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UNIDADE 2

A Biblioteconomia e suas relações


com a Arquivologia, a Museologia e a
Documentação como áreas afins8

“Sempre imaginei que o paraíso será uma espécie


de biblioteca” (Jorge Luis Borges).

O homem – desde os tempos mais remotos – sempre procurou


meios de entender, preservar e ampliar a sua memória e suas
possibilidades de se comunicar. Para tanto, utilizou um elemento
central – a informação – sem a qual a viabilidade desses processos
fica comprometida.
Segundo Pinheiro (2002), a informação, em um conceito res-
trito, está imersa em um campo de pesquisas que se relaciona
a documentos impressos e a bibliotecas. Le Coadic (2004) apre-
senta um conceito mais amplo, definindo a informação como um
conhecimento registrado, em forma escrita (impressa ou digital),
oral ou audiovisual, em um suporte espacial-temporal (impresso,
sinal elétrico, onda sonora etc).
As primeiras disciplinas que atuavam no campo da infor-
mação eram: a BIBLIOTECONOMIA, a ARQUIVOLOGIA, a MUSEOLOGIA e a
DOCUMENTAÇÃO (LE COADIC, 2004). Estas disciplinas, e outras que
se uniram a elas, atualmente, fazem parte do que se chama de
“Indústria da Informação”.
O ponto comum entre elas é que atribuíam muito mais valor
ao suporte do que à informação em si mesma. O livro, na bibliote-
ca, e a peça, no museu, foram por muito tempo recolhidos, arma-
zenados e guardados com o fim de preservação patrimonial.

8. Fundamentado, principalmente, em: LE COADIC, Y. A Ciência da Informação. 2.


ed. Brasília, DF, Briquet de Lemos/Livros, 2004.

36 A Biblioteconomia e suas relações ... como áreas afins


A Biblioteconomia
Segundo Le Coadic (2004), o termo “biblioteconomia” se consti-
tui da união de duas palavras – biblioteca e economia – esta no
sentido de organização, administração, gestão.
Fonseca (2007) apresenta outra composição morfológica do
termo:
Biblion = livros + theca = caixa + nomos = regra
Ampliando-se esta definição morfológica, tem-se que a
Biblioteconomia compreende as regras de organização de livros
ou outros documentos em caixas, materializadas em estantes, sa-
las, edifícios etc.
Para Le Coadic (Id.), a Biblioteconomia como área do conhe-
cimento tem seu foco inicial: a) nos acervos de livros (formação,
desenvolvimento, classificação, catalogação, conservação); b) na
própria biblioteca como instituição organizada (regulamento, pes-
soal, contabilidade, instalações, infraestrutura) e c) nos leitores –
os usuários (direitos e deveres, acesso ao acervo, empréstimos).
Para o autor, as bibliotecas tradicionais – que conservavam
apenas livros – foram sucedidas por organizações – que podem ter
outra nomenclatura – e que reúnem acervos dos mais diversifica-
dos, tanto por seus suportes, como por sua origem: imagens, sons,
textos. Estas organizações podem ser chamadas de Unidades de
Informação, porque abrigam não somente as obras armazenadas
ao longo dos anos, mas também informações em tempo real, vei-
culadas por redes de comunicação.
A evolução da Biblioteconomia tem se caracterizado por duas
orientações principais: passando da erudição para o serviço ao
público.
Os primeiros bibliotecários eram homens eruditos, que fun-
daram bibliotecas – como a famosa BIBLIOTECA DE ALEXANDRIA – na
foz do Rio Nilo, no Egito. Eles se ocupavam em reunir e classificar
todo o conhecimento registrado em forma documental.
Este bibliotecário – erudito e BIBLIÓFILO – dominou a profissão
até o início do Séc. XIX, quando começaram a se desenvolver as
tendências democráticas, com a valorização das práticas iguali-
tárias.
Com a propagação das bibliotecas públicas, no Séc. XIX, fun-
damentada na filosofia de educação como direito de todos, tomou

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 37


corpo o ideal de serviço para a comunidade. Esta mudança de
orientação – da erudição ao serviço ao público – manifestou-se
claramente, em 1876, ao ser fundada a American Library Associa-
tion (ALA), na Filadélfia, nos Estados Unidos.
Este marco levou a Biblioteconomia a trilhar caminhos dife-
rentes, que não têm cessado de se diversificar. Contribuindo para
a consolidação da área, foram criadas instituições, em nível in-
ternacional e nacional, como a International Federation of Library
Associations (Ifla), em 1927, e a Federação Brasileira de Associa-
ções de Bibliotecários (Febab),9 em 1959.
Desde então, a Biblioteconomia é considerada como uma
área do conhecimento, na medida em que compreende um con-
junto de organismos, operações técnicas e princípios que dão aos
documentos a utilização máxima, em benefício da humanidade
(SHERA, 1980).

A Arquivologia
A Arquivologia nasce no Séc. XIX, com caráter fortemente histo-
ricista.
A conceituação da área, sob uma perspectiva francesa, apon-
ta que a Arquivologia é a ciência que estuda os princípios e os
procedimentos metodológicos empregados na conservação dos
documentos de arquivos, permitindo assegurar a preservação dos
direitos, dos interesses, do saber e da memória das pessoas físicas
e morais (DELMAS, 1990 apud JARDIM, 1998).
Na França, o termo “Archivistique” surge nos anos de 1930,
impondo-se ao termo “Archivologie”.
A ARQUIVÍSTICA do Séc. XX, uma disciplina no sentido pleno do
termo, é então:

o conjunto de princípios e métodos que regem a


criação, a aquisição, a classificação, a descrição, a
difusão e a conservação de arquivos (COUTURE,
1992 apud JARDIM, 1998).

9. Atualmente denominadas International Federation of Library Associations and


Institutions (Ifla) e Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários e Cientis-
tas da Informação (Febab), respectivamente.

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O Dicionário de Termos Arquivísticos do Arquivo Nacional
(1992) distingue os dois termos: Arquivologia é definida como a
disciplina que tem por objeto o conhecimento dos arquivos e de
Arquivística, e esta como a reunião de princípios e técnicas a se-
rem observados na produção, organização, guarda, preservação e
utilização dos arquivos. Estes conceitos são legitimados no Brasil
também pela Associação dos Arquivistas Brasileiros.
Os arquivos, influenciados pelas tecnologias de informação,
já disponibilizam seus acervos eletronicamente, proporcionando
aos usuários de qualquer parte do mundo o acesso a documentos
históricos, antes praticamente inacessíveis.

A Museologia10
É definida como a área do conhecimento que se ocupa da orga-
nização dos museus. Tem seu foco: a) nas coleções de objetos e
reservas técnicas (formação, desenvolvimento, classificação, con-
servação e exposição para cientistas e público em geral); b) no
próprio museu como instituição organizada (regulamento, pes-
soal, contabilidade, instalações, infraestrutura) e c) nos visitantes
– os usuários (direitos e deveres, do pessoal e do público, acesso
às coleções).
O profissional que atua nos museus – o museólogo – dedica-
se à organização, à classificação, à conservação e à exposição de
peças de valor histórico, artístico, cultural e científico. Sua mis-
são é transmitir conhecimentos e desenvolver ações culturais por
meio de seus acervos.
Assim como as bibliotecas e os arquivos, os museus hoje têm
uma atuação mais arrojada, pois estão abertos à visitação do pú-
blico em geral, deixando de lado a primazia aos cientistas e à
guarda patrimonial do acervo, haja vista a frequência em massa
de estudantes e turistas e, ainda, a lógica da rentabilidade ao se
cobrar ingressos para entrada em seus espaços.

10. Chamada por Le Coadic (2004) de Museoconomia, como analogia à junção


dos termos museu e economia.

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Com o advento da Internet, as visitas aos museus se expandi-
ram para o plano virtual e a grande maioria dos museus já dispo-
nibiliza suas coleções on-line.

A Documentação
A partir do crescimento incalculável da informação, causado pela
Revolução Industrial, deflagrada em toda a Europa e nos Estados
Unidos, no final do Séc. XIX, várias tentativas foram efetuadas
para realizar um CONTROLE BIBLIOGRÁFICO UNIVERSAL.11
A iniciativa mais importante coube a dois advogados belgas
– PAUL OTLET e HENRI LA FONTAINE – que se preocupavam em poder
levar ao conhecimento de todos os cientistas, e de outros interes-
sados, a literatura científica, assim como todos os produtos do
conhecimento gerados no mundo.
Otlet e La Fontaine planejaram criar uma BIBLIOTECA UNIVER-
SAL, a qual não reuniria acervos, mas sim referências de como
encontrar produtos de interesse, utilizando para isso as técnicas
fundamentais da Biblioteconomia.
Para coordenar tais atividades foi fundado – em 12 de setem-
bro de 1895 – o Instituto Internacional de Bibliografia (IIB), em
Bruxelas, que passou a desenvolver ferramentas para registrar, de
forma sistemática e padronizada, as referências dos documentos.
Um dos primeiros objetivos do IIB era o de desenvolver um
sistema de classificação único, a ser adotado na indexação dos
documentos. Com isso, surgiu a CLASSIFICAÇÃO DECIMAL UNIVERSAL
(CDU), cuja 1ª edição foi publicada em 1905. Esta classificação
oferecia a possibilidade de tratar diferentes tipos de documentos,
além dos livros e de outros produtos impressos.
Outro fato relevante foi a criação, também por Paul Otlet, do
conceito de documento – que se estendeu do livro para a revista,
o jornal, a peça de arquivo, a estampa, a fotografia, a medalha, a
música, o disco, o filme, e até a outras amostras e espécimes, com
três dimensões e, eventualmente, em movimento. Este conceito
de documento vem unir – em uma abordagem mais abrangente

11. Pressupõe um domínio completo sobre os materiais que registram o conhe-


cimento, objetivando sua identificação, localização e obtenção (CAMPELLO,
2006).

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– entidades até então separadas, em virtude do suporte físico –
o arquivo, a biblioteca e o museu (BRIET, 1953 apud JARDIM,
1998).
Com a obra de Otlet, foi instituído, também, um novo con-
junto de técnicas para organizar, analisar os documentos, descre-
vê-los e resumi-los, técnicas essas diferentes das usadas na Biblio-
teconomia tradicional. A esse conjunto de técnicas, chamou-se
Documentação.
Diante desses novos conceitos, o IIB foi transformado – em
1931 – em Instituto Internacional de Documentação (IID), que
visava fornecer meios de controle para os novos tipos de supor-
te do conhecimento. Este organismo – em 1938 – passou a se
chamar Federação Internacional de Documentação (FID). Desde
1986, se denomina Federação Internacional de Informação e de
Documentação (FID), sendo o órgão máximo da área, que perma-
nece atuante até os dias de hoje, tendo completado 110 anos de
criação, em 2005.
Apesar da criação da Biblioteca Universal de Otlet e La Fon-
taine não ter sido implementada, da forma como foi idealizada,
foi materializada com a criação do MUNDANEUM, em 1910, em
Haia, que chegou a reunir, em 1914, 11 milhões de fichas cata-
lográficas, constituindo-se em um verdadeiro repertório mundial
do conhecimento.
O trabalho de Otlet e La Fontaine deixou como legado a cria-
ção de novos conceitos como o de documento e de BIBLIOGRAFIA, e,
ainda, a Classificação Decimal Universal.
Outra grande contribuição da Documentação foi a publicação
do TRAITÉ DE DOCUMENTATION, por Paul Otlet, em 1934, que ressal-
tou – entre outras coisas – a identificação dos novos suportes da
informação como portadores de memória e, ainda, a importância
da organização da informação, visando à sua recuperação pela
humanidade.
Paul Otlet apresenta, nessa obra, a seguinte previsão sobre o
acesso ao conhecimento registrado:

Tudo no universo e tudo do homem poderia ser re-


gistrado na distância em que foi produzido... De
uma distância, todos poderiam ler textos, amplia-
dos e limitados ao assunto desejado, projetado em

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uma tela individual. Dessa forma, qualquer pes-
soa sentada em sua cadeira poderia ser capaz de
contemplar a criação, como um todo ou em certas
partes (OTLET, 1934, p. 390-391, apud WRIGHT,
19??).

Sob a ótica de uma linha de tempo, esta previsão de Otlet


pode reunir sob um único objetivo – o acesso ao conhecimento – a
Biblioteca de Alexandria, do Séc. III a.C., o Mundaneum, do Séc.
XIX e a Internet do Séc. XX.

Referências
CAMPELLO, B. S. Introdução ao controle bibliográfico. 2.ed. Brasília, DF:
Briquet de Lemos/Livros, 2006.
DICIONÁRIO de termos arquivísticos do Arquivo Nacional. Rio de Janei-
ro: Arquivo Nacional, 1992.
FONSECA, E. N. da. Introdução à Biblioteconomia. 2. ed. Brasília, DF:
Briquet de Lemos/Livros, 2007.
JARDIM, J. M. A produção de conhecimento arquivístico: perspectivas
internacionais e o caso brasileiro (1990-1995). Ciência da Informação,
Brasília, DF, v. 27, n.3, 1998.
LE COADIC, Y. A Ciência da Informação. 2. ed. Brasília, DF: Briquet de
Lemos/Livros, 2004.
OLIVEIRA, M. de (Coord.). Ciência da Informação e Biblioteconomia:
novos conteúdos e espaços de atuação. Belo Horizonte: Ed. da UFMG,
2005.
PINHEIRO, L. V. R. Gênese da Ciência da Informação: os sinais enun-
ciadores da nova área. In: AQUINO, Miriam A. O campo da Ciência da
Informação: gênese, conexões e especificidades. João Pessoa: Ed. Univer-
sitária, 2002. p. 61-86.
SHERA, J. H. Sobre biblioteconomia, documentação e ciência da infor-
mação. In: GOMES, Hagar Espanha (Org.). Ciência da informação ou in-
formática? Rio de Janeiro: Calunga, 1980. p. 90-105.
WRIGHT, Alex. O antepassado esquecido: Paul Otlet. Disponível em:
http://tecnologica.extralibris.info/internet/o_antepassado_esquecido_
paul_o.html. 19??. Acesso em: 26 mar. 2007.

42 A Biblioteconomia e suas relações ... como áreas afins


A Biblioteconomia e a Ciência
da Informação: paradigmas e
interdisciplinaridade12

“A aventura bibliográfica iniciada na Bélgica, no fi-


nal do Séc. XIX, pode muito bem ser considerada,
em retrospecto, um importante aspecto histórico
do desenvolvimento da Ciência da Informação nos
Estados Unidos e em outros lugares, na segunda
metade do Séc. XX” (Boy Rayward).

A Biblioteconomia – como uma das mais antigas disciplinas que


se ocupa do acesso à informação e de sua transmissão para os
povos futuros – apresenta grandes marcos, como a criação das
bibliotecas que mais se destacaram na história da humanidade.

Principais Bibliotecas
A Biblioteca de Alexandria, uma das mais importantes bibliotecas
da Antiguidade, instituída por Ptolomeu I, em 288 a.C., foi orga-
nizada sob decisiva influência de Aristóteles, tendo como modelo
o clássico GYMNASIUM (CHASSOT, 2002).
Esta biblioteca foi criada com a finalidade de reunir e classi-
ficar todos os conhecimentos registrados em forma documental.
Possuía 10 grandes salas de investigação e leitura, vários jardins,
horto, zoológico, salas de dissecações e observatório astronômico.
Tem-se notícia que seu acervo chegou a alcançar 700 mil rolos de

12. Fundamentado em OLIVEIRA, M. de (Coord.). Ciência da Informação e Biblio-


teconomia: novos conteúdos e espaços de atuação. Belo Horizonte: Ed. da UFMG,
2005.

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papiro, o que poderia equivaler de 100 a 125 mil livros impressos
de hoje. Esse complexo foi devastado em diferentes momentos,
em função de guerras, de fenômenos naturais (incêndios) e, ain-
da, devido ao medo de que o saber, quando socializado, dimi-
nuísse o poder dos déspotas. Sua destruição começa com o pri-
meiro grande incêndio (47 a.C.) e termina com uma guerra, no
ano de 619, na qual os persas arrasaram totalmente Alexandria
(CHASSOT, 2002).
No ano de 1974, sob a liderança da Universidade de Ale-
xandria, desencadeou-se um projeto internacional – apoiado pela
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco) – para construção de uma nova biblioteca. Em
1990, foi assinada a Declaração de Assuã para a recuperação da
instituição e, em 1995, foi colocada a primeira pedra da imponen-
te construção. O custo total da obra girou em torno de US$ 220
milhões e, em 2002, a nova biblioteca foi inaugurada, inserida
em um imponente complexo com uma área total de 84.405m2,
dos quais 37.000m2 são exclusivos para a biblioteca; os demais se
destinam a um Centro Cultural, um Museu de Ciências, um Mu-
seu Arqueológico, um Museu de Manuscritos – com mais de oito
mil documentos de grande valor –, laboratórios de restauração e
um moderno planetário construído pela França, além de outros
serviços técnicos (Id.).
Na biblioteca, há uma grande sala de leitura com cerca de
20.000 m2, instalados em 11 níveis distintos; dos quais, sete estão
acima da superfície e quatro subterrâneos, dotados de refrigera-
ção e modernos equipamentos tecnológicos. A coleção – com ca-
pacidade para abrigar oito milhões de itens – está distribuída por
temas, em função da classificação internacional. Cerca de dois mil
leitores podem usar simultaneamente as salas, por meio de acesso
local ou virtual (Id.).
As bibliotecas da Antiguidade, cujos acervos eram constituídos
de coleções de tijolos de argila, de rolos de papiros, de códices –
apresentados em folhas de pergaminho – passam por uma grande
evolução, influenciadas por grandes invenções como a manufatura
do papel, no Oriente, e o surgimento da Imprensa, no Ocidente.
Com foco no cenário cristão, cabe destacar as bibliotecas da
Idade Média, inseridas nos conventos e nos mosteiros, também

44 A Biblioteconomia e a Ciência da Informação: paradigmas e interdisciplinaridade


conhecidas como BIBLIOTECAS MONÁSTICAS, monacais ou conven-
tuais.13 Nessas instituições, cujo acesso era restrito ao clero e a
alguns nobres, os copistas refugiavam-se no SCRIPTORIUM, para ler,
ilustrar, traduzir e copiar todo e qualquer manuscrito que chegas-
se ao seu poder, mais uma vez com o objetivo de registrar todo o
conhecimento gerado no mundo.
Como retratada no romance O nome da Rosa, por Humberto
Eco (2009), a biblioteca dos mosteiros medievais se apresenta
como um lugar quase inacessível, na qual a própria construção foi
realizada – como verdadeiros labirintos – de forma a dificultar o
acesso às obras desejadas. Battles (2003) descreve com primor a
magia desse cenário:

Reunidos aos milhões, empilhados, puídos, lidos


e esquecidos, os livros de uma biblioteca vão ga-
nhando uma vida própria, não exatamente como
textos, mas como objetos físicos do mundo.

No Renascimento, surge um novo tipo de biblioteca, consti-


tuído pelas coleções particulares dos humanistas, as quais podem
ser consideradas como precursoras das bibliotecas modernas.14
Exemplos dessas bibliotecas são a dos Estes, em Ferrara, a dos
Médici, em Florença, e mesmo a Biblioteca do Vaticano, fundada
em 1450, pelo Papa Nicolau V.
O Séc. XVI, principalmente com o advento da imprensa –
considerado como o primeiro grande momento de impacto para
a informação – acompanha o surgimento de grandes bibliotecas
universitárias, como a de Oxford, na Inglaterra. As palavras de
Bill Gates descrevem muito bem esse fato histórico:

Antes de Gutenberg, havia uns 30 mil livros em


todo continente europeu, a maioria Bíblias ou co-
mentários bíblicos. Por volta de 1500, havia mais

13. Uma curiosidade – que até hoje marca a história da Biblioteconomia – é a


do “dedo em riste”, que simboliza o bibliotecário pedindo silêncio na biblioteca;
ela, possivelmente, advém das bibliotecas monásticas. Esse gesto tem origem nos
sinais trocados entre os monges copistas, que tinham que obedecer às ordens de
silêncio, estabelecidas nos mosteiros.
14. Uma das características das “bibliothecas modernas” é a acessibilidade dos
livros ao público.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 45


de 9 milhões de livros, sobre tudo quanto é assun-
to... Pela primeira vez, quem se achava fora da elite
eclesiástica teve acesso à informação escrita... (GA-
TES, 1995, p. 19-20).

As bibliotecas nacionais começam a surgir no Séc. XVII, com


a Biblioteca Nacional de Berlim, mas é no Séc. XVIII que são cria-
das as grandes bibliotecas nacionais, como a Biblioteca Nacional
Espanhola, fundada em Madrid, em 1712, por Filipe V, a qual
possuía em seu acervo coleções de manuscritos magníficas, assim
como de primeiras impressões valiosas.
Outro fato relevante para a área de Biblioteconomia foi a
publicação do primeiro livro, destinado a apoiar a organização
de bibliotecas: “Advis pour dresser une bibliothèque”, escrito por
Gabriel Naudé, em 1627.
A Revolução Francesa também se constitui em um evento
importante para a área de Biblioteconomia visto que levanta,
como uma de suas bandeiras, a da igualdade entre os homens,
fazendo com que as grandes bibliotecas particulares fossem
abertas para consulta do povo, levando ao surgimento das bi-
bliotecas públicas.
Nos Estados Unidos, outro grande marco da Biblioteconomia é
a criação da BIBLIOTECA DO CONGRESSO, em 1800, duas vezes destruída
pelo fogo e depois reconstruída. Pode ser comparada, no Séc. XXI,
à Biblioteca de Alexandria, pelo seu objetivo de reunir todas as in-
formações sobre o conhecimento produzido no mundo.
Estes se constituem em grandes marcos da Biblioteconomia,
antes mesmo que ela se constituísse em área do conhecimen-
to, fato que ocorreu a partir da criação dos primeiros cursos
da área, como o da Ècole Nationale des Chartes, na França, em
1821, e o da Columbia University, em 1887, nos Estados Unidos.
Este último curso foi criado por MELVIL DEWEY, que se tornou um
dos personagens mais importantes na área, por suas inúmeras
contribuições, como a criação, em 1876, da ALA, a publicação
do primeiro periódico científico especializado – Library Journal
– e do primeiro código de classificação, conhecido como “CLASSI-
FICAÇÃO DECIMAL DE DEWEY (CDD)”.

46 A Biblioteconomia e a Ciência da Informação: paradigmas e interdisciplinaridade


Conceituação de Biblioteconomia
Um dos primeiros conceitos de Biblioteconomia é emitido pela
ALA, definindo-a como uma área voltada para a aplicação prática
de princípios e normas à criação, organização e administração de
bibliotecas.
Parece ser mais pertinente o conceito de Buonocore (1963),
que define a Biblioteconomia como a área que se destina ao estu-
do dos princípios racionais para realizar, com a maior eficácia e o
menor esforço possível, os fins específicos das bibliotecas. Para o
autor, a Biblioteconomia se subdividia em duas subáreas: a técni-
ca e a administrativa. A primeira preocupava-se com a seleção, a
aquisição, a catalogação, a classificação e a ordenação das obras
nas bibliotecas; a segunda, com o local, a arquitetura, o mobiliá-
rio, o pessoal, o uso, o regulamento, os recursos financeiros, tudo
isso para que a biblioteca pudesse atender aos seus usuários com
eficiência.
Esse conceito é complementado por Targino (2006), à luz do
Séc. XXI, como:

a área do conhecimento que se ocupa com a orga-


nização e a administração das bibliotecas e outras
unidades de informação, além da seleção, aquisi-
ção, organização e disseminação de publicações
sob diferentes suportes físicos.

Com base nesses conceitos, autores como Francis Miksa


apontaram como PARADIGMA da Biblioteconomia a visão da biblio-
teca como uma instituição social, fundamentando-se nos campos
da Sociologia e da Educação, tendo como foco a Biblioteca em si
mesma (OLIVEIRA, 2005).

Paradigma15 da Biblioteconomia
Com base nesse paradigma, a biblioteca é considerada como o
foco principal da área e é entendida como uma organização so-
cial, que compreende propriedades materiais, organizacionais e

15. Para Thomas Kuhn (1975), o termo paradigma quer dizer “um modelo ou
padrão de ciência que é compartilhado por uma determinada comunidade”.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 47


intelectuais, as quais servem para definir suas funções em uma
estrutura social.
Dentro das propriedades materiais encontram-se as coleções
dos documentos e os equipamentos especializados; as proprieda-
des organizacionais referem-se às medidas administrativas e de
pessoal; e as propriedades intelectuais referem-se aos sistemas,
tais como, o sistema de classificação, as regras de catalogação e
as políticas de seleção.
Oliveira (2005) aponta que o paradigma da Biblioteconomia
que considera a biblioteca como instituição social se apoia em seu
papel de “fio condutor” entre os indivíduos e o conhecimento que
eles necessitam.
Sob esse prisma, a função mais importante da biblioteca é
possibilitar o uso de sua coleção de documentos a um dado públi-
co e, para isso, são desenvolvidas atividades de aquisição, organi-
zação, tratamento e disseminação desses documentos, utilizando-
se técnicas apropriadas e pessoal qualificado.
A autora ressalta que a aceitação deste paradigma é prejudi-
cada por duas grandes questões: a primeira refere-se à preocupa-
ção primária com o armazenamento e a conservação dos acervos,
considerando o suporte do documento mais importante do que
o seu conteúdo. A segunda questão relaciona-se com a valoriza-
ção secundária ao atendimento aos usuários, os quais deveriam
se constituir no foco principal das atividades realizadas. Para se
compatibilizar com o cunho social da área, estes deveriam fazer
parte integrante das discussões relativas ao planejamento e ava-
liação de todos os produtos e serviços oferecidos.
As discussões a respeito dessa fragilidade no paradigma da
área de Biblioteconomia – aliadas às necessidades cada vez mais
prementes dos usuários, em obter informações relevantes, no me-
nor tempo possível – apontaram para a necessidade de criação de
uma nova área do conhecimento que priorizasse o atendimento
ao usuário em suas necessidades informacionais; nesse contexto,
surge a CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO.

48 A Biblioteconomia e a Ciência da Informação: paradigmas e interdisciplinaridade


A Ciência da Informação (C.I.)
Segundo Oliveira (2005) a Ciência da Informação tem sua gê-
nese no cenário da revolução científica e técnica, que ocorre
logo após a Segunda Guerra Mundial, tendo sofrido grandes in-
fluências da Documentação e da RECUPERAÇÃO DA INFORMAÇÃO. A
primeira, pelo desenvolvimento de novos conceitos – como o de
documento, por exemplo – e novas instituições na área – como
o IIB – IID – FID.
A influência da Recuperação da Informação é percebida a
partir da criação dos sistemas automatizados de recuperação
de informações, que começaram a surgir em meio ao boom in-
formacional presente após a Segunda Guerra Mundial. O inte-
resse dos países mais desenvolvidos pelas atividades de ciência
e tecnologia, que ocasionou um aumento considerável na ge-
ração e nas buscas de conhecimentos, dá origem ao fenômeno
que foi denominado, por VANNEVAR BUSH, de explosão da infor-
mação.16 Esse fenômeno foi, também, explicado por Saracevic
(1996) como um problema social que teve seu início com o
desenvolvimento das ciências e hoje se estende para todas as
atividades humanas.
O gráfico, a seguir, ilustra a explosão da informação, retra-
tando a expansão das revistas científicas.
Como pode ser visto no gráfico, foi realizada uma previsão,
em 1994, de que as revistas científicas – que começaram a ser
editadas em meados do Séc. XVII – chegariam no Séc. XXI ao
número de 1.000.000 de títulos. Essa previsão foi confirmada
pelo cadastro do sistema do International Standard Serial Number
(ISSN), que totaliza, em 2009, o número de 1.489.773 registros
de periódicos.17
Esse cenário traz o foco, mais uma vez, para a preocupação
de Otlet e La Fontaine de fazer com que esses documentos pudes-
sem estar acessíveis a todos os interessados.

16. Também conhecida como Explosão Informacional, ou Explosão Bibliográfica.


17. www.issn.org. Só no ano de 2009 foram cadastrados 75.831 registros novos.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 49


Gráfico 1

Em 1945, Vannevar Bush, um respeitado cientista do Mas-


sachussets Institute of Technology (MIT), que durante a guerra
havia ocupado o cargo de chefe do esforço científico america-
no, na procura de uma solução para o problema da explosão da
informação, propõe a criação de uma máquina que nomeou de
MEMEX.18 Processos de coleta, armazenamento e transmissão de
informações, utilizando técnicas como a mecanização e a micro-
filmagem, proporcionariam o armazenamento de livros e outros
documentos, contendo informações que poderiam ser recupe-
radas posteriormente. O invento teria a capacidade de associar
ideias, “duplicando os processos mentais artificialmente” e, por-
tanto, apoiaria na tarefa de tornar mais acessível um acervo cres-
cente de conhecimento. Apesar de a Memex não ter sido criada,
as ideias de Bush deram origem a inúmeras discussões sobre o
assunto, mais tarde culminando na invenção dos computadores,

18. Memex = Memory Extension.

50 A Biblioteconomia e a Ciência da Informação: paradigmas e interdisciplinaridade


o qual se tornou uma ferramenta indispensável para organização,
disseminação e recuperação da informação (BUSH, 1945).
Ainda com o objetivo de explicar o desenvolvimento da C.I.,
Meadows (1991) indica um outro evento importante: a descrição
da TEORIA MATEMÁTICA DA INFORMAÇÃO,19 por Claude Shannon e War-
ren Weaver, na década de 1940. Como mencionado antes, esses
dois engenheiros de rádio e telefonia, entendendo o processo de
comunicação como a transmissão de uma mensagem entre uma
fonte (emissor) e um destino (receptor), utilizando um canal, es-
tabeleceram uma analogia com a transmissão de sinais elétricos
por meio de canais mecânicos de comunicação. Porém, essa teoria
não se importava com o conteúdo ou a finalidade da informação,
considerando-a como somente aqueles símbolos que são incertos
para o receptor.
Outro marco no desenvolvimento da área de C.I. foi a criação
do Institute of Information Scientists (IIS), em 1958, no Reino
Unido, que deu origem ao termo “cientistas da informação”. O
surgimento desse termo que pode ser atribuído devido ao cresci-
mento das pesquisas especializadas nas indústrias modernas, sen-
do os profissionais que se dedicaram a essas tarefas designados
com esse título.
Os cientistas da informação se distinguiam dos cientistas de
laboratórios, na medida em que os primeiros se constituíam em
profissionais de várias disciplinas que se dedicavam às atividades
de organizar e suprir de informações seus colegas cientistas de
laboratórios.
Nascida, formalmente, em 1962, em uma reunião do Georgia
Institute of Technology, a C. I. foi definida como:

a ciência que investiga as propriedades e o compor-


tamento da informação, as forças que governam o
fluxo da informação e os meios de processamento
da informação para acessibilidade e usabilidade
ótimas (SHERA, 1977 apud BRAGA, 1995).

Borko (1968) reitera a definição de Shera, apontando que


essa abordagem relaciona-se com a tarefa de produção, coleta,

19. Também conhecida como Teoria Matemática da Comunicação.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 51


organização, armazenagem, interpretação, transmissão, transfor-
mação e utilização da informação. Refere-se, dessa forma, a todo
o ciclo informacional.
Nesse mesmo prisma, Targino (2006), usando como base a
premissa da ciência como instituição social dinâmica, contínua e
cumulativa, entende a C.I. como decorrência da Biblioteconomia
e da Documentação, definindo-a como:

o conjunto de conhecimentos relativos à origem, à


coleta, à organização, ao armazenamento, à recu-
peração, à interpretação, à transferência, à trans-
formação e à utilização da informação.

Saracevic (1996) redefiniu a C.I. como um campo dedicado


a questões científicas e à prática profissional voltadas para os pro-
blemas de comunicação do conhecimento [...] entre seres huma-
nos, no contexto social, institucional ou individual, do uso e das
necessidades de informação.
Em meados da década de 1960, o reconhecimento da área
de C.I. é expresso, formalmente, quando o American Documen-
tation Institute (ADI) muda seu nome para American Society for
Information Science (Asis) e o periódico editado por aquela insti-
tuição, intitulado American Documentation, passa a se denominar
Journal of the American Society for Information Sience (Jasis).
No Brasil, a C.I. foi introduzida no início da década de 1970,
com a implantação do curso de mestrado em C.I., pelo INSTITUTO
BRASILEIRO DE BIBLIOGRAFIA E DOCUMENTAÇÃO (IBBD), que a partir de
1976 passa a se denominar INSTITUTO BRASILEIRO DE INFORMAÇÃO EM
CIÊNCIA E TECNOLOGIA (Ibict), com vínculo ao CONSELHO NACIONAL DE
DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO (CNPq), órgão federal de
financiamento à pesquisa no Brasil. Outro fato relevante para a
área, no país, foi a publicação, a partir de 1972, da revista Ciência
da Informação, diretamente associada às atividades acadêmicas
do curso de mestrado.
A consolidação da C.I., no Brasil, se dá com a criação, em
1980, da ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA
DA INFORMAÇÃO & BIBLIOTECONOMIA (Ancib), que se constitui na prin-
cipal sociedade científica da área.

52 A Biblioteconomia e a Ciência da Informação: paradigmas e interdisciplinaridade


Inserida no esquema de classificação das áreas do conheci-
mento adotado pelo CNPq, a área de C.I.20 é uma das áreas incluí-
das na subdivisão Ciências Sociais Aplicadas, fazendo parte dessa
mesma divisão a Biblioteconomia,21 a Arquivologia,22 a Museolo-
gia23 e a Comunicação.24

A interdisciplinaridade da C.I.
Para Le Coadic (2004), “a interdisciplinaridade traduz-se por uma
colaboração entre diversas disciplinas, de modo que haja um enri-
quecimento mútuo”. Esse conceito é complementado por Targino
(2006, p. 97), quando afirma que:

a interdisciplinaridade é que fundamenta o avan-


ço das ciências, pois o conhecimento científico
subentende transformações, passagens de uma teo-
ria para outra, ressaltando o caráter evolutivo das
ciências e o seu estado de permanente ebulição.

Le Coadic considera a C.I. como uma das novas interdiscipli-


nas, com a qual colaboram entre si várias disciplinas como a Psi-
cologia, a Linguística, a Sociologia, a Informática, a Matemática,
a Lógica, a Estatística, a Economia, a Comunicação, o Direito, a
Política, as Telecomunicações e outras.
Faria (1981) nomeia as contribuições de algumas áreas à C.I.
como:
 Os princípios matemáticos têm possibilitado a formulação de
teorias dentro da C.I.;
 Os princípios da Lógica relacionam-se com os processos utili-
zados pela C.I. para investigação das propriedades e do com-
portamento da informação, seu fluxo e sua utilização;25

20. 6.07.00.00.9.
21. 6.07.02.00.1.
22. 6.07.03.00.8.
23. 6.08.00.00.3.
24. 6.09.00.00.8.
25. Por ex: Lógica de Boole, utilizada nos levantamentos bibliométricos.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 53


 A Linguística e suas propriedades estão muito relacionadas
com as pesquisas de terminologia e análise semântica, como
os estudos de vocabulário e indexação;
 Os princípios da Psicologia relacionam-se com as pesquisas
no campo dos estudos de comportamento dos usuários;
 As inovações tecnológicas no campo da computação têm tra-
zido inúmeras vantagens para a C.I., nas questões de armaze-
namento, disseminação e recuperação de informações;
 A Comunicação apresenta um vínculo com a C.I. no que diz
respeito aos padrões de comunicação e transmissão da infor-
mação;
 As técnicas e os métodos utilizados na Administração têm
servido de base para a organização e o gerenciamento dos
centros de informação.

Faria comenta ainda que, de um modo geral, a C.I. está re-


lacionada com todas as disciplinas. Porém, na visão de Sambaqui
(1978), ela se relaciona mais intimamente com a Bibliotecono-
mia; isso poderia ser explicado pelo fato de que as primeiras teo-
rias da C.I. têm como base as análises e leis bibliométricas.

Paradigmas da Ciência da Informação


Oliveira (2005) entende o paradigma da C.I. como um conjun-
to de ideias relativas ao processo que envolve o movimento da
informação em um sistema de comunicação humana. Comple-
mentando essa afirmação, Robredo (2003) apresenta um novo
modelo informacional, trazido à luz pela Documentação, que se
constitui em um paradigma que pode ser considerado como o
precursor para a área de C.I. Ele nasce da mudança de foco do
suporte dos documentos para a atenção dada aos seus conteúdos
e se transporta daí para a informação em si, desde a produção
do conhecimento científico até sua representação, organização e
distribuição pelos canais formais de comunicação científica.
Oliveira (2005) discute um outro paradigma para a área, que
surgiu no período de 1940 e 1950, com os estudos das proprie-
dades do sistema de transmissão de sinais em termos matemáti-

54 A Biblioteconomia e a Ciência da Informação: paradigmas e interdisciplinaridade


cos, inserido na teoria matemática da comunicação, de Shannon
e Weaver.
Como já visto, esta teoria consiste em um ponto de origem
(emissor), um canal – pelo qual passa a informação – e um ponto
de destino (receptor), com possibilidade de codificação e deco-
dificação para fins de retroalimentação. Esta estrutura teria sido
aplicada como modelo principalmente para estudar o fluxo da
informação e a recuperação de documentos.
No entanto, as críticas de sustentação desse paradigma para
a C.I., também, ressaltam suas fragilidades, desde que esse mode-
lo de comunicação, elaborado para comunicação entre máquinas,
não atendeu às demandas teóricas da C.I., uma vez que ao se tra-
tar de pessoas o receptor é submetido a um fluxo de mensagens
que chegam de todos os lados, sendo indispensável uma seleção
para verificar as que interessam particularmente a cada indiví-
duo. No entanto, o evento foi importante na medida em que fez
reforçar a ideia de que a informação flui dentro de um sistema e,
com isso, surgem os conceitos de ENTROPIA, INCERTEZA, REDUNDÂNCIA e
RETROALIMENTAÇÃO, considerados de grande relevância para o estu-
do do atendimento às necessidades dos usuários.
Outra contribuição do paradigma C.I., apontado por Oliveira
(2005) consistiu na percepção da necessidade de se definir clara-
mente o caráter da informação com que os profissionais da área
se preocupavam.
Como paradigma mais recente, pode-se considerar as refle-
xões de Saracevic (1996) em relação à área de C.I.: a questão da
interdisciplinaridade com várias disciplinas; a sua forte ligação
com a tecnologia da informação e a sua participação ativa na evo-
lução da sociedade da informação.
A interface com outras disciplinas – já comentada anterior-
mente – mostrando a relação mais estreita da área com uma ou
com outra disciplina, tem suscitado inúmeros estudos para ana-
lisar estes pontos de interseção e os benefícios que podem advir
dessas ligações.
A influência dos avanços tecnológicos na C.I. pode ser com-
provada na medida em que essas mudanças reorganizaram as
possibilidades de armazenamento, disseminação e, principal-
mente, de utilização de diferentes recursos para recuperação da

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 55


informação, fazendo com que uma das finalidades preconizadas
na conceituação preliminar da área – usabilidade e acessibilidade
ótimas – seja concretizada.
A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO – definida como a etapa do desen-
volvimento da sociedade que se caracteriza pela abundância da
informação organizada (OLIVEIRA, 2005) – encontra na C.I. a
oportunidade de prover a otimização do processamento e da
transmissão da informação, contribuindo para permitir o acesso
igualitário ao conhecimento para todos os homens.

Da Biblioteconomia à Ciência da Informação


Sambaqui (1978) apresentou uma reflexão muito pertinente so-
bre a interface entre as áreas dedicadas à informação, utilizando
para tal a genealogia bíblica, na qual a Biblioteconomia gerou a
Bibliografia, esta gerou a Documentação, que por sua vez gerou a
Ciência da Informação. Se a paráfrase retrata ou não a verdadeira
gênese das áreas nomeadas, o que se apreende é que a relevância
maior da interrelação dessas disciplinas repousa no fato de que
todas – cada uma com as suas especificidades – têm a finalidade
de facilitar o acesso ao volume cada vez mais crescente da pro-
dução de conhecimento no mundo. Os estudiosos dessas áreas
– bibliotecários, documentalistas, cientistas da informação, de-
vem desempenhar papéis cada vez mais próximos da informação
e mais distantes do suporte do livro ou do documento e, acima
de tudo, devem voltar seus esforços para que os conteúdos por
eles disseminados sejam utilizados cada vez mais a serviço da
sociedade.

Referências
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Brasil, 2003.
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Jan. 1968. 5 p.
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três tempos. Ciência da Informação, Brasília, DF, v.24, n.1, 1995.

56 A Biblioteconomia e a Ciência da Informação: paradigmas e interdisciplinaridade


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Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 57


História da Biblioteconomia
e da Ciência da Informação no Brasil

“Que se erija e acomode a minha Real Biblioteca e


instrumentos de física e matemática, fazendo-se à
custa da Real Fazenda toda a despesa conducente
ao arranjamento e manutenção do referido estabe-
lecimento” (Decreto de 29 de outubro de 1810 – D.
João VI).

As áreas da Biblioteconomia e da Ciência da Informação, na con-


cepção de alguns autores, apresentam interseções muito marcan-
tes. Cronologicamente, a Biblioteconomia é uma área que surge
antes da Ciência da Informação, e os marcos da história dessas
disciplinas no Brasil são bem distintos, sofrendo influências tam-
bém bastante diferenciadas.

A Biblioteconomia no Brasil26
A Biblioteconomia no Brasil começa a se fazer presente quando
são fundadas as primeiras bibliotecas no País, oriundas das or-
dens religiosas dos Beneditinos, Franciscanos e Jesuítas.
No entanto, o marco fundador deste campo do conhecimen-
to, no País, é atribuído à criação da Biblioteca Nacional. Esta bi-
blioteca tem sua origem na Biblioteca Real d’Ajuda, que foi trazi-
da pela Corte Real de Portugal, ao se refugiar na sua colônia mais
próspera, em 1808. Sua fundação, oficial, só ocorre em 1810;
no ano seguinte, é facultada a consulta aos estudiosos que obti-

26. Baseado em documento extraído do Portal do Conselho Federal de Biblioteco-


nomia (CFB) www.cfb.org.br e, ainda, na obra de Castro, C. A. História da Biblio-
teconomia brasileira: perspectiva histórica. Brasília, DF: Thesaurus, 2000.

58 História da Biblioteconomia e da Ciência da Informação no Brasil


nham consentimento régio e, em 1814, é aberta, totalmente, à
população. Sua administração fica a cargo de religiosos – como
na maioria das bibliotecas brasileiras do período colonial – e só
em 1846 é nomeado um Doutor em Medicina, o primeiro não
religioso para dirigi-la.
Na gestão de BENJAMIN FRANKLIN RAMIZ GALVÃO (1870-1882),
a Biblioteca Nacional passou por várias mudanças, das quais se
destacam a criação de um regulamento, em 1879 e, ainda, a re-
alização de concursos públicos para preenchimento de cargos,
principalmente de bibliotecários.27 CAPISTRANO DE ABREU28 considera
este concurso o marco inicial da formação profissional em Biblio-
teconomia no Brasil (FONSECA, 1957). Esses concursos foram
realizados, seguindo os modelos da École Nationale des Chartes,
de Paris, que, como já apresentado, foi a primeira escola criada no
mundo para a formação de pessoal para as bibliotecas.
Em São Paulo, até o Séc. XVIII, podiam ser consideradas
como bibliotecas apenas a do Convento das Carmelitas e a do
bispo D. Francisco Manoel da Ressurreição. Somente em 1825,
é criada a primeira Biblioteca Pública Oficial de São Paulo (CAS-
TRO, 2000).
No final do Séc. XIX, surgem outras bibliotecas: a do Colégio
Mackenzie, em 1886, e a da Escola Politécnica, em 1894.
Enquanto no Rio de Janeiro a constituição do campo da Bi-
blioteconomia esteve atrelada à trajetória da Biblioteca Nacional,
em São Paulo, ela sofre influência da biblioteca escolar do Colégio
Mackenzie. Tanto em um estado como no outro, a preocupação
existente à época era com a necessidade de resolver questões in-
ternas (pessoal não capacitado à frente dessas bibliotecas), muito
mais do que formar pessoal para atuar em qualquer tipo de bi-
blioteca (Id.).
O Conselho Federal de Biblioteconomia (CFB) considera que
a Biblioteconomia, como área do conhecimento, só passou a exis-
tir, no Brasil, a partir de 1911, quando MANUEL CÍCERO PEREGRINO DA
SILVA, diretor da Biblioteca Nacional, oficializou a criação do pri-
meiro Curso de Biblioteconomia do Brasil, primeiro também da

27. O termo bibliotecário já estava sendo usado, na Biblioteca Nacional, desde


1824.
28. João Capistrano Honório de Abreu obteve o 1° lugar neste concurso.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 59


América do Sul e 3º no mundo.29 Esse curso começou a funcionar
somente em 1915, na própria Biblioteca Nacional, onde conti-
nuou durante anos até se transformar, em 1979, no atual curso da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio).
Até o início da década de 1930, a Biblioteconomia brasileira
sofre a influência do modelo humanista da École Nationale des
Chartes, contando com profissionais escritores, historiadores, li-
teratos, pessoas cultas, em geral.
Fundamentado no Curso Elementar de Biblioteconomia, mi-
nistrado no Colégio Mackenzie, em 1936, é criada – por RUBENS
BORBA DE MORAES – a primeira escola de Biblioteconomia, que fun-
cionou inicialmente junto ao Departamento de Cultura de São
Paulo, sendo depois incorporada à Escola de Sociologia e Política
da mesma cidade, seguindo a orientação estritamente americana
– influenciada pelo 1º curso dos Estados Unidos – da Columbia
University – mais voltada para as técnicas biblioteconômicas.
O surgimento de novos cursos no País se dá a partir da or-
ganização, por Borba de Moraes, de um Curso de Atualização
Profissional, na Escola recém-criada, e os profissionais aí forma-
dos, ao retornarem aos seus Estados, começaram a criar novas
oportunidades de ensino de Biblioteconomia, especialmente nas
Universidades Federais.
A década de 1940 se constitui em um cenário de desenvolvi-
mento das modernas técnicas biblioteconômicas, no Brasil. Con-
tribuíram para esse fato: a) a atuação do Departamento Admi-
nistrativo do Serviço Público (Dasp), com a abertura de concur-
sos especializados, os quais criaram novos postos de trabalho na
área; b) a reforma da Biblioteca Nacional, que concorreu para a
elevação do nível de conhecimento dos futuros profissionais; c)
a oportunidade de aperfeiçoamento de técnicos brasileiros nas
universidades americanas e; d) a criação de um serviço nacional
de catalogação cooperativa: SERVIÇO DE INTERCÂMBIO DE CATALOGAÇÃO
(SIC), pelo Dasp, a exemplo do existente na Biblioteca do Con-
gresso Americano (PORTAL DO CONSELHO..., 2009).

29. O documento mencionado por Castro (2000), “Análises de los informes sobre
el estado actual de la profesión bibliotecária” aponta que o primeiro curso, na
América Latina, foi criado pelo Conselho de Mulheres da Argentina, em 1903, fato
não considerado pela maioria de autores da área.

60 História da Biblioteconomiae da Ciência da Informação no Brasil


É então implantado no Brasil, o conceito de “Bibliothecas
Modernas”, as quais podiam ser frequentadas livremente por
qualquer cidadão; apresentavam instalações amplas e confortá-
veis e com iluminação natural; suas estantes eram abertas para
consulta; disponibilizavam catálogos para apoiar as consultas
aos acervos e, principalmente, contavam com bibliotecários para
apoiar essas consultas (ARRUDA, 1928).
Outro órgão relevante, criado em 1937 – o INSTITUTO NACIONAL
DO LIVRO (INL) –, também contribuiu muito para a difusão das téc-
nicas biblioteconômicas, por meio da promoção de cursos regula-
res, alguns deles que se transformaram em cursos permanentes,
depois incorporados a universidades.
O surgimento das entidades de classe no País, nas décadas
de 1950 e 1960, foi marcante para a Biblioteconomia. Foram fun-
dadas, nesse período, instituições como a Federação Brasileira de
Associações de Bibliotecários (Febab), em 1959; a Associação dos
Bibliotecários do Distrito Federal (ABDF), em 1962; e a ASSOCIAÇÃO
BRASILEIRA DE ESCOLAS DE BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAÇÃO (ABEBD),
em 1965.
A criação do Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documen-
tação (IBBD), em 1954, se apresentou como um outro aconteci-
mento relevante para a área de Biblioteconomia.
Ainda sob forte influência americana, os primeiros eventos
da área começaram a ocorrer na década de 1950, com a “Confe-
rência sobre o Desenvolvimento dos Serviços de Bibliotecas Pú-
blicas na América Latina”, promovida pela Unesco, em São Paulo,
em 1951; o “Primeiro Congresso de Bibliotecas do Distrito Fede-
ral”, promovido pela Biblioteca Municipal do Rio de Janeiro, em
1953; e o “Primeiro Congresso Brasileiro de Biblioteconomia”,30
realizado em Recife, em 1954.
Esses eventos foram realizados com o objetivo de reunir pro-
fissionais bibliotecários de todo o Brasil para trocar experiências
e deram ensejo à criação de inúmeras bibliotecas nos órgãos pú-

30. Desde então, este Congresso tem se realizado, regularmente, sob a denomi-
nação atual de Congresso Brasileiro de Biblioteconomia, Documentação e Ciência
da Informação (CBBD), quase sempre de dois em dois anos, em cidades diferentes
do país, por meio da promoção da Febab e de outras instituições parceiras, a cada
edição. O XXIII CBBD ocorreu em Bonito (MS), em julho de 2009.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 61


blicos, especialmente federais, incentivando o aumento de candi-
datos aos Cursos de Biblioteconomia.
Os diferentes cursos de Biblioteconomia no país começam
a surgir a partir de 1942, com o da Escola de Biblioteconomia
e Documentação da Universidade Federal da Bahia (UFBA); de-
pois, em 1945, o da Faculdade de Biblioteconomia da Pontifícia
Universidade Católica de Campinas (PUCCamp); em 1947, surge
o da Escola de Biblioteconomia e Documentação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e em 1950, surge o Curso
de Biblioteconomia e Documentação da Universidade Federal do
Paraná (UFPR) e o da Escola de Biblioteconomia da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG).31 Em 1965, já existiam no Brasil
14 cursos na área.
A década de 1960 é relevante, também, pela instituição do
Primeiro Currículo Mínimo para os cursos de Biblioteconomia,
em 16 de novembro de 1962,32 o que desencadeou o processo de
regulamentação da profissão. Foi promulgada a Lei n° 4.084/62,
de 30/06/1962 e, depois, o Decreto n° 56.725, de 18/08/1965,
fato que ocorreu em virtude de esforços de bibliotecárias, como
LAURA GARCIA MORENO RUSSO, que, com persistência e coragem, vi-
nham trabalhando em prol da regulamentação da profissão, há
vários anos.
Também em 1962 foi criado o Conselho Federal de Bibliote-
conomia (CFB), órgão responsável pela fiscalização do exercício
profissional, resguardando-o para os bibliotecários de formação;
sua oficialização só ocorreu em 1966.
Dados de 2009 apontam que a classe bibliotecária já se en-
contra consolidada em todo o país, sendo representada por cerca
de 30.000 bibliotecários, inscritos nos 15 Conselhos Regionais de
Biblioteconomia, distribuídos por todo o País. No entanto, mes-
mo com esse número significativo de profissionais, ainda existem
postos de trabalho que não são ocupados por bibliotecários, como
é o caso das bibliotecas escolares e o das bibliotecas públicas, nos
quais se reconhece a atuação de leigos.

31. O primeiro curso de Biblioteconomia do Nordeste foi fundado pelo bibliotecá-


rio EDSON NERY DA FONSECA, quando este retornou a Pernambuco, depois de terminar
sua formação, no curso da Biblioteca Nacional.
32. Parecer n° 326/62, de autoria do conselheiro Josué Montello.

62 História da Biblioteconomiae da Ciência da Informação no Brasil


Visando modificar esse cenário, a Coordenação de Aperfeiço-
amento de Pessoal de Nível Superior (Capes), por meio da Uni-
versidade Aberta do Brasil (UAB) e com a parceria do CFB, está
desenhando a proposta pedagógica de um curso de graduação em
Biblioteconomia, para ser oferecido na modalidade à distância,
cujo início está previsto ainda em 2010.

Marcos da Biblioteconomia
Fatos marcantes da área de Biblioteconomia foram levantados por
vários autores. O Quadro 3, a seguir, apresenta uma síntese des-
ses acontecimentos.

Quadro 3 – Principais Fatos da Área de Biblioteconomia


Cronologia Principais Fatos
1911 Manuel Cícero Peregrino da Silva, então, diretor da Biblioteca Na-
cional (BN), cria o primeiro Curso de Biblioteconomia do Brasil.
1915 Início do funcionamento do curso, na BN, formando bibliotecá-
rios para o Serviço Público Federal.
Até o início Fase humanista calcada no modelo da École Nationale des Char-
da década de tes (França). Profissionais eram ilustres personalidades: escrito-
1930 res, historiadores, literatos, pessoas cultas em geral.
A partir da Criação da primeira Escola de Biblioteconomia, inicialmente no
década de Departamento de Cultura de São Paulo, e depois na Escola Livre
1930 de Sociologia e Política da mesma cidade, dirigida por Rubens
Borba de Moraes (orientação estritamente americana).
1940-1950 Criação da Escola de Biblioteconomia e Documentação/UFBA, da
Faculdade de Biblioteconomia/PUCCamp, da Escola de Bibliote-
conomia e Documentação/UFRGS, do Curso de Biblioteconomia
e Documentação/UFPR e da Escola de Biblioteconomia da UFMG.
1954 Realização do 1º Congresso Brasileiro de Biblioteconomia (Reci-
fe/PE).
1962 Regulamentação da profissão (Lei nº 4.084/62).
Criação do Conselho Federal de Biblioteconomia e do 1º. Currí-
culo Mínimo do Curso de Biblioteconomia.
1965 Criação da Associação Brasileira de Escolas de Biblioteconomia e
Documentação (ABEBD).
1982 Estabelecimento do 2º. Currículo Mínimo.
2002 Estabelecimento das Diretrizes Curriculares do Curso de Biblio-
teconomia.
2005 Aprovação do Curso de Biblioteconomia e Gestão de Unidades
de Informação, da UFRJ.
2009 Oferta de 39 cursos de Biblioteconomia no país.
2010 Previsão de oferta do 1º. Curso de Graduação em EaD, no Brasil.
FONTE: Adaptado de SÁ; FONSECA; SARDENBERG (2005).

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 63


A Ciência da Informação no Brasil
A história da Ciência da Informação (C.I.), no Brasil, tem como
um dos pilares a criação do IBBD, fundado em 1954, com vínculo
ao CNPq. Estes órgãos sofreram forte influência da Unesco, que
neste período incentivava o crescimento científico nos países em
desenvolvimento (ANDRADE; OLIVEIRA, 2005).
Com essa orientação, o IBBD empreendeu várias iniciati-
vas, dentre elas a realização de pesquisas bibliográficas, que
serviram de base para a compilação das bibliografias nacionais
especializadas,33 e a disponibilização do “Catálogo Coletivo Na-
cional (CCN)”, em 1954, que desde então se configura em um
instrumento relevante de apoio à recuperação de informações,
para o desenvolvimento de pesquisas acadêmicas no País (Id.).
Em se tratando do ensino na área de Biblioteconomia, o IBBD
teve também um papel relevante, por ter sido responsável pelos
primeiros cursos de pós-graduação lato sensu (1955) e stricto sen-
su (1970). Desde então, esses cursos vêm formando mestres e
doutores, fortalecendo cada vez mais a área no Brasil.

A sociedade científica e a C.I.


A consolidação de um campo do conhecimento pode ser avaliada
pela análise das suas sociedades científicas,34 de seus canais de
comunicação, de suas instituições de ensino e pesquisa e, ain-
da, por possuir pessoal qualificado para conduzir suas atividades
(ANDRADE; OLIVEIRA, 2005).
O campo da C.I. possui em sua organização sociedades cien-
tíficas35 renomadas, como a American Society for Information
Science and Technology (Asist).

33. Exemplos dessas bibliografias são as de: Física, Química, Botânica, Matemá-
tica e Documentação.
34. As primeiras sociedades científicas surgiram na Itália, como a Academia dei
Lincei, em 1603. Porém, a sociedade acadêmica mais conhecida é a Royal Society,
criada em Londres, em 1660.
35. Entidades detentoras do papel de incentivar a pesquisa científica e de facilitar
a comunicação e a discussão de resultados de pesquisas (ANDRADE; OLIVEIRA,
2005).

64 História da Biblioteconomiae da Ciência da Informação no Brasil


No Brasil, a sociedade científica que congrega os pesquisa-
dores da área de C.I. é a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-
graduação em Ciência da Informação e Biblioteconomia (Ancib).
Criada, em junho de 1989, tem como um de seus objetivos a
promoção do desenvolvimento da pesquisa, do intercâmbio e da
cooperação entre seus associados.
A Ancib realiza, periodicamente, o Encontro Nacional de Pes-
quisa em Ciência da Informação (Enancib), que se constitui em
um evento no qual os pesquisadores apresentam e discutem seus
trabalhos de pesquisas concluídas ou em andamento.36
Em nível de graduação, a área conta com outra entidade cien-
tífica – a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENSINO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
(Abecin), que surge, em 2001, quando sai de cenário a ABEBD.
Essa Associação congrega os cursos de Biblioteconomia, Arquivo-
logia e Ciência da Informação, ministrados no país.

O periódico científico e a C.I.


A publicação regular de periódicos científicos é outra característi-
ca de consolidação de uma área acadêmica (ANDRADE; OLIVEI-
RA, 2005). Este veículo se constitui no meio formal mais eficaz
utilizado para a comunicação dos resultados das pesquisas cien-
tíficas.
Os primeiros periódicos científicos surgiram, em 1665, na
França – o Journal de Savants – e na Inglaterra – o Philosophical
Transactions of The Royal Society, porém, com objetivos diferen-
tes. O primeiro se voltava para o registro de informações sobre os
livros publicados na Europa, a descrição de invenções, o registro
dos dados meteorológicos e a citação das primeiras decisões das
cortes civil e religiosa. O segundo se dedicava somente ao registro
de experimentos científicos em todas as áreas, relatados em car-
tas à sociedade por cientistas europeus.
No final desse século, a comunicação entre os cientistas já se
tornava mais fácil, pois já existiam, aproximadamente, 30 títulos
de periódicos médicos e científicos. Em 1800, ocorre um salto

36. Em 2009, ano em que foi comemorado o aniversário de 10 anos de sua cria-
ção, a Ancib organizou o X Enancib, na cidade de João Pessoa, na Paraíba.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 65


para 700 títulos; porém, atingiu-se o boom somente em meados
do Séc. XIX e início do Séc. XX. Nesse período ficou evidenciada
a proliferação de sociedades fundadas na Inglaterra, em decor-
rência da especialização da Ciência, com mais de 1.000 perió-
dicos sendo publicados. Cada uma dessas sociedades passou a
publicar seus próprios periódicos, que contribuíram para acelerar
a divulgação dos resultados das pesquisas, entre os pares, e para
disseminá-las para um público mais amplo, fazendo com que as
áreas científicas se consolidassem como campos de estudo.
A edição de revistas técnicas, na área de C.I., no Brasil, só
começou na década de 1970, com a revista Ciência da Informa-
ção, a partir de 1972. Essa revista foi criada pelo IBBD, com a
finalidade de se constituir em um veículo de divulgação e desen-
volvimento da informação no Brasil. A partir daí, várias outras
começaram a ser publicadas, muitas delas vinculadas aos cursos
de pós-graduação.
Na segunda metade da década de 1990, ocorre uma revolu-
ção nos veículos de comunicação com o uso de uma tecnologia
emergente, e o periódico científico desponta com um novo supor-
te – o eletrônico – vindo atender a uma demanda cada vez mais
exigente dos usuários, qual seja a de poder ser consultado antes
mesmo de sua edição impressa.
Posteriormente, começam a surgir os periódicos editados, ex-
clusivamente, em meio eletrônico, prática que está se difundindo
em todas as áreas do conhecimento. As vantagens desse tipo de
publicação são inúmeras, destacando-se: a) maior facilidade no
gerenciamento da edição; b) agilidade no acesso à informação,
possibilitando buscas simples e complexas no conteúdo das revis-
tas; c) barateamento dos custos da edição.
O Quadro 4, a seguir, relaciona periódicos eletrônicos das
áreas de Biblioteconomia e C.I.

Quadro 4 – Acesso Eletrônico aos Periódicos nas Áreas de


Biblioteconomia e Ciência da Informação
Título Ano Editor
Ciência da InformaçãoA 1972 Ibict
Perspectivas em Ciência da InformaçãoB 1972 UFMG
Revista de Biblioteconomia de BrasíliaC 1973 ABDF/UnB

66 História da Biblioteconomiae da Ciência da Informação no Brasil


Título Ano Editor
Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documenta- 1973 Febab
ção: Nova SérieD
Revista BiblosE 1985 FURG
TransinformaçãoF 1989 PUCCamp
Em Questão: Revista da Faculdade de Bibliotecono- 1989 UFRGS/Fabico
mia e Comunicação G
Informação e Sociedade: EstudosH 1991 UFPB
Informação & InformaçãoI 1996 UEL
Encontros Bibli: Revista Eletrônica de Bibliotecono- 1996 UFSC
mia e Ciência da InformaçãoJ
Revista ACB: Biblioteconomia em Santa CatarinaK 1996 ACBL
M
DataGramaZero 1999 IAISIN
Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da In- 2003 Sist. de Bibl. da
formaçãoO Unicamp
BJIS – Brazilian Journal of Information ScienceP 2006 Unesp
Pesquisa Brasileira em Ciência da Informação e Bi- 2006 Ibict
blioteconomia – PBCIBQ
Tendências da Pesquisa Brasileira em Ciência da 2008 Ancib
InformaçãoR
RevIU – Revista Informação e UniversidadeS 2009 CBBUT
FONTE: Autoria própria
Notas:
A. Disponibiliza texto integral em: http://revista.ibict.br/index.php/ciinf
B. Título anterior: Revista da Escola de Biblioteconomia da UFMG; disponibiliza texto integral em:
http://www.eci.ufmg.br/pcionline/index.php/pci/index
C. Interrompida em 2001. Disponibiliza texto integral de 1973 a 2001 em:
http://164.41.122.25/portalnesp/ojs-2.1.1/index.php/RBB
D. Título anterior: Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documentação. Interrompida de 1993-
1998, a partir de 2006 apresenta versão eletrônica http://www.febab.org.br/rbbd/ojs-2.1.1/
index.php/rbbd
E. Disponibiliza resumo e palavras-chave até 2003 e, a partir de 2004, texto integral em: http://
www.seer.furg.br/ojs/index.php/biblos
F. Disponibiliza texto integral em:http://revistas.puc-campinas.edu.br/transinfo/index.
php(desde 2002).
G. Título anterior: Revista de Biblioteconomia & Comunicação. Disponibiliza texto integral em:
http://www.seer.ufrgs.br/index.php/EmQuestao (desde 2003).
H. Disponibiliza texto integral em: http://www.ies.ufpb.br/ojs2/index.php/ies
I. Disponibiliza texto integral em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/informacao/index
J. Disponibiliza texto integral em: http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/eb
K. Disponibiliza texto integral em: http://revista.acbsc.org.br/index.php/racb
L. Associação Catarinense de Bibliotecários.
M. Disponibilizada em: http://dgz.org.br/
N. Instituto de Adaptação e Inserção na Sociedade da Informação.
O. Disponibilizada em: http://polaris.bc.unicamp.br/seer/ojs/index.php
P. Disponibilizada em: http://www.bjis.unesp.br/pt/index.php (interrompida em 2007).
Q. Disponibilizada em: http://revista.ibict.br/pbcib/index.php/pbcib
R. Disponibilizada em: http://inseer.ibict.br/ancib/index.php/tpbci
S. Número zero disponibilizado em:http://www.siglinux.nce.ufrj.br/~gtbib/site/
T. Comissão Brasileira de Bibliotecas Universitárias.

Conclui-se, ainda, que o fato desses periódicos estarem dis-


ponibilizados eletronicamente contribui para acelerar o acesso
às informações neles veiculadas e, consequentemente, também

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 67


promove o desenvolvimento do conhecimento nas áreas de Bi-
blioteconomia e C.I.
Outro dado importante é o reconhecimento da relevância
científica dos mesmos, visto que 12 desses 16 periódicos (mais de
70%) estão classificados na Base Qualis, da Capes, inseridos nos
extratos B1 (2 periódicos); B2 (2 periódicos); B3 (4 periódicos);
B4 (3 periódicos) e B5 (1 periódico).37

O futuro da Biblioteconomia e da C.I.


Para Mueller (1985), a área da Biblioteconomia, no Brasil, apre-
sentou grandes e rápidos progressos resultantes de influências de
fatores internos e externos à biblioteca.
Um destes fatores – o tecnológico – que proporcionou opor-
tunidades de acesso, controle e recuperação de informação fora
dos muros das bibliotecas, caracterizou o fenômeno conhecido
como a “biblioteca sem paredes, sem estoques de informação em
suporte físico, chamada de BIBLIOTECA VIRTUAL” (MARTINS, 2002).
Como se pode constatar pelas informações contidas no Quadro
4, as ferramentas tecnológicas proporcionaram um grande impulso
à área, modificando até a necessidade de se frequentar fisicamente
as bibliotecas. Segundo Barreto (1999), o usuário passa a ser ele
mesmo o mediador na escolha de documentos, transformando-se
no gerente de suas necessidades de informação.
No entanto, a capacidade de o bibliotecário atuar como me-
diador entre o usuário e as suas necessidades de informação não
pode ser relegada ao segundo plano, em virtude principalmente
da questão do tempo despendido no acesso às informações rele-
vantes ou pertinentes aos interesses desses usuários.
Outro fator que Mueller ressalta (1985) é o que diz respeito
ao entendimento da profissão e à formação do profissional. Para a
autora uma questão fundamental se apresenta: “Qual a definição
do profissional bibliotecário que se quer formar para o Brasil de
hoje e do futuro?”

37. Os periódicos científicos são classificados na Base Qualis em: A1, A2, B1, B2,
B3, B4, B5 e C, de acordo com os critérios de avaliação determinados pela Capes.

68 História da Biblioteconomiae da Ciência da Informação no Brasil


Quando da preparação da proposta pedagógica do Curso de
Biblioteconomia e Gestão de Unidades de Informação (CBG), da
UFRJ, ao se analisar os currículos dos 38 cursos existentes no
Brasil, constatou-se que na maioria deles prevalece a oferta de
disciplinas que focalizam as técnicas biblioteconômicas, em detri-
mento de uma formação que contemple também as técnicas ge-
renciais, o que deixa de preparar os futuros profissionais para as
atividades de gestão de todos os recursos existentes nas unidades
de informação – não só os informacionais – tarefa que cada vez
mais vem sendo demandada em sua atuação.
Por outro lado, os órgãos de classe vêm conclamando um
reconhecimento do bibliotecário como agente social, interessado
no acesso à informação, à educação e à cultura. Para isso, faz-se
também necessária a ênfase na formação desses profissionais no
campo humanístico, inserindo disciplinas voltadas para o fomen-
to à leitura e para a promoção cultural na grade curricular obri-
gatória dos cursos; com isso, a sociedade poderá reconhecê-los
como agentes sociais e culturais.
Diante desse contexto, cabe mencionar a reflexão de Mueller
(1985) de que a responsabilidade da formação do profissional
não pode estar atrelada somente à graduação. Deve-se buscar a
sensibilização das Universidades, na oferta de cursos de especiali-
zação a fim de complementar a formação dos profissionais.
Também os cursos de pós-graduação precisam intensificar
parcerias, para suprir as demandas de treinamentos oriundas de
profissionais já graduados.
O enlace das duas áreas – Biblioteconomia e Ciência da In-
formação – será muito benéfico, tanto na formação de mestres e
doutores para assumir postos nos cursos de graduação, como na
preparação de pesquisadores, que irão fortalecer a consolidação
das duas áreas no cenário informacional brasileiro.
Conclui-se, então, que as duas áreas, apesar de todos os pon-
tos favoráveis que foram descritos, encontram ainda muitos de-
safios pela frente, principalmente, no que diz respeito à questão
da sensibilização das instituições que trabalham com informação
a respeito das habilidades do seu corpo de profissionais no geren-
ciamento das unidades de informação.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 69


Referências
ANDRADE, M. E. A.; OLIVEIRA, M. de. A Ciência da Informação no Bra-
sil. In: OLIVEIRA, Marlene de (Coord.). Ciência da Informação e Bibliote-
conomia: novos conteúdos e espaços de atuação. Belo Horizonte: Ed. da
UFMG, 2005. p. 45-60.
ARRUDA, B. de S. Bibliotecas: os enormes resultados obtidos na América
do Norte. Correio Paulistano, São Paulo, 20 maio, 1928.
BARRETO, A. Os destinos da Ciência da Informação: entre o cristal e
a chama. DataGramaZero – Revista de Ciência da Informação, número
zero, dez. 1999.
CASTRO, C. A. de. História da Biblioteconomia brasileira: perspectiva his-
tórica. Brasília, DF: Thesaurus, 2000.
FONSECA, E. N. da. Desenvolvimento da Biblioteconomia e da Bibliogra-
fia do Brasil. Revista do Livro, v. 2, n.5, p. 95-124, mar. 1957.
MARTINS, L. M. B. O profissional da informação e o processo de me-
diação de leitura. In: CASTRO, C. A. de (Org.) Ciência da Informação e
Biblioteconomia: múltiplos discursos. São Luís: EDUFMA, 2002.
MUELLER, S. P. M.. O Ensino de Biblioteconomia no Brasil. Ciência da
Informação, Brasília, DF, v.14, n.1, p. 3-15, jan./jun.1985.
PORTAL DO CONSELHO FEDERAL DE BIBLIOTECONOMIA. Disponível
em: http://www.cfb.br. Acesso em: 2 out. 2009.
SÁ, N. O. de; FONSECA, N. L. da; SARDENBERG, R. R. C. Sobre o perfil
dos bibliotecários do Estado do Rio de Janeiro e sua inserção no merca-
do de trabalho. Rio de Janeiro: Conselho Regional de Biblioteconomia
(CRB-7), 2005. (Coleção CRB-7, v.1)

70 História da Biblioteconomiae da Ciência da Informação no Brasil


Influências do uso da Informática e sua
aplicabilidade na Biblioteconomia e na
Ciência da Informação38

“Desde a década de 1960 o desenvolvimen-


to tecnológico vem em ritmo crescente mol-
dando as bibliotecas e os serviços de informa-
ção. É a tecnologia disponível que determina
como os serviços de biblioteca serão no futuro”
(Luiz Fernando Sayão – CIN/CNEN).

As bibliotecas – ou outras unidades de informação – têm, basi-


camente, duas finalidades principais: a) atender às necessidades
dos seus usuários e b) procurar facilitar o acesso, de forma rá-
pida e ótima, à informação por eles solicitada. A multiplicidade
e a grande quantidade de informações geradas no mundo atual
requerem dessas instituições a adoção de novas técnicas para se
atingir os objetivos apontados acima. A INFORMÁTICA tem sido uma
disciplina fundamental na evolução das áreas de Biblioteconomia
e Ciência da Informação, principalmente pelo emprego das cha-
madas TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO (TICs).

Antecedentes
Os primeiros computadores surgiram entre 1940 e 1950, do pro-
gesso natural dos tempos, para que o homem pudesse efetuar os

38. Baseado em: BARSOTTI, R. A Informática na Biblioteconomia e na Documen-


tação. São Paulo: Polis, 1990 e em OLIVEIRA, M. (Coord.). Ciência da Informação
e Biblioteconomia: novos conteúdos e espaços de atuação. Belo Horizonte: Ed. da
UFMG, 2005.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 71


cálculos de seu interesse. Os cálculos mais elementares, que o
homem fazia com os próprios dedos, evoluíram para a criação de
auxiliares mecânicos para apoiá-los na solução das necessidades
que surgiam.
Desses auxiliares, pode-se destacar o ábaco – que alguns au-
tores datam da Séc. III a.C. – atribuindo sua invenção ora aos
chineses ora aos babilônios. Vários outros auxiliares foram sendo
inventados, até que por volta de 1833, o matemático inglês Char-
les Babbage projeta a primeira calculadora automática, contro-
lada por programas – a Máquina Analítica. Essa máquina estava
projetada para conter elementos como: Entrada, Memória, Pro-
cessamento e Saída. Sua operação seria governada por cartões
perfurados. Devido a limitações tecnológicas e à morte de Babba-
ge, o projeto não foi concretizado (BARSOTI, 1990).
A partir desses estudos, outros inventos foram realizados
como o de Herman Hollerith, interessado em agilizar o resultado
do censo norte-americano de 1880, que levou sete anos para ser
finalizado. Hollerith criou um cartão perfurado para ler os dados
dos questionários respondidos por cada pessoa, onde o furo no
cartão significava SIM e a ausência de perfuração queria dizer
NÃO. Esses cartões, por sua vez, seriam lidos por uma máquina
também inventada por Hollerith. Com esta invenção, o tempo do
resultado do censo de 1890 foi reduzido para um terço do gasto
no censo anterior, apesar de a população ter aumentado em mais
de 10 milhões de pessoas. Hollerith funda, então, uma empresa
para distribuir essa máquina, que dá origem à criação, em 1924,
da empresa que viria a tornar-se a International Business Machine
(IBM).
O primeiro computador eletrônico foi criado em 1946, ten-
do sido chamado de Electronic Numerical Integrator Analyzer and
Computer (Eniac).39 Foi construído com o objetivo de acelerar
cálculos de artilharia; pesava 30 toneladas, ocupava 1.400 m2 de
superfície, utilizava milhares de quilômetros de fios e 18.000 vál-
vulas eletrônicas. Além do peso, do espaço e dos componentes em
número excessivo, a manutenção do Eniac era muito dispendiosa
e sua programação era pouco flexível.

39. O Eniac foi construído pelos professores John Eckert e John Mauchly, da More
School of Electrical Engineering, da University of Pennsylvania.

72 Influências do uso da Informática na Biblioteconomia e na Ciência da Informação


Depois do Eniac, os computadores foram passando por gran-
des evoluções – denominadas gerações – até os dias de hoje,
quando as máquinas utilizadas para processamento de dados são
cada vez menores, mais leves e algumas já não necessitam de fios
para processar seus programas (wireless network connection).

Aplicações da Informática
Na sociedade informatizada presente no Séc. XXI, a maioria das
tarefas desenvolvidas – em quase todas as profissões – recebe in-
fluência da Informática. No caso específico da Biblioteconomia e
da Ciência da Informação, a Informática assume o papel de uma
ferramenta importante para agilizar a aquisição, o processamen-
to, a divulgação e a recuperação da informação. Com o passar dos
anos, essa influência tornou-se cada vez mais marcante, não de-
vendo ser considerada como uma ameaça e sim como uma nova
oportunidade para promoção do melhor atendimento às necessi-
dades dos usuários.
Todo o ciclo da informação – geração, difusão e uso – foi
influenciado pelas iniciativas da Informática. As atividades de ca-
talogação, classificação, indexação, assim como os processos de
armazenamento e recuperação da informação contida nos dife-
rentes suportes informacionais, dispensam hoje uma série de eta-
pas desenvolvidas antes da utilização dos computadores.
Na questão do armazenamento, Robredo (1989) apresentou
previsão de grande mudança nas instalações físicas das biblio-
tecas, as quais deveriam apresentar diferenças substanciais, na
medida em que inúmeros itens – antes arquivados no formato
impresso – teriam seu acesso facilitado por meio eletrônico, o que
diminuiria a necessidade de ampliação constante de espaço nes-
sas unidades.
A aplicação da Informática na Biblioteconomia é mais mar-
cante a partir do fenômeno da Explosão da Informação, quando
inúmeros cientistas se dedicaram a estudar meios de solucionar o
problema do acesso ao conhecimento. O emprego do computador
– máquina recém-criada à época – foi utilizado para tratar e re-
cuperar os dados de maneira sistemática, visto que esta máquina
permitia a manipulação de grande massa de dados.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 73


Surge, daí, a preocupação com um outro fenômeno, denomi-
nado por Mooers, em 1951, como “recuperação da informação”.
Para ele, essa atividade consistia em reunir os aspectos intelec-
tuais da descrição da informação e suas especificidades para a
busca, como também os sistemas, técnicas ou equipamentos em-
pregados para o desempenho da operação (SARACEVIC, 1995).
Meadows, citado por Oliveira (2005), conceituou a recupe-
ração da informação como uma ação que consiste em encontrar
a informação desejada em um armazém de informações ou base
de dados.
Outra abordagem para o termo é dada por Lancaster e War-
ner, citados por Oliveira (Id.), entendendo a recuperação da in-
formação como a busca, em uma coleção de documentos, para
identificar aqueles que satisfazem uma determinada necessidade
de informação e os sistemas de recuperação da informação são os
sistemas criados para facilitar essa busca.
Nesta mesma década, começaram a surgir iniciativas de pro-
jetos cooperativos entre bibliotecas para acesso a documentos,
compartilhamento de dados, desenvolvimento de padrões co-
muns em atividades biblioteconômicas, catalogação cooperativa,
comutação bibliográfica etc. Com a aplicação dos sistemas com-
putadorizados a esses projetos, nas décadas de 1970 e 1980, são
criadas as redes de informação, como a Online Computer Library
Center (OCLC), em 1967, a primeira dessas redes de catalogação
cooperativa (OLIVEIRA, Id.).

Sistemas de recuperação de informação


Com a evolução da Informática, as atividades desenvolvidas no
âmbito da recuperação da informação fizeram surgir os sistemas
automatizados de recuperação da informação.
Um dos primeiros sistemas automatizados de recuperação
da informação – o UNITERM – foi criado por Mortimer Taube, em
1953, consistindo na indexação de documentos de uma coleção,
por termos únicos, retirados do título ou do resumo desses docu-
mentos.

74 Influências do uso da Informática na Biblioteconomia e na Ciência da Informação


Dentre outros sistemas automatizados utilizados para recu-
peração de informações destacam-se, nos Estados Unidos, o On-
line Retrieval of Bibliographic Information Time Shared (Orbit) e o
Dialog, que na década de 1960 contribuíram para facilitar as pes-
quisas de documentos, recuperando o texto integral dos trabalhos
de interesse dos usuários.
No Brasil, os sistemas de recuperação da informação come-
çam a ser utilizados na década de 1970, com o Ibict promovendo
o acesso às bases de dados americanas Orbit e Dialog e à base de
dados francesa Questel, com o fim de apoiar os pesquisadores no
desenvolvimento de seus trabalhos científicos.
Além do surgimento dos microcomputadores, as décadas de
1980 e 1990 trazem novidades, também, nos suportes de infor-
mação com a introdução dos CD-ROMs como forma de armaze-
nar dados e promover a recuperação dos mesmos e, mais ainda,
com a utilização crescente da INTERNET40 pelas Universidades, na
condução de suas pesquisas.
Na década de 1990, a Internet é utilizada para promover o
acesso a informações contidas em bases de dados. Como exem-
plos, são encontradas as bases de dados da SilverPlatter, da H.W.
Wilson Company, da Ovid Technologies Inc., surgindo depois as
bases de dados disponibilizadas na Web,41 como as do Institute for
Scientific Information (ISI), nos Estados Unidos. Essas iniciativas
impulsionam a criação de mecanismos de busca, com alta tecno-
logia, para garantia de recuperação de informações relevantes.

As REDES DE INFORMAÇÃO
Nas áreas de Biblioteconomia e Ciência da Informação, a distin-
ção entre sistemas e redes de informação muitas vezes não é mui-
to clara, mas um ponto que não deixa dúvidas é que as redes reú-
nem pessoas e organizações para o intercâmbio de informações,

40. Em 1973, Vint Cerf – considerado “o pai da Internet” – apresenta em um


congresso a ideia básica da Internet, a qual é conhecida como “a tecnologia das
tecnologias da informação”.
41. Em 1991, Tim Berners-Lee cria a World Wide Web – www – como a plataforma
gráfica e interativa, que popularizou a Internet fora dos meios acadêmicos e de
pesquisa.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 75


ao mesmo tempo em que contribuem para a organização de pro-
dutos e a operacionalização de serviços que sem a participação
mútua não seriam possíveis (TOMAÉL, 2005).
Os tipos mais comuns de redes de informação são aqueles
que visam o compartilhamento de dados, o desenvolvimento de
padrões comuns e a comutação bibliográfica entre bibliotecas e
centros de informação. É importante observar que a configura-
ção dessas redes deve ser formalizada por meio de acordos de
cooperação, para que os objetivos pretendidos sejam mais bem
alcançados. As primeiras redes de informação, no Brasil, são apre-
sentadas no Quadro 5.

Quadro 5 – Primeiras Redes de Informação no Brasil


Redes Órgão Data de Função Obs.
Responsável Criação
SIC – Serviço de Dasp 1942 Catalogação Desativada em 1973.
Intercâmbio de cooperativa
Catalogação
CCN – Catálogo IBBD 1954 Formação de Absorvida pelo Ibict,
Coletivo Nacio- um catálogo na década de 1970;
nal de Publica- coletivo em uso até os dias de
ções Seriadas hoje.
Projeto Calco FGV 1973 Projeto para Em 1982, transforma-
implantação se na Rede Bibliodata
da catalogação e, a partir de 2005,
cooperativa no está sob a responsabi-
Brasil lidade do Ibict.
Bireme – Rede Opas 1973 Serviço de Contribui para o
Brasileira de Indexação e desenvolvimento da
Informações Resumos saúde, fortalecendo e
em Ciências da ampliando o fluxo de
Saúde informação na área.
Comut – Pro- Ibict 1980 Fornecimento A partir de 1997,
grama de de cópias de transforma-se no Co-
Comutação documentos mut Online
Bibliográfica
FONTE: Adaptado de TOMÁEL (2009)

Como pode ser visto, na análise do Quadro 5, só uma dessas


redes encontra-se desativada. A seguir, são apresentadas infor-
mações relevantes sobre as que ainda estão ativas e sobre outras
recém-criadas para apoiar a pesquisa no Brasil:42

42. Dados obtidos de outubro a dezembro de 2009 nos sites das redes.

76 Influências do uso da Informática na Biblioteconomia e na Ciência da Informação


1. Catálogo Coletivo Nacional (CCN)
(http://www.ibict.br/secao.php?cat=CCN)

Criado, em 1954, pelo então IBBD, constituiu-se, até sua automa-


ção em 1968, em um catálogo convencional em fichas, prestando
informações sobre os acervos das bibliotecas do País in loco, por
telefone ou correspondência.
De 1970 a 1978, o sistema automatizado possibilitou a di-
vulgação impressa do CCN por grandes áreas do conhecimento:
Ciências Exatas e Tecnologia, Ciências Agrícolas e Veterinárias,
Ciências da Saúde e Ciências Sociais e Humanas. Em 1978, de-
vido ao crescimento constante de novos títulos e acrescido do
inter-relacionamento entre as áreas do conhecimento, optou-
se pela divulgação do CCN em microfichas reunindo todas as
áreas.
Em 1986, foi implementado o acesso ao Sistema via Rede
Nacional de Pacotes (Renpac) e, em 1993, é criado o Catálogo
em CD-ROM.
Em 1994, foi promovido o acesso em linha ao CCN, por meio
da Internet, utilizando-se o aplicativo Telnet. Em 1997, foi de-
senvolvido o novo sistema em Oracle. A partir de 1998, o acesso
passa a ser feito via www e em 1999, o CCN passa a interagir
diretamente com o Sistema Comut.
Sob a coordenação do Ibict, o CCN pode ser definido como
uma rede cooperativa de unidades de informação localizadas no
Brasil com o objetivo de reunir, em um único catálogo de aces-
so público, as informações sobre publicações periódicas técnico-
científicas registradas em centenas de catálogos distribuídos nas
diversas bibliotecas brasileiras. Nesse contexto, possibilita a oti-
mização dos recursos disponíveis nas Bibliotecas e serviços de do-
cumentação que participam da rede, permitindo o intercâmbio
entre bibliotecas, por meio do sistema de comutação bibliográ-
fica.43

43. Em outubro de 2009, o CCN arrolava 58.460 títulos de periódicos, distribuídos


em 584 bibliotecas do país.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 77


2. Comutação Bibliográfica (Comut)
(http://www.ibict.br/secao.php?cat=Comut)

Criado em 1980, pelo Ministério da Educação, por meio da Co-


ordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Ca-
pes), o Comut tem a finalidade de dotar o País de um mecanis-
mo eficiente de acesso à informação, exclusivamente, para fins
acadêmicos e de pesquisa, respeitando-se rigorosamente a Lei de
Direitos Autorais. Mediante portaria interministerial, passou a ser
integrado posteriormente pela Secretaria de Educação Superior
(Sesu), a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e o Ibict.
O Comut permite a obtenção de cópias de documentos téc-
nico-científicos (artigos de periódicos, teses, anais de congressos
etc.) adquiridos e armazenados de forma cooperativa nas biblio-
tecas pertencentes às principais instituições universitárias e de
pesquisa do Brasil. Permite também cópias de documentos que
estão disponíveis em bibliotecas do exterior (com as quais o Pro-
grama estabelece contratos de serviços).
Cerca de 2.300 instituições brasileiras de ensino e pesquisa
solicitam cópias de documentos através do Comut. Para prestar
esse serviço o Comut atua por meio de uma rede de 394 biblio-
tecas, denominadas “Bibliotecas Base”, que são aquelas com re-
cursos bibliográficos, humanos e tecnológicos adequados para o
atendimento às solicitações de seus usuários. O sistema opera,
também, com as “Bibliotecas Solicitantes”, que podem pedir có-
pias de documentos por solicitação dos seus usuários.
De 1980 a 1996, todos os procedimentos operacionais e
administrativos eram feitos de forma manual, por meio de for-
mulários impressos remetidos por correio. A partir de 1997, foi
introduzido o Comut Online, que permite o pedido do documento
via Internet, o que agiliza o tempo do atendimento.
O Programa atende, também, a usuários individuais, que po-
dem fazer seus pedidos como usuários solicitantes, sem a inter-
mediação de uma Biblioteca Solicitante. Para isso, basta se cadas-
trar no site do Programa e adquirir bônus Comut.44

44. Em novembro de 2009, estão cadastrados no Sistema Comut cerca de 54.000


usuários como pessoa física.

78 Influências do uso da Informática na Biblioteconomia e na Ciência da Informação


Cabe informar que o CCN é o principal instrumento de apoio
do Comut.

3. Rede Bibliodata
(http://www8.fgv.br/bibliodata/)

A Rede Bibliodata é uma experiência nacional pioneira na cria-


ção de uma rede de catalogação cooperativa, que visa a difusão
dos acervos bibliográficos do País, o aperfeiçoamento dos serviços
de documentação e informação das instituições participantes e o
compartilhamento dos recursos empregados.
Com suas raízes no Projeto Calco,45 iniciado na década de
1970, hoje a rede é formada pelo acervo de 29 instituições coo-
perantes; até 2005 foi coordenada pela Fundação Getúlio Vargas
(FGV) e, desde então, sua absorção pelo Ibict está sendo imple-
mentada.46

4. Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em


Ciências da Saúde (Bireme)
(http://regional.bvsalud.org/local/Site/bireme/homepage.htm)

A Bireme é um centro especializado da Organização Pan-Ameri-


cana da Saúde (Opas), estabelecido no Brasil, desde 1967, em co-
laboração com o Ministério da Saúde, o Ministério da Educação,
a Secretaria do Estado de São Paulo e a Universidade Federal de
São Paulo. Tem a missão de contribuir para o desenvolvimento da
área da saúde fortalecendo e ampliando o fluxo de informação
nesse âmbito.
Apresenta-se como uma rede resultante da ação cooperativa
de 31 países da América Latina e do Caribe, África, Espanha, Mé-
xico, Portugal e Timor Leste.

45. Calco = Catalogação Legível por Computador. Esse projeto visava à constitui-
ção de um cadastro das obras dos acervos das bibliotecas da FGV, que emitia as
fichas e etiquetas relativas a este acervo.
46. Seu catálogo mais recente, em CD (31ª ed. – set. de 2009) contém mais de
1.800.000 registros bibliográficos.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 79


Produz a base de dados denominada Literatura Latino-Ame-
ricana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), a qual cobre a
literatura médica da região, desde 1982. Disponibiliza a Bibliote-
ca Virtual em Saúde, que se constitui em uma ferramenta indis-
pensável para a pesquisa na referida área.

5. Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD)


(http://bdtd.ibict.br/)

Anteriormente denominada Biblioteca Digital de Teses Brasilei-


ras (BDTD), hoje, a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dis-
sertações (BDTD) reúne os sistemas de informação de teses e
dissertações existentes em instituições de ensino e pesquisa bra-
sileiras, e também estimula o registro e a publicação de teses e
dissertações em meio eletrônico. Este projeto − iniciativa inovado-
ra do Ibict, em parceria com as instituições brasileiras de ensino e
pesquisa − possibilita que a comunidade brasileira de C&T publi-
que eletronicamente as teses e dissertações produzidas no país e no
exterior, dando maior visibilidade à produção científica nacional.
A BDTD iniciou com um sistema cooperativo, implantado
pelo Ibict, em 1995, o qual integrava, em uma só base de dados,
referências bibliográficas de teses e dissertações provenientes de
17 instituições de ensino superior.47 A base contava, à época, com
cerca de 121 mil registros.
Com a viabilização da publicação eletrônica de documentos,
diversas instituições nacionais e internacionais iniciaram ações
para a disponibilização em rede dos textos completos desse tipo
de documento.
Seguindo essa tendência, em janeiro de 2001, o Ibict consti-
tuiu um grupo de estudo para analisar questões tecnológicas e de
conteúdo relacionadas com a publicação de teses e dissertações
na Internet, o qual resultou, em dezembro do mesmo ano, em um
projeto-piloto, que levou à criação, em abril de 2005, do Consór-
cio Brasileiro de Teses e Dissertações, formado por instituições

47. Em dezembro de 2009, o portal do BDTD registra 92 instituições parceiras,


contando com 134.969 teses/dissertações publicadas.

80 Influências do uso da Informática na Biblioteconomia e na Ciência da Informação


de ensino e pesquisa que cooperam com o Instituto, integrando
as duas iniciativas – a de registro bibliográfico e a de publicação
eletrônica de teses e dissertações – que passou a ser o principal
alimentador da BDTD.

6. Portal da Capes
(http://www.periodicos.capes.gov.br/)

Professores, pesquisadores, alunos e funcionários de 311 insti-


tuições de ensino e de pesquisa,48 em todo o País, têm acesso à
produção intelectual mundial atualizada mediante este serviço
oferecido pela Capes. Essas instituições foram selecionadas con-
siderando-se a missão da Capes de promover a elevação da qua-
lidade do ensino superior por meio do fomento à pós-graduação.
As seguintes categorias são determinantes para as instituições se-
rem incluídas no acesso ao Portal de Periódicos da Capes:
 instituições federais de ensino superior;
 instituições de pesquisa com pós-graduação avaliada pela
Capes;
 instituições públicas de ensino superior estaduais e munici-
pais com pós-graduação avaliada pela Capes e;
 instituições privadas de ensino superior com pelo menos um
doutorado com avaliação trienal 5 (cinco) ou superior pela
Capes.

Outras instituições podem aderir ao Portal na categoria de


“pagantes”, com acesso restrito às coleções contratadas.
O Portal oferece acesso aos textos completos de artigos de
22.522 revistas nacionais e estrangeiras, e a 130 bases de dados
referenciais (com referências e resumos de documentos) em to-
das as áreas do conhecimento. Inclui, também, uma seleção de
importantes fontes de informações acadêmicas com acesso gra-
tuito na Internet.
O uso do Portal é livre e gratuito para os usuários das institui-
ções participantes, sendo o acesso realizado a partir de qualquer

48. Dados de dezembro de 2009 fornecidos pela Capes.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 81


terminal ligado à Internet localizado nas instituições ou por elas
autorizado (acesso remoto).
O portal vem favorecendo o crescimento das atividades dos
programas de pós-graduação, de pesquisa e de graduação do País,
em qualidade, produtividade e competitividade, pois se encontra
em permanente desenvolvimento.

7. Portal Domínio Público


(www.dominiopublico.gov.br/)

Sob a responsabilidade do MEC, foi criado – em novembro de


2004 – o PORTAL DOMÍNIO PÚBLICO, com um acervo de cerca
de 500 obras. Em 2009, arrola mais de 135.000 obras literárias,
artísticas e científicas, em formato de som, texto, vídeo e áudio já
em domínio público49 e a obras que tenham a devida licença por
parte dos titulares dos direitos autorais.
Esse portal propõe o compartilhamento de conhecimentos
de forma equânime, colocando à disposição de todos os usuários
da rede mundial de computadores uma biblioteca virtual que se
constitui em um ambiente que permite a coleta, a integração, a
preservação e o compartilhamento de conhecimentos, sendo seu
principal objetivo o de promover o amplo acesso às obras literá-
rias, artísticas e científicas, que constituem o patrimônio cultural
brasileiro e universal.
Por outro lado, também pretende contribuir para o desenvol-
vimento da educação e da cultura, assim como para aprimorar a
construção da consciência social, da cidadania e da democracia
no Brasil.
Concluindo esse tópico, pode-se inferir que os exemplos ci-
tados corroboram o conceito de Matos (1997), que define redes
virtuais como “uma rede (temporária) de organismos indepen-
dentes, ligados através das tecnologias de informação, com vistas
a partilharem competências, recursos, custos e os espaços de in-
tervenção de cada um”.

49. A noção de “domínio público” se apoia, legalmente, na questão de que as


obras de responsabilidade de autores com mais de 70 anos de morto devem ter
seu acesso liberado para a sociedade.

82 Influências do uso da Informática na Biblioteconomia e na Ciência da Informação


O grande potencial existente no contexto das redes se refere
ao fato de que a informação não se encontra mais centralizada, o
seu detentor não é mais uma única pessoa, ou seja, ampliam-se
as fontes de informação. Nesse sentido, o seu poder de circulação
é muito maior e dinâmico e a tecnologia trabalha justamente em
prol dessa disseminação.

Sistemas de Gerenciamento de Serviços de Bibliotecas


Os computadores são, também, amplamente utilizados nos sis-
temas de gerenciamento de bibliotecas. Estes sistemas ajudam a
controlar as atividades de registro, tratamento e recuperação dos
itens dos acervos das diferentes unidades de informação.
Os estudos sobre automação dos serviços de bibliotecas –
como eram denominados – remontam à década de 1960, com a
utilização dos grandes computadores (AVALIAÇÃO..., 2002).
No Brasil, as primeiras iniciativas de informatização das bi-
bliotecas se fundamentaram em softwares desenvolvidos, na déca-
da de 1970, pelas próprias instituições a que estavam vinculadas,
ou com base no software Microisis, desenvolvido pela Unesco,
sendo o Ibict o seu distribuidor oficial, a partir de 1985.50
Ao final da década de 1980, surgem outros sistemas de infor-
matização, sendo os mais relevantes os de origem internacional,
como o VTLS e o Aleph, entre outros.
A partir de 1993, com as mudanças na política de Informá-
tica, que proporcionaram o acesso a equipamentos e softwares
cada vez mais avançados, começaram a ser desenvolvidos os sis-
temas de informatização nacionais e, nos dias de hoje, a grande
maioria das bibliotecas – de todos os tipos e tamanhos – contam
com sistemas informatizados de gerenciamento de seus serviços.
A extensão dessa informatização varia de acordo com os recur-
sos disponíveis (financeiros, materiais, humanos, tecnológicos)
e outros fatores de interesses internos. Por outro lado, o custo
desses sistemas vem diminuindo, na medida em que a tecnologia
se aprimora.

50. Atualmente o Microisis é distribuído pela Bireme.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 83


Na escolha de um software, é preciso que os gestores nor-
teiem suas preferências, visando os benefícios que esse sistema
irá trazer para a unidade, em termos de: missão da instituição,
tamanho da coleção, infraestrutura tecnológica, características do
software, fidedignidade do fabricante etc.
Os Sistemas de Gerenciamento de Serviços de Bibliotecas
apresentam funções básicas, tais como: Aquisição; Catalogação;
Catálogo em Linha de Acesso Público (Opac); Circulação; Publi-
cações Seriadas; Informações Gerenciais.
A seguir, são listados alguns desses sistemas, especificando-
se as empresas que os comercializam:

Software Empresa
Aleph Ex Libris
Argonauta Data Coop
Informa Modo Novo
MicroIsis Bireme
Ortodocs Potiron
Pergamum PUC-PR
Thesaurus Via Ápia Informática
Virtua VTLS América

Esses sistemas apoiam a construção dos catálogos informati-


zados das instituições, que proporcionam a recuperação das infor-
mações dos seus acervos.
Figueiredo (1992), ao analisar a situação da automação nas
bibliotecas universitárias identificou como os maiores benefícios
trazidos pela implantação desses sistemas a rapidez, a agilidade
e a eficiência no atendimento às necessidades informacionais dos
usuários. Atualmente, os usuários desses sistemas estão organi-
zando redes de usuários, como a Rede de Usuários do Pergamum,
com a finalidade de otimizar as atividades desenvolvidas.
Um novo modelo, em se tratando de software para informatiza-
ção das coleções das bibliotecas é o conhecido como “software livre”,
que se constitui em uma oportunidade de democratização do aces-
so à informação bibliográfica. Um exemplo desse tipo de iniciativa
é o BIBLIVRE, que consiste em um projeto concebido em parceria

84 Influências do uso da Informática na Biblioteconomia e na Ciência da Informação


pela Sociedade de Amigos da Biblioteca Nacional e pelo Programa
de Engenharia Elétrica, da Coppe/UFRJ. O software, que está na sua
versão 2.2, está sendo implantado em todas as bibliotecas públicas
do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP).

GESTÃO ELETRÔNICA DE DOCUMENTOS (GED)


No final do Séc. XX e início do Séc. XXI, começam a ser utilizadas
ferramentas voltadas ao novo conceito de geração, tratamento,
guarda e difusão de documentos – a Gestão Eletrônica de Docu-
mentos (GED). Esta ferramenta tem por finalidade promover não
só a organização da documentação e o aumento da agilidade nos
processos de transmissão da informação, como também a redu-
ção e a racionalização de espaços de armazenamento; está sendo
muito utilizada pelas empresas e se constitui em um novo campo
de trabalho para o profissional bibliotecário.

A Informática e a atividade dos profissionais


A aplicação da Informática nas diferentes atividades profissionais
vem se constituindo em um grande desafio, principalmente, para
aqueles profissionais que não tiveram oportunidade de lidar com
as tecnologias emergentes durante seus cursos de graduação e
pós-graduação.
Mudanças substanciais estão ocorrendo nas relações de tra-
balho e nas formas de condução das tarefas diante desse cenário
tecnológico e faz-se necessário garantir meios de acesso às infor-
mações digitais para as futuras gerações. A educação permanente
deve ser uma meta presente para todos os profissionais, principal-
mente para aqueles que lidam diretamente com as tecnologias de
informação, que estão em constante evolução. Para os bibliotecá-
rios, recomenda-se, portanto, uma contínua atualização, não só
no que diz respeito ao domínio das ferramentas de Informática,
como também na sua aplicação nas áreas de Biblioteconomia e
Ciência da Informação.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 85


Referências
AVALIAÇÃO de softwares para bibliotecas e arquivos. 2. ed. rev. e ampl.
São Paulo: Polis, 2002.
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Paulo: Polis, 1990.
FIGUEIREDO, N. M. de. O impacto da automação no serviço de refe-
rência/informação. In: ______. Serviços de referência e informação. São
Paulo: Polis, 1992. p. 157-167.
MATOS, L. M. C. Organizações virtuais. Lisboa: mimeo, Universidade
Nova de Lisboa, 1997.
OLIVEIRA, Marlene de (Coord.). Ciência da Informação e Biblioteco-
nomia: novos conteúdos e espaços de atuação. Belo Horizonte: Ed. da
UFMG, 2005.
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MAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE (Bireme). Disponível em: http://
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E TECNOLOGIA (Ibict). Disponível em: www.ibict.br Acesso em: 10 out.
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br Acesso em: 10 out. 2009.
ROBREDO, J. Entrevista. Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documen-
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SARACEVIC, T. Interdisciplinarity nature of Information Science. Ciência
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TOMAÉL, M. I. Redes de Informação: o ponto de contato dos serviços e
unidades de informação no Brasil. Informação e Informação, Londrina ,
v.10, n.1/2, jan./dez. 2005.

86 Influências do uso da Informática na Biblioteconomia e na Ciência da Informação


UNIDADE 3
A formação profissional do
bibliotecário: ensino de graduação
e de pós-graduação51

“Escolha um trabalho que você ame e não terá que


trabalhar um só dia de sua vida” (Confúcio).

A Biblioteconomia como área de atuação, por muito tempo, teve


como lócus principal a biblioteca, a qual era vista sob uma ótica
estática –“de um depósito”– mais interessada no armazenamento
de seu acervo, que quanto maior número de itens reunisse mais
aumentava de valor. Foi preciso promover uma radical transfor-
mação neste cenário para que essa área se expandisse, voltando-
se para mercados diferenciados. Como consequência desta mu-
dança, uma nova tendência se instala – o interesse em facilitar o
acesso – fazendo crescer as oportunidades de pesquisa e, por sua
vez, o desenvolvimento do conhecimento.
O exercício da profissão, nessa área, era procurado por in-
divíduos estudiosos, amantes das letras e de livros, historiadores
– quase sempre pessoas muito cultas – que trabalhavam com dois
grandes objetivos “guardar com zelo o acervo” e “preservá-lo para
o futuro”.
O advento da Revolução Industrial faz surgir outros fatos que
influenciam a área de Biblioteconomia, tais como: o aumento da
produção do livro impresso; as novas descobertas científicas; a
proliferação das sociedades científicas e o crescimento dos perió-

51. Fundamentado, principalmente, em CASTRO, C. A. de. História da Biblio-


teconomia brasileira: perspectiva histórica. Brasília, DF: Thesaurus, 2000 e em
MUELLER, S. P. M. O Ensino de Biblioteconomia no Brasil. Ciência da Informação,
Brasília, DF, v.14, n.1, p. 3-15, jan./jun.1985.

88 A formação profissional do bibliotecário: ensino de graduação e de pós-graduação


dicos científicos. Diante desta nova era, a função dos profissionais
da área deve contemplar as atividades de “reunir, conservar, orde-
nar e distribuir informação”, o que exige da sua formação o foco
nas competências para atingir tais objetivos.

A Biblioteconomia como área científica


Alguns indicadores são considerados como indispensáveis para
que uma área seja considerada científica: que ela tenha desen-
volvido teorias próprias, acompanhadas por práticas que as com-
provem e que possua uma infraestrutura científica fundamentada
em sociedades científicas, canais de comunicação, instituições de
ensino e pesquisa e, principalmente, pessoal qualificado. Essas
pessoas, segundo Bunge (1980), precisam estar organizadas em
comunidades e suas relações devem ser estabelecidas por con-
tatos diretos (por meio das pesquisas) e indiretos (por meio das
publicações).
A formação de pessoal qualificado representa um grande fa-
tor para o desenvolvimento de uma área. Em se tratando da for-
mação na área de Biblioteconomia, ela ocorre em nível de gradua-
ção, nos países latino-americanos, e em nível de pós-graduação,
na Europa e nos Estados Unidos (GUIMARÃES, 2004).
Mota e Oliveira (2005) apontam que, no Brasil, os cursos de
Biblioteconomia e Ciência da Informação são oferecidos em três
níveis, a saber, graduação, pós-graduação lato sensu (especiali-
zação) e pós-graduação stricto sensu. O título de bibliotecário é
obtido em cursos de graduação, e os títulos de mestre e doutor
são obtidos em programas de pós-graduação stricto sensu, em vá-
rias áreas, com ênfase na de Ciência da Informação.
Os cursos de graduação possibilitam ao aluno a formação
básica e a iniciação na prática da pesquisa; os de pós-graduação
stricto sensu – mestrado e doutorado – formam os docentes e os
pesquisadores na área.
A evolução do ensino profissional de Biblioteconomia, no
Brasil, é apresentada por Fonseca citado por Mueller (1985) como
dividida em três fases distintas: a primeira, do período de 1879
a 1929, seguindo a influência francesa, sob a responsabilidade
da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro; a segunda, de 1929 a

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 89


1962, seguindo os modelos americanos, com ênfase na atuação do
Colégio Mackenzie, em São Paulo; a terceira, de 1962 em diante,
com a implantação do primeiro currículo mínimo oficial, apro-
vado pelo Conselho Federal de Educação (CFE). Mueller (1985)
acrescenta mais duas fases a essa classificação: a quarta, consti-
tuída pela década de 1970, em função do crescimento dos cursos
na área, e a quinta, que corresponde ao período que se seguiu à
implementação do segundo currículo mínimo, em 1982, que ca-
racterizou uma reformulação nos programas de ensino. Pode-se,
ainda, incluir uma nova fase a essa última classificação, desde a
promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em 1996,
que trouxe a flexibilização do currículo dos cursos no Brasil.
O início da formação em Biblioteconomia, no Brasil, segue
de perto a criação da Biblioteca Nacional (BN), que – como já
apresentado na Unidade 2 – foi fundada, oficialmente, em 1810
e, aberta, totalmente, à população em 1814.
As direções que se sucederam na administração da BN come-
çaram a demonstrar preocupação com a falta de pessoal qualifica-
do e em número insuficiente para desenvolver todas as atividades
requeridas (CASTRO, 2000).
Com o objetivo de sanar as dificuldades existentes na Biblio-
teca, em relação à qualificação de pessoal, foi criado o curso de
Biblioteconomia, em 1911. O currículo da primeira turma do curso,
que só iniciou em 1915, contava com quatro disciplinas: Bibliogra-
fia – que se subdividia em Administração de Bibliotecas e Cataloga-
ção; Paleografia e Diplomática; Iconografia e Numismática.
Este curso foi interrompido em 1923 e reiniciado em 1931,
nas próprias dependências da Biblioteca Nacional, sob a gerência
do diretor da instituição, com a duração de dois anos. No primei-
ro ano, o currículo contava com as disciplinas: História Literária,
Iconografia e Cartografia e, no segundo ano, com as disciplinas
Bibliografia, Paleografia e Diplomática.
Esta mudança do curso, ainda, contemplava a predominân-
cia da cultura geral em detrimento das técnicas, na formação
do bibliotecário, seguindo o modelo francês para a formação de
pessoal para as bibliotecas. Cabe ressaltar que com essa reforma
o curso não mais se destinava somente aos funcionários da BN,
apesar da predominância destes.

90 A formação profissional do bibliotecário: ensino de graduaçãoe de pós-graduação


A segunda fase, distinguida por Fonseca (MUELLER, 1985),
é aquela em que foi implantado no Brasil o modelo pragmático de
ensino de Biblioteconomia, com o Curso Elementar de Biblioteco-
nomia, criado no Colégio Mackenzie, no final da década de 1920.
Esse curso – que já focalizava as técnicas biblioteconômicas, mi-
nistrando as disciplinas Catalogação, Classificação, Referência e
Organização de Bibliotecas – encerra suas atividades quando é
criado, por Rubens Borba de Moraes, o Curso de Biblioteconomia
do Departamento de Cultura da Prefeitura Municipal de São Pau-
lo, em 1936. Como já mencionado, ambos adotaram o modelo
americano, no ensino da Biblioteconomia, que apresentou o pre-
domínio dos aspectos técnicos sobre os de natureza humanista.
Em 1939, o curso da Prefeitura Municipal é descontinuado,
sendo criado, em 1940, um novo curso na Escola Livre de Socio-
logia Política (ELSP52), com subvenção da Rockefeller Foundation.
Esta iniciativa, seguida da reforma do curso da Biblioteca Nacio-
nal, em 1944, abriu novas oportunidades na área. Candidatos
de outros estados receberam bolsas de estudos para estudar em
São Paulo, e, ao regressarem a seus estados, reorganizam antigas
bibliotecas, criam novas e, principalmente, dão origem a novos
cursos de Biblioteconomia no País. Como exemplos, podem ser ci-
tadas as Escolas de Biblioteconomia, da Bahia, de Belo Horizonte
e do Paraná, entre outras, como já apresentado na Unidade 2.
Mais uma reforma ocorre na BN, em 1944, a qual projetou
mudanças significativas no Curso de Biblioteconomia. Com esta
reforma, o ensino na BN incorpora os aspectos técnicos america-
nos, trazidos por bibliotecários brasileiros que se especializaram
nos Estados Unidos.
Cabe ressaltar que o Departamento Administrativo do Serviço
Público (Dasp) criou, no Rio de Janeiro, antes dessa reforma, um
curso de Biblioteconomia, com duração de seis meses – incluindo
as mesmas disciplinas do curso da ELSP – destinado a capacitar
os ocupantes de cargos públicos de bibliotecário e bibliotecário
auxiliar, o qual funcionou até a reformulação no curso da BN.
Castro (2000) ressalta que outro aspecto relevante da refor-
ma do curso da BN foi que o Curso de Biblioteconomia passou a
se denominar Cursos da Biblioteca Nacional (CBN), compreen-

52. Rubens Borba de Moraes foi um dos fundadores da ELSP.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 91


dendo três níveis distintos: o Curso Fundamental de Biblioteco-
nomia, com a duração de um ano, que tinha o objetivo de formar
bibliotecários auxiliares, que – sob a orientação de bibliotecários
– poderiam executar alguns serviços técnicos; o Curso Superior
de Biblioteconomia, também com a duração de um ano, que for-
mava o pessoal para administrar, organizar e dirigir os serviços
técnicos inerentes às bibliotecas; os Cursos Avulsos que davam
oportunidades aos profissionais se especializarem, por meio da
atualização de seus conhecimentos sobre Biblioteconomia, bus-
cando também promover a padronização dos serviços de bibliote-
cas. Como exemplos, podem ser citados os cursos de Conservação
e Restauração de Livros, Estampas e Documentos; de Iconografia
e de Paleografia.
A década de 1950 caracteriza-se, na ótica de Mueller (1985),
pela expansão no número de cursos de Biblioteconomia e na bus-
ca – pelos bibliotecários – de um reconhecimento da profissão
como de nível superior. Para conseguir tal intento, começaram a
se realizar eventos com a finalidade de reunir bibliotecários de
todo o território nacional, que deram início às atividades colabo-
rativas, assim como promoveram oportunidades de discussão dos
rumos da profissão e do ensino praticado para a formação dos
profissionais.
A terceira fase do ensino da Biblioteconomia, apontada por
Fonseca, no trabalho de Mueller (Id.), vai de 1962 em diante,
com a implantação do primeiro currículo mínimo oficial, aprova-
do pelo Conselho Federal de Educação (CFE) por meio de Parecer
no. 326/CFE/62.
Essa estrutura curricular – homologada pela Portaria do Mi-
nistério da Educação (MEC), de 4 de dezembro de 1962 – insti-
tuía que todos os cursos de graduação deveriam seguir o modelo
nacional, denominado “Currículo Mínimo”.
Este modelo – baseado no modelo americano introduzido
pela Escola Livre de Sociologia Política, na década de 1940 – esta-
belecia as matérias e seus conteúdos, sendo de responsabilidade
das escolas a determinação das disciplinas relacionadas aos mes-
mos. Porém, não permitia mudanças nestes conteúdos, na medida
em que o sistema educacional brasileiro era muito burocrático,
inviabilizando modificações rápidas na estrutura curricular.

92 A formação profissional do bibliotecário: ensino de graduaçãoe de pós-graduação


De autoria do Conselheiro Josué Montello, esse instrumento
apresentava:
 Art. 1° – O currículo mínimo do curso de Biblioteconomia
compreenderá as seguintes matérias: História do Livro e das
Bibliotecas; História da Literatura; História da Arte; Introdu-
ção aos Estudos Históricos e Sociais; Evolução do Pensamen-
to Filosófico e Científico; Organização e Administração de
Bibliotecas: Catalogação e Classificação; Bibliografia e Refe-
rência; Documentação; Paleografia.
 Art. 2° – A duração do curso será de três anos letivos.
 Art. 3° – É obrigatória a observância dos artigos 1° e 2° a par-
tir do ano letivo de 1963.
Este ato teve como consequência imediata a elevação da pro-
fissão à categoria de “profissão de nível superior”.
De acordo com levantamento realizado por Souza (2009), já
tinham sido criados no país 10 cursos de Biblioteconomia e por
toda a década de 1960 surgiram mais nove cursos. Entre 1970 e
1977, oito cursos foram criados no País, dos quais seis em cidades
do interior.
Outro fato relevante que ocorreu, em meados da década de
1960, foi a criação da ABEBD, por recomendação emanada do
V CBBD, realizado em São Paulo, em 1965. Esta entidade – que
se propunha a congregar as escolas de Biblioteconomia e Docu-
mentação do Brasil, em suas questões organizativas – apresentava
como uma de suas finalidades em seu estatuto, datado de 14 de
janeiro de 1967, “planejar o desenvolvimento da formação biblio-
teconômica”.
Por ocasião do VI CBBD, realizado em Belo Horizonte, em
1971, a ABEBD se pronunciou favoravelmente à necessidade de
uma revisão do currículo mínimo vigente para o Curso de Biblio-
teconomia.53
Por toda a década de 1970, foram realizados inúmeros en-
contros da ABEBD, nos quais foram discutidas questões relativas
à atualização dos currículos, até que, em 1980, a Secretaria do

53. Outra recomendação do VI CBBD foi a criação do Encontro Nacional dos Estu-
dantes de Biblioteconomia e Documentação (ENEBD), fórum de discussão e apre-
sentação de trabalhos, que vem se realizando regularmente desde então, tendo
sido realizada, em 2009, a sua 32ª edição, no Rio de Janeiro.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 93


Ensino Superior (Sesu/MEC) organizou um Grupo de Trabalho
– MEC/ABEBD – o qual apresentou, em janeiro de 1981, ao CFE
uma proposta de reformulação do Currículo Mínimo dos cursos
de Biblioteconomia (MUELLER, 1985).
Em 1982, foi aprovado o Segundo Currículo Mínimo,54 cuja
principal modificação foi o estabelecimento da duração mínima
do curso em 2.500 h/aula, que deveriam ser integralizadas em
quatro anos, no mínimo, e em sete anos, no máximo.
Este currículo estabelecia matérias de Fundamentação Geral:
Comunicação, Aspectos Sociais, Políticos e Econômicos do Brasil
Contemporâneo, História da Cultura; Matérias Instrumentais: Ló-
gica, Língua Portuguesa, Língua Estrangeira Moderna, Métodos
e Técnicas de Pesquisa; e Matérias de Formação Profissional: In-
formação Aplicada à Biblioteconomia, Produção dos Registros do
Conhecimento, Formação e Desenvolvimento de Coleções, Con-
trole Bibliográfico dos Registros do Conhecimento, Disseminação
da Informação, Administração de Bibliotecas (SOUZA, 2009).
A partir da Lei de Diretrizes e Bases para a Educação (LDB),
Lei No 9.394, sancionada em 20 de dezembro de 1996, que revo-
gou toda a legislação anterior relativa aos cursos de graduação, os
profissionais da área de Biblioteconomia iniciaram debates sobre
as diretrizes formuladas na LDB, apresentando como resultado
um documento denominado “Diretrizes Curriculares para os Cur-
sos de Biblioteconomia”, que flexibilizou a estrutura curricular
dos cursos formadores de bibliotecários, estando muito mais dire-
cionado aos anseios da sociedade brasileira.
Os 39 cursos existentes, em 2009, no País, seguem essas dire-
trizes, no estabelecimento de seus currículos. Desses cursos, 72%
estão vinculados a instituições públicas e 28% a instituições priva-
das, prevalecendo sua localização na região Sudeste (51%).
Um dos mais novos cursos da área, o da UFRJ, aprovado em
14 de julho de 2005, e denominado de “Curso de Biblioteconomia e
Gestão de Unidades de Informação”, foi planejado com o propósito
de formar bibliotecários gestores, aptos a atuar no Ambiente 21,
onde a flexibilidade, a celeridade e a autonomia são palavras de
ordem.

54. Resolução 08/1982, de 1° de setembro de 1982.

94 A formação profissional do bibliotecário: ensino de graduaçãoe de pós-graduação


Apesar de um movimento do MEC, em meados de 2009,
para padronização das nomenclaturas dos cursos de graduação,
no Brasil, a classe acadêmica discordou desse posicionamento,
apresentando argumentos que visavam garantir a flexibilidade
conquistada anteriormente.
Cabe ressaltar que, atualmente, as estruturas dos cursos es-
tão mais voltadas para o acesso à informação, buscando formar
um profissional mais dinâmico e competitivo que, de fato, atenda
às necessidades do usuário do Séc. XXI.

O ensino da Ciência da Informação


A criação do IBBD, em 1954, tem grande importância para a for-
mação dos profissionais da área de Biblioteconomia no Brasil.
Uma ação relevante empreendida pelo Instituto, sob esse aspecto,
foi a criação dos cursos de pós-graduação lato sensu, ou de es-
pecialização, tendo sido essa instituição a pioneira na oferta dos
mesmos. Salienta-se que os cursos de especialização destinam-se,
principalmente, a capacitar os profissionais graduados, especiali-
zando-os em determinado assunto ou tema.
Ressalta-se, neste cenário, a oferta do Curso de Documenta-
ção Científica (CDC), pelo IBBD, a partir de 1956, dirigido – ini-
cialmente – a bibliotecários, com o objetivo de cobrir lacunas dos
cursos de Biblioteconomia, capacitando-os para trabalhar com a
documentação científica e técnica, primeiro enfoque da C.I.; mais
tarde foi aberto a outros graduados de cursos superiores. Com
este curso, foram treinados inúmeros bibliotecários brasileiros e,
também, bibliotecários da América Latina, até o final da década
de 196055 (CHRISTOVÃO, 1995).
Cabe lembrar que a Biblioteca Nacional também oferecia cur-
sos de capacitação para profissionais já formados, desde a década
de 1950.
O primeiro curso de pós-graduação stricto sensu na área de
C.I., em nível de mestrado, foi criado, em 1970, também pelo

55. A partir de 1964, o CDC foi ministrado com mandato universitário, por meio
de convênio com a UFRJ, com grande projeção internacional. Segundo Barreto
(2007) este curso foi oferecido, pelo IBBD/Ibict, durante 40 anos, sem interrup-
ção.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 95


IBBD, que logo se transformou em Ibict. Esse curso manteve con-
vênio com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) até
2000. No período de 2003 a 2007, o convênio foi firmado com
a Universidade Federal Fluminense (UFF) e, a partir de 2008, o
Ibict retoma sua parceria com a UFRJ, estabelecendo convênio
com a Faculdade de Administração e Ciências Contábeis (Facc),
Unidade da UFRJ à qual está vinculado o curso de graduação em
Biblioteconomia e Gestão de Unidades de Informação (CBG).
De acordo com Christovão (1995), o mestrado do Ibict, a
princípio, não dispunha em seus quadros de profissionais com a
titulação exigida para exercer a docência neste nível, tendo sido
esse problema contornado por meio de convite a alguns especia-
listas da Inglaterra e dos Estados Unidos para ministrar as disci-
plinas da área de concentração do curso.56
No decorrer da década de 1970 e da seguinte, foram sen-
do formados docentes/pesquisadores brasileiros, os quais foram
substituindo o pessoal estrangeiro, no ensino, na orientação de
dissertações e no estabelecimento de linhas de pesquisa.
Ainda segundo a autora, o curso recém-criado não se confi-
gurava como uma especialização para graduados em um único
campo do conhecimento, mas sim como um curso interdisciplinar,
aberto a qualquer tipo de graduado que tivesse como foco de es-
tudo “a compreensão das propriedades, comportamento e fluxo
da informação”.
A partir do curso do IBBD/Ibict, outros cursos de mestrado
foram criados, no País, a maioria em Biblioteconomia, como o da
Universidade Federal de Minas Gerais, em 1976; o da Pontifícia
Universidade Católica de Campinas, também em 1976; e o mes-
trado em Biblioteconomia e Documentação, da Universidade de
Brasília, em 1978. Estes cursos depois mudaram suas denomina-
ções, vinculando-se à área de C.I. (SOUZA, 2009).
Atualmente, a área de C.I. conta com oito programas de pós-
graduação e, ainda se faz presente em outros dois programas: no
Programa de Pós-graduação em Comunicação, da Escola de Co-
municação, da Universidade de São Paulo (ECA/USP), em nível

56. Dentre os docentes estrangeiros, destacaram-se Frederick Wilfrid Lancaster e


Tefko Saracevic, que também exerceram papel de orientadores para a formação
de alguns docentes brasileiros.

96 A formação profissional do bibliotecário: ensino de graduaçãoe de pós-graduação


de mestrado, desde 1972 e, em nível de doutorado, desde 1992,
e no Programa de Pós-graduação em Comunicação e Informação,
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em nível
de mestrado, desde 1995.
Existe, ainda, um programa de pós-graduação em Memória
Social, com área de concentração em Estudos Interdisciplinares em
Ciência da Informação, sob a responsabilidade da Unirio, com cur-
so de mestrado, desde 1998 e doutorado a partir de 2005.
O Quadro 6 discrimina os programas de pós-graduação, ofe-
recidos na área de C.I.

Quadro 6 – Programas de Pós-graduação em


Ciência da Informação no Brasil
Nível Início Vinculação
Mestrado 1970 Ibict
Doutorado 1992
A
Mestrado 1972 USP
Doutorado 1980
Mestrado 1976 UFMG
Doutorado 1997
Mestrado 1976 PUCCamp
Mestrado 1978 UFPB
Mestrado 1978 UnB
Doutorado 1992
Mestrado 1995 UFRGSB
Doutorado 2000
Mestrado 1998 Unesp
Mestrado 1998 UFBA
Mestrado 1998 Unirio
Doutorado 2005
Mestrado 2003 UFSC
Mestrado 2008 UFF
FONTE: Adaptado de SOUZA, 2009.
Notas:
A. Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação (Linha de Pesquisa em
Biblioteconomia/Informação).
B. Programa de Pós-graduação em Comunicação e Informação (Área de Concentração:
Comunicação e Informação).

Como pode ser visto, houve um crescimento relevante na


quantidade de programas de pós-graduação, entretanto, o cor-
po de professores/pesquisadores ainda está aquém da demanda
desses programas. O MEC está promovendo modificações nesse
cenário, também no âmbito da graduação, por meio de uma das
ações do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Ex-

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 97


pansão das Universidades Federais (Reuni),57 desenvolvido pelo
Ministério, pelo Decreto nº 6.096 de 24 de abril de 2007.
Desde o final da década de 1970, o cientista social Darcy
Ribeiro já expressou sua avaliação positiva sobre os cursos de
pós-graduação no Brasil, pois eles têm um papel fundamental na
consolidação de uma área do conhecimento, na medida em que, a
seu ver, esta nova infraestrutura de ensino propiciaria a instrução
científica e humanista, além da formação e treinamento profis-
sional, culminando no desenvolvimento da ciência, da cultura e
da pesquisa, fornecendo à sociedade profissionais do mais alto
nível.

Reflexões sobre a situação atual


Diante do cenário apresentado, pode-se concluir que as áreas
de Biblioteconomia e Ciência da Informação, apesar de todos os
pontos favoráveis que foram descritos, encontram ainda muitos
obstáculos pela frente, a fim de que tenham maior visibilidade e
maior reconhecimento pela sociedade.
Autores das respectivas áreas levantam, então, alguns pontos
para reflexão sobre este assunto:
 os currículos dos cursos – acompanhando a flexibilidade vi-
gente – deverão ser analisados, continuamente, para se aten-
der às demandas da sociedade atual;
 práticas educacionais mais modernas deverão ser mais utili-
zadas, como a da tecnologia da Educação a Distância (EaD),
no sentido de facilitar o acesso mais rápido aos conteúdos
dos cursos, e também atingir um maior número de estudan-
tes nesse país de dimensões continentais;
 o estreitamento da parceria entre a área de Biblioteconomia
e as demais áreas que lidam diretamente com o tratamento e
uso da informação deverá ser estimulado, para que a sinergia
advinda desse vínculo incida positivamente nos membros da

57. O Reuni tem como objetivo maior criar condições para ampliação de acesso e
permanência na graduação com melhor aproveitamento da estrutura física e de
recursos humanos existentes nas universidades federais. O programa estabelece
ainda diversas diretrizes, uma delas é a redução das taxas de evasão, ocupação de
vagas ociosas e aumento de ingresso, especialmente no período noturno (Fonte:
http://www.ufrj.br).

98 A formação profissional do bibliotecário: ensino de graduaçãoe de pós-graduação


sociedade brasileira, a fim de que estes se sintam inseridos
em uma verdadeira sociedade da informação.

Influenciadas por estas e outras demandas, algumas escolas


de Biblioteconomia modificaram seus currículos, mudando a de-
nominação de seus cursos de graduação em Biblioteconomia para
Ciência da Informação. Dentre elas, estão a Universidade Federal
de Minas Gerais, a Pontifícia Universidade Católica de Minas Ge-
rais, a Pontifícia Universidade Católica de Campinas, a Univer-
sidade de São Paulo (Campus Ribeirão Preto), e a Universidade
Federal de São Carlos, as quais não formam mais bibliotecários e
sim bacharéis em Ciência da Informação. A Universidade Federal
do Paraná, por sua vez, mudou seu curso para Gestão da Infor-
mação.58
No entanto, muito se discute se essa modificação não é ape-
nas na nomenclatura, e se está privilegiando a verdadeira prepa-
ração dos profissionais para atuação na sociedade do Séc. XXI,
que exige uma competência profissional ampla e que demanda
um profissional capaz de fornecer a informação certa, da fonte
certa, ao cliente certo, no momento certo e a um custo que justi-
fique seu uso.
A formação desta postura profissional – pró-ativa e criativa
– é objeto de reflexões dos docentes nas escolas de Bibliotecono-
mia, das associações de ensino e dos órgãos de classe, mas o es-
forço deve ser bem acentuado em função das mudanças radicais
que se tem enfrentado.
Vencer mais este desafio garantirá espaço social e profissional
para os bibliotecários se inserirem na Sociedade da Informação.
Entretanto, a imensidão do Brasil e as disparidades regionais
evocam a necessidade de se formar profissionais para atender às
realidades diferenciadas do País, o que se espera ser resolvido com
a implementação do curso de EaD na área, em 2010. Como já men-
cionado, esta iniciativa do MEC, Capes/UAB, CFB deverá promover
a capacitação de pessoas para atuar como bibliotecário nas mais
longínquas cidades do interior brasileiro, oferecendo oportuni-

58. O Conselho Federal de Biblioteconomia indeferiu o pedido de registro profis-


sional de bibliotecário para os formandos deste curso, na medida em que não os
considera capacitados para o exercício da profissão de bibliotecário.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 99


dades de formação a inúmeros leigos que se encontram à frente,
principalmente, das bibliotecas públicas, os quais provavelmente
não teriam possibilidade de frequentar os cursos oferecidos nas ca-
pitais.

Referências
BUNGE, M. Ciência e desenvolvimento. Belo Horizonte: Itatiaia; São Pau-
lo: EDUSP, 1980.
CASTRO, C. A. de. História da Biblioteconomia brasileira: perspectiva his-
tórica. Brasília, DF: Thesaurus, 2000.
CHRISTOVÃO, H. T. A Ciência da Informação no contexto da pós-gradua-
ção do Ibict. Ciência da Informação, Brasília, DF, v. 24, n.1, 1995.
GUIMARÃES, J. A. C. Profissionais da informação: desafios e perspecti-
vas para a sua formação. In: BAPTISTA, S. G.; MUELLER, S. P. M. (Org.)
Profissional da informação: o espaço de trabalho. Brasília, DF: Thesaurus,
2004.
MOTA, F. R. L.; OLIVEIRA, M. de. Formação e atuação profissional. In:
OLIVEIRA, M. de. (Coord.). Ciência da Informação e Biblioteconomia:
novos conteúdos e espaços de atuação. Belo Horizonte: Ed. da UFMG,
2005.
MUELLER, S. P. M. O Ensino de Biblioteconomia no Brasil. Ciência da
Informação, Brasília, DF, v.14, n.1, p. 3-15, jan./jun.1985.
SOUZA, F. das C. de. O ensino da Biblioteconomia no contexto brasileiro:
Século XX. 2. ed. rev. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2009.

100 A formação profissional do bibliotecário: ensino de graduaçãoe de pós-graduação


O perfil do profissional
e o bibliotecário gestor

“Ninguém pode construir uma reputação com base


no que ainda vai fazer” (Henry Ford).

A partir do Séc. XIX, várias associações profissionais foram se


estruturando, fazendo com que surgisse a percepção de que era
necessária a formulação e a transmissão teóricas sobre os conhe-
cimentos nas áreas específicas. Pelewski, citado por Souza (2001)
apresenta, dessa forma, a organização científica do trabalho: de
evolução da atividade humana, que passa de um estágio de ocu-
pação para um estágio de profissão; de um saber prático para um
conhecimento teórico.
Por outro lado, a crescente produção de conhecimentos cien-
tíficos e tecnológicos, nos diversos campos do conhecimento, pos-
sibilitou o desaparecimento de algumas atividades e o surgimento
de outras. Este fenômeno implica, diretamente, na formação de
novos profissionais.
As profissões também passam por uma série de eventos, até
se consolidarem e obterem o reconhecimento na sociedade. Muel-
ler (2004) analisa a rota de uma profissão, com base em estudos
de Wilensky, que constatou que alguns eventos são presentes em
todas as profissões:
 As pessoas exercem determinado trabalho e passam a se de-
dicar a ele em tempo integral;
 Faz-se necessário, então, um treinamento mais formal, que
dá margem à criação de cursos para esse fim;
 Para obter status acadêmico, esses cursos vinculam-se a de-
partamentos universitários;

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 101


 Com os cursos universitários, forma-se um corpo docente que é
determinante para a construção dos conhecimentos na área;
 Surge, então, uma associação profissional que edita revis-
tas, realiza eventos e congrega professores e profissionais
graduados;
 Há um aumento no rigor da fiscalização, para verificar se
profissionais não habilitados para aquela área estão pratican-
do as atividades concernentes à profissão;
 A profissão publica um Código de Ética, visando estabelecer
normas de conduta internas (entre os pares) e externas (para
com a sociedade).
A Biblioteconomia passou, também, por esta trajetória, bus-
cando sua identidade profissional, como se pode verificar pelas
ações realizadas nos Estados Unidos, do Séc. XIX, quando Melvil
Dewey criou a ALA e o Library Journal, e foram então fundados
os primeiros cursos na área.
Russo (2000), estudando a trajetória da profissão dos biblio-
tecários no Brasil, no transcorrer do Séc. XX, fundamentando-se
em Guimarães (1997), fixou alguns períodos históricos relevan-
tes, que influenciaram e modificaram sua atuação:
 1911  o bibliotecário erudito, de formação fortemente hu-
manista, ligado à cultura e às artes – aspecto que norteou a
criação do primeiro curso de Biblioteconomia do país – o da
Biblioteca Nacional;
 1930  o bibliotecário de formação técnica, ligado a ativida-
des de tratamento e organização de documentos – que inspi-
rou os primeiros cursos de São Paulo;
 1960  o bibliotecário ligado às entidades profissionais, in-
fluenciado pelo reconhecimento oficial da profissão como de
nível superior e a criação dos órgãos de classe;
 1970  o bibliotecário pesquisador, atuante nos cursos de
pós-graduação e acompanhando o surgimento dos primeiros
periódicos científicos na área;
 1980  o bibliotecário como agente cultural, um novo pro-
fissional diante da reformulação curricular dos cursos de Bi-
blioteconomia;
 1990  o PROFISSIONAL DA INFORMAÇÃO, uma nova terminologia,
que concebia um profissional de formação mais abrangente,

102 O perfil do profissional e o bibliotecário gestor


envolvendo o trabalho com documentos e/ou informação,
em variados contextos e com o uso das TICs;
 2000  os bibliotecários autônomos, formados para atuar
como consultores (analistas, arquitetos e gestores da infor-
mação) no ambiente flexível das organizações.

Nomenclaturas do profissional
Para muitos autores, dentre os quais Mota e Oliveira (2005), a
cada nova tecnologia de informação criada ocorrem alterações
nas rotinas das atividades em que estão envolvidas; no caso parti-
cular das bibliotecas, o uso das TICs causaram grande impacto em
sua organização e funcionamento, como já mencionado em capí-
tulo anterior. Por sua vez, essa influência repercutiu na formação
e na atuação dos bibliotecários, na medida em que estes profis-
sionais passaram a se deparar com um novo tipo de usuário, que
demanda informações mais específicas, exigindo respostas cada
vez mais precisas e em tempo muito mais curto. Esse cenário faz
com que estes profissionais se ocupem muito mais com a aquisi-
ção de conhecimentos especializados, e que busquem se capacitar
no manejo das TICs para fazer frente às tarefas de organizar, pro-
cessar, recuperar e disseminar informações, para atender, eficien-
temente, às demandas mencionadas.
Paralelamente, a sociedade passa a valorizar a informação,
de tal modo, considerando-a como insumo básico para seu desen-
volvimento. Santos (2002) descreve com clareza essa percepção
ao declarar:

Ao pensarmos que hoje o contorno da economia


é definido pela quantidade de informação possuí-
da, veiculada e disseminada, podemos identificar
a informação como matéria-prima do mundo con-
temporâneo, juntamente com as tecnologias dispo-
níveis.

Pode-se dizer que a utilização do termo “Profissional da In-


formação” – sendo usado como sinônimo de bibliotecário – co-
meça a despontar na área de Biblioteconomia quando se faz pre-

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 103


sente – tanto na literatura quanto em discussões em eventos – a
preocupação crescente com o redimensionamento de identidade
desses profissionais, que se viam impulsionados a adaptar suas
atividades ao ambiente das novas tecnologias. Eles percebiam,
também, que muitas ações deveriam ser conduzidas pelas escolas
e pelos órgãos de classe, com vistas a garantir o espaço da Biblio-
teconomia como área fundamental para o acesso à informação.
A movimentação, neste sentido, foi muito benéfica, pois fez com
que a grande maioria dos bibliotecários incorporasse em suas ro-
tinas esse novo paradigma, deixando para trás o foco na organi-
zação das coleções.
Essa discussão – sobre a nomenclatura de bibliotecário versus
“profissional da informação” e sobre as suas atribuições – há mui-
to tempo já se fazia presente em encontros da classe e na literatu-
ra que se produzia, influenciando até os órgãos governamentais,
e as agendas das associações profissionais e de ensino.
Já em 1962, na Conferência realizada no Georgia Institute
of Technology, nos EUA, sobre a formação de especialistas em
Ciência da Informação, os delegados reunidos definiram cinco ca-
tegorias de pessoal para a área de informação: os bibliotecários,
os bibliotecários especializados, os bibliotecários científicos, os
analistas de publicações técnicas e os especialistas em Ciência da
Informação. Este relato, apresentado por Shera (1980, p. 96), é
seguido do comentário de que mesmo sem se pronunciar sobre a
validade dessa classificação, ele discordava de que essas catego-
rias fossem inteiramente distintas e que as mesmas se excluíssem
mutuamente. Nesse evento o especialista em Ciência da Informa-
ção é definido como

uma pessoa que estuda e desenvolve a ciência do


armazenamento e recuperação da informação, que
idealiza novos métodos para abordar o problema
da informação e que se interessa pela informação
por si mesma.

A coleta realizada por Almeida Júnior (2000) resultou em


83 nomenclaturas propostas em textos escritos ou em palestras
proferidas na área, as quais são sugeridas para designar o perfil
mais atual do bibliotecário; dentre elas, podem ser destacadas:

104 O perfil do profissional e o bibliotecário gestor


analista da informação, gestor da informação, cibertecário, es-
pecialista da informação, provedor de informação, consultor de
informação etc.
A FID, para fazer parte dessa discussão, criou, em 1992, um
grupo de trabalho para estudo da nomenclatura do profissio-
nal da informação. O grupo foi designado como Special Interest
Group/Modern Information Professional (SIG/MIP). Como resul-
tado do trabalho desse estudo, a Federação publicou a Resolução
de Tokyo,59 que destaca que:

o setor da informação, no seu sentido mais amplo


compreende: produção, coleta, distribuição, ges-
tão, conservação e utilização da informação, sina-
lizando dessa forma a possibilidade de abertura do
campo profissional para atividades além do ciclo
documentário (SANTOS, 2000, p. 18-109).

Sociedade da informação
Os homens pré-históricos viviam da caça de animais selvagens e
da coleta de plantas e frutas fornecidas pela natureza; nesse perío-
do, a troca de experiências entre eles era incrivelmente lenta; a
revolução agrícola veio modificar esse panorama: o deslocamento
humano – com a domesticação dos animais – foi facilitado e, com
isso, a troca de conhecimentos começou a se acelerar. Muitos anos
depois, uma nova revolução surpreende o mundo – a revolução
industrial – que com as invenções das máquinas a vapor e, depois,
do telégrafo e do telefone, proporcionaram um grande aumento
na propagação das informações (HISTÓRIA..., 2005).
Depois dessas duas grandes revoluções, o homem vive a revo-
lução da informação – também chamada de revolução do conhe-
cimento – iniciada com o surgimento dos computadores pessoais,
relativamente baratos, e o surgimento das redes de comunicação

59. Representantes de organizações não governamentais na área de Biblioteco-


nomia e afins, reunidos em Tóquio, por ocasião do centenário da FID, em 1995,
assinaram o documento Resolución de Tokyo criando a Alianza Estratégica de las
Organizaciones Internacionales no Gubernamentales en Información para servir me-
jor a la Comunidad Mundial, estabelecendo que o objetivo comum dos profissio-
nais envolvidos com informação é servir à sociedade (SANTOS, 1996).

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 105


globais como a Internet, trazendo uma nova onda de transforma-
ções, que envolve a vida da sociedade contemporânea. O impacto
dessas mudanças é sentido no trabalho, na educação, no entrete-
nimento, corroborando o que Massuda (1982), aponta a respeito
do papel que a informação ocupa como o principal elemento de
produção, chegando até a modificar o comportamento das popu-
lações economicamente ativas.
Araújo e Dias (2005) relatam a pesquisa desenvolvida, em
1962, pelo economista Fritz Machlup, em seu trabalho “A pro-
dução e a distribuição de conhecimentos nos Estados Unidos”,
cuja finalidade era estudar a livre competição na sociedade norte-
americana. Machlup levantou algumas estatísticas,60 observando
a comparação custo-benefício do sistema de patentes, e a sua
relação com o sistema de Pesquisa & Desenvolvimento. O autor
denominou o conjunto de dados levantados como os da “indús-
tria do conhecimento”. Seus trabalhos influenciaram outros estu-
diosos, como Peter Drucker, que previu que, em 1970, o setor de
conhecimento iria representar a metade do Produto Interno Bruto
(PIB), dos Estados Unidos, o que realmente ocorreu.
Outro trabalho relevante consiste na pesquisa de Marc Porat,
em 1977, sobre economia da informação – analisando os custos das
atividades de informação – que serviu de base para fortalecimento
do termo Sociedade da Informação, na medida em que detectou
que os trabalhadores de diferentes ramos ocupacionais vinham se
distanciando do lado físico de suas tarefas e se envolvendo cada
vez mais com atividades baseadas na capacidade intelectual, que
pressupõe o manuseio de informações (CIANCONI, 1991).
É neste contexto que está se desenvolvendo a Sociedade da
Informação, tendo sido anunciada por vários fatos, tais como o
crescimento exponencial da literatura científica, a partir do Séc.
XIX, e a explosão bibliográfica após a Segunda Guerra Mundial.
Por outro lado, o acesso à informação para os países em de-
senvolvimento e subdesenvolvidos apresenta inúmeros proble-
mas. No caso específico do Brasil, Castro e Ribeiro (1997, p. 21),
ao refletirem sobre a realidade da inserção do país na Sociedade

60. Uma delas é que a força de trabalho comprometida com as atividades de


produção de conhecimento, em 1962, nos Estados Unidos, era de 31,6% e, se
acrescida dos estudantes de tempo integral, a taxa seria de 42,8%.

106 O perfil do profissional e o bibliotecário gestor


da Informação apontam que o que existe são Núcleos Sociais de
Informação, constituídos pelas universidades, centros e institutos
de pesquisa, na maioria localizados nas grandes capitais. Diante
disso, os autores afirmam que:

a sociedade brasileira, caracterizada historicamen-


te por alarmantes índices de desigualdades sociais,
regionais, educacionais e culturais, provavelmente,
não nos permite, no momento, generalizarmos que
estamos numa sociedade da informação.

O Programa Sociedade da Informação, lançado pelo governo


brasileiro, em dezembro de 1999, apresentava como objetivos o
fomento à utilização maciça de serviços de computação, comuni-
cação e informação, com vistas a garantir sua aplicação pela so-
ciedade, tornando-a capaz de atuar nesse novo ambiente e, com
isso, podendo elevar o país a um patamar mais competitivo no
mercado internacional.
Esse programa não teve continuidade no governo seguin-
te, que lançou mão de outras estratégias para atingir os mesmos
objetivos, mas serviu como base para se fomentar a discussão so-
bre o papel que a organização e a disseminação da informação
desempenham nas atividades econômicas do País, na qualidade
de vida dos seus cidadãos e nos seus projetos culturais.
Barreto (2000) apresenta sua visão sobre como deve ser a
Sociedade da Informação no Brasil, definindo-a como uma so-
ciedade em que as condições de acesso a serviços e à informação
sejam cada vez mais amplas para toda a população, sendo seus
benefícios utilizados, cotidianamente, pelos cidadãos.
Nesse ambiente informacional, de questionamentos e acelera-
das mudanças, está inserida uma biblioteca não mais como um sim-
ples repositório de acervos e sim como ponto de acesso a um univer-
so ampliado de fontes internas e externas (MIRANDA, 1996).

A sociedade da informação e o bibliotecário


A partir da criação dos cursos de pós-graduação, na década de
1970, a literatura estrangeira das áreas de Biblioteconomia e Ci-

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 107


ência da Informação começa a veicular o termo Sociedade da In-
formação e muitos trabalhos apresentam reflexões sobre o papel
do bibliotecário nesse contexto.
Vários autores se propõem a sugerir mudanças pelas quais
devem passar esses profissionais e uma delas recai na alteração
da nomenclatura de bibliotecário para “profissional da informa-
ção” – já mencionada anteriormente – o que por si só não leva-
ria a nenhum resultado positivo, se não viesse acompanhada de
ações mais pontuais em relação à formação dos graduandos da
área e, também, à busca de capacitação e educação continuada
dos que já se encontram no mercado de trabalho.
Refletindo sobre a função do bibliotecário na Sociedade da
Informação, Tarapanoff (2000) apresentou algumas ações que
estariam contempladas no Programa Sociedade da Informação,
relacionando-as com as habilidades necessárias ao bibliotecário
para seu pleno desenvolvimento.
 Preservar a informação – a partir do pressuposto que os con-
teúdos informacionais estarão sempre sendo produzidos,
caberá aos bibliotecários a responsabilidade de localização,
normalização, indexação, utilização de padrões, protocolos,
metadados para garantir seu acesso futuro;
 Organizar a informação para uso – em função do paradigma
da biblioteca como instituição social, esta deverá se constituir
em um organismo mediador entre os indivíduos e os conheci-
mentos que eles precisam; com isso, os bibliotecários deverão
viabilizar o acesso às fontes de informação, em qualquer tipo
de suporte, assim como para qualquer tipo de indivíduo;
 Conectar-se em redes e participar de consórcios – visando
o compartilhamento de recursos e a ampliação do acesso à
informação para seus usuários, os bibliotecários deverão se
organizar em redes, assim como participar de projetos coope-
rativos, a fim de racionalizar recursos e otimizar resultados
nas suas tarefas regulares;61

61. Como exemplos dessas redes, pode-se citar a Rede Brasileira de Bibliotecas na
Área de Psicologia (ReBAP), desenvolvida pela USP, da qual fazem parte, segundo
dados de novembro de 2009, 159 bibliotecas, que vêm dinamizando os serviços
e produtos informacionais na área de Psicologia, fazendo com que esta se torne
cada vez mais visível no meio acadêmico. Sobre os consórcios, um exemplo é o
Cruesp/Bibliotecas, consórcio que reúne 89 bibliotecas das três universidades es-

108 O perfil do profissional e o bibliotecário gestor


 Ser empreendedor – a nova sociedade irá cada vez mais pro-
por desafios aos profissionais de todas as áreas e os biblio-
tecários deverão desenvolver habilidades de filtrar – na rede
de informações extensa que se descortina à sua frente – as
informações relevantes, inovando na criação de serviços e
produtos de informação mais sofisticados;
 Trabalhar a informação, agregar valor – significa imprimir
aos produtos e serviços uma diferenciação que os torne in-
dispensáveis aos usuários, como análise de informações,
divulgação de notícias recentes, preparação de gráficos, de
percentuais, de indicadores, a fim de transformar as informa-
ções em conhecimento para seus usuários;
 Socializar a informação – como as bibliotecas se constituem
em organizações sociais sem fins lucrativos, os bibliotecários
deverão proporcionar a prestação de serviços para os indiví-
duos e para a sociedade, quer sejam de forma tangível (im-
pressos) ou intangível (eletrônicos);
 Educar para a utilização da informação62 – a sensibilização
para o uso da informação deve se constituir em um objetivo
constante da biblioteca e os bibliotecários deverão procurar
se educar e educar seus usuários a utilizar as fontes de infor-
mação, por meio das redes disponíveis, desenvolvendo um
papel de educador nesse ambiente;
 Valorizar o conceito econômico da informação – a escassez
de recursos é uma realidade em todas as unidades de infor-
mação e os bibliotecários deverão saber quando e quanto co-
brar por serviços de informação;
 Criar, pesquisar e consumir informação – com objetivo de
melhor tecer a sua rede de informações, o bibliotecário deve
sair da posição de apoio e de intermediador de informações
para a de criador e consumidor das mesmas, produzindo co-
nhecimentos e assumindo papéis mais pró-ativos (TARAPA-
NOFF, 2000).

taduais paulistas (USP, Unesp e Unicamp), com a finalidade de integrar e otimizar


seus recursos financeiros e informacionais, entre outras ações.
62. Essa atividade, que já foi chamada de alfabetização informacional, hoje é mais
conhecida como competência em informação.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 109


Frente a essas reflexões, vê-se que o que se espera dos biblio-
tecários, na sociedade da informação, é o gerenciamento eficiente
dos recursos inseridos nas unidades de informação, tendo para
isso que vencer alguns desafios, que poderão ser transpostos com
o aprimoramento contínuo e a atualização constante, para se ade-
quarem às mudanças que estão e que estarão sempre ocorrendo
na sua área de atuação.
Por sua vez, os cursos de formação desses profissionais de-
verão incorporar disciplinas complementares, as quais venham
contemplar o ensino de teorias e a vivência de práticas gerenciais,
para administrar todos os tipos de recursos existentes nas unida-
des de informação.
A Library Association (LA), da Inglaterra, identificou conteú-
dos desejáveis para compor a formação do bibliotecário, utilizando
essa classificação como critério para credenciar cursos. O primeiro
dos cinco grupos a que se refere a LA recai sobre o desenvolvimen-
to de habilidades analíticas e gerenciais a serem aplicadas na aqui-
sição e na organização de recursos e na promoção das unidades de
informação. Dentre esses conteúdos, podem ser citados: modelos
organizacionais, análise e solução de problemas; comportamento
e motivação humanos, administração financeira, profissionalismo
e códigos de conduta, administração de recursos humanos, marke-
ting, planejamento e tomada de decisões (SANTOS, 1996).
Reforçando a necessidade de se estabelecer a dinamização e
um novo enfoque para a área de Biblioteconomia, Funaro (1997,
p. 4) afirma que “o que faz uma organização crescer é a capa-
cidade de seus profissionais de gerenciar produtos e serviços”,
inserindo-se, invariavelmente, a satisfação do usuário da bibliote-
ca como ponto de partida para a ação gerencial.
A partir dessas constatações, percebe-se que os bibliotecá-
rios, se veem pressionados pela necessidade de refletir sobre o seu
fazer, sobretudo porque precisam assimilar novos conhecimentos,
para poder executar as tarefas que lhes são exigidas.

O bibliotecário gestor
O emprego de técnicas administrativas começou a merecer aten-
ção dos bibliotecários em meados da década de 1950, nos Estados

110 O perfil do profissional e o bibliotecário gestor


Unidos, quando a biblioteca passou a ser conhecida como um re-
curso comunitário (BARBALHO et al., 199-?).
O ambiente informacional, nessa época impregnado pelas
questões relativas à organização, disseminação e uso da informa-
ção, quase sempre disponibilizadas em suportes impressos, inclui
– a partir do final do Séc. XX – tópicos mais complexos como cus-
tos, orçamentos, eficácia e eficiência organizacional, qualidade
nos serviços, liderança, gestão de coleções virtuais, tomada de
decisão, dentre outros. Atuar diante desses temas se configura em
um grande desafio para a administração das unidades de infor-
mação. Mesmo sendo consideradas instituições sem fins lucrati-
vos, essas unidades têm que se valer de práticas administrativas
para lidar com a escassez de recursos e a manutenção do atendi-
mento eficaz.
Oliveira (2000) elaborou um levantamento sobre a impor-
tância das habilidades gerenciais na formação dos bibliotecários.
O autor citou Rooks, o qual argumenta que o sucesso dos dire-
tores de bibliotecas depende muito mais de suas habilidades ge-
renciais do que de um conhecimento aprofundado em Bibliote-
conomia, recomendando estudos de técnicas como planejamento
estratégico e marketing. Outro trabalho citado por Oliveira (Id.)
foi o realizado por Pitt, que identificou o perfil de 67 diretores de
bibliotecas “one-person-library”.63 Esses profissionais indicaram
as tarefas administrativas como sendo a primeira da lista das ta-
refas que realizam regularmente. Uma outra afirmação que Oli-
veira (Id.) apresenta é a de Gessesse, autor que aponta que os
bibliotecários na era da informação precisam assumir o papel de
líderes, para preparar seu pessoal e sua comunidade de usuários
para conviver com esta “nova era”, assegurando o acesso à infor-
mação a um segmento maior dessa comunidade. Com base nesse
levantamento a respeito do estado da arte sobre o tema, Oliveira
(Id.) desenvolveu uma pesquisa, cujo universo foi constituído por
63 diretores de unidades de informação, do Estado de São Paulo.
Os dados foram coletados por meio da aplicação de questionários,
procurando identificar correlações entre aspectos de trabalho e

63. Bibliotecas que contam com apenas um profissional bibliotecário em seus qua-
dros.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 111


aspectos gerenciais relevantes na administração das unidades de
informação.
A pesquisa demonstrou, entre outros resultados, que os ge-
rentes das unidades de informação necessitam desenvolver com-
petências gerenciais para que sua função de líderes seja realizada
com êxito, aliando a isso a habilidade de lidar com ambiguidade
e atuar com flexibilidade e criatividade.

As bibliotecas e a administração
Na tentativa de atender a essa recomendação, apresentam-se al-
guns fundamentos teóricos da Administração Científica, sob a óti-
ca da racionalização do trabalho no mundo da produção, para de-
pois compará-los com a administração das bibliotecas. Este exer-
cício serviu para se estabelecer analogias com as atividades da
biblioteca e do bibliotecário, ao longo dos diferentes períodos.
Ao estudar as diversas fases pelas quais passa a Administra-
ção Científica, Valle (2005) discrimina quatro fases distintas:
A primeira geração de racionalização da produção foi funda-
mentada em Frederick Winslow Taylor (1856-1915)64 e em seus
sucessores – clássicos da Engenharia de Produção – que queriam
substituir o modelo gerencial então existente por um outro – me-
canicista – que julgavam mais adequado.
Os empresários da época pregavam que a melhor organiza-
ção do trabalho era aquela que refletia a maneira de ver as coisas
pelo lado dos proprietários e gerentes, tidos como indivíduos su-
periores, inclusive moralmente.
A segunda geração de racionalização da produção surge no
final dos anos 1920 e início dos anos 1930, ressaltando a impor-
tância central das relações entre empregadores e empregados e
a necessidade de tratá-las segundo o enfoque da Psicologia, dis-
ciplina que nascia naquela ocasião. Pensava-se que a melhoria
das condições de trabalho traria maior produtividade, o que não
ocorreu. Nessa ocasião, a Psicologia começava a tomar vulto nos
Estados Unidos e vislumbrou-se a possibilidade de se ter acesso a

64. Taylor fundou a chamada Escola de Administração Científica, preocupada em


aumentar a eficiência da indústria por meio da racionalização do trabalho ope-
rário.

112 O perfil do profissional e o bibliotecário gestor


uma área desconhecida do ser humano – o inconsciente. Nascia,
assim, a Escola das Relações Humanas, defendida por Mary Parker
Follet (1868-1933) que pregava que qualquer gerência teria que
compreender as pessoas, os grupos e a comunidade onde estava
situada a empresa. Essa gerência deveria propiciar a integração
das pessoas e coordenar suas atividades.
A terceira geração de racionalização da produção introduziu
o modelo japonês, sendo caracterizada pela preocupação com o
Controle da Qualidade.
Na primeira geração, esse controle realizado pelas empresas
estava mais voltado para a qualidade do trabalho dos empregados
do que para a qualidade de seus próprios produtos. Dava-se ên-
fase ao controle dos resultados quantitativos dos sistemas produ-
tivos, a partir da capacidade das pessoas em atender aos padrões
de trabalho estabelecidos.
Com relação às áreas administrativas, os japoneses deram o
adequado tratamento às relações interpessoais e à educação para
a qualidade; além de incorporarem mais conceitos da teoria com-
portamental, desenvolveram técnicas para realizar o desdobra-
mento da função qualidade e valorizaram o trabalho em equipe.
Hoje, generaliza-se a promoção por desempenho e o recrutamen-
to em outras empresas. O aperfeiçoamento contínuo e a formação
profissional interna dependem da estabilidade dos trabalhadores,
porque significam acumulação de conhecimentos específicos à
empresa.
Na década de 1980, surgem novas demandas externas para
os gerentes de produção – a exigência, pelos consumidores, de
novos padrões de qualidade e a incorporação de um mínimo cui-
dado com a preservação do meio ambiente, por influência do mo-
vimento social em prol da Ecologia (condições de trabalho versus
qualidade versus meio ambiente).
Surge, então, a quarta geração no mundo do trabalho, vol-
tada para a racionalização do conhecimento em busca da ação
comunicativa.
Segundo Valle (2005), as grandes transformações ocorridas
no Mundo da Produção tiveram origem fora das fábricas, foram
provenientes do universo social, ou seja, do Mundo da Vida. Os
espaços do trabalho, da economia, da administração etc., fazem

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 113


parte do Sistema, no qual o dinheiro e o poder são os principais
elementos. O Mundo da Vida é representado pelo espaço da cul-
tura, das artes, da educação, da família etc., onde as ações dos
sujeitos são coordenadas pela linguagem e

a diversificação das relações sociais no Mundo da


Produção é cada vez maior e, consequentemente,
[maior] o aumento da complexidade da tomada de
decisão nas empresas. Cada vez mais, os tomadores
de decisão não se restringem apenas aos proprietá-
rios e aos gestores. Clientes, fornecedores, órgãos
técnicos etc., demonstram um peso crescente nas
decisões no Mundo da Produção e as empresas vêm
sendo pressionadas a demonstrar seu comprometi-
mento com o meio ambiente, com a ética e com o
desenvolvimento social (VALLE, 2005, p.69).

Dentro dessa perspectiva, as organizações têm buscado uma


cadeia de produção mais flexível para se adaptar rapidamente às
mudanças tecnológicas, de mercado etc., procuram, também, re-
crutar trabalhadores mais qualificados e capazes de tomar micro-
decisões. O desenvolvimento de competências, nesse sentido, é
fundamental para o compartilhamento e para o desenvolvimento
de conhecimentos.
Por muito tempo, a administração das bibliotecas seguiu uma
linha compatível com a da primeira geração descrita por Valle
(Id.), comparadas com as fábricas da era Ford, onde as tarefas de
tratamento da informação passavam de um setor a outro, sendo o
bibliotecário visto como um especialista naquele setor, a maioria
não se envolvendo com o ambiente em geral e nem com o produ-
to final do seu trabalho.65
Como na história da Administração Científica, a biblioteca
passa pelas demais gerações de racionalização do trabalho, com a
preocupação dos estudos de usuários e com a aplicação dos círcu-
los de qualidade, para avaliação de seu desempenho.

65. Nessa época, costumava-se estudar o tratamento técnico dos itens de uma
biblioteca com base no modelo denominado de “cadeia do livro”, compatível com
as ideias do Fordismo. Seguindo este modelo, o livro passava de um setor para
o outro, sem que o bibliotecário – especialista em determinada tarefa – tivesse
conhecimento da tarefa do outro.

114 O perfil do profissional e o bibliotecário gestor


No Séc. XXI, pode-se dizer que a biblioteca se encontra na
quarta geração da racionalização do trabalho, preocupada com
o desenvolvimento de competências dos bibliotecários, os quais
atuam como gestores, o que corresponde a organizar, comandar,
prever, coordenar e controlar todas as atividades ligadas a essa
unidade de informação. Assim como no Mundo da Produção, as
atividades das bibliotecas são organizadas visando atender às ex-
pectativas dos atores do Mundo da Vida – seus usuários.
Para isso, esses profissionais deverão dispor de conhecimen-
tos técnicos e administrativos que lhes permitam manter diretrizes
e liderança em suas atividades gerenciais, traçar metas, estabele-
cer planos e políticas etc. Sua função requer permanentemente a
tomada de decisões no que se refere a estabelecer objetivos e or-
ganizar recursos para atingi-los, bem como interagir com pessoas
se utilizando de motivação e da comunicação.
Barbalho e outras (199-?) entendem que para a biblioteca
se tornar um ambiente de transformação, o gerente deve ter a
capacidade de pesquisar, liderar, planejar, ser avaliado por outros,
e se autoavaliar, de modo a ter condições de criar alternativas im-
pactantes com os recursos que possui. Isso evidencia a necessida-
de do gestor em agir criativamente frente ao cenário que deverá
conhecer.
Diante de toda essa exposição, vê-se que a inserção do biblio-
tecário na Sociedade da Informação e, portanto, neste mundo do
trabalho, não é tarefa impossível; entretanto, faz-se necessário
que este profissional acompanhe o estágio de desenvolvimento
da sociedade, no que diz respeito aos avanços tecnológicos e às
questões de natureza política, como o acesso à informação como
direito do cidadão e, principalmente, que se capacite como um
bibliotecário gestor em relação a todos os recursos que integram
uma unidade de informação.
Autores que estudaram o perfil desse profissional apontam
que ele pressupõe um novo padrão de referência, que envolve
preparação básica sólida, ou seja, boa formação em nível de gra-
duação aliada à busca por reunir conhecimento interdisciplinar,
habilidades gerenciais, engajamento em atividades de pesquisa,
habilidade de comunicação, especialização, habilidades intelec-
tuais, além de atitude ética.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 115


A respeito das competências profissionais, Marshall e outros,
citado por Santos (2000), listam uma série de quesitos necessá-
rios para o bom desempenho do bibliotecário, a saber: estar com-
prometido com a excelência da prestação de serviços, aceitar de-
safios e oportunidades de crescimento dentro e fora das unidades
de informação, saber trabalhar em equipes, ser líder, ser flexível e
positivo nesses tempos de mudança contínua.
Russo (2000), em seu estudo sobre o perfil do profissional
da informação nas bibliotecas universitárias, apresenta algumas
recomendações que permanecem válidas, hoje, servindo como
pontos de reflexão para os atuais profissionais da área:
 Deve ser dada grande ênfase à educação continuada, pois a
aprendizagem permanente é fundamental, sob pena de se
cair na autoexclusão profissional, por falta de atualização,
tanto no que se refere a conhecimentos, quanto ao acompa-
nhamento das inovações tecnológicas;
 A capacitação em técnicas gerenciais deve se constituir em
um objetivo constante, para atuar corretamente diante das
necessidades de tomada de decisão;
 As facilidades com os computadores e seus aplicativos devem
ser dominadas, a fim de poder adequar melhor os produtos e
serviços às necessidades de seus usuários;
 A participação em redes deve ser estimulada, visto que essa
deverá ser a saída para se aumentar o grau de satisfação dos
usuários, minimizando os custos dos investimentos;
 O ingresso em cursos de pós-graduação, tanto em nível de
especialização, como de mestrado e de doutorado, deve ser
outro objetivo dos profissionais, pois no Séc. XXI as disputas
de mercado estarão mais acirradas e só os mais preparados
poderão competir em condições de conseguir um posto de
destaque na Sociedade da Informação.

Conclui-se que para se transformar em um gerente efetivo,


os bibliotecários devem priorizar – por toda a sua trajetória pro-
fissional – a formação de habilidades e conhecimentos para o
desempenho das tarefas gerenciais nas unidades de informação,
como as de liderança e de empreendedorismo, que são e serão
cada vez mais necessárias.

116 O perfil do profissional e o bibliotecário gestor


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118 O perfil do profissional e o bibliotecário gestor


O mercado de trabalho e as
perspectivas da profissão

“Podemos caminhar sem pressa. Mas nunca cami-


nhar para trás” (Abraham Lincoln).

O mundo do Séc. XXI, caracterizado por aceleradas e intensas


mudanças e inovações no campo científico e tecnológico, afetou
diretamente o processo de trabalho e as profissões, fato que veio
influenciar fortemente as políticas de educação e formação dos
profissionais (BANDEIRA; OHIRA, 2000).
A economia globalizada, as inovações tecnológicas, os sofis-
ticados meios de comunicação, que levaram à criação do espaço
virtual, exigem dos trabalhadores um novo olhar para sua qualifi-
cação, que passa por uma boa formação geral e uma grande base
tecnológica. Não basta mais que o trabalhador saiba “fazer”, é pre-
ciso também “conhecer” e acima de tudo “saber aprender” (Id.).
A área de Biblioteconomia e seus profissionais, que também
foram afetados por essas transformações, estão atentos a esse am-
biente externo, a fim de enfrentarem as ameaças e aproveitarem
as oportunidades que lhes forem apresentadas.
Com esse objetivo, muitos estudos sobre o mercado de tra-
balho do bibliotecário vêm sendo realizados, no Brasil, desde a
década de 1970, com a finalidade de analisar esse mercado em
vários estados brasileiros.
Exemplos desses estudos são os de Polke et al. (1977), de
Suaiden (1981), de Robredo et al. (1984), de Botelho e Corte
(1987), de Nastri (1990) e de Modesto (1997), quase todos vi-
sando promover maior adequação dos currículos dos cursos exis-
tentes ao mercado de trabalho.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 119


Além desses estudos, Bandeira e Ohira (2000) relacionam
outras pesquisas, como a realizada por Souza e Nastri (1996),
sobre o mercado de trabalho no interior do Estado de São Paulo,
acompanhado pela de Souza (1996), que analisou o perfil pro-
fissional dos bibliotecários empregados na cidade de São Paulo.
Pode-se citar, ainda, o trabalho de Marengo (1996), que focalizou
a questão da qualificação da mão de obra na sociedade da infor-
mação e seus efeitos sobre o mercado de trabalho. Este tipo de
pesquisa concorre, também, para que se conheçam as expectati-
vas dos empregadores em relação aos profissionais que desejam
admitir em suas organizações. Muitos deles são realizados pelas
Escolas de Biblioteconomia ou pelos órgãos de classe para que
os cursos venham formar, ou capacitar profissionais já formados,
com vistas a permitir sua inclusão mais adequada no mercado de
trabalho.

O mercado de trabalho e o ensino de Biblioteconomia


As observações sobre as transformações que envolvem o mercado
de trabalho, atreladas às crescentes exigências dos empregadores
por profissionais capazes de propor soluções rápidas e eficien-
tes para problemas cada vez mais imprevisíveis, exigem um novo
modelo de formação acadêmica, que demanda o estabelecimento
de uma sintonia entre o ensino e as demandas desse mercado de
trabalho.
As escolas de Biblioteconomia, instadas pela sociedade e pe-
las entidades de classe, têm buscado a renovação dos currículos
dos seus cursos, a fim de compatibilizarem as condições do mer-
cado de trabalho do bibliotecário com a sua formação, com o in-
tuito de promover a absorção plena desses profissionais.
O mercado de trabalho dos bibliotecários, historicamente, se
encontra delimitado desde a Antiguidade, quando esses profis-
sionais já se ocupavam com a preservação dos registros informa-
tivos, na forma de tabuletas de argila, rolos de pergaminho ou
folhas de papiro.
Os primeiros bibliotecários a atuarem, no Brasil, foram os
que vieram com a Família Real Portuguesa, junto com a Real Bi-
blioteca d’Ajuda, que mais tarde deu origem à BN: o frei Gregório

120 O mercado de trabalho e as perspectivas da profissão


José Viegas e o padre Joaquim Dâmaso; estes voltaram para Por-
tugal, em 1821 e 1822, respectivamente.66
Porém, o cargo de bibliotecário só começa a ter maior conhe-
cimento quando são realizados os primeiros concursos para suprir
postos na BN; em 1879, coube o primeiro lugar ao historiador
Capistrano de Abreu, mas o mesmo não foi chamado de biblio-
tecário e sim de “oficial de biblioteca”; já no concurso de 1915,
Manuel Bastos Tigre, passa em primeiro lugar para bibliotecário
do Museu Nacional, com a tese sobre a Classificação Decimal de
Dewey, sendo, então, reconhecido como primeiro bibliotecário
aprovado por concurso no Brasil.67
No entanto, para Stumpf (1987), o bibliotecário passa, de
fato, a ser identificado como elemento integrante da força de tra-
balho somente no início do Séc. XX, quando da criação do curso
de Biblioteconomia, oferecido pela BN, no Rio de Janeiro.
A partir dessa data, o profissional começa a ser absorvido
pelo mercado de trabalho, incipiente na época, e, principalmente,
representado pelas instituições de Serviço Público.
Com o reconhecimento da profissão, como sendo de nível
superior, na década de 1960, e a promulgação da Lei 4.084, de
30 de junho de 1962, que rege a profissão, este mercado foi se
ampliando e diferenciando suas opções.

Conceituação de mercado de trabalho


O mercado de trabalho pode ser definido como o conjunto de
relações existentes, em dado momento, entre compradores e ven-
dedores de trabalho, enfatizando-se, neste contexto, dois elemen-
tos: a oferta e a procura (KRUEL, 2006).
Para o autor, a oferta se constitui na quantidade de força de
trabalho ou mão de obra que se apresenta disponível em um de-
terminado período de tempo e a procura, a quantidade de traba-

66. Tem-se notícia, depois, do primeiro trabalho na área de Biblioteconomia, rea-


lizado pelo Irmão Antonio da Costa – bibliotecário nascido em Lion, na França
– que catalogou por autor e matéria todos os livros da biblioteca iniciada com o
acervo do Padre Manuel da Nóbrega, que se transformou na Biblioteca do Colégio
dos Jesuítas, em Salvador, Bahia.
67. Por esse e outros motivos, o Dia do Bibliotecário, no Brasil, é comemorado na
data de seu aniversário: 12 de março.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 121


lho que, no decorrer deste mesmo período de tempo, está dispo-
nível, ou para a qual se necessita de força de trabalho por uma
determinada remuneração.
Na visão de Cunha (1977), uma profissão existe porque há
uma necessidade social a ser atendida e, ao constatar esta neces-
sidade, seja pela divisão do trabalho, seja pelo tipo de organiza-
ção, a sociedade devolve à profissão o seu reconhecimento pelo
preenchimento de tal lacuna e isto se pode dar pela elevação do
seu status ou do nível salarial.
Mercados de trabalho refletem sempre o contexto econômico
e social em que se inserem e o mercado de trabalho do bibliotecá-
rio não poderia ser diferente. A década de 1990 foi marcada por
fenômenos que afetaram bastante as características do mercado
do bibliotecário, tradicionalmente muito ligado à instituição fí-
sica da biblioteca e ao tratamento de coleções de documentos
impressos.
As profundas mudanças que ocorreram na sociedade, muitas
delas provocadas pelas TICs, ou pelo fenômeno da globalização
econômica, social e cultural, provocaram o surgimento de novos
postos de trabalho que passaram a ser desempenhados por dife-
rentes tipos de profissionais, que se viram envolvidos com a pres-
tação de serviços de informação (BAPTISTA, 1998).
Essa problemática de “disputa” de mercado de trabalho en-
tre o bibliotecário e outros profissionais é entendida por Souza e
Nastri (1996) como resultado da inexistência de uma política bi-
bliotecária séria e efetiva, de âmbito nacional, que trouxesse mais
visibilidade às suas funções. Corroborando com esse argumento,
Souza (1987) acrescenta ainda as desigualdades de condições
das bibliotecas brasileiras e as diferentes condições de trabalho
dos bibliotecários que atuam neste mercado. Uma saída para esta
situação seria uma ação, em nível nacional, que contasse com a
participação de profissionais da área e da sociedade, para assim
poder legitimar a atuação dos bibliotecários para com a popula-
ção, viabilizando, assim, que a profissão se tornasse conhecida e
valorizada pelo público.
Para Souza e Nastri (1996), que realizaram estudos sobre o
mercado do profissional do interior paulista, os cursos de gradua-
ção em Biblioteconomia apresentaram muitas limitações: os cur-

122 O mercado de trabalho e as perspectivas da profissão


rículos ainda não refletiam um consenso quanto ao profissional
que desejavam formar; ainda era dada muita ênfase aos aspectos
técnicos da profissão; os professores careciam de atualização; o
nível dos alunos que ingressavam nos cursos de graduação era
cada vez mais baixo, assim como o interesse pelo curso.
Em relação às oportunidades profissionais, algumas pesquisas
sobre mercado de trabalho do bibliotecário, realizadas na década
de 1990, descritas por Baptista e Mueller (2005), mostraram a
diversidade de postos de trabalho, para este profissional, compre-
endendo serviços de documentação, comunicação e informação,
cultura e lazer, educação, pesquisa, tecnologia da informação,
planejamento e política.
Dentre esses estudos, destaca-se o de Maranhão (1994), que
pesquisou o mercado de trabalho do Rio de Janeiro, tendo em vis-
ta a reformulação do currículo de Biblioteconomia de 1980, con-
cluindo que as mudanças e tendências observadas nesse mercado
devem resultar em novos conceitos de uso da informação e que
o bibliotecário se constituirá em um profissional imprescindível,
nesse setor, na medida em que se capacitar, continuamente, para
se ajustar aos novos paradigmas em relação a serviços e conceitos
de informação.
Outra pesquisa enfatizada é a de Tarapanoff (1997), que pro-
curou identificar o perfil do profissional da informação, frente às
novas tecnologias, por meio de respostas a questionários aplica-
dos a pessoas que atuavam no serviço Comut, oferecido pelo Ibict.
Nesse estudo, a autora aponta que, a partir da década de 1990,
ocorreram mudanças que trouxeram amplas consequências nos
ambientes social e econômico, nas estratégias, na estrutura e na
gerência das unidades de informação. Tarapanoff argumenta e
observa que a sociedade está cada vez mais dependente da infor-
mação, entendendo que isso poderá contribuir para uma abertura
do mercado de trabalho do bibliotecário e para o reconhecimento
do papel das bibliotecas e, consequentemente, desse profissional.
Conclui o estudo apontando que essa ampliação de perspectivas
só se concretizará se esse profissional conseguir adequar-se às no-
vas demandas.
Em todos estes estudos, o mercado de trabalho descrito era
composto por diversos tipos de organizações, que atuavam em

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 123


áreas variadas. Mas, ao mesmo tempo, esses autores identifi-
caram o bibliotecário típico como um profissional que investia
pouco em sua própria atualização, despreparado para enfrentar
desafios tais como os provocados pela evolução da tecnologia e
pela crescente globalização.
Análises mais recentes sobre a atuação profissional e o mer-
cado de trabalho, que consideraram cenários de restrições eco-
nômicas crescentes, visualizam um mercado futuro onde seriam
imprescindíveis habilidades gerenciais, capacidade para tomada
de decisões, negociação e comunicação – habilidades típicas de
um empreendedor.68
Com base nesses estudos, constata-se que os cursos de forma-
ção profissional, responsáveis pela capacitação de seus forman-
dos, devem se pautar nas análises efetuadas e incorporar em seus
programas conteúdos adequados para alterar estas situações.
Como visto, em capítulo anterior, desde o final da década de
1980 ocorre uma efetiva discussão sobre a eficiência e a adequa-
ção das estruturas curriculares dos cursos de graduação; nestas
discussões estão incluídas reflexões sobre o perfil do aluno que
procura a universidade, considerando que este também se modi-
ficou, pois o aluno não está apenas interessado no status universi-
tário, procura a obtenção de qualificações que o diferencie dentre
os profissionais a serem absorvidos pelo mercado.
As preocupações com essa qualificação precisam ir além da
capacitação para os novos papéis trazidos pela tecnologia; as
responsabilidades sociais – consideradas inerentes à missão do
bibliotecário – não podem ser descuidadas pelos cursos de forma-
ção profissional. A conscientização sobre a importância do papel
desse profissional na sociedade deve ser vista como meta priori-
tária dos programas educacionais; para isso, atividades como a
formação do hábito de leitura e a disseminação de informações
utilitárias, que ajudam na solução dos problemas do dia a dia,
como moradia, emprego, finanças domésticas, educação, direitos
civis etc. devem se constituir em ações com as quais o bibliotecá-

68. Empreendedor – tipo de comportamento encontrado em indivíduos, que se


caracteriza pela necessidade de inovar, de desenvolver uma nova ordem, con-
vertendo um produto/serviço antigo em algo novo (DRUCKER, 1985 apud MEN-
DONÇA, 1992).

124 O mercado de trabalho e as perspectivas da profissão


rio deve se envolver para demarcar a importância de sua atuação
como agente social.
A sintonia entre o ensino do profissional e o seu mercado de
trabalho é uma meta constante a ser buscada, mesmo sabendo
que essa interação é de difícil materialização.
Nessa relação, de um lado encontra-se a universidade, que
apresenta como funções principais a geração de novos conheci-
mentos e a formação de profissionais qualificados para atender
não só às demandas de mercado, mas também para interagir no
meio social visando promover o desenvolvimento integral da co-
munidade. Do outro lado, existe o mercado que apresenta de-
mandas, por muitas vezes irreais, e que não contribuem para uma
possível solução da questão e que demonstram quase sempre um
desconhecimento das funções e dos objetivos da aprendizagem
de nível superior.
Para melhorar essa situação, faz-se necessário que ambas as
partes se mobilizem para procurar atingir seus objetivos: a uni-
versidade deve procurar se integrar diretamente à comunidade,
planejando as atividades, o ensino e os currículos de seus cursos
de acordo com os objetivos e necessidades da coletividade. Além
disso, deve orientar os futuros profissionais frente à realidade do
mercado profissional, de acordo com a profissão escolhida.69
Por sua vez, os representantes do mercado devem buscar es-
clarecimentos sobre que profissionais estão habilitados para exer-
cer as tarefas que têm interesse em desenvolver.
A monitoração do mercado de trabalho tem então duplo
objetivo: o contínuo aprimoramento dos cursos para a adequação
da profissão às exigências desse mercado e a capacitação para
atuação profissional sob o ponto de vista das responsabilidades
sociais da profissão.

69. Exemplo de iniciativa dessa natureza pode ser visto com os eventos que a
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) vem realizando, desde 2004, sob
o nome de “Conhecendo a UFRJ”, os quais têm reunido estudantes de nível médio,
das escolas do Estado, que estão definindo suas escolhas para ingressar nos cursos
de graduação. Esse tipo de evento tem o objetivo de levar aos jovens as informa-
ções sobre os cursos que a Universidade oferece, por meio de palestras, divulgação
de material impresso etc., a fim de melhor direcionar as escolhas desse público.
No ano de 2009, cerca de 12.000 jovens participaram do evento.

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 125


Segmentação do mercado de trabalho do bibliotecário
Valentim (2000) identifica o mercado de trabalho do bibliotecá-
rio, segmentando-o em três grandes grupos: mercado informacio-
nal tradicional; mercado informacional existente não ocupado;
mercado informacional – tendências.
O primeiro grupo – mercado informacional tradicional – é
representado por segmentos bastante conhecidos pelos profissio-
nais e pela sociedade, como as bibliotecas públicas, que deveriam
se constituir em um mercado bastante consolidado. No entanto,
várias distorções ocorrem neste segmento, uma delas é que com
a ausência de boas bibliotecas escolares no sistema educacional
brasileiro, a biblioteca pública acaba preenchendo essa lacuna, o
que resulta em um desvio no desempenho de serviços inerentes às
suas finalidades. Outra distorção grave é a da colocação de leigos
à frente desses postos de trabalho, por total ignorância dos repre-
sentantes dos poderes públicos sobre as reais atividades que devem
ser desenvolvidas nessas unidades de informação, entendendo que
qualquer pessoa possa desempenhar as funções exigidas nesse seg-
mento. Essas distorções se refletem diretamente na sociedade que
não reconhece o valor da biblioteca pública, muitas vezes não apro-
veitando os benefícios que essas instituições oferecem.
As bibliotecas escolares constituem outro segmento do pri-
meiro grupo e vêm atuando, no país, com problemas estruturais
sérios. Dentre eles, destacam-se a falta de interesse político nes-
se segmento, constatado pelos baixos salários aplicados pelo go-
verno aos profissionais que atuam nessas unidades. A biblioteca
escolar enfrenta, também, o problema de pessoas não capacita-
das70 ocuparem os espaços dos bibliotecários, fazendo com que a
sociedade – sem saber que formação tem o profissional que está
fazendo esse atendimento – deprecie a imagem do bibliotecário,
pela prestação de serviço inadequada.
Como resposta a esses problemas, o Conselho Federal de
Biblioteconomia lançou, em 2009, o Programa Mobilizador das
Bibliotecas Escolares, com a finalidade de que sejam desenvol-
vidas ações, em todo o território nacional, para resgatar a im-

70. Como exemplo, pode-se citar: professores afastados da sala de aula por pro-
blemas de saúde e, ainda, pessoal de apoio, como merendeiras, faxineiras etc.

126 O mercado de trabalho e as perspectivas da profissão


portância desse segmento para a sociedade e para os próprios
bibliotecários.
As bibliotecas universitárias também se constituem em um
mercado consolidado, com grande quantidade de profissionais,
tendo conseguido atuar de forma coerente aos seus objetivos,
apesar dos problemas orçamentários de suas instituições. Nessa
questão, cabe mencionar que esse segmento passa por avaliações
constantes do MEC, visando ao credenciamento dos cursos ofe-
recidos no país, fazendo com que os dirigentes invistam recursos
regulares na sua manutenção e atualização.
As bibliotecas especializadas – entendidas por Valentim
(2000) como as bibliotecas dos institutos de pesquisas e das
empresas públicas ou privadas – também se constituem em um
mercado consolidado que reúne, igualmente, um número con-
siderável de profissionais; porém, sua localização distribui-se
muito mais nas regiões metropolitanas. No caso das empresas,
qualquer turbulência financeira repercute nas verbas destinadas
às suas bibliotecas, afetando diretamente acervos e pessoal. Esta
instabilidade demonstra a pouca importância que os empresários
dão aos serviços informacionais. Diferentemente, os institutos de
pesquisas, além de contarem com quadro de pessoal mais elevado
do que as empresas, costumam valorizar os serviços oferecidos,
buscando investir mais e mais recursos nas suas bibliotecas.
Os centros culturais – uma espécie de biblioteca pública mo-
derna – têm uma proposta diferente da biblioteca pública tra-
dicional, atuando em parceria com a área de Museologia, com
as áreas de Cinema, e Teatro, oferecendo ao público atividades
culturais, de lazer e entretenimento. Não empregam muitos pro-
fissionais e se concentram, também, nos centros urbanos, onde é
maior a demanda por seus serviços.
Os arquivos e museus também fazem parte deste segmento,
possuindo quase sempre em sua estrutura uma biblioteca, mas
empregam um pequeno número de bibliotecários e se concen-
tram, também, nos grandes centros urbanos.
O segundo grupo – mercados informacionais existentes e não
ocupados – tem como exemplo grande parte das bibliotecas esco-
lares e públicas, que apesar de se constituírem em um mercado
tradicional, correspondem também a espaços não ocupados, visto

Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação 127


que em sua maioria são preenchidos por profissionais não biblio-
tecários.71
Outros exemplos desse grupo são as editoras e as livrarias,
que se caracterizam como mercados existentes, mas muito pouco
ocupados por bibliotecários, que podem atuar nas primeiras em-
pregando seus conhecimentos de normalização e de editoração
científica e, nas últimas, no tema de desenvolvimento de coleções,
bem como na recuperação dessas coleções para a clientela. Esse é
um segmento do mercado que se encontra em franco crescimen-
to, com a criação da figura do “consultor literário”, que é uma
espécie de bibliotecário de referência, o qual pode atuar junto ao
cliente, oferecendo-lhe obras de interesse real e/ou potencial.72
É importante ressaltar que o emprego de bibliotecários nas
empresas privadas pode ocorrer mesmo que elas não possuam
uma biblioteca estruturada; existem oportunidades de ocupação
nos seus setores de informática, de planejamento estratégico, ou
outros, pois os bibliotecários poderão suprir os demais membros
desses setores com informações relevantes para que as empresas
tenham maior competitividade em seus negócios.
Também se apresentam como segmentos de mercado não
ocupado os provedores de Internet, os bancos e bases de dados
eletrônicos, pois os bibliotecários são capacitados para organizar,
processar e disseminar as informações contidas em seus sites, de
forma eficiente e eficaz, uma vez que estas tarefas são inerentes
à sua formação.
No seu estudo, Valentim (2000) ainda aponta que nesse se-
gundo grupo pode-se perceber um crescimento na atuação do
bibliotecário como consultor, profissional autônomo ou mesmo
profissional terceirizado, mas esta ainda é uma posição muito
acanhada. Exemplos de profissionais bibliotecários que desempe-
nham papéis mais arrojados neste tipo de mercado existem, mas
são em pequeno número.73

71. Os Conselhos Regionais, em número de 15 no país, fiscalizam o exercício da profis-


são de bibliotecário, punindo os leigos que estiverem exercendo as funções privativas
desse profissional, assim como os empregadores responsáveis pelo exercício ilegal.
72. No Brasil, as Livrarias Saraiva e Siciliano têm se colocado na vanguarda desse
mercado, que já está sendo ofertado aos bibliotecários.
73. Nessa situação, pode ser citada a empresa Datacoop, dirigida por bibliotecá-
rios, a qual além de atuar como cooperativa de profissionais, prestando serviços

128 O mercado de trabalho e as perspectivas da profissão


O terceiro grupo apresentado no estudo citado – mercado
informacional: tendências – pode ser entendido como um merca-
do potencial para o bibliotecário, que vai exigir do mesmo uma
atuação muito mais ousada, fazendo com que esse profissional se
disponha a trabalhar em qualquer posto de trabalho que se ocupe
com a criação, o gerenciamento e o uso da informação.
De acordo com Valentim (2000), para atuar nesse novo nicho
de mercado, com qualidade e competência, o bibliotecário deve
procurar ser mais observador, atuante, flexível, dinâmico, ousado,
integrador, pró-ativo e, principalmente, ter espírito empreende-
dor, mais voltado para o futuro, devendo buscar capacitação con-
tínua, uma vez que o cenário é mutante e dinâmico.

Perspectivas para o bibliotecário


Um fato que se configura como relevante no contexto atual do
mercado de trabalho dos bibliotecários é que eles estão cientes de
que outros profissionais estão ocupando seus postos – não só no
ambiente prospectivo como até mesmo no convencional – e que,
por esse motivo, devem lutar pela reversão desta situação, mas
não por força de uma lei que lhes dá reserva de mercado, e sim
porque esse mercado valoriza sua capacidade e competência no
desempenho das atividades que lhes são confiadas.
Acreditar na importância e no valor social da profissão, as-
sim como estar disponível para a atuação voluntária nos órgãos de
classe, são pontos considerados indispensáveis para que os biblio-
tecários possam ser absorvidos pelo mercado de trabalho que se
apresenta com perspectivas cada vez mais desafiadoras no campo
da geração, organização, disseminação e uso da informação.

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