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com uma cadeira. Chegando á barca do DIABO- Quem reze sempre por ti? Mas isto agora é pior...
Inferno, diz: Hi,hi,hi,hi,hi,hi,hi. Que bestas!... Não me entendem...
Tu viveste a teu prazer
FIDALGO- Esta barca, que sai agora, Pensando aqui ter perdão ANJO – (aproximando-se)
Aonde vai tão preparada? Porque lá rezam por ti? Que mandais?
DIABO- Vai para a ilha danada Embarca já!
E há de partir sem demora. FIDALGO – (apavorado) FIDALGO – Diga se a barca do paraíso
Quê?! É assim que a coisa vai? É esta em que navegais?
FIDALGO- Para lá vai a... senhora?
DIABO – (impaciente) ANJO – É esta. Que desejais?
DIABO- (corrigindo irritado) Embarcai! Embarcai logo!
Senhor!... A vosso serviço Segundo o que lá plantastes FIDALGO – Que me deixeis embarcar.
Agora aqui recebereis. Sou de família nobre
FIDALGO- Isso parece um cortiço. E como a morte já passastes, E é bom que me recolhas nesta tua barca.
Passei agora este rio.
DIABO- Porque olhais lá de fora. ANJO _ Não se embarca tirania
FIDALGO – Não há aqui outro navio? nesta barca divinal.
FIDALGO- A que terra passais vós? Para vossa fantasia
DIABO – Não, senhor, que este reservaste, bem pequena é esta barca!
DIABO- Para o inferno, senhor. Pois tão logo morrestes....
Tínheis me dado o sinal. FIDALGO – Para um senhor com minha
FIDALGO- (irônico) marca
Hum! Terra bem sem sabor! FIDALGO – (confuso, sem compreender não há aqui mais cortesia?
nada) (arrogante)
FIDALGO- E passageiros achais Sinal? Qual foi o sinal? Entrarei nem que seja na marra,
Para tal embarcação? levai-me ao paraíso!
DIABO – A boa vida que levastes!
DIABO- Oras pois, tu és a cara ANJO – (com firmeza e autoridade)
Dessa embarcação! FIDALGO – (dirigindo-se à barca do Não vindes vós de maneira
Paraíso) para entrar neste navio.
FIDALGO- Parece-te mesmo assim? A esta outra barca me vou. (apontando para a barca do Inferno)
(gritando para o Anjo que está na barca) Esse outro vai mais vazio.
DIABO- Onde esperas salvação? Olá! Pra onde partis? A cadeira entrará (apontando para o Fidalgo)
(o Anjo não responde) e o rabo caberá...
FIDALGO- Eu deixo na outra vida Ó barqueiro, não me ouvis?! E todo o vosso senhorio.
Quem reze sempre por mim. Respondei-me! Olá! Hou!... Ireis lá mais espaçoso,
Sois um tirano (impaciente) Carregando uma bolsa, vem um
Desprezastes os pequenos, Entrai, meu senhor, entrai! ONZENEIRO, isto é, um agiota, alguém que
agora sereis tanto menos explora com juros abusivos aqueles que
quanto mais fostes pretensioso. (ao companheiro do diabo) precisam de dinheiro emprestado. Aproxima-
Arrume a ponte se da barca do Inferno e diz:
DIABO – À barca, á barca, senhores! Para o precioso passar!
(Arrastando o Fidalgo) ONZENEIRO – Para onde embarcais?
Oh! Que maré tão jeitosa! (ao fidalgo)
Uma brisa bem gostosa Coloque o pé! DIABO – Oh!
e valentes remadores! onzeneiro, meu parente!
FIDALGO – (entrando na barca, Por que demoraste tanto?
(cantarolando) demonstrando tristeza)
Virão todos às minhas mãos, Entrarei, pois assim é que é... ONZENEIRO – Mais quisera eu demorar...
Às minhas mãos todos virão. Mas na hora de lucrar,
DIABO – Ora, agora descansai, de o dinheiro recolher,
FIDALGO – (tristemente conformado) enquanto chega mais gente. aconteceu-me... morrer!
Ao inferno!
Ó triste! FIDALGO – (gritando) Ó barca, como és DIABO – Ora, que muito me espanto
Enquanto vivi ardente, Não trouxeste nenhum dinheiro?
não pensei que ele existia, maldito quem aqui vai! Cadê toda aquela riqueza que acumulaste
pensei que era fantasia. na terra? (abraça o Onzeneiro)
Gostava de ser adorado, DIABO – (ao rapaz,pajem do Fidalgo, com a
e não vi que me perdia. (se aproxima da cadeira) ONZENEIRO – Pois nem para o barqueiro
barca desanimado e chorando, mas não Tu não entras! Sai daqui! não me deixaram um tanto.
entra) Que essa cadeira é demais.
Coisa que esteve na igreja DIABO – Ora, entrai, entrai aqui!
(humildemente pede ao diabo) não se há de embarcar aqui
FIDALGO – Dá-me licença, te peço, ONZENEIRO – Aí não hei de embarcar!
para ir ver minha mulher? (apontando o Fidalgo)
Ele uma outra terá, DIABO – (com ironia)
DIABO – (rindo) Ela, pra não te ver, uma outra de marfim, Oh! Que gracioso receio! (acolhedor e
se jogará de cabeça toda enfeitada de dores, acariciando o Onzeneiro)
no fundo de um precipício... (gargalhando) com tantos e tais primores
Ainda hoje ela rezou, que estará fora de si... ONZENEIRO – Inda agora faleci,
dando graças infinitas, (humildemente)
pois de ti se libertou. Deixa-me escolher o batel?
DIABO – Mas por João Pimentel! (com ONZENEIRO – Por quê? (segura com força o Onzeneiro e o conduz à
dúvida) barca)
Por que não irás aqui? ANJO – (apontando para a bolsa) Querendo ou não, entrarás!
Porque esse bolsão Irás servir Satanás,
ONZENEIRO – E para onde é a viagem? tomará todo o navio. pois sempre ele te ajudou.
DIABO – Para onde deves ir. (impaciente) ONZENEIRO – Juro por Deus que vai vazio! ONZENEIRO – (desesperado)
Estamos para partir, Oh! Triste, quem me cegou?!
não gastes a tua linguagem. ANJO – Mas não o teu coração.
DIABO – Cala-te!
ONZENEIRO – Mas pra onde é a ONZENEIRO – (lamentando-se) Guarda tuas lágrimas,
passagem? Na terra deixei, com a confusão, Teu sofrimento nem começou. (rindo)
Toda a minha riqueza... e também riqueza
DIABO – Para a infernal comarca. alheia. ONZENEIRO – (entrando, vê o Fidalgo, tira
o gorro em sinal de reverência e diz:)
ONZENEIRO – Pois eu não vou nessa ANJO – Ó ganância, como és feia, Santa Joana de Valdês! (é uma antiga
barca! (com determinação) e filha da maldição! prostituta da época)
(aponta para a barca do anjo) Aqui, vossa senhoria?!
Essa outra tem mais vantagem. ONZENEIRO – (voltando á barca do Inferno)
(dirige-se à barca do Anjo) Olá! Ó demo barqueiro! FIDALGO – (raivoso parte pra cima do
Ó da barca! Olá! Hou! Ainda tenho uma esperança, Onzeneiro)
Está na hora de partir? (tenta entrar...) quero lá tornar ao mundo Seja gentil comigo!
e trazer o meu dinheiro, Com quem pensas que estás falando?
ANJO – (faz gesto decisivo para não deixá- pois o outro marinheiro...(referindo-se ao
lo entrar) Anjo) DIABO – (interferindo abruptamente na
Não dê nem mais um passo! ao me ver chegar sem nada conversa e dirigindo-se ao Fidalgo)
Aonde queres ir? me insulta e não me deixa embarcar lá! O quê? Ser mais gentil contigo?
Vós, fidalgo, o que pensais?
ONZENEIRO – Eu vou pro paraíso, oras DIABO – Entra e remarás! (furioso) Que estais em vossa pousada?
pois. Não percamos mais maré! Vos darei tanta pancada
que então, sim, vos zangareis!
ANJO – Não pense que eu estou ONZENEIRO – Por favor, não me leve, é
a fim de aqui te levar. que... (chorando)
Volta BRÍSIDA VAZ à barca do Inferno, DIABO – Pois eu não passo cabrões! PARVO – (aproximando-se da barca, fala ao
dizendo: Judeu)
JUDEU – Eis aqui quatro tostões Furtaste a cabra, cabrão?
BRÍSIDA - Ó barqueiros de má hora, e mais poderei pagar Vós me pareceis, malandro,
ponde a prancha que eu me vou. se me passais o cabrão. um grande dum gafanhoto.
O destino me marcou Quereis mais outro tostão?
e mal me sinto aqui fora. DIABO – (apontando a outra barca)
DIABO – Pois nem tu vais embarcar. Judeu, lá te levarão,
DIABO – Ora, entrai, minha senhora, Que vão mais descarados.
e sereis bem recebida... JUDEU – (olhando para dentro da barca)
Se vivestes santa vida, Não irá o judeu aonde vai Brísida Vaz PARVO – E ele mijou, nos finados,
vós o sentireis agora. Na igreja de São Gião!
FIDALGO (gritando) Comeu carne de panela
Assim que BRÍSIDA VAZ embarcou, vem um _ Vem, entra cá, judeu. no dia de Nosso Senhor!
JUDEU com um bode às costas. Chegando
ao batel dos danados, diz ao DIABO: (Dirige-se ao Fidalgo) DIABO – (impaciente)
O senhor fidalgo quer? Ora, vamos! À barca, à barca!
JUDEU – Que vai lá, ó marinheiro? Então, senhor, irei eu? Judeu, vós sois má pessoa.
Ireis então a reboque.
DIABO – Em que má hora chegaste! DIABO – (furioso)
Por acaso foi o fidalgo quem lhe deu
JUDEU – Que barca é esta que arrumaste? o mando deste navio? Vem um ENFORCADO e, chegando ao batel
dos mal-aventurados, é, recebido pelo
DIABO – Esta barca é do barqueiro. JUDEU – (ao Fidalgo) barqueiro, que lhe diz:
Corregedor, coronel,
JUDEU – Passai-me, tenho dinheiro. (põe a castigai este imbecil! DIABO – Em boa hora, enforcado!
mão no bolso e de lá retira odinheiro) Que diz lá Garcia Moniz?
(apontando para o Diabo)
ENFORCADO – Eu vos direi o que ele diz: isto, ou algum reforço?
que fui bem aventurado, ENFORCADO – Disseram que era a prisão,
que, pelos furtos que fiz, ENFORCADO – Com a corda no pescoço que também por nós se implora
sou santo canonizado, pouco serve a pregação, naquele sermão derradeiro.
pois morri dependurado e quem há de balançar E que era bem notório
como morre uma perdiz. não quer saber de sermão. que os castigos aplicados
valiam preces de finados
DIABO – Entra cá, governarás DIABO – Entra, entra no batel, e missa de São Gregório
até as portas do inferno. que para o inferno hás de ir. capazes de abreviar
as penas do purgatório...
ENFORCADO – (surpreso) ENFORCADO
Não é essa nau que governo... Ora, já cumpri meu fado, DIABO – Quero-te desenganar:
agora não sei o que é isso se isso fosse verdade
DIABO – Mando-te eu: aqui irás! (irado) Não me falaram sobre isso, poderias te salvar...
nem barqueiro, nem barqueira,
ENFORCADO – Oh! não! Não! Por mas apenas em paraíso! (dirigindo-se a todos os que estão na barca)
Barrabás! E isso em bom juízo, Eia, todos! Apear!
Me disseram e que era santo o meu laço... Que está no seco o batel.
que os que morrem como eu fiz mas não sei o que aqui faço, Doutor, fidalgo – empurrar!
são livres de Satanás!... onde está o paraíso? E vós também, frei Gabriel!