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 Atividade relativa ao conto “A língua do P” de Clarice Lispector (Aula do dia

04/11//2020).
 Grupo: Maria Luiza Silva Fialho, Juliana Aparecida Gonçalves dos Santos e
Joana Vasconcellos Prudente.

1- Aspectos Psicológicos ou Psicanalíticos


2- Aspectos Sociais, Culturais e Históricos
3- Linguagem e Estilo
4- Teoria da Narrativa

Síntese:

De um modo geral, o texto a princípio relata um certo humor, até por se


tratar do uso da Língua do "P" e de alguns acontecimentos aparentemente
engraçados. Mas, conforme a narrativa vai se revelando, desvendamos um
sentido mais amplo e profundo em relação ao tema, que se mostra
contemporâneo e pertinente: o machismo × feminismo (embora mais nivelado
agora); o abuso sexual ou violência contra a mulher; os aspectos socioculturais;
a questão da linguagem: a professora de línguas (Língua Inglesa), a Língua do P
(surgida na Europa e expandida por outros países posteriormente).

1. O grupo considerou que os aspectos psicológicos referentes ao conto são de


alguma forma relacionados ao desejo ambíguo da personagem entre se livrar do
estupro e ao mesmo tempo, sentir a necessidade de ser currada. A personagem
pensa na própria virgindade ao se ver sozinha no vagão com os homens, traços
de uma percepção de possível violência, incutida no imaginário coletivo e
interiorizada pela personagem. Maria Aparecida tinha desejos secretos,
inconscientes, dos quais ela própria desconhecia, porém vieram à tona quando se
deparou com aquela situação, numa espécie de instigação e revelação de suas
fantasias. A viagem referida no conto pode ser encarada como uma viagem de
descobrimento. Não a viagem a Nova York, mas a própria trajetória da
personagem no trem. Personagem faz descobertas a respeito de si: é dito que ela
inicialmente “não se conhecia” e que durante a viagem ela descobrira “ser puta”
e desejar ser currada. Ou seja, a personagem passa por um processo que
poderíamos classificar de “autoconhecimento”. Se nos atentarmos às máscaras
que a personagem troca durante a narrativa, tanto a de rigor afetuoso,
representada pela forma apurada com que se vestia, quanto a de prostituta,
representada pela maquiagem, podemos falar em uma sequência de
identificações, e, portanto, de alienação. O fato de não ser mencionada uma
outra máscara após a retirada da maquiagem, pode significar o encontro de um
rosto verdadeiro, reforçado pelo fato a maneira como ela se apresenta diante dos
outros não ser mais mencionado no texto. Porém, a identificação deixa de ser
“de imagem” para tornar-se uma identificação com uma palavra: puta. Uma
palavra que, por sua vez, emerge de uma língua falada por crianças com intuito
de enganar os adultos, a língua do P, que dá nome ao conto. Esta é a língua que
falam os agressores e que a personagem terá de reconhecer para salvar-se.
Talvez alguns conceitos lacanianos pudessem nos ajudar a pensar este nó onde
língua e subjetividade se amarram, sem apagar os aspectos sócio culturais e de
gênero envolvidos. Creio que a “língua do P” poderia ser pensada em relação ao
Nome do Pai e poderíamos remeter a descoberta da “verdade” da mulher sobre
si ao gozo feminino, como sendo um gozo não fálico que não encontra lugar
estruturação linguística do desejo. No conto, o que a personagem descobre sobre
si é mal traduzido pela palavra puta. Mas seria ela uma puta, ou não haveria
palavra para o que sentia?

2. O conto apresenta a mulher exatamente como na sociedade: em uma posição de


vulnerabilidade, ao mesmo tempo que a objetifica como objeto de sexual de
prazer masculino. A personagem do conto, como a maioria das mulheres,
quando se encontra em uma situação de perigo, tende a considerar o estupro em
primeiro lugar, um traço ainda presente na sociedade atual. A ideia de que
apenas uma mulher recatada interessa os homens é apresentada à medida que a
personagem usa de psicologia reversa para convencer os homens a não viola-la e
o truque funciona. A personagem usa o termo “cara de prostituta” para se referir
ao seu rosto maquiado excessivamente, revelando mais um preconceito
machista. O fato de Maria Aparecida pertencer a uma classe média baixa e sua
ascensão dar errado, revela um aspecto importante da organização social: ela não
muda. É como se a mesma fosse punida por tentar entrar num mundo distante do
dela, e o seu próprio nome, comum entre o proletariado, entrega esse aspecto
dentro do texto. Através da "barata gorda" na prisão onde ela foi parar, podemos
comparar a beleza da moça e seus modos finos, seu papel na sociedade como
professora e mulher independente de certa forma, versus a imagem da grotesca
barata se arrastando pelo chão, um sinal de decadência e oposição. Há também a
maneira pejorativa como a personagem se refere as mulheres negras, quando
conta que se requebrou igual “sambista do morro” para evitar o latrocínio, dando
a compreender como um comportamento indesejado. O fato da cor da estação
ser azul e rosa pode representar de alguma forma o masculino x o feminino.

3. A linguagem apresentada, embora seja inventada e usada por crianças, determina


a tensão do conto. Sua importância fica clara desde o título, que não remete a
nenhum personagem, mas uma brincadeira infantil: um código usado por
crianças para burlar a vigilância dos adultos. Da mesma maneira, o texto brinca
com o leitor, pois se traveste de superficialidade divertida, mas toca temas
complexos e violentos. Conto narrado com frases curtas e de modo direto, quase
sem digressões “clariceanas”. O ritmo mimetiza as quebras duras que a língua
do P promove na fala. As repetições, nas partes faladas em língua do P, atingem
o nível silábico. A língua do P, em torno da qual o conto se organiza tem
características muito interessantes: O P é a letra de puta, signo com o qual a
personagem se identifica, mas também é de phalo, pênis etc, remetendo ao sexo
dos agressores. Como é em função da ameaça de estupro que a mulher reage e
que sua sorte muda, é na chave do sexual que esta língua tem de ser lida. É dito
que “a língua do P não tem explicação”. É como se essa língua representasse, de
alguma forma, uma sala secreta onde os homens julgavam que apenas eles
teriam acesso, mas Maria Aparecida também a adentra e se beneficia disso.
Embora a língua do P seja informal, o texto é escrito em linguagem formal e
apresenta o uso de aliterações, considerado um recurso fônico de intensificação.
A língua do P é utilizada pelos assaltantes-assassinos, sendo assim uma maneira
de linguagem marginalizada, que revela que a personagem em si tem traços de
marginalização. A mulher posteriormente assassinada lança um olhar de
desprezo para Maria Aparecida e provavelmente foi a vítima da vez, e por não
compreender aquela linguagem marginal, não pôde se salvar. O retorno às
origens de Maria Aparecida salvou-lhe a vida. "Tinha que pensar depressa,
depressa, depressa" / "E andava pelas ruas, desgraçada ela, desgraçada
Copacabana": A repetição das palavras na primeira frase dá ênfase ao
pensamento da personagem. Já na segunda frase, ela se utiliza de anáforas para
reforçar a palavra desgraçada, fazendo uma analogia em relação à sua própria
situação e a decadência que marca aquele ambiente.

4. O narrador é observador, mas embora não participe das ações, ele escolhe
seletivamente o que irá mostrar para o leitor. Os acontecimentos se dão na
estação de trem, no trem, no túnel, se desenrolam na delegacia, e por fim, na Av.
Copacabana. O tempo do conto se inicia de madrugada e se passam 3 dias até a
soltura de Cidinha. Os personagens apresentados são Maria Aparecida, os dois
homens no trem, a idosa no trem, o maquinista, o Soldado José Lindalvo e por
fim, a mulher com a maleta.

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