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O LOCKDOWN NO CEARÁ: INÚTIL E PERVERSO

Por José Carlos Parente de Oliveira, Dr. Em Fortaleza, CE, 03/06/2020.

Resumo
Em continuação a estudo fenomenológico e observacional publicado em 15/05/2020 no jornal
eletrônico FOCUS [1] este estudo faz uma análise mais aguçada sobre as possíveis evidências
benéficas que tenham resultado do lockdown cearense. As medidas restritivas severas que
foram decretadas pelo governador do Estado do Ceará a partir de 8 de maio de 2020, tiveram
como objetivo a contenção de uma suposta “explosão” de mortes por Covid-19.
Nós consideraremos os dados sobre o número diário e acumulado de mortes e de casos
confirmados e cinco parâmetros são analisados: Razão de Crescimento Diário de Mortes, Taxa
Absoluta de Mortes, Taxa Diária de Mortalidade, Taxa Diária de Letalidade e Tempo de
Duplicação de Mortes e de Casos Confirmados. Esses parâmetros para o Brasil, Ceará e seis
estados – Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Bahia e Rio Grande do Sul – são
comparados entre si. Os resultados obtidos indicam que a estratégia do lockdown pode não ter
salvo nenhuma vida a mais nos estados que o adotaram, comparativamente aos estados que
apenas adotaram a estratégia de distanciamento social e uso de máscaras. Em todos os estados
os resultados mostram evoluções temporais da epidemia semelhantes entre si, independente-
mente de terem adotado ou não a contenção domiciliar imposta e fechamento da economia,
ou lockdown. A conclusão final é que o lockdown no Ceará foi inútil no enfrentamento da
Covid-19, mas marcará indelevelmente o estado por sua perversidade e crueldade.

Introdução
O conhecimento a respeito da epidemia da COVID-19 cresceu enormemente, entretanto esta
doença continua a desafiar a capacidade de resposta dos governos que, visando o bem da
sociedade, devem analisar com muito cuidado as estratégias de enfrentamento da epidemia. As
estratégias não podem ser adotadas simplesmente porque foram adotadas anteriormente em
outros países ou estados.
Desde a adoção da estratégia de lockdown em uma região bem específica da China e,
posteriormente, na Europa Ocidental muitos questionamentos têm surgido quanto aos
benefícios no estado físico e mental da população: Por que privilegiar a doença Covid-19 em
detrimentos das milhões de mortes que continuam a ocorrer e que poderão se ampliar pela
diminuição ou falta de assistência médico-hospitalar? O lockdown não estaria aumentando o
estresse e piorando as condições mentais por causa do isolamento, com risco iminente de mais
suicídios, que sozinho já mata mais que a Covid-19? Quão sérias serão as consequências
humanas, sociais e econômicas com a inexorável recessão que já se iniciou? Estes
questionamentos são apenas alguns pontos que os governos não têm discutido francamente
com a população.
Em particular, o governo do Ceará decretou sucessivas medidas de contenção social sem que a
população seja informada claramente das razões pelas quais essas medidas são decretadas e
implantadas, até com o uso da força policial. Em verdade as razões são colocadas, mas de
forma lacônica e baseadas em uma ciência que não se mostra e que não é mostrada, aqui ou ali
ou acolá. A ciência que não se mostra não pode ser entendida e nem, eventualmente, ser
criticada. O que o governo mais tem ressaltado para a população é a sua “credibilidade de
autoridade” que, baseada na “ciência, profere números que assustam e emudecem a
população: iremos à China comprar “zilhões” disso e daquilo porque a situação é de guerra
total contra o desconhecido; esta doença deixará marcas indeléveis no Ceará porque serão 250
mortes a cada dia; na próxima semana, no melhor dos cenários, poderão morrer 4000
cearenses e se não adotarmos o lockdown serão 5000 mil mortes; ... , contratamos 3000
sepulturas em caráter de urgência e licitamos a compra de 3000 caixões e uma
retroescavadeira para cavar os sete palmos de terra que lhes são reservados.
Diante de tais afirmativas resolvemos realizar este estudo, que utilizará uma abordagem
fenomenológica e observacional para compararmos as evoluções da epidemia antes e depois
do lockdown com o intuito de verificar de forma incontestável se ocorreram os benefícios
prometidos.
Alguns governantes argumentam que avaliação em tempo real da eficiência do lockdown é
muito importante para auxiliar a tomada de posição nas decisões de ações públicas visando à
contenção da doença Covid-19. Um estudo com abordagem observacional foi realizado na
tentativa de obter resposta ao lockdown em países europeus. Os países estudados foram a
Itália e a Espanha e os resultados sugerem que houve saldo positivo em retardar a epidemia. [2]
Nossa abordagem tem semelhanças com esse último trabalho. Contudo, mostramos que não há
evidências de o lockdown tenha influenciado na evolução temporal da epidemia da Covid-19 na
Espanha, França, Itália e Reino Unido. [1]

Metodologia
Os surtos epidêmicos são sistemas dinâmicos complexos que apresentam comportamentos
gerais semelhantes. Em todos os lugares, o número de novos casos diários segue uma evolução
temporal semelhante: após um rápido crescimento inicial, os novos casos tendem a atingir uma
região de máximo, para decaírem a seguir, como se a imunidade de grupo tivesse sido atingida.
Algumas ações públicas podem retardar a reprodução vírus, como se observou na influenza
sazonal e em recentes epidemias de coronavírus H1N1, SARS e MERS. [3, 4] Entre essas ações
estão as medidas de higiene, o uso de máscaras, estratégias de distanciamento social e, em
casos extremamente graves, o lockdown.
Desde que, o lockdown é uma medida extrema que apenas se justifica se os resultados
benéficos dela oriundos suplantarem verdadeiramente e de forma inquestionável os prejuízos,
que ele certamente provocará. Uma condição necessária para que se aplique o lockdown é que
os parâmetros observados da epidemia sofram uma ruptura na evolução temporal da doença.
Uma forma de ver a influência do lockdown no número de mortes por Covid-19 é ilustrado na
Figura 1 a seguir. A partir da data de implantação do lockdown deve ser esperado de duas a três
semanas para que os efeitos dele decorrentes se tornem evidentes. Esse intervalo é chamado
de Janela Temporal de Efeito do lockdown.
Na Figura 1, o gráfico mostra claramente uma ruptura no número diário de mortes: as mortes
diminuíram sensivelmente na janela temporal do lockdown.

Figura 1. Um exemplo de efeito inconteste do lockdown. No período entre


duas e três semanas o número diário de mortes diminuiu bruscamente,
parecendo indicar a eficiência da medida adotada.

Neste estudo a evolução no tempo do número diário de mortes é expressa pelo seu logaritmo
decimal do número diário de mortes, LDM, o que nos permite verificar com maior facilidade a
sua evolução temporal. Em nossa análise utilizaremos os seguintes parâmetros, definidos como
segue:
 data e período de adoção do lockdown;
 a razão diária de crescimento de mortes, RCDM, que é definida como a “derivada”
temporal discreta do LDM, ou a inclinação à curva de evolução no tempo do número diário
de mortes;
 a taxa absoluta de mortes, TAM, que é definida como a razão entre as mortes
ocorridas no Dia 14, relativamente aos casos confirmados do Dia 1. Aqui há uma
defasagem de 14 dias, que é o tempo médio para uma pessoa se infectar, apresentar os
sintomas e, eventualmente, ir a óbito – notadamente se não há assistência respiratória
externa;
 a taxa diária de mortalidade, TDM, que é definida como a razão entre o número
diário de mortes de dado dia e o número acumulado de mortes até esse dia;
 a taxa diária de Letalidade, TL, é definida como a razão entre o número diário de
mortes de dado dia e a soma dos números diários de mortes e casos confirmados;
 o tempo de duplicação de mortes e de casos confirmados, TDMC, que é definido
como o tempo necessário para que o número diário de mortes e casos dobre. Esse
parâmetro é muito utilizado no diagnóstico da evolução epidêmica.
Dados
Em relação aos números e informações sobre o vírus SARS-CoV-2 e a doença Covid-19 no Ceará
e Brasil nós utilizamos as três seguintes bases de dados:
1. base de dados do Governo do Estado do Ceará, a base IntegraSUS,
(https://indicadores.integrasus.saude.ce.gov.br/indicadores/indicadores-coronavirus/obitos-
covid);
2. base de dados do Ministério da Saúde do Brasil,
(http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sim/cnv/obt10uf.def);
3. base de dados da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais, o portal de
Transparência do Registro Civil,
(https://transparencia.registrocivil.org.br/especial-covid).

Resultados
1. Data da Adoção do Lockdown
Na Figura 2 a seguir estão assinaladas por linhas verticais coloridas a data de início do lockdown
em cada um dos quatro países europeus Espanha, França, Itália e Reino Unido. A cor da linha
vertical é a mesma do correspondente país. Para o Ceará a data do lockdown foi o dia 08/maio,
indicada pela reta vertical na cor preta. Como se observa na figura os países europeus
decidiram pela adoção de medida restritiva durante o aumento do número diário de mortes.

Figura 2: Evolução temporal do número diário de mortes para a Espanha,


França, Itália, Reino Unido e Ceará. As linhas verticais coloridas, com cor
igual à curva do país a que se refere, indica a data de início do lockdown. Os
países europeus adotaram o lockdown na fase de crescimento do número de
mortes, enquanto o Ceará o adotou na fase de pico de mortes diárias.
Observa-se que nos quatro países há uma tendência geral de diminuição da taxa de
crescimento do número diário de mortes após um período de quatro a cinco semanas –
atualmente se verifica com o Modelo Polinomial [5] que esta tendência é geral, e ela é
independente da adoção ou não do lockdown.
O governo do Ceará, ao contrário do que foi feito no restante dos países, resolveu adotar o
lockdown em data próxima àquela que o pico de mortes da epidemia aconteceria e não na
ascensão das mortes diárias. Adicionalmente, no Ceará as autoridades responsáveis pelo
enfrentamento à Covid-19, e seus assessores, não observaram que a “curva do Ceará” já se
encontrava “achatada” ocasionando que a região de pico no Ceará demorasse uma semana a
mais que os países europeus analisados.
Quais são então as razões para este achatamento? A resposta é bastante óbvia: o Isolamento
Social, não rigoroso, que vinha sendo praticado pela população cearense; a alta temperatura
atmosférica, que é inimiga eficaz do vírus SARS-CoV-2; o menor número de obesos no Ceará; a
menor idade média da população do Ceará; a pirâmide etária cearense, mais larga na base e a
grande insolação, que é fundamental à imunidade pela vitamina D.

2. Razão de Crescimento Diário de Mortes, RCDM


As páginas oficiais dos governos e os jornais gostam muito de mostrar as curvas de acumulados
de casos e de mortes ou de qualquer outra variável. Talvez a principal razão para isso seja
porque essas curvas provocam um impacto visual considerável, pois elas crescem e crescem
sem parar. Normalmente esse impacto se traduz em pânico e preocupação na população
quando a variável considerada é o número de assaltos ou de mortes. E, mesmo que a taxa com
que essas variáveis (assaltos, mortes) estejam diminuindo, não é fácil de perceber na figura.
As curvas de acumulados diários de mortes em escala linear são difíceis de perceber pequenas
variações em seus valores, conforme se pode observara na Figura 3 (a) a seguir.

Figura 3. (a). Acumulados de mortes diárias no Brasil e em quatro estados,


mostrados em Escala Linear. Os mesmos dados são mostrados em Escala
Logarítmica na Figura 3 (b).
Os mesmos valores do acumulado de mortes da Figura 3(a) são mostrados na Figura 3 (b), só
que agora eles estão em escala logarítmica. Neste caso, é possível visualmente perceber que
estes valores acumulados mudam ao longo do tempo – muito rápido no início, mas diminuído à
medida que o tempo flui. As variações em um dado dia podem ser calculadas a partir da
inclinação da reta tangente à curva logarítmica estudada no dia desejado, bastando que se
tomem os valores do logaritmo do número diário em dias vizinhos.
Nós calculamos os valores do parâmetro RCDM para o Brasil e os quatro estados ao longo de
todo o período – o parâmetro RCDM é uma espécie de “medida da velocidade com que as
mortes ocorrem ao longo do tempo”.
A Figura 4 (a) a seguir mostra os valores da razão RCDM. O gráfico mostrado deixa bastante
claro que este parâmetro diminui à medida que o tempo passa, ou seja, “a velocidade” com
que as mortes acorrem está diminuindo, sistematicamente. Nesta figura esta assinalada pela
reta vertical preta o dia em que a medida de lockdown foi decretada.

Figura 4 (a). Evolução temporal da Razão de Crescimento Diário de Mortes


para O Brasil e quatro estados. A linha vertical se refere à data em que se
iniciou o lockdown no Ceará. A Figura 4 (b) são os ajustes lineares das curvas
de RCDM da parte (a). Não são observadas quaisquer modificações nestes
ajustes que possam ser atribuídas como efeitos do lockdown.

A Figura 4 (b) mostra as retas de ajustes de regressão linear das curvas de RCDM consideradas.
Há uma concordância muito boa entre os ajustes das diversas curvas, independentemente do
estado ter ou não adotado o lockdown – dentre os estados dois o adotaram, Ceará e
Pernambuco, e dois não o adotaram, Rio de Janeiro e São Paulo.
Também calculamos o parâmetro RCDM para os estados que apresentaram um número menor
de mortes – Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
A Figura 5 (a) abaixo mostra que o comportamento do parâmetro RCDM nesses estados é
semelhante aos daqueles estados que apresentaram muitas mortes. Ou seja, em todos os
estados, independente de ter ou não adotado o lockdown, observa-se uma diminuição
sistemática na “velocidade” das mortes.

Figura 5 (a). Evolução temporal da Razão de Crescimento Diário de Mortes


para os estados da Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. A Figura 5 (b)
mostra a curva de RCDM para o Ceará, em que são distinguidas duas porções:
ANTES do lockdown – a curva superior em preto – e DEPOIS do lockdown – a
curva inferior em lilás. Os ajustes lineares demonstram que o lockdown não
afetou a evolução temporal da RCDM.

Para que não restasse dúvida quanto ao comportamento do parâmetro RCDM da curva do
Ceará, relativamente a benefícios do lockdown, nós analisamos os dados antes e depois de sua
decretação.
A Figura 5 (b) mostra as curvas de RCDM antes (curva superior em preto) e depois (curva
inferior em lilás) do lockdown no Ceará. Como esperado não há nenhuma mudança significativa
no seu comportamento o que efetivamente demonstra que a “velocidade” com que as mortes
ocorriam no Ceará não foi afetada pela medida imposta pelo governo do estado que apenas
restringiu a liberdade dos cearenses de ir e vir e de trabalharem.
Somente a guisa de informação para demonstrar a completa inutilidade do lockdown no
comportamento da RCDM, a diferença entre os coeficientes angulares das retas dos ajustes
lineares antes e depois, que estão mostrados na Figura 5 (b) é de 25 em 10.000!

3. Taxa Absoluta de Mortes, TAM


A Taxa Absoluta de Mortes, TAM, é definida como a razão entre as mortes ocorridas no Dia 14,
relativamente aos casos confirmados do Dia 1. Neste parâmetro há uma defasagem de 14 dias,
que é o tempo médio para uma pessoa se infectar, apresentar os sintomas e, eventualmente, ir
a óbito, principalmente se não há assistência médico hospitalar conveniente, que era o que as
autoridades de saúde alegavam estar acontecendo no Ceará.
A correlação entre uma morte ocorrida tendo por causa a Covid-19 tem nesse parâmetro uma
boa medida. A Figura 6 (a) mostra a evolução da TAM para o Brasil e os estados da Bahia,
Ceará, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo. Observa-se na
figura que a evolução temporal da TAM, para todos os estados e Brasil, é decrescente o que
indica que os números absolutos de mortes diminuem relativamente aos casos confirmados
anteriormente. Do gráfico estima-se que a TAM diminuiu, em média, de um fator de vinte em
dois meses, ou seja, em sessenta dias o número de mortes para casos confirmados há cerca de
quatorze dias diminuiu de um fator igual a vinte.

Figura 6 (a). A evolução temporal da Taxa Absoluta Diária de Mortes no


Brasil e em sete estados apresenta o mesmo comportamento, independente
de ter ocorrido ou não lockdown. A taxa TAM diminui sistematicamente
com o passar do tempo. A Figura 6 (b) compara as curvas de TAM para os
estados do Ceará, Pernambuco e Bahia, que apresentam comportamento
similar. A curva de TAM do Ceará é mostrada nos períodos antes (curva
preta) e depois do lockdown (curva lilás): esses comportamentos da TAM no
Ceará são exatamente os mesmos.

Com o objetivo de analisar os dados do Ceará com maior detalhe nós os comparamos com os
dados de Pernambuco, que também esteve sob lockdown e Bahia que não o adotou e,
adicionalmente, verificamos o comportamento da TAM no Ceará ANTES e DEPOIS da data da
medida extrema de isolamento.
A comparação com Pernambuco nos mostra comportamento semelhante na TAM, assim como
com o comportamento do mesmo parâmetro na Bahia. Em nenhum desses três estados pode
ser observada qualquer modificação significativa na evolução temporal de duas TAMs.
Para olhar ainda mais de perto, plotamos na Figura 6 (b) os ajustes da curva do Ceará, ANTES e
DEPOIS da data do lockdown cearense, e o que se observa é que nada, nadinha mudou
relativamente à adoção das medidas restritivas severas.
A conclusão óbvia é que o “Lockdown no Ceará” não alterou em nada a evolução temporal da
Taxa Absoluta de Mortes.

4. Taxa Diária de Mortalidade, TDM (ou Taxa Bruta de Mortalidade)


Esta taxa, que é definida como a razão entre o número de mortes em dado dia e o número
acumulado de mortes até esse dia nos revela o número médio diário de mortes ocorridas por
Covid-19.
É muito comum nos noticiários e em reportagens falar da quantidade de mortes ocorridas em
dado dia específico. Esta informação deve ser informada com cuidado, pois ela pode ter um
forte impacto junto à população geral e pode servir a propósitos de geração de pânico – este
dado sozinho mais desinforma que ajuda no esclarecimento da população.
O número correto a ser fornecido é uma taxa relativa a uma população ou grupo total – a taxa
de mortes relativa à população é um dado mais próximo da realidade. O Brasil, apesar de
aparecer nos noticiários como possível “epicentro” de mortes, em termos absolutos, apresenta
uma das menores taxas relativas de mortes, que é a informação útil para que análises realistas
sejam obtidas.
A Figura 7 (a) mostra, em termos de por centos, a Taxa Diária de Mortalidade no Brasil e em
sete estados. No início da epidemia da Covid-19 ocorriam muitas mortes em todos os lugares
analisados, relativamente ao acumulado local de mortes. Entretanto, a evolução temporal da
TDM em cada local mostra que a quantidade de mortes diárias relativas tem se aproximado
rapidamente de zero – a situação em que não ocorre mais morte.
Com o objetivo de verificar se o lockdown no Ceará influenciou na Taxa Diária de Mortes
plotamos os dados do Ceará e os comparamos aos dados de Pernambuco, Bahia e Minas
Gerais: a conclusão inquestionável que se chega é que todos eles apresentam o mesmo
comportamento de decréscimo em suas TDMs!
Dos quatro estados mostrados na Figura 7 (b) dois decretaram lockdown (Ceará e Pernambuco)
e dois não o decretaram (Bahia e Minas Gerais) e todos eles apresentam o mesmíssimo
comportamento. Em particular os dados e as retas de ajuste do Ceará e de Pernambuco não
sugerem qualquer mudança, mesmo insignificante, nos dias posteriores à adoção das medidas
restritivas “absolutamente necessárias para salvar vidas preciosas”.
Figura 7 (a). A evolução temporal da Taxa Diária de Mortalidade, TDM, no
Brasil e em seis estados apresenta o mesmo comportamento, independente
de ter ocorrido ou não lockdown. A taxa TDM diminui sistematicamente
com o passar do tempo. A Figura 7 (b) compara as curvas de TDM para os
estados que adotaram o lockdown (Ceará e Pernambuco) e não o adotaram
(Minas Gerais e Bahia). É evidente desta figura que o comportamento da
TDM independe de o estado adotar ou não o lockdown.

5. Taxa Diária de Letalidade, TDL


A Taxa Diária de Letalidade, TDL, é definida como a razão entre o número diário de mortes por
Covid-19 em dado dia e a soma dos números diários de mortes e casos confirmados até esse
dia, e ela é expressa em por centos. A inclusão das mortes no cálculo desta taxa tem o objetivo
de torná-la “mais próxima” de um importante parâmetro epidemiológico chamado de Número
ou Fator de Reprodução.
A Figura 8 (a) mostra as TDLs para o Brasil, Ceará e mais cinco estados. Desta figura observa-se
que no início da epidemia da Covid-19 a sua letalidade foi de cerca quatro por centos (4%),
crescendo nas cinco semanas seguintes, onde atingiu valores médios de oito por centos (8 %). A
partir da sexta semana a letalidade da Covid-19 inicia um descenso lento, mas contínuo.

Figura 8 (a). A evolução temporal da Taxa Diária de Letalidade, TDL, no Brasil


e em seis estados apresenta comportamentos muito semelhantes entre si,
independente de ter ocorrido ou não lockdown. A taxa TDL inicialmente
cresce para, em seguida, decrescer sistematicamente. A Figura 8 (b)
compara as curvas de TDL para o Ceará, com lockdown, e Minas Gerais, sem
lockdown. É evidente desta figura que o comportamento da TDL independe
de o estado ter adotado ou não o lockdown.
A Figura 8 (b) mostra as curvas da Taxa Diária de Letalidade para o Ceará, que adotou o
lockdown, e para Minas Gerais que não o adotou. O comportamento ao longo do tempo dessa
taxa nos dois estados é semelhante, e mostra-se nítido que a razão de decréscimo da letalidade
em Minas Gerais é superior à correspondente do estado Ceará.
Novamente, e igualmente aos demais parâmetros analisados anteriormente, não há qualquer
indício ou evidência que o lockdown no Ceará tenha influenciado, mesmo que minimamente, o
comportamento da Taxa Diária de Letalidade da Covid-19, ou seja, não houve vidas a mais de
cearenses salvas devido à adoção das medidas restritivas “absolutamente necessárias para
salvar vidas preciosas”.

6. TEMPO DE DUPLICAÇÃO DE CASOS E MORTES, TDCM


Um importante parâmetro na análise de epidemias é o número de dias para que aconteça a
duplicação do número acumulado de casos confirmados e de mortes: quanto maior for esse
número menor é a expansão da doença.
O parâmetro Tempo de Duplicação de Casos e Mortes é mostrado nas Figuras 9 (a) e 9 (b),
respectivamente.
Este parâmetro varia de um fator de um dia (os casos e mortes dobram em 1 dia) para um fator
de sete na sexta semana de epidemia, ou seja, os casos e as mortes dobram em sete dias.
O comportamento geral do parâmetro TDCM, tanto em nível de Brasil quanto nos estados, é de
aumento contínuo à medida que as semanas de enfrentamento à Covid-19 se sucedem.
Também é visível para este parâmetro que os efeitos “benéficos” do lockdown no Ceará não se
concretizaram, ou seja, o aumento contínuo no tempo de duplicação de casos e mortes no
Brasil e estados é independente da adoção ou não das medidas restritivas “absolutamente
necessárias para salvar vidas preciosas”.

Figura 5: Quantidade de dias necessários à duplicação do número cumulativo


de (a) casos confirmados e (b) mortes.
Discussão
Neste estudo observacional com metodologia fenomenológica baseada no número diário de
casos confirmados e de mortes diárias obtidos em página eletrônicas de órgãos oficiais
mostramos que a medida restritiva extrema de lockdown no Ceará ainda não mostraram os
efeitos benéficos esperados no enfrentamento da epidemia da Covid19.
Nossos resultados mostram comportamentos semelhantes para todos os cinco parâmetros
analisados, independentemente da adoção ou não do lockdown.
A comparação da evolução da epidemia entre os estados totalmente fechados pelo lockdown
(Ceará e Pernambuco) e os demais estados que aplicou distanciamento social e uso de
máscaras confirma e reforça a ausência de efeito benéfico devido o lockdown.
Este trabalho sugere que medidas de distanciamento social, como aplicados pela maioria dos
estados brasileiros, têm aproximadamente os mesmos efeitos que os obtidos quando o
lockdown é imposto.
Entretanto, diferentemente de sua inutilidade no enfrentamento da epidemia da Covid-19, o
lockdown imposto no Ceará deixará marcas realmente indeléveis na vida de milhões de
cearenses e na economia do estado.
Como observação final, devemos salientar que, como as estratégias de lockdown foram inúteis
na desaceleração da epidemia no Ceará, devemos considerar que a sua adoção ao invés de
salvar vidas humanas, comprometeu ainda mais a saúde física e mental da população do Ceará,
seja pelo aumento do estresse seja pelo desemprego e marginalização gerados.
A INUTILIDADE DO LOCKDOWN NO CEARÁ DEU LUGAR E AMPLIFICOU A SUA PERVERSIDADE E
CRUELDADE, ESPECIALMENTE COM A CAMADA MAIS POBRE E HÁ MUITO DESASSISTIDA PELAS
AUTORIDADES DESTE ESTADO.

[1] Artigo do autor, “O Lockdown Não Funcionou na Europa, nem Funcionará no Ceará”,
publicado na revista eletrônica FOCUS, em 15/05/2020.
[2] A. Tobías. Evaluation of the lockdowns for the sars-cov-2 epidemic in italy and spain after
one month follow up. Science of The Total Environment, page 138539, 2020.
[3] J. B. Dowd, L. Andriano, D. M. Brazel, V. Rotondi, P. Block, X. Ding, Y. Liu, and M. C. Mills.
Demographic science aids in understanding the spread and fatality rates of covid-19.
Proceedings of the National Academy of Sciences, 2020.
[4] J. C. Lagier, P. Colson, H. T. Dupont, J. Salomon, B. Doudier, C. Aubry, F. Gouriet, S. Baron, P.
Dudouet, R. Flores, and others. Testing the repatriated for sars-cov2: Should laboratory-based
quarantine replace traditional quarantine? Travel Medicine and Infectious Disease, page
101624, 2020.
[5] Artigo do autor, “Modelo Vislumbrando o Final da Curva e Não Mais o seu Pico”, publicado
na revista eletrônica FOCUS, em 04/05/2020.

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