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Resenha Crítica
SCHOPENHAUER COMO EDUCADOR
Escritos por Nietzsche próximo dos seus 30 anos de idade, então ainda jovem e
promissor professor de filologia clássica na Universidade da Basiléia, os quatro textos
que seriam mais tarde reunidos como Considerações Extemporâneas são ainda pouco
difundidos e estudados no contexto da obra nietzschiana, mas vêm ganhando cada vez
mais relevo, dado sua fundamental importância para a compreensão da filosofia de
Nietzsche em suas origens e em sua proposta. Tais textos são um momento de
exposição clara de um primeiro rompimento com a academia e os círculos intelectuais
mais tradicionais, ponto de inflexão de sua vida e pensamento, que culminaria na sua
crítica total da racionalidade e do modo de vida tipicamente europeu (ou ocidental) de
sua época. Publicados inicialmente como trabalhos individuais, as quatro
considerações exprimem uma crítica ampla à cultura alemã de seu tempo –
direcionada ao Estado alemão e àqueles que o serviam e ancorada na denuncia da
frivolidade presunçosa de uma potência imperial de matriz militarista que
desconsiderava o papel central da cultura como princípio para a elevação de um povo
ao seu mais alto potencial - e apontam, como alternativa, para um projeto pedagógico
audacioso, direcionado à criação de uma cultura pautada pelo gênio, com matriz
romântica e inspiração clássica, que elevaria o homem alemão a um revigorado e
nobre tipo de vida artístico-filosófico.
O testemunho da decadência cultural da Alemanha, que Nietzsche explicita na
crítica aos intelectuais e à formação acadêmica de sua época, é dado pelo exagero do
historicismo e por uma busca exagerada pelo conhecimento científico frio e alijado de
uma perspectiva artística e filosófica, sem a qual tal conhecimento se torna estéril para
a edificação humana, servindo apenas a si mesmo e acabado num cientificismo. Este
paradigma, então dominante, seria consequência e causa de uma cultura fraca, que
não dá vazão à dimensão criativa da vida e que, portanto, castraria a cultura alemã e a
impediria de alçar mais altos voos. Uma cultura de funcionários públicos, comerciantes
e militares, guiados por clérigos e homens teóricos altamente especializados – é esse o
panorama desenhado por Nietzsche, ao qual ele volta sua censura.
É na terceira e na quarta extemporânea – Schopenhauer como educador e
Richard Wagner em Bayreuth, respectivamente - que Nietzsche adquire um ar mais
propositivo junto às severas críticas. Nietzsche descreve-as, mais tarde, no Ecce
Homo, como:
É para emancipar-nos das amarras que nos atam à sociedade e nos impedem
de voltar-nos objetivamente a nós mesmos que é posta a figura do educador. Logo,
não é na imitação ou na mera reprodução de um mestre que se encontra o caminho de
uma educação superior, mas na utilidade do exemplo de emancipação individual. É na
conquista da liberdade que começaria o processo de formação, liberdade que é
revelada pelo mestre, por aquele que já se encontra emancipado e que serve como
farol na escuridão dos estabelecimentos de ensino e da e uma cultura decadente.
Aqui se faz importante compreendermos o que significa, para Nietzsche, a figura
do gênio. Este tipo de homem mais elevado não é entendido como alguém dotado
apenas de uma superioridade natural, uma condição inata ou um talento genial. O
filósofo nos apresenta o gênio como aquele que foi capaz de moldar sua própria
natureza, com dedicação e esforço. O gênio é aquele que de certa forma se manteve
independente das estruturas de poder e das convenções sociais e que se manteve fiel
a si mesmo, para, a partir disso, desenvolver-se em seu máximo, alcançando um
patamar superior de saber e de relação com a vida, podendo assim ser tomado como
mestre. Nietzsche nos deixa a indicação das condições necessárias para o surgimento
deste tipo de homem: