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A moral importa?
(2005)
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A moral importa?
Cláudio D. Shikida *
Ari Francisco de Araujo Junior**
Pery Francisco Assis Shikida ***
Resumo
Introdução
chamar a atenção para a questão do efeito crowding out sobre a ação dos indivíduos.
Akerlof & Dickens (1982) e Caplan (2001a, 2001b) são bons exemplos deste tipo de
*
Professor do Curso de Ciências Econômicas do IBMEC-MG. Rua Paraíba, 330, térreo. CEP: 30130-
140. Belo Horizonte, MG. E-mail: claudiods@ibmecmg.br
**
Professor do Curso de Ciências Econômicas do IBMEC-MG. Rua Paraíba, 330, térreo. CEP: 30130-
140. Belo Horizonte, MG. E-mail: AriFAJ@ibmecmg.br
***
Professor do Curso de Ciências Econômicas e do Mestrado em Desenvolvimento Regional e
Agronegócio da UNIOESTE-PR. Rua da Faculdade, 645. CEP: 85.903-000. Toledo, PR. Bolsista de
Produtividade em Pesquisa do CNPq. E-mail: pfashiki@unioeste.br
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Basicamente, este modelo considera que existem motivações intrínsecas ao
destacar que o tipo de intervenção externa não é representado apenas pelo sistema de
preços (incentivos monetários) mas também, por exemplo, por algum tipo de
motivações intrínsecas dos indivíduos. Efeitos crowding out são indesejados pois
de políticas públicas.
indivíduo.
Evidências sobre a relevância empírica de seu modelo são resumidas por Frey
(1997) e Frey & Jegen (2001) em problemas de mercado de trabalho (shirking, oferta de
bens de uso comum (dever cívico, cuidados com o meio ambiente) e problemas de
Heckman (1979) para uma base de dados montada a partir de entrevistas com
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presidiários. A próxima seção apresenta o modelo de Frey (1997). Depois são
O Modelo Teórico
em que:
B = benefícios (utilidade);
P = quantidade/intensidade de performance
C= custos
dP * B PE − C PE
=
dE B PP − C PP (1a)
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Este é exatamente o resultado encontrado em Frey (1997). A existência do
crowding out, também chamado por Frey de hidden cost of the reward (money) ocorre
dP *
<0
quando se tem BPE < 0 e podendo ser reforçado quando CPE = 0, o que gera dE .
dP *
>0
tradicionalmente estudado em modelos de agente-principal: dE .
Um terceiro caso ocorre quando os dois efeitos estão presentes, i.e., BPE, CPE < 0.
dP *
Neste caso, o sinal de dE fica indeterminado.
O principal, por sua vez, procura maximizar seu lucro líquido. Seu problema é
resumido a seguir:
Em que:
π = lucro;
K = custos.
ótimo. Assim, uma vez que o principal saiba o efeito de sua intervenção sobre a
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Note que BPE = 0 é exatamente o que se supõe no modelo microeconômico tradicional.
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performance do agente, ele escolhe o nível ótimo de intervenção. Resolvendo-se a
−1
dK dπ dP * dπ dK B PE − C PE
= → =
dE dP dE dP dE B PP − C PP (3)
Dado o resultado acima, uma sugestão para a análise empírica seria através da
Mesmo em problemas nos quais existe apenas o agente o modelo de Frey (1997)
faz-se relevante. Por exemplo, em termos da economia do crime, teríamos que o efeito-
preço (punição) poderia até ser importante sobre a ação do criminoso violento (agente),
como tradicionalmente se postula, mas também existe o caso em que este efeito seja
criminoso acredita que o que faz é correto, isto o torna mais inelástico aos custos de sua
ação. Da mesma forma, a moral pode operar no sentido oposto, fazendo com que o o
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Metodologia Econométrica
*
Y1i = X 1i β 1 + ε 1i (1)
*
Y2i = X 2i β 2 + ε 2i (2)
vetores de coeficientes a serem estimados e ε1i e ε2i são os termos de erro. As variáveis
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Ver, por exemplo, Iannaccone (1988).
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* Y1i = 1, se usou arma de fogo,
Y1i = (3)
Y1i = 0, caso contrário.
Criminosos violentos, dados X1i e X2i, são menos propensos à prática religiosa. Neste
E assim:
[ ]
E Y1i X 1i , Y2i = 1 = X 1i β 1 + E [ε 1i ε 2i ≥ − X 2 i β 2 ]
*
(6)
8
Isso significa que a regressão da equação na amostra selecionada depende tanto
a hipótese de que ε1i e ε2i tenham distribuição normal bivariada podemos derivar a
seguinte equação:
[ *
]
E Y1i X 1i , Y2i = 1 = X 1i β 1 + ρσ 1 λi (7)
φ (X 2i β 2 σ 2 )
λi = (8)
Φ (X 2 i β 2 σ 2 )
A solução proposta por Heckman (1979) [e por Van de Ven e Van Pragg (1981)
para probit bivariado com censura] é uma estimativa de (7) em duas etapas. Na primeira,
estima-se os parâmetros de (2) pelo método probit usando a amostra toda. Tais
estimativas são usadas para computar λi para cada indivíduo. Uma vez computados os λi
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podemos estimar (7) sobre a amostra de indivíduos religiosos por meio de outro probit
Vale ressaltar que o sinal do viés de seleção depende da correlação (ρ) entre os
que, sendo válido o modelo de Frey (1997), o sinal de ρ será negativo, ou seja, a moral
Fontes e Dados
(PFP) do estado do Paraná, por meio de dados primários obtidos via aplicação de
econômicos. Cumpre dizer que o estudo de caso caracteriza-se pela identificação dos
fatores que determinam ou que contribuem para a ocorrência dos fenômenos analisados.
Com as informações fornecidas pela PCP, PEP e PFP, foi feito minucioso
estudo dos detentos aí residentes, via prontuários (em que se separou o crime econômico
do não econômico), e por meio de uma avaliação da condição penal (ou seja, foram
pela tipicidade de suas ações, procurando caracterizar nesta amostra perfis de “grandes”
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segurança e devido ao tempo gasto com cada pesquisado (em média 30 minutos), além
A amostra foi composta por 80% dos indivíduos do sexo masculino (o universo
masculino é bem maior no ambiente carcerário), 30% eram muito jovens (18 anos). Do
total de condenados entrevistados, 55 % tinha arma de fogo mas 48% utilizaram a arma
evangélicos. Além disso, 25% dos detentos da nossa amostra afirmava ter mudado de
religião.
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Estatísticas descritivas e correlações bivariadas encontram-se nos Quadros 1 e 2 do Anexo.
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Ver Gil (2000).
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arma_uso = 1, caso o indivíduo tenha feito uso de arma de fogo na atividade que o levou
a ser preso,
escolhidos como em Shikida et alii (2005). São eles: dummies de gênero (masc), jovens
parceiro no crime (parc_crime), que é uma proxy para interação social. Na equação de
(rel_evan), ou, de forma geral, aqueles que acreditam em Deus (deus) tendem a cometer
comportamento são: possuir pais casados (casp), pais trabalhando (trabp) e acreditar em
Deus (deus)5. Novamente, para que os resultados corroborem o modelo de Frey (1997)
que indica que existe viés de seleção. Ou seja, o teste do modelo teórico deveria gerar
como resultado que a regra de decisão dos condenados por crimes violentos (com
atenuam a violência.
5
Quando a variável acreditar em Deus foi usada como variável dependente da equação de comportamento
ela deixa de aparecer como variável explicativa.
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Resultados
violência na atividade criminosa são reproduzidos nos Quadro 3 (Anexo). Foram usadas
262 observações.
masculino, que não acreditam na justiça, que possuíam arma de fogo e parceiro para o
O que mais nos interessa aqui são os resultados da correlação entre os resíduos
das duas equações. Como pode ser observado no Quadro 3, apesar da significância
estatística não ser adequada em todos os modelos, os resíduos da equação primária são
existe viés de seleção (principalmente quando a proxy para trava moral é ser católico6).
indicam que a regra de decisão dos condenados por crimes violentos (com utilização de
armas de fogo) é distinta dos demais. Pode-se observar, também, que o sinal do
resultados sugerem que indivíduos que são, de alguma forma, religiosos, têm menos
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Com nível de significância de 15% isso também é válido para o caso em que a proxy de travas morais é
acreditar em Deus.
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tendência a se envolver em crimes violentos, ou seja, “restrições” morais fazem alguma
diferença.
Conclusões
palavras, além dos incentivos tradicionais, travas morais podem alterar ou não a ação de
criminosos.
(restrições impostas pelo Estado) afetam a ação dos mesmos: há indícios de que as
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Bibliografia
FREY, B. S. Not just for the money - An Economic Theory of Personal Motivation.
UK, Edward Elgar Publishing, 1997.
FREY, B.S. & JEGEN, R. Motivation crowding theory: a survey of empirical evidence.
Journal of Economic Surveys, Volume 15, Number 5, Dec. 2001.
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Anexo
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Quadro 2 - Correlações Bivariadas entre as Variáveis Utilizadas.
| arma_uso masc id18 casp jud arma parc_crime deus rel_cat
-------------+---------------------------------------------------------------------------------
arma_uso | 1.0000
masc | 0.3326 1.0000
id18 | 0.1826 0.1107 1.0000
casp | 0.1754 0.1577 -0.1353 1.0000
jud | -0.1610 -0.0421 0.0089 -0.0867 1.0000
arma | 0.7657 0.3354 0.1474 0.1315 -0.0811 1.0000
parc_crime | 0.1989 0.0305 0.0048 0.0808 -0.0714 0.1398 1.0000
deus | 0.0089 -0.0276 -0.0373 0.0510 0.0409 0.0086 0.0168 1.0000
rel_cat | 0.0165 0.1453 -0.0824 0.1364 -0.0180 -0.0331 0.0427 0.2329 1.0000
trabp | 0.1766 0.1519 0.1562 0.1428 -0.1072 0.1474 0.0007 0.1028 0.0414
rel_evan | -0.0735 -0.2130 0.0209 -0.0191 0.0727 0.0210 -0.0027 0.0912 -0.6074
| trabp rel_evan
-------------+------------------------------------
trabp | 1.0000
rel_evan | 0.0624 1.0000
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Quadro 3 - Heckman Robust
Probit Model with Sample Selection travas morais (católico) travas morais (evangélico) travas morais (acreditar deus)
coeficientes desv pad rob coeficientes desv pad rob coeficientes desv pad rob
equação primária (arma_uso - violência)
masc 0.43 *** 0.27 0.49 0.76 0.57 * 0.14
id18 0.20 *** 0.12 0.98 0.71 0.40 *** 0.21
jud -0.34 ** 0.14 0.08 0.69 -0.49 ** 0.22
arma 1.62 * 0.15 7.59 . 2.18 * 0.16
parc_crime 0.48 * 0.10 0.45 0.65 0.57 * 0.14
constante -1.20 * 0.27 -7.94 . -2.17 * 0.14
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