Foz do Iguaçu – PR
2014
1
CARICATURA, HENFIL, VANGUARDA E A ARTE ENGAJADA
3
Campanha civilista com vistas a posicionarem-se nos debates políticos travados
naquele contexto. (Silva, L. F. P., 2012)
Pesando que as vanguardas modernistas tem oposição estética e ideológica
ao passado acadêmico, é fácil pensar no artista do fim de século sendo esquecido
ou negado pelo movimento antropofágico das décadas de 1920 e 1930. Esses
artistas buscam novas linguagens visuais e plásticas que ao seu modo de ver
deveriam ser novas e criar um próprio diálogo entre a política e a arte. Podemos
citar nas obras dos brasileiros Osvald de Andrade Tarsilla do Amaral a figura
controvertida Monteiro Lobato, as pinturas de reflexão social de Candido Portinari
que se inspiravam em muito no trabalho icônico do espanhol Pablo Picasso e que
era forte e grandiloqüente discurso anti-fascista e de com apelo comunista tendendo
as ideias de Marx e Engels. (MONTALDO, 1994),(GIUNTA, 2011).
Neste início do século XX com um cenário político complexo, onde
sociedades e repúblicas Latino Americanas estavam se construindo e se
consolidando como estados democráticos após apenas um século de
independência, surgem movimentos sociais das mais diversas orientações. Grupos
de militância político-artístico tanto na Argentina como no Brasil se organizam, como
o Martín Fierro e os antropofagistas e mesmo os Tropicalistas na segunda metade
do século XX.
Na segunda metade do século XX temos um momento político que marcou a
memória de gerações de artistas, e tornou esse fato divisor de água na produção
intelectual brasileira. O golpe militar de 1964 abriu uma ferida no já tão oprimido e
esfacelado tecido social, um golpe não apenas de tomada de poder de forma anti -
revolucionária, este golpe fez com que a evolução social, intelectual e artística
tivesse uma verdadeira “idade das trevas”. Um apagão forçado com censuras e
proibições de obras e artistas em todas as áreas e todo tipo de suporte, o que exigia
da classe artista uma coragem e inteligência que pudesse usar de subterfúgios para
levar suas mensagens de forma velada com textos nas entrelinhas, e usando de
ambigüidades pueris que fossem interpretadas pela sociedade e atingisse seus
objetivos de crítica e até subversão política como forma de resistência.
Um guerrilheiro do cartum, assim Miguel Paiva definiu Henfil. É impossível ver
a obra de Henfil e não abordar sua vertente política, sendo ele de uma geração que
fica fortemente marcada pelo regime militar que faz o golpte de 1964 ser um vácuo
4
na vida e na história da democracia do país. (Malta, 2008). Segundo Malta, ainda
determina uma interrupção nas discussões sociais, culturais e filosóficas que se
construíam no Brasil.
No contexto jornalístico da época que tinha dificuldade em seus editoriais de
levar informações reais sobre a situação política brasileira, uma vez que em muitos
casos agentes censores do governo, com suas fardas e armas faziam plantão nas
redações, e liam as laudas antes dessas serem aprovadas pelos editores. Raras as
vezes que um jornalista conseguia “furar” as barreiras impostas, e levar um por mais
leve que fosse alento ao senso crítico do cidadão comum. A pessoa de Henrique de
Souza Filho, o Henfil, tem grande relevância, pois em seus traços caricatos de
simplicidade inenarrável, onde uma meia dúzia de riscos que segundo ele mesmo
eram quase caligráficos, e que tinham preocupações menores dos que as de seu
argumento crítico e incisivo. (Malta, 2008).
Mesmo recebendo ameaças por telefone de grupos anônimos de caça aos
comunistas, Henfil não desistiu de seu trabalho dentro do novo e heróico jornal que
no ano de 1969 surge no Brasil, o jornal Pasquim. Essa publicação que é em seu
tempo considerada “alternativa” foi de extrema importância para a continuidade da
expressão de uma voz questionadora ao regime e seus desmandos e barbáries
contra a liberdade coletiva.
Em 1970 os colaboradores do jornal ou estavam presos ou impedidos de denunciar
essa perseguição, pois claramente era censurada nessa tentativa. Então Henfil em
outro importante escritor do periódico Millôr Fernandes, deram continuidade aos
trabalhos do jornal imitando os estilos dos desenhos de seus colegas presos. Além
de ter um apoio de voluntários que colaboraram com as edições, dentre eles o
artista, compositor e escritor Chico Buarque.
Com um ar infantil e insinuando uma ingenuidade de criança os desenhos
críticos de Henfil eram impressos sem muita oposição do agente censor, e
passavam pela peneira do regime, conforme afirma Luís Fernando Veríssimo. O
traço caligráfico de Henfil se prestou ao trabalho de denúncias, criticas, as injustiças
sociais, ao capitalismo, humanitário e dedicado a ajuda até financeira, ele era
conhecido tanto em seu trabalho como artista, mas mesmo na vida particular como
um homem solidário. (PIRES, 2008).
5
Seus trabalhos em tiras ou quadrinhos eram povoados por personagens
zoomorfizados ou antromorfizados, que conferiam um aspecto lúdico ao seu
imaginário pictórico, e proporcionava um “ar mais leve” aos discursos fortemente
combativos, fossem eles políticos, filosóficos, seja tratando dos temas dentro do
universo futebolístico, clérico, ou da caatinga, pessoas comuns como operários, ou o
“típico malandro carioca” ou mesmo quando os personagens fossem apenas mudos,
sem expressão “oral”.
Em seus textos todos os temas eram criticados, desde a inflação, a reforma
agrária, abandono do nordeste frente ao desenvolvimentismo do “Sul Maravilha”,
satirizava o machismo com suas personagens femininas que eram combativas, uma
alusão as companheiras mulheres presas, (algumas de sua família inclusive), a
educação burguesa, a concentração de renda, programas e propagandas do regime
militar e ao desaparecimento de companheiros de luta política, o exílio de seu irmão
o sociólogo Betinho de Souza por exemplo.
Seu estilo teatral, onde os personagens por vezes interagiam com o leitor, era
uma metalinguagem que foi marca de seu estilo. Sob a forte influência da obra do
cineasta Glauber Rocha aborda o tema da caatinga e da reforma agrária. Usava
técnicas de fotografia ao enquadrar os personagens em campos de aproximação, e
planos vazios, o enquadramento dava uma carga dramática maior aos seus
cenários. (MALTA, 2008).
Toda sua obra (maior que 15 mil originais) não condiz com sua breve
existência, morre muito jovem, aos 43 anos de idade, em 1988. Hemofílico, pois a
doença era comum em sua família, como era obrigado a fazer transfusões de
sangue, não somente ele, mas seus dois irmãos também contraem o vírus do HIV e
morrem vitimados pela AIDS, comum naquela década o controle hospitalar falhou.
Ironicamente ele criticava a qualidade dos serviços públicos no país, falando sobre
isso um amigo seu diz sobre sua morte: “Henfil morreu de Brasil”.
Um breve ensaio não dará conta de abordar a importância de artistas
engajados em nossa América Latina. Tarefa que precisa de linguagem acadêmica,
técnica e dedicação de tempo maior, e espaço que essas poucas linhas não
favorecem. Tentei aqui ilustrar como tivemos em algumas décadas de America pós-
colonialismo, em nossa região artistas e pensadores conectados com nossas
6
causas, nossos temas mais importantes, a justiça social, a liberdade de expressão e
o direito a vida.
Henfil foi a exemplo de outros artistas como Araujo de Porto Alegre, Ângelo Agostini,
e Siqueiros, (respeitadas as proporcionalidades e genialidades no fazer de cada um
a sua arte) um revolucionário, vanguardista em suas técnicas, e pensador do Brasil
com uma sensibilidade que deixa claro o papel do artista na sociedade. Ser antes de
tudo um ser social, pensante, e combativo, enfim, engajado no melhor sentido da
palavra.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
7
http://www.encontro2012.mg.anpuh.org/resources/anais/24/1340747304_ARQUIVO
_artigoanpuh11.pdf> acessado em 10 de out. de 2014.
SILVA, Rosangela de Jesus: Crítica de arte na imprensa carioca do século xix:
revista musical e de bellas artes-Um panorama crítico:III Encontro de História da
Arte – IFCH / UNICAMP. 2007. Disponível
em:<http://www.unicamp.br/chaa/eha/atas/2007/SILVA,%20Rosangela%20de%20Je
sus.pdf>acessado em 10 de out. de 2014.
______________________: A (DES)CONSTRUÇÃO Da América Latina: Imprensa
Ilustrada Na Segunda Metade Do Século XIX (ARGENTINA E Brasil). Audição in
loco, no 1° Colóquio Interdisciplinar da Universidade da Integração Latinoamericana
-Unila. Foz do Iguaçu- 2014.