Você está na página 1de 1

EU -LÍRICO EU -LÍRICO

DORME RUAZINHA… É TUDO ESCURO! ... DORME RUAZINHA… É TUDO ESCURO! ...

Dorme ruazinha…  É tudo escuro… Dorme ruazinha…  É tudo escuro…


E os meus passos, quem é que pode ouvi-los? E os meus passos, quem é que pode ouvi-los?
Dorme teu sono sossegado e puro, Dorme teu sono sossegado e puro,
Com teus lampiões, com teus jardins tranquilos… Com teus lampiões, com teus jardins tranquilos…
Dorme…  Não há ladrões, eu te asseguro… Dorme…  Não há ladrões, eu te asseguro…
Nem guardas para acaso persegui-los… Nem guardas para acaso persegui-los…
Na noite alta, como sobre um muro, Na noite alta, como sobre um muro,
As estrelinhas cantam como grilos… As estrelinhas cantam como grilos…

O vento está dormindo na calçada, O vento está dormindo na calçada,


O vento enovelou-se como um cão… O vento enovelou-se como um cão…
Dorme, ruazinha…  Não há nada… Dorme, ruazinha…  Não há nada…
Só os meus passos…  Mas tão leves são, Só os meus passos…  Mas tão leves são,
Que até parecem, pela madrugada, Que até parecem, pela madrugada,
Os da minha futura assombração… Os da minha futura assombração…
Mario Quintana Mario Quintana

É comum confundir a voz do escritor com a voz criada por É comum confundir a voz do escritor com a voz criada por
ele, o eu lírico. ele, o eu lírico.
O poeminha é de autoria de um poeta brasileiro: Mario O poeminha é de autoria de um poeta brasileiro: Mario
Quintana, que escreveu poemas para adultos e crianças. Quintana, que escreveu poemas para adultos e crianças.
Essas vozes geralmente é uma espécie de personagem do Essas vozes geralmente é uma espécie de personagem do
poema chamado de eu lírico. A palavra “lírico”, está poema chamado de eu lírico. A palavra “lírico”, está
relacionada com os sentimentos. Nesses poemas, cantam- relacionada com os sentimentos. Nesses poemas, cantam-
se emoções e versos íntimos através de um eu lírico, que é se emoções e versos íntimos através de um eu lírico, que é
quem se manifesta e expõe suas emoções e percepções quem se manifesta e expõe suas emoções e percepções
sobre a vida e o mundo. Acontece que esse “eu” que dá voz sobre a vida e o mundo. Acontece que esse “eu” que dá voz
ao poema é a criação de um poeta para apresentar as ao poema é a criação de um poeta para apresentar as
reflexões de um sujeito que discursa em primeira pessoa. reflexões de um sujeito que discursa em primeira pessoa.
Por ser um discurso construído na primeira pessoa (eu), Por ser um discurso construído na primeira pessoa (eu),
muitas pessoas acabam confundindo o eu lírico com o poeta muitas pessoas acabam confundindo o eu lírico com o poeta
que escreve os versos. Algumas vezes é o próprio poeta que escreve os versos. Algumas vezes é o próprio poeta
quem empresta sua história pessoal para o poema. É o que quem empresta sua história pessoal para o poema. É o que
acontece no poema de Carlos Drummond de Andrade: acontece no poema de Carlos Drummond de Andrade:

CONFIDÊNCIA DO ITABIRANO CONFIDÊNCIA DO ITABIRANO

Alguns anos vivi em Itabira. Alguns anos vivi em Itabira.


Principalmente nasci em Itabira. Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro. Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas. Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas. Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e E esse alheamento do que na vida é porosidade e
comunicação. comunicação.
A vontade de amar, que me paralisa o trabalho, A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem
horizontes. horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte, E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana. é doce herança itabirana.
De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço: De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil, esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil,
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval; este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas; este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa… este orgulho, esta cabeça baixa…
Tive ouro, tive gado, tive fazendas. Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público. Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede. Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói! Mas como dói!
Carlos Drummond de Andrade Carlos Drummond de Andrade

O eu lírico de Drummond cedeu lugar às memórias de vida O eu lírico de Drummond cedeu lugar às memórias de vida
do poeta, portanto, nesse caso, não se trata de uma do poeta, portanto, nesse caso, não se trata de uma
personagem inventada para dar voz às emoções de quem personagem inventada para dar voz às emoções de quem
escreve. O eu lírico está nos textos literários, que tem a escreve. O eu lírico está nos textos literários, que tem a
linguagem elaborada de maneira especial, nos quais linguagem elaborada de maneira especial, nos quais
podemos encontrar metáforas, figuras de linguagem e de podemos encontrar metáforas, figuras de linguagem e de
construção, além de uma pontuação diferenciada. O construção, além de uma pontuação diferenciada. O
universo imaginário salta das mãos de um escritor ou poeta, universo imaginário salta das mãos de um escritor ou poeta,
diferentemente do que acontece com os textos não literários, diferentemente do que acontece com os textos não literários,
que não podem ser considerados Literatura. que não podem ser considerados Literatura.

Você também pode gostar