de sua superintendência, vigilância, tutela e
fiscalização para assegurar sua utilização comum.[493]
A melhor doutrina brasileira sustenta que o domínio eminente é um
poder sujeito ao direito; não é um poder arbitrário. Sua fruição é coletiva. Os
usuários são anônimos, indeterminados, e os bens utilizados o são por todos os
membros da coletividade – uti universi – razão pela qual ninguém tem direito ao
uso exclusivo ou a privilégios na utilização do bem: o direito de cada indivíduo
limita-se à igualdade com os demais na fruição do bem ou no suportar os ônus
dele resultantes”.[494]
Quanto à relação que o particular (o utente) guarda com os bens
públicos, esclarece JOSÉ CRETELLA JÚNIOR que ruas, praças, parques,
logradouros de toda espécie podem ser utilizados pelo cidadão, mas se algum
particular entender de apossar-se deles, à evidência que compete ao Estado
tomar as providências legais como proprietário, visto que à Administração
compete zelar pelos bens de uso comum do povo. Jamais os bens públicos de
uso comum, como as ruas, praças, parques, estradas podem ser objeto de posse
dos particulares, mas de simples detenção. O princípio geral que rege a
utilização dos bens de uso comum é o de que o uso de um seja transitório e
precário, não impedindo o uso dos demais, reservando-se a Administração, em
casos especiais, o direito de utilização privilegiada, quando se trata do interesse
público”.[495]


4.6 O USO DOS BENS PÚBLICOS POR
PARTICULARES


Essas 3 (três) categorias de bens públicos (bens de uso comum do povo,
bens públicos de uso especial e bens públicos dominicais) certamente admitem
usos comuns e especiais. Assim é que JOSÉ CRETELLA JÚNIOR menciona
que todo cidadão que preencher os requisitos exigidos pelo Estado é investido no
direito subjetivo público de utilizar os bens públicos dos 3 (três) tipos – uso
comum, uso especial e dominical –, desde que a utilização seja compatível com
a destinação do bem, tendo o particular o direito de recorrer ao Poder Judiciário,
caso seja impedido do exercício de seu direito”.[496]
Há que se ter em mente que todos os bens públicos admitem uso sem
discriminação, em igualdade de condições por todos cidadãos,
independentemente de qualificação ou consentimento pessoal, devendo ser
exercido de forma anônima e gratuita (exceto na hipótese de pedágio nas
estradas ou rodovias, que o Poder Público cobra como contraprestação pela sua
conservação, sem inibir o uso coletivo).
JOSÉ CRETELLA JÚNIOR acrescenta, então, que o uso comum desses
bens públicos, uti univers, se constitui no exercício natural de uma faculdade
que faz parte integrante da esfera de liberdade humana, que o homem tem como
homem, não apenas como habitante de um determinado lugar,[497] ou aquele uso
que se destina a atender ao homem, em virtude de sua qualidade humana, tendo,
pois, por objetivo principal e imediato a satisfação de necessidades físicas
indispensáveis para a própria vida, de todos, sem distinção, permitindo ainda o
desenvolvimento e projeção da personalidade humana no campo da liberdad.[498]
Todavia, esses bens públicos também podem ser utilizados com
exclusividade, por pessoas determinadas, mediante título jurídico conferido
individualmente pela Administração Pública, por ato ou contrato, mediante
autorização legal ou regulamentar, ou através de consentimento pela autoridade
competente. Denomina-se uso especial (uti singuli) pelo qual o particular irá
extrair do bem público algumas utilidades não conferidas, em caráter genérico,
aos demais usuários, cabendo-lhe o poder de privar outras pessoas do direito de
exercer igual utilização sobre a mesma parcela do domínio público.[499]
No que tange aos bens dominicais, o uso especial pode comportar
fruição pelos institutos de Direito Civil, tais como a locação, enfiteuse,
arrendamento, concessão de direito real de uso e comodato, mas, como não
poderia deixar de ser, com influência significativa dos princípios de direito
público.
Já a utilização dos bens de uso comum do povo ou utilização dos bens
públicos de uso especial pode ser feita por instrumentos jurídicos de direito
público, tais como a autorização, a permissão e a concessão de uso, uma vez
que, estando eles afetados a finalidade pública, a sua vinculação a título
jurídico de direito privado, que coloca o particular em igualdade de condições
com a Administração Pública, viria em prejuízo do interesse geral, pois retiraria
à Administração Pública a possibilidade de apreciar a todo momento a
conveniência da utilização privativa consentida e de extingui-la quando
prejudicial à finalidade precípua a que o bem se destina. Todas as relações
jurídicas que têm por objeto os bens de uso comum e os de uso especial
sujeitam-se a regime jurídico de direito público; daí as razões de afirmar-se que
os bens dessa natureza estão fora do comércio jurídico de direito privado.[500]
Vale lembrar que a autorização de uso é ato precário, unilateral e
discricionário, visa atividades transitórias e irrelevantes ao interesse público, é
conferida com exclusividade e no interesse privado do beneficiário, pode ser a
título gratuito ou oneroso, dispensa autorização legislativa e licitação e não cria
para o usuário o dever de utilização (como na permissão ou concessão de uso),
mas mera faculdade. São exemplos: a ocupação de terrenos baldios; a retirada de
água de fontes não abertas ao uso comum do povo; o depósito de material na via
pública; o tráfego de caminhões pesados, de certo porte e altura ou que
conduzam produtos inflamáveis, em horários e locais específicos; a utilização de
vias públicas para a realização de festas, lazer, cortejos e provas desportivas.
Permissão de uso é ato negocial, precário, discricionário e unilateral que
a Administração faculta ao particular para a utilização individual de bem
público. Pode ou não ser estabelecida sob condições, por tempo certo ou
indeterminado, revogável ou modificável unilateralmente pela Administração,
indenizável quando operada a revogação se assim for disposto no termo que a
concedeu. Qualquer bem público admite a permissão de uso especial, desde que
a utilização seja também de interesse da coletividade que irá fruir certas
vantagens desse uso, como acontece na instalação de serviços de bar nas
calçadas (colocação de mesas, cadeiras e toldos), de bancas de jornais e de feiras
livres, vestiários em praias, na utilização de boxes nos mercados municipais, no
estacionamento de táxis nas vias públicas, etc. Por sinal, a permissão de uso
deve ser deferida mediante prévia licitação (art. 2° da Lei n° 8666, de
21.06.1993, que regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal,
institui normas para licitações e contratos da Administração Pública)[501] e, se não
houver interesse para a comunidade, mas tão-somente para o particular, o uso
especial não deve ser permitido nem concedido, mas simplesmente autorizado,
em caráter precaríssimo.[502]
A concessão de uso, por sua vez, é contrato de direito público,
sinalagmático, gratuito ou oneroso, comutativo e realizado intuitu personae,
utilizado preferentemente à permissão, nas hipóteses em que a utilização do bem
público visa ao exercício de atividades de maior vulto e mais onerosas, firmado
geralmente com prazos longos que garantam certa estabilidade ao
concessionário. Quando implicar na utilização de bem de uso comum do povo,
sua outorga só será possível para fins de interesse público e se for compatível
com a destinação principal do bem. Ela investe o concessionário na posse da
parcela do bem objeto do contrato e sua rescisão pela Administração Pública,
antes do termo, exige justa indenização. São exemplos a concessão para a
exploração de minas e águas (hidrelétricas), ou para o uso de dependências
aeroportuárias (para abrigo, reparação e abastecimento de aeronaves), de
cemitérios para sepulturas (inumação de cadáveres).
Certamente, os atos da Administração Pública são norteados pelos
princípios constitucionais da legalidade, finalidade e interesse público (caput do
art. 37 da Constituição Federal),[503] razão por que o ato administrativo municipal
que faculta a utilização de bens de uso comum do povo a particulares deve
sempre render obediência a esses princípios, em especial o da prevalência do
interesse público, o qual, embora não esteja expresso na Constituição Federal
como princípio da Administração Pública (assim como o da finalidade), para a
doutrina ele é considerado um desdobramento do princípio da legalidade, pois o
ato administrativo só é válido quando atende ao seu fim legal e a finalidade é
inafastável do interesse público, de sorte que o administrador tem que praticar o
ato com finalidade pública, sob pena de desvio de finalidade, uma das mais
incidiosas modalidades de abuso de poder.[504]




4.7 A CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO
DAS ÁREAS PÚBLICAS DOS LOTEAMENTOS
CONVENCIONAIS


O fechamento dos loteamentos convencionais da Lei n° 6.766, de
19.12.1979, que dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano, operado
mediante obstrução das vias internas ao acesso do público, com a colocação de
obstáculos, cancelas e guaritas, é sustentado por alguns autores como lícito,
sendo frequente o argumento de que o Município pode viabilizá-lo pelo instituto
da concessão de direito real de uso das áreas públicas, previsto no art. 7º do
Decreto-Lei n° 271, de 28.02.1967 (dispõe sobre loteamento urbano e
responsabilidade do loteador concessão de uso e espaço aéreo),[505] e também
disciplinado pelo §2° do art. 17 da Lei de Licitações Públicas (Lei n° 8666, de
21.06.1993).[506]
A parte da doutrina que sustenta essa tese se apoia no art. 3º do Decreto-
Lei n° 271, de 28.02.1967,[507] que equiparava o loteador ao incorporador, os
compradores de lote aos condôminos e as obras de infraestrutura à construção da
edificação, determinando a aplicação da Lei n° 4591, de 16.12.1964 (dispõe
sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias) aos
loteamentos. No entanto, não se aplicam ao caso as disposições da Lei n° 4591,
de 16.12.1964, por força do mencionado art. 3º do Decreto-Lei n° 271, de
28.02.1967, não apenas porque abrogado pela Lei n° 6.766, de 19.12.1979, que
dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano, como ainda por não ser auto-
aplicável tal dispositivo legal, porquanto a regulamentação determinada em seu
§1° jamais foi feita.[508]
Uma interpretação superficial do art. 7º do Decreto-Lei n° 271, de
28.02.1967, pode levar o intérprete menos atento àquela conclusão. Todavia, a
tese, embora de certa forma atraente, não resiste a análise mais atenta a respeito
da natureza jurídica e a extensão dessa espécie de trespasse de uso da
propriedade pública. De natureza contratual (portanto, bilateral, com direitos e
obrigações recíprocas), a concessão de direito real de uso de imóvel público
torna acessível ao particular seu uso sem os percalços da enfiteuse, as
inconveniências da locação (para a Administração Pública), a precariedade das
permissões e cessões de uso e a inflexível natureza da concessão de uso. Ela é
vantajosa para a Administração Pública, que deve sempre preferir essa forma de
utilização ao invés de dispor do patrimônio imobiliário, através da venda ou
doação, mas sempre dependerá de autorização legal e de licitação.[509]
Entretanto, não podemos perder de vista que a fruição de imóvel público,
através do instrumento de concessão de direito real de uso, só pode ser conferida
para os bens dominicais, sendo incompatível para os bens de uso comum ou
especial, enquanto destinados aos fins precípuos.[510] Com efeito, os bens de uso
comum ou especial, para poderem ser usados discriminadamente ou por
concessão exclusiva do uso, exigem prévia desafetação, porque a utilização, por
exemplo, das vias públicas (bens de uso comum) não é uma simples
possibilidade, mas poder legal exercitável erga omnes, não podendo a
Administração Pública impedir o trânsito de pessoas de maneira estável, a menos
que, antes, desafete a referida via.[511] Inclusive, a desafetação de uma
determinada rua, ainda que precedida de autorização legislativa, deve conter o
elemento fundamental: de ter perdido, de fato, sua utilização pública ou seu
sentido de via de circulação ter desaparecido ao se tornar desabitada. Não basta a
lei para desafetá-la. É preciso atender ao interesse público, como qualquer ato
administrativo, sem o qual haverá fundamento para contestar a transmudação
operada pela lei ordinária que promove a desafetação.[512]
Se não bastasse isso, algumas características que informam essa
modalidade de uso são prejudiciais aos interesses da Administração Pública,
favorecendo ao particular, haja vista que a concessão de direito real de uso não
está vinculada à totalidade dos princípios publicísticos, derrogatórios e
exorbitantes do direito comum que deveriam nortear a relação entre o Poder
Público e os particulares, em prol do interesse coletivo (precariedade e
unilateralidade).
Acrescenta RICARDO PEREIRA LIRA que o direito real gerado pela
concessão de uso de imóvel público, ainda quando possa ser considerado um
direito real administrativo, não é resolúvel ao nuto da Administração Pública,
discricionariamente, mas apenas naquelas hipóteses expressamente previstas no
§ 3 do art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28.02.1967: dar, o concessionário,
destinação diversa da prevista no título; descumprir o concessionário cláusula
contratual cujo inadimplemento tenha por consequência a resolução do ajuste.
Assim, o concessionário tem direito à posse, uso, administração e fruição do
terreno durante o prazo da concessão, bem como, quando finda esta, de ser
indenizado, salvo disposição em contrário, pelas acessões e benfeitorias
realizadas no imóvel concedido, com direito de retenção, que deriva dos efeitos
dessa posse.[513] Além disso, devemos ter em conta que esse instituto é
estigmatizado por uma finalidade não individualista (caput do art. 7° do Decreto-
Lei nº 271, de 28.02.1967).
De fato, ressalta renomado e consagrado professor administrativista
CAIO TÁCITO SÁ VIANA PEREIRA DE VASCONCELOS que se trata de
modalidade de direito real resolúvel que não absorve nem extingue o domínio
público. Constitui-se por uma fruição qualificada de interesse social, e tem
como escopo uma atividade específica de acentuado teor social, e não a mera
fruição de interesse privado, importando o desvio de finalidade na extinção do
direito, mesmo antes de seu termo.[514]
Na concessão de direito real de uso de ruas, praças, espaços livres,
áreas verdes e institucionais para a formação dos loteamentos fechados,
prevalece o desejo ou interesse exclusivo dos moradores na sua utilização
privativa, de caráter individual (sossego, segurança e conforto pessoais),
contrapondo o interesse privado ao coletivo, porque essas áreas públicas estão
vocacionadas ao uso comum do povo. Por conseguinte, essa modalidade de
concessão de direito real de uso não se presta à utilização de bens de uso
comum, que pressupõem a universalidade, a impessoalidade e a gratuidade de
uso, sem contraprestação pecuniária ou indenização ao particular, além do que o
princípio geral que rege a utilização dos bens de uso comum é o de que o uso de
um seja transitório e precário, não impedindo o uso dos demais.[515]

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ALEGAÇÃO DE
IRREGULARIDADE EM LOTEAMENTO "FECHADO" –
CONCESSÃO DE ÁREAS PÚBLICAS – OBSERVÂNCIA DE
REGRAMENTOS E ENCARGOS AOS CONDÔMINOS –
PROPRIETÁRIOS – NÃO INFRINGENCIA DE PRECEITO
CONSTITUCIONAL – LEGISLAÇÃO PRECEDENTE – NÃO
INFRINGENTE DE DIREITO PÚBLICO. IMPROCEDÊNCIA.
O Ministério Público objetivou a declaração de
inconstitucionalidade de legislação autorizadora de cessão de
bem público existente em loteamento "fechado", constituído de
ruas e áreas de preservação; não caracterização de tal vício;
encargos assumidos pela Associação de proprietários, no sentido
de manutenção, conservação, admitida remuneração pelos
proprietários; descabimento da pretensão de
inconstitucionalidade de legislação municipal, a qual atende
preceito constitucional (art. 23 e 30, CF). Mantença do
condomínio fechado e da improcedência da ação, admitido
cobrança. Recurso negado”.[516]


4.8 DA VIOLAÇÃO AO ARTIGO 17 DA LEI N° 6.766,
DE 19.12.1979


O fechamento dos loteamentos caracteriza, na realidade, tentativa de
burlar a Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei n° 6.766, de 19.12.1979) e
tentativa de contornar a vedação urbanística imposta pelas Leis e Constituições
Estaduais.
Nos termos do art. 17 da Lei n° 6.766, de 19.12.1979, o loteador não
pode alterar a destinação dos espaços livres de uso comum, as vias e praças, as
áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos constantes
do projeto e memorial descritivo (incisos III e IV do § 2º do art. 9 da Lei n°
6.766, de 19.12.1979).
Esse dispositivo também obriga o Município, que recebe essas áreas
quando do registro do loteamento (art. 22 da Lei n° 6.766, de 19.12.1979),[517]
porque os bens públicos adquiridos com a implantação do projeto de loteamento
urbano guardam consigo, por razão ontológica, afetação específica ao interesse
público reconhecido pelo Município ao aprovar o projeto.[518]
Como a Lei n° 6.766, de 19.12.1979, só disciplina os loteamentos
convencionais, abertos, com espaços e áreas públicas franqueadas ao acesso de
todos, alertam JOSÉ AFONSO DA SILVA [519] e DIÓGENES GASPARINI [520]
que a aprovação pelo Município dos loteamentos fechados não é lícita, pois não
lhe preside o princípio da legalidade, nem a legislação municipal editada para
tratar do assunto lhe dá foros de legitimidade, porque a matéria, por sua natureza
condominial, é da competência da União Federal.
Há que se ter em mente o fato de as áreas públicas de um loteamento
(espaços livres de uso comum, áreas verdes, vias, praças, áreas destinadas a
edifícios públicos e outros equipamentos urbanos), visam a atender às
necessidades coletivas urbanas. Algumas estão voltadas à circulação de
veículos, pedestres e semoventes (vias urbanas). Outras destinam-se à
ornamentação urbana (fim paisagístico e estético), têm função higiênica, de
defesa e recuperação do meio ambiente, atendem à circulação, à recreação e ao
lazer (praças, jardins, parques, áreas verdes e de lazer).
De maneira que o fechamento das vias de circulação, por ato do
loteador ou associação de moradores, com ou sem aprovação do Município,
infringe o comando legal previsto no art. 17 da Lei n° 6.766, de 19.12.1979, na
medida em que, subtraindo-as da fruição geral, altera a destinação, os objetivos e
a finalidade congênitos dessas áreas, predispostas que estão para atender ao
público indistintamente.
Por sinal, SÉRGIO ALBERTO FRAZÃO DO COUTO esclarece que a
destinação de áreas públicas pelo loteador é imposição legal para atender às
necessidades da comunidade: assim como se exige do empresário o destaque de
parte de sua gleba para a implantação de equipamentos urbanos, impõe a Lei, no
mesmo dispositivo, a separação de áreas destinadas a equipamentos
comunitários, entendidas essas como áreas reservadas a estabelecimentos
educacionais, culturais, de saúde, de lazer e similares, cujas considerações mais
detalhadas faremos adiante, esclarecendo desde já, no entanto, que mencionados
equipamentos desempenharão papel de grande importância para o equilíbrio
sócio-político-cultural-psicológico da população e como fator de escape das
tensões geradas pela vida em comunidade. Como a própria expressão dá a
entender, esses equipamentos servirão à comunidade que habitará os lotes
criados pelo parcelamento urbano e, por isso mesmo, deverão ser porporcionais
à densidade de ocupação prevista para a gleba, tendo por fim satisfazer às
necessidades assistenciais e hedonísticas da coletividade. Equipamentos
comunitários vêm a ser, portanto, os aprestos do sistema social da comunidade
previstos para atender a suas necessidades de educação, cultura, saúde e lazer.[521]
Ainda que o loteamento seja concebido com as áreas públicas dispostas
para fora de seu perímetro, ficando somente com as ruas em seu interior, para a
circulação restrita aos moradores, ainda assim o fechamento das vias públicas
não encontra ressonância em nosso ordenamento jurídico. É que o conceito de
área institucional comporta exegese mais ampla. Com efeito, as áreas verdes,
não obrigatoriamente matas, podem se destinar a preservação da vegetação já
existente ou reservada ao lazer da população, com a implantação de gramados,
bosques ou jardins. Desde que assim instituídas por lei, passam a ser,
inequivocadamente, áreas institucionais, complemento do equipamento urbano.
Portanto, as áreas destinadas à implantação de equipamento urbano e
comunitário e os espaços livres de uso público são áreas institucionais. Nesse
mesmo sentido DIÓGENES GASPARINI menciona que as áreas institucionais
são as consagradas, por força de lei, pelo loteador, a fim comunitário e de
utilidade pública. De maneira que, dúvida não resta de que se trata de área
destinada a sistema de lazer, destacada das áreas reservadas ao sistema de
circulação, tais como ruas, praças e avenidas. É área reservada para fim
específico comunitário e de utilidade pública, como é o lazer.[522]
Em assim sendo, somos forçados a concluir que as ruas (espécies de vias
de circulação) são também reservas institucionais do loteamento, porque
objetivam atender a uma necessidade pública de circular. Presta-se a exercitar os
direitos de locomoção inatos ao homem (ir e vir), de permanecer no local, como
expressão do direito de reunião, e de estacionar veículos, respeitadas as
vedações da legislação de trânsito.
CINO VITTA [523] e JOSÉ CRETELLA JÚNIOR [524] alertam que não se
nega que há, efetivamente, um uso especial conferido a um morador de uma rua
ou ocupante de imóvel fronteiriço à via pública, quando se lhe garante
continuamente, por exemplo, o acesso ao seu imóvel, mediante abertura de porta
sobre a via pública, o despejo de águas pluviais e servidas, a abertura de janelas
sobre a via, para receber luz, ar, etc. Mas nem por isso se está diante de
fenômeno diverso do uso geral referente aos demais particulares, visto que não
varia a substância do fato com sua repetição.
Portanto, segundo JOSÉ AFONSO DA SILVA [525] e JOSÉ CRETELLA
JÚNIOR,[526] é inconcebível a posse dos bens de uso comum pelo usuário, que só
tem mera detenção física. Também, segundo JOSÉ AFONSO DA SILVA [527] e
HELY LOPES MEIRELLES,[528] se mostra inadmissível a existência de ruas
particulares. Bem como, alerta BIASI RUGGIERO, juridicamente impossível a
instituição de condomínio, à base da Lei n° 4.591, de 16.12.1964 (dispõe sôbre o
condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias), em rua ou
loteamento regular.[529]
Por via de consequência, perfeitamente justificável o combate aos
loteamentos fechados implantados, por exemplo, na orla marítima, que
inviabilizam seu acesso a qualquer pessoa estranha ao empreendimento, que não
seja proprietária de lote, privatizando as praias do nosso litoral. Nesses casos,
além dos princípios acima lembrados, aplica-se uma legislação específica que
assegura a livre acessibilidade às praias, por qualquer do povo. Tal legislação
refere-se ao art. 10 da Lei n° 7661, de 16.05. 1988 (instituiu o Plano Nacional de
Gerenciamento Costeiro).[530]
Não podemos no furtar de mencionar que, não raras vezes, o Poder
Público Municipal tolera a utilização exclusiva da via pública ou com
perturbação de seu uso comum pelo povo, mas de forma temporária, mediante
autorização expressa das autoridades públicas, tais como ocorre nas
competições desportivas de rua. Também o Poder Público Municipal admite a
utilização com exclusividade, de maneira permanente, embora precária, no uso
especial que se permite ou concede sem embaraçar a utilização normal da via
pública pelo povo, desde que traga alguma utilidade para a população, como
acontece para a instalação de bancas de jornais nos passeios, de feiras-livres nas
ruas e dos boxes dos mercados municipais para vazão direta da produção
agrícola. Mas isso não deve ser justificativa para a privatização do uso dos
espaços públicos em detrimento da coletividade (cujo prejuízo presume-se, ao
ser colocada à margem dessa utilização), ainda que com a anuência do Poder
Público Municipal, o que só beneficia uns poucos habitantes, atribuindo-lhes
privilégios, instituindo verdadeiros guetos.

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Birigui. Villa do Chafariz.
Irregularidade em loteamento fechado. – 1. Loteamento fechado.
Inconstitucionalidade. Ao editar as leis municipais e decretos
autorizadores da criação dos bolsões residenciais e implantação
dos condomínios fechados, o Poder Público Municipal, baseado
na discricionariedade que lhe é atribuída, permitiu que os bens
públicos fossem utilizados de acordo com a finalidade do
empreendimento. Não há abuso ou delegação de
discricionariedade ao particular. O controle de acesso ao
condomínio não significa prejuízo ao direito de ir e vir dos
munícipes nem em restrição abusiva, garantindo segurança aos
moradores do local, às suas expensas, sem ônus ao Poder
Público. Interesse público preservado. Posicionamento pacificado
neste Tribunal. – 2. Associação. Rateio de despesas. O
loteamento em questão praticamente nasceu ‘fechado’; os
adquirentes dos lotes desde o momento da compra sabiam que
estavam comprando imóvel em área residencial fechada; a
associação de moradores já estava constituída quando os lotes
foram adquiridos, de modo que ao adquirir o imóvel eram
sabidas as regras que deveriam ser seguidas. Os serviços
prestados e pagos com as contribuições dos proprietários são
revertidos em prol de todos os moradores e a admissão de que o
pagamento é meramente facultativo implica em enriquecimento
sem causa daqueles que não contribuem com a associação, já que
usufruem dos benefícios sem o respectivo ônus. Precedente do
STF. – Improcedência. Recurso do Ministério Público
desprovido”.[531]

Inclusive, a essa prática com a anuência do Poder Público Municipal,
contrapõe-se os princípios constitucionais, como objetivo fundamental da
República, a redução das desigualdades sociais e a erradicação da
marginalização (inciso III do art. 3° da Constituição Federal)[532] e, como
garantias fundamentais da pessoa humana, previstas no caput [“Todos são
iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”], inciso XV [“é livre
a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa,
nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”] e inciso
XVI [“todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao
público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra
reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido
prévio aviso à autoridade competente”], todos do art. 5º da Constituição Federal.
Garantias estas de aplicação imediata conforme previsto no § 1º do art. 5º da
Constituição Federal [“As normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata”]. Portanto, o direito de circular, ou seja,
de ir e vir (viajar e migrar), e também o direito de permanecer (para exercer o
direito de reunião e de estacionar) deve ser respeitado, pois, como esclareve
JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, em matéria de bens terrestres, de uso comum, no
Brasil, a utilização de quisque de populo compreende o trânsito e o
estacionamento, podendo este ser momentâneo - parar - e prolongado –
estacionar.[533]
Ensina EDUARDO ESPÍNOLA qua a liberdade de locomoção consiste
no poder que todos têm, sem necessidade de pedir autorização, de dirigir suas
atividades e de dispor de seu tempo, como bem lhes parecer, em princípio,
cumprindo-lhes, entretanto, respeitar as medidas impostas pela lei, no interesse
comum, e abster-se de atos lesivos dos direitos de outrem.[534] Acrescenta JOSÉ
AFONSO DA SILVA que é de duvidosa constitucionalidade lei que estabeleça
limitações ao direito de locomoção no território nacional, em tempo de paz, só
possível de ser editada em tempo de guerra, desde que não elimine a liberdade
como instituição.[535]
Por fim JOSÉ CRETELLA JÚNIOR [536] e MARIA SYLVIA ZANELLA
DI PIETRO [537] arrematam a questão lembrando que o princípio vigente na
utilização dos bens de uso comum é o de que o uso de um seja transitório,
precário, compatível com a destinação do bem (de servir a todos), sem obstar a
fruição dos demais.


4.9 RATEIO DAS COTAS DO LOTEAMENTO
FECHADO E DO CONDOMINIO DE FATO


Como demonstrado, o loteamente fechado e o condomínio de fato surgiu
da necessidade de alguns proprietários ou moradores de um determinado
logradouro suprirem os serviços que deveriam ser prestados pelo ente público ou
fornecidos de modo satisfatório, como segurança pública, conservação das vias,
distribuição de água, recolhimento de lixo e outros serviços cujo suprimento
demande uma organização e participação coletiva dos interessados.
Suscita discussões a questão relativa à obrigatoriedade ou não do
pagamento de contribuições referentes aos serviços prestados, para associações
de moradores, em vista de dois princípios constitucionais: o primeiro de que
“ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado, na
forma do art. 5º, XX, da Constituição Federal vigente, ou seja, o princípio da
livre associação; o segundo, calcado no princípio que veda o enriquecimento
sem causa, por seu turno, encontra-se amparado no art. 3º, I da Constituição
Federal, como fator relevante de uma sociedade mais justa e solidária,
consagrada, pois, como objetivo fundamental da República,[538] e nos arts. 884 a
886 do Código Civil”.[539]
O princípio da livre associação confronta com o da condenação do
enriquecimento sem causa no que diz respeito às associações em condomínio de
fato. O que suscita debates, pois, de um lado prima-se pela liberdade de
associação que cada pessoa possui; do outro, pela contrariedade de os
indivíduos se beneficiarem, mesmo que de forma indireta, dos outros
condôminos que arcam com as despesas comuns do loteamente fechado e o
condomínio de fato.
Causa impacto doutrinário e jurisprudencial o rateio das cotas
condominiais e a aplicação dos princípios ora aludidos, enfatiza DANIELLE
MACHADO SOARES sobre os impasses: “1º- O primeiro princípio prega a
liberdade de associação que cada indivíduo possui, pois é inerente a sua
personalidade; em contra partida, o segundo princípio prega a condenação
daquele que se beneficia, ainda que de forma indireta, às custas de outros
indivíduos, sem uma causa justa ou legal; 2º- O princípio da liberdade
associativa está inserido em sede constitucional, ao passo que o da condenação
ao locupletamento sem causa reside em sede doutrinária, o que em outras
palavras significa dizer que o primeiro é hierarquicamente superior ao segundo”.
[540]

Ressalva-se, contudo, que atualmente o princípio do enriquecimento sem


causa encontra-se amparado em nosso ordenamento, com expressa redação do
art. 884 a 886 do Código Civil de 2002,[541] não sendo mais somente uma
construção doutrinária, como afirmava DANIELLE MACHADO, em obra
anterior ao Código Civil de 2002.[542] A nosso ver, encontra amparo também no
inciso I do art. 3º da Constituição Federal, como fator relevante de uma
sociedade mais justa e solidária,[543] e ainda como princípio geral do direito.[544]

“CONDOMÍNIO DE FATO Sociedade constituída pelos
moradores de Loteamento fechado Competência preferencial de
uma das dez primeiras Câmaras de Direito Privado I do Tribunal
de Justiça (1ª a 10ª Câmaras), nos moldes do disposto no inciso
XXI do Provimento 63/2004 da Presidência do Tribunal de
Justiça e da Resolução n. 194, de 29-12-2004, do Órgão Especial
do Tribunal de Justiça - Obrigação de pagar despesas mensais
para se evitar o enriquecimento sem causa da apelante
Inaplicabilidade da Lei n. 4.591/64 - Recurso não conhecido,
com determinação de remessa dos autos para redistribuição ao
órgão competente”.[545]

O princípio que veda o enriquecimento sem causa está apoiado em
institutos antigos do direito. O tema enriquecimento sem causa “habita o mundo
do direito desde, ao menos, os primórdios das ordenações romanas”,[546] como
exemplifica HAMID CHARAF BDNIE JÚNIOR: “No Direito romano, o
princípio que veda o enriquecimento sem causa já era conhecido e aplicado.
Atualmente, várias ações têm o objetivo de evitar esse tipo de enriquecimento: a
repetição de indébito, a de enriquecimento ilícito na cobrança do cheque
prescrito, a indenização etc. Todas elas pertencem ao gênero das ações in rem
verso. No antigo Código Civil de 1916, eram exemplos dessas medidas o
dispositivo que determinava a restituição do pagamento indevido, o que
reconhecia o direito de ressarcimento das despesas de produção e custeio e das
benfeitorias necessárias ao possuidor de má-fé, bem como aquela que reconhecia
o direito à indenização do construtor de boa-fé em terreno alheio”.[547]
Nesse sentido o princípio que veda o locupletamento ilícito inspira-se
desde o Direito Romano, em regras de equidade, aplicando-se às ações pelas
quais “devia aquele que se locupletasse com a coisa alheia restituí-la a seu dono
– iure naturae aequum est neminem cum alterius detrimento et injuria fieri
locupletiorem. Todas as hipóteses conhecidas eram envolvidas na epigrafe ampla
das condictiones sine causa, denominação que permitiu aos juristas modernos
generalizar, dizendo: quando alguém recebia indevidamente alguma coisa, ou
quando cessava a razão justificativa de tê-la recebido ou quando a aquisição
provinha de furto ou de um motivo imoral, não tinha o direito de retê-la, por lhe
faltar uma causa. Esta porém, não era elementar na obligatio, que se contraía
independentemente de seu conceito, porém necessária a que o adquirente
conservasse a propriedade ou a posse da coisa recebida”.[548]
CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, acerca do instituto do
enriquecimento sem causa ao alegar, escreve o seguinte: “O novo Código, a
exemplo dos que cuidaram do tema de maneira genérica, estabeleceu a regra:
quem se enriqueceu à custa alheia fica obrigado a restituir o que indevidamente
houver recebido. Apurado o enriquecimento sine causa, o beneficiado tem o
dever de restituir o que indevidamente recebeu, com a correção monetária dos
valores, atualizados na data da restituição”.[549]

“INDENIZAÇÃO. FURTO DE JET-SKI. LOTEAMENTO.
CONVENÇÃO CONDOMINIAL QUE NÃO PREVÊ DEVER
DE GUARDA E VIGILÂNCIA DE BENS PARTICULARES.
AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO.
IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. O condomínio não responde,
em princípio, pela subtração de bens particulares dos
condôminos. Não há dever de guarda, de vigilância ou de
fiscalização. Apenas quando há previsão nas convenções o
condomínio pode ser responsabilizado. 2. Ainda que os atos de
constituição da Sociedade não disponham expressamente sobre
cláusula de exclusão de responsabilidade, não se pode impor ao
Loteamento obrigação contrária, isto é, de que os condôminos
serão ressarcidos, pois assim não dispôs a assembleia. Se fosse,
de fato, intenção dos Condôminos o ressarcimento, com
segurança, haveria disposição neste sentido na constituição do
Loteamento, o que, não ocorreu. Apenas com previsão expressa
em ato constitutivo, poderia o Loteamento ser responsabilizado
pelos danos ao patrimônio dos condôminos. Precedentes do E.
STJ. 3. Há apenas previsão genérica de que a Sociedade
constituída para administração do manteria sistema de segurança.
Esta deliberação não comprova que a ré assumiu diretamente a
vigilância e a guarda dos bens dos condôminos por meio de
instalação de aparatos de segurança ou da contratação de vigias.
4. O que determina a responsabilidade do Condomínio ou
Associação de Moradores de Loteamento Fechado pelo furto é a
obrigação que assume de vigilância e segurança, provando-se
nesse caso a falha no serviço. No caso, não estão presentes estas
duas condições para responsabilizar o réu. Sentença de
improcedência do pedido mantida. Recurso não provido”.[550]

De maneira que podemos concluir que o enriquecimento sem causa se
dá, quando alguém, às expensas de outrem, obtém vantagem patrimonial sem
causa, ou seja, sem que essa vantagem se baseie em dispositivo de lei ou em
negócio jurídico anterior.
Vale destacar que aqueles que defendem a tese que condena o
enriquecimento sem causa nos condomínios irregulares, sustentam que, quando
da abstenção dos moradores em ratearem as cotas instituídas em condomínios de
fato, incidem na premissa da existência da vantagem, de forma indireta, dos
benefícios extraídos da situação fática, ocasionando, desta forma, um aumento
patrimonial às expensas de outrem. Assim, alguns julgados consideram que são
exigíveis o rateio das cotas de todos moradores, estejam eles associados ou não,
bastando que sejam atendidos pelos serviços, assegurando que esta exigibilidade
decorre da proibição do locupletamento sem causa como princípio geral do
direito civil brasileiro, e que o legislador não admitiria que um morador pudesse
se beneficiar dos serviços sem arcar com as despesas para tanto. Ante a obtenção
da vantagem patrimonial sem causa, os nossos tribunais já se pronunciaram
condenando o locupletamento sem causa nos condomínios de fato:

“APELAÇÃO CÍVEL. COBRANÇA DE COTAS
CONDOMINIAIS. CONDOMÍNIO DE FATO.
POSSIBILIDADE. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS.
APLICAÇÃO DO VERBETE DA SÚMULA Nº 79 DO E.TJ/RJ.
O inadimplemento de cotas resultantes do rateio de despesas
realizadas em benefício de todos os proprietários e moradores
que compõem a associação configura locupletamento indevido,
que independe do beneficiado ser associado ou não. Recurso a
que se nega provimento”.[551]

“APELAÇÃO CÍVEL. CONDOMÍNIO DE FATO.
CONTRIBUIÇÕES CONDOMINIAIS. ASSOCIAÇÃO.
EXIGIBILIDADE. RATEIO DE DESPESAS COMUNS. O
condomínio se forma quando várias pessoas possuem direito de
propriedade sobre um mesmo bem, cumprindo que essas relações
sejam regulamentadas para resguardar a cada um o exercício das
faculdades de usar, gozar e dispor da coisa, destinando-a ao seu
fim social e econômico. A associação formada por proprietários
de granjas de um loteamento fechado, porém, não registrado,
constitui meio de possibilitar que, de forma mais organizada, seja
exigida de cada condômino a participação nas despesas comuns.
Todos os beneficiados com obras de manutenção do bem ou de
implantação de infraestrutura necessária ao exercício das
atividades próprias do terreno, devem arcar com o custeio das
obras, sob pena de enriquecimento sem causa”.[552]

“Associação de Moradores. Ação de cobrança. Loteamento. Taxa
de Manutenção. Sentença de improcedência. Inconformismo.
Morador não associado. Irrelevância. Imóvel adquirido em
loteamento fechado com características de condomínio, que
necessita das contribuições dos associados para manutenção da
infraestrutura proporcionada. Associado ou não, o morador deve
contribuir no rateio das despesas comuns demonstradas em taxas
de manutenção, criadas por uma associação constituída para a
prestação desses serviços, sob pena de enriquecimento ilícito.
Recurso a que se dá provimento”.[553]

No entanto, existe corrente que sustenta tese contrária a essa. Com
efeito, parte da jurisprudência entende que, em regra, não seria possível esta
associação compulsória, ou a imposição de rateio, sob a alegação de que todos
os moradores seriam implicitamente associados, já que beneficiados por aqueles
serviços. Invocam o princípio da livre associação, de sorte que não se poderia
pensar numa associação compulsória de tais moradores, pura e simplesmente.
Aos defensores do princípio da livre associação cabe a alegação de que, em face
da liberdade de se associar, tutelada constitucionalmente, não é possível a
cobrança de tais taxas, senão quando os moradores voluntariamente associarem-
se, encontrando-se, tão somente, a partir da sua expressão de vontade de
associação a obrigatoriedade e o vínculo ao pagamento das despesas comuns.
Julgados recentes em ordem de contrariedade aos que condenam os proprietários
e moradores de condomínios de fato a arcarem com os rateios tão somente pela
argumentação do enriquecimento ilícito, asseveram sobre o princípio da reserva
legal e da livre associação, garantia constitucional.

“DIREITO CONSTITUCIONAL. COBRANÇA DE COTAS
‘CONDOMINIAIS’. CONDOMÍNIO ATÍPICO OU DE FATO.
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA RESERVA LEGAL E DA
LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO (ARTIGO 5O, II E XX).
Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude da lei, não podendo ser compelido a se associar
a entidade privada. Associação de moradores não tem nenhum
direito de crédito em face de morador que não se associou.
Serviços de segurança, urbanização, lazer, etc. que cabem ao
Poder Público prestar como obrigação constitucional de sua razão
de ser. Bem de uso comum do povo. Privatização dos espaços
públicos por entidade privada. Imposição de obrigação ao
particular de pagar duplamente pelos mesmos serviços, pelo qual
já paga através de impostos e taxas. Conhecimento e provimento
do recurso”.[554]

“CIVIL. LOTEAMENTO. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES.
COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO POR SERVIÇOS
PRESTADOS. O proprietário de lote não está obrigado a
concorrer para o custeio de serviços prestados por associação de
moradores, se não os solicitou”.[555]

Apresentadas as divergências, podem-se enumerar os principais pontos
argumentados. Sintetizam os julgados que admitem às associações de moradores
cobrarem dos não associados as despesas que a todos beneficiam, tais como os
serviços de segurança, limpeza, organização da atividade comunitária e proteção
do meio ambiente, pelas seguintes alegações: a) embora não seja possível que
alguém seja compelido a associar-se, pode a associação cobrar pelos serviços
prestados e usufruídos pelo morador; b) apesar de a associação não ser
visualizada como sendo um condomínio “de direito”, regulado pela Lei n° 4.591,
de 16.12.1964 (dispõe sôbre o condomínio em edificações e as incorporações
imobiliárias), ou pelo Código Civil de 2002, não se exclui a obrigação de
concorrerem os moradores para as despesas realizadas em benefício de todos e
que ensejam a valorização das unidades e maior segurança e bem-estar coletivo,
[556]
sob pena de se caracterizar o enriquecimento sem causa;[557] c) o art. 1.315 do
Código Civil de 2002 prevê a obrigação de o condômino ou o coproprietário
arcar com a sua parte das despesas decorrentes da coisa comum; e, d)
comprovação de que os serviços prestados confiram efetivos benefícios aos
condôminos, e sejam eficientes.[558]

“ANULATÓRIA DE LANÇAMENTO CUMULADA COM
PEDIDO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO.
ILUMINAÇÃO DAS VIAS INTERNAS E ÁREAS COMUNS
DE LOTEAMENTO FECHADO. ALEGAÇÃO DE
RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO DE VOTORANTIM
ARCAR COM O PAGAMENTO DAS CONTAS DE
ENERGIAELÉTRICA. IMPOSSIBILIDADE. BENS DE USO
COMUM RESTRITO APENAS AOS MORADORES
DEFENDIDOS PELA ASSOCIAÇÃO-AUTORA. RECURSO
IMPROVIDO. Embora se trate, formalmente, de loteamento, o
Alphaville Nova Esplanada, defendido pela associação-autora,
está instituído como condomínio, porque nele o ingresso só é
permitido por moradores e pessoas por eles autorizadas. Assim, o
sistema de vias internas bens de uso comum não estão no âmbito
do domínio do Município de Votorantim. Por isso, o custeio de
sua iluminação deve ser de responsabilidade dos moradores, em
razão do empreendimento privado devidamente constituído”.[559]

É importante mencionar ainda a alegação da legitimidade da associação
de moradores para o rateio das cotas presente no Enunciado nº 89, aprovado na
I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, em cujos termos “o
disposto nos artigos 1.331 a 1.358 do Código Civil aplica-se, no que couber, aos
condomínios assemelhados, tais como loteamentos fechados, multipropriedade
imobiliária e clubes de campos”. Sobre esse enunciado, J. FRANCO
NASCIMENTO comenta que “a enumeração enunciada pelo art. 1.331 é
meramente exemplificativa, porque o sistema pode ser adotado igualmente às
edificações destinadas a garagens, mercados, estações rodoviárias, ‘shopping
centers’ e, por extensão, vilas residenciais, loteamentos fechados etc. e até
cemitérios particulares com jazigos individuais ou coletivos”.[560]
Em sentido contrário, os que não admitem a cobrança do rateio das
despesas comuns nos condomínios atípicos defendem o seguinte: a) a liberdade
de associação consagrada nos incisos XVII e XX do art. 5º da Constituição
Federal não autoriza que os moradores de certa localidade sejam compelidos a se
associar a determinada associação; b) a associação não pode ser considerada um
“condomínio especial”, máxime quando foi constituída após o loteamento e a
aquisição do imóvel pelos interessados; c) o local de prestação dos serviços
configura um bem público, inexistindo vinculação e dever de contribuir, pois
particulares não podem se reunir em associação e instituir obrigações
compulsórias incidentes sobre não associados; e, d) a obrigatoriedade do
pagamento das cotas condominiais está reservada aos condôminos regularmente
instituídos, ou seja, ligados a um condomínio “de direito”.
Todavia, atualmente a jurisprudência vem se pacificando no sentido de
que as taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam
os não associados ou que a elas não anuíram, mas obrigam aqueles associados ou
que a elas anuíram, inclusive incidindo correção monetária e juros de mora no
caso de inadimplência.

“RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA - ART. 543-C DO CPC - ASSOCIAÇÃO DE
MORADORES - CONDOMÍNIO DE FATO - COBRANÇA DE
TAXA DE MANUTENÇÃO DE NÃO ASSOCIADO OU QUE
A ELA NÃO ANUIU - IMPOSSIBILIDADE. 1. Para efeitos do
art. 543-C do CPC, firma-se a seguinte tese: ‘As taxas de
manutenção criadas por associações de moradores não obrigam
os não associados ou que a elas não anuíram’. 2. No caso
concreto, recurso especial provido para julgar improcedente a
ação de cobrança”.[561]

“AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO. COBRANÇA DE QUOTA-PARTE DE
PROPRIETÁRIO DE IMÓVEL SITUADO EM LOTEAMENTO
CONSTITUÍDO POR ASSOCIAÇÃO DE MORADORES.
ILEGALIDADE. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AOS
PROPRIETÁRIOS. ADESÃO VOLUNTÁRIA. NÃO
CONFIGURAÇÃO DE CONDOMÍNIO. 1. Associações de
moradores não têm autoridade para cobrar, de forma impositiva,
taxa de manutenção por elas criada ou qualquer contribuição a
quem não é associado, visto que tais entes não se equiparam a
condomínio para efeitos de aplicação da Lei n. 4.591/64. 2.
Agravo regimental desprovido”.[562]

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
LOTEAMENTO FECHADO. COBRANÇA DE
CONTRIBUIÇÃO RELATIVA AO RATEIO DE DESPESAS.
JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO
INICIAL. SÚMULA 83/STJ. IMPROVIMENTO. 1.- Os juros
moratórios e a correção monetária incidem a partir do
vencimento de cada parcela. Precedentes. 2.- Estando o acórdão
de origem em sintonia com o entendimento jurisprudencial deste
Tribunal, incide a Súmula 83/STJ. 3.- Agravo Regimental
improvido”.[563]

“LOTEAMENTO. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES QUE
COBRA CONTRIBUIÇÃO COMPULSÓRIA POR SERVIÇOS
PRESTADOS. ALEGAÇÃO DE QUE A OBRIGAÇÃO FOI
ASSUMIDA QUANDO DA AQUISIÇÃO DO TERRENO.
RECURSO ESPECIAL COM BASE NA ALÍNEA “C”. - Não-
cumprimento das exigências previstas nos arts. 541, parágrafo
único, do CPC, E 255, § 2º, do RISTJ. Dissonância interpretativa
não demonstrada. - Não obstante a polêmica em torno da matéria,
com jurisprudência oscilante desta Corte, a posição mais correta
é a que recomenda o exame do caso concreto. para ensejar a
cobrança da cota-parte das despesas comuns, na hipótese de
condomínio de fato, mister a comprovação de que os serviços são
prestados e o réu deles se beneficia. no caso, o exame dessa
matéria significa revolver os substratos fáticos da causa decidida,
incidindo, portanto, as Súmulas 5 e 7/STJ. - Recurso especial não
conhecido”.[564]

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DOCUMENTO NOVO.
JUNTADA E ANÁLISE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL.
IMPOSSIBILIDADE. BEM OU DIREITO LITIGIOSO.
ALIENAÇÃO. SENTENÇA. EFEITOS. LIMITES.
ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. CONTRIBUIÇÃO PARA
MANUTENÇÃO DE LOTEAMENTO. INEXISTÊNCIA DE
CONDOMÍNIO REGULARMENTE CONSTITUÍDO.
OBRIGAÇÃO AUTÔNOMA, QUE NÃO ACOMPANHA A
TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE. IMPOSIÇÃO A NÃO
ASSOCIADO. IMPOSSIBILIDADE. - Os arts. 397 do CPC e
141, II, do RISTJ não autorizam pedido de análise de novas
provas, juntadas apenas com o recurso especial e mesmo
posteriormente a este. Tal providência não encontra abrigo dentro
das peculiaridades dos recursos de índole extraordinária, porque
mesmo as provas e contratos já examinados pelas outras
instâncias não podem ser valorados pelo STJ. - O art. 42, § 3º, do
CPC visa a resguardar os direitos daqueles envolvidos em
alienação de bem ou direito litigioso. Todavia, essa proteção
encontra limites na efetiva sujeição do negócio jurídico ao
resultado da ação em trâmite. - O dever de pagar ou não
contribuições a associação que administra e mantém determinado
loteamento, sem a efetiva constituição de condomínio nos termos
da Lei nº 4.591/64, constitui obrigação autônoma, que não
acompanha a transferência da propriedade sobre terreno
participante de tal loteamento, tornando inaplicável o art. 42, §
3º, do CPC. - “As taxas de manutenção criadas por associação de
moradores, não podem ser impostas a proprietário de imóvel que
não é associado, nem aderiu ao ato que instituiu o encargo”
(EREsp 444.931/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, Rel. p/
acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 01.02.2006). -
Na hipótese, tendo sido reconhecida a adesão do réu à associação
autora, há o dever de pagar as contribuições. Recurso especial
conhecido e provido”.[565]

“LOTEAMENTO. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES.
COBRANÇA DE TAXA CONDOMINIAL.PRECEDENTES DA
CORTE. 1. Nada impede que os moradores de determinado
loteamento constituam condomínio, mas deve ser obedecido o
que dispõe o art. 8º da Lei nº 4.591/64. No caso, isso não ocorreu,
sendo a autora sociedade civil e os estatutos sociais obrigando
apenas aqueles que o subscreverem ou forem posteriormente
admitidos. 2. Recurso especial conhecido e provido”.[566]

Do exposto, verifica-se que o Superior Tribunal de Justiça, atualmente,
não adotou o teor do julgamento da Uniformização de Jurisprudência nº
2004.018.00012, na Apelação Cível n.º 2004.001.13327, do Tribunal de Justiça
do Rio de Janeiro, realizado em 04.04.2005, relator des. Sergio Cavalieri Filho
(Votação por maioria - Registro de Acórdão em 15/07/2005), que editou a
Súmula nº 79: “Em respeito ao princípio que veda o enriquecimento sem causa,
as associações de moradores podem exigir dos não associados, em igualdade de
condições com os associados, que concorram para o custeio dos serviços por elas
efetivamente prestados e que sejam do interesse comum dos moradores da
localidade”.

“DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO
DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO
CIVIL. LOTEAMENTO. NÃO OBRIGATORIEDADE DE
PAGAMENTO DE QUOTA-PARTE MENSAL DE
PROPRIETÁRIO NÃO FILIADO À ASSOCIAÇÃO DE
MORADORES. PRINCÍPIO DA LIBERDADE PARA
ASSOCIAR-SE. PRECEDENTES DO STJ.
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA NÃO CONFIGURADO.
AUSÊNCIA DE CONTEÚDO PROBATÓRIO. RECURSO
CONHECIDO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Para que o
proprietário de imóvel pertencente a loteamento fechado seja
obrigado a efetuar o pagamento das contribuições para
manutenção das áreas comuns, é necessário que esteja filiado à
associação responsável, ou, ao menos, que tenha anuído com a
sua constituição. Nesse sentido, é dominante a jurisprudência do
Superior Tribunal de Justiça; 2. Não obstante a possibilidade de
se criar associação com fins de constituir condomínio, para que
possa exigir, de todos os proprietários, o pagamento de taxas
condominiais, isso deve ser feito com a observância da Lei nº
4.591/64. Não basta, portanto, que seja constituída uma
sociedade civil; 3. Atente-se ao fato de que a recorrente absteve-
se de comprovar não só a filiação dos apelados à entidade, bem
como que o mesmos usufruíram dos serviços prestados por esta,
não havendo que se falar em enriquecimento ilícito; 4. Recurso
conhecido a que se nega provimento”.[567]

.









CAPÍTULO V –
MULTIPROPRIEDADE,
PROPRIEDADE
COMPARTILHADA OU TIME-
SHARING

5.1 DEFINIÇÃO DE MULTIPROPRIEDADE,
PROPRIEDADE COMPARTILHADA OU TIME
SHARING


GUSTAVO TEPPEDINO define o sistema time sharing como verdadeira
multipropriedade de forma genérica. É a relação jurídica de aproveitamento
econômico de uma coisa móvel ou imóvel, repartida em unidades fixas de
tempo, de modo que, cada qual a se turno, diversos titulares possam utilizar-se
da coisa com exclusividade e de maneira perpétua.[568]
Time sharing (às vezes chamado vacation ownership) é uma propriedade
com forma particular de propriedade ou direitos de uso. Essas propriedades são
normalmente unidades de condomínio resort, em que várias partes detêm
direitos de uso da propriedade, e cada participante é atribuído um período de
tempo (normalmente uma semana e quase sempre a mesma hora todos os anos)
em que eles podem usar a propriedade. As unidades podem estar em uma
propriedade parcial, arrendamento ou “direito básico de usar”, em que o
participante não detém qualquer dirieot de reivindicação da propriedade do
imóvel.
Dúvida não resta de que algumas dificuldades têm de ser enfrentadas
para se chegar à conceituação da multipropriedade ou propriedade
compartilhada. No entanto, podemos dizer que suas principais características
são as seguintes: 1) a transitoriedade de toda propriedade em comunhão: a
transitoriedade do condomínio imobiliário é de ser, no caso da multipropriedade,
obstada pela finalidade lógica do instituto, que é a do uso de todos os
multiproprietários. Admitida, no caso e na espécie, a transitoriedade genérica,
teremos a destruição do destino da própria base material da estrutura. Seria tanto
um contrasenso e agressão à legítima pretensão de uso por todos os contratantes
da multipropriedade, quando não há nada que a proíba e ao contrário existe a
garantia constitucional de sua existência, via do direito de associar-se e
contratar; 2) a divisibilidade da coisa: a divisibilidade, também, não poderá ser
admitida, visto que além de se adotar as mesmas razões acima contra a
transitoriedade, é de se adicionar as do interesse e utilidade social, para que se
mantenha o estado de comunhão, com o aumento de empregos, do crescimento
econômico e da satisfação dos seus titulares ou contratantes; e 3) o direito de
preferência dos coproprietários, quando da alienação de parte da coisa comum:
o direito de preferência nas alienações, da mesma forma, não é de ser aqui
admitido, em nome do critério de exclusividade da multipropriedade, encontrada
com o tempo dividido em turnos para satisfação de todos os seus titulares. Por
analogia é de ser feita a adoção das regras do condomínio especial da Lei n°
4.591, de 16.12.1964 (dispõe sobre o condomínio em edificações e as
incorporações imobiliárias), e da Lei n° 4.864, 29.11.1965 (cria medidas de
estímulo à Indústria de Construção Civil), onde as unidades individuais são
exclusivas de seus proprietários, substituídas, analogicamente, aquelas pela
multipropriedade de unidades condominiais, que se dividem por turnos de
utilização.
No Brasil, tal fenômeno do time-sharing surgiu timidamente sem
legislação específica, sendo assim, nasceu dificuldade de conceituar a
multipropriedade como direito real. Nesse sistema, todos os multiproprietários
são condôminos, mas esse condomínio somente será exclusivo na unidade
autônoma no tempo fixado no pacto. Sem permissão legal, contudo, não pode ser
conferido direito real aos multiproprietários. Uma das soluções encontradas é
registrar o empreendimento em nome de pessoa centralizadora de contratos
(trustee), que concede e organiza a utilização periódica. Nesse caso, a relação
dos multiusuários é de direito obrigacional com o proprietário da coisa. Outra
solução é constar na escritura a aquisição por vários titulares de períodos de sete
dias em cada ano, atribuindo-se a cada unidade cinquenta e dois períodos
compartilhados. Todos os adquirentes são coproprietários de fração ideal, não se
identificando a unidade, a não ser no vínculo obrigacional. Um pacto adjeto
meramente contratual o fará. Não existe, desse modo, constituição de unidades
autônomas, invocando-se as normas típicas do condomínio ordinário. A relação
de tempo fica exposta em regulamento. A administração é atribuída a empresa,
que normalmente reserva para si frações ideais, correspondentes a duas semanas
do ano todos os apartamentos.[569]
O maior atrativo para a propriedade compartilhada é o turístico. Com
efeito, o sistema de timesharing é comumente utilizado no ramo turístico por
meio de contrato de tempo compartilhado, bem como de contrato de adesão a
clube ou programa de férias.
No entanto, o sistema time-sharing ela pode ser aplicada em diversos
setores da vida moderna, principalmente o compartilhamento para fins
econômicos. Com a globalização e competição instaladas nos negócios, os
produtos e serviços têm de se ater a 3 (três) condições básicas: 1) o preço mais
baixo; 2) a melhor qualidade; e 3) a rapidez no atendimento do consumidor. O
valor mais acessível é encontrado com o custo baixo da produção, e o último
implica no corte de gastos e enxugamento de despesas. A melhor qualidade é a
resultante da aplicação dos melhores aparelhamentos e técnicas. A rapidez é
fruto da produção sustentada por instalações e expedientes modernos. O corte de
gastos ou enxugamentos, os melhores aparelhos e técnicas e as instalações
modernas significam altas despesas, que se contradizem com a necessidade do
custo baixo do produto ou do serviço. O instrumento conciliador desses 2 (dois)
extremos é encontrado no “contrato de compartilhamento” para uso conjunto de
instalações industriais, comerciais e de serviços, como escritórios e outros. Duas
ou mais empresas utilizando-se das mesmas instalações e serviços significa
diminuição de seus custos de produção.
A grande inovação do sistema time sharing (multipropriedade) de um
modo geral é a divisão do tempo em turnos de dias, semanas, meses ou horários
de usos. Os primeiros são mais indicados na multipropriedade de habitações
para temporadas e a última multipropriedade para a vida negocial. Esta última
já é facilmente encontrada em consultórios médicos ou odontológicos e o que
pode ser estendido para advogados, corretores, produção industrial e atividades
outras. Uma mesma instalação servindo a vários empreendimentos, para melhor
aproveitamento econômico, repartida em unidades fixas de tempo, onde a
empresa multiproprietária exercita o seu direito de maneira exclusiva e perpétua,
é economia certa de custos da produção e aumento de seu poder de competição.
Por sinal, para que se melhor compreenda o instituto da propriedade
compartilhada, o advogado goiano ARTHUR RIOS apresenta os seus principais
pontos de distinção: 1) o conceito de direito de propriedade continua em
evolução diante das constantes alterações sociológicas. Longe está ele de ter uma
concepção definida, diante da globalização e das mutações sociais que
enfrentamos; 2) a nominação contratual do direito real de habitação periódica é
reclamo social à ciência jurídica. A falta de configuração legal produz prejuízos
sociais e individuais de credibilidade nas atividades turísticas; 3) os contratos de
compartilhamento de solo não podem ser confundidos com locações ou
comodatos. Diferenciam-se, com aqueles admitindo a utilização comum de
compartilhantes e compartilhatários, em turnos de tempo diferenciados, o que
não ocorre com os últimos; 4) a função social integra, atualmente, o conceito de
propriedade ao lado do direito de usar, gozar, dispor e reivindicar; 5) a
humanização do direito de propriedade é a própria busca de sua melhor função
social, sem que se prejudique o uso normal do seu titular; 6) a propriedade
temporária, multipropriedade ou propriedade compartilhada de lazer é uma
questão de higidez social; 7) o compartilhamento da propriedade, para fins
econômicos, significa menos custo da produção ou dos serviços das empresas
compartilhantes ou compartilhatárias, tornando-as mais competitivas no
mercado; 8) a criatividade humana tem de ser preservada pelo direito e deve ser
colocado à frente do contexto jurídico o princípio “ninguém é obrigado a deixar
de fazer a não ser por proibição legal”; 9) a multipropriedade ou propriedade
compartilhada é a propriedade comum com a divisão temporal de sua base
material individualizada, o que não é vedado no direito brasileiro; 10) a
“transitoriedade” jurídica da propriedade em comunhão, a “precariedade” legal
da indivisão do imóvel e o `direito de preferência' do condômino de direito
comum caem por terra, diante da propriedade compartilhada ou
multipropriedade. A admissão dos mesmos seria a destruição da base material da
estrutura do objetivo lícito dos compartilhatários, em afronta ao princípio
constitucional da liberdade de contratar; 11) no registro imobiliário brasileiro, a
adoção do princípio do `numerus clausus', ou de somente se levar ao fólio
registral os casos tipificados da lei é negativa do princípio constitucional da
autonomia da vontade. É a adoção do intervencionismo estatal sem lei prévia
determinando-o. É o engessamento desnecessário do direito, diante dos reclamos
sociais em sentido contrário; 12) a fixação de tempo para o uso de cada
proprietário, titular do compartilhamento, não desnatura a propriedade. Ser
proprietário não significa não poder dispor da posse direta, para terceiros.[570]
Em relação aos métodos de uso do time sharing (multipropriedade),
podemos enumerar o seguinte: 1) os proprietários podem: a) usar seu tempo de
uso; b) alugaro seu uso próprio; c) dar como um presente; d) doá-lo para uma
instituição de caridade (se a instituição de caridade escolher aceitar o ônus dos
pagamentos de manutenção associados); e) intercâmbio interno dentro do
mesmo resort ou grupo de resort; f) trocá-lo externamente por outro entre
milhares de resorts existentes; g) vende-lo através de publicidade tradicional,
online ou usando corretor licenciado; contratos de time sharing permitem a
transferência através da venda, no entanto, raramente é realizada assim; 2)
recentemente, com a maioria dos sistemas de pontos, os proprietários podem
optar por: a) atribuir seu tempo de uso ao sistema de pontos a ser trocado por
passagens aéreas, hotéis, pacotes de viagem, cruzeiros, bilhetes para parques de
diversões; b) em vez de alugar todo o seu tempo de uso real, alugar parte de seus
pontos sem realmente obter qualquer tempo de uso e usar o resto dos pontos; c)
alugar mais pontos da entidade de câmbio interna ou outro proprietário para
obter uma unidade maior, mais tempo de férias ou para uma localização melhor;
d) salvar ou mover pontos de um ano para outro. Algumas empresas de resorts,
no entanto, podem limitar quais dessas opções estão disponíveis em suas
respectivas propriedades. Os proprietários podem optar por ficar no seu resort
durante o período prescrito, que varia dependendo da natureza de sua
propriedade. Em muitos resorts, eles podem alugar a sua semana ou dar-lhe
como um presente para amigos e familiares.
Outra questão que vem à baila é a do denominado “time sharing”. Time
sharing é o contrato de termo compartilhado, ou seja, uma multipropriedade
mobiliária. Nada mais é do que o contrato de condomínio no tempo e não no
espaço. Por exemplo, cada parte exerce o direito de propriedade por
determinado tempo. É muito usado em área de lazer. Ao invés de comprar uma
casa de praia, os interessados serão proprietários desta casa por determinados
dias no ano.
Certamente, as regras do condomínio edilício servem para orientar o time
sharing, tais como as normas que disciplinam os atos de administração do
síndico, etc. Além disso, deve se ter uma administradora, para conciliar os
diferentes interesses. No entanto, a relação da administradora do time sharing
com os condomínios é de consumo, conforme já decidiu o próprio Superior
Tribunal de Justiça – STJ e outros Tribunais. Diferentee da relação existente
entre o condômino e condomínio, que certamente não é de consumo.


5.2 ETIOLOGIA HISTÓRICA DO TIME SHARING


O termo time sharing foi introduzido no Reino Unido no início dos anos
1960 expandindo em um sistema de férias que se tornou popular após a Segunda
Guerra Mundial.[571] Este compartilhamento de casas de férias, também
conhecido como partilha de casas de férias, envolveu 4 (quatro) famílias
europeias que iriam comprar uma casa de férias em conjunto, cada uma tendo
uso exclusivo da propriedade para 1 (uma) das 4 (quatro) estações. Eles
rotacionavam estações a cada ano, então cada família desfrutou as estações
prime igualmente. Este conceito foi usado principalmente por famílias bem
relacionadas, porque a propriedade conjunta exige confiança entre elas e que
nenhum gerente de propriedade esteja envolvido. No entanto, poucas famílias
em férias poderiam usar a casa durante uma temporada inteira de cada vez. De
modo que as casas de férias ou propriedades partilhas ficaram muitas vezes
vagas por longos períodos.
Mentes empreendedoras na Inglaterra decidiram dar um passo além e
dividir 1 (um) quarto de resort em 1/50 de propriedade, tendo 2 (duas) semanas
por ano para reparos e melhorias e sendo cobrada uma taxa de manutenção para
cada proprietário. Demorou quase uma década para time sharing, na Europa,
evoluir para negócio bem sucedido e bem sucedido utilização compartilhada.
O primeiro time sharing nos Estados Unidos foi iniciado em 1974 pela
Caribbean International Corporation – CIC, com sede em Fort Lauderdale,
Flórida. Ele ofereceu o que foi chamado uma licença de 25 (vinte e cinco) anos
de férias, em vez de propriedade. A empresa possuía 2 (dois) outros resorts o
titular da licença de férias poderia alternar suas semanas de férias com: um em
St. Croix e um em St. Thomas; ambos em Virgin Islands. As propriedades de
Virgin Islands começaram suas vendas do time sharing em 1973 com os
proprietários Hillie Meyers, Don Saunders, e Arthur Zimand.
O contrato era simples e direto. A empresa Caribbean International
Corporation – CIC prometeu manter e fornecer o tipo de acomodação
especificado (um estúdio, um quarto ou dois quartos) para uso pelo “proprietário
da licença” por um período de 25 (vinte e cinco) anos (até 1999, a partir de 1974,
por exemplo) na temporada especificada e o número de semanas acordado, com
apenas 2 (duas) taxas extras: 1) uma taxa diária de US $ 15,00 (por noite),
congelada a esse custo pela tempo do contrato; e 2) uma taxa de mudança de US
$ 25,00, caso o titular de licença decidisse usar sua semana ou semanas em um
dos outros resorts. A lógica da apresentação baseava-se no fato de que o custo da
licença e da diária era pequena em comparação com o custo projetado das taxas
de hotel, as quais subiriam nos próximos 25 (vinte e cinco) anos para mais de US
$ 100,00 por noite. Isto iria poupar o proprietário da licença muitos dólares
gastos em férias, caso optasse pelo contrato de licença. Ao proprietário da
licença era ainda permitido alugar ou dar sua semana ausente como presente
num ano em particular. A única estipulação era que a diária de US $ 15,00 devia
ser pago todos os anos se a unidade fosse ocupada ou não. Esta “taxa anual que
devia ser paga” se tornaria raízes do que é conhecido hoje como “taxas de
manutenção” (Homeowners Association – HOA),[572] uma vez que o Florida
Departament of Real Estate se envolveu na regulamentação do time sharing.
O conceito de time sharing nos Estados Unidos chamou a atenção de
muitos empresários devido aos enormes lucros a serem feitos vendendo a mesma
sala 52 (cinquenta e duas) vezes para 52 (cinquenta e dois) proprietários
diferentes a um preço médio, no período de 1974-1976, de US $ 3.500,00 por
semana. Pouco tempo depois, a Florida Real Estate Commission entrou em cena,
promulgando legislação para regulamentar os time sharing da Flórida e torná-los
sujeitos às fee simple ownership (“taxa de propriedade simples”). Isso
significava que, além do preço da semana de férias do proprietário, uma “taxas
de manutenção” (Homeowners Association – HOA) e a associação de
proprietários, tiveram que arcar com mais um ônus. Esta taxa simples sobre
propriedade também gerou intercâmbio entre localizações de time sharing, no
âmbito de empresas como Interval International – II e Resort Condominiums
International – RCI. De maneira que proprietários em qualquer área poderia
trocar sua semana com os proprietários em outras áreas.
A idéia de proprietários trocar sua semana, independentemente ou
através de agências de câmbio, foi usada como base para atrair grande massa de
interessados para a compra de um time sharing,.[573] Existem várias agências de
intercâmbio, mas apenas 2 (duas) são frequentemente mencionadas na indústria.
Elas são as duas maiores: Interval International – II e Resort Condominiums
International – RCI; que combinadas, têm mais de 7.000 (sete mil) resorts. Elas
têm programas de resort afiliados e os membros só podem trocar com resorts
afiliados. É mais comum que um resort, para ser afiliado, deve estar vinculado a
apenas uma das maiores agências de intercâmbio, embora resorts com dupla
afiliações não sejam incomuns. O resort do sistema time sharing , no momento
da compra dos direitos, determina quais das empresas de câmbio podem ser
usadas para fazer trocas. Resort Condominiums International – RCI e Interval
International – II cobram uma taxa de adesão anual e taxas adicionais para
quando houver requerimento de troca por um membro e membros que alugaram
determinadas semanas para que eles possam trocar.
Os proprietários também podem trocar suas semanas ou pontos através
de empresas de câmbio independentes. Proprietários podem trocar sem precisar
do resort para ter um acordo de filiação formal com as empresas, se o resort,
onde está localizada sua propriedade, concordar com tais acordos no contrato
original.
Devido à promessa de troca, proprietários de time sharing muitas vezes
vendem sua unidade independentemente da localização dela. O que não é
frequentemente divulgado é a diferença no poder de negociação, dependendo da
localização e época da propriedade. Se um resort está, por exemplo, no Havei ou
no Sul da Califórnia, ele vai poder trocar muito bem, dependendo da época e da
semana que é atribuída à unidade em particular a qual se vai tentar fazer uma
troca. No entanto, time sharing em locais altamente desejáveis e slots de época
considerada alta temporada são os mais caros do mundo, sujeito à demanda
típica de qualquer área de férias pesadamente negociada. Se acontecer de possuir
um time sharing em Palm Springs, Califórnia, no meio de julho ou agosto, por
exemplo, o seu poder de negociação é muito diminuída, porque aqueles que
procuram um resort num momento em que as temperaturas são superiores a 110
graus Fahrenheit são poucos.
No entanto, cancelamentos ou rescisão do contrato de time sharing
permaneceram o maior obstáculo da indústria até a data de hoje.

“COMPETÊNCIA RECURSAL. - Ação visando a renúncia de
quatro módulos semanais de utilização compartilhada, no sistema
‘time sharing’. –Possibilidade. Sentença de procedência. Recurso
não provido”.[574]

“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO
RESCISÓRIA E INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS
E MORAIS. RITO ORDINÁRIO. CONTRATO DE CESSÃO
DE DIREITO DE USO DE IMÓVEL EM SISTEMA DE
TEMPO COMPARTILHADO MEDIANTE UTILIZAÇÃO DE
PONTOS (TIME SHARING). SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA PARCIAL CONDENANDO O RÉU À
DEVOLUÇÃO DO VALOR PAGO PELO AUTOR,
DEDUZINDO-SE 15% (QUINZE POR CENTO) DO PREÇO
TOTAL DO CONTRATO. APELO DO AUTOR.
PROVIMENTO EM PARTE. RECONHECIMENTO DE
ABUSIVIDADE DE CLÁUSULAS ENSEJANDO A
RESCISÃO DO CONTRATO E A DEVOLUÇÃO DE 80% DO
VALOR DAS PARCELAS INTEGRALIZADAS PELO
CESSIONÁRIO. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. 1.
Autor que celebrou com a ré BEACH PARK HOTEIS E
TURISMO S/A, em setembro de 2009, ¿Contrato de cessão de
direito de uso de imóvel em sistema de tempo compartilhado
mediante utilização de pontos¿, pelo prazo de 10 (dez) anos, no
valor total de R$ 40.660,00, a ser pago da seguinte maneira: uma
entrada no valor de R$ 14.440,00 e mais 30 parcelas de R$
874,00, através de boleto bancário. Sustenta o autor que pagou o
valor da entrada e 12 parcelas do contrato. Aduz que, à época da
celebração do contrato, era alto executivo de uma empresa, no
entanto, teve seu contrato de trabalho rescindido, por isso, não
pôde mais arcar com as prestações do contrato e pede a sua
rescisão. Alega que jamais utilizou os serviços da ré. Afirma que
solicitou a extinção do contrato junto à ré, mas esta negou
qualquer devolução de valores pagos, fundamento sua negativa
na cláusula 10.2 e seguintes do contrato, a qual prevê a retenção
de 35% do valor total do contrato, em caso de rescisão por parte
do cessionário contratante. Assim, pretende a rescisão do referido
contrato, a devolução a título de danos materiais do valor total
pago à ré e indenização por danos morais. 2. Sentença de parcial
procedência condenando o réu à devolução do valor pago pelo
autor, deduzindo-se 15% (quinze por cento) do preço total do
contrato. 3. Inconformismo do autor. Provimento em parte. 4. A
hipótese é de evidente relação de consumo, a teor do que
dispõem os artigos 2° e 3°, §2° do Código de Defesa do
Consumidor. 5. Neste particular, há de se ressaltar que referida
legislação prevê no artigo 47 que ¿as cláusulas contratuais serão
interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor¿, e que o
artigo 51, § 1º, inciso III, dispõe que se presume exagerada, entre
outros casos, a vantagem que ‘se mostra excessivamente onerosa
para o consumidor, considerando- se a natureza e conteúdo do
contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares
ao caso’. 6. Cabe acentuar que as cláusulas contratuais de nº 10.2
e seguintes colocam o autor/consumidor em desvantagem
exagerada, eis que trata desigualmente a resilição contratual de
iniciativa do cessionário, pois estabelecem retenção de 35%
sobre o valor de todo o contrato, ao passo que, na hipótese de
resilição promovida pelo cedente, não há sequer cláusula
específica tratando da hipótese. 7. Considerando as
circunstâncias acima, não se afigura razoável compelir o autor ao
cumprimento integral do contrato, o qual impõe o pagamento das
parcelas vencidas e vincendas, nem tampouco que o mesmo fique
vinculado ao contrato até o seu termo final, sendo perfeitamente
possível a resolução do contrato de execução continuada ou
diferida, sobrevindo circunstância que torna a prestação de uma
das partes excessivamente onerosa, nos termos do que dispõe o
artigo 478 e seguintes do Código Civil. 8. Destarte, evidencia-se
a abusividade do ajuste diante da estipulação de obrigação que
coloca o consumidor em desvantagem exagerada, sendo
incompatível com a boa-fé e a equidade. 9. Ademais, impõe-se a
restituição das parcelas que chegaram a ser integralizadas pelo
autor, sob pena de se prestigiar o enriquecimento sem causa, nos
termos do que dispõem os artigos 884 a 886 do Código Civil. 10.
Contudo, afigura-se razoável que, a título de indenização pelas
despesas decorrentes da administração do negócio, que a
devolução das parcelas pagas não se faça de forma integral e sim
com o abatimento de 20% das prestações quitadas. Precedentes
desta Corte. 11. Quanto ao dano moral, não ignora este Relator
decisões favoráveis desta Corte ao seu deferimento em situações
aproximadas, todavia, entendo que o dano moral, aqui, não restou
devidamente caracterizado. Em que pese a retenção abusiva pela
ré de 35% do valor total do contrato se mostrar excessiva para
compensar os gastos, é certo que aquela compensação estava
prevista no contrato, ao qual anuiu a parte autora, sem qualquer
vício de vontade. Ora, se a parte adversa agiu amparada em
cláusula contratual, ainda que abusiva, é certo que a parte autora
com ela anuiu, não havendo por que ser indenizada moralmente
apenas porque a parte ré insistiu no seu cumprimento. Por outro
lado, não restou demonstrado qualquer fato relacionado ao dano
moral do autor, que, nas circunstâncias, não pode ser
simplesmente presumido. 13. Sentença que se reforma em parte
para (a) declarar rescindido o contrato celebrado entre as partes;
(b) determinar que a ré devolva ao autor 80% dos valores pagos
por este, ficando, assim, autorizada a reter 20% do valor pago
pelo autor, e não 15% do preço total do contrato, mantendo-se os
demais termos da sentença, inclusive a sucumbência recíproca.
14. APELAÇÃO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO”.[575]


5.3 NATUREZA JURÍODICA DO TIME SHARING


A natureza jurídica do time sharing ou da multipropriedade é matéria
controversa na doutrina jurídica de todos os países.
Destacamos que os primeiros passos nessa discussão para defini-la
ocorreram na Europa, justamente onde surgiu o time-sharing. Segundo DARIO
DA SILVA OLIVEIRA JUNIOR e VICTOR EMANUEL CHRISTOFARI, tal
sistema é por vezes considerado direito pessoal, direito real, forma de
comunidade de bens, propriedade quatridimensional ou mesmo como um novo
regime jurídico imobiliário.[576]
A respeito da natureza jurídica do time sharing ou da multipropriedade,
acrescentam ainda DARIO DA SILVA OLIVEIRA JUNIOR e VICTOR
EMANUEL CHRISTOFARI o seguinte: a) multipropriedade como direito
pessoal: considerando tanto a perspectiva de um pacto entre os comproprietários
de cotas indivisas de determinado imóvel (inclusive de apartamento em regime
de propriedade horizontal), quanto no âmbito de uma sociedade civil,
cooperativa ou mesmo uma sociedade anônima; b) multipropriedade como
forma de comunidade de bens: ideia sustentada por doutrinadores espanhóis, no
qual a multipropriedade derivaria do instituto das comunidades de bens,
constante do ordenamento jurídico espanhol; c) multipropriedade como direito
real: posto que o domínio, segundo a doutrina clássica do direito das coisas,
contém em si uma série de direitos como usar, gozar, fruir e dispor, ainda que
restritos a um determinado lapso temporal no caso do time-sharing; d)
multipropriedade como um novo regime jurídico imobiliário: já que a intenção
perene e a prática repetitiva de utilização sazonal do imóvel configuraria o que
se denominou posteriormente de “turnos de utilização/habitação”; e)
multipropriedade como propriedade quatridimensional: teoria esta
eminentemente italiana, que considera o tempo de uso do imóvel como uma
quarta dimensão da propriedade. O direito dos multiproprietários sobre o imóvel,
bem delineado pela conjugação dos fatores espaciais e temporais, não
configuraria uma cotitularidade, visto que o fator temporal permitiria
individualizar o direito de propriedade de cada um dos multiproprietários.[577]
Na verdade, o instituto de multipropriedade imobiliária é considerado
por alguns doutrinadores como uma espécie de condomínio, por isso sustenta tal
corrente que deve ser aplicado a ele as normas que disciplinam o condomínio
edilício.

“AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C PERDAS E
DANOS. MULTIPROPRIEDADE IMOBILIÁRIA (TIME
SHARING). ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA. GOZO
DO PERÍODO DE FRUIÇÃO A QUE FARIAM JUS OS
AUTORES EM OUTROS IMÓVEIS. CONCORDÂNCIA
QUANTO AO PROCEDIMENTO ADOTADO. PROVEITO
ECONÔMICO COM O AJUSTE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO
MATERIAL. ENLEIO PRESERVADO. SENTENÇA
MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. O sistema time
sharing ou multipropriedade imobiliária é uma espécie
condominial relativa aos locais de prazer, pela qual há um
aproveitamento econômico de bem imóvel (casa, chalé,
apartamento), repartido, como ensina Gustavo Tepedino, em
unidades fixas de tempo, assegurando a cada co-titular o seu uso
exclusivo e perpétuo durante certo período anual (DINIZ, Maria
Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 4º volume. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 212) 2. Atrasada a conclusão do
empreendimento múltiplo, com violação de cláusula específica,
assistia aos autores o direito à resolução, ou então, perseguir o
cumprimento do enleio, nos termos do art. 1.092 do Código Civil
de 1916 (art. 475 do CC/2002). Exercida a fruição de férias em
outros imóveis da rede, equivalente à segunda opção, sem
indicativo de prejuízo até que o resort ficou pronto, e sem
demonstração de impossibilidade do uso ulterior, observa-se
proveito econômico bastante à rejeição do pedido de ruptura
negocial lançado de forma tardia. 3. Recurso desprovido”.[578]

No mesmo sentido, ultimamente o Superior Tribunal de Justiça – STJ
tem se quedado a considerar a natureza jurídica do time sharing ou
multipropriedade imobiliária como uma espécie de condomínio, ou seja,
natureza jurídica de direito real.

“PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL.
EMBARGOS DE TERCEIRO. MULTIPROPRIEDADE
IMOBILIÁRIA (TIME-SHARING). NATUREZA JURÍDICA DE
DIREITO REAL. UNIDADES FIXAS DE TEMPO. USO
EXCLUSIVO E PERPÉTUO DURANTE CERTO PERÍODO
ANUAL. PARTE IDEAL DO MULTIPROPRIETÁRIO.
PENHORA. INSUBSISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL
CONHECIDO E PROVIDO. 1. O sistema time-sharing ou
multipropriedade imobiliária, conforme ensina Gustavo
Tepedino, é uma espécie de condomínio relativo a locais de lazer
no qual se divide o aproveitamento econômico de bem imóvel
(casa, chalé, apartamento) entre os cotitulares em unidades fixas
de tempo, assegurando-se a cada um o uso exclusivo e perpétuo
durante certo período do ano. 2. Extremamente acobertada por
princípios que encerram os direitos reais, a multipropriedade
imobiliária, nada obstante ter feição obrigacional aferida por
muitos, detém forte liame com o instituto da propriedade, se não
for sua própria expressão, como já vem proclamando a doutrina
contemporânea, inclusive num contexto de não se reprimir a
autonomia da vontade nem a liberdade contratual diante da
preponderância da tipicidade dos direitos reais e do sistema de
numerus clausus. 3. No contexto do Código Civil de 2002, não há
óbice a se dotar o instituto da multipropriedade imobiliária de
caráter real, especialmente sob a ótica da taxatividade e
imutabilidade dos direitos reais inscritos no art. 1.225. 4. O
vigente diploma, seguindo os ditames do estatuto civil anterior,
não traz nenhuma vedação nem faz referência à inviabilidade de
consagrar novos direitos reais. Além disso, com os atributos dos
direitos reais se harmoniza o novel instituto, que, circunscrito a
um vínculo jurídico de aproveitamento econômico e de imediata
aderência ao imóvel, detém as faculdades de uso, gozo e
disposição sobre fração ideal do bem, ainda que objeto de
compartilhamento pelos multiproprietários de espaço e turnos
fixos de tempo. 5. A multipropriedade imobiliária, mesmo não
efetivamente codificada, possui natureza jurídica de direito real,
harmonizando-se, portanto, com os institutos constantes do rol
previsto no art. 1.225 do Código Civil; e o multiproprietário, no
caso de penhora do imóvel objeto de compartilhamento espaço-
temporal (time-sharing), tem, nos embargos de terceiro, o
instrumento judicial protetivo de sua fração ideal do bem objeto
de constrição. 6. É insubsistente a penhora sobre a integralidade
do imóvel submetido ao regime de multipropriedade na hipótese
em que a parte embargante é titular de fração ideal por conta de
cessão de direitos em que figurou como cessionária. 7. Recurso
especial conhecido e provido”.[579]


5.4 ESPÉCIES DE TIME SHARING


Em relação à transferência e aos contratos direito de usar o time
sharing, podemos classifica-los da seguinte maneira: 1) deeded contracts
(contrato de transferência); 2) deeded ownership ou fractional ownership
(propriedade fracionada); 3) leasehold deeds (título de arrendamento); 4) right-
to-use contracts (contratos de direito de uso); 5) fixed-week ownership
(propriedade de semana fixa); 6) floating-week ownership (propriedade de
semanda flutuante); 7) rotating or flex-week ownership (rotação ou propriedade
de semana flexível); 8) points programs (programas de pontos).


5.4.1 Deeded contracts (Contrato de Transferência)


Com deeded contracts (contrato de transferência), o uso do resort
costuma ser dividido em incrementos de uma semana e são vendidos como
propriedade real através de propriedade fraccionada.
Como com qualquer outra fração de imóveis, o proprietário pode fazer o
que é desejado: usar a semana, alugá-lo, dá-lo, deixá-lo aos herdeiros, ou vender
a semana para outro comprador em potencial.
O proprietário também é responsável por uma parcela igual dos impostos
imobiliários, que geralmente são cobrados com taxas de manutenção do
condomínio.
O proprietário pode potencialmente deduzir algumas despesas
relacionadas com a propriedade, tais como impostos imobiliários da renda
tributável.[580]


5.4.2 Deeded ownership ou fractional ownership (Propriedade Fracionada)


O deeded ownership ou fractional ownership (propriedade fracionada) é
um método em que várias partes não relacionadas podem compartilhar e mitigar
o risco de propriedade de um ativo tangível de alto valor, geralmente um jato,
um iate ou um pedaço de imóvel de resort.
Pode ser feito por razões estritamente monetárias, mas normalmente há
alguma quantidade de acesso pessoal envolvido. Um dos principais motivadores
para uma compra fracionária é a capacidade de compartilhar os custos de
manutenção de um ativo que não será usado em tempo integral por um
proprietário.
No entanto, cada empreendimento fracionário requer algum tipo de
gestão, para administrar as regras e regulamentos (que são acordados antes da
fração ser adquirida) e manter o ativo ao grau estabelecido nos documentos de
propriedade. Geralmente, a gerência supervisionará o funcionamento diário de
mais de uma propriedade, embora não seja necessário. Um único ativo
fracionado pode ser gerido por uma única entidade.
Cada proprietário é garantido um montante prescrito de acesso ao ativo,
que normalmente pode ser usado ou oferecido ao público como aluguel ou
fretamento, a renda é geralmente dividida entre a empresa de gestão eo
proprietário fracionário, a menos que o proprietário encontra o próprio locatário.
Além disso, cada proprietário paga uma parcela das taxas de gestão anuais e de
manutenção, em relação à percentagem de propriedade.
Nos negócios, a propriedade fracionária é uma porcentagem de um
ativo caro. As ações são vendidas a particulares. Normalmente, uma empresa
gerencia o ativo em nome dos proprietários, que pagam taxas mensais/anuais
para a administração mais taxas de uso variáveis (por exemplo, por hora, por
dia).
Para ativos depreciando rapidamente, a empresa de gestão pode vender o
ativo e distribuir os rendimentos de volta para os proprietários, que podem então
reivindicar uma perda de capital e, opcionalmente, comprar uma fração de um
novo ativo.
No entanto, se a propriedade fracionária oferece uma vantagem
financeira sobre o arrendamento é um debate permanente, e alguns países e
regiões têm leis fiscais que fornecem benefícios adicionais para os proprietários,
tais como subsídios de perda de capital, enquanto outros podem penalizar a
propriedade sobre o arrendamento.
Como se pode observar, o deeded ownership ou fractional ownership
(propriedade fracionada) pode ser tão complexo quanto a propriedade direta ou
propriedade em que a estrutura de ações variam de acordo com as leis locais
sobre direito de propriedade.


5.4.3 Leasehold deeds (Título de Arrendamento)


Os leasehold deeds (título de arrendamento) são comuns e oferecem
propriedade por um período de tempo fixo após o qual a propriedade reverte
para o proprietário livre.
Ocasionalmente, escrituras de arrendamento são oferecidas em
perpetuidade, porém muitas ações não transmitem a propriedade da terra, mas
apenas o apartamento ou unidade (habitação) do alojamento.


5.4.4 Right-to-use contracts (Contrato de Direito de Uso)


Com right-to-use contracts (contratos de direito de uso), o comprador
tem o direito de usar a propriedade de acordo com o contrato, mas em algum
momento o contrato termina e todos os direitos revertem para o proprietário da
propriedade. Assim, um contrato direito de uso concede o direito de usar o resort
para um número específico de anos.
Em muitos países há limites severos na propriedade de propriedade
estrangeira. De maneira que este é um método comum para desenvolver recursos
em países tais como México. Deve-se ter cuidado com esta forma de
propriedade, uma vez que o direito de utilização assume frequentemente a forma
de uma associação ao clube ou o direito de utilizar o sistema de reservas,
quando o sistema de reserva é propriedade de uma empresa que não está sob o
controle dos proprietários.
O direito de uso pode ser perdido com a quebra da empresa
controladora, porque o direito de usar o contrato do comprador geralmente é
apenas bom com o proprietário atual, e se esse proprietário vende o imóvel, o
titular do direito de uso pode estar fora do ajuste, dependendo da estrutura do
contrato e/ou das leis atuais em locais estrangeiros.

“Embargos de Terceiro – Ação julgada parcialmente procedente
para declarar insubsistente a penhora – Penhora incidente sobre
imóvel que integra empreendimento direitos no sistema "Time
Sharing" – Negócio jurídico que não confere ao cessionário a
copropriedade do imóvel penhorado – Relação obrigacional –
Manutenção da penhora – Sentença reformada – Recurso
provido”.[581]

As questões relativas ao direito de usar foi a principal razão em locais
dos Estados Unidos, que o US Departament of Real Estate se envolveu com as
compras de time sharing, e as vendas de time sharing sujeitas à fee simple
ownership (“taxa de propriedade simples”) . De fato, com a fee simple
ownership, a segurança aumentou, juntamente com os custos, que atualmente
tem de incluir as “taxas de manutenção” (Homeowners Association – HOA), e
outras taxas de manutenção: custo contínuo para os proprietários e seus
herdeiros, a menos ou até que o tempo é transferido/vendido a um novo
proprietário.
Uma variante de time share baseado em imóveis que combina recursos
de deeded contracts (contrato de transferência) com right-to-use contracts
(contratos de direito de uso) foi desenvolvido pela Disney Vacation Club – DVC
em 1991. Compradores de Disney Vacation Club – DVC compartilham
interesses, a quem Disney Vacation Club – DVC chama de membros recebem
escritura transmitindo propriedade real indivisa em uma unidade de time
sharing. Os direitos de propriedade de cada membro do Disney Vacation Club –
DVC são acompanhados por uma parcela anual de pontos de férias em proporção
ao tamanho do interesse de propriedade. Sistema de pontos de férias do Disney
Vacation Club – DVC é comercializado como altamente flexível e pode ser usado
em incrementos diferentes para estadias de férias em resorts do Disney Vacation
Club – DVC com uma variedade de acomodações de estúdios para moradias de 3
(três) quartos. Pontos de férias do Disney Vacation Club – DVC podem ser
trocados por férias em todo o mundo em resorts não-Disney Vacation Club –
DVC, ou podem ser depositados ou emprestados em anos futuros. A estrutura de
deeded contracts (contrato de transferência) ou right-to-use contracts (contratos
de direito de uso) do Disney Vacation Club – DVC, que tem sido utilizado em
todos os seus times sharings resorts, foi adotado por outros grandes
empreendedores de time sharing, incluindo o Hilton Grand Vacations Company,
o Marriot Vacation Club, o Hyatt Residence Club e o Accor, na França.


5.4.5 Fixed Week Ownership (Propriedade de Semanda Fixa)


A unidade de venda no sistema time sharing mais comum é o contrato de
uma semana fixa, ou seja, o fixed-week ownership (propriedade de semana fixa).
Neste caso o resort terá um calendário enumerando as semanas
aproximadamente de cada proprietário, coincidindo o começo com a primeira
semana do colendário do ano.
Um proprietário pode possuir uma escritura para usar uma unidade por
uma única semana especificada. Por exemplo, a semana 26 (vinte e seis)
normalmente inclui o período equivalente ao primeiro quarto de julho de férias;
a semana 51 (cinquenta e um), normalmente engloca o Natal; e assim por diante.
Se um proprietário adquiriu a semana 26 (vinte e seis) da propriedade num
determinado resort, ele ou ela só poderá usar essa semana em particular a cada
ano.


5.4.6 Floating-week ownership (Propriedade de Semanda Flutuante)


Às vezes as unidades são vendidas como semanas flutuantes, ou seja,
floating-week ownership (propriedade de semanda flutuante). Neste caso, a
propriedade será específica sobre quantas semanas o proprietário possui e de
quais semanas o proprietário pode selecionar para a estadia do proprietário.
Um bom exemplo disso pode ser uma semana flutuante de verão, onde o
proprietário pode solicitar qualquer semana durante a temporada de verão,
geralmente semanas 22 (vinte e dois) a 36 (trinta e seis). Neste exemplo, haveria
concorrência para semanas de “grandes feriados”, como as semanas de “Semana
Santa”, “Natal”, “Ano Novo” e “Dia do Trabalhador”.
As semanas em que as escolas ainda podem estar em plena atividade,
com aulas diárias, não seriam consideradas tão altas na demanda do resort.
Todavia, é importante ter em mente que alguns floating-week ownership
(propriedade de semanda flutuante) excluem, expressamente, grandes feriados
para que possam ser vendidos como fixed-week ownership (propriedade de
semana fixa).


5.4.7 Rotating or flex week owership (Rotação ou Propriedade de Semanda
Flexível)


Alguns tims sharings são vendidos como semanas de rotação,
comumente referido como semanas flexíveis. Tal sistema ganha a denominação
de rotating or flex-week ownership (rotação ou propriedade de semana flexível).
Em tentativa de dar a todos os proprietários chance de usufruírem as
melhores semanas, estas são giradas para frente ou para trás através do
calendário, por isso no ano 1 (um) o proprietário pode ter uso da semana 25
(vinte e cinco), então a semana 26 (vinte e seis) no ano 2 (dois) e, em seguida,
semana 27 (vinte e sete) no Ano 3 (três) do contrato.
Este método de time sharing dá a cada proprietário a justa oportunidade
para utilização de semanas diferentes, mas ao contrário de seu nome, não é
flexível.


5.4.8 Points Programs (Programas de Pontos)


Os points programs (programas de pontos), baseados em resorts,
também são vendidos como contrato de transferência de propriedade e como
contrato de direito de uso.
Points programs (programas de pontos) anualmente dão ao proprietário
uma quantidade de pontos iguais ao nível de propriedade. Por sinal, o
proprietário num desses programas pode usar esses pontos para fazer arranjos de
viagem dentro do grupo resort.
Muitos points programs (programas de pontos) são afiliados a grandes
grupos de resort, oferecendo grande variedade de opções para o destino.
Ademais, muitos desses programas possuem o recurso de fornecer a
flexibilidade da estadia em semanas tradicionais. Os membros do points
programs (programas de pontos), tais como World Mark by Wyndham, podem
pedir de todo o inventário disponível do grupo de resort.
Um membro do points programs (programas de pontos) pode muitas
vezes solicitar semanas fracionárias, bem como estadias de semana completa ou
múltipla. O número de pontos necessários para permanecer no resort em questão
variará com base em um gráfico de pontos. O gráfico de pontos permitirá fatores
como: 1) popularidade do resort; 2) tamanho das acomodações; 3) numero de
noites; 4) destaque da temporada.


5.5 TIPOS E TAMANHOS DE TIME SHARING


Em relação aos tipos e tamanhos de acomodações, podemos dizer que
propriedades no sistema time sharing tendem a ser estilo de apartamento com
acomodações variando em tamanho de unidade padrão [com espaço para 2 (dois)
quartos], unidade para 3 (três) e 4 (quatro) quartos. Estas unidades maiores
geralmente podem acomodar confortavelmente famílias grandes.
Seja qual for o estilo, as unidades normalmente incluem cozinhas
totalmente equipadas com uma área de jantar, máquina de lavar louça,
televisores, leitores de DVD, etc. Não é incomum ter lavadoras e secadoras na
unidade ou acessível na propriedade do resort. A área da cozinha e amenidades
irão refletir no tamanho da unidade em questão.
Unidades do sistema time sharing são geralmente listadas por quantas
pessoas na unidade vão dormir e quantos a unidade tem a capacidade de
ocupação em particular. Tradicional, mas não exclusivamente: 1) capacidade 2/2,
seria normalmente 2 (duas) pessoas para unidade de 1(um) quarto ou unidade
padrão de 2 (dois) quartos); 2) capacidade 6/4 seria normalmente 6 (seis) pessoas
para unidade padrão de 2 (dois) quartos com 1 (um) sofá-cama.
Vale acrescentar que time sharing são vendidos em todo o mundo e cada
local tem suas próprias descrições exclusivas. Por exemplo, sleep privately,
geralmente, refere-se ao número de convidados que não terão de caminhar
através da área de dormir de outro convidado para usar um banheiro. No entanto,
o sistema time sharing resorts tendem a ser rigorosos sobre o número de
convidados permitidos por unidade.
Vale ainda ressaltar que o tamanho da unidade afeta o custo e a demanda
em qualquer resort. O mesmo não é verdade comparando resorts em diferentes
locais. Uma unidade de 1 (um) quarto em um local muito desejável pode ainda
ser mais caro e em maior demanda do que uma acomodação de 2 (dois) quartos
em um resort com menos demanda. Um exemplo disto pode ser 1 (um) quarto
em um resort de praia muito desejável em comparação com uma unidade de 2
(dois) quartos em um resort localizado no interior da mesma praia.


5.6 LEGISLAÇÃO SOBRE TIME SHARING


É sabido que a maioria dos estados europeus não redigiu legislação
específica para o sistema de time sharing, o qual não obedece a um padrão
contratual especial, mantendo-se as discussões sobre a presença de um direito
obrigacional ou um direito real nessa modalidade condominial. Seja como for, a
utilização do time sharing vem sendo verificada em diversos ramos, dentre os
quais destacamos: 1) carros de luxo; 2) aeronaves particulares; 3) barcos, navios
e iates particulares; e 4) casas de praia/férias e resorts. Em vista disso, a Grécia,
por exemplo, acabou regulamentando a multipropriedade imobiliária como
modalidade de locação, sendo um dos primeiros países a fazê-lo, em 1986.
Assim como em boa parte dos estados europeus, não há legislação
específica a tratar do time sharing no Brasil. Entretanto, um dos grandes
impasses enfrentados para difundir esse instituto no território brasileiro é a falta
de regulamentação específica. Uma vez que o instituto de multipropriedade
imobiliária é considerado por alguns doutrinadores como uma espécie de
condomínio, analogamente se usam certos conceitos do Código Civil Brasileiro,
em seu capítulo de “Condomínio Edilício”.
Seja como for, o marco regulatório do time sharing no Brasil se deu
somente em 12.08.1997 com a edição da Deliberação Normativa nº 378 pela
qual o Ministério do Turismo, através do Instituto Brasileiro de Turismo –
EMBRATUR, implementou o sistema de tempo compartilhado em meios de
hospedagem de turismo, considerando, para tanto, a importância que o Sistema
de Tempo Compartilhado em Meios de Hospedagem vem adquirindo em todo o
mundo, bem como considerando que este sistema, embora em franco
desenvolvimento necessita de diversos agentes intervenientes, sendo o elo mais
fraco nesta cadeia o consumidor adquirente ou destinatário final que precisa ter
seus direitos protegidos pelo poder publico.
É importante alertar para o fato de que, embora a Deliberação
Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997, não tenha densidade normativa,
tal documento versa sobre o regulamento do sistema de time sharing em Meios
de Hospedagem de Turismo, bem como seu funcionamento e os direitos e
obrigações das partes nesse sistema, observada a sua crescente utilização em
todo o mundo.
Posteriormente, o Decreto nº 7.381, de 01.12.2010 (regulamenta a Lei n°
11.771, de 17.09.2008, que dispõe sobre a Política Nacional de Turismo e define
as atribuições do Governo Federal no planejamento, desenvolvimento e estímulo
ao setor turístico), apresentou definição para o sistema de time sharing, ou tempo
corpartilhado, em seu art. 28: “Considera-se hospedagem por sistema de tempo
compartilhado a relação em que o prestador de serviço de hotelaria cede a
terceiro o direito de uso de unidades habitacionais por determinados períodos de
ocupação, compreendidos dentro de intervalo de tempo ajustado
contratualmente”.[582]




5.7 REGULAMENTO DO SISTEMA DE TEMPO
COMPARTILHADO EM MEIOS DE HOSPEDAGEM
DE TURISMO


Sistema de Tempo Compartilhado (time sharing sistem), também
denominado multitasking, refere-se a um sistema operacional específico, o qual é
uma extensão lógica da multiprogramação.
Basicamente, o Sistema de Tempo Compartilhado (time sharing sistem),
utilizado pelo mercado imobiliário, consiste em alternar entre diferentes épocas
do ano de forma que o usuário/proprietário do imóvel tenha a percepção que os
interesses de todos os usuários/proprietários estão sendo atendidos
alternativamente durante o ano, permitindo a interação com múltiplos direitos de
uso em exercício. Esta percepção é dada pela concretização das trocas de tempos
em que os vários exercícios do direito de uso ocorrem, sendo tão certos nas
épocas definidas e disponíveis que se tornam não perceptíveis do ponto de vista
de cada um dos usuários/proprietário[583]
O conceito de Sistema de Tempo Compartilhado (time sharing sistem)
significa compartilhamento de tempo, ou seja, o tempo ocioso de um
determinado usuário/proprietário de imóvel é compartilhado com outros
usuários/proprietários para dinamizar o sistema, comum em locais muito
procurados para férias. Múltiplas ocupações são executadas sequencialmente. Os
usuários/proprietários exercem seu respectivo direito de uso, em sequência, por
um determinado tempo. Os tempos dedicados para cada ocupação de
usuário/proprietário são pequenos o suficiente para dar a ilusão de que os
direitos de uso estão sendo execidos alternadamente durante todo ano.


5.7.1 Parte Geral do Regulamento do Sistema de Tempo Compartilhado


O art. 1° da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997,
reconhece, para todos os efeitos, o interesse turístico do Sistema de Tempo
Compartilhado em Meios de Hospedagem de Turismo, por meio da cessão pelo
prazo mínimo de 05 (cinco) anos e a qualquer titulo, do direito de ocupação de
suas unidades habitacionais, por períodos determinados do ano.
As seguintes pessoas fazem parte integrante do Sistema de Tempo
Compartilhado: I- o empreendedor: como tal entendido o titular do domínio e
posse do Meio de Hospedagem de Turismo implantado ou em implantação, no
qual, integral ou parcialmente, o sistema funcione; II- o comercializador: como
tal entendido o contratado pelo empreendedor, para promover e comercializar o
direito de ocupação em unidades habitacionais do Meio de Hospedagem de
Turismo que tenha aderido ao sistema e nele funcione regularmente; III- o
operador: como tal entendido o responsável pela prestação dos serviços
ajustados entre o empreendedor e o cessionário, na forma e qualidade por ele
contratada, atendendo os pedidos de reservas efetuadas e zelando pela
manutenção de regime de utilização dos espaços, bens e serviços, em
conformidade com sua destinação; IV- o administrador de intercâmbio: como tal
entendido o responsável pela promoção e organização de permuta de períodos de
ocupaca entre cessionários de unidades habitacionais de distintos Meios de
Hospedagem de Turismo, que funcionem, no Pais ou no Exterior, no Sistema de
Tempo Compartilhado; V- o cessionário do direito de ocupação: como tal
entendido 0 detentor do uso e ocupação, por determinado período de tempo, de
unidade habitacional de determinado meio de hospedagem de turismo
participante do sistema (art. 2° da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378,
de 12.08.1997).
Compete ao empreendedor do Sistema de Tempo Compartilhado em
Meios de Hospedagem de Turismo o seguinte: I- ceder o direito de ocupação por
um ou mais períodos e prazos determinados do ano, de uma ou mais unidades
habitacionais do Meio de Hospedagem de Turismo, devidamente mobiliada e
equipada; II- permitir ao cessionário do direito de ocupação o uso dos espaços,
coisas e serviços comuns do Meio de Hospedagem de Turismo; III- operar, por si
ou por terceiros, as unidades habitacionais, espaços, coisas e serviços cuja
utilização estiver compreendida na cessão, incluindo o regulamento
correspondente; IV- manter a unidade habitacional hoteleira cuja ocupação for
cedida e as demais instalações e serviços do empreendimento em estado
adequado para utilização; V- cobrir as despesas operacionais das unidades
habitacionais cujo direito de ocupação não tenha sido cedido ou das unidades
temporais não cedidas; VI- receber dos cessionários do direito de ocupação,
diretamente ou por terceiros, correspondentes aos períodos de utilização por eles
contratados (art. 3° da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de
12.08.1997).
Compete ao comercializador do Sistema de Tempo Compartilhado em
Meios de Hospedagem de Turismo o seguinte: I- oferecer e contratar, em nome
do empreendedor, a cessão do direito de ocupação de unidades habitacionais em
Meio de Hospedagem de Turismo; II- divulgar de forma adequada os atributos
do empreendimento e os serviços nele existentes ou a serem implantados; III-
esclarecer os consumidores sobre as reais características da cessão do direito de
ocupação e o conteúdo do respectivo contrato (art. 4° da Deliberação
Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).
Compete ao operador do Sistema de Tempo Compartilhado em Meios de
Hospedagem de Turismo o seguinte: I- manter o regime de utilização dos
espaços, bens e serviços conforme o seu destino: II- prestar os serviços ajustados
entre o empreendedor e o cessionário na forma e qualidade por eles contratada;
III- atender os pedidos de reservas dos períodos de ocupação das unidades
habitacionais observando os direitos dos cessionários e a prioridade das
solicitações; IV- verificar o cumprimento das obrigações dos cessionários,
adotando as providencias contratuais caso não ocorra; V- manter controle de
registro dos cessionários, com a qualificação completa de seu contrato e
lançamento de ocorrências; VI- manter controle e documentação hábil de
registros financeiros e contábeis; VII- aplicar corretamente a taxa de manutenção
paga pelos cessionários (art. 5° da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378,
de 12.08.1997).
Compete ao administrador de intercâmbio do Sistema de Tempo
Compartilhado em Meios de Hospedagem de Turismo o seguinte: I- afiliar os
Meios de Hospedagem de Turismo segundo os padrões por eles estabelecidos; II-
aceitar os pedidos de associação dos cessionários do direito de ocupação de
unidades em Meios de Hospedagem de Turismo filiados, que desejem utilizar a
possibilidade de permuta; III- efetivar a permuta solicitada pelos associados
segundo as regras constantes do contrato de associação; IV- manter seus
associados informados sobre os Meios de Hospedagem de Turismo que integram
a rede de intercâmbio e respectivas normas de permuta (art. 6° da Deliberação
Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).
Compete ao cessionário do direito de ocupação do Sistema de Tempo
Compartilhado em Meios de Hospedagem de Turismo o seguinte: I- pagar o
preço ajustado no respectivo contrato de cessão para exercer o direito de
ocupação; II- pagar, na forma, proporção e prazo ajustados, os valores
correspondentes a taxa de manutenção estabelecida no contrato, ao
empreendedor ou à sua conta; III- ocupar a unidade habitacional cedida ou
permutada e os espaços, bens e serviços de uso comum de acordo com os
regulamentos correspondentes (art. 7° da Deliberação Normativa/EMBRATUR
nº 378, de 12.08.1997).
Esclarecido isto, podemos dizer que os períodos de ocupação, por ano,
nos quais o cessionário do direito de ocupação, por força do respectivo contrato,
pode utilizar a unidade habitacional e os serviços comuns do Meio de
Hospedagem de Turismo, podem ser das seguintes modalidades: I- fixos ou
flutuantes; II- determinados em dias, semanas ou meses; III- específicos, ou não,
a determinado tipo e categoria de Meio de Hospedagem de Turismo e/ou unidade
habitacional (art. 8° da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de
12.08.1997).
Contratos de tempo compartilhado são instrumentos, públicos ou
privados, pelos quais o empreendedor, por si ou por meio do comercializador,
cede, por períodos, o direito de ocupação de unidades habitacionais equipadas e
mobiliadas em Meios de Hospedagem de Turismo de seu domínio ou posse,
permitindo o uso de seus espaços, bens e serviços comuns, e assumindo, por si
ou por terceiro, a sua operação (art. 9° da Deliberação Normativa/EMBRATUR
nº 378, de 12.08.1997).


5.7.2 Funcionamento do Sistema de Tempo Compartilhado


Os empreendedores, operadores, comercializadores e administradores
de intercâmbio de Sistemas de Tempo Compartilhado em Meios de Hospedagem
de Turismo só podem funcionar no Brasil após o devido cadastramento no
Instituto Brasileiro de Turismo – EMBRATUR, mediante comprovação de
capacidade jurídica, técnica e econômico-financeira compatível com suas
respectivas responsabilidades; na forma por ela estabelecida e verificada. Tal
cadastramento é' igualmente obrigatório para comercializadores de
empreendimentos localizados no exterior (caput e §1° do art. 10 da Deliberação
Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).
O cadastramento de empreendedores está' sujeito, ainda, a comprovação
do seguinte: a) titularidade de domínio ou posse das unidades habitacionais
destinadas ao Sistema de Tempo Compartilhado em Meios de Hospedagem de
Turismo, por força de instrumento próprio, devidamente registrado, e, no caso do
Meio de Hospedagem de Turismo, ter ônus real, averbação da anuência do credor
à cessão do direito de ocupação das unidades habitacionais no Sistema de Tempo
Compartilhado em Meios de Hospedagem de Turismo; b) registro do sistema na
matricula do imóvel, com as características de funcionamento e o prazo para a
implantação e duração, durante o qual a alteração de destinação implicará
anuência de todos os cessionários de direito de ocupação (§2° do art. 10 da
Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).
É importante acrescentar que o referido cadastro pode', a critério do
Instituto Brasileiro de Turismo – EMBRATUR, ser renovado, periodicamente,
mediante exigência das atualizações comprobatórias previstas (§3° do art. 10 da
Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).


5.7.3 Contrato de Tempo Compartilhado


Os Contratos de Tempo Compartilhado devem conter, entre outras,
cláusulas referentes aos seguintes aspectos relativos aos bens e serviços: I-
descrição e identificação cadastral do Meio de Hospedagem de Turismo; II-
especificação dos bens e instalações previstos no projeto aprovado da obra; III-
indicação da proporção de unidades habitacionais destinadas aos Sistemas de
Tempo Compartilhado em Meios de Hospedagem de Turismo; IV- determinação
dos espaços, bens e serviços de ocupação e utilização privativa e comum; V-
numero máximo de pessoas que poderão ocupar as unidades habitacionais
durante cada período de utilização; VI- normas de utilização das unidades
habitacionais, bens, espaços e serviços de uso comum, e respectivas sanções pelo
seu não cumprimento; VII- procedimento para a implantação adicional de
unidade habitacional, espaços, coisas ou serviços de uso comum; VIII- regras
sobre casos de destruição parcial ou total dos imóveis e móveis relacionados; IX-
comprovação de seguro de cobertura contra risco de incêndio (art. 11 da
Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).
Os Contratos de Tempo Compartilhado devem, também, regular, de
forma clara, os seguintes direitos dos cessionários de direito de ocupação: I-
continuidade do direito de ocupação no caso de transferencia do imóve1, a
qualquer titulo, ou de alteração total ou parcial de sua destinação; II- natureza e
espécie do direito cedido e correspondente prazo de duração; III- procedimento
para a transmissão dos direitos pelos cessionários de direito de ocupação; IV-
determinação, duração e categoria dos períodos de tempo cedidos e
procedimentos para sua modificação e solicitação de disponibilidade pelos
cessionários de direito de ocupação; V- regimes de deliberação e decisão sobre
as questões relativas à gestão e utilização dos bens e serviços contidos na cessão;
VI- hipóteses de rescisão do contrato, e seus efeitos para as partes (caput do art.
12 da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).

“RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. RESCISÃO DE
CONTRATO COM DEVOLUÇÃO DE VALORES.
CONTRATO DE HOSPEDAGEM EM SISTEMA TIME
SHARING. LEGITIMIDADE PASSIVA DA RECORRIDA.
PRELIMINAR CONTRARRECURSAL DE INDEFERIMENTO
DA AJG REJEITADA. DESISTÊNCIA DO CONTRATO PELO
AUTOR. MULTA CONTRATUAL. REDUÇAO PELA
SENTENÇA PARA 10%. MANUTENÇÃO. DEVOLUÇÃO
DOS VALORES PAGOS QUE ULTRAPASSAM ESSA
QUANTIA. PROVA DOS PAGAMENTOS PELO
RECORRENTE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO”.[584]

Os Contratos de Tempo Compartilhado devem prever, de forma
expressa, a possibilidade de os cessionários de direito de ocupação exercerem o
direito de arrependimento previsto no art. 49 da Lei nº 8.078, de 11.09.1990
(dispõe sobre a proteção do consumidor),[585] com devolução integral dos valores
pagos ou entregues (§1° do art. 12 da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº
378, de 12.08.1997).
Os Contratos de Tempo Compartilhado devem prever, também, de forma
expressa, a cláusula penal aplicável as suas rescisões imotivadas por qualquer
das partes, sem prejuízo da composição de perdas e danos (§2° do art. 12 da
Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).
Outrossim, os Contratos de Tempo Compartilhado devem, ainda, regular
os seguintes aspectos relativos a operação de bens e serviços cuja ocupação e
utilização forem cedidas: I- forma de designação e alteração do operador, com
respectivos direitos e obrigações, inclusive remuneração; II- determinação dos
valores necessários para as despesas operacionais a serem pagos pelos
cessionários de direito de ocupação e forma de pagamento correspondente; III-
indicação de responsabilidade de pagamento das despesas operacionais no caso
de períodos de ocupação não cedidos; IV- previsão de fundo de reserva na taxa
de manutenção estabelecida no contrato, para manter o empreendimento no
padrão ajustado; V- indicação das hipóteses em que poderá ser instruída taxa de
manutenção extraordinária; VI- indicação do valor dos serviços não incluídos
no direito de ocupação e nas despesas operacionais ou fundo de reserva; VII-
procedimentos para aprovação de eventual alteração da taxa de manutenção;
VIII- normas relativas a encargos rnoratórios e penalidades; IX- cobertura
contra incêndio (caput do art. 13 da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº
378, de 12.08.1997).
Entretanto, são consideradas nulas, sujeitando seus responsáveis as
penalidades previstas em lei, as clausulas abusivas (art. 39 da Lei nº 8.078, de
11.09.1990),[586] as propagandas enganosas (art. 37 da Lei nº 8.078, de
11.09.1990),[587] a estratégia de venda que venha a iludir o consumidor (arts. 30
a 35 da Lei nº 8.078, de 11.09.1990)[588] e a cobrança de serviços cujas
condições não estejam conveniente e suficientemente explicitadas para os
consumidores e cessionários de direito de ocupação (parágrafo único do art. 13
da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).

“APELAÇÃO. CONSUMIDOR. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS.
CESSÃO DE DIREITOS EM UNIDADE OCUPACIONAL.
SISTEMA DE MULTIPROPRIEDADE (TIME-SHARE, OU
TIME-SHARING TURÍSTICO, OU TEMPO
COMPARTILHADO). AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL
CUMULADA COM RESTITUIÇÃO DE VALORES E
INDENIZAÇÃO POR DANO E MORAL. PARCIAL
PROCEDÊNCIA PARA EXCLUIR O PEDIDO DE
INDENIZAÇÃO DO DANO MORAL. DANO MORAL
TIPIFICADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM R$
12.000,00. RECURSO DOS AUTORES PROVIDO. O acervo
probatório coligido nos autos é suficiente em demonstrar a
aplicabilidade, na espécie, do CDC. Considera-se tipificado o
dano moral em seu aspecto pedagógico punitivo, na medida em
que tal espécie de prestação defeituosa dos serviços não deve ser
tolerada pelo consumidor, impondo às apeladas o aprimoramento
na prestação de seus serviços. Por isso, mantendo-se sempre os
critérios de razoabilidade e proporcionalidade que as
circunstâncias do processo apresentam, serve a verba indenizável
também de consolo ao sofrimento experimentado pelos
consumidores. Às causadoras do dano, tem a medida a finalidade
de evitar novas vítimas e ocorrências semelhantes. APELAÇÃO.
CONSUMIDOR. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. CESSÃO DE
DIREITOS EM UNIDADE OCUPACIONAL. SISTEMA DE
MULTIPROPRIEDADE (TIME-SHARE, OU TIME-SHARING
TURÍSTICO, OU TEMPO COMPARTILHADO). AÇÃO DE
RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM
RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANO
E MORAL. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
INOCORRÊNCIA. IMPOSIÇÃO DE REALIZAÇÃO DE
PROVA NEGATIVA. NÃO CONFIGURAÇÃO. INTELECÇÃO
DO ART. 333, II, DO CPC. MULTA PENAL
COMPENSATÓRIA. EXIGÍVEL. RECURSO DA RÉ
IMPROVIDO. As rés não se desincumbiram do ônus de
desconstituir as alegações dos autores, nos termos do art. 333, II,
do CPC. Indiscutível, de outro vértice, a hipossuficiência dos
acionantes, bem assim, a necessidade de cominação da multa
penal compensatória adrede pactuada. Correta a devolução dos
valores alusivos aos pontos não utilizados. PROCESSUAL
CIVIL. ALTERAÇÃO DA CONDENAÇÃO COM A
INCLUSÃO DA REPARAÇÃO DO DANO MORAL.
REDISTRUIÇÃO DA VERBA SUCUMBENCIAL.
NECESSIDADE. RECURSO DOS AUTORES PROVIDO.
Tendo em vista a alteração da condenação para incluir a
reparação do dano moral, mostra-se imperiosa, por via de
consequência, a alteração do percentual dos honorários
advocatícios, que neste ato são fixados em 20% (vinte por cento)
sobre o montante da condenação, devendo ser suportados
solidariamente pelas rés”.[589]

“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO
ESPECIFICADO. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL
COM PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E
INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.
SISTEMA DE TEMPO COMPARTILHADO - TIME SHARING.
HOSPEDAGEM INDISPONÍVEL NO MOMENTO EM QUE
SOLICITADO PELOS ADERENTES. AUSÊNCIA DE
INFORMAÇÕES CLARAS E PRECISAS A RESPEITO DA
PACTUAÇÃO. RESOLUÇÃO CONTRATUAL DEFERIDA.
DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS. INEXECUÇÃO
CONTRATUAL RECONHECIDA. NEGARAM
[590]
PROVIMENTO. UNÂNIME”.

“AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C.C PEDIDO DE
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AÇÃO JULGADA
PROCEDENTE. ALEGAÇÃO RECURSAL DE
INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DO VALOR DA CAUSA.
VALOR DA CAUSA QUE NÃO CORRESPONDE AO VALOR
DO CONTRATO, MAS SIM À PRETENSÃO ECONÔMICA
DO AUTOR, NO CASO VALOR DO SINAL E DANOS
MORAIS, OS QUAIS TOTALIZAM MENOS DE 40
SALÁRIOS MÍNIMOS. CONTRATO DE TIME SHARING.
SERVIÇOS DE HOTELARIA NO SISTEMA DE TEMPO
COMPARTILHADO. MARKETING AGRESSIVO.
AUSÊNCIA DE INFORMAÇÕES CLARAS E PRECISAS A
RESPEITO DA PACTUAÇÃO. NECESSIDADE DE
PAGAMENTO DE UMA TAXA, QUE NÃO FOI INFORMADA
NO MOMENTO DA CONTRATAÇÃO, PARA QUE O
CONSUMIDOR PUDESSE RESERVAR UM HOTEL.
INOBSERVÂNCIA DO DEVER DE BOA-FÉ OBJETIVA.
RESOLUÇÃO CONTRATUAL DEFERIDA. DEVOLUÇÃO
DOS VALORES PAGOS DE FORMA SIMPLES.
CONDENAÇÃO EM DANO MORAL NO VALOR DE R$
4.000,00 PARA CADA AUTOR. VALOR PROPORCIONAL ÀS
CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. 1. Nos termos do
enunciado 39 do FONAJE: ‘Em observância ao art. 2° da Lei
9.099/1995, o valor da causa corresponderá à pretensão
econômica objeto do pedido’. 2. O marketing utilizado no ?time
sharings? gera um desequilíbrio contratual, pois os funcionários
da empresa são treinados para exagerar nas vantagens do
negócio, deixando o consumidor cansado e confuso, o qual não
dispondo de condições e de tempo necessário para refletir sobre a
contratação. 3. Falta de dever de informação, pois quando da
contratação não houve a informação de que o consumidor haveria
de pagar uma taxa anual 4. Precedentes Judiciais: A)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO
ESPECIFICADO. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL
COM PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E
INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.
SISTEMA DE TEMPO COMPARTILHADO - TIME SHARING.
HOSPEDAGEM INDISPONÍVEL NO MOMENTO EM QUE
SOLICITADO PELOS ADERENTES. AUSÊNCIA DE
INFORMAÇÕES CLARAS E PRECISAS A RESPEITO DA
PACTUAÇÃO. RESOLUÇÃO CONTRATUAL DEFERIDA.
DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS. INEXECUÇÃO
CONTRATUAL RECONHECIDA. NEGARAM
PROVIMENTO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70062043757,
Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Pedro Celso Dal Pra, Julgado em 16/04/2015). 2) PRESTAÇÃO
DE SERVIÇOS. CONTRATO DE PROMESSA DE CESSÃO
DE USO DE FRAÇÃO IDEAL DE IMÓVEL (TIME SHARING).
DECLARATÓRIA DE RESCISÃO DE Isso posto, voto pelo
CONHECIMENTO DO RECURSO, e em seu mérito pelo
DESPROVIMENTO”.[591]

A vedação de mudança da destinação prevista no instrumento registrado
que instituir os Sistemas de Tempo Compartilhado em Meios de Hospedagem de
Turismo não impede que o empreendedor comercialize, de outro modo, os
períodos de tempo que não forem cedidos sob o regime de tempo compartilhado.
A referida alteração do instrumento, observado o procedimento aplicável, deve'
ser igualmente registrado junto à matricula do imóvel (art. 14 da Deliberação
Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).
Os Sistemas de Tempo Compartilhado em Meios de Hospedagem de
Turismo deve ser extinto, caso não seja implantado no prazo previsto no
respectivo instrumento registrado de instituição, cabendo, neste caso, a
restituição integral dos valores pagos pelos cessionários, até então constituídos,
com atualização e juros legais. A extinção também ocorre se rescindidos todos
os contratos ou por vencimento do prazo de duração previsto no instrumento
registrado da instituição (art. 15 da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378,
de 12.08.1997).


5.7.4 Direitos e Obrigações da Partes do Contrato de Tempo Compartilhado


Conforme previsto no art. 16 da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº
378, de 12.08.1997, são obrigações do empreendedor: I- manter os serviços e a
afiliação a administrador de intercâmbio previsto no instrumento registrado de
instituição; II- observar as características técnicas e os prazos contratuais, em
caso de Meios de Hospedagem de Turismo em construção, oferecendo garantia;
de sua implantação; III- defender os cessionários de direito de ocupação contra
eventuais esbulhos ou turbações de posse; IV- cumprir ou fazer cumprir as
obrigações impostas ao operador dos Sistemas de Tempo Compartilhado em
Meios de Hospedagem de Turismo; V- informar ao administrador do
intercâmbio as cessões havidas, até 30 (trinta) dias após sua formalização; VI -
colocar à disposição dos cessionários de direito de ocupação unidade
habitacional alternativa no empreendimento ou outro no mesmo destino, com
características e categoria semelhante caso a cedida não esteja disponível; VII -
exigir do comercializador o cadastramento, o treinamento de seu pessoal de
vendas bem corno a elaboração e cumprimento de um Manual Ético de Venda ao
Consumidor. Este pessoal de vendas é considerado, para todos os efeitos legais,
proposto do comercializador, respondendo este e, subsidiariamente, a empresa
responsável pela sua contratação, por todos os atos de oferta e comercialização
que praticarem em desacordo com o Código de Defesa do Consumidor e com a
legislação de turismo em vigor; VIII - comunicar aos cessionários de direito de
ocupação s a constituição de ônus real ou a instituição de penhora sobre o
imóvel de situação do Meio de Hospedagem de Turismo ou sobre os direitos de
ocupação e utilização, e o ajuizamento de ações judiciais que possam, direta ou
indiretamente, afetar o instrumento registrado de instituição dos Sistemas de
Tempo Compartilhado em Meios de Hospedagem de Turismo ou os contratos de
cessão.
Os cessionários de direito de ocupação devem: I- declarar
expressamente o conhecimento e aceitação das condições da cessão; II- ocupar e
utilizar os bens e serviços conforme o seu destino; III- não exceder o número de
ocupantes previsto no contrato; IV- permitir o acesso do pessoal de limpeza,
manutenção e administração do Meio de Hospedagem de Turismo; V- comunicar
qualquer dano dos bens e por ele responder quando o causar por si, seus
acompanhantes ou pessoas que hajam autorizado; VI- desocupar na data e
horários previstos a unidade habitacional; VII- comunicar toda cessão temporal
ou definitiva de seus direitos, observando o procedimento contratual previsto;
VIII- pagar pontualmente a taxa de manutenção estabelecida no contrato, No
entanto, eventual falha no serviço não pode ser causa para o descumprimento
desta obrigação, o qual impede os cessionários de direito de ocupação de
exercerem o direito adquirido; IX- manter sua ficha cadastral atualizada (art. 17
da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378, de 12.08.1997).


5.7.5 Responsabilidades do Empreendedor e do Comercializador


O empreendedor e, subsidiariamente, o comercializador, são
responsáveis perante o cessionário de direito de ocupação pela legitimidade para
ceder os direitos previstos nos Sistemas de Tempo Compartilhado em Meios de
Hospedagem de Turismo, pela entrega dos bens e serviços contratados e pela
restituição de valores recebidos que devam ser devolvidos. Ademais, a referida
responsabilidade subsidiária ocorre ao tempo de celebração do Contrato de
Tempo Compartilhado (art. 18 da Deliberação Normativa/EMBRATUR nº 378,
de 12.08.1997).

“I- JUIZADOS ESPECIAIS. CONSUMIDOR E PROCESSUAL
CIVIL. SERVIÇO TURÍSTICO. CONTRATO DE PRESTAÇÃO
DE SERVIÇOS PELO SISTEMA DE TEMPO
COMPARTILHADO EM MEIOS DE HOSPEDAGEM DE
TURISMO. EMPRESAS ENVOLVIDAS EM ATIVIDADE
ECONÔMICA VOLTADA AO DESENVOLVIMENTO DO
TURISMO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS
PESSOAS JURÍDICAS PARCEIRAS - (A) EMPREENDEDOR,
(B) OPERADOR E (C) ADMINISTRADOR DE
INTERCÂMBIO - PELA ADEQUADA PRESTAÇÃO DO
SERVIÇO CONTRATADO PELO CONSUMIDOR (D).
PRESTAÇÃO DEFEITUOSA. RESPONSABILIDADE CIVIL
RECONHECIDA. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO.
II- PRELIMINARES. ILEGITIMIDADE PASSIVA E
CERCEAMENTO DE DEFESA. VÍCIOS NÃO
CONFIGURADOS. II.1 - Empresa prestadora de serviços de
intercâmbio. pessoa jurídica que integra sistema de tempo
compartilhado em meios de hospedagem. necessário
reconhecimento de que vigente regime de solidariedade entre
empresas parceiras que desempenham atividades no setor de
turismo. pessoas jurídicas ligadas por vínculos estabelecidos em
razão de conjunta participação na mencionada atividade
econômica, o que as faz integrar cadeia de responsabilidade pela
prestação de serviços turísticos. consumidor. adquirente de
serviços que se diz prejudicado. cumprimento afirmado
defeituoso de obrigações contratuais. ilícito contratual causador
de danos materiais. pertinência subjetiva da demanda
devidamente caracterizada. preliminar de ilegitimidade passiva
rejeitada. II.1.1 - OPERADOR (B). SOCIEDADE COMERCIAL
RESPONSÁVEL PELA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
AJUSTADA ENTRE O EMPREENDEDOR (A), TITULAR DE
DOMÍNIO E POSSE DO MEIO DE HOSPEDAGEM DE
TURISMO, E O CESSIONÁRIO (D), TITULAR DE DIREITO
DE USO E OCUPAÇÃO POR UM OU MAIS PERÍODOS,
SEGUNDO PRAZOS DETERMINADOS AO ANO, DE UMA
OU MAIS UNIDADES HABITACIONAIS HOTELEIRA.
ADMINISTRADOR DE INTERCÂMBIO (C). Sociedade
comercial responsável pela promoção e organização de permuta
de períodos de ocupação entre cessionários de unidades
habitacionais de distintos meios de hospedagem de turismo.
II.1.2 - Empreendedor, operador e administrador. Empresas
integrantes do sistema de tempo compartilhado e que atuam de
forma interdependente de modo a permitir o funcionamento do
sistema de tempo compartilhado. Negócio de necessária atuação
conjunta de diversos agentes intervenientes que se associam para
implementar e incrementar suas respectivas atividades
comerciais. Regime de solidariedade reconhecido entre as
pessoas jurídicas que integram a cadeia de responsabilidade pela
prestação de serviços de turismo. Responsabilidade objetiva.
teoria do risco da atividade. Inteligência dos artigos 7°, parágrafo
único, e 14, ambos do Código de Defesa do Consumidor, e dos
artigos 2º e 10º da Deliberação Normativa 378, de 12/08/1997 da
EMBRATUR. Direito certificado ao consumidor de exercer
opção de demandar em juízo em desfavor de um, alguns ou todos
os responsáveis pela prestação de serviço de turismo
defeituosamente ofertada. II.2 - CERCEAMENTO DE DEFESA.
RECURSO INOMINADO. INSURGÊNCIA EM QUE
ADUZIDA, EM PRELIMINAR, VIOLAÇÃO A DIREITO DE
DEFESA EM FACE DO ANTECIPADO JULGAMENTO DA
LIDE. CHAMAMENTO REGULAR DA EMPRESA
ADMINISTRADORA DE INTERCÂMBIO QUE SE FEZ
REVEL. VÍCIO INEXISTENTE. Inadmissibilidade de alteração
da marcha processual para fazer a demanda retornar à fase de
realização de atos próprios à fase postulatória do processo de
conhecimento. Impossibilidade de consideração pela corte
revisora, sob pena de supressão de instância, de matéria de defesa
não apresentada a exame do poder judiciário em tempo oportuno.
Questão preclusa. Procedimento hígido. II.2.1 - PRELIMINAR
DE CERCEAMENTO DO DEFESA REJEITADA. III -
MÉRITO. III.1 - MERCADO IMOBILIÁRIO. EMPRESAS
QUE ATUAM EM SISTEMA TIME SHARING. CONTRATO
DE CESSÃO DE DIREITOS DE HOSPEDAGEM EM
UNIDADE HABITACIONAL DE HOTELARIA EM TEMPO
COMPARTILHADO VINCULADO A CONTRATO DE
INTERCÂMBIO COM OUTRAS UNIDADES
HABITACIONAIS DISPONIBILIZADAS POR HOTÉIS
CREDENCIADOS. ASSOCIAÇÃO DE PESSOAS JURÍDICAS
QUE ATUAM NO RAMO DE TURISMO PARA DIMINUIÇÃO
DE CUSTOS DE SERVIÇOS E AUMENTO DA
COMPETITIVIDADE. PROVEITO ECONÔMICO DE QUE
TOMAM PARTE TODOS OS AGENTES INTERVENIENTES.
III.1.1 - INÁBIL A DEMONSTRAR A OCORRÊNCIA DE
CAUSA EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE (ART. 14,
§3°, II, CDC) MERA ALEGAÇÃO ADUZIDA PELA
EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS DE
INTERCÂMBIO DE QUE NÃO AUFERIU PROVEITO
ECONÔMICO COM OS PAGAMENTOS EFETUADOS
PELOS AUTORES/RECORRIDOS À SOCIEDADE
COMERCIAL RESPONSÁVEL PELA PRESTAÇÃO DE
SERVIÇOS DE HOSPEDAGEM. EXTENSÃO DE
BENEFÍCIOS PRESUMIDA PELA PRÓPRIA NATUREZA
DAS OPERAÇÕES COMERCIAIS ENVOLVIDAS EM
CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE TEMPO
COMPARTILHADO DE IMÓVEL. III.1.2 - CONSUMIDOR
TITULAR DE DIREITOS DE MULTIPROPRIEDADE OU
PROPRIEDADE COMPARTILHADA QUE SE VÊ IMPEDIDO
DE USAR A UNIDADE HABITACIONAL QUE ADQUIRIU
EM SISTEMA TIME SHARING. OBSTÁCULO OPOSTO POR
CONTA DE EXIGÊNCIAS INDEVIDAS DE PAGAMENTOS
NÃO AJUSTADOS. EMBARAÇO IMOTIVADO QUE TORNA
LEGÍTIMO O INTERESSE DEDUZIDO EM JUÍZO DE
DESFAZER O NEGÓCIO JURÍDICO. Responsabilidade pelo
rompimento do contrato que é de ser atribuida às empresas
parceiras que insuficientemente explicitam no ajuste escrito
firmado as condições de pagamento de taxa de manutenção.
Disposições contratuais estabelecidas de modo contraditório.
III.1.3 - Induz a erro o instrumento de contrato em que a forma
de pagamento trienal fixada para a taxa de manutenção se revela,
quando da execução do ajuste, mero chamariz. Vantagem
propagada do negócio que se opõe a disposição outra constante
do acordo de vontades, a qual torna exigível a mencionada taxa
antes da disponibilizaçao da unidade pela empresa de
intercâmbio, ficando assim afastado o triênio. Antinomia
utilizada pelos réus/recorrentes para atenuar sua responsabilidade
perante os autores/compradores. Cláusulas contratuais
incoerentes e, portanto, nulas. Abusividade configurada
conforme comandos NORMATIVOS POSTOS NOS INCISOS I
E IV DO ARTIGO 51 DO Código de Defesa do consumidor e no
parágrafo único do artigo 13 da Deliberação Normativa 378/97 -
EMBRATUR. III.2 - Razões recursais aduzidas em desfavor de
condenação dita imposta por violação a direito da personalidade.
Insurgência inapta a atacar os fundamentos da sentença porque
não condizente com a pretensão deduzida na peça vestibular e
reconhecida legítima pelo magistrado de primeira instância.
Irresignação de conhecimento inviável, conforme orientação
sumulada pelo superior tribunal de justiça em Enunciado 182. IV
- RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO DA EMPRESA
RCI BRASIL. PRELIMINARES REJEITADAS. NO MÉRITO,
NA PARTE EM QUE CONHECIDO, IMPROVIDO.
CONHECIDO O RECURSO DA EMPRESA BRASIL USA. NO
MÉRITO, IMPROVIDO. 1.SENTENÇA MANTIDA POR SEUS
PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 2.EM FACE DA
SUCUMBÊNCIA, FIXO HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM
20% (VINTE POR CENTO) SOBRE O VALOR DA CAUSA,
DEVENDO TAMBÉM AS RECORRENTES SUPORTAR O
PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS, CONFORME
DISPOSIÇÃO EXPRESSA NO CAPUT DO ART. 55 DA LEI
9.099/95. 3.ACÓRDÃO LAVRADO POR SÚMULA DE
JULGAMENTO, CONFORME PERMISSÃO POSTA NO ART.
46 DA LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS”.[592]









CAPÍTULO VI – CONDOMÍNIO
EM SHOPPING CENTER

6.1 INTRODUÇÃO


A questão mais polêmica no âmbito do mercado de shopping centers,
certamente é a da figura do condomínio em shopping center.
Segundo a Associação Brasileira de Shopping Centers – ABRASCE,
entidade representativa da maioria dos empreendedores de shopping centers no
Brasil, shopping center é “um centro comercial planejado sob uma
administração única, composto de lojas destinadas exploração comercial e à
prestação de serviços, sujeitas a normas contratuais padronizadas, para manter o
equilíbrio da oferta e da funcionalidade, assegurando a convivência integrada e
pagando um valor de conformidade com o faturamento”.[593]
Mas, para compreendermos o condomínio em shopping center, merece
o esforço no sentido de definir, inicialmente, condomínio de uma forma
genérica, apenas para delimitar um entendimento, assim, condomínio é a
propriedade de um imóvel, bem ou coisa exercida em conjunto por 2 (duas) ou
mais pessoas.
Entretanto, o instituto condomínio, quando aplicado nos negócios de
shopping center, ganha aspectos peculiares e bastante complexos.
Com efeito, o condomínio não é a propriedade ou imóvel ou o bem, o
condomínio é o vínculo entre seus diversos proprietários que têm obrigações e
direitos que recaem sobre a propriedade em comum. Como pressuposto
fundamental de determinado shopping center, o condomínio parece ser, em
última análise, forma coerente, adequada e sistemática para permitir que o
empreendimento seja gerido com uniformidade, indivisibilidade e coesão. E isso
não poderia ser visto de outra maneira, afinal de contas, se cada parte do
shopping center fosse administrada por um proprietário ou um locatário, não
seria possível coordenar todos os esforços, ações e medidas necessárias para
preservar a estratégia na consecução de objetivos claros e bem definidos. Cada
um dos proprietários ou cada um dos locatários faria o que achasse melhor ou
que estivesse dentro do seu exclusivo interesse, e isso não daria certo numa
organização padrão de shopping center.
Inclusive, de acordo com a Associação Brasileira de Shopping Centers
– ABRASCE, os empreendimentos desse tipo tem que satisfazer os seguintes
requisitos básicos: 1) sejam construídos como um conjunto planejado de lojas,
operando de forma integrada, sob administração única e centralizada; 2) sejam
compostos de lojas destinadas à exploração de ramos diversificados ou
especializados de comércio e prestação de serviços (tenant mix);[594] 3) estejam
os locatários sujeitos a normas contratuais padronizadas, permanecendo a
maioria das lojas sujeitas à locação cujo preço, varie, ao menos em parte, de
acordo com o faturamento dos lojistas; 4) possuam lojas âncoras [595] ou
características estruturais e mercadológicas especiais, que funcionem como força
de atração e assegurem ao shopping center o tráfego de consumidores essencial
ao bom desempenho do empreendimento; 5) ofereçam estacionamento
compatível com a área de lojas e correspondente afluência de veículos ao
shopping center; 6) estejam sobre controle acionário e administrativo de pessoas
ou grupos de comprovada idoneidade e reconhecida capacidade empresarial.[596]
Assim, a Associação Brasileira de Shopping Centers – ABRASCE
considera shopping center somente os empreendimentos com Área Bruta
Locável – ABL,[597] normalmente, superior a 5.000 (cinco mil) m², formados por
diversas unidades comerciais, com administração única e centralizada, que
pratica aluguel fixo e percentual. Na maioria das vezes, dispõe de lojas âncoras e
vagas de estacionamento compatível com a legislação da região onde está
instalado.[598]


CLASSIFICAÇÃO DE SHOPPING CENTERS POR TIPO DE
EMPREENDIMENTO
Tipo Porte Área Bruta Locável –
ABL
Tradicional Mega Acima de 60.000 m²
Tradicional Regional De 30.000 a 59.999 m²
Tradicional Médios De 20.000 a 29.999 m²
Tradicional Pequenos Até 19.999 m²
Especializado (podem ser Grandes Acima de 20.000 m²
[599]
do tipo outlet, life stile
[600]
ou temáticos)[601]
Especializado (podem ser Médios De 10.000 a 19.999 m²
do tipo outlet, life stile ou
temáticos)
Especializado (podem ser Pequenos Até 9.999 m²
do tipo outlet, life stile ou
temáticos)
Fonte: Associação Brasileira de Shopping Centers – ABRASCE

De maneira que o shopping center não se assemelha a um centro
comercial, exatamente em razão do planejamento total do empreendimento, o
qual traz consigo uma série de novidades no cenário empresarial. Uma das
grandes inovações trazidas pelos shoppings centers foi a relação contratual, até
então desconhecida em nosso ordenamento, onde é assegurado ao empreendedor
a participação no faturamento das atividades desenvolvidas no empreendimento,
tornando-se, assim, possível constante integração entre os empreendedores e
lojistas, dando embasamento à realização posterior de ganhos de produtividade.
O controle exercido pelos empreendedores em relação ao faturamento de seus
lojistas, com vistas à remuneração a eles devida, os coloca em posição jurídica
de empresários e não como meros investidores imobiliários, circunstância que
traz desdobramentos importantes na esfera jurídico-fiscal.

Dados do Setor de Shopping Center em Janeiro de 2017
Número Total de Shoppings 558
Área Bruta Locável (Em milhões de m²) 15,237
Área Construída (Em milhões de m²) 35,98
Vagas para Carros 851.162
Total de Lojas 99.990
Lojas Âncora 3.403
Megalojas 2.381
Lojas Satélites 70.738
Lazer 1.235
Alimentação 14.408
Lojas de Serviços 7.825
Salas de Cinema 2.707
Empregos Gerados 1.016.428
Fonte: Associação Brasileira de Shopping Centers – ABRASCE

É verdade que há shopping centers em que cada lojista é o próprio
proprietário do seu espaço comercial e/ou loja, mas mesmo nesses
empreendimentos, que são minoria no universo dos shoppings centers, a
administração é feita por uma única pessoa, empresa, síndico ou entidade
representante de todos os proprietários. Portanto a figura do administrador
(como elo entre empreendedores e lojistas) tem singular importância, na medida
em que a ele cabe, com sua criatividade, organização e liderança, concretizar o
empreendimento tal como planejado pelos investidores, assegurando, outrossim,
a regularidade das transações empresariais.
Acontece, porém, que o instituto do condomínio não foi criado para
servir ao modelo de negócio de shopping center, então, sua aplicação e
compreensão precisa passar por diversas adaptações, para que seja uma forma
útil e correta de administrar um tipo de empreendimento tão complexo e
dinâmico.
Essencialmente, os condomínios de shopping center são constituídos
exclusivamente para permitir o rateio das despesas do empreendimento, criando,
assim, uma proporção justa da participação de cada um dos locatários ou
proprietários sobre o custeio das despesas denominadas “comuns”, sendo que as
despesas denominadas “privativas” e/ou “específicas” são assumidas
individualmente por quem se beneficiou delas.
Como vimos, no Brasil, existem 2 (duas) modalidades básicas de
condomínio: a) condomínio voluntário (condomínio ordinário ou pro indiviso); e
b) condomínio especial ou edilício. O condomínio voluntário é aquele
condomínio genérico, que surge da simples copropriedade, por 2 (duas) ou mais
pessoas, sobre determinado imóvel, bem ou coisa. Já condomínio edilício se
mostra diferente do condomínio genérico, em vista de pressupor que a
propriedade pode ser dividida em partes ideais (frações ideais), uma parte
comum a todos os coproprietários (áreas comuns ou coletivas) e outra parte
individualizada para cada um dos condôminos (unidade autônoma).
No modelo de negócio amplamente praticado pelo mercado de
shopping centers, o empreendimento evolui no interior de imóvel indivisível, ou
seja, que mantém estrutura física que não pode ser totalmente dividida em partes
individualizadas, ainda que os espaços comerciais e/ou lojas possam ser
divididas e identificadas uma a uma, outras áreas como o mall,[602] as docas
[local na área de logística (geralmente expedição), destinado ao embarque e
desembarque de produtos em vários modais (carretas, vans, etc.)], o
estacionamento (área dos shopping centers, onde os motoristas podem estacionar
seu carro em área demarcada), etc., são partes comuns do empreendimento,
razão pela qual o shopping center se assemelha bastante com a figura do
condomínio edilício, e assim tem sido tratado por todos, e também pela
legislação em vigor.
No entanto, não se pode perder de vista que, bem diferente do que
ocorre num prédio de unidades autônomas residenciais, as partes que podem ser
individualizadas (áreas privadas), tais como espaços comerciais e/ou as lojas
também são propriedade dos proprietários do shopping center, sendo que, estes,
cedem a unidade privada em locação para os locatários e/ou lojistas para que
eles possam exercer seus negócios, empresas e operações comerciais. É
justamente por essa razão particular que os locatários e/ou lojistas acabam
assumindo os deveres, as obrigações e as responsabilidades como se fossem
verdadeiros condôminos, mas, na verdade, eles não são condôminos, porque só
são condôminos os proprietários que mantêm a propriedade em comum do
imóvel, bem ou coisa.
Daí emerge a questão no sentido de se saber exatamente qual a regra
que se aplica nos condomínios de shopping centers. O locatário e/ou lojista está
subordinado também à convenção do condomínio de shopping centers ou
somente ao contrato de locação que foi firmado com o proprietário (condômino).
A esse respeito, lembramos que o condomínio edilício é constituído através da
convenção do condomínio, que é, na sua essencial, o conjunto de regras que vão
disciplinar todas as relações entre os condôminos, determinando quais são os
direitos e deveres que cada um deles deve exercer na propriedade em comum.
De maneira que, como em geral o locatário e/ou lojista não é o condômino,
porque não é coproprietário do shopping center, as regras da convenção do
condomínio não se aplicam diretamente a eles, mas tão somente aos proprietários
do shopping center, que, em verdade são os condôminos. Aos locatários e/ou
lojistas o que se aplica são as cláusulas do contrato de locação firmado com o
proprietário ou condômino, bem como as normas gerais de locação. Portanto, é
justamente o contrato de locação, conjunto de normas gerais que disciplinam,
determinam e estabelecem as regras, direitos e deveres que todos os locatários
e/ou lojistas, que regulamenta tais pessoas no âmbito do shopping center.
É importante destar ainda que os direitos e deveres dos locatários e/ou
lojistas do shopping center são diferentes dos locatários de prédio de unidades
autônomas residenciais. Com efeito, no caso das relações entre locatários e/ou
lojistas de shopping centers, o limite de tais direitos e deveres é mitigado, é
reduzido para determinadas espécies de despesas, denominadas “despesas
extraordinárias”. Assim, no condomínio de shopping center, o locador ou
proprietário precisa assumir algumas das despesas extraordinárias definidas na
lei, que são as despesas com obras de reformas ou acréscimos que interessem à
estrutura integral do imóvel; com pintura das fachadas, empenas, poços de
aeração e iluminação, bem como das esquadrias externas; e indenizações
trabalhistas e previdenciárias pela dispensa de empregados, ocorridas em data
anterior ao início da locação, bem como as despesas com obras ou substituições
de equipamentos, que impliquem modificar o projeto ou o memorial descritivo
da data do habite-se [603] e obras de paisagismo nas partes de uso comum. No
entanto, não são todas as despesas extraordinárias que os proprietários do
shopping center precisam arcar, apenas as acima mencionadas, porque no
restante das possíveis e eventuais despesas do shopping center, a própria lei
assegura que as regras ficam a cargo do contrato de locação, ou seja, prevalece
aquilo que o locador e o locatário e/ou lojista estabelecerem em contrato de
locação.

“RECURSO ESPECIAL. DIREITO EMPRESARIAL.
LOCAÇÃO DE ESPAÇO EM SHOPPING CENTER.
CLÁUSULA CONTRATUAL LIMITADORA DO VALOR DA
REVISÃO JUDICIAL DO ALUGUEL MENSAL MÍNIMO.
RENÚNCIA PARCIAL. VALIDADE. PRESERVAÇÃO DO
PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. 1. Ação declaratória
de nulidade de cláusula contratual cumulada com pedido
revisional do valor do aluguel mensal mínimo. 2. Recurso
especial que veicula a pretensão de que seja reconhecida a
validade de cláusula de contrato de locação de imóvel situado em
shopping center que estabelece critérios para a revisão judicial do
aluguel mensal mínimo. 3. O princípio do pacta sunt servanda,
embora temperado pela necessidade de observância da função
social do contrato, da probidade e da boa-fé, especialmente no
âmbito das relações empresariais, deve prevalecer. 4. A cláusula
que institui parâmetros para a revisão judicial do aluguel mínimo
visa a estabelecer o equilíbrio econômico do contrato e viabilizar
a continuidade da relação negocial firmada, além de derivar da
forma organizacional dos shoppings centers, que têm como uma
de suas características a intensa cooperação entre os
empreendedores e os lojistas. 5. A renúncia parcial ao direito de
revisão é compatível com a legislação pertinente, os princípios e
as particularidades aplicáveis à complexa modalidade de locação
de espaço em shopping center. 6. Recurso especial provido”.[604]

Exatamente em vista dessa razão é que existe o condomínio dos
shoppings center, para que seja possível administrar as partes comuns e as partes
privativas e/ou específicas do empreendimento, mitigando, dividindo e
repartindo o custo das despesas entre os locatários e/ou lojistas, na forma de
despesas comuns e despesas privativas e/ou específicas. De maneira que o
condomínio dos shoppings center é constituído entre os coproprietários do
imóvel, bem ou coisa, transferindo para cada um dos locatários e/ou lojistas os
custos decorrentes das despesas comuns (proporcionais) e privativas e/ou
específicas inerentes aos espaços comerciais e/ou lojas que cada um deles
recebeu em locação.
Outra questão importante reside na maneira como deve ser formada e
dividida a proporção das despesas comuns, normalmente estabelecida através de
Coeficiente de Rateio de Despesas – CRD e não proporcional às frações ideias.

“RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE
COBRANÇA DE TAXA DECONDOMÍNIO DE SHOPPING
CENTER. MATÉRIA RELATIVA À FORMA DE
CÁLCULODA TAXA DEFINIDA EM DEMANDA ANTERIOR
ENTRE AS MESMAS PARTES.EFICÁCIA PRECLUSIVA DA
COISA JULGADA. 1. Pretensão de condomínio de shopping
center de cobrar diferenças de taxas condominiais, em face de
modificação operada na respectiva convenção. 2. Critério de
cálculo da taxa condominial, considerando a fração ideal do
imóvel, definido em ação declaratória cumulada com
consignatória movida pela condômina. 3. Alteração na forma de
cálculo da taxa condominial operada no curso da demanda
anterior, para o coeficiente de rateio das despesas (CRD), que não
foi comunicada ao juízo. 4. Inaplicabilidade da regra contida no
artigo 471, I, do Código de Processo Civil, referente às relações
jurídicas continuativas, que somente tem incidência nas
alterações posteriores ao trânsito em julgado da ação anterior, em
face do disposto no artigo 474 do mesmo diploma legal. 5.
Interpretação sistemática e teleológica da legislação processual.
6. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO”.[605]

Como dito, a administração do shopping center depende da coerência,
coesão e harmonia na convivência de todos os locatários e/ou lojistas, assim
considerados entre eles, e também considerados em relação aos proprietários
e/ou locadores do empreendimento. Justamente por está razão em particular que
a Lei de Locação desloca a maior parte das regras de locação em shopping
center para serem tratadas por meio do contrato de locação. Somente o ajuste
personalizado pode criar regras concebidas, organizadas e sistematizadas de
maneira adequada, especialmente para garantir que a existência e a manutenção
do shopping center seja preservada quanto à sua indivisibilidade, organização e
finalidade.

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. REVISIONAL DE
CONTRATO DE LOCAÇÃO. SHOPPING CENTER. Impõe-se
a manutenção da decisão agravada que indeferiu o pedido de
antecipação de tutela, em que pretende a autora seja autorizada a
readequação do valor do aluguel, com fixação em percentual
sobre o faturamento. Locação em Shopping Center, avença
atípica, prevalecendo as condições do contrato. Recurso a que se
nega seguimento”.[606]

“LOCAÇÃO. REVISIONAL. SHOPPING CENTER. Preliminar
rejeitada. Previsão contratual de décimo terceiro aluguel no mês
de dezembro. Abusividade não vislumbrada. Inteligência do art.
54 da Lei de Locações. Precedentes da jurisprudência. Recurso
desprovido”.[607]

Por outro lado, vale chamar a atenção para o fato de que os shoppings
centers diferem bastante das lojas comerciais situadas em ruas, na medida em
que possuem uma administração centralizada, em que os interesses coletivos
prevalecem em relação a aqueles interesses individuais, já que se trata de
empreendimento que consiste numa organização comercial complexa.
Justamente como consequência dessa complexidade comercial, o mix
(distribuição das diversas atividades e respectiva localização) nos shopping
centers é objeto de constante preocupação por parte de seus administradores, que
mantêm serviço especializado de assessoria comercial, com o fito de substituir
os lojistas que não estejam atingindo resultados esperados e de sempre trazer
novos lojistas e/ou novas atividades que sejam do anseio dos respectivos
consumidores. De maneira que o shopping center, em virtude de uma gama de
peculiaridades, possui regras específicas, que naturalmente fogem à realidade de
outros empreendimentos imobiliários. Por exemplo, a parcela de contribuição de
cada lojista para as despesas comuns do shopping center é calculada partindo de
algumas premissas, entre as quais, de que, quanto maior for a área por ele
ocupada (loja âncora), menor será a sua contribuição por metro quadrado. A
contrario sensu, quanto menor for sua área locada (loja satélite),[608] maior será
essa contribuição. Tal prática decorre do fato de que cada shopping center
funciona como um todo, possuindo uma estrutura de apoio, que será mais ou
menos necessária, dependendo de cada atividade desenvolvida nos seus espaços.
Por sinal, DARCY BESSONE equipara a atividade desenvolvida no
interior de um shopping center a um resort e a um navio. De fato, quem se
hospeda num resort ou viaja em navio não tem como objetivo principal ocupar
um quarto, mas se servir de toda a estrutura organizacional que, em ambos os
exemplos, é colocada à disposição do seu hóspede, ou viajante. Da mesma
forma, no shopping center, o lojista não conta, tão simplesmente, com o espaço
comercial onde desenvolve sua atividade empresarial, mas com toda a
infraestrutura mantida pelo shopping center e que se constitui em atrativo
essencial ao consumidor.[609]
Como consequência, os encargos condominiais cobrados pelo
shopping center a seus lojistas possui características acentuadamente diversas
daqueles exigidos em prédios convencionais, sejam residenciais, sejam
comerciais. Ocorre que inúmeros shoppings centers se encontram localizados em
prédios regidos por condomínios especiais. Atualmente, a cobrança dos encargos
condominiais é regulada pelo Código Civil de 2002, em cujo inciso I do art.
1.336 está precrito que “são deveres do condômino (...) contribuir para as
despesas do condomínio, na proporção de suas frações ideais”. No entanto,
anteriormente, a Lei n° 4.591, de 16.12.1964, que dispunha sobre a cobrança de
encargos condominiais, previa a possibilidade de estes serem fixados com base
em outro critério, desde que previsto na convenção condominial. Então, para os
condomínios existentes anteriormente à vigência do Código Civil de 2002, não
existe problema na fixação do rateio desses encargos, observando-se os
princípios que norteiam as atividades em shopping centers, já que o Código
Civil de 2002 não pode alcançar os atos jurídicos praticados antes de
11.01.2.003, nos estritos termos do inciso XXXVI do art. 5º da Constituição
Federal, respaldado por mansa e pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal – STF e até do Superior Tribunal de Justiça – STJ. Mas, os condomínios
constituídos a partir de 11.01.2.003 estão sempre sujeitos às regras do Código
Civil de 2002 e, no caso dos shoppings centers, a adoção da regra do
mencionado art. 1336 configuraria a impossibilidade fática da realização desse
tipo de empreendimento.
As alternativas para solucionar este problema são as seguintes: a)
adotar a forma de condomínio civil (mais adequada a esta modalidade de
empreendimento); ou b) utilizar construção interpretativa do Código Civil de
2002 como saída, na hipótese de se adotar o condomínio especial no prédio em
que o shopping center será desenvolvido. Na hipótese da alínea b acima, é
importante ter em mente que o Código Civil de 2002 se refere à fração ideal no
condomínio edilício: a) no seu art. 1.332, que impõe, na convenção de
condomínio, entre outras, a obrigação da “determinação da fração ideal atribuída
a cada unidade, relativamente ao terreno e às partes comuns”; e b) no art. 1.334,
que dispõe que, “além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os
interessados houverem por bem estipular, a convenção determinará: I- a quota
proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos para
atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio; (...)”.
No entanto, se o art. 1.332 do Código Civil de 2002 já prevê a
determinação da fração ideal de cada unidade autônoma e o seu art. 1.336
estipula a cobrança dos encargos condominiais com base na fração ideal, por que
haveria o art. 1.334 de prescrever “além das cláusulas referidas no art. 1.332”,
referindo-se, no seu §1°, à “quota proporcional”? Certamente, o princípio de
hermenêutica menciona que não existem expressões inúteis na lei. De maneira
que o mencionado §1° do art. 1.334 do Código Civil de 2002 poderia
simplesmente aludir ao “modo de pagamento das contribuições dos
condôminos”, porém não o fêz, preferindo o legislador se referir expressamente
à “quota proporcional”, ao invés de fração ideal. Assim, se quota “proporcional”
fosse sinônimo de fração ideal, haveria total contradição com o caput do referido
art. 1.334 do Código Civil de 2002, que menciona: “Além das cláusulas referidas
no art. 1.332”.
A interpretação que, de forma sistemática, se coadunaria com a
cobrança de encargos, em condomínio edilício, que não seja com base na fração
ideal seria a de que: a regra geral (cobrança de encargos condominiais com base
na fração ideal) é a prevista no art. 1.336 do Código Civil de 2002; a exceção,
prevista no inciso I do art. 1.334 do Código Civil de 2002, que estipula a “quota
proporcional”, nos casos em que a atividade a ser exercida no condomínio
edilício não fosse compatível com a escolha da fração ideal como forma de
cobrança desses encargos condominiais. O fato concreto consiste em que não é
possível conceber que o Código Civil de 2002 tenha tornado inviável o
desenvolvimento de novos shoppings centers no País a partir de 11.01.2.003, sob
a forma de condomínio edilício, em função da obrigatoriedade de estipulação da
fração ideal do terreno como critério de cobrança dos encargos condominiais.
Por outro lado, o inciso I do art. 1.334 do Código Civil de 2002 prescreve
alternativa à regra geral, mencionada no inciso I do art. 1.336 do Código Civil de
2002, para casos restritos.
Considerar esta alternativa é algo que o bom senso recomenda, pois é
inquestionável a relevância conquistada pelos shoppings centers no âmbito das
sociedades civilizadas. Mas, diante de sua complexa estrutura e das implicações
jurídicas inerentes à atividade, abordam-se os diversos aspectos que envolvem a
constituição do empreendimento e a celebração dos múltiplos contratos nele
envolvidos. Certamente a figura do shopping center é uma criação exclusiva do
mundo empresarial. No Direito não havia, há pouco tempo atrás, figura
correspondente ao shopping center. de uma série de contratos coligados que, em
sua unidade, exprimiam o shopping center.


6.2 NATUREZA JURÍDICA


Para IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, os shoppings centers são a
natural consequência do crescimento das cidades e da também crescente
necessidade de o comércio, em economia de mercado e competitividade, unir-se
ao lazer. Realidade pertinente à mercancia moderna, objetiva ofertar ao usuário
horas de satisfação, assim como de compras, em que as alternativas que lhe são
apresentadas, terminam por lhe propiciar o usufruto de umas, de outras, ou de
ambas.[610]
Já FÁBIO ULHOA COELHO escreve que, de fato, o empreendimento
denominado shopping center é mais complexo. Além da construção do prédio,
propriamente dita, o empresário deve organizar os gêneros de atividade
econômica que nele se instalarão. A idéia básica do negócio é por à disposição
dos consumidores, em um local único, de cômodo acesso e seguro, a mais
variada sorte de produtos e serviços. Assim, as locações devem ser planejadas,
atendendo às múltiplas necessidades do consumidor. Geralmente, não podem
faltar em um shopping center certos tipos de serviços (correios, bancos, cinemas,
lazer, etc.) ou comércios (restaurantes, lanchonetes, papelarias, etc.), mesmo que
a principal atividade comercial seja estritamente definida (utilidades domésticas,
moda, material de construção, etc.), pois o objetivo do empreendimento volta-se
a atender muitas das necessidades do consumidor. É esta concentração variada
de fornecedores que acaba por atrair maiores contingentes de consumidores,
redundando em benefício para todos os negociantes.[611]
No entanto, há que se alertar para o fato de que a natureza jurídica de
shopping center não ser exclusivamente de condomínio. Embora os lojistas,
antes mesmo do prédio estar construído, já comecem a contribuir com certa
quantia para ultimação do empreendimento, pagam uma res sperata, que é o
sobrefundo de comércio do shopping center, ou seja, pagam para ter um lugar no
centro comercial, não para adquirirem a propriedade do imóvel (fala-se a
respeito em ágio). E sem domínio, não pode haver condomínio.
Por outro lado, uma vez edificada a obra, os lojistas continuam
despendendo um quantum mensal em favor do proprietário do imóvel,
denominado “empreendedor”, que parece ser o título de locação (art. 54 da Lei n
° 8.245, de 18.10.1991).[612] Mas é mera aparência, pois só haveria locação se o
preço pago decorresse unicamente do uso e gozo da coisa, ou melhor se a causa
do contrato fosse a posse do imóvel; o que não é o caso, já que essa quantia é
variável segundo o lucro do lojista que também pode ser o valor devido,
dependendo de qual é o maior. Se a porcentagem sobre o lucro bruto superar a
quantia mínima (fixa), aquele será o valor devido; se não houver a superação, a
quantia impõe-se. Ademais, em dezembro a quantia mínima é sempre cobrada
em dobro, o que mostra que efetivamente se tem em mira, nesse contrato, o lucro
obtido pelo lojista, já que é de supor-se que esse mês é o de maior incremento de
vendas. De outra parte, o comerciante instalado em shopping center sofre sérias
restrições no uso do imóvel uma vez que qualquer alteração a que ele vise
realizar tem de seguir os rígidos padrões do tenant mix (planta do centro
comercial); sem olvidar o fato de que o empreendedor (proprietário do imóvel)
pode exercer severa fiscalização sobre os ganhos brutos dos lojistas, o que
definitivamente descaracteriza esse contrato como sendo de locação.
Em vista disso, chegou-se até mesmo a levantar a hipótese de que o
shopping center seria uma sociedade em cota de participação, pela comunhão de
interesse que há entre os lojistas e o empreendedor pois ambos almejam o lucro.
Todavia, um único argumento pode profligar essa tese: falta a affectio societatis
no contrato de shopping center. E isso tanto é verdade que, se imaginássemos os
lojistas como sócios do empreendedor só pelo fato de buscarem o lucro,
estaríamos admitindo que um empregado que aufere percentagens sobre vendas
seria igualmente sócio de seu empregador, já que ambos buscam o máximo de
vendas possível.

“RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. LOCAÇÃO DE
ESPAÇO EM SHOPPING CENTER. ALUGUEL COM BASE
EM PERCENTUAL DE RENDA BRUTA. MANUTENÇÃO DE
PONTO DE VENDAS PELA INTERNET NO INTERIOR DA
LOJA. PRODUTOS DE COMÉRCIO ELETRÔNICO
FATURADOS EM NOME DE EMPRESA DIVERSA.
DISSIMULAÇÃO DO FATURAMENTO DA LOCATÁRIA.
VALOR DO ALUGUEL PAGO A MENOR.
DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. DESPEJO.
CABIMENTO. 1. O lojista que se estabelece em um shopping
center integra a sua empresa com o empreendimento para
usufruir do planejamento, organização e clientela que o
frequenta. Portanto, mais que um simples contrato de locação, há
uma relação associativa na qual a colaboração entre os lojistas e
o empreendimento é necessária para concretizar-se esse modelo
de exploração comercial. 2. Nos contratos de locação de loja em
shopping center, é fixada a cobrança de aluguel percentual,
proporcional ao faturamento bruto mensal da atividade
comercial, e que se justifica devido à infraestrutura do
empreendimento, que colabora para o sucesso do lojista locatário.
O aluguel percentual representa um rateio do sucesso, que em
parte é possibilitado pela estrutura e planejamento oferecidos
pelo shopping center. 3. Representa violação contratual a conduta
do locatário que, a despeito de ter assumido a obrigação de
efetuar o pagamento do aluguel com base no faturamento, instala
ponto de vendas de produtos pela internet, que são faturados em
nome de empresa diversa. Os ganhos com o comércio eletrônico
não ingressam no faturamento da loja situada no shopping center
locador e, por isso, não integram a base para o cálculo do
aluguel. 4. A violação contratual acerca da contraprestação
devida pelo uso do espaço locado autoriza o desfazimento da
locação, nos termos do art. 9°, II, da Lei 8.245/1991. 5. Não se
pode presumir a aquiescência do locador apenas em razão das
renovações contratuais, uma vez que ele ainda não tinha ciência
da sonegação de parte do aluguel. 6. Recurso especial provido”.
[613]


Alguma outra doutrina chegou a sustentar que o shopping center seria
uma joint venture, ou seja, uma associação de duas ou mais empresas, por tempo
limitado, para a consecução de um fim lucrativo comum, sob uma única
personalidade jurídica. É facilmente rechaçável esse pensamento, basta dizer que
o shopping center não possui personalidade jurídica.
Na verdade, apesar da difusão dos shoppings centers como tipos sociais,
[614]
não existe um consenso acerca da definição da natureza jurídica de seus
contratos de instalação de lojistas. As teses aventadas passam por institutos
consolidados como o contrato de sociedade (associações), a cessão de
estabelecimento comercial, o contrato de arrendamento, os contratos coligados,
chegando até a sua qualificação como contrato atípico misto, embora guarde
características de todos os contratos supracitados, não se confunde com nenhum
deles; tem unidade orgânica autônoma, por consistir em instrumento jurídico que
reflete, em boa parte, a complexidade econômica do shopping center.


6.3 CARACTERÍSTICAS CONTRATUAIS DO
SHOPPING CENTER


Considerando a natureza jurídica de contratos coligados, a criação de
shopping centers, fruto do processo inventivo humano, a ciência jurídica se vale
dos contratos coligados os quais costuram as seguintes finalidades: a)
constituição jurídica do empreendimento: relação entre os investidores [havendo
3 (três) formas de se constituir o shopping center, no que se refere aos
investidores: condomínio ordinário ou pro indiviso; condomínio especial ou
edilício e sociedade];[615] b) constituição jurídica da administração: relação
entre investidores e administração; c) funcionamento do empreendimento:
relação entre investidores, lojistas e administração.


6.3.1 Organização na forma de condomínio ordinário ou condomínio pro
indiviso


Na modalidade de organização em condomínio ordinário ou condomínio
pro indiviso, verifica-se o domínio dos titulares (proprietários) sobre frações
ideais do empreendimento, em maior ou menor proporção do todo. Portanto, o
shopping center é considerado uma unidade indivisível, existindo com apenas
uma matrícula no Cartório do Registro Geral de Imóveis.
Isto se explica pelo simples fato de que o shopping center é formado por
um grupo de estabelecimentos comerciais unificados arquitetonicamente e
construído em terreno planejado e desenvolvido, obedecendo, as lojas, a uma
distribuição no estabelecimento global, de acordo com o dinamismo empresarial,
que admite, periodicamente, reestruturação dos espaços, bem como a mudança
na exploração de ramos diversificados de comércio. Logo, este se enquadra na
definição de coisa indivisível prevista no art. 88 do Código Civil de 2002,[616] por
força da vontade dos próprios empreendedores.
Tendo adotado a espécie de shopping center constituído como
condomínio pro indiviso, as relações entre os empreendedores são reguladas
pelos arts. 1.314 a 1.326 do Código Civil de 2002, que estipulam,
essencialmente, a necessidade de observância, pelos condôminos, da destinação
da coisa comum, bem como a partilha dos ônus e bônus segundo a proporção das
quotas de cada proprietário e a administração por deliberações da maioria
absoluta, considerando os valores dos quinhões.
Em assim sendo, o direito de propriedade se exerce de modo exclusivo
sobre frações ideais ou quotas abstratas, possibilitando-se ao condômino, em
caso de compra e venda, o direito de preferência, observada na sua aquisição a
ordem inicial por aqueles que possuírem maior quinhão, em caso de igual oferta,
de acordo com o art. 1.322 do Código Civil de 2002. Também é atribuído a cada
quotista o uso de todos os direitos atribuídos por lei ao titular do domínio.
Tomando-se por base que o negócio jurídico relacionado à shopping
center pressupõe uma unidade direcional determinante da política empresarial
adotada para o empreendimento, característica essa que lhe confere um inegável
caráter de indivisibilidade, entende-se que o preceito do art. 1.320 do Código
Civil de 2002, que possibilita a qualquer tempo a divisão da coisa comum, não
se aplica ao caso dos shopping centers.
Na hipótese de determinado shopping center com mais de um
empreendedor, não tem o menor cabimento um dos condôminos requerer a
extinção do condomínio, com a consequente partilha das lojas, pois estas
passariam a existir sem qualquer comprometimento com a universalidade de
direito, situação que afrontaria a razão do negócio.
Os empreendedores, adotando então essa forma de organização
condominial, o contrato que vier a ser celebrado entre eles deve prever,
expressamente, a fração ideal atribuída a cada condômino; regular a destinação
das diferentes áreas e as respectivas restrições; a forma como deve ser exercida a
administração; as regras atinentes às assembleias de condôminos, determinando
ainda a forma de rateio das despesas comuns e da elaboração de orçamentos a
elas relativas.


6.3.2 Organização na forma de condomínio edilício


Inicialmente destacamos que, na modalidade de organização na forma
de condomínio edilício, está caracterizada a coexistência de 2 (duas)
propriedades distintas: a propriedade individual sobre determinado bem imóvel,
convivendo paralelamente com a propriedade comum das partes fundamentais à
solidificação da comunhão dominial, sendo que, entre si, a primeira é divisível e
a segunda indivisível.
Na modalidade de organização na forma de condomínio edilício, a
legislação em vigor exige a construção sob forma de unidades autônomas.
Portanto, em se tratando de shopping center, é necessário que haja unidades
autônomas formadas por lojas ou, no mínimo, por espaços fracionados
previamente, cada qual com sua matrícula individual no Cartório do Registro
Geral de Imóveis.
Também por exigência de legislação em vigor, cada unidade autônoma
deve corresponder uma quota ou fração ideal do terreno relativa à parte comum.
Cada unidade autônoma deve, ainda, ter acesso à via pública (ruas, travessas,
estradas, avenidas, etc.), podendo tê-lo de forma direta, como é o caso de lojas,
dos compartimentos em mercados etc., ou de forma indireta, através de escada,
corredor, rampa ou ascensor. De maneira que a legislação aplicável veda a
apropriação da rota de comunicação por uma só pessoa, alheia ou não ao
condomínio, ou que ela se efetue por unidade autônoma pertencente a um, ou
que este esteja, a qualquer título, dono da passagem.
Todavia, não há qualquer obstáculo legal impedindo que determinado
shopping center seja estruturado mediante a adoção de organização na forma de
condomínio especial entre os empreendedores, ou até entre eles e alguns poucos
lojistas. O que interessa, nessa hipótese, é a constituição do sistema comercial
moderno, decorrente, não da exploração do imóvel condominial, mas da
exploração do comércio pelas lojas integradas individualmente, cada uma delas,
no shopping center.
Por outro lado, considerada a alienação dos espaços aos lojistas, a
organização que restará presente não será mais a de um shopping center, e sim
de um simples centro comercial ou galeria de lojas (corredor interno ou externo
em um edifício, que se situa no mesmo nível das outras peças do mesmo andar,
comunicando-as ou separando-as, composto por estabelecimentos comerciais),
em face dos inafastáveis elementos necessários à sua constituição, elementos
esses constantes da definição fornecida pela Associação Brasileira de Shopping
Centers – ABRASCE, antes mencionada.

“APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO
CUMULADA COM COMPENSAÇÃO, DEPÓSITO,
ANULAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS ABUSIVAS
E PERDAS E DANOS - AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE
PAGAMENTO CUMULADA COM COBRANÇA -
EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL - EMBARGOS À
EXECUÇÃO - SENTENÇA ÚNICA. RECURSO DA
LOCATÁRIA (APELAÇÃO 1): DESCARACTERIZAÇÃO DO
EMPREENDIMENTO DE SHOPPING PARA GALERIA -
PERDAS E DANOS - INOCORRÊNCIA - LOCATÁRIA QUE
NO MOMENTO DA ASSINATURA DO CONTRATO JÁ
TINHA CONHECIMENTO DA ESTRUTURA QUE
CONTRATAVA - NÃO DEMONSTRAÇÃO DA
INVIABILIDADE ECONÔMICA DO NEGÓCIO; RES
SPERATA (LUVAS) - IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA
PORQUE O EMPREENDIMENTO NÃO É SHOPPING
CENTER - AUSÊNCIA DE DETERMINAÇÃO DE
DEVOLUÇÃO DE VALORES PORQUE A COBRANÇA NÃO
FOI PROVADA; TENANT MIX - AUSÊNCIA DE PREVISÃO
CONTRATUAL DE EXCLUSIVIDADE - EXISTÊNCIA DE
MAIS DE UMA LANCHONETE EM GALERIAS E
SHOPPINGS É FATO COMUM; VALOR DO ALUGUEL -
IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO - ALUGUEL
COBRADO CONDIZ COM O VALOR DE MERCADO;
TAXAS CONDOMINIAIS - COBRANÇA QUE RESPEITA O
DEFINIDO EM CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO; DANO
MORAL - AUSÊNCIA DE ABALO À HONRA OBJETIVA DA
PESSOA JURÍDICA NO CASO - INEXISTÊNCIA DO DEVER
DE INDENIZAR; RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS
VALORES INDEVIDAMENTE COBRADOS -
IMPOSSIBILIDADE - AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ NA
COBRANÇA; PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO POR
ACESSÕES - IMPROCEDÊNCIA - CONTRATO COM
CLÁUSULA DE NÃO INDENIZAÇÃO E DE AUSÊNCIA DE
DIREITO DE RETENÇÃO - VALIDADE; SUSPENSÃO
DETERMINAÇÃO DE DESPEJO - IMPOSSIBILIDADE NO
CASO - INADIMPLÊNCIA CARACTERIZADA; INVERSÃO
DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS - IMPOSSIBILIDADE.
APELAÇÃO DA LOCATÁRIA NÃO PROVIDA. RECURSO
DO CONDOMÍNIO (APELAÇÃO 2): AGRAVO RETIDO:
TESE DE CARÊNCIA DE AÇÃO POR INOBSERVÂNCIA DO
PRAZO MÍNIMO PARA A REVISÃO CONTRATUAL -
INAPLICABILIDADE NO CASO DO ARTIGO 19 DA LEI Nº
8425/91 - AGRAVO RETIDO NÃO PROVIDO; MÉRITO DA
APELAÇÃO: AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO -
CARÁTER PROTELATÓRIO - INOCORRÊNCIA -
EXERCÍCIO DO DIREITO DE AÇÃO; TESE DE
CONFIGURAÇÃO DO EMPREENDIMENTO COMO
"SHOPPING CENTER" - IMPROCEDÊNCIA - MERA
GALERIA DE LOJAS - CONTRATO COM
CARACTERÍSTICAS DE LOCAÇÃO COMERCIAL;
COBRANÇA DE 13º ALUGUEL E FUNDO DE RESERVA -
IMPOSSIBILIDADE - RUBRICAS QUE PODEM SER
COBRADAS SOMENTE DE LOJAS DE SHOPPINGS
CENTERS; FUNDO DE RESERVA - ALEGAÇÃO DE
SENTENÇA EXTRA PETITA - INOCORRÊNCIA - PLEITO
DE RESTITUIÇÃO DEDUZIDO NA INICIAL; DEVOLUÇÃO
DE VALORES INDEVIDOS - CABIMENTO
INDEPENDENTEMENTE DE PROVA DE ERRO OU
QUALQUER CONDIÇÃO - OBRIGAÇÃO DO CONDOMÍNIO
DE RESTITUIR À LOCATÁRIA AS QUANTIAS
ILEGALMENTE COBRADAS; ALEGADA INOCORRÊNCIA
DE LITISPENDÊNCIA - IMPROCEDÊNCIA -
LITISPENDÊNCIA CARACTERIZADA EM RAZÃO DA
COBRANÇA DÚPLICE DE ALUGUERES (NA EXECUÇÃO E
EM AÇÃO DE DESPEJO CUMULADA COM COBRANÇA) -
CONDOMÍNIO QUE ABRIU MÃO DA DEMANDA
EXECUTÓRIA AO FORMULAR O PEDIDO DE COBRANÇA
DE ALUGUÉIS NA AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE
PAGAMENTO; PRETENSÃO DE READEQUAÇÃO DOS
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DA AÇÃO DE REVISÃO
DE CONTRATO - PROCEDÊNCIA - SENTENÇA QUE FIXOU
O VALOR DE FORMA INVERTIDA; PEDIDO DE
MINORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
FIXADOS NA EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL -
VALOR ARBITRADO COM BASE NO ARTIGO 20, §4º, DO
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 E EM PATAMAR
ADEQUADO. APELAÇÃO DO CONDOMÍNIO PROVIDA
EM PARTE (PARA READEQUAR OS HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS FIXADOS NA AÇÃO DE REVISÃO DE
CONTRATO)”.[617]

“APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO DECLARATÓRIA C/C
RESOLUÇÃO CONTRATUAL E PEDIDO CONDENATÓRIO -
CONTRATO DE SHOPPING CENTER CASO DE GALERIA
DE HIPERMERCADO QUE NÃO PODE SER TRATADO
COMO SHOPPING CENTER COBRANÇA DE 13º
ALUGUEL E RES SPERATA IMPOSSIBILIDADE -
ENTENDIMENTO REITERADO DESTA CORTE TAXA DE
ADMINISTRAÇÃO REMUNERAÇÃO DE SERVIÇOS
ESPECÍFICOS NÃO CABIMENTO SERVIÇOS QUE ERAM
PRESTADOS DE FORMA INSATISFATÓRIA PELA
DEMANDADA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO”.
[618]


“APELAÇÃO CÍVEL. LOCAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA.
AÇÃO DE DESPEJO. EMBARGOS À EXECUÇÃO.
SENTENÇA ÚNICA. APELAÇÃO 1.
DESCARACTERIZAÇÃO DE LOCAÇÃO EM SHOPPING
CENTER PARA LOCAÇÃO NÃO- RESIDENCIAL COMUM.
JUSTIFICATIVA. LOJA LOCALIZADA DENTRO DE
GALERIA DE HIPERMERCADO. NÃO CONFIGURAÇÃO
DE SHOPPING CENTER. RES SPERATA E 13º ALUGUEL.
DEVOLUÇÃO DEVIDA. CONCORRÊNCIA DESLEAL.
CONFIGURAÇÃO. FIADOR. LEGITIMIDADE. RECURSO
PROVIDO SOMENTE NESTE ASPECTO. APELAÇÃO 2.
DESPEJO. CABIMENTO. FIXAÇÃO DE CRITÉRIO PARA
LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO NA
CONCORRÊNCIA DESLEAL. INCIDÊNCIA DO ART. 210, II,
DA LEI FEDERAL 9279/96. REVISÃO DE ALUGUEL.
IMPOSSIBILIDADE. ACESSÕES. INEXISTÊNCIA.
INDENIZAÇÃO E RETENÇÃO DO IMÓVEL.
IMPOSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
COMPENSAÇÃO. LEGALIDADE. INTELIGÊNCIA DA
SÚMULA 306 DO STJ. HONORÁRIOS DA AÇÃO
DECLARATÓRIA. FIXAÇÃO COM BASE NO §3º, DO
ART.20, DO CPC. RECURSO DE APELAÇÃO 1
CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. RECURSO DE
APELAÇÃO 2 CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE”.[619]

“CIVIL. CONTRATO DE RESERVA DE LOCALIZAÇÃO.
MULTIFEIRA. COBRANÇA DE RES SPERATA.
ILEGALIDADE. NULIDADE DE CLÁUSULA. 1. O
EMPREENDIMENTO DENOMINADO MULTIFEIRA NÃO
SE CARACTERIZA COMO SHOPPING CENTER E ASSIM
NÃO PODE COBRAR RESERVA DE LOCALIZAÇÃO NA
COMERCIALIZAÇÃO DE BOXES E QUIOSQUES. 2. A
DECLARAÇÃO DE NULIDADE DA CLÁUSULA QUE
PREVÊ A RESERVA DE LOCALIZAÇÃO TEM COMO
CONSECTÁRIO A DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS A ESSE
TÍTULO COBRADAS. 3.RECURSO PROVIDO, EM P ARTE”.
[620]


De maneira que, em se tratando de shopping center, o sistema de
organização na forma de condomínio edilício somente tem eficiência nos casos
em que a totalidade das unidades autônomas pertença a um mesmo proprietário,
pois este poderá conferir às unidades a planificação própria de um shopping
center. Do contrário, estariam ausentes alguns requisitos fundamentais à
existência do negócio, tais como o tenant mix (planejamento prévio feito em
relação às necessidades da localidade, posicionamento das lojas no shopping
center e organização das lojas), que reside na capacidade por parte do
empreendedor de alocar, em função de razões mercadológicas, os espaços a
partir do grupamento de determinados ramos de comércio, o que, é claro, não
ocorreria num empreendimento em que cada lojista fosse dono de sua loja, nele
podendo comercializar o produto que bem entender.
Portanto, a divisão da totalidade dos espaços existentes em shopping
center e a consequente comercialização a diversos proprietários descaracteriza a
sua finalidade primordial, conferindo ao shopping center características
antagônicas ao dinamismo que o negócio empresarial moderno exige.


6.3.3 Organização na forma de sociedade


A maior parte dos shoppings centers brasileiros adotaram a organização
em forma condominial como sua estrutura jurídica, em razão da disciplina
societária regulada pelo antigo Código Civil de 1916 (Lei nº 3.071, de
01.01.1916), que vigorou até janeiro de 2003, e como meio de elisão fiscal.[621]
Contudo não havia impedimento legal que inviabilizasse a criação de um
shopping center sob a forma de uma sociedade comercial. No entanto, nos dias
de hoje, com as mudanças legais postas em vigor com o Código Civil de 2002, a
estrutura societária mostra-se perfeitamente adequada aos propósitos de
empreendedores de shopping center.
De fato, o desenvolvimento do capitalismo moderno provocou, como
efeito colateral, o distanciamento da sociedade comercial da pessoa do sócio,
reestruturando-a em torno do resultado almejado, que é o lucro. Assim, a
sociedade tradicional, de cunho pessoal, familiar, em que a affectio societatis
[622]
era a alma do empreendimento comercial, cedeu lugar a modelo em que
pessoas podem ser sócias sem compromisso direto com a administração ou com
o vínculo com os demais sócios. Ao lado das já existentes sociedades anônimas,
cuja característica é a divisão do capital por ações e a responsabilidade dos
sócios limitada às ações que possuem, o disciplinamento empresarial de 2002
criou a sociedade limitada de capital, com peculiaridades que se assemelham à
sociedade por ações, sem os inconvenientes desta, principalmente em relação ao
não-anonimato dos sócios. Este modelo admite a gestão do negócio por pessoa
estranha ao quadro societário (o que proporciona flexibilidade para contratação
de profissional especializado em shopping center) e permite a ampla
cessibilidade das quotas, inclusive para não-sócios.
Portanto nenhuma incompatibilidade há em relação à constituição de
uma sociedade para a exploração comercial de coisa imóvel. O exemplo mais
comum é o da exploração comercial de propriedades rurais, aptas ao plantio e à
exploração pecuária. No entanto, a forma societária não é indicada quando
empreendedores são entes que não podem, por disposição legal, ser sócios em
empresas, como é o caso de certos servidores públicos, de determinadas
entidades sem fins lucrativos, ou entidades com destinação específica (caso de
fundações e cooperativas).
As vantagens na adoção de organização na forma de sociedade residem,
sobretudo, no campo tributário. Uma vez que o intuito da sociedade é a
obtenção de lucro, os empreendedores, na qualidade de sócios, não necessitam
de empresa intermediária para o recebimento das rendas de aluguéis, da locação
esporádica de espaços e do estacionamento, e podem diretamente proceder à
divisão dos lucros.
A intermediação de administração por uma empresa terceirizada traz
ônus excessivos decorrentes das necessárias transferências dos rendimentos de
capital para os quotistas do empreendimento. Com efeito, os órgãos federal e
estaduais da receita atualmente entendem que as receitas do shopping center
devem ser tributadas na qualidade de faturamento da empresa administradora.
Assim, esses rendimentos acabam sofrendo bitributação quando distribuídos aos
empreendedores-condôminos, que devem recolher Imposto de Renda em forma
de carnê-leão.[623]


6.3.4 Constituição jurídica da administração do shopping center: relação entre
os investidores e administradora


Tendo os empreendedores optado pela constituição do shopping center
sob a organização na forma de condomínio, a relação entre os investidores e a
administradora passa a ser de suma importância. No entanto, atualmente, não se
considera mais a forma de condomínio a mais adequada para estruturar as
relações entre os empreendedores de shopping center. Entretanto, se essa for a
opção dos investidores, outra alternativa não resta senão a de contratar empresa
especializada na administração de shopping center para a boa administração do
empreendimento.
Inclusive, vale lembrar que o serviço de administração de shopping
center, terceirizado ou não, abrange a atuação nas áreas jurídica, comercial, de
planejamento [definição da planta comercial; melhor aproveitamento da Área
Bruta Locável – ABL; análise financeira e viabilidade econômica; avaliação para
estimar as luvas e aluguéis; análise detalhada para a definição de ancoragem;
adequação de lojas e orientação à comercialização e elaboração; implantação e
acompanhamento do tenant mix, Coeficiente de Rateio de Despesas – CRD [624] e<