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Multidisciplinares
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04 A cidade em perspectivas multidisciplinares
A cidade em perspectivas multidisciplinares
Unidade - 1
A cidade e suas histórias
Construção histórica da sociedade brasileira
Introdução
Objetivos
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Dimensão Histórica
Quando iniciamos nosso trabalho em uma etnia ou segmento
social buscamos descobrir as repostas à perguntas chaves cujos
elementos são universais. A pergunta que se levanta aqui é quem
somos nós? Para respondê-la lançaremos mão de algumas abordagens,
aplicáveis em qualquer cultura ou segmento.
Para a Antropologia o ser humano adapta-se a diferentes ambientes
e situações a partir de respostas mais culturais do que genéticas. O
homem é visto como homem, pela Antropologia, no momento em que a
história é capaz de relatar sua capacidade de transmitir “conhecimento,
crença, lei, moral, costume a seus descendentes e aos seus vizinhos
através do aprendizado”. Vemos, assim, que a cultura participa da
história do homem de tal forma intrínseca que o desenvolvimento da
humanidade pode ser considerado o desenvolvimento cultural.
O aperfeiçoamento das ferramentas para subsistência como
habitação, plantio, caça, pesca e proteção, além da família se
estabelecendo em variadas formas no decorrer do tempo e nos espaços
geográficos bem como as valorizações cada vez mais constantes do
aspecto simbólico, as artes, a linguagem, os mitos, a religiosidade
universal, tudo isto criou para o homem um novo ambiente ao qual
ele foi obrigado a adaptar-se.
Historicidade cultural
Nosso pressuposto é que os padrões de historicidade, ou seja,
como certo grupo observa sua identidade e desenvolvimento, irá gerar
a plataforma de compreensão de uma mensagem, qualquer mensagem.
Sociedade brasileira
A sociedade brasileira é profundamente diversificada racial
e socialmente. Por outro lado possui alguns marcos definidores de
sua identidade social fazendo com que o homem brasileiro possua
elementos unificadores de forma geral, mesmo em agrupamentos
distintos como os urbanos, suburbanos e rurais. Já as sociedades
tribais indígenas são únicas e freqüentemente distintas lingüística
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e de maneira marcante precisamos nos tornar contadores de histórias.
Em uma sociedade judaica altamente marcada pelo simbolismo Jesus
utilizou tal expediente para uma perfeita comunicação. Falou sobre
valores e verdades profundas e complexas como o Reino, Salvação,
Soberania, Céu e Inferno. Porém o fez de forma compreensível através
de parábolas, comparações com a vida diária, utilizou elementos com
os quais lidavam no dia a dia como a lamparina, o sal, o peixe e o trigo.
Sua intenção, porém, não era apenas comunicar a um grupo em sua
geração, mas dar a este grupo ferramentas para que pudesse comunicar
tais verdades a outros grupos, fora daquele círculo geográfico e de
geração em geração.
Certa vez, convidado a falar sobre diversidade cultural em contexto
de equipes interculturais para um grupo formado por latinos, maioria
brasileiros, e europeus, com maioria alemã, era notável a maneira como
cada um tinha sua atenção voltada para partes diferentes da mesma
palestra. Quando me prolongava na explicação técnica de um conceito
os europeus tinham sua atenção cativa e anotavam enfaticamente o que
se dizia. Tal atenção caía quando me punha a ilustrar algum conceito
através de história ou fato da vida. Neste momento os latinos, porém,
tinham sua atenção cativa e freqüentemente estes eram os pontos
mais comentados entre eles após a exposição. Aprendemos de forma
diferente por sermos culturalmente distintos. Se desejarmos expor
conceitos bíblicos ou humanos à sociedade brasileira é necessário
observar de perto o segmento com o qual iremos interagir, distinguir
suas nuances e desenvolver a abordagem e método de comunicação
lembrando que o homem brasileiro, seja ele urbano ou rural, é um ser
contador de histórias e aprende através delas.
Dimensão Ética
Se na dimensão histórica foi levantada a pergunta “quem somos
nós?” por sua vez, tratando da ética, do homem e seus valores culturais,
a pergunta que levantaremos agora será: “como nós pensamos?” Ou
ainda, “quais são nossos valores?” E buscamos este pensar humano
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gerador (ou receptor) de valores culturais como pecado, perdão,
comunicação, normas de agrupamento e dispersão e coisas afins.
Todo agrupamento e sociedade humana possuem valores e
normas o que, de maneira geral, associamos à moral. Mauss já enfatizava
que a moral pré-existente na consciência humana desabrocha em
valores semelhantes e normas semelhantes em diversas gerações e
agrupamentos.
Ou seja, por sermos seres morais e unidos por uma historicidade
cultural, mesma origem, desenvolvemos valores parecidos e universais.
Isto poderia ser facilmente comprovado através de um estudo de
caso quando isolamos um valor, por exemplo, a sensualidade. Ela é
condenada em praticamente todas as culturas em suas diferentes
formas quando ultrapassa o que aquela sociedade considera tolerável.
Mesmo estando sempre ligadas a partes do corpo humano, danças,
roupas e atitudes, sua manifestação é distinta de grupo a grupo (o que
é sensual no Brasil não é necessariamente em Gana), porém seu valor
é uno e por ser assim a sensualidade cria tabus e tolerâncias muito
semelhantes em diferentes sociedades e épocas. O Museu do Cairo,
por exemplo, apresentou em 1979 uma galeria de roupas, adornos e
cosméticos dedicados à produção de sensualidade em moças egípcias
durante mais de 20 gerações. Apesar de experimentarmos certos
valores de forma adaptada ao nosso contexto e ambiente, tais valores
nos unem e nos tornam socialmente semelhantes.
Introdução
Objetivos
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Análise Antropológica dos Ajuntamentos
Humanos urbanos
Conceituando brevemente a Antropologia
Este é uma simples conceituação para dar introdução ao assunto.
Olhar para a antropologia em primeiro lugar, quando falamos
sobre plantio de igrejas é olhar para o que Jesus fez.
Infelizmente precisamos aprender a viver no meio das pessoas
os respeitando como gente, pois isso não é natural, posto que o que
geralmente queremos é “impor” nosso estilo de vida (comportamentos),
determinar como é que Deus age (impositivo) e principalmente dizer
“quem” entra na igreja ou não (exclusivismo). Jesus não é exclusivista,
ele não olha para a prostituta e não imagina que ela não pode receber
a mensagem do reino, mas ele também não vê que o rico é impedido
de estar no reino – pode até objetar dizendo que é mais fácil uma
prostituta entender sua necessidade de Deus do que um rico que tem
tudo, mas assim mesmo ele enxerga as pessoas, lê as pessoas, entende
o seu meio de vida e o meio da sua vida.
Ele sabe que para um teólogo como Nicodemos é preciso tratar
de temas que o façam sentir e pensar, assim como lida com uma
mulher samaritana na beira de um poço tratando com ela a partir das
suas próprias necessidades, levando o reino, o amor, a misericórdia
tanto para um como para outro.
É preciso aprender a fazer isso e a antropologia (dentre outras
disciplinas) pode nos ajudar com isso.
O método (do grego, methodos, vocábulo composto de meta =
junto de, ou ao lado de e hodos = caminho) etmologicamente significa
atalho, rodeio. É, pois a maneira de, ou o caminho seguido para, se
alcançar um objetivo.
Compreende uma serie de técnicas científicas que se quer
demonstrar pelo experimental na realidade que se propõe sendo
eminentemente indutivo, partindo de observação de casos até chegar
a uma “lei universal” (no caso uma maneira universal da cultura ver,
ouvir, trabalhar, viver etc) e também válida para casos não observados.
O método científico é um método analítico, pois parte de casos
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vivendo em comunidades isoladas, para entender o ser humano a
partir daí. O mundo mudou e hoje a maioria absoluta das pessoas vive
ou mora em zona urbana e isso trouxe uma nova necessidade para os
estudos antropológicos.
A antropologia se relegou durante muito tempo a estudar apenas
os povos tribais e dali tirar suas conclusões sobre a humanidade. O
“homem urbano” não era interessante, principalmente porque ele era
de relacionamento mais raso, menos profundo e menos modificado
ou acercado da realidade de “comunidade”.
O primeiro movimento de estudo urbano pela antropologia é
uma tentativa de enxergar o folclore na cidade - aquele que é herança
de povos tribais e rurais. Depois, voltou-se para a cidade para observar
o movimento político e o trabalho.
Quando por fim começou-se a analisar o lazer e a diversão,
que era tida apenas como uma ocasião alienante e como sendo nada.
Depois, Magnani, ao referir-se sobre isso diz:
“(...) atividade marginal, instante de esquecimento das
dificuldades cotidianas, lugar, enfim, de algum prazer - mas
talvez por isso mesmo possa oferecer um ângulo inesperado para
a compreensão de sua visão de mundo: é lá que os trabalhadores
podem falar e ouvir sua própria língua” (2008, p. 184).
O problema de estudar o lazer vem justamente da sua contraposição:
o trabalho. Se não é trabalho, não é importante. Lazer é perda de tempo.
A análise após décadas passou a ser uma leitura social e aplicável do
tempo livre das pessoas e como elas e porque gastam desse jeito.
Juntamente com isso, os espaços (pedaços da cidade) passaram a ter
uma significação especial para a antropologia.
Hoje a antropologia estuda a cidade como um todo, seus
habitantes, seus costumes, seus espaços, seu trabalho, sua política e
aprende de sua cultura.
Fala-se sobre o “pedaço” na cidade, que é uma referência à
diferença entre o “privado da sua casa” e o “de fora da sua casa”. Essa
é uma referência como a Antropologia vê a cidade e enxerga os seus
diferentes grupos.
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aqueles que são chamados de primários (individualidade, sentimento
de comunidade, bem estar social comunitário) e através do isolamento,
da superficialidade, do anonimato, das relações sociais transitórias e
com fins instrumentais, da inexistência de um controle social direto,
da diversidade e fugacidade dos envolvimentos sociais, afrouxamento
dos laços familiares e a competição individualista estes sentimentos
primários são gradativamente substituídos e solapados.
Passamos por esta breve introdução ao assunto da antropologia
e a sua metodologia de estudo para que possamos entender o quanto
ela, a antropologia, pode nos ajudar a entender não só os ajuntamentos
humanos, mas sobretudo, a relações que existem aí – relações a partir
do ajuntamento e da separação; do isolamento e da ação conjunta;
relação entre o outro distante e o comum que está perto.
Entender as relações humanas e como elas se dão é o primeiro passo
para o plantio de igrejas de forma saudável e relevante no caráter missional.
Não querer entender como pensam as pessoas, como vivem as
pessoas, como elas se relacionam consigo mesmo e com os outros,
como elas enxergam o movimento social, a igreja, a política, a religião,
a diversão, a sexualidade – e tudo isso a partir da visão própria, da
própria cosmovisão – é não tentar plantar uma igreja de maneira
impositiva, se preocupando pura e tão somente com a nossa vontade
e em última análise, não nos preocupando com aquilo que Deus
realmente quer – uma igreja que seja sal para a terra e luz para o
mundo, que não somente mostre o que está oculto e errado (ser luz),
mas que também seja um fator de transformação (ser sal).
Heranças de relacionamento
Em segundo lugar, as heranças de relacionamento interpessoal
são os elementos passados de pais para filhos que determinam como
nos relacionamos com o próximo, com o distante e com o desconhecido.
Normalmente precisamos aqui identificar as hierarquias humanas e
suas aplicações. O sentimento de pertencer a um grupo, segmento, clã
ou família, é definidor de nossa identidade. Este pertencer determina
com quem nos identificamos, como pensamos e os padrões sociais de
comportamento.
Heranças de religiosidade
Em terceiro lugar, as heranças de religiosidade são os elementos
passados de pais para filhos a fim de unir o homem ao divino. Entretanto,
em meio à teia de religiosidade visível ou invisível de certa cultura,
facilmente somos levados a nos perder em fatos menores. Aqui, o
importante é a definição dos elementos imprescindíveis de religiosidade
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que os pais ensinam aos filhos, sem os quais não se pode viver.
Deveremos descobrir se há relação entre a Persona e Ponto Alfa
e o povo e este trabalho será desenvolvido a partir de diversas fontes
como canções, narrativas e histórias contadas aos filhos.
Reguladores sociais
Os Elementos Universais são os traços que aparecem em todas as
culturas que englobam idéias, hábitos, reações emotivas condicionadas
como raiva quando é atacado, alegria com o recebimento de presentes
ou tristeza por ocasião da perda; ou comportamentos que são
compartilhados por toda a sociedade de determinada cultura, como o
aperto de mão entre os ocidentais. Quais são as soluções desenvolvidas
pelo grupo estudado para elementos universais como fome, tristeza,
humilhação, perda? Quais são suas reações para alegria e ganho?
As Especialidades são os atos realizados por apenas determinado
grupo da sociedade, como por exemplo a assistência médica,
construção de habitação, assessoria a alguma atividade específica,
plantio, caça e outros. Desta forma é possível categorizar, tendo em
mente, por exemplo, quem realiza ou coordena algumas atividades
específicas como caçar, plantar, fazer farinha, disciplinar a criança, etc.
As Alternativas são costumes que podem ser aceitos
voluntariamente, como optar por andar de bicicleta ou a cavalo.
Envolve normalmente aprendizado e iniciativa. Creio ser relevante
observarmos a presença ou não das alternativas no grupo estudado,
como sinal de abertura para o novo.
As Peculiaridades individuais ficam além dos limites do grupo e
constituem as características pessoais do indivíduo. São aqueles que se
destacam (positiva ou negativamente) no grupo pela diferenciação de
padrão, seja comportamental ou de idéias.
Observando os agrupamentos humanos podemos também
identificar seus elementos reguladores sociais. Vale aqui montar uma
pequena explicação. Pensemos em uma escala vertical onde, no topo,
encontramos os grupos regulados socialmente pelas leis. São grupos
com regulamentos sociais rígidos, que demandam normalmente
uma organização formal e, não raramente registrada (seja verbal –
por narrativas - ou escrita) do seu conjunto de leis. A quebra destas
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coletivas de alegria e tristeza bem como toda uma cadeia comportamental
que regula o pertencer social, o que é aceitável ou não.
Surge aqui a questão dos pensamentos progressivos, ou seja, valores
que desenvolvemos enquanto expostos a novas situações e contextos,
não necessariamente passados pelos nossos pais ou pelo grupo.
Leiamos Bonhoeffer:
“Em Lugar de Deus, o ser humano enxerga a si mesmo. ‘E abriram-
se-lhes os olhos’ (Gn 3.7). O ser humano se reconhece em sua desunião
em relação a Deus e ao semelhante. Reconhece que está nu. Sem a
proteção, sem a cobertura que Deus e o outro significam, ele se sente
exposto. Nasce o pudor. É a indestrutível lembrança do ser humano da
sua separação da origem, é a dor decorrente desta separação e o desejo
impotente de desfazê-la. O ser humano se envergonha porque perdeu
algo que faz parte de sua essência original e de sua integridade. Tem
vergonha de sua nudez.”
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A modificação da época exige melhor conhecimento dela para
que se possa não somente interagir, mas proceder com a sua Missão e
[...] seria irônico – se não fosse trágico – se os evangélicos
se tornassem os últimos defensores da modernidade já
morimbunda. Para alcançar as pessoas no novo contexto pós-
moderno, devemo-nos lançar a tarefa de decifrar as implicações
do pós-modernismo para o evangelho (Grenz, 1997, p. 28).
Francis Shaeffer, um dos grandes expoentes cristãos do século
XX, durante uma aula devocional afirmou que
[...] podemos medir a crise de toda a humanidade pela crise de
um só homem. Quando a mentira, o suborno, o rompimento dos
laços da família, o amor livre entre os jovens e o entorpecimento
pelas drogas tornam-se comuns e naturais para o indivíduo,
então poderemos ver que o mundo está em crise e ensinou
àquela mente, individualmente, quais são as novas regras do
jogo. (Shaeffer – “Devontion” – Não publicado).
Apesar de Francis Shaeffer pertencer à “modernidade” em sua
análise e vida entendo que esta descrição sobre as novas regras do jogo
evidenciam uma projeção do ser humano na “pós-modernidade”.
Essa é basicamente a crise por
qual a igreja evangélica brasileira passa,
apesar do pós-modernismo ainda não
estar “completamente” presente no
país, sendo que se enxerga o seu brilho
aqui e ali, em situações específicas, até
porque não se pode falar sobre o pós-
modernismo como uma coisa concreta,
porém, como Grenz afirmou que é
uma mudança cultural que vai além
da modernidade ou como Bauman
argumenta em seus livros, é uma
modernidade líquida.
Francis Shaeffer
O espírito da pós-modernidade,
porém, encontra-se presente nos
círculos de relacionamento, principalmente porque que a igreja
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Quatro concepções sobre o mundo e o conhecimento
Concepções
Materialismo Pós
Idealismo Empiricismo
Dialético modernismo
Idade Moderna
Momento Histórico Idade Média Idade Moderna (fim) Atualidade
(início)
Dualista
Mecanicista
(Universo=máquina) Discursiva –
Dualista não presume
Estrutura do
Reducionista Dialético a existência de
Raciocínio
Maniqueísta uma realidade
(Decomposição do única.
objeto)
Maniqueísta
Construcionismo
Social (discursos
Feudalismo/ científicos
Vinculação Política Capitalismo Revolução Social
Monarquia críticos e
implicações
sociais)
Natureza da
Desobediência Destrutividade Crescimento Discurso crítico
Divergência
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assim por diante. Essa é uma relação pragmática, numa estrutura pós-
moderna de pensamento mesclada com o pressuposto básico de que é
a vontade divina que rege o mundo.
Em sociedade então, esse ser humano dos dias atuais é uma eterna
contradição e é com estes que trabalharemos no plantio de igreja, por
isso é mais do que necessário utilizarmos as ferramentas de análise da
realidade (antropologia, sociologia, psicologia etc) para entendermos
o máximo como pensam, vivem e interagem estes seres humanos que
deverão ser alvos de nossas ações, de nosso amor, de nossa abnegação,
tudo isso com alteridade, com sabedoria e principalmente movidos
por Deus.
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vida e que, portanto, é um gerador do futuro – a Despersonificação
processual, onde inauguramos a era do RFID (Radio Frequency
Identification – “Identificação por rádio frequência”) onde um chip
implantado poderá fornecer identificação, localização, monitoramento,
dando a nítida sensação de que o termo aldeia global faz cada vez mais
sentido e o sentimento isolacionista que movimenta o coração do
homem em busca de felicidade pessoal tem seus dias contados, sendo
substituído pela necessidade corporativista cada vez mais presente
através de associações, conglomerados, fusões empresarias etc.
Paul Tournier, em seu livro Mitos e Neuroses (Tournier, 2002,
p. 13) exprime que “quando se pretende por valores entre parênteses,
quando se vive como se eles não
existissem, o natural é finalmente
chegar a negá-los e viver segundo seu
próprio gosto e prazer”.
Talvez esta tenha sido a
primeira tentativa humana de
mudar a conceituação da verdade,
relativizando e movendo-se para um
lugar neutro, pois não podendo viver
com os paradigmas e marcos do seu
referencial teórico (passado), coloca
entre parênteses aquilo que quer negar
para que não tenha mais valor. Mas
“assim como se pode por os valores
‘entre parênteses’ e viver como se não
existissem, também se pode adotar
novos valores, fabricar os próprios valores” (Tournier, 2002, p. 26) e
então “a minha liberdade é o único fundamento dos valores e nada,
absolutamente nada, justifica que eu adote um determinado valor, esta
ou aquela escala de valores... E a minha liberdade me angustia por ser
o fundamento sem fundamento dos valores” (Tournier, 2002, p. 26).
Existe uma pretensão em descaracterizar a verdade, mas o
conceito absoluto é algo conhecido, mas não serve pra a vida do homem
e da mulher pós-moderna, apesar de não o negar frontalmente. Poucos
são os seres humanos que confrontam a verdade estabelecida, como
Desenvolvimento Humano
O ser humano, pós-moderno, inclui-se numa barbárie de
pensamentos soltos, desconexos e sem estrutura, que torna difícil a vida
daqueles que pretendem instruir outros. Utilizando para isso experiência
ou mesmo contos e fábulas, C S Lewis, apesar de não pertencer à pós-
modernidade é um dos maiores escritores cristãos e leva a um mundo
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criado por sua imaginação, Nárnia, onde a analogia é a demonstração
da verdade como princípio de vida. Gabriele Greggersen, especialista
em C S Lewis no Brasil diz em um de seus livros:
Podemos, sim, considerar O Leão, o guarda-roupa e a Feiticeira
como uma autêntica parábola filosófico-antropológica que
(...) está interessada em discutir não a existência ou não de
feiticeiras, animais falantes, elfos, diabos, Baco etc. Esse tipo
de especulação, aliás, não é o que interessa aos leitores que
realmente compreenderam e estão abertos para “o espírito da
cosia” (Greggersen, 2001, p. 89).
Gabriele argumenta ainda em seu livro “... o principal objetivo
da educação é ensinar as virtudes (especialmente a prudência) a este
ser ‘esquecente’, que é o homem, pois as mesmas não são inatas, mas
adquiridas pela educação e experiência” (Greggersen, 2001, p. 89).
Não importa hoje o aprendizado, mas o para que – a cultura
racionalista é pragmática demais, óbvia demais, charlatã demais.
Vezes a fio se deveria apenas ouvir, sem preocupar com o que vai se
ganhar com esse conhecimento que advém. A experiência que ensina,
o imaterial que reflete e assim traz uma mágica sobre a vida do ser
humano parece perdida no tempo ou pelo menos esquecida do viver
diário de grande parte da civilização.
O ser humano moderno crê firmemente naquilo que aprendeu
desde sua tenra infância, quando criança em casa ou na sua igreja ou
mesmo com bons mestres que lhe incutiam a boa moral e ética. Boa
é a sua fé. Alenta-se o fato de enxergar um pouco além do que se vê,
na teologia, na Bíblia e até na conversa do dia-a-dia. Quando se sai do
âmbito da prédica e passa para a razão de ser da vida, no dia-a-dia, de
decisões, de vontade, de acertos com a vida, quer seja ela sentimental,
profissional, religiosa ou pessoal, enxerga-se, porém que esta verdade
não é vivida e que se mente ao afirmá-la.
A subjetividade tomou conta da vida; retirou dela todo
critério objetivo; mais que isso ainda arrancou o sonho, a poesia, a
contemplação.
Alguns têm uma forte necessidade de “ver as árvores balançando”,
numa tentativa desesperada de alguém que nesse mundo se acha
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Anotações
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A cidade e a política
Nosso sistema estruturalmente influenciado e planejado traz sobre
a política uma ação de injustiça e opressão muito comum em tantos
recantos do Brasil e fora dele. O mal também triunfa estabelecendo
a perda de liberdade básica, ou seja, somos e fazemos aquilo que se
espera de nós, na instituição de uma tirania bem conduzida que se
traduz em corrupção, dinastias de poder e muito nepotismo – “Política
e corrupção parecem acompanhar a saga humana na perspectiva do
exercício do poder” (Gasparetto, 2009, p. 1).
As estruturas do poder estão corrompidas e jazem no maligno
não porque tenham mal em si, mas porque seres humanos corrompidos
adentram em seus portões e fazem de lá os seus currais. As leis, as
políticas de ação, as constituições tendem a favorecer este ou aquele
grupamento, negociando em favor da facilitação para uma melhoria de
vida para alguns que detém o poder e a oportunidade de controlarem
em detrimento da desgraça e perda de esperança de quem sempre se
encontra com as mãos vazias.
Preparar-se politicamente é talvez o último dos motivos cristãos,
mas agira em ‘diakonia’ na cidade também requer de nós inteligência e
atitude nesta área. Muitos cristãos, vão para o meio dos “lobos” tão mal
preparados, com tamanha sede corporativista para defender os direitos
evangélicos que muitas vezes não conseguem transpor a barreira da
insignificância política, transformando uma situação difícil em algo
pior, onde os votos e as ações são para um grupo, beneficiando poucos
em detrimento de muitos e assim, não conseguem ser suficientemente
sal e luz para transformar esta área tão importante da nação.
Às vezes não notamos que a verdadeira arte da política está em
se colocar em lugares onde as decisões ocorrem como é o caso dos
conselhos que atuam na cidade, nos estados e em todo o país.
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Gostaria de sugerir algumas ações práticas em relação a esta
questão:
Em primeiro lugar olhe para a sua cidade. Se pergunte o que vê
na cidade, como a enxerga, quais é a maneira como enxerga a estrutura
política administrativa dela - geralmente não enxergamos com bons
olhos, apesar de conhecermos bem pouco. Saiba dos planos que estão
sendo feitos para o desenvolvimento da cidade e ore pela sua cidade,
não apenas aquele tipo de oração imprecatória e pouco relevante, mas
uma oração que acompanhada de ações suas e de outros mobilizem e
produzam transformação.
Em segundo lugar leve para a sua comunidade o resultado de
suas pesquisas e investigações. Todos os desdobramentos do que se
está fazendo com a administração do bem público interfere na vida
de todos. Assim poderá gerar movimentos de oração específicos para
ações objetivas através da sua ‘ekklesia’ na cidade.
Em terceiro lugar, sugiro que você e outros que se interessarem
por esta questão política na sua comunidade participem dos
conselhos municipais e reuniões de associações (de bairro, de redes
de afinidades etc). Leia e informe-se sobre as leis e suas aplicações.
Saiba o que está em projeto para se tornar lei no legislativo e executivo.
Interesse-se pelo movimento de transparência financeira da sua
cidade e corra atrás das prestações de conta do município e de seus
líderes no executivo, legislativo e judiciário. Envolva-se com a política
na sua cidade - não com a politicagem. Esforce-se por conhecer
e fazer conhecido os candidatos que se pautam pela justiça, ética e
cidadania - cobre destes um projeto coerente sugira pontos que acha
importante para que ele apresente em suas idéias políticas e mais tarde
cobre dele, caso seja eleito, ser fiel ao que disse. Eleja bem os seus
governantes, saiba deles, o que pensam, como vivem, o que propõem,
como resolvem suas questões pessoais, como tratam com o dinheiro,
com o casamento, com os filhos, com os bens, cobre deles no mandato,
conversando, escrevendo, perguntando e se possível debatendo idéias
e por fim, envolvam-se em projetos sociais que procurem o bem da
comunidade assim você participará do poder político que governa sua
cidade e será um agente de transformação para ela.
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de uma vida repressora da religiosidade. A imoralidade grassa em
meio à comunidade, família e vida, causando erosão nos valores e
princípios antes marcadamente estabelecidos. O crescimento da (ou
descobrimento de...) escravidão em vários cantos e recantos no país
nos leva a pensar nas prisões onde homens e mulheres, culpados
e inocentes, convivem na maior escola de criminalidade que o ser
humano criou – as cadeias. As artes, o entretenimento, a literatura
estão tremendamente contaminados com obscenidade, destruição de
valores antes estabelecidos e marcas (e marcos!) hoje mal definidos.
Na saúde, o ser humano inserido na sociedade moderna, luta contra
grandes epidemias como AIDS e outras, mas também contra a injustiça
do próprio sistema que beneficia, exclui e danosamente leva para uma
sobrevida aqueles que não possuem.
Em 1974, em Lausanne, Suiça, líderes do mundo inteiro
reuniram-se para discutir teológica e missiologicamente a maneira
de pensar sobre o Evangelho e este Pacto de Lausanne (como ficou
conhecido) declara em sua afirmação sobre Evangelização e cultura:
O desenvolvimento de estratégias para a evangelização
mundial requer metodologia nova e criativa. Com a bênção de
Deus, o resultado será o surgimento de igrejas profundamente
enraizadas em Cristo e estreitamente relacionadas com a
cultura local. A cultura deve sempre ser julgada e provada pelas
Escrituras. Porque o homem é criatura de Deus, parte de sua
cultura é rica em beleza e em bondade; porque ele experimentou
a queda, toda a sua cultura está manchada pelo pecado, e parte
dela é demoníaca. O evangelho não pressupõe a superioridade
de uma cultura sobre a outra, mas avalia todas elas segundo o
seu próprio critério de verdade e justiça, e insiste na aceitação
de valores morais absolutos, em todas as culturas. As missões
muitas vezes têm exportado, juntamente com o evangelho, uma
cultura estranha, e as igrejas, por vezes, têm ficado submissas aos
ditames de uma determinada cultura, em vez de às Escrituras.
Os evangelistas de Cristo têm de, humildemente, procurar
esvaziar-se de tudo, exceto de sua autenticidade pessoal, a fim
de se tornarem servos dos outros, e as igrejas têm de procurar
transformar e enriquecer a cultura; tudo para a glória de Deus.
A cidade e a religiosidade
O senso comum da vida religiosa tem sido modificado alterando
o centro dela – a divindade não está mais no centro, no lugar da
adoração, mas a necessidade pessoal, individual assume o controle.
Os fiéis se transformam em meros clientes, ora satisfeitos, ora não,
e assim modificam o status da religião e a coloca como produto a
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ser consumido – daí, a idolatria toma lugar, onde sou eu o centro da
religião e não aquele ser que eu deveria adorar. Qualquer coisa que
retire Deus do centro da vida é idolatria. A fé simplesmente como fim
em si mesma – a fé na fé – apegue-se a sua fé, diriam alguns. Parece
que estamos criando um cristianismo onde Cristo não é mais o centro,
mas o ser humano e suas necessidades.
A cidade e a economia
Dinheiro e materialismo, exploração, trabalho injusto, ganância,
usura, trabalho infantil, consumismo excessivo, massificação da
pobreza e tantos outros fatores são drasticamente o retrato da sociedade
atual, onde um abismo se abre entre as classes sociais.
O dinheiro gira a produção e a produção move o mundo como
o conhecemos e este mover é um trator que nivela e estraçalha a vida,
transformando uma paisagem ondulada, cheia de entradas e saídas
numa grande avenida asfaltada, sem vida, sem esperança.
A cidade e a mídia
A mídia não é um “demônio”, mas é constantemente demonizada
e tem o intuito de moldar o pensamento para gerar um estimulo que
leve ao consumo, a libertinagem, a necessidades que nem sonhávamos
em ter e soluções para estas que foram criadas.
Ela, a mídia, tem um papel importante na formação do povo
brasileiro, que facilmente aprende com histórias, com narrativas.
A condução das tramas é um legado da audiência, onde se põe e se
dispõe de maneira direcionada, pela oscilação de público. A condução
das ideologias se torna uma ferramenta de controle vital e aumento e
disseminação de uma sensualidade exageradamente aberta, além de
que tudo parece favorecer o rico, o poderoso.
A cidade e a educação
É unilateral o ensino, numa filosofia educacional secularizada
que traduz um racionalismo científico que busca um sucesso
individualista favorecendo o secularismo, a decepção e o desprezo
A cidade e a sexualidade
Existe uma banalização da sexualidade por um lado, para tomar
como exemplo, onde o sexo se transforma em mero objeto de prazer
e por outro lado num obscuro método de procriação sem prazer.
Não conseguimos evitar os danosos lados contrários: ou temos a
abertura para a sexualidade completamente irreverente, onde o prazer
é substituído pelo hedonismo (“eu me amo, sou muito importante,
portanto o meu prazer é o único objeto da minha existência”) ou
olhamos para a sexualidade como uma aberração causada pelo efeito
do pecado no ser humano – achamos que Deus nos criou sexuados,
mas com condições de que esse sexo fosse apenas para a perpetuação
do ser humano na terra – daí, tudo que tem a ver com o prazer sexual
precisa (!) estar ligado ao pecado. Por isso, muitos se sentem sujos
e insatisfeitos quando do relacionamento sexual (mesmo dentro do
casamento!).
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É necessário e urgente fazer-se em nosso meio uma diferenciação
entre perversão sexual e ato sexual. Deus criou o ato e o pecado gerou a
perversão. Deus criou, inclusive colocando dentro do arcabouço de sua
visão da perfeição e bondade que havia criado – “crescei e multiplicai”
(de Gn 1.28) está antes da palavra de Deus que engloba tudo isso – “E
viu Deus que tudo era bom” (Gn 1.31). Deus viu tudo o que criara como
sendo bom e agradável, perfeito, inclusive a união sexual.
Apesar de Freud (Sigmund Freud, fundador da psicanálise) não
concordar que sexo era uma coisa boa, mas quase uma aberração, ele
trouxe um grande avanço ao demonstrar
que ele fazia parte de nossas necessidades
fisiológicas – assim como a sede, a fome e
o próprio sono. Portanto, ao comer e beber
não estamos apenas nos alimentando,
mas também nos proporcionando prazer
ao sorver um líquido delicioso como um
café com creme, num dia de chuva ou
então participarmos de uma comunhão
gostosa com muito churrasco com carne
de qualidade. Dá prazer, beber e comer
e é esperado isso, porém, do ato sexual,
muitas vezes olhamos com desprezo pois
parece ser coisa que o diabo inventou para o pecado do ser humano.
O prazer em dormir bem, acordar bem humorado é algo que não deve
ser tolhido de nossa vida, assim como o prazer sexual.
Deus quer uma humanidade exposta ao padrão da sua graça –
com liberdade, onde o corpo e a alma sejam unidos em expressão para
o louvor da sua glória; onde você e eu possamos acordar sabendo que
esse sono delicioso, restaurador de minhas forças glorifica a Deus e
faz bem a minha alma que é fruto da graça de Deus para com minha
vida; onde saibamos que ao digerir um alimento que nosso paladar
deseja e aprendeu a gostar estamos trazendo sobre nossa vida também
uma espiritualidade concernente a graça de Deus sobre nossas vidas;
onde possamos enxergar o conhecimento sexual não apenas como ato
sexual mas como um conhecimento profundo, abrangente e que na
liberdade que a graça traz sobre nós glorifique o nome de Deus.
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Anotações
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Introdução
Objetivos
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sugere o interdito. Ganhou sentido de evitamento, proibição
por razões de crença, temor ou superstição. Os tabus servem
como instrumentos de preservação do sagrado e identificação
do profano.
Levítico capítulo 11 nos apresenta uma listagem de
animais puros e impuros. Douglas expõe que o ‘incomum’
determina o impuro e explica que tudo aquilo que contraria
a ordem natural dos elementos é oposto ao sagrado e deve ser
evitado. Ele categoriza os animais a partir das espécies criadas
no gênese: seres das águas, seres da terra e seres do ar. Todos
os que não estejam perfeitamente equipados para o ambiente
onde subsistem é categorizado impuro. Diz que “assim tudo o
que se encontra na água e que não tem escamas nem barbatanas
é impuro, como a enguia e o crustáceo... As criaturas de quatro
patas que voam são impuras como os insetos... e a fim de não
ser exceção à regra ou insulto à ordem, portanto para ser puro,
o porco de casco fendido deveria ter sido um ruminante e a
serpente que rasteja deveria andar sobre as patas”.
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universo tem lugares sagrados e profanos”. Para o homem religioso
há o tempo profano, contaminado, e o tempo sagrado que remonta
ao tempo mítico. Mauss divagou sobre esta questão concluindo que o
sagrado é mais que um fato, ou idéia social, mas sim uma necessidade
empírica encontrada em todos os segmentos humanos. Baseou-se na
empírica necessidade de aproximação com o ‘mana’ para que a vida
ganhe maior significado. Entretanto, em uma perspectiva elementar
creio que poderíamos supor que o sagrado, em sua extensão de
relações, não é causador mas sim causado. E neste caso causado por
uma necessidade de crer, de minimizar o mal, de procurar salvação.
Encontramos, assim, de forma incontestável, em uma variedade
extensa de culturas estes elementos necessários de aproximação. O
principal destes elementos é o impuro.
O que sugiro, assim, é que o conhecimento do mal em suas
diversas formas (erro, quebra, morte, dor...) é o elemento que desperta
e formula o sagrado nas diversas culturas. Na tentativa de provar
este pensamento sugiro imaginarmos uma criança recém-nascida,
desprovida de influencia social e religiosa. Privada de convívio social
é posta a se manter em exílio de presença humana que com ela se
comunique até atingir os 12 anos de idade. Esta mesma criança, sem
o desenvolvimento da fala, da sociabilidade estruturada ou mesmo da
compreensão do ‘pecado’ social não está isenta de sentir o impuro que
lhe chega através de elementos psíquicos como medo, inquietação,
inconformação e culpa. Mesmo excluída e só não há dúvida que estes
elementos, representação do impuro, poderiam ser suficientes para a
incipiente produção de sentimentos que levem a criança-adolescente a
desenvolver meios rudimentares de procura do sagrado e evitamento
do impuro. Se esta comprovação é plausível haveríamos de crer que o
‘mal’ produtor das impurezas não se encontra, a priori, na sociedade e
suas inter-relações mas sim no próprio homem, mesmo que desprovido
de fala e sociabilidade. O conjunto destas impurezas, geradas na
esfera psíquica, produz na coletividade social as mazelas comunitárias
conhecidas e analisadas antropologicamente. A partir desta conclusão
podemos perceber que o ‘mal’, empírica e não teologicamente, é o
causador que desperta a atenção do homem para a necessidade de
minimização do mesmo, gerando assim o sagrado e suas atribuições.
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proteção. A abordagem Angelos propõe que, nesta busca humana pelo
puro e pelo verdadeiro, em um ambiente contaminado pelo mal, a
Bíblia nos expõe o caminho.
Laburth-Tolra e Warnier citam, como graus das atitudes religiosas
um primeiro nível, o elementar onde a prática religiosa é puramente
sociológica, pois os hábitos rituais são sustentados pela pressão social,
pela interdição de se singularizar, pela vontade de fazer ‘como todo
mundo’ e ‘como os ancestrais sempre fizeram’. Citam o nível mágico
elevando-se a uma ordem do mundo sobre a qual o homem pode agir
com condição de se submeter a ela.
O estudo das manifestações humanas
Acreditamos que socialmente necessitamos de estruturas e essas
estruturas, templo, instituição, normas, não devem ser vistas como
tendo objetivas em si mesmas, mas precisam ser interpretadas a partir
das respostas as perguntas. Vejamos algumas delas:
1. O que é igreja?
2. Qual o propósito de Deus em nos fazer igreja?
3. Como Jesus lidou com a igreja?
4. Como as estruturas surgiram?
5. Como a graça trata com a normatização da fé?
6. Porque normas são necessárias?
7. Quando aplicar estas normas?
São muitas perguntas que podemos fazer. Entendemos que precisamos
da ‘organização’ das coisas, Deus não é um Deus de desordem, mas de
ordem, a própria criação do universo segue este princípio básico. Tudo
tem o seu lugar, ordenado, colocado e tem uma serventia muito própria,
mas na própria criação, Deus não dá ordem para que apareçam estruturas
sem que suas bases sejam fundadas anteriormente: primeiro ele ordenou
a luz no meio do caos - depois criou o sol, lua e estrelas. Não colocou o
carro na frente dos bois, mas fez o caminho da necessidade primeiro. Ele
não ordenou que os animais existissem antes de ter criado a base para a
sobrevivência deles; ele não criou o ser humano, no primeiro dia, pois não
Dualismo e pragmatismo
A vida evangélica contemporânea no Brasil, porém, é
tremendamente dualista e profundamente pragmática.
Dualista porque não consegue ver que o sagrado precisa invadir
a vida comum (profano) para exercer o seu poder de transformar
em puras coisas impuras e que esta separação de mundo da vida da
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igreja é contrária ao próprio discurso de Jesus em João 17, na sua
oração sacerdotal, onde ele pede ao Pai que não nos tire do mundo,
mas que nos santifique em meio a ele – ou seja, faça de nós, templos
andantes que somos, objetos que santifiquem o profano e ajudem na
transformação de coisas impuras em puras.
Pragmática porque instaurado este conceitual dualista é necessário
pensar que somente pessoas certas, fazendo aquilo que é correto darão o
resultado esperado por Deus e, portanto será o que Deus espera.
Um grande exemplo disso é visto na megalomaníaca ideia de
crescimento de igreja que temos em nosso contexto brasileiro (influenciado
de perto pelo contexto da América do Norte). Quando dois ou três pastores
se reúnem pra conversar alguma coisa invariavelmente a pergunta: “Quantos
membros tem a sua igreja?” vai estar presente. Acabamos por crer que as
metodologias, os modelos, as estratégias são em si mesmas eficientes para
dar vazão ao nosso apetite voraz por mais pessoas em nossos templos. Nada
mais pragmático do que: seja a pessoa certa, faça a coisa certa, faça no lugar
certo que dará tudo certo.
Há uma certa metodologia diretiva na maneira de agir do
evangélico brasileiro, que muito se assemelha (guardadas as devidas
proporções) da maneira do cristão da América do Norte em agir nas
suas relações, sejam com discipulado, com evangelização ou mesmo
com o aconselhamento cristão.
Geralmente existe a figura de um orientador. Alguém que sabe o
que faz e portanto é “superior” ao que está sendo alvo de sua ação. Ele, o
orientador é que dirige os passos a seguir, seja numa orientação bíblica ou
na evangelização ou mesmo no aconselhamento. Ele selecione os assuntos,
os tópicos a serem tratados. Ele também define os problemas e inclusive
responde às perguntas, mesmo que elas não tenham sido feitas pelo outro.
A partir disso, esse que está na figura de “superior” sugere um plano de ação,
metodologicamente pensado e sempre tem como base algo já escrito ou
mesmo prescrito por outros que fizeram o mesmo.
É uma tentativa de conformação da vontade, não da vontade de Deus
muitas vezes, mas da visão do «superior» qual seja a vontade de Deus.
Esse pragmatismo nós herdamos, de certa forma, da cultura
norte americana e gostamos destes modelos prontos, enlatados e que
simplesmente precisam ser replicados para que o resultado seja colhido
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Mapeamento religioso
Para entender a cultura religiosa de um povo, de um grupo, de
uma cidade é necessário passar pelo menos por quatro grandes blocos
e responder as perguntas referentes à esse bloco:
A dimensão histórica do povo (grupo ou indivíduo)
Quem somos nós?
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sociedade alvo, antes de começarmos a expor as respostas bíblicas.
Tradicionalmente o trabalho missionário envolve trazer o evangelho
como um pacote fechado que deve ser entendido em seu contexto
original. Entretanto, sem conhecer as questões que atormentam e
desafiam a cultura alvo, receptora, torna-se impossível abordar as áreas
de tensão na cosmovisão animista especialmente quando tratamos de
uma sociedade onde a base do princípio da vida está na possibilidade
de resolver problemas diários.
O resultado de uma apresentação do evangelho sem pré-análise
cultural tem sido ao longo da história o sincretismo religioso ou a
simples falta de entendimento do evangelho, resultando em afirmações
como a de Uikiid e H. Stuart acima.
No sincretismo religioso, o animismo e cristianismo dividem o
mesmo universo. Bem sabemos que o sincretismo religioso é o declínio
da influência cristã revelacional onde a possibilidade de apresentação
de um evangelho bíblico torna-se uma tarefa dantesca por pelo
menos duas ou três gerações. Na falta de entendimento do sentido do
evangelho, por outro lado, cria-se uma igreja imatura que dificilmente
experimentará um crescimento normal não sendo capaz de transmitir
o evangelho de forma que faça sentido ao restante do grupo. Um dos
grandes desafios que temos perante nós hoje é aprender com o nosso
passado e pregar um evangelho que faça sentido na sociedade.
Creio que, na tentativa de avaliar o impacto do evangelho em um
grupo que vive em contexto animista, há três principais questões que
deveríamos tentar responder:
• Eles percebem o evangelho como sendo uma mensagem
relevante em seu próprio universo? Para mim esta é uma
pergunta chave e está enraizada não meramente no conteúdo
da mensagem apresentada mas em sua compreensão.
• Eles entendem os princípios cristãos em relação a cosmovisão
do grupo? Aqui é ressaltado o conceito da interpretação e
compreensão, ou seja, em como determinada mensagem é
recebida e interpretada no grupo que a ouve.
• Eles aplicam os valores do evangelho como respostas para os
55
aplicação e constante reavaliação da cultura observada e da mensagem
que está sendo comunicada. O objetivo desta constante vigilância é
propor um evangelho que possa ser traduzido culturalmente fazendo
sentido também para a rotina da vida, da casa, roça, rua e trilha. É
necessário fazer o povo perceber que Deus fala a sua língua.
Fazendo isto esperamos apresentar Cristo como resposta para
as questões da vida no universo animista. Um Cristo que seja solução,
também, para seu mundo.
57
tradicionais, existencial para grupos existenciais, e assim por diante,
obterá uma boa possibilidade de que o fato comunicado ultrapasse a
fronteira da informação e possa ser interpretado, e também aplicado.
Isto porque estaremos transmitindo uma informação com códigos
próximos daqueles que a receberão, gerando maior possibilidade de
haver boa interpretação e consequente associação.
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Anotações
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Diagnóstico da Igreja
Como a igreja deve testemunhar de Cristo? A igreja não é
chamada como um fim em si mesma. Se ela não é um fim em si mesma,
então deve funcionar de acordo com o propósito para o qual Deus a
chamou para ser. A Igreja, ainda que seja uma realidade presente, é
também uma comunidade escatológica, uma comunidade que será.
Como o bispo Leslie Newbiggin coloca, “... [a igreja é] uma
comunidade in via, a caminho dos confins da terra e do fim dos
tempos”. E a igreja, apesar de presente, é também futura. Jesus disse:
“edificarei a minha igreja...” (Mt 16.18). Como a nova comunidade de
Deus, ela deve organizar a sua vida de acordo com a visão daquilo
que ainda há de vir. À medida que ela possa demonstrar esta nova
realidade dentro da comunidade, a igreja será bem sucedida na tarefa
de ser despenseira das bênçãos para a sociedade. Como a igreja não
tem vida alguma fora de Cristo, o cabeça da Igreja, ela não tem outro
propósito além do Seu propósito. Ele veio para edificar a Sua igreja
(Mt 16.17) e Ele ordena à sua igreja que pregue o evangelho do Reino
(Lc 4.43) e discipule as nações (Mt 28.18).
O retrato pintado por J. C. Hoekendijk’ da igreja como a “avant-
garde de Deus” apoia a ideia de uma igreja presente ainda que futura.
Ela é um corpo que se move inexoravelmente em direção à sua própria
plenitude avançando em estágios. A transformação de comunidades,
no sentido de que elas reflitam os valores do Reino, é a comissão
primária da igreja. Sua vida deve ser moldada pela visão do seu
Cabeça de “fazer discípulos de todas as nações” (Mt 28.19). Os anjos
celestiais reiteram este fato de outra maneira ao dizer “o reino deste
mundo se tornou de nosso Senhor” (Ap 11.15). O formato e a textura
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da era futura vêm até a realidade concreta. Karl Barth referia-se a este
aspecto da igreja como “a demonstração provisória de Deus da sua
intenção para toda a humanidade”.
Quero enfatizar as 4 marcas ou funções principais da igreja no
mundo: koinonia, kerigma, diakonia e marturia.
1. Comunidade – Koinonia
No Novo Testamento, a palavra grega para comunidade é
koinonia, uma comunidade de homens e mulheres que creem em
Jesus Cristo como Salvador e Senhor de suas vidas. Na união com Ele,
concretizada pelo arrependimento e fé, os pecadores salvos pela graça
de Deus são indissoluvelmente incorporados nesta comunidade ou
corpo. De uma maneira bem simples, a igreja como o corpo de Cristo
tem crentes em Cristo como seus membros. Isto é autenticado pela
presença do Espírito Santo nos membros e na comunidade.
Esta comunidade é a nova humanidade, porque em união com o
Cristo ressurreto, ela compartilha de Sua vida. O seu futuro está unido
ao Dele simplesmente porque a igreja é o Seu corpo, do qual Ele é o
cabeça (Ef 1.22). Este corpo é único já que Cristo “destruiu a barreira, o
muro de inimizade” (Ef 2.14) – não há mais judeus ou gentios, homens
ou mulheres, escravos ou libertos. Todos em Cristo se tornaram um
com Ele e com os outros. Os membros da igreja são espiritualmente
um (Ef 4.1-6).
Esta ideia de comunidade é fundamental para a nossa compreensão
da igreja. Jesus nos ordena que amemos uns aos outros como Ele nos
amou. Reconciliados com Deus e uns com os outros em Cristo, a igreja
recebe o ministério da reconciliação (2Co 5). Este ministério, para que
seja efetivo, requer uma demonstração prévia de realidade – a unidade
da igreja – antes que possa sequer falar de reconciliação ou participar
de qualquer mediação significativa em conflitos.
O fracasso de muitas igrejas de alcançar igualdade entre seus
membros, a integração racial e entre as classes sociais silencia a
mensagem de paz social em comunidades culturalmente pluralistas.
Cada vez mais, as igrejas falam da boca para fora de sua universalidade,
mas se mostram como grupos etnocêntricos na realidade. Ajith
Fernando, um respeitado líder e estudioso asiático, em sua exposição
63
2. Proclamação – Kerigma
A palavra grega usada para a ideia de proclamação no Novo
Testamento é kerygma ou simplesmente “mensagem”. “Pregue a
palavra; esteja preparado a tempo e fora de tempo” (2Tm 4.2).
A proclamação autêntica do evangelho é outra marca
indispensável de uma igreja verdadeira. A igreja tem uma história a
contar. Na linguagem comum dos cristãos, a mensagem é que Deus
já derrotou “as potestades e principados” em Jesus e possibilitou que
homens e mulheres fossem “herdeiros” do Criador do mundo criado.
Deus, em Cristo, declarou o jubileu (Lc 4.16-21). Agora há
descanso, restauração e redenção pela fé em Jesus, nosso Salvador.
Em termos sócio-políticos, a igreja está tentando dizer que em meio
a esta confusão de revoluções, a revolução final e verdadeira está a
caminho e a batalha decisiva teve lugar no Calvário e no sepulcro. Esta
proclamação ou pregação do Evangelho é indispensável. Ela nega o
universalismo, o humanismo ou qualquer outra maneira de se lidar
com a condição humana do pecado. A proclamação tem basicamente
duas direções. Primeira, o evangelho deve ser proclamado na igreja.
Somos informados de que a igreja é feita de joio e trigo (Mt 13.25, 30,
36). A separação, contudo, terá lugar no dia do julgamento.
O Senhor ainda avisa à sua igreja que existem ovelhas e bodes no
rebanho (Mt 25.32). De fato, na igreja existem os “igrejeiros” e existem
os cristãos. O evangelismo na igreja é um ministério necessário.
Existe, assim, uma necessidade de reavivar a igreja, acordá-la
do seu sono e capacitá-la para a ação. Ao mesmo tempo, também
precisamos nos lembrar de que a participação no discipulado não é o
mesmo que a própria salvação. O joio e o trigo crescerão juntos.
A lição das cinco virgens néscias nos lembra que precisamos
estar vigilantes a todo o tempo para encontrar o noivo. Segunda, o
evangelho deve ser proclamado fora da igreja. Como Jesus disse, “este
evangelho do Reino será pregado em todo o mundo” (Mt 24.14).
Por esta razão, Cristo derramou o Espírito sobre o Seu povo. “Mas
receberão poder quando o Espírito Santo descer sobre vocês, e serão
minhas testemunhas... até os confins da terra” (At 1.8). O conteúdo da
proclamação cristã é Jesus Cristo.
A dimensão kerygmática do Novo Testamento se focaliza em
65
de que ela é posse dele apenas, e que ela vive e espera viver apenas
a partir do seu conforto e da sua direção na expectativa da sua
aparição...” O sentido da pregação cristã primitiva pode ser resumido
como “a proclamação da morte, ressurreição e exaltação de Jesus, que
leva à apreciação de Sua pessoa como Senhor e Cristo, confrontando
as pessoas com a necessidade de perdão e a promessa de perdão dos
pecados”. Esta mensagem sustenta que a vida, morte e ressurreição
de Jesus Cristo tornam possível uma nova forma de existência que é
manifestada em Jesus Cristo e evocada através de uma regeneração
realizada por Deus nos crentes enquanto são conformados com Cristo.
A pregação do Evangelho exige uma resposta de fé. Esta resposta de fé
deve ser alimentada dentro da comunidade da igreja através da qual o
crente encontra uma família, cresce em conhecimento da Sua palavra,
desenvolve os seus dons e serve a Deus no mundo. Não se pode apenas
pregar e deixar ao Espírito Santo os resultados. A obra de alcançar o
mundo com o Evangelho não é apenas de plantar, mas de regar, colher,
cuidar e liberar para o serviço ou as missões nos campos de colheita.
3. Serviço – Diakonia
Ministério de compaixão entre crentes. A palavra grega diakonia
é simplesmente traduzida por “serviço”. A ideia básica é a do serviço
à mesa, mas ela acabou sendo usada de maneira geral para serviço,
comumente para tarefas domésticas. Lucas, por exemplo, registra um
arranjo primário da jovem igreja em Jerusalém pelo qual os líderes
servem comida às viúvas e aos necessitados em comunhão (At 6.1).
No entanto, o sentido de serviço não pode se limitar a isto sem
se tornar barato demais. A igreja primitiva era uma comunidade
do jubileu. Eles compartilhavam as suas posses uns com os outros
de forma que ninguém estivesse passando por necessidade (At 4).
Quando a fome atacou a Palestina, a igreja em Antioquia contribuiu
para as necessidades da irmandade (At 11).
A relevância da diakonia para o ministério do crente é vista
em sua “qualidade especial de indicar muito pessoalmente o serviço
prestado a outro”. A palavra “diaconia” expressa melhor o conceito
de serviço em amor que qualquer outra palavra grega relacionada. A
Grande Comissão deve ser acompanhada pela Grande Compaixão em
atos como alimentar o faminto, cuidar do estrangeiro e do refugiado,
67
ação social quando se contempla esta parábola. O serviço cristão deve
penetrar em cada camada da sociedade. Como o vento, o Evangelho
deve invadir toda a criação. Se a vida física é uma pressuposição
necessária para a proclamação do Evangelho, então a igreja deve
trabalhar com toda a humanidade e com estruturas que preservem a
vida e a dignidade humanas.
A preocupação evangélica não deve ser apenas com a proclamação
da graça salvadora de Deus, mas também com a promoção da graça
comum de Deus no mundo, pois a graça comum se destina tanto a
cristãos quanto a não-cristãos. Jesus disse que Deus “faz raiar o seu sol
sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos” (Mt 5.45).
Governo, escolas, comércio e mercados públicos são áreas legítimas para
o envolvimento cristão transformacional. Há uma razão pragmática
para isso, como Edmund Burke expressa claramente: para que o mal
triunfe, tudo o que é necessário é que boas pessoas não façam nada.
Deus está não apenas na Igreja, mas ele preenche toda a criação.
Escrevendo aos cristãos colossenses, Paulo disse que o mundo foi
criado por Cristo, para Cristo, foi reconciliado em Cristo e para Cristo
(Cl 1.16-20). Estas três responsabilidades – koinonia, a demonstração
do caráter da nova sociedade; kerygma, a proclamação do evangelho
que chama ao arrependimento de pecados e à fé em Cristo, e; diakonia,
reconciliação, cura e outras formas de serviço – são necessárias no
compartilhar das bênçãos do Reino à comunidade.
4. Testemunho – marturia
Além da proclamação do Evangelho está a necessidade de que os
crentes se tornem maduros. Paulo fala da meta que o crente deve ter de
ser maduro (Ef 4.13). E ele ainda exorta veementemente: “tornem-se
meus imitadores, como eu o sou de Cristo” (1Co 11.1). Suas palavras
parecem sugerir que ser um cristão é “entrar em um relacionamento
tão íntimo e profundo com Cristo que os crentes, de certa forma,
começarão a imitá-lo em consequência deste relacionamento. Imitação
é, desta maneira, o fruto, e não uma condição prévia, da fé.
Tornar-se um cristão é começar o processo, não de conformar-se,
mas de ser conformado a Cristo. Não é tanto que nós sejamos ativos,
mas Deus é ativo neste processo”.
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A Grande Comissão é uma veia contínua que corre desde o Antigo
Testamento até o Novo Testamento. Tão cedo como no Gênesis,
vemos Adão e Eva levados para fora do jardim (Gn 3). Outra palavra
para levados é dispersos, que é a mesma palavra usada para descrever
o povo se dispersando depois de terem tentado construir Babel. É
também a mesma palavra usada quando os cristãos primitivos foram
dispersos como um resultado da perseguição que resultou no espalhar
do Evangelho por toda a Ásia Menor.
E Deus continua a “dispersar” o Seu povo de todos os lugares
para todos os lugares de forma que o Evangelho do reino seja pregado a
todo o mundo (Mt 24.14). A missão do Rei é estabelecer o Seu reinado
e domínio em todo o mundo e criação. Ele pretende reconciliar todas
as coisas em Si mesmo (Cl 1). E somos os “filhos da luz” que a criação
aguarda como parceiros de Deus em sua missão divina. Em união com
Cristo, Sua missão é a nossa missão.
A igreja deve ser capaz de declarar com o apóstolo Paulo: “eu lhes
declaro hoje que estou inocente do sangue de todos. Pois não deixei de
proclamar-lhes toda a vontade de Deus” (At 20.26-27). É necessário
equipar-se, de forma que haja a assimilação de um evangelho integral
pelo indivíduo crente, por cada família, por cada igreja. A visão de toda
comunidade da fé deveria ser o trabalho, ao lado de Deus, de colocar
toda a comunidade e todo o país sob o Seu domínio ou cuidado, de
maneira que houvesse suficiência econômica para todos, paz social,
que os governantes governassem em justiça, que houvesse retidão e
respeito pelo que pertence aos outros e que o Evangelho fosse pregado
e uma igreja fosse plantada em cada cidade ou grupo de pessoas.
71
alcançar um objetivo. Compreende uma serie de técnicas) científico
quer demonstrar pelo experimental a realidade que se propõe sendo
eminentemente indutivo, partindo de observação de casos até chegar a
uma lei universal, também valida para casos não observados. O método
cientifico é um método analítico, pois parte de casos particulares para
chegar à síntese, à sistematização.
A ciência utilizada para esta leitura que se dará daqui é a Antropologia.
Não uma antropologia geral, mas um ramo dela, a antropologia cultural
que se propõe a estudar a obra humana que se denomina cultura, incluindo
ai conhecimentos, crenças, artes, moral, leis, costumes e quaisquer outras
capacidades geradas ou adquiridas pelo ser humano enquanto vive em
sociedade.
Especificamente no caso do estudo presente, usaremos a antropologia
missionária, pois em conjunto com a missiologia e teologia são as ferramentas
para uma análise mais acurada, investigativa e conclusiva para o estudo do
reino de Deus e sua expansão.
Segundo Luiz Gonzaga de Mello, Lévi-Strauss indica que a
antropologia tem suas divisões e, portanto antropologia social e cultural são
apenas dois nomes dados para a mesma disciplina. (Mello, 1982, pg 25)
Ainda sobre a antropologia, Durkhein diz que os “fenômenos
religiosos colocam-se naturalmente em duas categorias fundamentais:
as crenças e os ritos. As primeiras são estados de opinião e consistem de
representações; as segundas constituem tipos determinados de ação. Entre
estas duas ordens de fato esta toda a diferença que separa o pensamento do
movimento”. (Durkhein, 1971, pg 72)
A estrutura seguida neste trabalho será determinada por esta
premissa – de um lado olhando para as crenças (as maneiras expressas
da fé da e na Igreja) e por outro olhando a prática desta mesma crença na
forma ritualística – estabelecendo desta forma um olhar crítico para
a ortodoxia (o conjunto da fé ou crença) e a ortopraxia (a prática
referente ao que se crê), vendo assim acertos (comparativamente) e
desacertos entre o que se crê e o que se vive no meio da igreja.
1. ANÁLISE DO MOVIMENTO ECLESIÁTICO BRASILEIRO
Esta não é uma analise profunda e ampla, mas uma visão
limitada a espectros da igreja evangélica brasileira, como bem trata da
73
mundo, porém não há uma associação muito convincente entre a ação
da igreja e sua teologia.
Sabendo disso, pode-se afirmar que nenhum despertamento
missionário irá acontecer enquanto não houver disposição para se
viver segundo o que se crê, pois os que serão evangelizados pela igreja
precisam ver nas suas práticas a sua prédica. É preciso voltar a ser uma
igreja visionária, que traduza a sua teologia perante a gritante angústia
do mundo sem Deus. Que tenha os valores do Reino, que entenda de
uma vez por todas que “uma alma vale mais que o mundo inteiro”, que
abdique de seus portentosos edifícios de concreto e invista naquele que
é alicerçado na Rocha o qual nunca cairá, que ofereça sua vida, seus
olhos, suas forças para que ao fim, com lágrimas nos olhos e alegria
nos corações contemplem, ajoelhados, lado a lado, homens de todas as
extremidades da terra louvando ao Cordeiro Jesus, formando com os
santos de todas as gerações a grande multidão dos salvos no último dia.
Uma igreja visionária é uma Igreja que põe a mão no arado e ara a
terra, porém parece que se quer ver a terra sendo arada sem que as mãos
sejam colocadas no arado, parece que a Igreja foi “retirada do mundo”
não apenas na terminologia da santidade, onde a contaminação com
o sistema pode fazê-la “conformar-se” com o presente século, mas sim
foi retirada num isolamento institucional e gerando desta forma um
individualismo exarcebado que leva os cristãos a se posicionaram longe
de qualquer envolvimento mais direto com tudo o que é necessário
para o cumprimento da missão da Igreja, que é segundo Russel Shedd
em uma palestra, “agir com Deus em co-missão, já que a Missão é de
Deus e a igreja é sua cooperadora”.
1.1 Caracterizando a época
Caracterizando mesmo que rapidamente o que entende-se
sobre a pós-modernidade pode-se afirmar que uma transformação
acontecendo, isso já se nota claramente na arquitetura, nas artes, na
filosofia, ou seja é um fenômeno cultural amplo. Grenz afirma que
“estamos passando por um deslocamento cultural” (Grenz, 1997,
p.16). Esse deslocamento molda todo o pensamento da vida do ser
humano, quer sejam nas artes, filosofia, cultura em geral e não seria
75
pequenos; crise porque não tinham influência para mudanças; crise
porque não sentiam-se preparados e outras infinitas crises pessoais
e comunitárias leva-nos a pensar no fracasso da vida comunitária.
Ronaldo Lidório analisando o livro de Atos diz que:
Lendo o livro de Atos com os nossos olhos humanos,
encharcados dos critérios simplistas que definem sucesso
e fracasso em nossa geração, veremos apenas um bando de
fanáticos vivendo uma ilusão e pagando por isto um preço alto
através do sofrimento, da tristeza e da melancolia. Veremos a
Igreja deixada só no capítulo 1; Pedro e João Presos no capítulo
4; Dois mentirosos no capítulo 5; Os apóstolos presos ainda
no capítulo 5; Estevão apedrejado no capítulo 7; Toda a Igreja
perseguida no capítulo 8; A Igreja dividida entre pró-gentios
e antigentios no capítulo 11; Paulo perseguido, açoitado,
aprisionado, banido e humilhado do capítulo 13 ao capítulo
27; A expectativa do assassinato do apóstolo entre os gentios
no capítulo 28. Se lermos este livro com olhos humanizados
veremos um povo que sofre e termina em martírio por causa da
fé que abriga. Mas precisamos olhar além dos acontecimentos
individuais; além do horizonte humano; além das cores que
pintam a matéria; precisamos olhar além da vida; precisamos
olhar com os olhos de Deus. (Lidório, 2000, p. 9)
Essa é basicamente a crise por qual a igreja evangélica brasileira
passa, apesar do pós-modernismo ainda não estar “completamente”
presente no país, sendo que enxerga-se o seu brilho aqui e ali, em
situações específicas, até porque não se pode falar sobre o pós-
modernismo como uma coisa concreta, porém, como Grenz afirmou
que é uma mudança cultural que vai além da modernidade.
O espírito da pós-modernidade porém, encontra-se presente
nos círculos de relacionamento, principalmente porque que a igreja
sempre está um pouco atrasada em relação às mudanças, quase sempre
correndo atrás do prejuízo e não antevendo crises, enxergando sua
época para saber o que deve fazer.
Robson Cavalcanti em um artigo publica na Ultimato diz
77
suas características fortemente marcadas por uma presença estrangeira,
um jeito estrangeiro de ser, que olha para o puritanismo americano ou o
pietismo europeu como sendo o suprassumo da espiritualidade e tudo o
que é culturalmente definido como brasileiro fica de fora dos cultos até
há bem pouco tempo atrás. A identidade da igreja evangélica brasileira
é estrangeira, precisa de visto para estar no Brasil!
1.2 Perfil da atuação da igreja no Brasil – posturas culturais
Pode-se perguntar: qual é o perfil de atuação da Igreja? Pensando
na questão da definição cultural a igreja tem tido, em diferentes
condições as seguintes posturas e que enumeradas poderiam servir
de base para um entendimento cultural a partir do pensamento
evangélico no Brasil.
Em primeiro lugar existe uma superioridade latente – encara-
se muito do evangelho como sendo um mantra mágico que venha
solucionar as mazelas do povo ante sua simples aceitação – transforma-
se deste modo a encarnação em um simples símbolo desprovido de
imitação.
Segundo, há um caráter acusatório na vida da igreja – tem-se
em muitos círculos certa empatia com as necessidades brasileiras –
nordeste, sofrimentos dos pobres marginalizados, menores infratores...
Mas o principal papel da igreja tem sido acusatório, onde o lema
poderia ser traduzido como: isso nunca aconteceria se não fossem
pecadores – substituindo a fala de Jesus que não veio para “sarados”,
mas para pecadores e doentes em um discurso pobre e interesseiro.
Em terceiro lugar quase sempre é alienante – muito desta
postura deve-se ao fato da superioridade, onde se cria uma redoma
de proteção de valores e assim o evangelho só faz sentido dentro das
quatro paredes da Igreja e nunca na sociedade, pois “ir pra fora dos
portões da igreja” ainda é considerado em muitos círculos como uma
quebra da santidade (encara-se santidade como o movimento de ser
separado do mundo e suas mazelas), porém o que dizer da oração
de Jesus quando ele argumenta que não pedia ao Pai que tirasse os
seus discípulos do mundo, mas os santificasse dentro dele? Esse ser
“alienígena” não se parece com um discípulo de Jesus, ou pelo menos
não se parece com a visão que Jesus tinha para os seus discípulos, antes
79
1.3 Causas que comprometem
Quais são as causas de todos estes erros? Passam logicamente
pela má utilização da Bíblia, interpretações comprometidas geram
uma exegese falida e partidária.
A igreja tem uma dificuldade em entender o mundo que a
cerca, onde ela está culturalmente inserida devidos principalmente a
dois fatores básicos: 1) a igreja tem uma péssima leitura da realidade
que a cerca, muitas vezes mascarando-se realidades para justificar
eclesiasticamente esta ou aquela atitude e 2) interpretação errada das
Escrituras e que por consequência geram erros teológicos para o dia-
a-dia (boca a boca) nos membros das igrejas criando as “superstições
hermenêuticas” como também erros de ensino nos púlpitos, onde a
preocupação em agradar, o dia-a-dia corrido perturba ao ponto de não
se fazer um exame mais profundo e minucioso (exegeticamente) do
texto pregado além de produzir por tabela erros em livros teológicos e
principalmente nos chamados devocionais.
Há pelo menos 3 grandes causas para tudo isso: 1) desvalorização
da erudição (acadêmica) por parte do povo evangélico, observando
com isso uma dissociação entre evangelho e cultura, o acadêmico e o
prático, a emoção e a razão, o experiencialismo e a objetividade; 2) há
uma grave fragilidade (talvez uma tremenda falta de profundidade)
nos cursos bíblico-teológicos das escolas, seminários e faculdades
teológicas principalmente na parte missiológica, que daria para
o líder uma visão da realidade profunda e duradoura e por último
3) a desvalorização por parte da igreja do ensino nos seminários e
faculdades teológicas, criando um bolsão de supervalorização do
místico em contraste com o erudito ou acadêmico.
Estes fatores agregados a estas causas têm consequências e elas
são em grande parte o que gera a deficiência da vida evangélica no país.
Apesar de a igreja ter uma quantidade enorme de pessoas por todo o
Brasil ainda se vê pouca (ou quase nenhuma!) influência nas tomadas
de decisão ou mesmo uma decisão firme da igreja em tornar a sua
voz profética ouvida e quando há não se espera que sua manifestação
surta algum efeito, pois a máxima é que o “mundo jaz no maligno” e,
portanto não se deve esperar mudanças.
81
2. CONFORMAÇÃO E SECULARIZAÇÃO
A análise, inda que pequena e pouco extensa, devido ao
comprometimento com este trabalho assim mesmo nos informa da
realidade vivida pela igreja evangélica brasileira em todos os cantos
da nação. A pergunta que deve ser respondida agora é: biblicamente,
pode-se ter também uma visão de que a realidade da igreja vivida,
apesar de muito ser necessário à sobrevivência nestes tempos “pós-
modernos” para com isso haver um confronto entre realidade e fé?
Entre santidade e insanidade?
2.1 Paulo roga pela não-conformação
Paulo em sua carta aos Romanos escreve aos crentes, logo no
primeiro século. Nos primeiros onze capítulos a grandeza da salvação
que é oferecida é finalizada com um lindíssimo hino de louvor à
grandeza de Deus (Romanos 11.33-36) e logo a seguir, no capítulo 12
ele abre a conversa com o tom de exortação, querendo logicamente
mostrar que tudo o que foi falado até aqui tem um propósito – ou
seja, a salvação oferecida tão abundantemente por Deus para eles não
deveria morrer sem antes frutificar para o que foi proposta por Deus
mesmo desde o princípio. Então ele diz:
“Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que
apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a
Deus, que é o vosso culto racional. E não vos conformeis com este
século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que
experimenteis qual seja boa, agradável e perfeita vontade de Deus.”
(Romanos 12.1-2)
Ao rogar Paulo está apelando para sua autoridade apostólica.
A expressão usada aqui para rogar (parakaleo) era usada no grego
clássico para exortação de tropas que estavam indo à batalha e quando
ele escreve o texto, quer que seus leitores o entendam de forma
concreta e forte, por isso, após apelar pelo peso da sua autoridade
apostólica junto aos crentes romanos ele expressa “pois”. Na língua
grega é uma referência ao argumento anterior – ou seja, os capítulos
anteriores, começando do primeiro capítulo indo até o 11.36; nesses,
Paulo apresenta a verdade de Deus e diante do conhecimento de tal
83
atitude do ser humano, mas um “viver normalmente”. Há um modelo
de conduta esperado e o modelo esta na próxima expressão que o
apóstolo utiliza: ... com este século – to aioni touto – o termo “mundo”,
“século” traz a ideia não de um mundo (região, ou povo, ou pessoas),
mas sim do caráter e conduta do ser humano. Esse é o modelo pelo
qual se espera que todo ser humano se molde. O modelo estabelecido
pelos costumes, pela tradição ou a falta dela, pela sociedade, imposta,
quebra de valores etc.
Esta exortação, portanto, é que não se deve deixar que o molde do
mundo estabeleça o critério do seu caráter ou conduta, ou seja, tomar a
forma, ou usar o molde do caráter esperado pelo mundo. Este caráter, por
melhor que seja, está morto. É um caráter do ser humano caído. Então
se deve despir de tudo que se refere a este caráter para se vestir daquilo
que pode moldar a vida do ser humano dentro da vontade de Deus.
Paulo então enfatiza: ... transformai-vos – metamorfoysthe – está como
presente imperativo passivo e indica “sede transformados”. Paulo não
deixa somente uma negativa (não façam), mas indica como fazer o certo:
As palavras de Cristo continuam valendo e dizem que todo homem, tanto
de mente como de coração está inteiramente alienado da justiça de Deus
e, portanto tem que nascer de novo. A mente (razão), que é o princípio
regulador da vida, precisa passar por uma transformação.
O verbo, estando no presente imperativo e na voz passiva indica que
esta ação de transformação precisa ocorrer na vida daquele que esta em
transformação a todo instante e que é feito por Deus e não por esforço
ou sofrimento pessoal. Note que no início Paulo enfatizou que é pelas
misericórdias de Deus. Misericórdia (oiktirmos) e compaixão que se
originam do estado miserável de alguém que está em necessidade. Aqui
pela análise da língua original compreende-se que a misericórdia divina é
o poder por meio do qual esta exortação deveria tomar posse da vontade
daqueles que apresentam seus corpos por sacrifício vivo.
Existem dois tipos de ação negativa ante a misericórdia de Deus:
gerar medo para produzir obediência (mantendo a salvação e santificação
por esforço), ou ser hipócrita ao ponto de pensar que misericórdia de
Deus é fonte para que eu viva minha vida da maneira como achar melhor.
Jamais entenderá verdadeiramente a vida com o Senhor a não ser
que o crente compreenda o quanto é necessitado de sua misericórdia.
85
Anotações
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87
A Rede trabalha com cada crente foi dado por Deus uma função
SINGULAR a ser desempenhada, então são colocas as pessoas certas,
nos lugares certos, pelas razões certas.
Quando se entende sobre os dons e vê a diversidade no meio da
igreja, não dá pra entender apenas que o ministério que desejo, que tenho
vontade é aquele que vou desempenhar, pois, os dons espirituais são
capacitações especiais distribuídas a cada crente pelo Espírito segundo
o desígnio e a graça de Deus, visando o bem comum do Corpo de
Cristo. Deus designou cada parte do corpo para ter um relacionamento
interdependente com as demais partes do corpo.
Os dons servem para edificação e o dom pastoral para o cuidado e
serve para o aperfeiçoamento dos santos. O dom de pastor é a capacitação
divina para nutrir, cuidar, guiar o povo à maturidade espiritual e a ser
como Cristo. Não há hierarquia ai, mas devemos entender que os dons
são diferentes uns dos outros e que cada dom sendo exercido serve para
a edificação da igreja.
O grande problema com a Rede Ministerial geralmente está com
pastores e líderes que são bastante centralizadores e então tem muito
medo de que isso seja realidade na igreja, pois iguala demais as pessoas.
89
alguns membros do Corpo de Cristo, que o capacita a assumir, a longo
prazo, a responsabilidade pelo bem espiritual de um grupo de cristãos.
VI – Igrejas Emergentes
No Brasil, o movimento de igrejas emergentes tomou corpo a
partir de 2006, com a fundação da Convenção Brasileira de Igrejas
Emergentes: Foi iniciada no dia 2 de janeiro de 2006, com apoio da
Emergent Village dos EUA.
Por ser um movimento característico da pós-modernidade,
a igreja emergente é difícil de ser definida e alguns autores até
mesmo hesitam em dizer que ela pode ser caracterizada como um
movimento. As características de fluidez, imprecisão e falta de um
padrão que possa abranger todas as comunidades que se reconhecem
como emergentes tornam a tarefa da definição ainda mais difícil. Por
outro lado, é impossível deixar de observar que um número cada vez
maior de comunidades com origens dentro do cristianismo chamam
91
a si mesmas de emergentes. Seguindo a tese de Carson – “sempre que
surge um movimento cristão que se apresenta como reformista ele não
deve ser sumariamente descartado.
Provavelmente, Karen Ward, da Igreja dos Apóstolos, nos
Estados Unidos, foi o primeiro a usar o nome Igreja Emergente, para
caracterizar um movimento.
Brian McLaren, um dos nomes mais reconhecidos dentro do
movimento, começou a usar o termo “emergente” em seus livros.
Para McLaren era necessário que a igreja descobrisse e desenvolvesse
uma ortodoxia diferente da ortodoxia praticada pela igreja evangélica
durante o período do modernismo.
Uma das tônicas do movimento é que antes de ser, primeiro é
fundamental pertencer. A comunidade “projeto242”, existente no Brasil,
traz a seguinte proposta comunitária: “Queremos oferecer às pessoas
um local onde elas possam se sentir parte antes mesmo de acreditar”.
Geograficamente o movimento teve origem no Reino Unido,
ligado a uma cultura fundamentada na experiência, a cultura “clubber”.
Essa cultura, na verdade uma subcultura, é caracterizada pela
migração dos jovens suburbanos para o centro das cidades durante
os fins de semana, buscando um significado tribal para a existência.
Os ajuntamentos de jovens dentro dessa subcultura propiciaram o
aparecimento de “tribos” cristãs entre a população, e estes, por sua
vez, produziram movimentos que, mais tarde, passariam a identificar-
se como emergentes. Na Inglaterra, onde a expressão do cristianismo
evangélico tradicional é muito pequena e a frequência à igreja está
entre 2 e 3% da população, a igreja emergente tornou-se rapidamente
uma expressão importante.
As igrejas emergentes são comunidades que passam por um
processo de “seeker friendly” (ou seja, “adaptada ao usuário” ou
“orientada para o consumidor”). A busca sempre é satisfazer o fiel que
está na igreja, tornando sua experiência a mais prazerosa possível. É
marcadamente uma igreja que valoriza o hedonismo, a satisfação das
necessidades e prazeres, da experiência em primeiro lugar.
É marcada pelo não-absolutismo, ou seja, nega a existência de algo
que seja real ou verdadeiro ou absoluto para todos do mesmo jeito.
É pluralista. Assim como o pós-modernismo. A proposta
93
na verdade, ninguém sabe onde ela vai terminar. Uma das propostas
fundamentais na comunicação emergente é a criação de um culto
experimental e multissensorial, numa atmosfera trabalhada por luzes,
velas, símbolos, mensagens multimídia, arte estática e em movimento,
espontânea e participativa, dando sempre lugar à experiência.
Há outros movimentos, como o Movimento das Igrejas
Apostólicas, Movimento das Igrejas Judaizantes, Movimento de
Igrejas Puritanas, Igrejas Contemporâneas, Movimento de Igrejas
Generacionais etc.
Há um forte movimento religioso no Brasil e cada diz que passa
há mais pessoas migrando de igrejas para outros movimentos.
Esse número cresce, infelizmente, devido a nossa falta
de sensibilidade e de visão correta a respeito das pessoas, não
conseguindo ler as mesmas através da ótica do reino de Deus, das suas
necessidades, suas fraquezas, suas dificuldades e principalmente a
falta de conhecimento de Deus.
Introdução
Objetivos
95
Igreja Presbiteriana Boas Novas, Conjunto São
Lourenço, Londrina
Um estudo de caso
Este levantamento a partir da área de atuação da Igreja
Presbiteriana Boas Novas, utilizando o ferramental histórico,
geográfico e da comunicação (marketing) visa traçar um perfil da
região, suas raízes, cultura, necessidades, pontos de inserção para
promover uma melhor visibilidade e atuação da Igreja no seu contexto
sócio-histórico-cultural e cumprir a sua missão – ser sal e luz.
Foi usado como base para a Perspectiva Histórica Atas da Igreja
Presbiteriana Boas Novas, Biografias e Livros Históricos sobre a Igreja
Presbiteriana do Brasil – para a Perspectiva Geográfica os dados
estatísticos levantados são do IBGE, censo de 2000 e inserção de
pesquisa de campo realizadas pelos adolescentes da Igreja Presbiteriana
Boas Novas para este fim – para a Perspectiva da Comunicação foi
utilizado idéias e pesquisas feitas a partir de necessidades visualizadas
no próprio bairro como no levantamento.
1– Perspectiva Histórica
1.0. – O Brasil presbiteriano
Para ter uma visão mais correta presbiterianismo e sua influência
aqui em Londrina é necessário reportar-se ao começo, ao começo
no Brasil. No solo brasileiro a história começa em 1555, quando um
grupo de franceses que liderados por Nicolas Durand de Villegagnon
instalados em uma das ilhas da Baía da Guanabara solicita ao seu líder
em Genebra, João Calvino que envia um grupo de pastores e colonos em
resposta ao pedido. Em 10 de março de 1557 foi realizado o primeiro culto
evangélico protestante no Brasil; apesar desse começo houve desavenças
entre os que foram enviados e o líder no Brasil, Villegagnon que resultou
numa “confissão” chamada de “Confissão de Fé da Guanabara” através
da qual três dos calvinistas que chegaram foram executados e um outro
foi poupado por ser o único alfaiate da colônia.
No século XVII, os calvinistas holandeses tentaram novamente
97
1.5. – Nascimento de Igrejas Presbiterianas em Londrina
Depois da Igreja Presbiteriana Central, em 1936 houve mais 5
organizações até chegar à Igreja Presbiteriana Boas Novas, que é a
sexta igreja presbiteriana plantada em Londrina – e são:
Igreja Presbiteriana da Vila Nova (segunda) – 1951
Igreja Presbiteriana da Vila Judith (terceira) – 1966
Igreja Presbiteriana do Jardim Bandeirantes (quarta) – 1974
Igreja Presbiteriana Arco-Íris (quinta) – 1978
Perspectiva Geocensitária
1.8. - Mapas de localização e apresentação
Informações e mapas produzidos através de utilização de
ferramentas: Philcarto, Adobe Illustrator, Adobe Photoshop, Corel
Photopaint, PowerBullet e MS PowerPoint, Sites na Internet – IBGE
e Google Earth.
99
1.9. Demografia
1.9.1. - Densidade demográfica – pessoas residentes;
- Pessoas residentes por domicílio – comparação entre homens
e mulheres;
Existem na região cerca de 2670 domicílios com um total de
9803 pessoas residentes. Destas pessoas residentes as mulheres são a
maioria, com um total de 5017 (51,17% da população residente) contra
4786 homens (48,82% da população residente).
1.9.1.2. - Crianças % e total de crianças;
As crianças da região perfazem um total de 2518 (25,69% da
população residente).
1.9.1.1.3. - Crianças % versus concentração de Igrejas;
A região conta com 13 igrejas evangélicas com um total de 193
crianças em média por alcance do evangelho.
1.9.1.1. 4. - Idosos % e total de idosos
Há 806 idosos (8,22% da população residente).
1.10. – Educação
1.10.1. - Analfabetismo em geral
75,24% (7376 pessoas) da população é alfabetizada contra 24,75%
(2427 pessoas) de pessoas ainda não alfabetizadas.
1.10.2. - Analfabetismo entre crianças e adolescentes
Entre crianças e adolescentes há um total de 444 pessoas não
alfabetizadas que é 4,52% da população residente.
1.10.3.- Número de Escolas
Existem 6 escolas na região, entre escolas particulares (privadas
ou confessionais) e públicas – 1633 pessoas para cada escola.
1.11. - Meio sócio-ambiental
1.11.1. - Domicílios com apenas 1 morador
Existem 185 domicílios em que apenas uma pessoa mora.
1.11.2.- Domicílios com 7 ou mais moradores
154 domicílios são habitados por 7 ou mais pessoas.
1.12. – Economia
1.12.1. Linha de baixos salários – responsáveis com até 2
mínimos
44,00 % dos domicílios tem seus responsáveis recebendo menos
que dois salários mínimos o que dá um total de 1175 domicílios.
1.12.2. Linha da pobreza – responsáveis sem rendimento
263 domicílios – 9,8 % do número total tem os seus responsáveis
declarando como sem rendimento.
1.12.3. Linha de altos salários – responsáveis com 15 salários ou mais
Apenas 0,7 % dos domicílios da região tem responsáveis que
ganham 15 salários mínimos ou mais – 21 no total.
1.13. – Dados Estatísticos
Domicílios (total) 2670
Domicílios com apenas 1 morador 185
Domicílios com 7 ou mais moradores 154
Domicílios sem esgoto 596
Homens responsáveis por domicílios 2014
Mulheres responsáveis por domicílios 635
Pessoas residentes (total) 9803
Homens residentes 4786
Mulheres residentes 5017
Crianças entre 0 e 12 anos 2518
Crianças % em relação à população residente 25,69 %
101
Pessoas alfabetizadas 7376
Pessoas não alfabetizadas 2427
Jovens não alfabetizados (5-19 anos) 444
Idosos 806
Idosos % em relação à população residente 8,22 %
Responsáveis por domicílios com até 2 salários mínimos 1175
Responsáveis por domicílios com 15 salários mínimos ou mais 21
Responsáveis por domicílios sem rendimento 263
Igrejas 13
Escolas 6
103
1.18. – Criar um programa de artesanato e outras confecções
manuais visando minorar a deficiência de sustento familiar na região,
principalmente com aqueles domicílios que tem responsáveis ainda
sem rendimento;
1.18.1. Artesanato
1.18.2. Corte e costura
1.18.3. Decoração de objetos
1.18.4. Culinária (doces e salgados)
Conclusão
Introdução
Objetivos
105
Ensinamento Bíblico-Teológico
Conceitos de diaconia
Durante muitos anos fui diácono, ou seja, tive o ofício de diácono
numa igreja presbiteriana na cidade de Nova Venécia (Espírito Santo)
e naquela época (coisa que se seguiu até hoje!) nunca vi muito sentido
em ser diácono com aquele padrão estabelecido, como se a diaconia se
resumisse a tornar-se um porteiro da congregação, cuidando para que
bêbados não entrassem no templo ou mesmo cachorros, servindo à mesa
da ceia, retirando e colocando ali a toalha que cobre os pães e vinhos ou
até mesmo trazendo um copo de água para um pregador sedento no
púlpito! Pronto. Meu serviço diaconal está indo muito bem...
Hoje, anos mais tarde, olho para diaconia com outros olhos,
não de um ofício secundário, mas como uma resposta a Deus do seu
próprio serviço e do bem que tem feito a nós, sua Igreja – como diriam
alguns, um ato segundo em resposta ao ato primeiro de Deus, em nos
amar e vir, em Cristo, para servir!
Diakonos (grego do Novo Testamento) é o termo que intitula
aqueles que servem ao Senhor por meio do serviço à comunidade –
gosto de pensar que esta comunidade é mais abrangente que a própria
noção de igreja/templo que temos em nossos dias, mas que se coloca
de tal forma que inclui em seu alvo de ação aqueles que estão ao
nosso redor, em nossa casa, bairro, cidade – ou seja, todos aqueles que
verdadeiramente estarão vivendo ao nosso lado, compartilhando da
vida comum designada a nós serão o alvo desta diakonia. Este termo
é usado para aquelas pessoas que são sensíveis às necessidades dos
outros, quer sejam de ordem física/mental ou espiritual/religiosa –
assim, servindo a outros, servem a Deus!
Uma das grandes marcas do pecado na vida do ser humano é a
capacidade desenvolvida por todos de sermos egoístas, orgulhosos e
vaidosos e com isso pensarmos que não precisamos de ninguém para
viver, como também sentirmos que não precisamos nos deixar envolver
por outros. Jesus vive em meio à cultura hedonista dos religiosos
judeus e age justamente na contracultura, mostrando, ensinando e
atuando de maneira que suas ações sempre incluem o outro quer seja
107
pois o segundo ressalta quase exclusivamente a sujeição
completa do cristão ao Senhor; ‘diakonos’ diz respeito ao seu
serviço em prol da igreja, dos seus irmãos e do seu próximo,
em prol da comunhão, quer o serviço se realize ao servir à
mesa, com a palavra, ou de alguma outra maneira. O ‘diakonos’
sempre é aquele que serve em nome de Cristo e que continua o
serviço de Cristo” (DITNT, 2000, p. 2345).
Vemos diakoneo que é o verbo grego no Novo Testamento para
servir, apoiar. Ele denota as ações de quem faz algo em direção a outro.
Juntamente vemos o substantivo diakonia que é o serviço, ou cargo,
ajuda, sustento, distribuição de esmolas, cargo de diácono. Enfatizando
a situação ou como o serviço executado é visto pelos outros. Já o
substantivo diakonos mostra uma pessoa que serve, para aquele que
executa estas ações e estes serviços – servo ou diácono.
O contexto do grego clássico da palavra diakoneo (verbo: servir)
denota dar-se trabalho; no sentido secular do grego clássico é de servir
à mesa, ou mesmo cuidar das necessidades do lar e também servir de
modo geral. O substantivo (diakonia) era usado no sentido de um
garçom e por isso foi usado mais tarde para aqueles que serviam as
refeições rituais (DITNT, 2000, p. 2342).
A palavra diakonia não é encontrada em nenhum dos evangelhos a
não ser em Lucas quando Marta, irmã de Maria e Lázaro, se diz preocupada
com muitos serviços, pois ela tinha sido deixada para servir sozinha.
Marta agitava-se de um lado para outro, ocupada em muitos
serviços. Então, se aproximou de Jesus e disse: Senhor, não te
importas de que minha irmã tenha deixado que eu fique a servir
sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me (Lc 10:40).
Diakoneo é encontrada com mais freqüência no Novo Testamento,
quase sempre com o sentido de servir à mesa. Diakonia é achada 34
vezes com o mesmo sentido de serviço à mesa. Pode envolver tanto o
cuidado com alimentação, ceia, ofertas, especialmente pensando no
trabalho dos diáconos.
O ato de servir a mesa, principalmente pensando em Atos,
remete-nos ao serviço em partir o pão de casa em casa e também
nas festas realizadas, onde os que tinham posses cuidavam daqueles
109
falamos da ordenação em termos de ‘entrar para o ministério’.
O emprego do artigo definido pressupõe que o pastorado
seja o único ministério que existe. Mas ‘diakonia’ é um termo
geral para serviço; ele não é específico, a não ser que receba
o adjetivo como ‘pastoral’, ‘social’, ‘político’, ‘médico’ ou outro
(1994, p. 135).
111
Esta assistência ou cuidado para com os outros acaba por ser
uma das maneiras que Deus se utiliza para edificar o corpo de Cristo,
como o próprio Paulo deixa isso claro em Efésios 4:16 – “todo o corpo,
bem ajustado e consolidado pelo auxílio de toda junta, segundo a
justa cooperação de cada parte, efetua o seu próprio aumento para
a edificação de si mesmo em amor”. A expressão “segundo a justa
cooperação de cada parte” enfatiza o serviço que contribui para a
comunhão e estabelece o crescimento e edificação do corpo de Cristo.
Quando Paulo vai falar sobre os dons em Coríntios ele utiliza
para o dom de serviço a palavra diakoniai – “E também há diversidade
nos serviços, mas o Senhor é o mesmo” (2 Co 12:5).
Este serviço não é apenas uma prática desprovida de análise,
apenas obediência cega. É necessário entendermos e conhecermos
as reais necessidades de outros para nos aventurarmos no serviço, na
diakonia.
Antonio Carlos Barro, em seu excelente artigo Implicações e
desafios da Missão Integral, falando sobre o olhar da igreja para o povo,
alvo de sua ação missionária, faz-nos entender algo importante sobre
o conceito da diakonia que é a empatia:
Empatia é “sentir o que se sentiria caso se estivesse na situação
e circunstâncias experimentadas por outra pessoa” (Dicionário
Aurélio). Seria como colocar-se na situação do outro e calçar os
seus sapatos, pois somente quando sabemos onde realmente o
sapato aperta o nosso pé é que teremos empatia com o outro.
Muitas vezes o nosso evangelho é muito teórico, pois temos as
respostas para todas as perguntas e temos as soluções para todos
os problemas. Os pastores, principalmente, são mestres em quase
todos os assuntos da vida. Eles entendem de uma complicada
doença, economia, casamento, política, carro, casa, seguro.
Sabem como resolver os problemas da juventude e da velhice.
Devemos reconhecer que muitas das coisas que um pastor fala
e aconselha, ele o faz sem nenhuma consideração pela pessoa à
sua frente. Ele dá conselhos com a maior naturalidade e tem a
mais absoluta certeza de que se a pessoa praticar o que ele está
dizendo, todas as coisas serão solucionadas (2003, p. 21).
113
É a graça de Cristo que nos faz viver em comunhão e cuidado.
Pedro também entendia isso e mais especificamente ainda nos diz que
devemos viver em diakonia uns para com os outros – “Servi uns aos
outros, cada um conforme o dom que recebeu, como bons despenseiros
da multiforme graça de Deus” (1 Pe 4:10).
O serviço ao outro depende de nossa união com o corpo de Cristo
(“os membros de um mesmo corpo”) e também deve ser exercido cada
qual dentro do dom que recebeu do Senhor. Por isso diakonia precisa ser
entendida como algo mais abrangente que apenas a ação ou assistência
social por parte de pessoas da igreja para com seus membros ou os
de fora – esse conceito diaconal perpassa a todo ministério cristão –
“servi uns aos outros, cada um conforme o dom que recebeu” – Pedro
queria nos mostrar que se pregamos, servimos à mesa, cuidamos da
administração, ensinamos ou desenvolvemos qualquer outro ministério
cristão devemos fazê-lo como diakonia – servindo aos outros.
Em Filipenses 2:1 Paulo expõe quatro frases que começam com a
interjeição se – na verdade o termo grego (ei) deveria ter sido traduzido
de outra forma, para não dar a idéia de algo condicional, pois não é o
caso, mas se de certeza absoluta. F. F. Bruce argumenta que esta tradução
correta de ei “implica na inexistência de qualquer dúvida quanto à
realidade destas bênçãos, quer na mente de Paulo, quer na experiência
dos filipenses: poderia ser traduzido assim: ‘tão certo quanto’” (1989,
p. 74) – “Se há, pois, alguma exortação em Cristo, alguma consolação
de amor, alguma comunhão do Espírito, se há entranhados afetos e
misericórdias” (Fp 2:1).
Paulo está argumentando com a igreja de Filipos que ele
gostaria de ter mais alegria quando eles entendessem que exortações,
consolações, comunhão, afetos e misericórdia já se encontram
em Cristo e estão a nossa disposição no viver diário cristão. No
sentido incorporativo a frase em Cristo é que demonstra para as quatro
condicionais como é que se pode ter cada uma daquelas afirmações:
• Em Cristo é que se tem conforto, consolação, comunhão no
Espírito e entranháveis afetos e misericórdias;
• Exortação – pode ser conforto, consolo (paraklesis) que é
115
da ausência de presunção pessoal acerca de qualquer coisa,
principalmente acerca dos outros que estão ao nosso redor. Em
Filipenses 3:2 Paulo trata da questão do partidarismo. Parece
algo muito comum às comunidades cristãs estarem divididas
ou dividindo-se em partidos. No versículo 2 ele insta para que a
Igreja tenha um só pensamento e partidarismo é o contrário da
unidade de pensamento.
Ser um servo humilde, como Cristo se propôs não era algo
que tinha um conceito muito bom naquela época (continuamos na
mesma hoje!) e era associada ao servilismo, literalmente poderia ser
traduzida como um espírito mesquinho, de servo. Humildade não
era uma virtude estimada principalmente no meio da sociedade
pagã, tendo como ponto de vista as culturas romanas e gregas. Os
discípulos mesmo sentiam dificuldade em aprender isso – Jesus
tinha que insistir que o maior entre eles deveria ser o que serve,
tomando como exemplo ao próprio Mestre, que “não veio para ser
servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Mc
10:45). O que Paulo diz aqui é ao considerar os outros superiores
a nós mesmos, é o processo aqui de aplicação da humildade numa
vida prática não fingida, tendo uma sinceridade e comunhão de
amor como relatou anteriormente. Em discussões ou debates temos
a tendência de tomar partido, de olhar as coisas do ponto de vista
único válido – o nosso! E é isso que o apóstolo quer evitar ao
demonstrar que os afetos e misericórdias de Deus já vieram até nós
e que, portanto temos condições de fazer com outros aquilo que já
foi aplicado a nós.
Em 2:4 ele argumenta – atente cada um ... para o que é dos
outros – é possível que essa exortação aqui é para devemos ficar
atentos (olhar fixamente) para as qualidades dos nossos irmãos que
estão ao nosso lado no corpo de Cristo, e que “quando tais virtudes
forem reconhecidas serão um incentivo a nossa forma de viver”
(Bruce, 1989, p. 75).
Paulo está preparando a Igreja a pensar de modo semelhante
a Cristo – como alguém que pôs os interesses dos outros antes dos
seus próprios interesses. Essa maneira de pensar difere em muito
117
verso – que é chamada de Kenosis. O que está sendo tratado aqui é
justamente Paulo trazendo a memória o hino do servo em Isaías –
quando o esvaziar-se até a morte pode ser considerado como Jesus
tendo derramado a sua vida na morte (Is 53:12).
Louis Berkhof argumenta que “o estado de humilhação consiste
em Cristo ter posto de lado a majestade divina que era Sua como
soberano governador do universo ter assumido a natureza humana na
forma de servo e ter ficado, Ele que é o supremo legislador, sujeito às
exigências e à maldição da lei” (1985, p. 170).
O fato mais preponderante certamente é que ele sendo Deus, não
considerou como sendo impedimento o ele ser Deus, para encarnar-
se homem, assumindo a atitude e forma de servo e sendo obediente
como servo até a morte e essa morte não é uma morte qualquer, mas é
uma morte onde ele seria contado com os malditos.
Ser servo na época de Cristo era o ponto extremo de negação
dos direitos de uma pessoa. Cristo assumiu o fato de que sua diakonia
o colocaria numa posição em que as necessidades dos outros viriam
antes das suas. O fato de Cristo ter assumido esta posição, de serviço
ao outro, torna nossa vida cristã e ministério cristão possível. Nossa
condição, então, é a de quem já experimentou de Deus, já recebemos
amor, misericórdia, conforto e consolação de Deus, portanto, podemos
ter comunhão com outros, pois o mesmo Espírito que já nos uniu a
Deus nos une uns aos outros. Assim, por causa de Deus e para a glória
de Cristo a diakonia, o ministério cristão se torna possível e esperado.
Introdução
Objetivos
119
Implicações missiológicas para o serviço cristão
Ao afirmamos que a Missão de Deus também tem o seu lado de
responsabilidade social não estamos sós, mas junto com milhares de
homens e mulheres que entendem que o pacto de Lausanne representa
uma declaração de fé válida para nossos dias. Neste pacto, lemos o
seguinte no seu ponto 5, da responsabilidade social cristã:
Afirmamos que Deus é o Criador e o Juiz de todos os homens.
Portanto, devemos partilhar o seu interesse pela justiça e pela
conciliação em toda a sociedade humana, e pela libertação dos
homens de todo tipo de opressão. Porque a humanidade foi
feita à imagem de Deus, toda pessoa, sem distinção de raça,
religião, cor, cultura, classe social, sexo ou idade possui uma
dignidade intrínseca em razão da qual deve ser respeitada e
servida, e não explorada. Aqui também nos arrependemos
de nossa negligência e de termos algumas vezes considerado
a evangelização e a atividade social mutuamente exclusivas.
Embora a reconciliação com o homem não seja reconciliação
com Deus, nem a ação social evangelização, nem a libertação
política salvação, afirmamos que a evangelização e o
envolvimento sócio-político são ambos parte do nosso dever
cristão. Pois ambos são necessárias expressões de nossas
doutrinas acerca de Deus e do homem, de nosso amor por nosso
próximo e de nossa obediência a Jesus Cristo. A mensagem da
salvação implica também uma mensagem de juízo sobre toda
forma de alienação, de opressão e de discriminação, e não
devemos ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que
existam. Quando as pessoas recebem Cristo, nascem de novo
em seu reino e devem procurar não só evidenciar mas também
divulgar a retidão do reino em meio a um mundo injusto. A
salvação que alegamos possuir deve estar nos transformando
na totalidade de nossas responsabilidades pessoais e sociais. A
fé sem obras é morta (Lausanne:1983, p. 12).
O teólogo Reginaldo von Zuben, professor na FTSA afirma
em seu artigo intitulado Superando dualismos, publicado na Práxis
Evangélica, revista teológica da Faculdade Teológica Sul Americana
sua visão sobre a missão integral, dizendo:
121
28) e Deus mesmo diz que tudo foi criado perfeito e bom (v.31), nas
palavras de Derek Kidner, “abençoar não é só conferir uma dádiva,
mas também uma função (conforme 1.22; 2.3)” e é dessa função que
estamos pensando aqui neste texto (1985, p. 16).
Qual o objetivo da natureza? Ela foi criada por Deus para manter
e preservar a vida do ser humano – “todas as ervas... de toda a terra...
todas as árvores... todos os animais da terra... todas as aves do céu...
todos os répteis da terra... lhes será por mantimento” (v. 29-30). Para
sua própria preservação, a humanidade recebe de Deus a bênção,
ou seja, a bênção funcional de cuidar de toda a natureza – “Deus...
colocou (o ser humano) no jardim... para o cultivar e o guardar” (v.
15). A preservação mútua da vida – da humanidade e de toda a criação
além de serem interdependentes faz parte do plano do Senhor para
que a sua glória venha a ser manifestada – ou seja, para que a missão
de Deus seja cumprida por ele mesmo.
Com a queda a terra se torna maldita (Gn 3:17) por causa do
pecado, mas mesmo após a queda enxergamos nos relatos que Deus
permanece ligado ao seu propósito primeiro: glorificar o seu nome
através do seu plano com a criação. Deus re-estabelece esta verdade
em Noé – “Estabeleço a minha aliança convosco (com o ser humano)...
para perpétuas gerações” (Gn 9:9-12).
Depois da generalizada corrupção do ser humano que tem por
fim a história de Noé (Gn 6 a 9) e com a ampliação da corrupção em
Babel (Gn 11), Deus espalha as famílias pela terra (Gn 11) e chama
a Abraão, para que o povo formado através dele fosse bênção para
“todas as famílias da terra” (Gn 12:3); Deus não mudou seus planos e
continua com o mesmo propósito: abençoar a humanidade com sua
manifestação, revelação e bondade para que a sua glória seja manifesta
e toda a terra seja invadida com a sua glória.
Os verdadeiros filhos de Abraão (Jesus declara que são aqueles que
são chamados pela fé como o crente Abraão) agora são denominados
pelo próprio Senhor de “sal da (para) terra” (Mt 5:13). Analisando
exegeticamente este versículo chegaremos a uma conclusão no mínimo
espantosa. Vejamos:
O sal, referindo-se provavelmente ao cloreto de sódio retirado
de perto do Mar Morto, um pó branco que muitas vezes permanecia
123
está implícito no texto é justamente a produção de vida que depende da
utilização do sal corretamente, sem sujeiras que possam desqualificá-lo.
Então, ser sal para a terra tem uma resignificação a ser feita:
ser sal é ser mais que um pregador, é ser mais que um defensor da
sã doutrina, é ser mais que um apologista de Deus, é ser mais que
um denunciador profético dos males e corrupções do mundo, é ser
mais, muito mais; é ser alguém comprometido com o Reino de Deus
de maneira que as ações de salgar a terra perpassem a nossa própria
conduta como servos do Reino e nossas ações sejam inclusivas e não
exclusivas. É ser ativo no compromisso com a restauração da vida e
não somente com a pregação de um evangelho alienante que só faz
sentido dentro das quatro paredes das igrejas. É enxergar os sinais
do reino de Deus, dentro e fora da igreja e persegui-los, e quando
os alcançar promovê-los para que o Reino de Deus seja ampliado e
as bênçãos deste reino alcancem o que Deus planejou alcançar deste
o princípio: toda a sua criação sendo restaurada para a glória dele
mesmo. Estas atitudes pressupõem para nós mais que simplesmente
pregar o evangelho falando às pessoas ou ações/assistências sociais.
Charles Van Engen argumentou em 2008, em um curso na
Faculdade Teológica Sul Americana (FTSA) em Londrina, que “a
igreja não existe como propósito de servir a seus membros, mas sim
consiste de membros que existem para ser povo de Deus, participando
da sua missão no meio da comunidade e servindo a outros”.
Por causa disso, desta vocação missionária que pesa sobre a igreja
do Senhor, faz-se necessário e urgente conhecer o contexto da vida
urbana que processa uma mudança enorme na maneira como o ser
humano habita e vive na cidade. Esta mudança ocorre principalmente
por causa do esvaziamento da zona rural numa migração da grande
maioria da população hoje, ao contrário do que no passado, habita em
meio à cidade e suas necessidades.
José Comblin, o teólogo da cidade, diz que “parece chegar
o momento de considerar-se as realidades humanas concretas e
confrontá-las com a realidade do cristianismo. A cidade é uma destas
realidades, e uma das mais importantes” (1991, p. 12).
A cidade constitui um desafio maior que podemos supor, pois
grande do tempo de vida da igreja foi desenvolvido no modelo e para o
125
No mundo bíblico o que se pode perceber é que a Palavra de
Deus foi privilegiando as cidades como horizontes missionários
carentes de uma mensagem de transformação. Naquela época, os
estóicos eram os religiosos de proeminência social. Seus ensinos
enfatizavam o espírito em detrimento ao corpo. Para eles, o
corpo era mau, a matéria ruim e somente o espírito possuía boas
qualidades. Na verdade, o estoicismo cosmopolitano tomou o
controle religioso, formando uma cidade espiritual. É justamente
nesse contexto que o Evangelho ganhou terreno fértil para a
pregação cristã. As cidades helênicas tornaram-se palcos de uma
nova ordem religiosa. Sobretudo em o Novo Testamento, Cristo
foi pregado como transformador da cidade (2003, p. 33)
Olhando para a maneira como Paulo introduz várias de suas
cartas entenderemos um pouco sobre a necessidade de inserção da
ekklesia na vida da cidade. Antes se faz necessário brevemente definir
ekklesia, pois fazemos muita confusão entre templo e igreja.
O termo para igreja no Novo Testamento é ekklesia que é
composto pela preposição ek (para fora de) e a raiz kaleo (chamar)
que literalmente poderia ser traduzido por chamada para fora de,
dando-nos a idéia de uma comunidade que tem como alvo óbvio da
sua existência o fato de ter sido criada a partir de pessoas que foram
convocadas para agir fora do contexto interno da própria convocação.
Isso está presente, obviamente, por causa do contexto da formação do
termo – quase sempre eram pessoas convocadas para uma assembléia
que iriam discutir e decidir pontos a respeito da sua sociedade –
decisões políticas, econômicas e religiosas – muitas vezes era uma
convocação para a guerra. Qualquer que fosse o motivo o objetivo era
a reunião para fazer alguma coisa fora do contexto da convocação –
por isso chamada para fora. Obviamente o termo também está ligado
a agrupamento de indivíduos e em todo o Novo Testamento adquire o
conceito de comunidade dos santos.
O que importa para nosso estudo aqui é que a conformação
ekklesia não se prende ao templo (local onde ela se reúne) e nem
mesmo a certo número de pessoas organizadas como igreja local.
O fato de que pequenos grupos em casas individuais se chamam
‘ekklesia’ (Fm 2; 1 Co 16.19; Rm 16.5; cf. também Cl 4.15) indica
127
são cidadãos do céu na terra e continuam pertencendo a cidade onde
habitam.
Assim, quando Paulo quer explicar sua idéia de ekklesia ele lança
mão de vários recursos, mas o que melhor caracteriza seu pensamento
é a de ekklesia ser um corpo (soma) e que nesse corpo, o corpo de
Cristo, cada membro possui uma função esperada e também recebe da
cabeça (Cristo) dons específicos para a edificação deste mesmo corpo
ou edifício. Estes dons dão entregues por Cristo, pelo Espírito santo e
tem como objetivo edificar o seu próprio corpo, tanto cuidando uns
dos outros dentro da comunidade como para cumprir a vontade do
Senhor na proclamação e cuidado para com os de fora.
Localizar igreja apenas vinculada a uma instituição ou mesmo
a um lugar (templo) onde efetivamente ela se reúne é um desserviço
ao corpo de Cristo. Por isso Agostinho, Wycliffe, Lutero e Calvino
desenvolvem a idéia da igreja invisível deixando claro que aqueles
que pertencem à igreja efetivamente só são conhecidos mesmo pelo
Senhor, principalmente pensando em 2 Timóteo 2:19 – “O Senhor
conhece os que lhe pertencem”.
Esta ekklesia que está localizada na cidade tem como alvo
primeiro do seu ministério cristão os que são de fora.
Daí algumas considerações práticas missionárias sobre a
transformação da cidade a partir da vida da ekklesia.
José Comblin, falando sobre a teologia da cidade, afirma:
Não seria fácil demonstrar historicamente o que as cidades
devem ao cristianismo. Teríamos que estudá-las uma a uma e
fazer a história das influências que agiram em cada caso. É mais
importante realçar que, apesar do que possa ter sido o passado,
a tarefa dos cristãos e o efeito da redenção de Cristo é salvar
a cidade de seu mal, transformá-la em autêntica comunhão
humana (1991, p. 58).
É assim que devemos entender o nosso chamado, um chamado
radical de Cristo para que assumamos neste quesito chamado cidade a
função de transformá-la em algo que glorifique também o nome de Cristo.
Invariavelmente muita coisa pode acontecer quando somos
enviados à cidade.
129
Diante das transformações psicológicas, sociológicas,
tecnológicas e culturais que têm ocorrido nas grandes cidades,
qualquer pastor, com sua teologia bíblica e sua experiência
mística, se sente tão anacrônico quanto um jumentinho
puxando em meio à velocidade e ao barulho das motocicletas,
automóveis, ônibus e caminhões, ele vai ruminando suas
limitações pessoaIs e arrastando uma carroça (chamada igreja)
cheia de objetos velhos e móveis usados (2007, p. 11).
Essa é uma grande realidade em meio as cidades e igrejas, pois
as mudanças ocorridas nos últimos anos na configuração demográfica,
saindo da ruralidade para um vida urbana caótica, coloca líderes e
pastores quase completamente despreparados para a prática da missão
em meio à urbe.
A pergunta crucial que devemos fazer a esta altura é: como
agir missionariamente numa época tão voltada para o intra, para o
particular, para as necessidades individualizadas?
Participe da sua cidade! Não adianta você florescer, ter
prosperidade, ser abençoado se outros ao seu redor continuam sofrendo
com problemas. Exigir ruas calçadas, que não tenham buracos e que
sejam iluminadas coerentemente dentre outras coisas são atitudes
esperadas daqueles que são exercem diakonia no ministério cristão e é
previsto no Estatuto da Cidade que você pode fazer parte das decisões
sobre a mesma. Se participarmos da vida na cidade irá melhorar a
cidade e a vida de todos os que habitam nela.
Agir em diakonia para com a cidade implica em oferecer da
parte do corpo (ekklesia) e também individualmente como cidadãos
que pertencem às duas cidades – a cidade dos homens e a cidade de
Deus, atitudes de cuidado, de transformação, de mudança de valores,
de reestruturação para a transformação das vidas na cidade e da própria
estrutura da cidade em si, de modo que venha ser um lugar também
onde se encherá da glória de Deus, como as águas cobrem o mar.
Ítalo Calvino (1923-1985), em seu livro Cidades Invisíveis,
coloca o viajante Marco Polo encontrando-se com o imperador
mongol Kublai Khan narrando sobre cidades, cada uma delas com
o nome de uma mulher e nenhuma delas eram reais – ele fala sobre
uma cidade chamada Dorotéia em torres de alumínio, muralhas
131
cristão, no serviço cristão ao outro.
Há necessidade urgente de vivenciarmos uma fé mais viva, mais
intensa e que serve a Deus através do serviço à comunidade.
Este cristianismo, de uma fé viva e não morta é o verdadeiro
cristianismo que diferente da falsa religião, nos constrange a seguirmos
o samaritano e não o sacerdote ou o levita do texto de Lucas 10.
Ronaldo Lidório, em seu livro “Plantando Igrejas” nos diz que:
O sacerdote, conhecedor da Palavra, e o levita, ministro da
adoração a Deus, formavam o clero religioso da época. Sua
relutância em parar perante um homem caído ao lado demonstra
muito mais que insensibilidade. Mostra que é possível ser
Igreja, conhecer a Palavra, se envolver com a adoração a Deus
e ao mesmo tempo desprezar o desespero humano (2008, p.80)
Entendo que podemos, mesmo hoje, reproduzir este ‘modelo’
perverso, onde nossa prática cristã diferencia tanto de nossas pregações
como dos mandamentos bíblicos e das palavras de Jesus.
René Padilha também afirma algo parecido em seu livro “Missão
Integral” que “a salvação é o retorno do homem a Deus, mas é também o
retorno do homem a seu próximo” (2000, p. 32) colocando de modo direto e
simples a temática da ‘diakonia’, que gera cuidado e mantém a comunhão.
Creio que a única maneira de entendermos e praticarmos este
tipo de Missão, voltada para o louvor, a glória de Deus bem como para
a reconciliação do ser humano e de toda a criação para com o próprio
Senhor está no modelo Jesus: a sua encarnação e palavra nos mostram
que “o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar
a sua vida em resgate por muitos” (Mc 10.45).
Quando você enxerga sua cidade, suas dificuldades e necessidades,
as ansiedades que transtornam a vida das pessoas levando muitos ao
desespero completo, deve pensar como ser um agente de transformação
para eles. Ronaldo, ainda no seu livro “Plantando Igrejas” diz que
“igrejas plantadas que ao longo dos anos não fomentem transformação
humana e social são redutos espirituais que, mesmo na busca cúltica
pelos valores do Reino, deixam de ser sal da terra e luz do mundo” (2008,
p.81). Ele também fornece algumas dicas para um maior envolvimento
social que promova esta ação de transformação social. São elas:
133
servir a Deus e às pessoas. Atentos às mudanças de seu tempo, os
franciscanos foram às cidades e serviram aos pobres. Este é um
desafio absolutamente premente e contemporâneo. Não é possível
falar em missão hoje sem falar na cidade e no pobre (1993, pág. 87).
Ir às cidades e servir às pessoas, cuidar da vida do que necessita
tanto pobre quando rico, tanto do desesperado por necessidades
físicas como psicológicas ou espirituais é o sinônimo de um evangelho
integral que enxerga a alma e também o corpo, tem os olhos voltados
para o céu, mas os pés no chão. Isso nos ajuda a entender que “uma
espiritualidade sadia abre o coração para Deus, a mente para a Palavra
e dirige os nossos pés para um mundo necessitado onde muitos ainda
não ouviram essa Palavra, ainda não comeram hoje e têm na vida um
pesadelo cotidiano” (Steuernagel, 1993, pág. 88).
135
Pensando nas cidades, no plantio de igrejas nos meios urbanos,
o que mais vemos em nossa época é a a secularização, o pluralismo,
o individualismo tomando conta das pessoas, das massas. Plantar
igrejas em zona urbana nos dias de hoje, requer um conhecimento de
como o ser humano tem se transformado, nas gerações que estão se
estabelecendo.
Tomando como base os conceitos sobre pessoas secularizadas
extraído do texto de G. George Hunter III poderemos estabelecer
algumas características e diretrizes para o cuidado com os secularizados.
Vejamos:
1. É essencialmente alguém ignorante aos conceitos básicos do
cristianismo. Eles encontram-se fora da ação ou da esfera de atuação
da religião, portanto não recebem dela seus ensinamentos e muito
menos compartilham com a mesma seus valores e verdades – apesar de
não negá-los muitas vezes frontalmente age diametralmente opostos a
idéia de vida estabelecida na e por meio da instituição religiosa.
2. Está buscando vida diante da morte. A ênfase da vida do
secularizado não está no celeste porvir (no além, céu, recompensas
celestes e futuras), mas sim, em questões vivenciais que respondam
a dúvidas e necessidades reais do aqui e do agora. Estão em busca de
sentido para suas vidas.
3. São pessoas mais conscientes de suas dúvidas que de suas culpas.
Há uma busca de sentido para a vida e isso leva a questionamentos
– geradores de dúvidas, mas como estão fora do eixo estabelecido
e normatizado da religião não tem muitas culpas, pois os valores
religiosos são apenas referenciais teóricos.
4. Possuem uma imagem negativa da igreja. A igreja (ou igrejas) é
vista como lugar de manipulação e alienação o que gera desconfiança
e visão negativa generalizada. A identificação do movimento religioso
cristão tendo mesmas bases e permeando os mesmos resultados faz
o secularizado entender que o que vale é o resultado – a produção é
o que mescla e transforma a vida e como o valor é determinado pelo
“mercado”, qualquer ação pode ser válida para a “venda do produto” –
daí o conceito da não confiança.
137
10. O secularizado não consegue “achar a porta”. Perderam a
noção real da presença de uma porta ou ponte entre o seu mundo
e a realidade cristã, justamente por se colocarem fora da influência
desta; a falta de um conhecimento básico do cristianismo leva-os para
longe das possibilidades de encontrar um sentido no que é oferecido
do cristianismo no decorrer de suas vidas.
Cuidando dos secularizados – passos práticos e estratégias
Para plantarmos igrejas existem alguns passos práticos que
podemos seguir para nos ajudar a sermos mais contextuais em nossa
evangelização. Há 12 (ou mais) passos que poderemos seguir no intuito
de cuidar de pessoas secularizadas. Estes passos (ou itens) devem ser a
base de qualquer ministério que deseja ser relevante no cuidado para
com pessoas secularizadas.
1. Precisamos de ministérios que enfatizem a instrução dos valores
e princípios cristãos, sem o estigma da “catequese” e do proselitismo;
estes ministérios devem ser baseados em relacionamentos pessoais
(através de redes);
2. É necessário desenvolver ações que ajudem os secularizados
a encontrar significados para a sua própria vida, respondendo suas
dúvidas mais que apontando suas culpas; oferecer ministérios que
respondam às suas necessidades;
3. Será preciso que providenciemos que os secularizados tenham
contato com cristãos confiáveis;
4. Há de se ajudá-los a descobrir o seu valor próprio para que vençam
sua baixa autoestima, através de ministérios que tenham relevância e
utilize-se de ferramentas que trabalhem com a restauração de pessoas
com a autoestima diminuída com a produção de grupos de autoajuda,
ministérios de aconselhamento e provisão de saúde integral etc.
5. Proporcionar grupos de suporte para pessoas viciadas ou
com dificuldades de relacionamento interpessoal; O isolamento, as
alienações e a baixa autoestima estimulam as pessoas tornarem-se
dependentes de vários tipos de vícios que supram (insatisfatoriamente)
suas necessidades de sentido.
139
140 A cidade em perspectivas multidisciplinares
A cidade em perspectivas multidisciplinares
Unidade - 14
A cidade e as estratégias de alcance
Por Ronaldo Lidório
141
SE RURAL, lembre-se: demonstram mais amabilidade com o de
fora, porém maior desconfiança. Apesar de a hospitalidade ser um fator
de inserção a desconfiança os mantém interiormente distantes. São mais
tradicionais e agregados aos seus valores comunitários e religiosos, o que
deve gerar barreira ao evangelismo. O esforço evangelístico deve ocorrer
através de famílias-chave e é necessário se estabelecer entre eles e participar
dos eventos rurais.
SE TRIBAL, lembre-se: são exclusivistas impondo maiores
restrições aos de fora. Normalmente possuem barreiras étnicas,
linguísticas e culturais distintas, portanto o processo de aceitação do outro
na sociedade é mais lento e complexo. Este processo envolve adaptação
pessoal, envolvimento comunitário, fluência linguística e aptidão cultural.
São tradicionais e identificarão em um primeiro momento o evangelismo
como algo alienígena ao seu ambiente e cosmovisão.
143
Há sete princípios que devem permear a organização destas
igrejas locais. Vejamos:
Evangelismo e discipulado são dois elementos que precisam
caminhar juntos, em equilíbrio. A ênfase no primeiro superlotará os
templos com pessoas pouco amadurecidas em Cristo. A ênfase no segundo
trará um pequeno grupo de crentes maduros e firmes, porém vivendo
numa congregação estática e sem acréscimo de novas pessoas à fé.
O discipulado é o melhor momento para identificação da futura
liderança local. Um plantador de igrejas deve reconhecer entre os
discipulandos aqueles que são líderes. Deve investir neles para capacitá-
los. Além do estudo da palavra, introduza-os em particularidades do seu
ministério, visitando, no evangelismo e na solução de conflitos.
Ajuntamento para o culto público a Deus é um ato que deve ser
central na organização de igrejas locais. O culto público nos lembra que
nos reunimos PARA Deus e POR Deus.
A eleição ou apontamento de líderes locais é um passo importante
e deve ser dado com segurança, a partir de crentes que sejam fiéis a Deus,
conhecedores da Palavra e que já tenham sido testados na vida de fé.
A ceia do Senhor e o batismo promovem a comunhão e compromisso.
A exposição da Palavra, seja em um púlpito de maneira formal ou o
ensino de casa em casa em contexto informal, deve ser central na vida da
igreja. A maturidade da comunidade dependerá disto.
A responsabilidade missionária não deve esperar. Já no discipulado
e nas primeiras reuniões, a igreja deve ser levada a reproduzir aquilo que
aprendeu do Senhor perante outros, seja perto, seja longe. Lembre-se
de que a Igreja ainda incipiente, somente aprenderá se você a conduzir
no evangelismo, levando os novos consigo para o alcance de outros. O
investimento em pessoas locais, passando-lhes a visão, paixão e estratégias
garantirá um processo de plantio de igrejas que vá além do missionário
ou evangelista. Irá além da sua geração.
Um projeto de plantio de igrejas não deve ser medido pelo
número de pessoas envolvidas ou na estrutura construída para tal.
Devemos medir sua solidez pela quantidade e qualidade de pessoas
locais que estão sendo discipuladas e preparadas para a liderança.
145
comportamental, educacional e social. Ele simplesmente não planejou
apenas plantar uma igreja, mas fazer dela uma comunidade que
influenciasse toda a cidade para que refletisse os valores de Cristo.
Igrejas que, ao longo dos anos não fomentam transformação
humana e social são redutos espirituais que, mesmo na busca cúltica
dos seus valores do reino deixam de ser sal da terra e luz do mundo –
ou seja, deixa de ser igreja.
Humilhação
Quando a Palavra do Senhor nos diz que Cristo se esvaziou não
devemos entender como ele tendo perdido alguma coisa, mas sim que
ele deixa de agir exclusivamente como Deus e encarna-se para, na
dependência do Espírito Santo de Deus, agir 100% como ser humano.
O estado de humilhação consiste em Cristo ter posto de lado
a majestade divina que era Sua como soberano governador do
universo ter assumido a natureza humana na forma de servo e
147
ter ficado, Ele que é o supremo legislador, sujeito às exigências e
à maldição da lei.” (Louis Berkhof – Manual de Doutrina Cristã
– página 170)
Exaltação
Como exaltado é justamente o processo inverso do seu caminho
da humilhação e é glorificado por Deus, sendo colocado no seu lugar
de direito, assentado a destra do trono de Deus.
No estado de exaltação, Cristo saiu de debaixo da lei, que era
uma obrigação pactual, tendo pagado a penalidade do pecado
e merecido a justiça e a vida eterna para o pecador. Como
Mediador começou a gozar do favor total e do bom prazer de
Deus e foi coroado com glória e honra correspondentes. (...) Sua
exaltação foi também Sua glorificação.” (Louis Berkhof – Manual
de Doutrina Cristã – página 174)
Jesus sendo Deus e como Deus, tendo a forma de Deus, deseja ser
reconhecido em figura humana, tanto que encarna homem, trazendo
assim para a vida da humanidade a presença corporal de Deus. Ele não
apenas encarna, mas o faz movido por obediência e amor. Jesus não
somente fez-se homem, mas ele possuía consciência de sua identidade
como Deus. Ele não resolveu encarnar-se acidentalmente, mas o fez
intencionalmente, pois queria encontrar-se no meio da humanidade,
tornar-se homem e com isso ele abre mão de suas prerrogativas da
identidade divina que tem para viver como homem, 100%, nada
mais, nada menos. Sua obediência voluntária e amorosa não se
limita ao fato de tornar-se parte da humanidade, mas vai até o fim,
tornando-se escravo, numa obediência forte e radicalmente oposta à
desobediência de Adão, o primeiro homem. Segue-se que após sua
completa obediência, a morte e morte de cruz, ele é ressuscitado pelo
Pai e assim, após sua ascensão é glorificado no céu, voltando ao seu
estado anterior, porém aperfeiçoado, tendo ainda em si as mesmas
naturezas que a partir da sua encarnação estão presentes em Jesus –
divina e humana.
149
evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar libertação aos
cativos e restauração da vista aos cegos, para pôr em liberdade os
oprimidos, e apregoar o ano aceitável do Senhor.” (Lucas 4.17-18).
É pelo Espírito Santo que ele oferece a si mesmo como sacrifício,
“muito mais o sangue de Cristo, que, pelo Espírito eterno, a si
mesmo se ofereceu sem mácula a Deus” (Hebreus 9.14).
Ele foi ressuscitado pelo poder do Espírito Santo de Deus,“se
habita em vós o Espírito daquele que ressuscitou a Jesus dentre
os mortos, esse mesmo que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os
mortos vivificará também o vosso corpo mortal, por meio do
seu Espírito, que em vós habita.” (Romanos 8.11).
Ele deu mandamentos aos Apóstolos por intermédio do
Espírito Santo, “Escrevi o primeiro livro, ó Teófilo, relatando
todas as coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar até ao dia
em que, depois de haver dado mandamentos por intermédio
do Espírito Santo aos apóstolos que escolhera, foi elevado às
alturas.” (Atos 1.1, 2).
Ele mesmo enviou o Espírito Santo para a Igreja que o recebeu a
partir do Pentecostes – “E, havendo dito isto, soprou sobre eles e disse-
lhes: Recebei o Espírito Santo.” (João 20.22).
Testemunhas
Feito isso, Jesus nos outorgou o poder do Espírito Santo para ser
testemunhas dele e cumprirmos nossa missão – “recebereis poder, ao
descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas” (Atos 1.8).
Ser testemunha de Cristo não significa simplesmente que é alguém
que viu Jesus e pode então falar dele pra outros, mas é alguém que,
identificado com Jesus, pelo poder do Espírito Santo de Deus, pode
então viver uma vida semelhante à dele mesmo, tem poder e autoridade
1
para viverem o Reino de Deus, viver uma vida de transformação da
realidade através de suas vidas – a nova humanidade.
Sendo assim, cada um de nós deve entender (e assim viver!)
da mesma maneira que Jesus viveu, ou seja, dependendo completa e
totalmente do Espírito Santo de Deus, que nos capacita, que habita em
nós e que então nos transforma dia-a-dia na imagem de Jesus, e essa
separação que existe em nós, de uma vida espiritual e outra, a normal
é algo que não vemos em Cristo, onde o fato dele encarnar o faz viver
integralmente. Essa dicotomia também permeia a obra da Igreja, ou a
Missio Dei, fazendo com que a Igreja separe da obra de salvação aquilo
que denominamos de obra social, o que é inconcebível na vida do
Senhor Jesus Cristo.
“... no ministério público de Jesus, estas duas realidades (evangelização
e ação social) são inseparáveis, pelo menos nas sociedades livres, e
raramente teremos de optar entre uma e outra. Em lugar de estarem
em competição, elas se sustentam e fortalecem mutuamente, numa
espiral ascendente de preocupação crescente” 2
1
Mateus 28.19 – “todo poder e autoridade me foi dada nos céus e na terra” juntamente com
Lucas 9.1, 2 – “Tendo Jesus convocado os doze, deu-lhes poder e autoridade sobre todos os
demônios, e para efetuarem curas. Também os enviou a pregar o reino de Deus e a curar os
enfermos.”.
2
EVANGELIZAÇÀO e responsabilidade social: Relatório da consulta internacional realizada em
Grand Rapids sob a presidência de John Stott. 2. ed. V.2. Série Lausanne. São Paulo/Belo Horizonte:
ABU/Visão Mundial, 1985.
151
Essa dicotomia é devido a fatores externos de influência,
principalmente no que vemos na filosofia platônica “argumentando que
o ser humano é essencialmente um ser espiritual e que apenas tem conexão
funcional com um corpo que, na melhor das hipóteses, é um impedimento
e, na pior, um grande mal”. 3 Trazendo para mais perto de nós, vemos
que a influência da ação missionária tem sido grandemente produtora
da dicotomia que importa o evangelho, ora destruindo, ora ignorando
a cultura, não “deixando” que Deus se manifeste culturalmente, sendo
que se cria então um evangelho alienante e alienígena e um abismo
entre a vida evangélica e a vida comum do filho de Deus no meio da
sociedade; além disso, a própria teologia sistemática que é por demais
espiritualista, mas o que enxergamos na Palavra de Deus é que “a salvação
que afirmamos usufruir deve produzir em nós uma transformação total,
em termos de nossas responsabilidades pessoais e sociais. A fé sem obras é
morta” (O PACTO DE LAUSANNE, V).
George Eldon Ladd afirma que “o reino de Deus é o domínio
redentor de Deus, ativo dinamicamente, visando estabelecer seu
governo entre os homens, e que este Reino, que aparecerá como um
ato apocalíptico na consumação dos tempos, já entrou para a história
humana na pessoa e missão de Jesus com a finalidade de sobrepujar o
mal, de libertar os homens do seu poder e propriciar-lhes a participação
das bênçãos da soberania de Deus sobre suas vidas” (Teologia do Novo
Testamento, página 87 – grifo meu).
Essa maneira espiritualista de enxergar o reino, deixando de fora
tudo o que a Igreja tem para participar e realizar do Reino, sua Missão,
faz com que tenhamos uma vida cristã dissociada do bem estar do
outro – somos ensinados a fazer o bem para os da “família da fé”
somente e o restante como sendo apenas alvo de nossa evangelização
e busca pelo perdido.
3
Josivaldo de França Pereira – Artigo publicado – Revista Online Missões
153
ou temporal – o que ele realmente nos mostrou com sua vida é que o
Reino deve ser vivido em todos os aspectos e oportunidades que vida
tenha, sendo que essa é a verdadeira vida da Igreja.
“Portanto, se a igreja pretende evangelizar a sua sociedade secular
circundante, ela precisa encarnar-se nesta” (Caio Fábio D´Araujo Filho,
no livro organizado pelo Valdir Steuernagel – A missão da Igreja –
Artigo: A missão da igreja e o ministério da evangelização – página 65).
Cumprir o mandato do Senhor Jesus é justamente andar pelo
caminho que ele andou, sendo sal e luz da terra – “a igreja não pode
ser, de modo algum, uma comunidade paralela ao mundo. Não somos
sal do sal, nem luz da luz; somos sal da terra e luz do mundo” (Idem
citado acima).
Evangelização é muito mais que uma simples proclamação
de uma verdade acerca de Deus, de seu Filho, da sua salvação e
redenção – evangelizar é viver esse evangelho, que é uma vasilha onde
encontramos os valores de Deus.
Como diz René Padilla – “O conceito de Igreja como uma entidade
‘separada’ do mundo se presta a toda sorte de falsas interpretações. (...)
Urge a recuperação de uma evangelização que faça justiça ao binômio
mundo/igreja, visto na perspectiva do evangelho: uma evangelização
que se oriente para o rompimento da escravidão do homem no mundo e
que não seja uma expressão da escravidão da igreja ao mundo”. (Missão
Integral – página 22).
“A salvação é o retorno do homem a Deus, mas é também o retorno
do homem a seu próximo” (René Padilha – Missão Integral – página
32). A encarnação de Jesus faz-se o início desse retorno do homem
para o seu próximo; Jesus vem com o intuito de estar perto de nós,
de viver a nossa vida, de morrer a nossa morte, pra que vivamos em
novidade de vida. O Espírito Santo nos capacita a isso, assim como
capacitou Jesus a viver na dependência de Deus e fazer sua vontade
– e essa é nossa Missio Dei – esta é a Missão da Igreja, uma missão
integral e isso acontecerá quando entendermos que Jesus não é apenas
o Salvador do mundo, mas também é o seu Senhor e vivamos essa vida
sendo sal da terra e luz do mundo, em novidade e em justiça.
155
“... e entoavam novo cântico dizendo:
digno és de tornar o livro e abrir-lhe os selos,
porque foste morto e com o teu sangue
compraste para Deus
os que procedem de toda tribo,
povo, língua e nação”
Apocalipse 5:9
A. “IGREJA DE DEUS”
UMA PERSPECTIVA DE POSSE
Comumente encontramos no N.T. a expressão “Igreja de Deus”
1
, o que evidencia que esta Igreja veio de Deus e pertence a Deus. É
uma comunidade que possui Deus como fonte; é eterna, espiritual e
universal. Não provém de elucidações humanas ou de uma obsessão
nutrida por um gripo de loucos há vinte séculos, antes, porém foi
articulada por Deus, formada por Deus, é pertencente a Deus e está
ligada a Deus. Independente das deturpações da fé, das ramificações
que se liberalizaram, dos que se perderam pelo caminho, a Igreja
permanece, pois, é posse de Deus.
O misterioso princípio bíblico sobre a “Igreja de Deus” transcende
a esfera da lógica otimista, contrapõe a filosofia do acaso e chega ao
único lugar onde a teologia bíblica poderia nos levar: à Redenção aos
pés do Cordeiro. Jesus não somente é a Rocha sobre a qual a sua Igreja
está edificada, como também é a Inspiração para que esta Igreja viva.
O viver contracultural e inquietante de Jesus inspiram a Igreja em seu
caminho de glorificar a Deus. A mensagem do Mestre fala sobre uma
forma diferente de viver, uma forma “evangélica”, onde o marido não
domina sua esposa, ama-a; onde o perseguido não odeia aquele que o
persegue, antes ora por ele; onde o líder cristão não exerce domínio
sobre o seu rebanho, mas serve-o; onde a comunidade dos santos não
organiza revoluções contra as más autoridades, porém intercede por
elas; onde o menor é o maior; onde morrer é um ganho; onde só se
torna forte os que reconhecem a fraqueza; onde se anda duas milhas
com quem te obriga a andar uma e vira-se a outra lace a quem te fere;
onde não há apego a este mundo, pois, todos são peregrinos; onde a
terra natal é desconhecida, a garantia é uma promessa e só se alcança
a vida eterna quem primeiro morre.
Era o nascer de uma comunidade onde homens ricos paravam de
roubar para devolverem o dinheiro até quatro vezes mais aos que foram
157
ludibriados; mulheres adúlteras largavam suas vidas de promiscuidade
e transformavam-se instantaneamente em testemunhas; pescadores
largavam suas redes para seguirem um carpinteiro de Nazaré; muitos
vendiam tudo o que tinham para distribuírem entre os que nada
possuíam, milhares morriam crucificados ou queimados por se
recusarem a negar o seu Senhor o qual nunca haviam visto face a face.
Esta sem dúvida é a “Igreja de Deus”, uma Igreja Visionária!
B. “HUMANIDADE DA IGREJA”
UMA PERSPECTIVA DE FORMAÇÃO
Dentro deste termo – “Igreja” – também nos deparamos no
N.T. com um conceito humano/social. Em 1 Tessalonicenses 1:1, por
exemplo, encontramos “Igreja de Tessalônica”2 que originalmente
dá-nos a idéia sobre alguns que ao mesmo tempo são “Igreja” sendo
também e “tessalonicenses”, cidadãos de Tessalônica.
Mostra-nos o fato de que por serem “Igreja” não significa
que deixam de ser cidadãos, patriotas, carpinteiros, lavradores,
comerciantes, desportistas, pais de família, esposas ou filhos. A “Igreja”
no N.T. não é apresentada como uma comunidade alienante, mas como
uma comunidade que abrange o homem em seu contexto humano.
Necessitamos entender que a Igreja não foi retirada do mundo, mas
purificada dentro dele.
Quando olhamos esta “Igreja” dentro de um prisma mais
humano e menos alienante, entendemos que a Santidade pessoal, e
não a estrutural social, é o cerne da vida da Igreja.
A cada dia estou mais convencido de que a Santidade ao Senhor
é a condição Bíblica para a proclamação do evangelho a todos
os povos numa perspectiva eclesiológica. Muitos poderão enviar
missionários ao mundo, mas apenas um povo santo fará isto movido
pela compaixão que brota do coração, muitos poderão falar ao mundo
da glória de Deus, mas apenas um povo santo, ao fim, dará glória a
Deus, muitos poderão andar dezenas de milhares de quilômetros para
falar das boas novas de salvação, mas apenas um povo santo andará
com Deus; muitos poderão preparar-se em altos cursos teológicos,
culturais, missiológicos e lingüísticos. Sentindo-se preparados e
C. “IGREJA LOCAL”
UMA PERSPECTIVA DE EXTENSÃO
Também encontramos no N.T. o conceito de Igreja local. Em 1
Co 1:12 vemos, por exemplo, a expressão “Igreja que está em Corinto”
3
, quando “que está” 4 indica a localidade da Igreja. Entretanto este
termo não expressa que a Igreja esta condicionada ao local. “Que está”
não indica que a Igreja pertence à Corinto, mas sim que os santos de
Corinto pertencem a Igreja.
Precisamos entender que a “Igreja”, numa perspectiva de extensão.
Localiza-se onde estão os santos e não onde estão os templos.
Lembro-me que estava na região de Nabukorá, noroeste do Togo,
a caminho da aldeia de Molani, quando algo interessante aconteceu.
Após andar sozinho por vários dias, cerca de 120 km de área não
habitada, cheguei junto a um rio e montei um pequeno acampamento.
Estava acendendo uma fogueira quando comecei a sentir uma forte
159
opressão demoníaca. Um terrível peso no coração e uma nítida sensação
da presença maligna naquele lugar, e somente após um longo período
de oração consegui sentir novamente a paz do Senhor. Isto já havia
acontecido 2 vezes antes quando estávamos próximos de comunicar o
evangelho pela primeira vez em aldeias até então não alcançadas pelo
evangelho. Mas algo peculiar acontecera desta vez, bem simples, mas
que para mim evidenciou um grande princípio da batalha espiritual.
Eu estava cerca de 80 km de distância de qualquer aldeia ou grupo
de pessoas. Era uma área inabitada. Eu estava sozinho. Até onde sei,
aquela área nunca fora habitada antes; não havia fetiches ao meu redor
ou lugares onde eram praticadas cerimônias animistas. Ao contrário
de Deus, Satanás e seus demônios não são onipresentes, limitam-se
ao espaço; em termos práticos, não havia qualquer “interesse maligno
local” naquela arca. Poderia concluir-se que: eu havia sido seguido,
possivelmente passo a passo, durante 120 km, por algum ser maligno
portador de alguma missão destrutiva.
Apesar de não haver nada de novo nisto, este fato ganhou
um tremendo peso para mim pelo contexto em que me encontrava
e levou-me a relembrar o conceito Bíblico de que a Igreja localiza-
se onde estão os santos e não onde estão os templos. E é ali, entre
os santos, que é travada a luta, onde se experimenta o cansaço das
batalhas, a glória das vitórias, o dissabor do pecado e seja em uma
mata distante ou no centro de uma cidade, que a oração, o louvor, a
adoração e o testemunho da Palavra transformam templos de concreto
ou choupanas de palha em lugar santificado; não pelo material com
que foram construídos, mas por ser ali que se ajunta o povo de Deus
para adoração.
A Igreja evangélica hoje possui uma forte tendência de “localizar”
a Igreja, condicionando-a tão fortemente à sua cidade ou seu bairro
que alguns chegam a impedir a realização de trabalhos “fora da sua
jurisdição local”. E há até mesmo aqueles que chegam a demarcar até
onde pode ir o trabalho da Igreja. Necessitamos compreender que num
conceito neotestamentário “Igreja” é uma comunidade sem fronteiras.
Creio, portanto, que há assim uma necessidade de sacrametalizarmos
mais os “santos” e menos os “templos”.
161
Creio que é este o conceito que vemos na missiologia
neotestamentária: até a última fronteira.
Vejamos, portanto um pouco do que é narrado sobre a Igreja
neotestamentária, a qual explodia no mundo conturbado do primeiro
século.
ATOS 1
Um dos assuntos mais enfáticos de Jesus Custo era o Reino de
Deus. Falava aos discípulos sobre o Reino presente e futuro e sobre sua
escolha de homens para a ação neste Reino. Após morrer Ele ressurgiu
e passou 40 dias falando-lhes ajuda sobre este Reino. No momento de
subir aos céus houve um dialogo decisivo entre Cristo e seus discípulos:
163
e presente - com emoções, expectativas. Que sentem a dor, desespero
e angústia de forma intensa e olhos chocados por terem presenciado
tantas atrocidades nesta guerra tribal.
Eu estava em grande ativismo durante estes dias, organizando
a recém nascida Igreja em Cráchi, tentando estruturar a aldeia
para receber tantos refugiados e usando os poucos remédios que
dispúnhamos para suprir a grande demanda de pessoas que chegavam
a cada instante. Certa noite parei e me espantou ver que não havia
vertido nenhuma lágrima perante tamanha dor. Sentia pena daquelas
mulheres e estava trabalhando dia e noite para ajudá-las, entretanto
não conseguia chorar por suas dores. Fui para a palhoça a fim de orar
e naquela oração fui confrontado por Deus. Orei por minha família,
pela pequena Igreja que estávamos plantando em Cráchi, por um
ministério de poder e autoridade, mas não conseguia orar, orar de
verdade, com o coração, mente e alma, por aquelas mulheres. Algo
me incomodava. Algo faltava. Ali estava eu, missionário entre a tribo
Konkomba, no meio de uma aldeia Konkomba, sem poder orar por
um grupo de mulheres Konkombas. Foi então que o Senhor ministrou
fortemente uma palavra ao meu coração: Ninguém é capaz de orar
por milhões de vidas que perecem sem Cristo se não consegue chorar
sequer por uma delas. Fiquei desmontado por dentro e não acabei
aquela oração. Fui até a periferia da aldeia onde estavam dezenas
daquelas mulheres. Muitas eram Konkombas, outras Bassaris e ainda
outras Nawris. Encontrei uma que falava o dialeto compatível com o
meu e sentei-me ao seu lado. Era uma mulher baixa, muito magra,
com uma criança recém-nascida nos braços e olhar fixo em frente. Fia
estava tremendo e suando e sem que nada lhe perguntasse ela começou
a falar. Narrou como perdera seus outros filhos quando a palhoça em
que morava fora queimada em sua aldeia mais ao norte, falou como se
esforçou para correr com a filhinha recém-nascida e outra de três anos
que fora flechada já fora da aldeia, contou sobre o paradeiro do seu
marido: era um guerreiro Konkomba e já por dois meses havia viajado
para a região de maior conflito; falou sobre medo, pavor, angustia
e por fim desesperança. Tudo isto entrava em meus ouvidos e algo
forte era ministrado ao meu coração. No meio do burburinho de um
campo vasto, com pouquíssimos missionários, somos levados a tratar
ATOS 2
Creio que o Pentecostes em Atos 2, quando o Espírito Santo
desceu permanentemente sobre a Igreja é um marco para entendermos
o piano de Deus para o seu povo.
165
Vemos que justamente nesta época do Pentecostes (Festa Judaica)
estavam reunidos em Jerusalém os chamados Judeus da dispersão
(2:5), os quais habitavam em mais de 14 regiões diferentes e certamente
conheciam diversas línguas gentílicas. Lucas dá-se ao trabalho de registrar
que eram “partos, medos e elamitas e os naturais da Mesopotâmia,
Judéia, Capadócia, Ponto e Ásia; da Frigia e Panfilia, do Egito e das
regiões da Líbia nas imediações de Cirene, e Romanos que aqui residem,
tanto judeus como prosélitos, cretenses e arábios...” (v. 9-11) e que esta
multidão, presenciando a descida do Espírito na Igreja de Cristo ficou
perplexa porque ouviam o que era falado pelos discípulos “cada um em
sua própria língua materna” (v. 8). Qual era a mensagem que ouviam?
No v. 11 Lucas registra que eles ouviram as “grandezas de Deus”.
Com certeza Deus havia preparado as circunstâncias para o
primeiro testemunho transcultural da Igreja revestida. Os dispersos
que ali estavam para a festa chamada Pentecostes e que presenciariam
a descida do Espírito Santo, em pouco tempo voltaria para as etnias das
quais vieram, pois estavam ali de passagem e, quando lá chegassem,
seriam pessoas conhecedoras das “grandezas de Deus” na língua nativa
daqueles povos, propiciando o testemunho a cada etnia.
Devemos perceber que Deus queria mostrar algo com isto e creio
que a Igreja de Atos entendeu:
a) Que a descida do Espírito não veio apenas como uma
“experiência para edificação dos salvos” tuas como um “revestimento
para que a Igreja testemunhe com poder”;
b) Que a primeira ação do Espírito Santo na Igreja ainda durante
o Pentecostes foi impulsiona-los a testemunhar, falando das “grandezas
de Deus”;
c) Que este primeiro testemunho da Igreja revestida foi
transcultural, feito em línguas gentílicas para os judeus dispersos em
países remotos, entre povos ainda não alcançados.
d) Que “até aos confins da terra” era o alvo de Deus para a sua
Igreja após o “recebereis poder ao descer sobre vós o Espírito Santo”.
Parece-me claro que desde o inicio da vida da “Igreja revestida”
Deus conduzia o seu ministério a uma visão do Reino, a uma visão dos
povos, a uma visão do testemunho como resultado de um avivamento,
a visão dos confins. Deus preparava uma IGREJA VISIONÁRIA.
167
são poderosos e podem ouvir - não os confronte”. Daí normalmente eu
passaria a falar-lhes sobre “Uwumbor Aagbang” - a Palavra dinâmica
de “Uwumbor Aa Ni” - o Poder de Deus, mas desta vez foi diferente.
Wali olhou para aqueles fetiches em seu compound, balançou a cabeça
e disse: “Também acho”.
Fiquei desconcertado e nem sabia bem o que falar, quando ele
passou a contar-me que há cerca de 6 meses atrás houve uma grande
tempestade ali, quando um raio caiu exatamente sobre as duas árvores
fetiches que erguiam-se no meio da aldeia onde eram feitos todos
os sacrifícios e derrubou uma delas, cortando-a pela raiz. A partir
daquele dia ele começou a questionar o poder dos fetiches. “Ou
aquelas árvores não eram fetiches” - dizia ele – “ou o poder do raio
é maior que o poder dos fetiches”. Aproveitei o momento e disse: “Eu
tenho uma história que quero contar a você sobre Uwumbor (O Deus
Presente) e o início dos tempos quando Ele criou a terra, os céus, os
homens e os raios”. Passamos algumas horas juntos e ao fim de toda a
explanação ele levantou-se e entrou em sua palhoça sem nada dizer.
Entre os Konkombas isto significa que foi importante o que ouviu e que
pensaria sobre isto. Senti que aquele homem e outros que ali estavam
haviam sido tocados pelo Espírito Santo de Deus. Hoje a Igreja de
Cráchi conta com mais de 100 pessoas e Wali é o presbítero mais ativo.
Nascia em Cráchi uma Igreja local evidenciando que é o Senhor,
e não homens, que soberanamente tem plantado a sua Igreja dentro do
princípio que Ele mesmo proferiu: Para o alcance de homens de toda
tribo, povo, língua e nação. Uma Igreja Visionária!!
ATOS 8:26-40
Neste texto Lucas inicia uma narração sobre Felipe, o diácono.
No capitulo 8 mostra a Igreja sendo perseguida em Jerusalém (pois a
Igreja não havia saído de lá!) e sendo dispersa pelas regiões da “Judéia
e Samaria” (v. 1), onde os crentes que foram dispersos “iam por toda
parte pregando a Palavra” (v.4). Após falar sobre a ação de Pedro e João
em Samaria, onde o evangelho também deveria chegar (segundo Atos
1:8), Lucas começa a falar do diácono Felipe. Narra que um anjo do
Senhor o enviou a “banda do sul, no caminho que desce de Jerusalém
169
ATOS 13
Vimos que durante o Pentecostes e no episódio com o Etíope, Deus
reafirmou o desejo de que Sua Igreja possuísse uma atenção especial
quanto ao testemunho transcultural. Esta preocupação transcultural,
portanto não é registrada apenas no V.T. e em alguns textos do N.T.,
mas em especial durante o nascer da Igreja Crista seu revestimento
de poder e sua vida Fica claro que uma comunidade visionária é uma
comunidade que vê o mundo como campo e se propõe a ara-lo na força
do Espírito. E uma comunidade com um ministério transcultural.
Não pensemos, porém que a Igreja de Atos era uma Igreja
sedenta de cumprir a visão transcultural de Deus, ao contrário vemos
claramente que esta Igreja relutava em participar desta visão. Mesmo
após o revestimento de poder no Pentecostes eles relutavam em sair da
Judéia; Pedro relutou em testemunhar a Cornélio, um romano; mesmo
após a perseguição a Igreja os apóstolos relutavam em abandonar
Jerusalém e até quando foram dispersos muitos cristãos relutavam em
testemunhar a outros que não fossem Judeus.
Em Atos 13, porém inicia a narração da Igreja de Antioquia uma
Igreja formada em grande parte pelos dispersos de Jerusalém a qual
estendeu-se depois a crentes vindos de todos os lugares e desta forma
certamente ela não possuía os preconceitos étnicos como a Igreja de
Jerusalém. Parece-nos que Deus em Atos 13 levantava unia Igreja
gentílica para cumprir Sua visão transcultural a qual permanecia
embrionária entre os crentes em Jerusalém.
Quanto a Antioquia, nem tudo era fácil.
a. Antioquia era uma cidade em expansão e o cristianismo era
recente ali, necessitando desta forma de todo ajuda possível para a
sustentação da Igreja local;
b. A situação política era instável por toda a região em decorrência
das estratégias romanas quanto à integração do Império. Digamos que
havia dificuldades na política externa;
c. A situação econômica da Igreja local certamente era precária
pelo lato da grande maioria dos seus membros serem imigrantes e,
portanto ainda não estabelecidos;
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