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ACIDADE DO SALVADOR g =e % ° o a > a ec a a > Z Fe ' = ni O° UM “HOMEM DO Povo, ESCREVENDO PARA O POVO" _ A merecida homienagem que a Cie j uzacko BRasitema e 0 INstITUTO NAcio- ih. . NAL Do Livro vém prestando & memoria de Edison Carneiro com a reedi¢ao de alguns de. seus livros fundamentais cons- titui, a0 mesmo tempo, trabalho cultural de extraordinéria relevincia para a cul- tura_ brasileira Modesto, discreto, umi tanto ou quan- ‘0 timido, © cientista social baiano legou 4 seu povo, sem qualquer alarde, um corpo de obras que abrange variados’ cam- q ¢ Pos de pesquisa e atuagdo, em todas elas tevelando absoluta integridade intelectual © criativa imaginagdo critica. Tendo-se tornado famoso nacional internacionalmente como uma das maio- Tes autovidades no setor dos estudos fol- cloricos, Edison Cameiro foi também his. {oriador, socidlogo, mestre em ciéncia po- Wica, além de escritor, jornalista e tra- dutor de excelente nivel. Potado de invulgar capacidade de itabalho, apesar de sua satide nem sem. Pre Ihe permitir tio grandes esforcos, ele ¥ amava sua patria e, sempre que pode, Yitlava por todos “os seus quadrantes, ’ Nio sendo um homem de sabinete, ele Gueria ver de perto a realidade, conver. far com as pessoas, conhecer-Ihes os hd- bites alimentares, a’ visio do mundo que linham, as formas ¢ estilos de suas cna. ses artisticas, a dim blemas existenciais. Pr ison Cameito, por tudo isso, foi hm ‘homem cuja capacidade intelectual Sempte esteve dedicada a0 servigo do. po- 1 preniasileito © de suas causas: a tuta pela j Plenitude democrética, a afirmagao da'na: i Fraatlidade, a busca’ de plena¢. efetiva independéncia interna e externa, uy Fstio reunidos neste volume dois de re gaivfos. mais importantes: A ‘Crane DO SALVADOR 1549) — Uma Reconstitui~ ensdio_de seus pro- A Cidade do Salvador (1549) 4 Uma reconstituicao histérica ‘ A Conquista da Amazénia Colegio RETRATOS DO BRASIL ‘Volume 146 Edison Carneiro A Cidade do Salvador (1549) Uma reconstituicéo histérica ‘ 28 Edicio A Conquista da Amazénia 2 Edicaio Em convénio com o INSTITUTO NACIONAL DO LIVRO MinisTéxio Da EpucacKo E CULTURA Cameiro, Edison A Cidade do Salvador, 1549 : uma _reconstituigso siren 4A. conqubta da Amazdnia. "Euan Camere, Sat, tt — Rio de Janeiro! Ciileacao Brasles Brasilia : INL, 1980, = “ 2886 (Colegio Retratos do Brasil ; vy. 146) Duas obras reunidas em um volume 1. Amazinia — Descriga scrigiio e viagens 2. Salvador — MitGria T. Instituto Nacional do Livro I ‘Titulo III. tulo: A Conquista da Amazonia IV. Série cop — 981.1 a suai civilizaggo cou — 581 a CCF/SNEL/RI-80-0661 — brasileira ~"3393° Exemplar Capa: Douné Revisio: Cristina M. Pats pa CuNHA ¢ Luiz AUGUSTO Mesquita MARIO ELBER Dos S. Cunia Direitos desta edicdo reservados a EDITORA CIVILIZACAO BRASILEIRA §.A. Rua Muniz Barreto, 91/93 RIO DE JANEIRO — Ry 1980 Impresso no Brasil Printed in Brazil Sumario Noticia Biogréfica do autor Bibliografia - Historia DA CIDADE Do Satvavor (1549) I Me Vila Velha 1. Gramatio Teles 2. A capitania da Bahia 3. O donatério Pereira “A terra dard tudo” Caramuru e¢ os infortinios do Rusticéo clérigo Bezerra “Um grao ribaldo” © naufrégio em Ttaparica Reverso da capitania 4 Coroa Outros galos cantavam Governo Geral ‘A armada do governador Tomé de Souza Funciondrios do governo geral Oficiais da Cidade Posse ‘Adiantamentos de dinheiro “Prés e percalcos” Eserivies 6. Ts 8 9. 0. oO 1 2. 3. 4, 5. 6. 7 % A CONQUISTA DA AMAZONIA 1. Os escravos do tio 157 II. A populacdo da Amazénia 163 I. Amazonia — capital, Belém 181 IV. 0 cavalo de Attila 191 V. © quadro agricola 199 VI. Economia predatéria 209 VII. A sabedoria popular 24 VIII. Perspectiva 27 Notas finais 231 ‘Amazbnias 231 Comissio_Carapand 231 Bibliografia 232 Anexos A Zona Bragantina 237 Benjamin Constant — Aspectos circunstanciais 249 Benjamin Constant — Notas e observagdes de viagem 259 Maranhio — Comissio Carapana 273 Noticia Biografica do Autor Nascido na cidade de Salvador, Bahia, a 12 de agosto de 1912, Edison de Souza Cameiro fez todos os seus estudos na ‘capital baiana, até diplomar-se em Ciéncias Juridicas ¢ Sociais ‘Pela Faculdade de Direito da Bahia em 1936 (turma de 1935). Scus pais foram o engenheiro civil Antdnio Joaquim de Souza Carneiro, catedrético da Escola Politécnica da Bahia, © Laura Coelho de Souza Cameito. E 0 quarto dos oito filhos do casal. ic ‘Casou com Magdalena Botelho de Souza Cameiro, sua conterrinen, a3 de fevereio de 1940, na Bahia, e tem dois filhos, Philon, nascido em 1945, ¢ Lidia, nascida em 1948. Fixou residéncia no Rio de Janeiro desde novembro de 1940, [ ‘Comecou a escrever e a publicar artigos e crénicas em 1928 ©, por volta de 1930, participou do movimento de renovacio cultural simbolizado na Academia dos Rebeldes, em que teve Por companheiros os romancistas Jorge Amado, Joi Cordeiro © Clovis Amorim, 0 contista Dias da Costa ¢ os poetas Sosige- nes Costa e Alves Ribeiro, entre outros. A partir de 1933, interessou-se pelos cultos populares de ‘rigem africana ¢, em geral, pelo folclore ¢ pela cultura po- ular, tendo iniciado entiio, em companhia do romancista Gui- 9 Iherme Dias Gomes, um curso de yorubé ou nagé. O conheci- mento dos candomblés Ihe deu a possibilidade de divulgar por escrito as suas festas, para o que foi contratado por O Estado da Bahia em 1936, ¢ de tentar uma federacio das varias casas de culto na Unido das Seitas Afro-Brasileiras da Bahia em 1937. Da colaboracio naquele diério passou a0 servico efetivo como redator, ¢ em 1937 trabalhou alguns meses em outro diario, Bahia-lornal, de vida efémera como érgio de campa- nha politica, Em meados de 1939 veio para o Rio de Janeiro e aqui trabalhou em O Jornal até que, comissionado pelo Museu Nacional, voltou a Bahia, a fim de recolher material dos cultos populares ¢ encomendar a feitura de bonecas de pano, em ta- manho natural, com as vestimentas e insignias das varias di- vindades africanas, que ainda se podem ver na Quinta da Bow Vista. De volta a0 Rio de Janeiro, trabalhou como tradutor-re~ dator de The Associated Press. J4 na Bahia havia traduzido dois livros, de inglés para portugués, ¢ desta vez continuou a tra~ duzir livros em inglés e em francés, ao mesmo tempo que con- Snuava o seu trabalho regular naquela agéncia de noticias, de gue chegou a ser redator-chefe (1941-1949). Em marco de 1949 fol admitido no Departamento Econémico da Confede- racdo Nacional da Indistria, onde alguns anos depois foi chefe da Secdo de Divulgacio, ¢ cm 1955 foi transferido para o Ser vico Social da Indistria (sest), onde exerceu a fungao de chefe da Seco de Estudos ¢ Planejamento, Servico de Assisténcia ‘Técnica, da Divisio Técnica do Departamento Nacional, come: Assistente Técnico. Trabalhou, ao mesmo tempo, como redator de Ultima Hora e, em 1953, foi contratado pela capes (Coor- denacio do Aperieicoamento de Pessoal de Nivel Superior, Mi- nistério da Educacdo © Cultura) como redator do seu boletim mensal, tarefa que desempenhou sem interrupedo entre 1956 ¢ 1966. Trabalhou no Jornal do Brasil (1956-1958). Fez parte, ‘como téenico em ciéncias humanas, de uma comissio extraor- dindria do extinto Instituto de Tmigractlo e Colonizacao incum- bida de estudar a localizacio de novas colénias agricolas no vale do Amazonas (1955). A partir de 1959 foi contratado como Professor de Bibliografia de Folclore nos Cursos de Bi- blioteconomia da Biblioteca Nacional. Tendo participado do grupo de trabalho que estruturou a campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, do Ministério da Educacio e Cultura, fos 10 Membro do seu Conselho Técnico entre 1958 ¢ 1961, quando foi nomeado Diretor-Executivo da mesma Campanha, cargo que exerzeu até 1964. Em 1961 foi enquadrado como Redator € em 1968 como Professor da Biblioteca Nacional. Ensinou folelore (Cultura Popular) no Instituto Vila-Lobos. Candidato & cétedra de Antropologia e Etnografia da Fa~ culdade de Filosofia da Universidade Federal do Rio de Ja- neiro (inscrito em 1950), deu cursos, como professor-visitante, nas Faculdades de Filosofia de Minas Gerais, Bahia, Pernam- buco, Parana, e fez conferéncias ¢ deu cursos em outras es- colas e instituigdes, entre as quais uma série de palestras no curso de vero da Universidade de Wisconsin em Porto Alegre. Participou dos Congressos de Escritores e dos Congressos de Folclore realizados no Brasil, e entre estes 0 Congresso In- ternaciona re e simpésios. Ter pasts Gn comissio do Ministério, das Relages,Exte lores que estudou a colaboragio brasileira a0 T Festival, de Artes Negras de Dacar (1966) © foi nomeado delegado do Bi Sil aguele Festival. Em Dacar, foi chefe da delegacio brasl= leira ao simpésio de Artes Negras. Ao mesmo tempo fof cot ¥idado pela unrsco ao Coléquio Aftiea-Amériea, Latin’, em Cotonou (Dahomey), na verdade reunido em Porto Tove, Nessa oeasido visitou, além do Senegal ¢ do Dahomey. , @ Costa do Marfim e a Nigéria. Foi condecorado pelo governo da ex-Guanabara tot © Mo. dalha Silvio Romero, membro das Sociedades de saeeti México, do Peru e de Tucumén Argentina), meme Be Cae. Kitio da Associagio Brasileita de Folelore, membro to Cor selho Diretor da Comissio Nacional de Folelore dc MET Ao Bio nacional da UNESCO) © membro do Conselho Mier |) Folclore, Foi grande Benemérito da Escola de Same Coe i+ S6cio honorério das Escolas de Samba Aceilsiers oe To © Mangueira, Presidente de Honra da Escola de Sir tolinhas de Caxias (extinta), do Afoxé Filho OM Meda- Clube Camnavalesco (frevo) Ps Douradas. Recebeu 7 Ne Tha Euclydes da Cunha de Sio José do Rio Preto, sp. P™! Eon bro do Conselho de Miisica Popular do Museu da Imass do Som, Os jnteresses de Edi 2 Carneiro se dlividiram, principale i e em segundo mente, pelos campos da etnologia ¢ do sei cade Iugar ‘pelo da historia. Esereveu alguns, omar er gedi- Bados entretanto a esses campos de estudo, ub cou a Castro Alves, poeta ¢ combatente da Aboligdo da Es- cravatura, Além de intimeros artigos e ensaios, publicados, em épocas diversas, em quase todas as revistas ¢ didrios de conseqiiéncia do Pais, escreveu os verbetes Foiclore, Negro Brasileiro e Po= pulacdes Ajricanas da edicio brasileira da Enciclopédia Barsa, colaborou com muitos verbetes sobre 0 negro brasileiro para a Enciclopédia Delta-Larousse © com um.ensaio sobre as reli= sides do negro brasileiro no plaquete do Ministério das Rela- Ges Exteriores para o Festival de Artes Negras de Dacar (tra- dugdes em francés e inglés). Um dos seus artigos, sobre a evolugdio dos estudos de fol- clore no Brasil, foi publicado na urss na coletinea Brasil, Eco- romia, Politica, Cultura divuigada pela Academia das’ Cién- cias em 1963. Dois outros ensaios foram publicados nos Estados Unidos —— um em torno da contribuicdo de Artur Ramos A etnologia brasileira (Phylon, Atlanta University, primeiro. trimestre, 1951); outro sobre a estrutura dos cultos ‘de origem africana (The Journal of American Folklore, vol. 53, n° 210, outubro- dezembro de 1940). Para o nimero especial dedicado ao Brasil pela revista His- onium, de Buenos Aires (n.° 224, janeiro de 1958), escreveu um artigo sobre o negro brasileiro, Hi trabalhos seus publicados no volume de ensaios come- morativo dos 150 anos do Jornal do Comércio, antecedendo a nova edico de A Escraviddo no Brasil de Perdigio Malhet To, etc. Reviu © anotou a traducdo brasileira de A Cidade das Mulheres, de Ruth Landes, ¢ fez © mesmo com as Cartes de Vilhena, a que se deu 0 novo titulo A Bahia do século XVII Em 1963 a Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro Publicou, em traducZo francesa, inglesa e alemd, 0 sen artigo Sobre os estudos de folclore no Pais (Folklore in Brazil). Redigin a Carta do Samba (1962) ¢ foi um dos redatores- coordenadores da Carta do Folclore Brasileiro (1951) Em 1969, a Academia Brasileira de Letras © Prémio Machado de Assis. Faleceu no Rio de Janeiro, a 2 de dezembro de 1972, dei- xando virios trabalhos inéditos © agracion com 2 Bibliografia it Alegre, Antologia do negro brasileiro, Editora Globo, Porto Alegre 1950. hia, Candomblés da Bahia, Editora Museu, do Estado peas Salvador, 1948; 2. ed., Editora Antes Big Hoes de 1954; 3% ed., Editora ompiat 6: Beadle nc Ouro, 1967; 5 ed., Editora Sean tara Rio de Janeiro, 197; 6% ed., Editora Civilizagio leira, 1978. , 1950; Yindmica do folelore, Editora do Autor, Rio de see mf 28 ed. ampliada, Editora Civilizagéo Brasil h Janeiro, 1965. 5a idinos e crioulos, Editora Civilizaci eiro, 1964. linguagem popular da Bahia, cagdio, Salvador, 1951. a Negro bantus, Editora Civilizagio Brasileira, 1937, 7 © Quitombo dos Palmares, Editora Pela, 1947; 28 ed., Cia. Eaditora Nacional, $i0 ed., Editora Civilizagao Brasileira, “ io Brasileira, Rio de Ja- Editora da Secretaria da Edu- Rio de Janeiro, Sio Paulo, 1958; 3? 3 ReligiGes negras, Editora Civilizagio Brasileira, Rio de Janeiro, 1963. A sabedoria popular, Instituto Nacional do Livro, Rio de Ja- neiro, 1936. Samba de umbigada, Campanha de Defesa do Fotclore, Rio de Janeiro, 1961. Castro Alves (Ensaio — Compreensio), Editora José Olympio, Rio de Janciro, 1937. Trajetéria de Castro Alves, Editora Vitéria, Rio de Janeiro, 1947, Castro Alves, Editora Andes, Rio de Janeiro, 1947. Insurreigio praicira, Editora Conquista, Rio de Yanciro, 1960. Guerra de los Palmares, Editora Fondo de Cultura, México, 1946. A cidade do Salvador, Org. Simées, Rio de Janeiro, 1954. A conquisia da Amazénia, Min. Viagio © Obras Piiblicas, Rio de Janeiro, 1956. Folclore no Brasil (publicacio em inglés, francés ¢ alemio), Campanha de Defesa do Folciore, Rio de Janeiro, 1963. Folguedos iradicionais (obra péstuma), Editora Conquista, Rio de Janeiro, 1974, “ A Cidade do Salvador (1549) UMA RECONSTITUICAO HISTORICA segunda edig&o «_.. uma cidade, que fosse como coracda no meio do corpo... Fr, VICENTE DO SALVADOR Roteiro Eis wm retvato dindmico da Cidade do Salvador no ano de 1549, quis B ‘inh wm objeto limitado, no 0, 1 fen pases esses limites, para poder mersulliar profundament Passido s desemerrar a Cidade. Nao sox linhagisia | do Pretendia jazer o inevinivel elogio “te Tomé de Souza, de Gar cla de Avila ou de Nébrega. Nao ea por que me incomodar com a sitwagdo econdmica de. portugal, nem com os motives ¢ disposicoes pessoais do rei. Se Merevé algumas paginas, Mm ‘0 por alto, sobre a capitania do Moreira, fol somente part lar uma idéia geral do que era @ Bahia no ‘momento da che- Beda do governador. O essencial, nese datudo, era a Cidade +8 sua edificagdo, 0 sew funcionamerty voy seus Habitat 25, g sua economia, asta posi come cametr do. pas, centr de administracao civil e da defese wlitar do Brasil. O res fundo de quadro, nada mais. tale se obit Teconsiiuicao Mstériea, We infeliment, 6 gear emer atrocentas aia apds 0 estabelecimente gover Ge te ee anion asta, cecal — me levou a Usa de termos ¢ expressdes dubitattien Tina mancira de 100", com seriedade, wm tema tao tiga, tao sem apoio, om Ae es rr rad polos culkaresius ES ive tempo e no espaco, ¢ nd? 19 de suprir a deficiéncia documental e epigréfica, tanto quanto possivel, com a ajuda da ldgica e do senso comum Em geral, posso dizer que o trabalho se norteou por uma série de suposicoes, que podem ser resumidas assim: 1. A povoacdo fundada pelo donatdrio Pereira ficava na praia, na base do morro, em volta da fortaleza, no pont em que esté o forte de So Diogo, como queria Teodoro Sam- Paio, € nao no alto, na Vitoria, 2. Diogo Alvares vivia de ajudar os nautas perdidos na costa — fossen: portugueses, castelhanos ou franceses, em vie gem de paz ou em busca de pau-brasil — e nao tinha interesse em cooperar com 0 donatério Pereira, Esta situacdo nao es capou a argicia do beneditino Clemente Nigra, 3. Os tupinambés acossaram os moradores da Vila Ve- tha provavelmente aculados por elementos descontentes — ¢ ndo se deve esquecer, neste capitulo, a carta de Duarte Coelho (20 de dezembro de 1546) propondo 20 rei o castigo dos “dot. dos e mal ensinados” que haviam perdido a Bahia, levantan. do-se contra 0 donatirio. 4. © governador Tomé de Souza nao poderia ter trazi do consigo 600 homens d’armas e 400 degredados. Nos seis navios da armada niio caberia tanta gente, mesmo superloia. dos como era costume, contando-se ainda funciondrios civis, artifices, trabathadores, etc., além da carga, que parece ter sido apreciavel. Os mandados de pagamento sugerem um nimero muito mais modesto e razodvel — um total de cerca de 500 essoas, inclusive pouco mais de 200 homens de soldo de terra @ mar. Os degredados néo seriam mais de 100, talvez 62 ape- nas, 3. A maior parte da gente da armada comecou a per ceber ordenados a partir do primeiro dia de maio. Este fato sugere, como salientou Rodolfo Garcia, que os trabalhos de erecio da Cidade tenham comecado nesse dia. O més de abril 6. Nao hé fundamento algum de que Tomé de Souza “despejou” trés aldeias de indior nat vizinhancas da nova Cidade — no Terreiro, no Carmo e ne Desterto. O Terceiro ficava dentro da zona escolhida para ¢ Cidade, 0 Carmo e 0 Desterro adiante da cerca, Nobrega es- crevia (1549) que a aldeia mais préxima estava para id da na afirmativa de Jaboatao, 20 cerea, no Carmo, ¢ os jesuitas jd tinham entrado © ania com esses indios. O levantamento, mesmo da cerca sugere ane nao havia necessidade Jette oe Shei Lins lific le guarnecer era a paligada pr ms dar ee Jabontae néo tinha qualquer pete ctl como data da jundacdo da Cidade o dia de Todos of Serer, Nem parece provavel que tenha visto algum downer 0° @ posse de Tomé de Souza perante o Senado, H” reer sovernador tinka jurisdicéo sobre 0 pais € nao eats ic.3), dinado a Camara, nem a Cidade. Em cara pare 0 Petr © cheje do governo geral sugeria: “A esta Cidade te deve V. A. de prover de um capitdo honrade & or seal ue a qualidade dela 0 demanda assim, € 2 Sern ig no deve ter lugar certo, sendo residir onde Ihe pe mais necessidac i”, ic havido re na a ead, 8 z “ ido jé vinha deter~ um dia especial de fundago da Cidade. Ti Pieper y minado, em pormenor, de Lisboa. Tomé de Souza, dre i, Pilkérias, na Corte, com urns, nO sera homer ie, © ceriménias. Nao terd havido nem mesmo DENIC Ni eva Sendo os jesuitas 0 teriam notado, nas suas Corie NT ania necessidade de ceriménia de fundacao, 4 I de Port apenas 9G muros da Cidade, em ver de rade a riba oroa da colina”, como até agora se suPee, AT M13 de ceira até a praia, sendo tail reler a carta Wutho de 1851) a Miguel de Arruda. 10. “Gabriel Soares falava em seis baer, que se uatro do lado do mar, dois da banda, era apenas quatro re Pode inferir de documentos fidedignos, MO” Cais nas ports luartes, dois na praia, voliados para 0 ia de fortificagdes cs Imeridional ¢ setentrional. Nao hd noticia OY fal mais forge. & Peciais debrucadas sobre 0 interior — 2 Wt idcias de i “uposicao de que o governador nao ae lios para assentar a Cidade. da, verde, A base destas suposigdes, mu minha cidade trouxe novamente @ luz a Cidade do ‘yersos natal, de modo que poderia dizer 40 Castro Alves: oximnas z ito Pvador, leitor, com Moema, Vers a terra da infeliz eer eg bem como a Vénus se elevar Escrevi com simplicidade, sem complicagdes, sem luxos de erudigéo, porque escrevo para 0 povo — sou um homem do povo — e este trabalho significa uma tentativa de trazer ao conhecimento do cidadao comum as intencdes, os éxitos e as vicissitudes dos homens comuns que edificaram a primeira ca~ pital. E.C. 22 Pouco mais de cem exemplares desta monograjia, roda- dos em Multigraph, chegaram as mios de outros tantos amigos ‘m 1950, Em nada difere esta daquela edigfo, exceto pelo acréscimo de alguns artigos na parte suplementar. ‘O autor deseja, com esta publicagio, reafirmar os seus pontos de vista acerca da fisionomia da Cidade no ano da sua fundacao e renovar, de pitblico, 0 seu agradecimento @ co: preensio ¢ 4 boa vontade de Anisio Teixeira que, como Se- Gretério de Educagao da Bahia, the dew (1947) a ajuda finan Ccira de 10,000 cruzeiros (atualmente, dez cruzeiras) para @ realizagéo das pesquisas historicas de que resultow este li ne. Vila Velha Pouca Gramatio Teles, emissario do rei, cor Alvares. anunciando a vinda do governador. (0 correio real chegou & capitania abandonada em comecos de 1549 e a carta de que era portador mandava que Diogo ‘Alvares, em quem o soberano reconhecia “muita prdtica © © periéncia... dessas terras e da gente e costumes delas”, fi- Frese uma reserva de mantimentos da terra para o governa- dor Tomé de Souza ¢ para os funciondrios civis e militares que viriam em sua companhia. "A carta antecipava-se de alguns meses 20 governador. Nao deve ter sido dificil a Gramatéo Teles encontrar 0 patriarca Diogo Alvares, que, com a morte do donatirio Pe- Pera, se tornara o homem mais importante da capitania, com varias filhas casadas que Ihe davam netos. Era o lingua do ntio, o intermediario nas negociacSes de marinheiros portu- ect : pueses © corsirios franceses com os indios. Um véu de lenda sueercava, Dizia-se que naufragara na costa, por volta de 1510, Conseguindo salvar-se, segundo uns, pelo amor que despertara as na filha do chefe Itaparica ou, segundo outros, abatendo uma fave com uma espingarda que recolhera de bordo. Os navegan- tes 0 conheciam e mencionavam © seu nome nos seus relatos de viagem, como Francisco d'Avila, Pero Lopes de Souza ¢ Oviedo. O homem de Viana constituira familia e tinha a volta de si trés ow quatro cristios, naufragados na costa ou deixados ali pela armada de Martim’ Afonso, empregando o seu tempo em ajudar portugueses, espanhéis e franeeses que por ali pas- savam. Parece que conseguia bons negécios com a sua ajuda, sem duvida inestimavel em tao desertas paragens, Em troca do mantimento que obteve para a armada de Simao de Alc4- zaba, por exemplo, deram-lhe uma chalupa ¢ duas pipas de vinho. Vivia rodeado de indios, que naturalmente trabalhavam. sob o seu comando, e em seu beneticio, talvez ja em ‘Tatua- para, localidade da costa do Atléntico que se toraria o cen iro fornecedor de mantimentos da terra & Cidade do Salva- dor, sede do governo geral. Diogo Alvares, com os seus filhos, genros ¢ netos e com ‘05 indios seus amigos, preparou-se para receber 0 governador. A capitania do Pereira espraiava-se por 50 léguas de costa, da foz do Sao Francisco para o sul, “entrando nestas terras ¢ demarcacio delas toda a... baia de Todos 05 Santos”. Para oeste, os limites eram os tracados no Tratado de Tordesilhas. ‘A doagio real — “de juro e herdade” — dava ao capitio- general: a) ampla jurisdicSo civil e criminal, nas causas civeis até 100$ e nas causas crime até morte natural “em escravos © gentios” e até 10 anos de degredo em “pessoas de qualidade”, com as excecdes de heresia, traicio, sodomia e moeda falsa b) poderes para fundat vilas ¢ povoacdes, que, no sertio, te- riam um intervalo de seis Iéguas, para que houvesse “20. me- nos trés Iéguas de terra de termo” para cada vila; c) a aleai- daria-mor de todas as vilas que se fundassem na capitania, com todas as rendas, direitos, tributos, que a elas pertence- rem"; d) 0 direito de criar tabelionatos e de nomear tabeliaes do piiblieo © do judicial, que the pagariam $500 por ano, “de pensio”; e) a redizima de todas as rendas e direitos; £) a “vin~ 26 tena parte” do lucro liquide do pau-brasil na capitania; g) “jodas [as] moendas d’égua e marinhas de sal e quaisquer outros engenhos de qualquer qualidade que sejam”; e, h) tam- bém “de juro e herdade”, 10 Iéguas de terra “em qualquer parte que mais quiser, ndo se tomando porém juntas, senfio Tepartidas em quatro ou cinco partes e nfo sendo de uma a outra menos de duas Iéguas”. ‘© donatério era obrigado a dar sesmatias aos cristios que as pedissem, livremente, sem foro nem direito algum, exceto o dizimo & Ordem de Cristo. Os moradores, por sua vez, exam obrigados a prestar servico militar, quando necessario. ‘Se fossem encontrados, na capitania, pedreiras, pérolas, aljofar, ouro, prata, coral, cobre, estanho, chumbo, “ou qual- quer outra sorte de metal”, a exploracio dessas riquezas daria tim quinto para 0 rei e, desse quinto, um dizimo para o capi- io-general. © rei Se reservava © pau-brasil “e assim qualquer especia- tia, ou drogaria de qualquer qualidade que seja". Em caso de exploracao particular, os infratores perderiam a sua fazenda em beneficio da Coroa e seriam degredados, “para sempre” para a ilha de Sio Tomé. Entretanto, os moradores poderiam Iitilizar 0 pau-brasil na capitania, “ndio sendo em o queimar, porque queimando-o incorrerfio nas ditas penas”. Sobre o pescado, a nao ser A cana, incidiam um dizimo & Ordem de Cristo € mais meio dizimo para o capitio-general. "As mercadorias enviadas da capitania para o Reino esta- vam isentas de direitos; por sua vez, 0s navios portuguese, que jé tivessem pago direitos no Reino, nada pagariam na ca- pitania, 'A sucessio far-se-ia na linha masculina, exeluindo os bas- tardos, mas, 2 falta de outros herdeiros, seriam contemplados mesmo os bastardos, “no sendo porém de danado coito”. ‘A capitania era indivistvel ¢ inaliendvel. & Francisco Percita Coutinho, fidalzo da Casa Real, filho do alcaide-mor de Santarém, “de grande fama, e cavalarias em fa India”, ja era idoso — “velho © doente”, dizia Duarte Coe- a7 Tho — quando afinal (1536) se decidiu a vir tomar conta da sua capitania. O Pereira, cuja rudeza pessoal the valera 0 apelido de Rus~ ticdo, armou uma frota & sua custa, com 0 dinheiro que con- seguira nas campanhas da India, e trouxe para o Brasil paren- tes, amigos € aliados. © donatério desembarcou com a sua gente adiante da Ponta do Padrio (0 Farol da Barra), para dentro da bafa, e se estabeleceu numa enseada, a sombra da colina, fundando uma vila — mais tarde chamada Vila Velna e Vila ou Povoagao do Pereira — em tomo de uma fortaleza, provavelmente a torre “j4 no primeiro sobrado” a que se re- fere um documento da época, um simples quadrado de pedra ¢ taipa com alguma artitharia. Os seus homens deram inicio & construgio de casas para cem moradores, levantaram “uma maneira de igreja” onde os jesuftas diriam a sua primeira mis- sa — a “ermida” mencionada no Roieiro Geral — e armaram uma camboa de pesca em frente & povoacio. Dos companheitos do Pereira, conhecem-se apenas 0s no- mes de alguns, como Antao Gil, de Evora, Custédio Rodrigues Corréa, de Santarém, ¢ Vicente Dias, de Beja. O donatirio doou terras a Ferngo Dolores, a Bastiio Aranha, ao bombar- deiro Pedro Afonso, perto da Vila Velha, e concedeu sesma- rias a Afonso de Tormes, espanhol, ¢ Joao Veloso, em Paripe € em Pirajé, mais para’ interior da bafa para’ o levanta. mento de engenhos de acticar. Dos funcionirios nomeados pelo rei, conhecem-se um certo Pero de Géis, Provedor da Faven. da Real na capitania, e Diogo Luis, moco da Cémara Real, eserivao da feitoria e do almoxarifado, Hé um documento —- a concessio de sesmaria a Diogo Alvares — assinado pelo es: crivio Rodrigo Fernandes, Eram boas as relagies comerciais com os indios in Um certo Coutinho — taiver 0 mesmo donatirig — escre- via (1536) que os naturcis do pais vinham ao erconin cies Porlugueses, dizendo-se dispostos a adotar a religito crete Hazendo mantimentos: “uma ania vale um vintém, wm ieado {0] mesmo viniém, um porco montés [0] mesmo vintem oy Bw ‘coelho dois vinténs, ¢ muitas outras cacas de muitas maneiras. © peixe & tanto que vai de graca...” Eram 0s indios, certamente, que abasteciam a Vila Velha de pescados, salmonetes, linguados e sardinhas. (© donatério alimentava a esperanca de tirar lucro da terra: “A costa tem muito coral, mas ndo tem ainda com que o tire. A terra dard tudo 0 que Ihe deitarem, os algodées sao os mais excelentes do mundo, o acticar se dar quanto quiserem”. Tudo parecia bem, mas, para manter-se na capitania, 0 donatirio necessitava de relagoes amistosas com o gentio ¢, naturalmente, devia contemporizar com a influéncia, que lhe parecia insultuosa, do Caramuru, o verdadeiro senhor da terra, O Rusticio, afeito as brutalidades da India, nio conseg adaptar-se is novas exigéncias de comedimento, boa vontade ¢ espirito cordial no trato com os indios. Tentou obter a coope- ago dos nativos através de Diogo Alvares, com a promessa de uma vasta sesmaria, que se viu na contingéncia de confir- mar, em documento piiblico (1536). A extensio das terras doadas, em comparagaio com as datas de Fernaio Dolores, Pe- dro Afonso e Bastifio Aranha, seus companheiros de aventura no Brasil, indica a importincia que o Pereira atribuia, afinal, 20 novo aliado. Diogo Alvares era, certamente, o interme- digrio nas negociagdes com os naturais do pais (muitos anos mais tarde ainda o era) e até certo ponto o fornecedor de mantimentos 4 gente da capitania. Produzia esses mantimentos — uma indistria de familia — nas vizinhangas de Tatuapara, na costa do Atlantico, onde, provavelmente, nos anos anterio- res, auxifiara os franceses no tréfico do pau-brasil. Era natu- ral que se verificassem choques entre os interesses gerais da capitania e os interesses particulares de Diogo Alvares. O “esforcado cavaleiro” conseguiu viver em paz durante cerca de um ano, mas, sem visio politica — sem “saber usar com a gente como bom capitio... mole para resistir as doi dices ¢ desmandos dos doidos e mal ensinados”, como escrevia Duarte Coelho — permitindo que os seus companheiros se en- 29 tregassem a violéncias e torpezas com o gentio, viu de repente a sua vila atacada, constantemente, pelas tribos vizinhas, que 208 poucos foram empurrando os moradores para o mar, di- minuindo a sua zona de penetraciio. Estas incursdes eram, cer- tamente, instigadas pelos descontentes, gente do proprio séqui- to do donatirio. Nao parece que as dificuldades do velho Pe~ reira desagradassem a Diogo Alvares, que niio tomou posicio contra as tribos, nem se pos em defesa da capitania. Bra “uma coisa muito desonesta e feia e digna de muito castigo... a causa de se a Bahia perder”, Esta situacdo prolongou-se por cerca de sete anos, com pequenos intervalos de trégua, c, de cada vez, as tribos hostis, convergindo sobre a povoacio, aper- tavam mais os moradores. As investidas provavelmente faziam- se pelo Camino do Conselho, que subia a colina, e pela pla- nicie litorinea, a0 sul. Metidos entre dois fogos, os moradores figis a0 Pereira tiveram de se abastecer por mar, usando al- guns dos seus caraveldes para o transporte dos mantimentos comprados na capitania dos Ihéus. Nem mesmo dispunham de gua potavel. Muitos colonos morreram, entre cles um fitho do donatério, outros perderam todos os seus bens, mas nao parece ter havido desanimo entre o pugilo de homens que de- fendia 0 pequeno estabelecimento humano. 6 Foi entio que 0 clérigo de missa Jofio Bezerra — um aventureiro sem escripulos, que se valia das vestes sacerdotais Para proteger os seus crimes — usou de um engenhoso ardil para destruir © Pereira. Expulso da capitania pelo Rusti Vi la Velha com um falso mandado r natério, ao aportar & Bahia um caravelo, que disse ter che gado de Portugal. Parece certo que o clérigo estava de com- binacio com os moradores. O movimento talvez tenha coin. cidido com um ataque geral dos indios contra as tranqueiras dos colonos. Era insustentavel, nestas circunstincias, a posi- cio. Deposto, o velho Pereira nao se animou a permanecer na capitania, alids ameacada de extingao pelas tribos em guerra. fio, 0 sacerdote surgiu na eal de prisilo contra 0 do- 30 Tomou um dos seus caraveldes e partiu para pedir guarida a Pero do Campo, donatério da capitania de Porto Seguro. s outros moradores refugiaram-se, uns em Porto Seguro, outros nos Ilhéus. clérigo Bezerra bem merecia 0 qualificative que the dava Duarte Coelho — “um gro ribaldo”. (© capitio-general de Pernambuco achava que os homens que se haviam rebelado contra a autoridade do donatirio da Bahia deviam ser “mui bem castigados” ¢ que, quanto ao sa- cerdote, o soberano devia “o mandar ir preso para Portugal e que munca torne ao Brasil”. Parece, entretanto, que o rei ndo quis tomar 0 conselho — ou nao deu importincia & questio. O certo é que, depois da chegada de Tomé de Souza, quando © Ouvidor Geral Pero Borges foi em socorro dos Ihéus (1550), ja se encontrava o clérigo trapalhdo, envolvido em novas ma- roteiras, “em serras e brenhas”, em companhia do mestre de ‘um navio que entregara todos os seus passageiros aos potigua- res e viera vender na Bahia os seus pertences de valor. Pero Borges nao o prendeu, “porque era clérigo”, e nfo participara do crime, mas estava disposto a fazé-lo, “porque ele nfo vive Talver fosse de referéncia A “ribaldia” do Bezerra que N6- brega esorevia (1549): “C& hd elérigos, mas é a escdria que de ld vem... Néo se devia consentir embarear sacerdote sem ser sua vida muito aprovada, porque estes destroem quanto ‘se edifica. . 8 © velho donatério, arruinado, deixou-se ficar em Porto Seguro, durante um ano, sem tentar a reconquista da sua capi- tania, —— “sem nunca por nenhuma diligéncia acerca de a po- voar", dizia Pero do Campo — embora o amigo lhe aconse- 3 Ihasse embarcar para o Reino, a dar conta ao rei da desgraca em que caira a Bahia. Em Porto Seguro o foi encontrar novamente Diogo Alva- res, num caravelao, com a noticia de que corsdrios franceses haviam levado consigo toda a artilharia da fortaleza © as mer- cadorias e bens que haviam escapado aos assaltos dos indios — © prometiam voltat. Caramuru regressou logo Bahia. O Pereira, finalmente, vencendo as suas hesitagées, fez 0 caminho da Vila Velha, pouco depois (1546), mas naufragou no arrecife das Pinadnas, na ilha de Itaparica, © foi liquidado, com os seus companhei- ros, pelos tupinambas. 9 ‘Com a morte do Pereira, a sucessio caberia ao seu filho ‘Manuel Pereira ou ainda ao seu neto Manuel Coutinho. rei, entretanto, chamou a si a capitania, que destinow para sede do governo geral, instituido em 1549, por ser “o lugar mais conveniente da costa... assim pela disposicaio do porto ¢ rios que nela entram, como pela bondade e abund: cia © satide da terra”. ___-Muitos anos depois (1576) os herdeiros abritam mio dos Gireitos @ capitania em troca de um padrio de 400$ de juro “no que render a redizima” da capitania da Bahia, “para sen. pre”. 10 Soberano, que as suas 32 Pereira. Nobrega, ao chegar, escrevia: “Achamos a terra de paz € quarenta ou cingtienta moradores na povoacdo que antes era...” E, em referéneia direta ao Carammru, acrescentava: “Este homem, com um seu genro [Paulo Dias], é 0 que mais confirma as pazes com esta gente, por serem eles seus amigos ontigos”. 33 II O Governo Geral ‘A armada do governador compunha-se de seis unidades — tres naus, Salvador, Conceicao © Ajuda, duas caravelas, Rai- nha e Leoa, e 0 bergantim Séo Roque. Em fins de janeiro, os navios j4 se encontravam em Belém, com todo o material a bordo, mas 4 espera dos retardatdrios, que se demoravam’ na Corte — 0 Provedor-Mor da Fazenda Cardoso de Barros, 0 mestre das obras Lufs Dias, 0 capitio- mor da costa Pero de Géis e os jesuitas, “afora outros”. Em carta para o rei, Fernfo Alvares de Andrade, encarregado do despacho da armada, pedia que “se nfo perca este bom tem- po que cd vai" para a travessia do Atlantic, Era a estacéo propicia & viagem, mas havia outros motivos. A gente d’armas, }é assentada, estava descontente — “anda clamando pedindo de comer" —— e era de temer que, se sobreviesse mau tempo, se produzissem dificuldades. Em verdade, a armada estava “de todo prestes” a 24 de janeiro e poderia partir logo — se todos estivessem a bordo. ‘Afinal, no primeiro dia de fevereiro, uma sexta-feita, os navios deixavam 0 Tejo a caminho da Bahia. O escrivao da 35 armada era Nano Alves. A caravela Leoa veio sob 0 coman- do de Cristévao Cabral, nomeado pelo soberano capitio “de um dos navios” da armada, e Ferio Vaz da Costa capitanea- va 0 bergantim Sao Roque. Nao se conhecem os nomes dos comandantes das outras unidades, nem h4 prova da afirmativa de Jaboatio, de que o governador, o fidalgo Duarte de Lemos © 0 capitio-mor da costa Pero de Gdis viessem no comando de naus e caravelas. A viagem se fez, como escrevia Nébrega, em 56 dies, “sempre com ventos prosperos”, e, a 29 de mar- 0, outra sexta-feira, os seis navios chegavam a vista da Vila Velha. © desembarque nao se terd feito imediatamente a chega- 4a ¢, em vista da auséncia de cais, parece igualmente impro- vavel que se tenha organizado uma procissio, tendo a frente 8 jesuitas e a Cruz, em demanda da povoacdo do Pereira, como narrava Jaboatio, com extraordinatio luxo de porme- nores. Simples consideragdes de defesa militar impediriam tal despropésito, que em vez de impor o respeito © 0 temor aos findios, exporia toda a gente da armada aos seus ataques, s¢ fosse 0 caso. Nao terd sido com tais imprudéncias que Tomé de Souza mereceu as esporas de cavaleiro, Pelo contraio, o governador deve ter mandado parlamentares & povoagio, em busca do Caramuru e do seu genro Paulo Dias, a quem o rei escrevera, e somente depois de certo de estar a terra em paz, iniciado, com cautela, 0 desembarque. Parte do material ¢ as guamnigdes dos navios devem ter permanecido a bordo. A ar. mada era 0 Yinico ponto de apoio seguro dos homens do go- verno geral, que nada sabiam da nova terra e estavam preve- _ s contra qualquer surpresa pelas insistentes reco i ek soberano. -comendagoes O homem, escolhido para capitio- Salvador ¢ governador geral do Brasil uted Gece fardo, que se destacara nas guerras da Africa e da Indi. Era Primo de Martim Afonso e de Pero Lopes de Souza e do con de da Castanheira, valido do rei. Tinha privilépios de fidalgo desde 1537, como escudeiro, © governador de Ceuta o armou 36 cavaleiro em 1544 e, em 1551, ainda no desempenho da sua comissio no Brasil, foi nomeado membro do Conselho da Coroa. Ja nessa ocasido desejava muito voltar a Portugal, lem- brando-se de “uma mulher velha que tenho e uma filha moca” © argumentando que “nenhum outro governador pode V. A. mandar que nao faca ea melhor que eu, e com menos trabalho”. Nébrega (1552) achava que, se o rei “the der lé 0 que tem a sua filha, e a casar, e Ihe mandar sua mulher”, 0 governador ficaria como morador no pais, “porque € muito contente desta terra, e acha-se muito bem mela, © muitas vezes conheci isto dele”. O jesuita ia mais adiante no seu elogio: “Nio creio que esta terra fora avante, com tantos contrastes, como teve, se houvera outro governador... Tememos muito vir outro, que destrua tudo...” Nao & crivel, apesar disto, que Tomé de Souza fosse “o primeiro que langava mio do pilio para os taipais ¢ ajudava ‘a levar a seus ombros os caibros e madeiras para as casas”, durante a construgio da Cidade, como escreveu, confiando no exagero de alguns velhos habitantes da capital, Frei Vicente do Salvador. Mais importantes do que a construcéo da Cidade eram as coisas do govern geral — 0 socorro as capitanias do norte e do sul, a distribuic&o da justiga, a policia da costa, a arrecadag&o dos impostos. Somente na feitura de mandados ¢ provisdes gastava-se a maior parte do tempo — e por tris desses Gocumentos podemos entrever uma série de reunides, con- feréncias, visitas ¢ consultas. Por outro lado, a construc da Cidade nio se fez com a azifama que parece implicita na des- cticio de Frei Vicente, pois muitos edificios piiblicos essen- ciais s6 ficaram prontos nos anos seguintes — € no era im- prescindivel, assim, a ajuda pessoal do governador. Tomé de Souza era um homem idoso e nao poderia entregar-se, com tal facilidade, a exercicios fisicos desnecessitios, havendo tan~ tos trabalhadores empenhados nas obras da Cidade, sem contar os indios que ajudavam os fundadores. De volta 20 Reino, 0 governador foi nomeado vedor da Casa Real (1557) © premiado com sesmarias, tencas © pen- ses, além da merc8 do cargo de Tesoureiro da Bahia para a Pessoa que indicasse em testamento. © governador faleceu em 1579. a7 3 Somente quatro dos auxiliares imediatos do governador ti- nham fungées de ambito nacional, com jurisdigdo sobre toda a costa € povoagdes do Brasil. Trés desses funciondtios eram responsaveis pela Fazenda, a Justica e a Defesa do pals, 0 outro geria as rendas reais, Esses quatro homens eram Antonio Cardoso de Barros, Provedor-Mor da Fazenda, com 2008 de ordenado anual; o dr. Pero Borges, do desembargo real, Ouvi- dor Geral do Brasil, com 2008; Pero de Gois, capitio-mor da costa, com 2008; e Goncalo Ferreira, Tesourciro das Rendas, com 80S. Cardoso de Barros e Pero de Géis eram ex-donatarios, res- Pectivamente das capitanias do Ceard e Paraiba do Sul. O Pro- vedor-Mor da Fazenda nem mesmo tentara colonizar as terras gue 0 rei Ihe havia dado no Brasil, mas Pero de Géis, homem Pobre, arruinou-se completamente tentando, com o auxilio de amigos ricos, tirar lucro da sua capitania. Cardoso de Barros continuou a dirigir os negécios da Fa- zenda sob 0 governo de Duarte da Costa, com quem teve séria desavenca. © segundo governador escreveu ao rei, na ocasiio, que “homem que tem engenho e faz fazenda nesta terra é mui- to prejudicial a de V. A. @ como a cle tem ¢ muito grossa des- cuidaya-se muito do que cumpria a bem do seu oficio”. O Pro- vedor-Mor voltou pata o Reino em 1556, mas naufragou na for do Cururipe ¢ foi trucidado pelos caetés, em companhia do bispo da Bahia Pero Fernandes Sardinha, © ds. Pero Borges, Ouvidor Geral, da magistratura do Algarve € do Alentejo, fot mais tarde (1554) nomeado, pelo governador Duarte da Costa, Provedor-Mor da Fazenda, acumu- Tando 0s dois oficios. Outros funcionérios vinham nomeados esse local — Rodrigo de A\ nha, Provedor da Fazenda Cardoso de Barros, com 3 para cargos de inte~ tg0lo, porteito da camara da rai- na Bahia, subordinado a Anténio '0$ de ordenado anual; Luis Dias, 38 mestre das obras da Cidade do Salvador, com 72$; 0 licenci do Jorge de Valadares, fisico e cirurgiio, com 48$; 0 botici- rio Diogo de Castro, com 15S... © governador, munido de poderes especiais, acrescentou a estes nomes os de Cristovao de Aguiar, almoxarife do armazém de mantimentos; de Garcia de Avila, homem d’armas, feitor e almoxarife da Cidade e da Alfandega; de Bastiao de Almei- da, espingardeiro, Porteiro da Fazenda ¢ Contos; do fidalzo Diogo Moniz, Provedor do Hospital; de Bris Alcoforado, Te- soureiro dos Defuntos... Para os novos cargos, a escolha 1e- caia entre os primeiros habitantes, Muitos dos funciondrios reais tomaram posse quando jé na Bahia, em abril e maio, embora alguns estivessem vencen- do ordenados desde abril —~ © mesmo antes. © capitéio-mor da costa Pero de Géis empossou-se no seu cargo logo no primeiro dia de abril, mas o Provedor-Mor da Fazenda Cardoso de Barros s6 0 fez a 17 de mai. O Tesou- reiro Goncalo Ferreira ¢ 0 escrivaéo do Tesouro Joao de Arad jo entraram em exercicio no mesmo dia, 4 de maio — depois de terem ganho todo o més de abril. O Ouvidor Geral Pero Borges comecou a desempenhar as suas fungves a 30 de marco © deu posse ao meirinho Manuel Goncalves jé a primeiro de ea ‘tam da posse formal, sendo mni- Parece que os registros tratam da pe | to provavel que, no momento da chegada & Bahia, todos os funciondrios do governo geral tenham comecado a exercer, efe- tivamente, as suas comiss6es off i do governo homens nomeados para os virios cargos eral do Brasil voleam-se, desde © Reino, de uma largueza do governo — o adiantamento de dinheiro. 39 © rei, nos artigos supiementares do Regimenio de Tomé de Souza, havia autorizado 0 governador a pagar dinheiro adiantado aos seus auxiliares, mas 0 precedente foi aberto em Portugal. Pero de Géis, capitio-mor da costa, tomou adjantados 300 cruzados, que deveriam ser descontados dos seus vencimentos, & razdio de 30$ por ano; Cristévio Cabral, comandante da ca- ravela Leoa, recebeu logo trés meses por conta (128); Luis Dias, mestre-das-obras, o seu sobrinho Diogo Pires, pedreiro, © 0 escrivéo Brés Fernandes, da Ouvidoria Geral, receberam metade (368, 18S © 208) dos seus ordenados anvais. a Certos funcionérios accitaram cargos sem ordenado, arris- cando-se a viver dos azares do negécio, tendo apenas “os pros © perealgos que thes direitamente pertencerem”, Tal era o caso do homem d’armas Garcia de Avila, cria- do de Tomé de Souza, nomeado pelo governador, jé no pri- meiro dia de junho, feitor e almoxarife da Cidade e da Al- fandega, ¢ © do escrivio da armada Nuno Alves, sobrinho do desembargador Bemardim Esteves. " ‘aspar Lamego, nomeado contador na Bahia, com ‘70S or ano, foi msis tarde’ nomeado esctivio da Provedoria-Mot Stiegaminats mas desse cargo auferia apenas os “prés © pet- Era assim que se pagavam os esctiva: 5 : n ies, com excecdes como Jodo de Araijo, mogo da Camara Real, esctivao dev Tesout0, com 408 por ano, ¢ Paulo da Fonseca, escrivio “d'ante 0 $0” Femador”, nomeado © empossado na Bahia, com 158 de orde- 8 © niimero de escrivies era, so do para as coisas do governo geral. Havia sete eserivies numa Cidade de menos de mit habi tantes — sem contar Manuel Alvares, da armada da costa, & m diivida, desproporcions- 40 Nuno Alves, da armada do governador. Jodo Rodrigues Pas- coal servia 4 Matricula da gente de soldo; Manuel Nunes, aos Contos; Jodo de Aratjo, a0 Tesouro; Brés Fernandes, & Ouvi- doria Geral (correico); Gaspar Lamego, contador, Prove doria-Mor da Fazenda; Rodrigo de Freitas, ao almoxarifado; Paulo da Fonseca trabalhava com o governador, na feitura de mandados, cartas € provisoes. cargo de escrivio da Matricula foi mais tarde desempe- nhado por Rodrigo de Freitas; Francisco Mendes da Costa subs- tituiu Gaspar Lamego, na Provedoris-Mor da Fazenda, ainda no governo de Tomé de Souza; ¢ Jotio de Aratijo foi sucessi- vamente nomeado pelo governador -Provedor da Fazenda na Bahia, substituindo Rodrigo de Argolo, e Tesoureiro das Ren- das, por morte de Gonealo Ferreira. Nao tinha motivos para se espantar, portanto, 0 Ouvidor Geral Pero Borges com 0 miimero de funcionérios que encon- trou em Porto Seguro (1550): “S6 nesta vila, que nem tem com vizinhos, havia quatro tabelides, dois inquiridores, escri- ios e outros oficiais. ..” 9 Rodrigo de Freitas, cavaleiro fidalgo, teve a principio o cargo de escrivio do armazém de mantimentos, subordinado joxarife Crist6vao de Aguiar. Mais tarde (1552) substituiu Joi Rodrigues Paseoal como esetivio da Matricuia, O governador Duarte da Costa o no- meou (1553) Provedor da Fazenda na Bahia, por falecimento de Rodrigo de Argolo, com a condicio de que os ordenados do cargo (30$) fossem entregues A vitiva e aos filhos do anti go titular, Procurador da Coroa, juiz ¢ vereador, um alvara do rei o nomeou, “em dias de sua vida” (1554), escrivio do Tesouro, Lica ‘Comesaram entiio os seus infortdnios — talvez por fazer ‘oposicio a Duarte da Costa. Tinha contra si o governador, o Ouvidor Geral e ProvedorMor da Fazenda Pero Borges, 0 contador Gaspar Lamego ¢ 0 almoxarife, que “me prenderam ¢ condenaram em degredo e em dinheiro e me tiraram meus oficios, por eu procurar a liberdade e o bem da Repiblica 41 como era obrigado, por ser vereador”, Durante o seu “‘impedi- mento”, Duarte da Costa nomeou Provedor da Fazenda Ant6- nio do Rego, Tesoureiro das Rendas, e escrivio do Tesouto Luis da Maia (1555). Rodrigo de Freitas temia ficar sem 0 socorro da lei durante quatro anos, entregue, como estava, 20 arbitrio dos homens do governo geral: “Ca nfo ha alvard que nao glosem, nem virtude que no contra-facam, e dizem pu- blicamente que quem Ihes aborrecer prenderio e terdo assim um par d'anos em ir e vir 0 negécio a0 Reino...” E, no inter- valo, “o criado do governador estaré ganhando 608 cada ano do meu oficio de escrivio do Tesouro”. Os inimigos preparavam, secretamente — “sem 0 eu saber, sendo presente na Cidade” — um outro processo, por um al- cance que se teria achado nos Livros da Matricula. Rodrigo de Freitas, precavendo-se contra qualquer eventualidade, os creveu umas lembrangas em sua defesa, em que argumentava que no era o esctivdo o responsivel pelos desvios que houves- se, ¢ sim 0 almoxarife e, depois dele, o contador; que os it os e 0s criados do almoxarife tinham as chaves dos armazéns € davam e tiravam tudo 0 que queriam; e que, com esse novo Processo, tentava-se fazer pager, & custa da Fazenda Real ¢ da sua honra pessoal, 0s “passatempos" do almoxatife de par- ceria com 0 filho do govenador, Alvaro da Costa. Para ve- xi-lo, faziam-no ir & Casa dos Contos para dar as explicacdes que cabiam a Cristéviio de Aguiar, “por ele as nfo saber dar”. Com as suas lembrancas, Rodrigo de Freitas como que impe- trava um mandado de seguranca, no Reino, contra os seus ini- migos na Bahia, ___ Embora tomasse as suas precaucdes, sérios, nem sentia a consciéneia ser alguma coisa contra o escrivao de seu cargo. eu Ihe tla- rei umas botas amarelas mais justas que as que agora {raz ¢ luma camisa com volta de trancinha sobre sua velhice, de que da to mi conta como da Fazenda de S. A.”. E, quanto 20 contador, desafiava-o, propondo que uma pessoa insuspeita Te visse as contas do governo geral, eomprometendo-se a pagar © que se achasse contra si, contanto que se cobrassem também 0s exros contra o contador — “e quero the dar um quarto de vinho, com que ele folga muito”, - Rodrigo de Freitas nao i perdcu o cargo de escrivao do Te- souro nessa ocasiao, mas alguns anos ‘Sep aaa ndo temia os adver- pesada: “Se almoxarife qui- . Sob 0 govern de 2 Men de Sé (1560), quando “se meteu” na Companhia de Jesus. O seu substituto foi Sebastiio Alvares, um dos homens de confianca do segundo governador. 10 Os servidores da Fazenda nao tinham muita folga © Provedor-Mor Cardoso de Barros, antes de partir para as capitanias do sul (1550), determinou que, durante a sua auséncia, 0 contador e 0 escrivio dos Contos fossem & Casa dos Contos duas vezes por dia — das 7 as 11 ¢ das 14 as 18. Em caso de falta, os dois homens do governo geral seriam Punidos com o desconto de um cruzado para o contador ¢ de $200 para o escrivdo nos seus ordenados. Mais tarde (1551) Cardoso de Barros ordenou que os oficiais da Fazenda e Contos estivessem a postos nas segun- das, quartas e sextas, mesmo que ndo houvesse 0 que fazer; e, se houvesse, duas vezes por dia, pela manhi e a tarde. Os oficiais da Fazenda, faltosos, seriam punidos em $200; os dos Contos, em $500. i jondrios eram muitos, eram demais para o servigo rs Ot nc on dn (1551) estava cero de que se poderia prescindir de dois altos funcionios — 0 Provedor-Mor da ea ito-mor da costa. ‘ Fraverd eo Ghizn, em caria para o rei, dizia que, pelos trés anos mais préximos, he parecia conveniente nfio nomear Pro- vedor-Mor ‘da Fazenda, pois 0 Ouvidor Geral poderia acumu- Tere cargo, om o avs de dois esrives, um da jestica, Gutsy da Fazenda: “E quando for fazer correo a faré de todo e ainda Ihe sobejard tempo, ¢ desta maneira terd que fazets & Ge outra folgam ambos todo o tempo". Nem havin necessdade de capitigrmor da costa, que ficava ocioso a maior parte fempee qeand fosse preciso correr o Titoral, nomear-se-ia um 43 capitéo especialmente para esse fim, » escusando-se a despesa permanente com o capitéo-mor. ° smncoFesoUTBTO das Rendas, por sua vez, poderia servir de almoxarife dos armazéns de mantimentos ¢ da Cidade, “por- que € 0 negécio quase todo um, ¢ nao é muito”, bastando, para auxilié-lo, apenas um escrivao. ° ° Era o ensinamento de dois anos de governo no Bras 12 A sugestio de Tomé de Souza, d A » de que o: - vedor-Mor da Fazenda e de Ouvidor Geral fossem Gad aaa Pessoa, foi bem aceita pela Coroa. “aun je coan yeokemador Duarte da Costa se desentendeu com Borges, Ouypnes momeou para substitutlo (1554) 0 dr. Pero Bonen it se que assim teve nas m&os os dois ofi- 2000 fol memca tte de Men de Si, 0 licenciado Brés Fra- See oa hl ns Seen ds 8) da Fazenda, com mais 60S, ines ee Os ‘slmoxarif i { es, de cineo om cis Bahia prestar contas, trazendo consigo,tedoe’ oem ve A apéis. O Provedor da Fazenda na conige sos 08, Seu livros ¢ Se houvesse diivid Jocal para substitu : las nas ¢ Para substitui-lo. a0 governador “um letrado” aries : Provedor-Mor pediria 44 0 Provedor-Mor deveria, logo ao chegar & Bahia, mandar construir “umas casas para Alfandega, perto do mar”; mant livros da receita e despesa, das rendas e direitos reais, dos o! ciais de arrecadagio ¢ da Matricula da gente de soido que ia na armada, cada pessoa com titulo separado, de que constas- sem nome, filiacio, naturalidade, residéncia, soldo, tempo de Servico, pagamentos feitos ctc.; determinar os precos de armas @ municées: executar as penas contra os moradores que nao possuissem as armas que o tei mandava, no Regimento dado 2 Tomé de Souza; despachar todos os dias, com o escriviio, na Casa da Fazenda; dat conhecimento de todos os seus atos a0 ‘governador e, em caso de divergéncia de opinido, conformar- se com a decisio de Tomé de Souza. ‘Cardoso de Barros acompanharia 0 governador quando em visita as outras capitanias do Brasil. 14 Os pagamentos de soldos ¢ servicos faziam-se goralmente em mercadoria (resgate), € muito raramente em dinheiro de ‘contado, Ocasionalmente, esses pagamentos faziam-se parte em mercadoria e parte em dinheiro. Os primeiros pagamentos da~ tam de 15 de junho, mas referem-se, em geral, ao periodo co- mecado no primeiro dia de maio. ; (Os objetos utilizados mo resgate eram foices, machados, anz6is, pentes, tesouras, facas, espelhos, enxadas, furadores, poddes, cunhas, pregos, ferrolhos, chapéus, ealcdes, camisas. .- Ou, extraordinariamente, animais: o fidalgo Diogo Moniz teve ‘um novitho por 28500; 0 seu criado Antonio de Freitas, uma vaca, também por 28500; o homem d'armas Amador de Aguiar, uma vaca, por 28; eo almoxarife Garcia de Avila, duas vacts, por 4S, em pagamento de soldos atrasados (1550). O Prove- vorMor Catloso de Barros sc fez pagar (1550) em artilhari Lats Dias, mestre das obras, queixavarse desse sistema de pagamento, eserevendo (1551) que, “do soldo [nem] um s¢ Ceitil me deram nem pagaram, nem hé de que mo pagar, [pois] © que vem do Reind & ferro velho como © que se vende na feite em Lisboa e com isto se paga & pobre gente que ¢& tra- 45 balha, que os rendimentos do Brasil A , asil com que cd nos manda- vam pagar € tudo burlaria, porque néo ha aqui com que se pague meio ordenado dum destes senhores...” 15 © mantimento, i sa00 poantiment, aparentemente, era igual para todos — dos Plo depoimento de Luis Dias (1551), 0 passadio no era dos melhores, nem 0 servigo de. abastecimento. primava pela ae organiza, nem pela consideragio para com os homens vindo “to Ionge” se “ enganaram com ais pagamentos, © que hee citer doe de comer, © dio-lhes um pouco “nao pagasse soldos, nem o: nd the fazerem certo nao dever Aguiar, almoxarife”, lenados a nenhuma pessoa sem coisa alguma a Cristvio de 16 Se 0 mantiny e iento era ji da mais escasso, Pouco, € ruim, 0 numerdrio era ain- Nobrega escrevia, ja = , Ja em agost 2 de Souza da a de trabalhadores Ps he alas a Tomé ios deveriam vir “ja oon GOF Ihe dissera. que ses ‘aie alvard régio, no haveria ‘com’ gee ‘pega mesmo trazendo Bahia. agar OS seus servicos na orcamento es oii stourava, em face de tantas despesas im- Mais tarde (1551), f cavam em pau-brasl. © governegee’ G08 franceses que trafi- 46 ferira aproveiti-los: “Nao os mandei enforcar porque tinha muita necessidade de gente que me nao custe dinheiro”. Um deles era lingua — cra um homem util. O outro, ferreiro, tra- balhava nas ferrarias da Cidade com uma grilheta (braga): “é © mais habil homem que tenho visto, porque faz bestas © es- pingardas e todas as armas...” 17 © governador, desde a chegada, comecou a dar cumpri- mento a recomendaco real, de dar “favor ¢ ajuda” as outras capitanias, para 0 seu progresso econdmico © para a sua de- fesa contra os corsdrios franceses. Tomé de Souza ¢ os seus auxiliares imediatos enviaram artigos de consumo civil, e nomearam fan- ciondrios para as capitanias da Nova Lusitania (Pernambuco), do Espirito Santo, de Sao Vicente, de Itamaracé... Com a armada da costa, sob 0 comando de Pero de Géis, 0 Ouvidor Geral Pero Borges ¢ 0 Provedor-Mor da Fazenda Cardoso de Barros visitaram as capitanias dos Ihéus e de Porto Seguro, numa intervencio direta do governo geral. O fidalgo Duarte de Lemos chegou a dirigir, por mandado do governador, a ca- pitania de Pero do Campo. i ‘Duarte Coelho, donatério de Pernambuco, nfo gostava desse tipo de “favor ¢ ajuda” e obteve do rei que o governo geral o deixasse em paz na sua capitania. O governador se queixava (1551): “Néo pode Id ir o Provedor-Mor, porque esté muito diferente com Duarte Coelho ¢ com seu cunhado Jerénimo de Albuquerque, nem eu, pelo que me v. A. tem escrito, que no vé Id até ver outro recado seu... mantimentos, armas, 18 Com 0 dr, Pero Borges, 2 justiga passava, do arbitrio dos antigos donatitios, para as mos dos funcionérios reais. ‘Nie we conhece 0 Regimento do Ouvidor Geral, mas a carta de nomeagio derrogava todos os privilégios concedidos a7 208 capities-generais e mandava a todas as autoridades e mo- radores da colénia “que o hajam por Ouyidor Geral... lhe obedecam, e cumpram inteiramente suas sentencas, juizos © mandados, em tudo o que ele. fizer, e mandar”, Manuel Goncalves, escudeiro da Casa Real, servia de mei- tinho, com 20$ por ano, tendo para auxilid-lo seis homens, @ $600 por més cada, Em virtude de alvard régio, 0 meirinho pode incluir, nesse niimero, com a anuéncia do Ouvidor Geral, © escravo africano Afonso de Touca, © escrivio da Ouvidoria Geral era Brés Fernandes. Pero Borges, mal chegado & Bahia, seguiu em correicao, com a armada da costa, para as capitanias de Porto Seguro ¢ dos lhéus (1550). $6 néo podia ir a Pemambuco, em vista da agressiva resistencia de Duarte Coelho, a que o rei se curva~ 7a — © que parecia ao governador “grande desservico” A Jus- tica real. Era extremo o rigor com que distribufa justica. Os trés funciondrios da Justiga tomaram dinheiro adian- tado sobre os seus ordenados antes de vir para a Bahia. 19 © rei declarava, no Regimento de ‘Tomé ° sew objetivo principal, em + Sa incon sora ‘ em relaci i il, era Peon ne ici aos indios do Brasil, er “Para que mais folguem de sta toil ato Igue © ser [cristéos], tratem bem sintam que thes seja feita o} ,OPressio nem agravo algum ¢ fa- zendo-se-Ihes o facam cortigir, © emendar de mancira que fi das como Tor de sigeot GUE Thos fizerem sejam casts Em conseqiiéncia, aqueles az, em navios ou por terra tural e perda de toda a sun f que escravizassem 0 gentio de seriam punidos com morte na~ : sua fazenda. Os moradotes nfo pode~ di . res no pode- Tran Denetrar o serto, mesmo em terras de Paz, a no ser com Jicenca do governador o do Provedor-Mor, “sob pena de ser acoitado, sendo peo, ¢ se i i pias pe’ ndo de maior qualidade pagaré 20 Para o estabelecimento de relacs telacées comerciais pacificas entre 0s portugueses € 05 nativos, o governador estabeleceria ° 48 sistema de feiras semanais, “a que os gentios possam trazer © que tiverem e quiserem ¢ comprar o que houverem mister”, proibindo-se aos cristios a ida as aldeias. © Soberano recomendava o perdio aos indios culpados, “havendo respeito ao pouco entendimento que essa gente até agora tem, a qual coisa diminat muito por suas eulpa", acres centando que um dos meios de trazé-los a 16 cristd “hd de ser recusardes fezer-hes guerra, porque com ela se ndo pode ter a comunicagdo que convém que se com eles tenha para o sere Os fndios “reduzidos” af deveriam habitar as vizinhangas das povoacdes dos brancos. 20 Os tupinambés, entretanto, haviam feito guerra a0 one tério Pereira — ¢ 0 rei mandava que Tomé ae aaa de reparada a cerca da Vila Velha e de se prover de, manti mentos, castigasse os culpados, matando e cativando fncios, £m mimezo que julgasse conveniente ¢ enfore: nas, suas aldeias. . " nm © povernador favorecerin as tribos que haviam mantido a paz —e entre estas apontavams, especifiamente, as do Max Taguacu ¢ Tatuapara — e, em caso de levante, p ficd-las, sem recorrer 8 BUETTO. es pomens Para castigar os ee a masitio deverlaifios € de peleja” — 0 governador ac alto oa indies de outres capitanias, Ee, ad a - folguem de vos ajudar, enquanto tiverdes ia porém os gentios se agasalhario_ em ne oe cok fas dated fazer 0 que nfo devem, porque nao € a eeeeece cana tanto que se possa seg ITT gy entretano, slgunsdesss Pa ae ‘car, 0 gover! indios quisessem ficar, © 2 rada, : © governador expulsaria os tupinamb: Uhéus e a Bahia. is da costa, entre 49 21 Tomé de O gove n vinha Sod sola mak, fers a0 resgate, uma politica que Tsou da, sua sera, Gesde © descobrimento, e, por outro lado, 68 fodion,, Exsent ae th Para impedir que os colonos molestassem portugueses. realiza es guerra. Se, antes do governo geral, os sil par i no transporte di - aren pe sas {Ga costa, sob 0 novo dninatader woe res, Os indies, unos © catapucas principalmente por vive- riam, mas depois ump trabalhavam onde, quando © como que- spois vinham, pacificamente, trocar os seus manti- mentos, 0§ animais as ntos, que cagavam fam, os ces ieee ou pescavi ie has © as redes que fabricavam, cor ‘adbite da Cl Bas » com os moradores da Ci- © local e m. Gue se levava a cabo esse comércio era, pto- vavelmente, a bai a ixada adiant¢ atual Praca Castro Alves," “* Porta de Santa Luzia’ — 2 08 portug om “pate as Preparavam uma destorra guerra”, . dadores, “mal { » Certamente de: , ottificados”™ sVantajos. - © mando eolocar A boy Pee dO. governador, gue! “T0z0 enibceieaa ca de uma bom my ae: Oe 10s”, ibarda e foi assim feito __ Os nativos salia © 08 cri 23 © governador deveria criar uma espécie de guarda metro~ politana, impondo o armamento das capitanias e dos morado- res. © Regimento de Tomé de Souza mandava que em cada capitania houvesse 2 falcdes, 6 bergos, 6 meios bercos, 20 a abuzes ou chucos, 40 espadas, 40 corpos darmas de algodao, dos que na... terra do Brasil se costumam”. Os donos de engenhos e fazendas deveriam construir “uma torre ou casa forte” para a sua defesa, com pelo menos 4 bergos, 10 espin- ‘gardas com a polvora necessiria, 10 bestas, 20 espadas, 10 langas ou chugos, 20 corpos d'armas de algodéo. Os simples moradores deveriam possuir ao menos besta, espingarda, ¢s- pada, lana ou chugo. © rei dava o prazo de um ano para @ compra desse armamento, sob pena de os infratores pagarem © dobro do seu valor. A distribuicdo de armas proibiam o armamento dos in! no atingia os indios, pois as leis figis. Seriam punidos com morte natural e perda de todos os bens agueles que fornecessem aos indios “artilharia, arcabuzes, espingardas, pélvora nem muni- Gao para clas, bestas e lancas, espadas € punhais, nem facas de Alemanha, nem outras semelhant. armas de qualquer fei¢do que forem, sivas”. . "Essas providéncias visavam & defesa, tanto contra os ini- migos de fora como de dentro, tanto contra os traficantes es- trangeiros de pau-brasil, especialmente franceses, como contra 08 nativos da terra ies, nem algumas outras assim ofensivas e defen- 24 fosta contra as ineurses dos franceses, © torizado a fazer ‘construir uma frota de ‘apitanias do Brasil, “para servico Para policiar a c governador estava aul navios a remo, nas varias © da terra, e defensio do mar”. Pero de Geis estava incumbido da defesa da costa. Logo 20 ehegar & Bahia, o capitio-mor den iniio 8 ofsy Ig I ll 51 tcucdo da Ribeira das Naus, também chamada Ribeira do Gois, junto as ferrarias — mais ou menos onde esté o Arsenal ce Marinha. Uma das naus da armada do governador, a Conceicao, era a capitinea; as caravelas Rainha e Leoa e o bergantim Sio Roque acompanhavam a Concei¢zo. Mais tarde, foram acres- centados A armada da costa mais dois bergamtins, 0 Sao Tiago € 0 Séo Tomé, este ‘iltimo construido na Bahia, ¢ ainda mais {arde a earavela Nazeré ¢ Esperanca, de que era capitio Ma- nuel Jacques, © escrivao da armed de Andrade, Os navios eram pequenos — e os artilheiros nfo tinham tcino. O capitéo-mor desesperava-se, pois, “andando A fala Sorn,°s ftaneeses”, no podia abordar os seuss navios, de maiot ito do que os portugueses, © “nunca houve um homem que em mais de Ginglienta tiros pudesse meter um pelouro dentro” dos navios dos corsirios, “e diziam e juravant que por forca $5 fueram vir para o Brasil, © que em’sua vida nao etree no mary nem usaram de bombardeiros”, mM certa ocasitio, por exemplo, fi a ‘ures ¢. win Becpantin, 0 caplizornor os cote oom ot 40 diffeil: “Nao havia’ mai Erauvela, © dois no bergantim, ¢ estes aprendizes, que no sa- © marinheitos to pou- se marear as velas, & ni 7 aay Gente d’armas que os criados dos oficiais de mee ee n haus: © 00 bergantim s6 dez ou doze > sem have muita gente docnaz, °° P8¥et quem pudesse remar, @ desta By ones iam aemados, “em naus grandes de du- causar “pouce isjer Ee > Ga armada da costa sé Ihes podia ; u . a ‘ Géis advertia que, se " area Pero ce Pequenos que nao podiam abairoac i 'a era Manuel Alvares, 0 feitor Vasco e850 situacao ignorancia do oficio — « @ esta terra como vém”. Cristévai ita aed ae oo ea caravela Leoa, foi pur afastado do testo da armad; eats comand, Pe sis est la exatar y dis Mune ores trace, ¥ ales do Sane ee 52 a s capitanias de Porto armada da cosia visitou (1550) as i ro ¢ S80 Vieene, oferecendo combate aos navios franceses carregavam pau-brasil nese treeho do litoral. 25 ed ior bre- (© governador deveria mandar constrir, “com a maior re Vidade e lligéneia”, navios a remo, tanto para serir 9 o°ene ria da colénia como para defendé-la dos, corséries, f armando-os © aparethando-os para a sua dupla misSS0, | Para estimular a construgdo particular de navios — 0 Ther meio de transporte em tal extensio de i iam ser a ‘ ave s. Os navios deviam s facilidades aos provveis scmadaret Cae aed 10 ¢ remo e, se fossem de quinze bat ar cm, Os = fenham de banco a banco tr6s palmios fo gn’ as munis € aparethos necessrios para a sua, consirugso, nfo, pier Se Sireitos nes Alfandegas reais; e, se fossem de mais de demote bancos, os seus donos teriam 40 cruzados ge oe Sha dao ea orden ana, a0ss4 licenca para a on eet ao oe tong consiucao. de navios © caravelOt, 2 "On are faem fianea’, obrigan’ i 2 guras © que déem Tage se erecadarem, do suplicante © do ic um ano, s 40 cruzados. ” ia no Brasil, *='S i vist Ga. vabastanga de madras” que Wav no DSS xa muito conveniente a construcio de maus. O Songs es ofa, aos que fizessem nous de 120 tonéis, ou mls, et Te tas liberdades ¢ merefs de que, gozavem of fr or paga nnaus da mesma “grandura” em Portus das do Brasil. econ Co “om Gabriel Soares nowava que se constr io Vermelho ¢ da deiras vindas da regiio do Paraguact, 30 ne occupa, ahd Tape aes 8g cm a ala : ; , a = aie net ‘nadeiras nas varias fases raiba, da cutuca ai i. e ia foi uma galé, come- ons mar avio contuido na Bahia fi uma gas cORe! sada e terminada em 1550, que © £° ‘guel Henriques, “homem honrado e para todo cargo que lhe quiserem dar”, que, em companhia de Pero Rabelo, patrao da Ribeira, seguiu para descobrir “alguma boa ventura”, subindo um dos rios da costa, em Pernambuco. “A galé partiu a 5 de novembro do ano passado (1550) e até a feitura desta nao nho nova dela; presumo, pelas grandes tormentas, que cé fo- ram muito desacostumadas, que este ano passado nunca tal vi, que ¢ perdida e que a comeu o mar...” Depois dessa galé construiu-se na Bahia a galeota ou bergantim Siio Tomé (1551), entregue ao mestre Jodo Alves, em que trabalharam, de empreitada, o carpinteiro Antonio Gon. salves, © seu criado Anténio Vaz e “um escravo.setrador”. As “ios de feitio” do Sto Tomé custaram 195. 26 Q rei mandava que se explorasse 0 interior, subindo os see paraguacu © Sdo Francisco, em bergantins “Gen providos ep mecessério... com linguas da terra e pesrans ae confianca”, plantando padi terras que descobrissem a tere © fazendo 0 relato minucioso des incidentes da expedi- It Nascimento da Cidade Es jomento — se houve ‘verdade, que se torna nclusdes de qualquer ‘o sem ntimero de Para determinar, com ext — da fundacio da Cidade do Salvador Poem de poueos dados. Téo poucos, na Y arriseado, incerto e desvantajoso tiar om espécie. Esta circunstancia explice, talvet © mt TONES e hipteses que. tém sido levanadas, desde os primes tis © 8 argumentagdo, por eres engenhos®, die a eS ra de que Taboatio se Tenibrou do dia de Togs ot auem, ar como dia de nascimento da Cidade, nfo (om TO? tial Por este ou por aquele motivo, n40 ae : i ang sre peas das dats coat ietules Dee OOo 4 1349 — 7 chegada de Tomé de Sow fessoal vindo na arma- mareo, e o pagamento. dos servigos do pessonl ine or me de, 8 pani do primeizo dia, de m8, Tor oe os mente os assemtamentos do Livro da Matwieala, PANE DO Documentos Histéricos da Biblioteca {nais, trabalho Esses documentos so coo i ae do governador Fer- descuidado e irregular, que 55 nando Portugal (1800). Nao hi ordem cronolégica, os salto: entre meses € anos so freqiientes; muitas vezes se omitem os nomes das pessoas contempladas nos mandados, com a Ples indicacdo de “tantas pessoas contetidas em um rol”, etc.; Outras vezes um documento se confunde com outro ou, eniio, nio se registra o nome do beneficiétio ou do mandante Ora a ortografia & seiscentista, ora nfo. Parece que o escriba fez a transcricdo a contragosto, sem método, copiando os ‘techos mais féceis, suprimindo ou deixando para copia e- Pois os perfodos cansativos, longos, sem interesse. Nao & pos- sivel que os Livros do governo geral, conhecida a meticulo- sidade de Tomé de Souza, fossem tio desarrumados e incom- pletos. Nao se pode inferir, 1549 © governador geral da a Cidade do Salvador? Para muitos, a data da fundacio estaria entre o primeiro dia de maio e 15 de junho. © governador dispés, em comecns de Junho, © pagamento dos servicos dos olisinis “e trabalhado- petiodo eects andaram nas obras da Cidade durante ewe Petiodo. Esses 46 dias sio, entretanto, muito pouco — e, ainda mais) alguns dos mandados de pagamento foron Passados nos Pas 2s dias de junho, embora o pagamente incluisse o tra balho por fazer até 0 dia 15. © mai Provavel é que esses pa- Samentos fossem os primeizos pagaméntor Com ‘eteto, sind NOS anos seguintes, os mandad 1s % i- ieee Os referem-se as “obras da Ci Sdn med? que os primeizos, datados de 1549, A data preferida parece ser a de 13 de junho, Nesse dia, de acordo com uma carta de Nébrega, howe Procissio, “‘inven- nfo fale amemtesto das russ, salves de artiin gt) jesuita nio fala, entretanto, em fundagao oi ida Gags festvidades se’ jusiicavam por nent 8 Cidade. Todas cidéncia — era o dia de Con i dénc us-Chiisti, mas era também, ¢ Principalmente, 0 dia de Santo Anténio de Litbos, mide mente comemorado em Portugal, © ainda agora em algumas ia Bahia, com fogueiras e divews c r C07 ‘as © diversdes cole- tivas. Quanto 20 dia de Sio'Jozo, desapoiado como estd em boas fontes, nao merece mai 7 ‘Maior consid datas sugeridas. Pode-se oe —ppinltez apenas a Cimara, os baluartes da pris, a Cass dos Armanéns, “0 hospital, a $6 de palha, a Ribeira das Naus,¢ Parte da cerea — que nfo se poderia dizer, com propriedade, ‘gue a Cidade estava fundada. Nobrega exagerava, a0 eserever em agosto: “Pode-se ji contar um: b 5 Nia eitarerioy, neon busca ‘a, solenidads da fundasio dramatizando um acontecimento que era apenas 0 simples d re dos fundadores? senso comum sugere que néo houve tal ce imbnia — que Tomé de Souza e a sua gente, tendo dado int cio is obras da Cidade, se foram instalando como puderam, 4 medida que o permitiam as circunsténcias. ss ate sse da © sovernador, chegando & Bahia, deveria tomat posse 28 Gerea da Vila Velha, entio povoada de yassalos Pore ‘Em paz com 0 gentio, repari-lay levatar “outras cons oe dela, de valas © madeira, ou taipal”, % a “tne, in gente cla enue: OF ES OE deka ede tes A cerca do Pereira nio era i OS ae ‘aleza e povoacio que Tomé de Souza deveria const ‘berano ordenava que 0 estabelecimento s¢ fm Tac dentro da baia”, para o que o governador, © golfo, 3 cada a terra, deveria mandar Soni eis ‘abundancia de Um “sitio sadio e de bons ares, rar o$ navios © VaITS= Aguas © porto em que bem possam amat Tem-se quando cumprir”. ‘ cada de acordo A fortaleza e povoacio deveria oe Na arma- Com “tragos ¢ amostras” que Tomé de rrpinas, telbeiros, caici- 4's seguiam alguns oficiais, pedreiros, MPI 69 fosse Tos, oleitos, ¢ “algumas achegas” para a8 OPEN O°. Ge pedra Possivel consirair a fortaleza “de pedra © cal, fOr NT Cre. ioe vib > © barro, ou taipas ou madeira”. Logo au ete Sadao Fecessem condigées suficientes de SegUMANE® fF port overador transferirseia pare a CiOAde. Ne haste para Na... cerca que estd feita [Vila Velha. @ Povoar ¢ defender”. ig Iéguas de termo. A nova Cidade teria seis 1éguas di 57 3 © trecho escolhido para plantar a Cidade do Salvador, sede do governo geral — uma drea de terreno irregular, de Perto de um quilémetro de comprimento por mais ou menos 350 metros em linha reta no ponto mais largo — ficava mais para dentro da bafa, para o norte, a cerca de uma légua da Vila Velha. Era o ponto mais alto da costa, nesta direcio. © bloco de colinas arqueanas, que orlam o mar, da Ponta do Padréo (o Farol da Barra) para o interior do golfo, ele- Yese, com efeito, até essa escarpa — uma falésia — caindo depois, aos poucos, até 0 promontério de Monte-Serrate, com Pequenas saliéncias e reentrancias, sobre “o Jago interior” de 53 léguas de circuito. Jaboatéo escrevia que, “por ir para ali Frtindo © seu bojo a enseada, e fazendo entrada paraa terra, fica o monte mais chegado, e sobranceiro A praia”. As rochis alteiam-se a cerca de cem metros sobre 0 Oceano, quase per Fendicularmente sobre as 4guas. Ou, como se diz wo Ling que & razio do Estado do Brasil (1612), “a Cidade to Shaion sabeca deste Estado, estd em uma Ihanura, que no dato devo montanha se faz, levantada do mar quarenta bracas...” La do alto descortina-se, a olho mu, todo ¢ horizonte, desde a en- trada da barra A subida, pela montanha ing & coroa da colina era quase plan reme, era dificil e penosa, mas i € as suas vertentes, da’ ban- itvam pata o vale do rio das Tri cer i a pas, que a cer aren sents ofa mais caudatoso, ora mene profundo, ora fazendo charcos e lamacais, A terra, levantada, voltada pa i: , , Para 0 poente, ficava no cami- ho das brisas terrestres e maritimas’ © in Diante da ribanceira havia um porto que o mar era mais fi MPO, com a vantage fonte bem a borda d'écua” Vv ie orda d’agua” que servia par: “acomodado”, em mde “uma grande ‘aa aguada dos na- Era exatamente © que Tomé de Souza duscava 58 4 Naturalmente, as consideragées de defesa miltar tiveram arande importincia na escolha desse techo da costa ‘A sede do governo geral Seava mais para dentro da buy em sitio de bons ares © abundincia de fguas, com um porto abrigado, de acordo com as recomendagdes reais, mas, situa da em posigto estratégica, oferecia outs vantagens, puramente miitares. Tanto do alto da colina como da praia, smbaixo, Podiam-se divisar, a distincia, os navios que demandassem © Porto — e atacar as velas inimiges que se aproximassem. Os fundadores tinham dues fortificagdes na parte baixa, entre 8 uals a estincia de sobre © mar ow de Sto Jorge, que desco- bria todo o mar — 0 mais poderoso dos baluartes da Cidade, E se, apesar da reagfo, 0 inimigo conseguisse desembarcar 228 winhancas, teria de transpor a barreira dégu Ss Tripas e, em qualquer caso, galgar as aaa eacoea SxPostO ao fogo dos defensores. O governo geral precatava-séy deste modo, contra qualquer surpresa, do! mar ou da tere. A cerca, os muros e os baluartes aumentaram cond mente a’seguranga proporcionada pelas defesas nats. A capital transformava-se, assim, num re Pugndvel. de se encontrava “em local Nébrega escrevia que 2 Cida ee a de muitas fontes” e Gabriel Soares contava qi wees Yos da escotha do sitio da Cidade foi haven, defronte eo Oia gue se recolhera a armada, uma fonte Pere Sot nome ‘edreiras, Ora, além desta fonte, um deg! ira — na parte baixa 8 outra que explorava — a Fonte do pee ee caminho que ligava a praia. & Cidade, poe ta; keira da Misericérdia. Hlavia ainda outra fone Ot Oe pnixa Para © norte, nas vizinhancas do baluarte Santg 2 Ponte dos (2 Ladeita do Tabudio — mais tarde ¢ Padres, 7 Em cima, na coroa da colina, havia fm fins do século xvmr, Vilhena pudes dentro na Cidade uma tinica fonte cuj ia muitas fontes, eubors cee escrever: “NGO figua se possa beber, 59 quando para gasto néo abundam... Poucas sio as casas que mae enfam sua poga em que a aproveitam; toda, porém, 6 ‘silobra”. Entretanto, ainda entio, o professor régio escrevia gue “toda a montanha na sua falda geme agua”. Os fanda- ores provavelmente se valiam dos filetes d’4gua que a monta- aaron amt iuls Dias, ‘mestre das obras, contava que, 0 maior dos dois pequenos vales do interior da Cidade, “fize- woreo ee oee muito grande de vinte palmos de véo, e tem 70 verio seis palmos de gua muito excelente, e nove de corda.. Tratava-se, certamente, de um lengol superficial, Poucos me- ‘tos abaixo do solo, Os moradores podiam valer-se, ainda, da 4gua — entio limpa — do rio das Tripas, v #0 tivesse recaido numa das ills a ee e toe “sobre uma colina scarpada, cheia de tas quebras © ladeiras, sem acess ys om ue coe: Por terra mais do qi Era “to perpendicular o decliver, Se ytte, S884 quase impraticével Sane OS precloitens cB, com exits “08 moradotes brineavam na parte fronteira a0 ubit por ele um gato, rdinéria imprevidéncia, » Construindo “casas que Parecem sustentadas pela Providén, ia, i ees ia, em um despenhadeiro Nem acre 7 Um dos primeitos cuidados do Bovernador, depois de os olhido © local, foi mandar Ievanta uma cerca — ou, como 60 dizia Tabostio, “fortitcar [a regifo] em circaito com une alla, © fore estacada de paus, para segurar com ela os solda- dos, e trabalhadores de alguma invasio do gentio desmanda- do”. Em fins de 1549, mandavam-se levar 8 at eal viios objets do reste, que se finham dado em tora de “agulhas, cipés e varas, e... outras muitas . eregaéo da Cidade. 7 5, ia es- wa cerca em breve se revelou insuficiente. [os a capar aos homens pritces, realists, afeitos & gusts, que di “glam as obras da Cidade, a inanidade dese Upo de paliads gue os bois, os porcos eos animais domésticos em geral po diam destruir. Para substituir a cerca (a obra pri ea tenha sido interrompida), o governador mi: Vantasse um muro de taipa. erate Somente Jaboatio achou que esse au ge vee a fossa taipa, de barre, e madeira”. Gabriel Soares falva, “muros de taipa grossa”, mas logo adiant ‘se nao. repararem SS vieram a0 chio por serem de txipa ¢ se nie renee unea”, de tal modo apagada a sua memérin ae er ff Jembrava da sua antiga Tocalizacdo. Tals Dis, se ore {etideu a construcio do muro — a obra fol tomads Sop ‘ada, parceladamente, por vitios pedreirs, entre os auais Xe de Carvathais © Femio Gomes (1550) — nto Tht Te as entusiasmo. Em duas cartas para 0 Reino fra as obras de taipa bras contava que uma invernada desiuira as obtes & Petieria da Cidade — “da Porta de Santa Cate? anla Luvia] até a estincia de sobre 0 eg chama de Sio Jorge, ¢ logo do baluarte de $00 es am estincia de Sao Tomé” — e reconhecia oe aria na m0 25 sido mal taipadas: “Eu com um dardo bisa mas as obras amanchava”, Os estragos mio foram forte tos tiaham, Sram “um pouco altas para taipa sem e8]” (or aa. bras 20 Minimo, 16 a 18 palmos de altura, due gy den Teduziu a 11 palmos) e foi preciso rel Ne de fora” Miguel de Arru- Uma dessas cartas de Luts Dias, a cart gga 8 e008 a fe rodear “toda a come f Sugere que os muros, em Vez ae aa", como: parela a Vient, Js a flizmente Feo 20 porto © & aguada dos navios. oat e para babso-."> iegivel, dessa carta, que diz “E até 0 ct indica esse rumo, Aa, St or

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