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Editora
Léa Carvalho
Capa
Design: MaLu Santos | Foto: Freepik
Projeto gráfico
MaLu Santos
Revisão
Kátia Cristina de Souza Bispo
Apêndice
Inclui Bibliografia
ISBN: 978-65-86137-18-7
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por
escrito da Editora poderá ser utilizada ou reproduzida - em qualquer meio ou forma,
seja mecânico ou eletrônico, fotocópia, gravação, etc. - nem apropriada ou estocada em
sistema de bancos de dados.
Associada:
Liga Brasileira de Editoras - www.libre.org.br
Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL) - www.snel.org.br
Impresso no Brasil
Uma obra é trabalho de muita gente. Dedico à
persistência e ao amor em forma de mamãe: Leuca.
À presença de meu pai, Osvaldo. Aos dois, por
convidarem-me a perceber a dimensão espiritual da
vida consigo. Dedico à constelação de amigues e ao
meu benzinho, são meu lar onde eu esteja. Aos/às
jovens e suas famílias, trouxeram significado onde
insiste o vazio, compõem as vozes na minha cabeça
que dizem pra continuar. Aos/às trabalhadores(as)
do sistema socioeducativo: vocês não enxugam gelo,
vocês colaboram para construir novos mundos. Às
bolsas de pesquisa concedidas pela CAPES e pela
FAPERJ, à universidade pública, universal e gratuita!
]
Vento que vem de toda parte. Dando no meu corpo, aquele ar me falou
em gritos de liberdade, mas liberdade – aposto – ainda é só alegria
dentro de um pobre caminhozinho no ferro de grandes prisões. Tem
uma verdade que carece de aprender, do encoberto, e que ninguém
não ensina: o beco para liberdade se fazer.
(Rosa, 1995, p. 123)
COMO ASSIM, PROTAGONISMO?
5 FECHAMENTO, 146
REFERÊNCIAS, 150
APÊNDICES, 162
ANEXOS, 173
PALAVRAS INICIAIS
No nosso grupo Sandro dizia que não conseguia fazer uma cena
sem opressão: “Como eu vou fazer uma cena de algo que eu nunca
vivi?” Eu pedia pra ele imaginar... E o mesmo repetia que não
conseguia imaginar. Sandro então lembrou de uma cena vivida em
sua própria casa. Contou quando a polícia estava invadindo várias
casas na favela e ficou surpreso quando, em sua casa, o policial
entrou com educação. Eles disseram que o BOPE sempre entra
sem perguntar. Estava ele, seu irmão e sua mãe quando o policial
bateu na porta. Sua mãe abriu. O policial viu a moto no quintal e
perguntou sobre a mesma. A mãe explicou que era de seu filho,
que a moto havia sido roubada e recuperada depois . . . O policial
se compadeceu da situação dizendo “Poxa, esse mundo não
está fácil, não é? Roubam as coisas que com tanto custo a gente
conquistou”. Entrou, pediu com educação os documentos, que
foram exibidos pelo irmão, e se despediu da mãe dos meninos: “A
senhora fique com Deus”. Eu era a mãe, Sandro o policial (sugeri
que ele trocasse de posição dessa vez) e Lucas o irmão. Na cena
ainda há a manutenção da separação em dois lados opostos, de
um lado o trabalhador e do outro o bandido que rouba motos, e o
policial se compadeceu dos moradores da casa pois estes no caso
eram vítimas. No entanto, o policial entrou perguntando, pediu
para ver documentos, fez todo o processo com educação, e isto
foi o mais próximo que Sandro chegou, segundo suas lembranças
naquele momento, de uma realidade livre de opressão. (Diário de
campo da Yasmim, 2018).
7. Guattari e Rolnik (2013) nos dizem que o sujeito foi considerado ao longo de toda uma
tradição filosófica e científica através de sua suposta condição natural de humano, porém
afirmam a concepção considerada oposta, ou seja, que a subjetividade humana é fabricada
e consumida conforme maquinarias étnicas, profissionais, industriais, capitalísticas. Em
cada sociedade é preciso mapear os territórios: não temos, no Brasil, por exemplo,
o sistema de castas que existe na Índia, mas aqui encontramos linhas instituídas bem
delimitadas etárias, étnico/raciais, de classe, de gênero, tecnológicas, etc.
8. Desde a construção de minha multigrafia de conclusão de curso (França, 2013), optei pela
escrita em primeira pessoa que busca movimentos de incorporação das ideias lidas, escritas,
vividas. Novamente conforme Guattari e Rolnik (2013), ao invés de sujeitos individuais,
prefiro compreender a pessoa como um “agenciamento coletivo de enunciação”, um corpo
por onde passam agentes grupais, máquinas desejantes, econômicas, sociais, acadêmicas...
Portanto, ao se dizer “eu” compreende-se que não se está assumindo postura individualista,
mas afirmando um coletivo de enunciados que constituem este corpo vivo. Ao dizer que
algo é “meu”, não quero, com isso, clamar por posse ou originalidade, apenas informar
que utilizo, que incorporo, que adapto os conceitos às forças que estão me conformando.
O “meu método”, portanto, é aquele que eu aplico afetada, que me encanta e me espanta,
por meio do qual sou capaz de sentir as palavras que digito, de perceber variações na
temperatura da minha pele enquanto o vivo, é aquele que está entrelaçado a “mim”. Para
não ser mais eu, nem você, mas outro.
1 Escreviver
A arte da desinvenção
a arte da desinvenção
não tem compasso
remédio
nem medida
é a arte de tornar-se
vivo pelo espanto
via do equívoco
que faz do acaso
um avesso
é a arte de escutar
as dissonâncias
de aumentar o som
das estridências
que arranham
as grades das partituras (Ferreira, 2017, p. 35).
A cartografia trata de escolhas políticas de quais linhas se deseja seguir,
quais se deseja criar, e com quais objetivos. Conforme Marcia Moraes
(2010), a ação se dá no sentido de acompanhar os problemas que agitam as
linhas. Nesta análise a proposta de Moraes é PesquisarCOM, acompanhar
acompanhada, ou seja, aberta para a instabilidade que se dá no encontro
com o outro.
Um adolescente havia dito que achava que o que eu faria com o
texto final seria apenas empilhar os papéis ou tacar fogo. Outros o
criticaram pelo comentário. Respondi que era bom que ele tivesse
dito, que ao menos ele falou o que pensava. Outro então respondeu
que pensava o mesmo. Para quê serviria tudo aquilo? Falei do
meu interesse. Falei que eu gostaria que outras pessoas lessem,
que eu queria mudar as coisas. Que eu queria que as pessoas se
ouvissem mais, que participassem mais, que o DEGASE fizesse
um trabalho pros jovens a partir do que os jovens dizem e precisam.
Na medida em que eu ia falando ia também me emocionando.
Não tive medo de me emocionar, deixei que acontecesse, falei
sobre isso. Um adolescente (ainda não consigo decorar os nomes)
respondeu que viu a mudança na minha voz. Eles se calaram e me
ouviram, afetou-os de alguma forma. E olha que foi difícil vê-los
todos calados. Acredito que a atenção deles era maior tanto era
maior a emoção com que falávamos. MOÇÃO, MOVER. Fala
com emoção move. (Diário de campo da Yasmim, 2018).