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Movimento #QueParaísoQueremos

Evolução da pandemia da Covid-19 no Município de


Paraisópolis (MG): um estudo a partir da consolidação de
dados do Departamento de Saúde

Estudo realizado pelo antropólogo


Juliano Almeida e pelo jornalista e
professor de filosofia José Geraldo da
Silva Junior com base nos dados oficiais
sobre a pandemia do novo coronavírus
informados pela Prefeitura Municipal
de Paraisópolis (MG).

Paraisópolis, Janeiro de 2021


Em memória de todas as vítimas da Covid-19
Apresentação

O presente estudo tem por objetivo, a partir de dados disponibilizados


pela Prefeitura Municipal de Paraisópolis em seu site1 e em sua página no
facebook,2 oferecer às autoridades responsáveis e à sociedade civil um
panorama da evolução da pandemia da Covid-19 no Município de Paraisópolis
(MG).
Embora não descuide de princípios e da metodologia científica, esse não
é um estudo realizado por especialistas em epidemiologia ou profissionais de
saúde.
Trata-se de um trabalho voluntário, sem fins lucrativos, desvinculado dos
chamados grupos políticos e partidos. O trabalho de caráter científico visa sim
suprir uma lacuna informacional no Município, ao procurar construir uma
perspectiva temporal em relação à evolução da pandemia da Covid-19 em
Paraisópolis, que não é imediatamente visível se considerados apenas os
recortes dos dados diariamente divulgados pela Prefeitura.
Nesse sentido, o estudo não tem a pretensão de apresentar uma visão
definitiva ou única sobre o tema, mas de oferecer novos elementos para
contribuir com o debate sobre as estratégias de enfrentamento à pandemia no
Município e também de estimular outras iniciativas e olhares, oficiais ou não,
que venham a se somar a esse primeiro esforço de consolidação de dados até
então dispersos.
Espera-se, assim, que a presente análise de longo prazo da evolução da
pandemia na cidade seja considerada pelas autoridades e pela sociedade e possa
contribuir para a construção de uma estratégia ampla de prevenção,
esclarecimento da população, testagem, fiscalização, rastreamento de contatos
de casos confirmados bem como, se possível, rastreamento de contatos de casos
suspeitos com síndrome gripal, efetivação da Lei Municipal 2.655/20203 que
versa sobre obrigatoriedade do uso de máscara e dá outras medidas no que
tange à prevenção e ao enfrentamento da pandemia no município.

1 https://www.paraisopolis.mg.gov.br/coronavirus
2 https://www.facebook.com/prefeituradeparaisopolis
3 A Lei Municipal pode ser consulta no website da Câmara Municipal de Paraisópolis pelo link:

https://www.paraisopolis.mg.gov.br/assets/file/LEI 2655_USO DE MÁSCARA.pdf (Acesso em


8 de Jan. 2020)
Metodologia

Os dados epidemiológicos relativos à Covid-19 utilizados no estudo foram


extraídos dos boletins divulgados diariamente pelo Município na página oficial
da Prefeitura no Facebook.
Os números de cada um dos boletins no período de 03/04/2020 e
07/01/2020 foram individualmente transpostos para uma planilha e agrupados
em: “casos ativos”, que se referem aos casos de Covid-19 confirmados e
monitorados pelo Município durante o período de 14 (quatorze) dias a contar do
início dos sintomas na data de referência; “acumulado de casos confirmados”,
que incluem os casos ativos na data de referência e os registros de casos
confirmados há mais de 14 dias em relação à data de referência, incluindo
aqueles que evoluíram a óbito; “óbitos confirmados”, que compreendem os
óbitos associados à infecção pela Covid-19 registrados pelo Município;
“síndrome gripal ativa”, referente ao número de pessoas com sintomas de
síndrome gripal, mesmo que leve, registradas pelo Município e monitoradas na
data de referência; “acumulado de síndrome gripal”, compreendendo o
somatório dos casos de síndrome gripal ativa e daqueles registrados
previamente.
Considerando que o trabalho de transposição foi realizado manualmente,
já que a Prefeitura não disponibiliza em seu site um arquivo com dados em
excel, o estudo está sujeito a pequenos erros decorrentes de problemas de
digitação, o que, de todo modo, não compromete os objetivos do levantamento,
que consiste em oferecer à população e aos gestores locais um panorama da
evolução da pandemia da Covid-19 em Paraisópolis, bem como apontar
possíveis tendências em curso visíveis a partir desses dados.
Gráfico e análise dos dados

Gráfico 1: Casos de infecção por Covid-19 confirmados por mês

A análise dos dados deste primeiro gráfico permite concluir que o pico de
casos no Município ocorreu no mês de agosto, quando 78 casos de infecção pela
Covid-19 foram confirmados, com uma progressiva redução entre os meses de
setembro e novembro, quando esse número chegou a 23. Tal trajetória
descendente, contudo, foi interrompida em dezembro, quando 53 casos foram
registrados, número inferior apenas ao registrado em agosto.

Casos confirmados por mês


90
80
70
60
50
40
30 Casos confirmados

20
10
0

* No mês de janeiro consideramos até o dia 7.


Gráfico 2: Evolução dos casos de infecção pela Covid-19 ativos

A observação deste gráfico revela que Paraisópolis enfrentou uma


primeira onda de infecções entre o início de julho e meados do mês de
novembro de 2020. Durante todo esse período, ao menos um caso ativo de
infecção pela Covid-19 foi registrado no Município, com um pico de infecções
ativas confirmadas entre os dias 27 e 31 de agosto de 2020, quando 19 casos
foram notificados. A tendência de queda que se observou a partir daí foi
interrompida em 19 de novembro de 2020. A partir desse momento,
possivelmente em razão das aglomerações e movimentações associadas à
campanha eleitoral e também do relaxamento de medidas de prevenção
adotadas pelo Município, o número de casos ativos volta a crescer, estabilizando
desde o dia 14 de dezembro em um patamar superior a cinco casos
ativos, um padrão similar ao início da primeira onda de casos no
Município, verificado durante o mês de julho de 2020, após o qual
houve uma explosão de novos registros.

Casos confirmados ativos


20
18
16
14
12
10
8
Confirmados ativos
6
4
2
0
Gráficos 3 e 4: Evolução dos óbitos confirmados associados à
infecção pela Covid-19

Evolução dos óbitos confirmados


16
14
12
10
8
6
Óbitos confirmados
4
2
0

Óbitos confirmados
6

2 Óbitos confirmados

O gráfico acima mostra que desde que a Covid-19 foi reconhecida como uma
pandemia pela OMS, ao longo do ano de 2020, apenas os meses de março e outubro
não tiveram registros de confirmação de óbitos associados à doença em
Paraisópolis. Em aproximadamente dez meses de pandemia, o Município registra
uma média de 1,5 óbitos por mês. Ressalte-se que, dentro desse período, 7 dos 15
óbitos confirmados (ou cerca de 46,7% do total) foram registrados nos últimos dois
meses, e dentre esses 5 (ou cerca 33,33% do total) apenas no último mês.
Trata-se de dado extremamente preocupante, que não foi objeto de
maiores considerações pelas autoridades sanitárias até o momento.
Gráfico 5: Taxa de letalidade da Covid-19 em Paraisópolis

Taxa de Letalidade
45,00%
40,00%
35,00%
30,00%
25,00%
20,00%
15,00% Letalidade
10,00%
5,00%
0,00%

A taxa de letalidade da Covid-19 expressa no gráfico corresponde à


proporção entre o número de óbitos associados à doença e o número total de
casos confirmados ao longo do período sob análise registrados no Município.
Para a elaboração desse gráfico, foram considerados apenas os dados
disponibilizados pelo Município a partir de 15 de maio de 2020, quando foi
adotado um padrão de divulgação de dados que nos permite um cálculo mais
confiável. O número, em tese, expressa o número de óbitos esperados para cada
100 casos confirmados. Observa-se que a taxa de letalidade pela Covid-19 em
Paraisópolis oscilou de 40%, inicialmente, para uma média de cerca de 4,8%,
que tem se mantido estável ao menos desde meados do mês de agosto de 2020.
Trata-se de uma taxa de letalidade bastante superior àquela
auferida para a mesma doença pelos estudos realizados em
diferentes localidades do mundo, variando entre 0,5% e 1%. Não há
razão outra para tamanha diferença no dado obtido em
Paraisópolis senão a baixa notificação de casos de Covid-19
decorrente de baixa testagem e de uma estratégia de
monitoramento falha.
Gráfico 6: Evolução dos casos de síndrome gripal (suspeita de
infecção pela Covid-19)

1000
900
800
700
600
500 Síndrome Gripal ativa
400
300
Síndrome gripal
200 acumulado
100
0
03/04/2020

03/05/2020

03/06/2020

03/07/2020

03/08/2020

03/09/2020

03/10/2020

03/11/2020

03/12/2020

03/01/2021

O gráfico acima mostra os registros de pessoas que apresentaram


sintomas, ainda que moderados, de síndrome gripal durante o período
analisado no Município. Conforme critérios do Ministério da Saúde, tais casos
são suspeitos de infecção pela Covid-19, adotando-se, assim, a recomendação de
quarentena durante o período de 14 dias após o início dos sintomas para as
pessoas que venham a apresentá-lo. Diante de um cenário de baixa testagem,
trata-se de uma ferramenta essencial e confiável para o monitoramento da
Covid-19 no Município. Observamos que a curva de casos ativos cresce a partir
do mês de junho de 2020, chegando a um pico de casos ativos de síndrome
gripal em 5 de outubro de 2020, quando 143 pessoas chegaram a apresentar tais
sintomas e foram monitoradas pelo Município durante o período de 14 dias.
Após esse pico, o número de casos de síndrome gripal cai acentuadamente,
chegando a apenas 25 casos em 7 de novembro de 2020. Após essa data, a curva
volta a apresentar tendência de crescimento. Em 15 de dezembro de 2020,
chegaram a ser registrados 86 casos ativos de síndrome gripal
ativos. Assim, se durante o mês de novembro, a média de casos de síndrome
gripal esteve em torno de 33 casos, desde dezembro esse número oscila em
patamar bastante superior, em torno de 57 casos ativos, o que sugere uma
tendência de crescimento, bem visível se considerarmos a linha que mostra o
acumulado de casos de síndrome gripal. Depois de um curto período de
estabilidade entre outubro e novembro, a curva volta a apresentar inclinação
acentuada e apontar para cima. É preciso, como já foi repetidamente dito pelas
autoridades sanitárias, “achatá-la”.

Gráfico 7: Casos de síndrome gripal por mês

Síndrome gripal por mês


160
140
120
100
80
60
Síndrome gripal
40
20
0

O gráfico acima, além de corroborar as informações anteriores


relativamente à síndrome gripal, mostra que o número total de casos registrados
no mês de dezembro é equivalente àquele observado em setembro, o que, mais
uma vez, reforça a percepção de que podemos estar diante de um
aumento acelerado de casos de Covid-19 na cidade, ao qual deve se
somar os efeitos das festas de fim de ano, sugerindo, assim, um
difícil cenário adiante. Ressalte-se ainda que, embora os dados de janeiro
de 2021 refiram-se apenas aos 7 primeiros dias do mês, o número de casos
registrados já é equivalente ao de todo o mês de outubro e superior ao de maio
de 2020.
Gráficos 8 e 9: Evolução dos casos de infecção pela Covid-19
confirmados e dos casos de síndrome gripal

1400

1200

1000

800 Síndrome gripal


acumulado
600

400 Confirmados
acumulado incluindo
200
óbitos
0
03/04/2020

03/05/2020

03/06/2020

03/07/2020

03/08/2020

03/09/2020

03/10/2020

03/11/2020

03/12/2020

03/01/2021

160
140
120
100
80
60 Confirmados ativos

40 Síndrome Gripal ativa


20
0
03/04/2020

03/05/2020

03/06/2020

03/07/2020

03/08/2020

03/09/2020

03/10/2020

03/11/2020

03/12/2020

03/01/2021

Os dois gráficos acima permitem-nos observar a existência de uma forte


correlação entre os padrões de evolução dos casos confirmados e suspeitos de
infecção pela Covid-19, mostrando-se, assim, um critério efetivo para, num
cenário de baixa testagem, realizar o monitoramento e o controle da pandemia
no Município. Um aumento no número de suspeitos, em geral, é seguido da
confirmação pela testagem a seguir (sobretudo porque, de modo geral, os casos
que vêm a ser confirmados o são por teste rápido, que detectam anticorpos,
efetivo apenas dias após o início dos sintomas). Da análise da série divulgada
pela Prefeitura é possível aduzir a existência de um notável atraso entre o
registro de casos ativos e a respectiva confirmação. Muitos casos confirmados
não entram nas estatísticas de casos ativos. São casos suspeitos cujo diagnóstico
ocorre apenas após o período de quarentena ou casos assintomáticos que só são
detectados a posteriori, embora operem como vetores do vírus no período de
infecção.
Considerações finais

Não pretendemos com o este estudo apresentar um diagnóstico


conclusivo sobre a pandemia na cidade nem como a maneira como o poder
público vem agindo ao longo dos meses, mas não se pode deixar de considerar, a
partir dos dados que apresentamos, a existência de fortes indícios de que
estamos em meio a uma curva de crescimento de casos, que deve ainda ser
impactada pelos efeitos das festas de fim de ano e ao correlato relaxamento das
medidas de prevenção, acelerando essa tendência.
A partir do que foi apresentado, entendemos que há elementos
suficientes para afirmar que estamos diante de uma segunda onda de infecções
na cidade de Paraisópolis. Além disso, o cenário regional é preocupante e por
toda a parte já são escassos os leitos para atendimento de casos graves de Covid-
19. A nosso ver, é urgente que se discutam novas medidas para enfrentamento
da pandemia se não queremos iniciar 2021 com uma grave crise sanitária e
registrando mortes absolutamente evitáveis.
Entendemos que, na falta de testes, o Município deva iniciar um trabalho de
busca ativa de pessoas com sintomas de síndrome gripal e de rastreamento dos
respectivos contatos. Os dados sugerem que mapear, identificar e isolar esses
casos é a maneira mais efetiva, considerando a realidade municipal, e de baixo
custo para enfrentar a Covid-19.
A vacina está cada dia mais perto, mas ainda não chegou de fato para
todos e todas. Não vamos perder mais ninguém.

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