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TEÓRICAS
NOTA
Este índice foi realizado pela ordem de matéria lecionada pelo Professor Carneiro da Frada
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1. O direito das obrigações o sistema jurídico
Segundo o Código Civil, artigo 397º, assume-se uma como uma obrigação o vínculo jurídico
que por virtude do qual uma pessoa fica adstrita para com outra à realização de uma
prestação.
“O Direito das obrigações é o conjunto de normas jurídicas reguladoras das relações de crédito,
sendo estas as relações jurídicas em que ao direito subjetivo atribuído a um dos sujeitos
corresponde um dever de prestar especificadamente imposto a determinada pessoa. É o dever
de prestar a que uma pessoa fica adstrita, no interesse de outra, que distingue a relação
obrigacional de outros tipos próximos de relações.”
Para o professor Carneiro da Frada, parece estranho que o legislador defina em termos
positivos o que se entende por uma obrigação, na medida em que as definições no âmbito
jurídico possam ser perigosas por se traduzirem num ajustamento ou incompletude. Apesar de
a noção de obrigação possuir um conteúdo legalmente estabelecido, ela é polissémica.
Há quem não concorde com esta definição, mas na verdade parece uma noção muito
correta e feliz de direito das obrigações, é uma boa noção e serve para introduzir o objeto da
nossa disciplina.
As obrigações são vínculos jurídicos em que uma pessoa está vinculada a uma atividade,
a atividade não é especifica, pode ser variável (ex.: quando o empreiteiro se vincula a pintar uma
casa assume uma obrigação; quando um sujeito trespassa o seu café e se vincula a não abrir
outro café ao lado assumiu uma obrigação de não concorrência; quando outra pessoa resolve
assumir que outrem transite pelo seu terreno para instalar uns andaimes e a dona do terreno
aceita efetivamente assume uma obrigação etc…).
• As modalidades da atividade
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As modalidades da atividade que a prestação pode revestir são múltiplas, segundo uma
velha distinção há:
Nós no dia a dia utilizamos a palavra obrigação, mas não é desta obrigação que vamos falar,
estas obrigações nascem de ordens normativas do dever ser, não tem fundamento jurídico nem
estão dotadas da garantia do aparelho coercitivo do estado.
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Pois todas as obrigações são deveres jurídicos, mas nem todos os deveres jurídicos são
obrigações.
“todas as pessoas têm obrigação de respeitar o direito de A” - são deveres jurídicos de
natureza privada, mas não são obrigações.
Até aqui não eram obrigações com fundamento jurídico, mas se dissermos:
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As obrigações podem ser:
Autónomas
Não autónomas
→ Obrigação Autónoma- é uma obrigação que nasce entre pessoas que não se
encontram previamente vinculadas entre si, nasce entre pessoas entre as quais não há uma
relação jurídica preexistente, esta relação preexistente é alheia á obrigação, a autónoma tem
existência própria, não pressupõe a existência de uma relação jurídica prévia. “A atropela B, B
exige indemnização” a obrigação nasce com o dano não com uma relação prévia.
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• O credor – aquele que tem direito á prestação. É o lado ativo da obrigação, a
esse lado chama-se direito de crédito.
• O devedor- aquele que está sujeito á prestação. É o lado passivo da obrigação,
a este chama-se direito de débito.
o O objeto: ao objeto da relação obrigacional chama-se prestação.
o O vínculo: é o nexo ideal que liga os poderes do credor aos deveres do obrigado.
• OS SUJEITOS
→ Credor: pessoa a quem se proporciona a vantagem
resultante da prestação (titular do interesse patrimonial, espiritual ou
moral que o dever de prestar visa satisfazer);
Mas o credor é o portador de uma situação de carência ou de
uma necessidade. Há bens (coisas, serviços) capazes de preencherem
tal necessidade. Há uma apetência ou desejo de obter estes bens para
suprimento da necessidade ou satisfação da carência.
O credor é amo e senhor da tutela do seu interesse. A tutela do
interesse depende da sua vontade, o funcionamento dela está
subordinado à iniciativa do titular ativo da relação. Na veste ou qualidade
de verdadeiro sujeito de um direito subjetivo, o credor pode dispor dos
meios coercitivos predispostos pela ordem jurídica para governo da
relação: pode exigir o cumprimento (voluntário ou judicial) da obrigação
e pode não o exigir, sem que do facto lhe advenha qualquer sanção.
Mesmo depois de ter obtido sentença condenatória do devedor, não é
forçado a instaurar execução contra o condenado, nem a lei o impede
de desistir da execução instaurada. Pode remitir a dívida, no todo ou em
parte; pode ceder o crédito; fazer dele objeto de doação a terceiro;
convencionar com o devedor a sua modificação; dá-lo em usufruto;
constituir com ele uma garantia, dando-o em penhor; aceitar em
cumprimento coisa diferente da que é devida; etc... Numa palavra, o
credor é o titular do direito à prestação, o sujeito ativo da relação de
crédito.
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posição de subordinação jurídica. Se não cumprir pontualmente, é sobre
o devedor que recaem as sanções estabelecidas na lei.
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§ Classificação das prestações
→ Ou o devedor compromete-se apenas a não fazer («non facere»), a não praticar certos
atos.
→ Ou o devedor fica apenas obrigado a consentir ou tolerar («pati») que outrem (o
credor) pratique alguns atos a que, de contrário, não teria direito.
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→ Prestações instantâneas: o comportamento exigível do devedor esgota-se num só
momento ou num período de tempo de duração praticamente irrelevante.
Ex: Entrega de certa coisa; pagamento do preço numa só prestação, etc...
Ex: Prestações do locatário (pagamento de renda ou aluguer), do devedor da renda perpétua ou vitalícia, da
empresa fornecedora de cerveja ou refrigerantes a certo estabelecimento, do consumidor de água, gás ou
eletricidade, etc...
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→ Prestação de resultado: a prestação visa um interesse do credor que se traduz no
resultado que o devedor se obriga a proporcional.
→ Prestação não fungível: o devedor não pode ser substituído no cumprimento por
terceiro.
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• O DIREITO À PRESTAÇÃO
• O DEVER DE PRESTAR
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1) Deveres principais ou típicos e deveres secundários de
prestação
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surgem todos ao mesmo tempo (a obrigação de restituição, não sendo
típica do contrato de mútuo, é muito ligada à estrutura do contrato de
mútuo, tratando-se de deveres de prestar que surgem mais tarde, pois
não surgem apos a conclusão da relação, mas sim durante a relação,
mais tarde).
b) Deveres de prestar que apenas surgem no termo da relação
obrigacional.
c) Deveres impostos pela boa-fé que surgem mais tarde (o dever
de endossar a correspondência ao antigo inquilino resulta da boa-fé) – a
expressão «culpa postpactumfinitum» reporta-se a uma culpa que só
surge depois de findo o contrato, por violação de regras segundo a boa-
fé (num certo sentido, poder-se-á pensar que esta culpa é o pandã da
culpa in contrahendo, numa fase posterior).
d) Deveres sucedâneos ou substitutivos do dever de prestar: O
dever de prestar pode extinguir- se por incumprimento imputável ao
devedor, surgindo então um dever de indemnizar, sendo este um dever
substituto do dever de prestar. Outras vezes, as prestações não são
propriamente substitutivas, mas acompanham a prestação inicial.
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Vista do lado do devedor a garantia traduz-se na
responsabilidade do seu património pelo cumprimento da obrigação e na
consequente sujeição dos bens que o integram aos fins específicos da
execução forçada.
Se o credor tem o direito de agredir o património do devedor
quando ele não cumpre, é porque o património responde previamente
pela obrigação.
O fim da execução consiste em proporcionar ao credor a
realização do interesse que a prestação visava facultar-lhe ou uma
satisfação tão próxima quanto possível desse interesse (indemnização
do prejuízo que lhe causa o não cumprimento).
Como os bens do devedor respondem igualmente perante todos
os credores (comuns), independentemente da data, do montante da
constituição do crédito ou da natureza da dívida, diz-se que o património
do devedor é a garantia comum dos credores.
• Conceções dominantes:
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Tratando-se de trilhar o conceito relativo a uma realidade tão central no direito
civil tem havido um debate doutrinal intenso. A doutrina tentou perceber como é
possível alguém ficar vinculado perante outrem através de uma obrigação, dado que
impera um princípio de liberdade no tráfego jurídico.
§ Doutrinas realistas
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Críticas - O CC estabelece claramente um dever de prestar, pelo que as
obrigações são puras expectativas. O credor pode exigir prestação através de
uma ação de incumprimento, através do qual o credor obtém a condenação do
devedor ao cumprimento, proferida pelo tribunal. Desta forma deve entender-se
o dever de prestar como um verdadeiro dever jurídico.
Existem 2 aspetos a considerar:
- Uma pessoa sem património pode constituir obrigações. Não é pelo
facto de não haver património que não pode realizar obrigações. Assim, as
conceções não são de acolher porque tomam a parte sobre o todo. O conceito
de obrigação não se descreve pela sanção, mas pela ordenação da vida social
segundo a justiça. Carneiro da frada não crê que a relação obrigacional careça
de ser explicada pela sanção e julga que esta deve permanecer fora do conceito,
adotando uma visão pessoalista.
- A maior parte das obrigações extinguem-se sem intervenção coativa.
§ Doutrinas ecléticas/modernas
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pode-se constituir uma hipoteca para garantir uma obrigação futura, temos
hipóteses de responsabilidade, mas ainda não há dívida constituída.
Como é que saímos desta confusão doutrinal entre clássicos e realistas, por
outro lado ainda defensores de doutrinas complexas como esta?
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Uma das conceções mais interessantes é aquela que diz que a
obrigação é um processo, algo que não se mantém constante.
Os defensores apontam para que a obrigação é um organismo vivo, é
uma realidade que efetivamente tem as suas componentes, lógica interna e vai
mudando.
Grandes autores contemporâneos defenderam essa noção e trouxeram-
na como legado imediato da geração anterior. O professor identifica-se com esta
forma de ver.
Pouco interessa termos uma noção pura de obrigação, o que nos
interessa é a maneira da obrigação funcionar.
Um autor identifica a obrigação como um direito do credor à prestação
(à atividade do devedor) mas diz que como é um processo caso o devedor não
cumpra o credor tem um direito à indemnização. O dever de indemnizar pode
gerar um direito do credor para agredir o património do devedor. Esta obrigação
foi recebendo modificações, é uma realidade dinâmica.
O dever de prestar convola-se ou faz surgir um dever de indemnizar,
este caso não seja cumprido pode dar lugar a uma ação judicial para penhorar
o devedor. É um processo, algo que se vai desenrolar no tempo, não se pode
prever, pode ser preciso levar até ao fim este processo em marcha.
As obrigações vão adquirindo cambiantes, um crédito pode ser cedido,
há muitas possibilidades de desenvolvimento da relação obrigacional, são
tentativas mais elaboradas de superação, mas que embora retratando muito
bem a vida da obrigação, não chegam propriamente a representar uma
alternativa às conceções básicas de que partimos, porque mesmo estas
doutrinas da obrigação como processo não podem prescindir daquilo que está
em causa.
Nesta conceção acabamos por não conseguir substituir o problema
concetual teórico que é saber o que é a obrigação. Por isso, o que parece
adequado dizer é que efetivamente essas doutrinas são muito boas, mas algo
enganadoras e temos de enfrentar o problema concetual.
Críticas
Sumariando todos os prós e contras, parece que de facto as conceções
pessoalistas retratam melhor a obrigação:
→ é um vínculo entre pessoas pelo qual alguém esta efetivamente adstrito a
realizar uma prestação em benefício de outrem, havendo um direito a uma
prestação e um dever a realizar uma prestação.
→Todas as dificuldades relacionadas com o momento coativo estão fora da
obrigação, são a aplicação eventual de mecanismos que em muitos casos nem
sequer são invocados.
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É diferente daquele que recebe algo a que não tem direito –
liberalidades. O cumprimento n é uma liberalidade, é jurídico. “Convictio
in debiti” – alguém que pensa que está em dívida e paga, mas afinal não
está. A pessoa que recebe é obrigada a restituir.
É diferente daquele que recebe algo a que não tem direito –
liberalidades
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Além disso nestes direitos genéricos o comportamento é
omissivo, é de não fazer algo para que se cumpra o direito “não ofender
alguém” etc…
Este direito genérico não tem obrigações, mas a violação de um
destes direitos pode recair numa responsabilidade civil que dará aso a
uma obrigação.
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Segundo o professor C. Frada, o ónus jurídico refere-se á pratica
de um comportamento que, não sendo obrigatório, traduz aquando da
sua verificação uma vantagem ou remoção de um obstáculo jurídico
para o onerado. Trata-se de diligências a que o titular do direito está
adstrito para que o seu direito venha a ser reconhecido ou plenamente
exercido.
Exemplo: o ónus da prova é do interesse do individuo que pretende beneficiar da
procedência da ação intentada em tribunal. Para isso terá de fazer prova de tais factos.
Outros exemplos são o ónus de contestar (artigo. CPC) e o ónus de impugnação especificada.
É feliz a definição do artigo 397º porque não faz apelo à sanção. Temos de evitar
nas conceções pessoalistas ou clássicas aquele argumento que podia induzir em
erro, vivemos numa sociedade de colaboração entre pessoas que assume a forma
de obrigações.
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Mas isto não significa que a obrigação seja um conceito simples. Agora temos
de ver o que se esconde dentro da obrigação, não é uma realidade simples.
A relação obrigacional é estabelecida entre duas pessoas, tem uma fonte, um
objeto, uma garantia, esses elementos são externos ao vínculo, necessários ao
surgimento de um vínculo, a obrigação é o vínculo e não os sujeitos. Esse vínculo
representa uma realidade complexa e por isso é que é muito importante fazer notar
que a obrigação é complexa.
Exemplo mais simples e comum é o da compra e venda – o vendedor tem o dever jurídico de
entregar a coisa e o direito subjetivo de exigir o pagamento da coisa entregue. Do lado do comprador, este
tem o dever jurídico de pagar o preço e o direito subjetivo de exigir a entrega da coisa.
→ seja discurso do juiz para fundamentar a decisão, seja o advogado para explicar
ao cliente e persuadir o juiz.
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No vínculo temos um poder que ordinariamente é do devedor, mas que como é
coisa genérica há um poder de escolha afeto ao vínculo obrigacional.
→ Pertence também ao vínculo recusar a entrega de maças defetuosas, tem
também o poder de interpelar o devedor para que cumpra – poder de exigir a prestação,
o cumprimento.
→ É também possível transmitir o crédito para outra pessoa – cessão de
créditos, o poder de transmitir também está inserido no crédito.
→ Também existe o poder de acionar os mecanismos judiciais para obter o
cumprimento da obrigação – artigo 830º.
Temos uma realidade complexa, mas não é só isso, quando surge sendo
complexa a obrigação produz uma relação entre pessoas que vai muitas vezes para lá
dela própria, aglutina realidades que a acompanham, posições jurídicas secundarias que
gravitam em torno da obrigação.
No exemplo da compra e venda das maças, temos também uma obrigação da
entrega de preço que é uma obrigação pecuniária.
Quer dizer que a relação obrigacional entre comprador e vendedor não está
sozinha porque há um dever de sentido inverso do comprador para com o vendedor de
entregar o preço, é um contrato sinalagmático, são obrigações interligadas.
Se se tratasse de uma doação não havia essa obrigação de entrega de preço.
Podem surgir outros deveres p além daqueles que determinam a obrigação.
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primários ou deveres principais de prestação e os deveres laterais de conduta ou
deveres acessórios:
(vide pág. 14)
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de situações, do lado ativo e do lado passivo, quer porque está acompanhada
habitualmente de outras posições jurídicas, tal como a conduta de boa fé.
Não atribuem nada ao credor, apenas dizem como a relação obrigacional deve
processar-se, a relação deve desenvolver-se adequadamente, corretamente, que atinja
os seus fins, considerando o credor e o devedor. São deveres de conduta, não são
obrigações em sentido próprio.
A complexidade não decorre da estática, mas resulta da observação da vida da
obrigação desde o seu nascimento e às vezes até antes até à sua extinção e por vezes
para lá da sua morte. A complexidade ajuda a perceber esse dinamismo temporal da
obrigação.
1. Arrendamento – à medida que o tempo passa implica para o locador a continuação da sua prestação
de proporcionar o gozo da coisa. O locatário tem a obrigação de pagar a retribuição (renda) que se
vence por períodos (mensais, quinzenais, semestrais). Do contrato de locação podem advir outras
prestações, tais como realizações de obras por parte do locador. Nestas relações duradouras
enxertam-se conjuntos de obrigações que se distinguem da obrigacional principal.
2. Cumprimento defeituoso- dá-se quando o devedor cumpre inadequadamente, do ponto de vista
qualitativo, a obrigação. O devedor realiza a obrigação a que estava adstrito, mas não com o alcance
a que estava vinculado, incorrendo por isso num cumprimento defeituoso. O exemplo mais típica
remonta a situações em que é cumprido o dever principal, mas que não se cumprem os deveres
laterais.
Simplificando – A, dona de uma loja de moda XL, encomenda a B 100 camisas tamanho XL.
A, ao receber a encomenda apercebe-se que B enviou tudo em tamanho M. É um contrato de compra
e venda defeituoso, 913º e ss CC. O dever principal, que era a entrega da coisa e o respetivo pagamento
foram cumpridos, mas o dever lateral de corresponder ao que foi pedido por A (tamanho XL) não foi.
3. Contrato de Trabalho – quando o trabalhador cumpre com a sua prestação principal, mas é mal-
educado para com o empregador não está a cumprir deveres laterais. Na figura da cessão de posição
contratual (424º CC), transita-se de uma esfera jurídica para outra a posição que um certo individuo
tem num contrato. A essa posição contratual que ingressa numa nova esfera jurídica são adicionados
não só os débitos e os créditos da posição contratual anterior, mas também os deveres laterais de
conduta. O facto de um contrato vir a ser anulado ou resolvido nada afeta a permanência dos deveres
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laterais de conduta. A anulação do contrato abrange os deveres de prestar, mas os deveres laterais
mantêm-se, não sendo afetados pela invalidade do contrato. Desta forma, aos deveres laterais não se
aplica a regra do artigo 268º quanto à restituição, dado que neles não há nada para restituir.
→ a doutrina mais moderna aponta que estes deveres de conduta (os quais o
professor C. Frada prefere chamar deveres de consideração) acompanham toda
a relação obrigacional e se manifestam logo no período pré-contratual têm um
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regime similar ao das obrigações, estabelece-se uma presunção de culpa pelo
incumprimento, no artigo 199º
o Exemplo: num supermercado, uma senhora escorrega numa casca de banana e parte a perna.
A pergunta é saber se essa senhora pode ou não pedir uma indemnização ao
supermercado? → Tanto pode haver um facto ilícito do dono do supermercado – falta de
limpeza originou uma situação perigosa; indemnização (art.º. 483.º do CC).
Existe uma dificuldade: é que cabe ao lesado a demonstração da culpa da lesão… art.º
487.º do CC (a prova de ilicitude até é virtualmente impossível, quanto mais a prova da culpa).
Essa prova de falta de culpa é muito mais árida. Quer dizer que persistindo no
espírito do juiz uma incerteza quanto à culpa, adota a solução das “decisões em cenários
de incerteza”, condenando o dono do supermercado a pagar a indemnização (não se
prova que agiram sem culpa; será justo?
O prof. diria que sim… é mais justo ser um destes donos de supermercados a
responder, do que deixar o pobre do cliente com o sofrimento e problema patrimonial.
Será mais justo por muitas situações:
→ o dono do supermercado terá grande facilidade de repercutir as despesas
com o pagamento do seguro ao cliente, através do aumento dos preços sobre os
produtos – daí ser esta a solução mais equitativa.
o Exemplo de outro dever de conduta (na sua vertente de lealdade): dever de segredo.
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Nos direitos de crédito aquilo que a Relação Jurídica atribui ao sujeito não é uma coisa, é
uma atividade, isto porque, ter direito a uma conduta é diferente de ter direito sobre uma coisa
(direitos reais de gozo).
Há aqui uma bipartição do direito civil, a relação das pessoas com as coisas e a relação
das pessoas entre elas.
O direito de crédito só tem proteção sobre a forma de barricada, proteção exigida apenas num
sentido.
Em princípio ninguém que não seja o devedor pode responder pelo incumprimento, mas
pode discutir-se se em alguns casos, em certas circunstâncias, não poderão terceiros responder,
por vezes discute-se se as obrigações para além deste efeito relativo não terão efeito externo.
→ O direito de crédito mesmo quando tem haver com coisas, é o direito á coisa, ius ad rem.
A constituição de um direito real importa um sacrifício de direitos mais fracos mesmo que
tenham sido previamente constituídos.
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Com exceção do artigo 1022ºCC contrato de locação (arrendamento).
Nos direitos reais temos direitos sobre as coisas, expressam sempre uma posição do sujeito
de domínio relativo a uma coisa. Nos de crédito, temos uma realidade distinta, aquilo que a ordem
jurídica atribui ao sujeito não é uma coisa, mas é uma atividade, o devedor deve essa atividade
ao credor, que tem direito a uma conduta.
Há uma destrinça conceptual que já vem dos romanos que ajuda a distinguir a
nossa disciplina. Ambas são estruturantes do Direito Civil.
→ Não são características absolutas dos direitos reais nem exclusivas dos direitos reais.
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Exclusiva: há outros direitos que não são reais e que obedecem ao mesmo princípio.
Retiramos isto do artigo 407º: exemplo do contrato de locação (direitos pessoais de gozo).
A é dono do imóvel e arrenda a B e depois arrenda para o mesmo período a C, prevalece o direito primeiramente
constituído.
Esta regra também se aplica a outros direitos reais de gozo.
→ direitos reais gozam da característica da sequela: o poder que o titular tem sobre a coisa pode
fazer-se valer onde quer que a coisa se encontre, o direito real sobre a coisa pode fazer-se valer
mesmo que a coisa se encontre no domínio material ou jurídico de outra pessoa. O proprietário
do bem pode reivindicar a coisa onde quer que esteja. Exemplo: direito real de garantia.
→ Função da obrigação:
Visa satisfazer o interesse do credor. Há uma discussão de saber se o interesse integra ou
não a relação obrigacional, se faz parte da sua estrutura. Quer faça parte ou não, o interesse
tem repercussões no regime aplicável à obrigação.
Artigo 428º - não havendo prazos diferentes, a prestação e a entrega são simultâneas é a
marca do sinalagma funcional.
O interesse do credor explica esta regra, tem uma razão legítima para recusar o
cumprimento.
Nos contratos bilaterais (de compra e venda por exemplo) – gera obrigações para ambas as partes,
ambas as partes são credoras e devedoras.
Artigo 801º- a coisa vendida foi destruída por culpa, há uma impossibilidade imputável ao
devedor, há um incumprimento impossível, mas tem que pagar o preço?
Não, pode recusar-se porque não vê o seu interesse satisfeito. A obrigação extingue-se
perante a impossibilidade imputável ao devedor. Pode haver cumprimento por terceiro?
Artigo 767º - terceiro pode cumprir a obrigação e não se pode recusar, e no nº 2 temos
situações de infungibilidade – situações em que a prestação não pode ser cumprida por outra
pessoa. Como sabemos se a substituição prejudica o credor?
Vamos ver se o interesse do credor é prejudicado, é o critério que vamos empregar para
aferir a fungibilidade da obrigação. Quando falamos de função da obrigação pomos em destaque
o interesse do credor: distinguir fungíveis e infungíveis.
Artigo 791º - o cumprimento pode ser feito por terceiro se o interesse do credor n for
prejudicado. O interesse do credor é a função que o direito de crédito visa servir e é ele que
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permite aferir se a prestação é fungível, se há impossibilidade subjetiva extintiva da obrigação, é
um critério que está subjacente a muitas normas obrigacionais.
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→ Substituição do credor pelo seu credor
Ex: Se a realização da prestação devida se tornar impossível por facto imputável a terceiro (que
destruiu a coisa devida) ou ao próprio devedor e, em consequência disso, o devedor adquirir algum direito de
crédito contra terceiro (o autor da destruição da coisa ou a companhia seguradora), pode o credor substituir-
se ao devedor no exercício do direito relativo que este tiver obtido contra terceiro. Não é que o credor possa
exigir de terceiro a prestação que lhe compete, mas pode exercer contra o terceiro o crédito do seu devedor,
como se fosse ele o titular do direito, embora dentro dos limites do seu próprio crédito.
A eficácia externa das obrigações significaria que estas poderiam ser opostas a
terceiros, designadamente para os responsabilizar perante o credor. O credor não
poderia exigir a prestação devida senão ao obrigado, mas todo o terceiro que tivesse
conhecimento da relação creditória seria juridicamente obrigado a respeita-la, não lhe
sendo lícito induzir o devedor a faltar ao cumprimento, celebrar com ele negócio que o
impedisse de cumprir, nem destruir ou danificar a coisa devida. Deste modo, a
responsabilidade delitual ou extracontratual abrangeria não apenas a violação dos
direitos absolutos, em geral, e dos direitos reais e de personalidade, em especial, mas
também a infração dos direitos de crédito cometida por terceiros.
Sendo a obrigação relativa, parece que ela só pode ser oposta ao devedor, mas,
se considerarmos que a obrigação tem eficácia externa, então os terceiros terão que
respeitar as obrigações assumidas por outrem, sob pena de responsabilidade.
Alguns autores vieram defender a eficácia externa das obrigações para que
fosse possível que o credor viesse exigir, não apenas do devedor, mas também de um
terceiro, uma indemnização pelo não cumprimento da prestação que lhe era devida.
Mas Carneiro da Frada considera mais adequado optar pela doutrina clássica,
que só admite que o credor possa pedir uma indemnização pelo não cumprimento ao
devedor. Nesta linha, o credor não pode pedir ao terceiro, ainda que aliado/cúmplice do
devedor, uma indemnização pelo não cumprimento da prestação devida pelo devedor.
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De facto, todos nós estamos vinculados, genericamente, por um dever de não
celebrar qualquer espécie de contrato que possa perturbar, de qualquer forma, um direito
de crédito alheio. Mas Carneiro da Frada entende que é manifestamente exagerado dizer
que há uma obrigação genérica, indiscutível e de princípio no sentido de todos nós
evitarmos celebrar qualquer contrato que possa prejudicar direito de crédito alheio.
O Direito Civil tem expedientes para, em alguns casos, permitir que haja
responsabilidade. Alguns falam numa tutela mediata do direito de crédito, pois há
institutos jurídicos que permitem uma proteção indireta do direito de crédito:
a) Abuso do direito (art.334º CC): Este pode ser aplicado para, em casos
particularmente gritantes, se conseguir a responsabilidade de terceiro que colabora
com o devedor na violação de direito de crédito ou que instiga o devedor para a
violação do dever de crédito.
b) Concorrência desleal: Numa economia de mercado, em que há concorrência,
tem que ser admitida a celebração de contratos incompatíveis com outros contratos em
vigor. Ganhar para si outros contratos, prejudicando outros credores é, em si, lícito,
dentro do âmbito da concorrência, mas haverá concorrência desleal se o desvio da
clientela for feito através de procedimentos que
→ Art.1306º CC: De igual faculdade não gozam os interessados no domínio dos direitos
reais. Quanto a estes, não é permitida a constituição, com caráter real, de restrições ao
direito de propriedade ou de figuras parcelares deste direito senão nos casos previstos
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na lei; toda a restrição resultante de negócio jurídico que não esteja nestas condições
tem natureza obrigacional.
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Com efeito, a tutela das representações não é o objetivo principal do Direito,
pois o Direito visa a justiça e não aquilo que cada um de nós pensa ser a justiça.
Neste sentido, devemos pensar o mais objetivamente possível, porque o Direito
reporta-se ao mundo da justiça.
Todavia, as representações que possamos ter são tuteláveis e merecem, muitas
vezes, tutela, sob determinados pressupostos. Essa tutela da confiança, que não é um
vetor indiscriminado, tem pressupostos específicos, nomeadamente a hipótese de haver
normas que tutelem a representação das pessoas.
→ Art.334º CC: Quem provoca confiança no outro deve respeitar essa confiança e,
portanto, o exercício do direito que vai contra essa confiança é impedido através do
abuso, que até pode ser fonte de responsabilidade.
Nestes termos, é possível movimentar cláusulas gerais para a proteção da
confiança, mediante o preenchimento de certos requisitos. Quando aplicamos
cláusulas gerais e nos reportamos à tutela da confiança, temos que fazer a prova de
que estão verificados os requisitos dessas cláusulas.
Outra cláusula geral que poderá ser utilizada para proteger a tutela da confiança é a
cláusula da boa-fé.
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→ Art.762º CC: Consagra a regra da boa-fé.
Se são criadas expetativas e, depois, elas são frustradas, aplica-se a regra da
boa-fé. Às vezes, ela até vem complementar uma deficiente ou insuficiente redação
de contratos ou um programa obrigacional ineficientemente traçado.
A regra da boa-fé não visa só a proteção da confiança dos sujeitos, mas também,
por vezes, a correção do comportamento no tráfego jurídico, independentemente
das expetativas dos sujeitos.
→ Num contrato, o indivíduo tem direito a um comportamento correto do outro,
independentemente das expetativas que os sujeitos tenham em relação um ao outro.
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Este princípio consiste na possibilidade de o credor, em caso de não
cumprimento, executar o património do devedor para satisfação dos seus créditos.
p.e., adoção de cláusulas contratuais – X prometeu vender o andar, logo está obrigado a vendê-lo, mas
só está obrigado porque quis através de um contrato-promessa.
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das suas posições, se isso não acontece, significaria que ele poderia manipular o juízo
que a ordem jurídica traça sobre o seu conteúdo.
→ A ideia da autonomia privada é uma expressão da realidade ontológica dos
sujeitos que nasceram para ser livres; é no Direito das Obrigações que se reconhece
essa liberdade do sujeito.
→ Autonomia privada formal e Autonomia privada material – os sujeitos têm
autonomia para celebrar contratos, mas não podem, todavia, dispensar a tutela das suas
posições, se isso não acontecesse significaria que ele poderia manipular o juízo que a
ordem jurídica traça sobre o seu conteúdo.
Não se pode prescindir princípio de autonomia que sempre vigorou. Diz-se que é mais
eficiente do ponto de vista económico, as pessoas alocam as suas preferências.
Este princípio não existe apenas porque convém ao mercado, embora sejam
pontos de vista importantes, mas antes das empresas e do mercado, estão na liberdade
ética das pessoas, saber qual o espaço de liberdade da pessoa na sociedade, no
entanto, isso é uma questão que não interessa no âmbito do direito das obrigações
A ordem jurídica assume essa liberdade do sujeito e não se desinteressa
totalmente, na medida em que, reconhece que direitos podem ser objeto de abuso, da
maneira como essa autonomia é exercida, a autonomia é para ser bem exercida, daí que
essa autonomia esteja em tensão com o princípio da justiça contratual que é um
princípio também ele importante do ordenamento jurídico.
→ Nos contratos o ordenamento jurídico tem muitas limitações da autonomia privada,
ordem pública de proteção contratual no DT, CCG. Há exigências mínimas de justiça do
qual a ordem jurídica não prescinde. Deixando de lado estas exigências, consideramos
que temos uma CCG que é o negócio usuário – ligação com a forma como o contrato é
celebrado. Aquilo que a OJ quer responder é a desproporção daí resultante.
No âmbito da nossa disciplina o direito procura não meter no julgamento da justiça o que
os sujeitos fazem ao celebrar os contratos, considera-se que o entendimento que para
eles é justo, implica que não se imponham medidas externas.
Há a preocupação da OJ em vigiar a forma como o contrato se formou e se expressou,
por isso é que se fala em ónus da comunicação para que a contraparte seja informada
e que temos uma decisão racional. O exercício da autonomia privada mesmo em sentido
material não chega para assegurar a justiça na formação dos contratos.
Segue-se o controlo do próprio conteúdo do contrato que deve ser adequado,
porque via de regra a OJ não polícia o conteúdo do acordo, limita-se a policiar a forma
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como o acordo é feito, desde que o acordo esteja bem formado a ordem jurídica «lava
as suas mãos».
→ a boa-fé é um elemento psicológico, mas porque é que não é ética, como tem de ser
ordinariamente?
Quando há uma simulação não somos obrigados a ter mais cuidado pelas asneiras que
os outros fizeram. Quem coloca o problema tem de levar com as consequências. Não é exigível
que o terceiro tome mais cuidado do que aquele que deveria ter se não existisse problema.
O direito está feito para pessoas do bem, não devemos ter um cuidado extra porque
devemos poder presumir que os outros atuam licitamente. Na nossa disciplina interessa muito a
boa-fé como regra de conduta ou dever de comportamento, comportamento esse que aparece
antes, durante e após a relação obrigacional. É uma medida objetiva aquela que está presente
no art.º 437º, CC.
A boa-fé no direito civil tem ainda outro aspeto importante, que diz respeito ao abuso do
direito e a proteção da confiança.
Quanto ao abuso do direito podemos dizer que todas as posições jurídicas de vantagem
que conferem ao sujeito liberdade tem um sentido ético jurídico sendo que há limites:
→ a boa fé, os bons costumes, a função económica e social do direito; não é fácil
distingui-los, mas há poderes que estão funcionalizados, o poder parental,
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p.e., se os pais abusam do poder, temos abuso de direito por violação da função económica ou social do direito.
O limite dos bons costumes – há limites de decência, há exigências mínimas, sem que
ninguém se possa desculpar, que ninguém está eximido, são comportamentos exigíveis a todos,
a boa-fé disciplina relações, portanto, é uma medida mais exigente, todos devem comportar-se
de acordo com os bons costumes.
Interessa-nos particularmente a boa-fé, porque através desta possibilidade de aplicação do
abuso do direito, a ordem jurídica opera a chamada proteção das expetativas/confiança.
Esta proteção é vinculada através da boa-fé – usucapião. É um vetor que opera também em
limites e que faz uma presença relevante na nossa cadeira.
• Princípio da Confiança – É algo que está presente como valor ou objetivo fundamental
da ordem jurídica em qualquer situação.
A maneira que o Direito tem de resolver os conflitos é através da justiça e esta
não pode deixar de corresponder às expectativas das pessoas.
A proteção das expectativas está omnipresente (no discurso jurídico, na
argumentação dos juízes apenas que implicitamente, etc.). Nem sempre, ou muitas
vezes, as questões jurídicas não são para responder às expectativas das pessoas.
A justiça é verdade que tem a ver com as expectativas das pessoas, justiça é
algo de objetivo. Entre convicções conflituantes intervém a justiça para tomar uma
decisão sobre critérios objetivos.
Embora a confiança represente um objetivo, uma função fundamental do Direito,
não é na verdade o critério último decisivo. Uma forma de ordenação social segundo a
justiça, há uma medida objetiva. Entre opiniões jurídicas é possível encontrar uma que
seja preferível em relação às outras através da utilização de critérios objetivos e
justificáveis. Não estamos num mundo de relativismo.
→ A proteção da confiança é um instrumento jurídico delicado, porque permite
diferenciar funções em relação às expectativas das pessoas. As expectativas dos
sujeitos são importantes. Falamos da proteção da confiança na boa fé, porque a boa fé
de acordo com a função que desempenha no ordenamento jurídico português, tem entre
outras a função da proteção da confiança (ex.: adquirir mais facilmente por usucapião).
A boa fé não se limita apenas a proteger a confiança, tem mais funções.
Expressa padrões objetivos de conduta do sujeito que não estão dependentes das
representações dos sujeitos. Exigências de comportamento que têm menos a ver com a
confiança do que muitas vezes aquilo que se diz. Mesmo que uma das partes desconfie
da outra, tem o direito de ser informada mesmo que nem sequer se aperceba da sua
vulnerabilidade. Ex: aconselhado do modo que funciona uma máquina, não depende da confiança ou que deixa
de ter.
A responsabilidade pré-contratual não depende de ter confiança ou não,
depende da verificação da violação do princípio da boa fé. O que está em causa são
padrões objetivos de comportamento, como o são o abuso do direito.
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Ex: abuso do direito, criação francesa. Numa pequena comarca de França surgiu um problema- um
indivíduo que tinha uma casa com parede confinante à do vizinho, deparou-se com o facto de o mesmo ter erguido
uma chaminé falsa no seu terreno exclusivamente para retirar a luz ao vizinho. Agia no seu direito de propriedade,
mas o tribunal entendeu que havia um abuso do direito de propriedade porque o que tinha motivado a construção
da chaminé era apenas para prejudicar o vizinho.
É contrário à boa fé, mas com a exclusiva motivação de prejudicar. A boa fé tem esta
dupla face, por um lado para proteger expectativas e por outro lado é uma locação que
exerce exigências de comportamento independentemente da relação dos sujeitos.
Estas cláusulas gerais que estamos aqui a convocar demonstram claramente a
falência de uma construção de ordenamento positivista. Não é uma questão meramente
teórica. O Direito não se pode explicar apenas por aquilo que está na lei, como quando
nos referimos a estas cláusulas gerais. Ex: caso da chaminé, ninguém o consegue
explicar apenas com base na lei- há elementos que estão para lá da lei; condições
práticas do trabalho do jurista; observação do real. As concessões positivistas legalistas
não são de forma alguma capazes de explicar o trabalho dos juristas. A proteção da
confiança é uma ideia muito simpática de proteger a expectativa das pessoas.
Na verdade, podemos dizer que desde sempre o Direito se preocupa com tal
ainda que a autonomia do pensamento dogmático se tenha vindo a verificar em datas
relativamente recentes. A sua principal função é a justiça. Uma ciência jurídica vai tentar
aprofundar aquilo que é pensado.
Canaris, no final do séc. XX, é extremamente relevante. A proteção da confiança
aparece em muitos lugares. Confiança tem sempre a ver com a ignorância de alguma
coisa que é ou corresponde à realidade. Estamos a fazer prevalecer as expectativas
sobre aquilo que, em princípio, é a realidade. A perfusão da proteção da confiança no
DP é grande. A forma como as expectativas são tuteladas varia muito. Tem de ser as
expectativas em si mesmas. Ex: A não presta a B uma prestação a que estava adstrito. Os credores
normalmente confiam nos seus devedores. Quando o devedor não cumpre, pode haver uma frustração da
confiança, mas o problema não é da proteção da confiança, mas sim da justiça.
A ordem jurídica quando impõe a alguém um dever é consequente, não
interessas as expectativas. É sempre um critério subsidiário, um critério de segunda
linha. Ex: A atravessa a estrada porque confiava que o automobilista iria parar. Não estamos perante
um problema da proteção da confiança. Só tem autonomia dogmática quando estejam
em causa situações que só ela deva proporcionar. Em primeiro lugar temos os
instrumentos objetivos. A confiança não é muito facilmente operacional. O princípio é
demasiado vago para poder operar com principal.
Proteção positiva das expectativas - o sujeito é colocado no direito na posição
correspondente em função das expectativas que tem. Ainda que em princípio essa
posição não lhe assistisse. Temos aquilo a que se chama a tutela da aparência. A ordem
jurídica torna muitas vezes aquilo que é aparente como real. Ex: Art.243º nº1 CC - simulação e
da inoponibilidade da simulação a terceiros de boa fé. O negócio do A que é nulo, é havido como válido na medida
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em que um terceiro de boa fé tenha acreditado nele. É como se o negócio fosse válido apesar de não ser. Art.291º
CC – (inoponibilidade em relação a terceiros de boa fé, regra geral, sem ser a regra específica da simulação do
art.243º nº1 CC) a proteção de 3º de boa fé por haver um dolo, uma coação, um erro que gera a nulidade do
negócio.
O que se faz em relação aos terceiros que não sabiam da existência destes?
É protegido mediante determinados requisitos. Apesar de ser parte de um
negócio que está inquinado por uma invalidade é colocado na posição correspondente
àquele que realizou um negócio válido.
A proteção da aparência, ex.: casamento putativo – vício que afeta o casamento, mas tratado
como válido na medida em que haja justificação para que se acredite na sua validade.
A proteção da aparência está no âmbito de institutos variadíssimos do DC. Há
outra manifestação da tutela da aparência. Ex: representação – art.266º CC inoponível a terceiros
se não lhe forem comunicadas. Ex: não leva a procuração, apesar de a ter, ao conhecimento de terceiros. Se o
terceiro não estiver de boa fé não merece essa tutela.
Proteção negativa das expectativas – o sujeito que vê frustradas as suas
expectativas tem apenas um direito a ser indemnizado por aquele que criou e defraudou
essas expectativas. Essa frustração é compensada com um direito à indemnização. Não
é colocado na posição correspondente às expectativas.
P.e., indivíduo que vai a um banco e deposita dinheiro. O indivíduo não vai pedir os poderes exatos que essa pessoa tem para
efetuar aquele depósito.
Quais as garantias que isso nos dá? Que garantias é que temos que essa pessoa vai dar a
alguém com os plenos poderes? Como é que sabemos se aquele funcionário que ali está tem
poderes de acordo com a legislação aplicada?
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Não sabemos! Portanto, temos de confiar na existência de poderes naquele que aparenta ter
poderes de procuração, mesmo que ele não tenha. Para já não falar daquelas hipóteses em que
o funcionário sabe que não tem poderes, no entanto, pratica o ato, porque quer beneficiar para
si mesmo – é uma questão fundamental para a qual o nosso direito civil não dá uma resposta
clara; temos um negócio ineficaz quando se está a celebrar um negócio e a parte não tem
poderes para o realizar,
p.e., não fez o depósito devido do dinheiro que tinha sido acordado aquando da celebração do negócio, isto é, é feito um
pagamento ao credor errado, no entanto, terá depois de pagar ao credor certo, situação esta que gera alguma frustração
na vida dos cidadãos.
Art.º 259º a 261º do Código Comercial – Caixeiros – aqueles que têm a seu cargo a caixa, o
dinheiro, que recebe o dinheiro.
Que garantia existe de que essa pessoa esteja habilitada a receber essa quantia?
Esta questão foi resolvida porque se diz que o pagamento feito ao caixeiro libera o
devedor. O pagamento feito a quem tem aparentemente poderes, porque está no
estabelecimento comercial, faz com que o pagamento a essa pessoa libere o devedor.
A lei admite que o pagamento seja feito ao representante aparente. Situações de
representação aparente, que são de facto reconhecidas no nosso ordenamento jurídico, poderão
ser eventualmente estendidas a situações semelhantes, isto para dizer que a proteção da
confiança não se cinge aquelas hipóteses que estão previstas na lei, mas pode, perfeitamente,
ser estendidas a outras situações que pertençam ao mesmo tipo.
Claro que temos de justificar que alguém possa ficar vinculado do lado de outrem a quem
não atribuiu poderes nenhuns. Nas hipóteses do estabelecimento comercial, quem tem um
estabelecimento comercial tem de ter em conta que podem ocorrer situações de aparência, que
não tenham poderes de representação. Risco do tipo de atividade que exerce. Tem de correr o
risco que haja na cadeira de representação de poderes possam ocorrer falhas, situações
anómalas. Não se podem voltar contra terceiros que têm de ser protegidos. Nós temos proteção
da confiança na aparência para além do que está previsto na lei – art.º 268º CC – norma de
proteção.
Para lá da nossa autonomia ninguém pode perturbar a nossa esfera jurídica. O princípio
está inteiramente intocável, mas percebemos que este precisa de ser matizado em determinado
tipo de situações quando existem atividades que correm riscos que não podem ser transferidos
para outrem em prejuízo de terceiros.
A proteção da aparência não pode ser uma proteção indiscriminada porque o direito
vive da realidade e não da aparência. Não pode tutelar situações por aparentemente elas
existirem. Não pode haver uma tutela jurídica indiscriminada. A ordem jurídica tutela a realidade
e apenas prevê algumas situações que tutelam a proteção da aparência. O que o intérprete
aplicador faz – pode estender criteriosamente essas hipóteses, pode considerar que há uma
analogia, p.e., funcionário das finanças e caixeiro.
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Alguns autores admitem, em vez da analogia o uso do abuso do direito para em situações
em que manifestamente é preciso tutelar quem contrata uma pessoa, diga, então, que o
arrogando não pode invocar a falta de poderes daquele concreto empregado que não tinha nas
funções a que estava destinado, para aquelas atribuições, não poderá invocar o abuso de direito.
Essa hipótese, esse risco para a contraparte, não tendo definido o direito, como uma maneira de
elencar quando a aparência é protegida, em nome da boa-fé invocar a não representação de
poderes, aquilo que seria o exercício legítimo.
Situação típica de abuso do direito – O abuso do direito não é uma função primária da
assunção, mas sim uma função sindicadora, ele aplica-se subsidiariamente.
Por exemplo, entre comproprietários deve haver uma harmonização.
Em relação à tutela da proteção da confiança o venire in contra factum proprio tem uma
imposição fundamental, a contrariedade de comportamentos pertence à autonomia privada.
O que para o direito interessa é saber se as mudanças de comportamento em termos de
justiça afetaram ou não a outra pessoa e se precisam ou não de ser tuteladas, por exemplo, a questão
de trespasse, se houver abuso então tem que ser tutelada a confiança e, por isso, há responsabilidade e deve ser arbitrada
uma indemnização para colmatar o dano gerado.
O indivíduo diz hoje que quer celebrar um contrato: o comportamento contraditório é um
preço que no fundo temos de estar dispostos a pagar se queremos ser livres. Enquanto não
prejudicamos outrem porque não pode haver uma alteração do comportamento.
P.e., A diz que quer celebrar um contrato com B. Mais tarde diz que não quer contratar.
Há um comportamento contraditório, mas não pode ser imposto juridicamente. O
comportamento contraditório não é ilícito apenas se estivermos a prejudicar outrem a defraudar
as suas expetativas. Não vamos ao ponto de justificar essa coerência de comportamentos. Só
quando a incoerência fira expetativas de outrem que careça de ser protegidas em nome da
justiça. A sociedade só funciona com base numa necessidade de acreditar e continuar o
comportamento dos outros.
A Rutura da Negociação
Até ao momento em que se celebra o contrato o sujeito pode desistir de o fazer. Não há
contrato promessa, a boa-fé evidentemente que faz as suas exigências, e uma exigência
fundamental é que o sujeito advirta o outro atempadamente que não está certo que queira
contratar para que o outro não entre em custos, mas não é uma obrigação de contratar, avisar
atempadamente a contraparte de que não se quer contratar, isto sim é o que a boa-fé manda,
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mas não manda contratar, não há dever de contratar, há sim dever de aviso, há dever de não
entrar numa negociação se não há intenção de contratar.
Qual a razão pela qual uma doutrina aponta que há dever de boa-fé para contratar?
• É preciso que haja confiança – quem não acredita nela, não merece ser protegido por
ela;
• Essa confiança tem de ter um domínio de razoabilidade, um mínimo de consistência,
a confiança tem de ser justificada, para evitar que os mais displicentes possam
beneficiar da tutela;
• O problema surge quando há um investimento. A tutela é de investimento da confiança
– enquanto não tiver perdido nada de consistente, não há problema, é apenas uma
desilusão. O que é que temos no art.º 243º CC? Diz-se que o terceiro de boa-fé adquiriu
direitos porque ele acreditou que o negócio jurídico anteriormente celebrado era válido.
No art.º 291º CC, o terceiro é protegido na medida em que adquire algo em troca, por
isso é que é protegido. Se assim não fosse já não merecia tutela.
• É preciso que aquele contra o qual vai funcionar a tutela da confiança tenha criado e
defraudado essa confiança. O negócio jurídico não se celebra porque alguém se
intrometeu – aí não há proteção da confiança a funcionar. A imputação da confiança tem
dois sentidos: há um sujeito a quem tem de ser imputado a criação da confiança e a sua
defraudação. Quanto mais insistentemente um indivíduo tenha criado a confiança de
outrem, mais é importante que a confiança seja relevante e fundamental; a confiança só
existe na medida em que o sujeito contra o qual se vai gerar uma situação em que os
custos tenham sido provocados por ele mesmo, tem de ter sido ele a provocar a
confiança na outra parte – não basta que alguém tenha criado a confiança, é preciso que
quem a criou a tenha defraudado, também; é preciso uma imputação da confiança –
imputação que tem dois sentidos implica que ao sujeito tenha sido imputada a
provocação da confiança. O problema só surge quando alguém defrauda a confiança;
• É importante um juízo global. A proteção da confiança só protege quando haja um
sistema justo em que a proteção ocorra, ao contrário não. Temos mesmo de saber se
de facto é ou não uma exigência da justiça.
O problema da proteção da confiança não é o futuro, é a modificação da situação jurídica.
Neutralização
Temos uma situação de confiança decorrente da inação do sujeito por um determinado período
de tempo: por exemplo, havia uma sociedade comercial que apenas era gerida por um dos sócios – o sócio A. Este, a
título de remuneração da gerência, retirava 500 euros da caixa com o conhecimento do outro sócio – sócio B – todos os
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meses. Acontece que o sócio B morre e a viúva cria problemas e diz que A que andou tantos anos a levantar dinheiro da
caixa, deveria repô-los. Quid iuris?
A viúva teria razão, porque não havia deliberação da sociedade a atribuir aquela
remuneração ao sócio. Não houve contradição de comportamento – nunca ninguém manifestou
desacordo no sentido de a remuneração ser paga, nem o sócio B enquanto era vivo.
Há, assim, um silêncio – a situação era conhecida e ninguém reagiu, só passados muitos anos
é que se lembraram. Aqui não há contradição de comportamento, há uma inação que cria uma
confiança que a posição não vai ser exercido. A viúva podia dizer que a partir de agora vamos
deliberar tudo e etc.
O problema da frustração da confiança não é o futuro, é o passado- aquilo que já foi feito e não
pode ser desfeito, sob pena de ser grande injustiça. Isto é abuso de direito- sendo imputável ao
sujeito, ofende a confiança alheia, à custa do dinheiro que o sócio A tirou, ele satisfez os seus
encargos familiares, etc., pelo que não seria justo restituir essa quantia agora.
Sabemos que não havia deliberação dos sócios nesse sentido. Não há contrariedade de
comportamento, é uma pura inação que não deixa de ser abuso de direito – enquanto uma
posição jurídica não estiver prescrita, não é possível ao devedor invocar a confiança de que a
posição não vai ser exercida.
A prescrição é de 20 anos, não foi exercido crédito em 10 anos, o devedor não pode criar a
confiança de que não vai ser exercida a posição.
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→ Outro tipo: também tem a ver com a confiança, mas tem algumas particularidades –
as inalegabilidades formais – nos negócios formais haverá hipótese em que o sujeito não esteja
legitimado a invocar a invalidade formal? Se houver um negócio jurídico sujeito a forma, e se
houver situações em que essa invalidade possa ser invocada pelo sujeito, temos hipóteses de
inalegabilidade formal. As exigências de forma podem ser sempre, se incumpridas, invocadas.
Sendo a forma requisito ad substância do negócio, e pode ser invocada por qualquer interessado,
e até ex officio pelo tribunal. Haverá algum caso em que o funcionamento das regras da
invalidade pode ser paralisado?
O sujeito que vem invocar o vicio da forma possa ter sido ele o causador do vicio de
forma, porque convenceu a contraparte que não era preciso que o negócio jurídico fosse
celebrado daquela forma – pode este sujeito vir mais tarde invocar a nulidade e obter o efeito
restitutório por força do art.º 289º?
Isto foi alvo de algumas anotações (p.e., trespasse – escritura púbica; não foi assim celebrado e pouco
tempo mais tarde, o anterior proprietário veio invocar a nulidade do trespasse por vicio de forma, e exigir a restituição do
estabelecimento. Mas ao que parece, ele sabia bem que o trespasse tinha de ser celebrado por escritura publica, mas
convenceu a contraparte de que tal não era preciso. Quid Iuris?
Esta família que veio instalar-se era de fora, e vendeu tudo o que tinha para aqui se
instalar, mudou toda a sua vida. O impacto desta nulidade do trespasse naquele agregado
familiar, convencido que tinha adquirido validamente. Se aplicarmos literalmente este preceito,
há realmente o poder de declarar a nulidade – mas estão em causa interesses que superam os
interesses das partes no negócio. Imaginando 2 trespasse sucessivos, em que o 1º era sem forma, e o 2º com
forma. Mas então e a parte que causou a nulidade? A regra da nulidade não podia deixar de ser aplicada,
mas as normas não seriam suscetíveis de redução teleológica, não se pode dizer que o negócio
sem forma legal se torna valido, se as finalidades da forma se realizaram.
Mas não se pode dar razão, quando dizem que o abuso de direito não se pode aplicar
a hipóteses de preterição e forma legal nos casos em que uma das partes convenceu a outra –
o abuso de direito não pode intervir? Não é só havendo dolo (porque aí até era mais fácil), mas
e se a negligencia forma grosseira? Uma das partes confia e a outra tem negligência grosseira
e depois quer retratar-se do negócio, através da nulidade. É possível? É, pelo art.º 286, mas com
uma exceção, se houver abuso, e há abuso no caso deste trespasse – se se induzir e frustrar a
confiança da contraparte (a família que se mudou para o Porto, por causa do seu negócio e do
trespasse). É a mesma parte que convence a contraparte e que depois lhe frusta a confiança. O
tribunal não pode declarar a nulidade, porque não pode consentir com o abuso de direito. O
tribunal não é obrigado a declarar a nulidade, a lei permite, não obriga.
(Situação diferente seria, se a esse trespasse invalido, se tivesse sucedido um outro, este sim
válido, alheio à invalidade, e aí o argumento que a família poderia invocar perante este terceiro
já não valeria, não foi este terceiro que criou e frustrou a confiança).
O interesse do terceiro iria prevalecer, tutela negativa de confiança, há uma tutela contra
quem induziu essa confiança, mas é uma tutela que não pode operar através da paralisação do
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exercício, mas tem que operar através do mecanismo indemnizatório e é dessa forma que vamos
conseguir uma justiça possível.
Por exemplo: havia um sócio que tinha meia dúzia de ações – 0.001% - esse sócio não foi convocado para as AG que eram
necessárias para ir em frente com o processo de privatização do banco. Não foi convocado e assim, intenta uma ação
judicial – esta posição do socio tinha de ter vencimento quanto ao direito estrito – todos os negócios jurídicos assentes
nessas deliberações inválidas tinham de cair e o processo teria de ser reiniciado com grande prejuízo. Como é que o tribunal
decidiu?
→ Outra nota: o abuso do direito tem no art.º 334º, CC – esta norma não nos diz com
toda a clareza que tipo de consequência se devem associar aos atos abusivos porque a
estatuição da norma limita-se a dizer que é ilegítimo o uso do direito. Por isso esta estatuição
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precisa de ser especificada. Se o ato abusivo for um ato jurídico então efetivamente a forma de
reação com a OJ não pode deixar de ser a nulidade. Se o ato gera prejuízos a consequência é
a da responsabilidade civil. O abuso do direito pode levar a uma preclusão do exercício do direito
fazendo com que não seja possível exercer aquela pretensão. Se se tratar de neutralização a
consequência é a paralisação. A proteção à confiança exige a proteção do exercício feito.
O abuso do direito é uma norma que paira por cima das outras normas, é o exercício
dessas posições jurídicas e, por vezes, dá resultados inconvenientes. O direito corrige
inconveniências na aplicação de certas normas, portanto é subsidiário. Não se deve apelar ao
abuso do direito por tudo e por nada. O sistema jurídico está constituído por diversas camadas
de normas, e o abuso do direito está num plano um tanto superior. As cláusulas que remetem
para valores fundamentais do direito, partilham o plano superior com o auso do direito e por isso
se manifestam exageradas. Há um exagero obvio, quer a proteção da confiança quer a
necessidade de respeitar a proporcionalidade, quer a capacidade de proteger o mínimo, são
todas exigências profundas.
No direito romano o devedor correspondia não só pelo património, mas também pela sua
pessoa. O direito podia aprisioná-lo e se a situação continuasse podia cortejá-lo e atirar as suas
4 partes ao tigre. Tudo isto evoluiu paulatinamente e realmente acabou por se evoluir desta
responsabilidade pessoal do devedor para uma responsabilidade patrimonial.
No DO temos como norma central o art.º 817º CC que atribui ao credor a chamada ação
de cumprimento, as providências cessadas ou adequadas para exigir o cumprimento da
obrigação do devedor lhe pode permitir executar o património do devedor e fazê-lo pagar pelos
seus bens.
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do património do devedor. Qualquer um dos credores beneficia desta garantia. Claro que ao
dizermos que respondem aos bens do devedor é possível entender que tal não desconhece que
há patrimónios separados, podem existir patrimónios autónomos que respondem apenas por
certas dívidas (art.º 184º CC), p.e., uma herança não responde pelas dividas pessoais do
herdeiro. Há uma ignorabilidade – todos os bens respondem, exceto aqueles que são
indispensáveis à vida do devedor, p.e., pode-se penhorar a TV do devedor, mas já não se pode penhorar a cama
do devedor.
Depois vamos ter em conta que os credores estão todos em posição de igualdade, no
entanto, se a garantia for insuficiente, garante a satisfação dos seus interesses o que mais
rapidamente o conseguir. O credor que mais depressa intentar a ação de cumprimento, mais
depressa se consegue satisfazer, e os restantes não terão património para satisfazer o seu
interesse.
Às vezes, a garantia faz com que os bens do devedor se possam juntar bens de terceiros,
p.e, o fiador que responde pela divida que não é sua. São garantias pessoais prestadas por
terceiros que respondem com os seus bens à garantia do crédito. Depois temos as garantias
reais que já não têm a ver com pessoas, mas sim com a afetação de determinados bens a
determinados credores para a satisfação das suas dívidas.
Uma delas tem a ver com a pretensa da Patrimonialidade da obrigação. A prisão por
dívidas desapareceu do nosso ordenamento jurídico. A pergunta que se coloca é:
Se o facto de o devedor responder significa necessariamente que a obrigação tem de ter carater
patrimonial? A obrigação em si mesma tem de ter carater patrimonial, valor pecuniário, ou não?
P.e., pode constituir-se em obrigação a retratar-se publicamente num jornal afirmando a verdade dos factos contra
difamação a quem a proferiu?
A resposta está ao abrigo do art.º 398º CC – não necessita de valor pecuniário, não
precisa de ter um preço, pode corresponder a uma atividade que não tenha esse valor pecuniário,
até porque não tem mercado para ela, o que é necessário é que a prestação corresponda ao
interesse do credor de proteção legal – p.e., pessoa que se compromete perante outrem a dar determinada joia
que lhe foi dada por um inimigo – para este tipo de situações que provem de manias, gera
subjetividades, a ordem jurídica não serve para acautelar. Já serve para situações que apesar
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de não ter valor pecuniário merecem proteção legal, p.e., promessa de casamento – interessa o interesse do
credor.
Temos que, hoje em dia, o nosso sistema admite a compensação. É evidente que a
pessoa que é difamada, tenha um dano, de natureza moral, que não pode ser eliminado em
espécie, não há nenhuma situação restitutiva que possa repor a situação, mas essa pessoa pode
beneficiar de uma compensação por dano moral – art.º 496º, CC – há hoje uma indemnização
por danos morais, uma compensação que restitua uma situação. Portanto, há uma tutela para
estas situações. A dívida pode ter caráter não patrimonial, p.e., não tocar piano depois das 22 horas, mas
também pode satisfazer um interesse patrimonial, portanto, uma mesma prestação pode servir interesses patrimoniais e
não patrimoniais em simultâneo.
O que acontece é que não havendo exigibilidade de obrigações que decorrem de outros
estratos normativos trazem alguns deveres de cuidado, que por via da boa-fé não se tratam
deveres de prestar, mas sim de deveres de conduta p.e., grupos de caça, não apresentam obrigações
jurídicas, mas são obrigações em sentido técnico, quem vai numa linha de caça tem de haver cuidado para que nenhum
deles seja atingido por um disparo negligente do companheiro.
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MEDIAÇÃO
A mediação das obrigações pode-se contrapor à imediação dos direitos reais, no primeiro
significa que o credor só vê satisfeitos os seus interesses mediante a atividade do devedor, na
medida em que este cumpra a obrigação que satisfaça o interesse do credor. Nos direitos reais,
há imediação, há um direito imediato e direito sobre a coisa – claro que pode haver algum que
colida com esse exercício, mas quando o titular do DR pretende exercer o seu direito, ele exerce
um direito imediato sobre a coisa. No direito das obrigações o titular só tem exercício do direito
mediante cumprimento do devedor. O que o Tribunal faz é retirar a mediação em caso de
incumprimento.
Por exemplo: No contrato de compra e venda é evidente que o art.º 879º nos diz que temos de entregar a coisa, o
comprador tem direito à coisa, o direito é o de que o devedor lhe entregue a coisa, temos uma prestação de dar.
Aqui, quando se transmite validamente a coisa, o titular da coisa pode também exigir a
entrega da coisa através de uma ação de reivindicação, reivindicar a coisa de quem está na
posse. Na compra e venda pode haver de facto situações que para obter a coisa pode-se intentar
uma ação de cumprimento contra o devedor ou não invocar a propriedade.
RELATIVIDADE
Os direitos reais são absolutos e as obrigações são relativas. Dizemos que o vínculo
obrigacional é apresentado como um vínculo relativo pelo DC, a reforçar esta relatividade que já
se descortina no art.º 597º CC, ao abrigo do art.º 406º temos que em relação a terceiros o
contrato só produz efeitos em casos especificamente previstos na lei. As obrigações emergentes
do contrato são relativas, não produzem efeitos face a terceiros, nem para o bem nem para o
mal.
Parece que a resposta à pergunta se é relativa ou não é que SIM, são relativas, a única
pessoa que parece poder violar a obrigação é o devedor. P.e., contrato de empreitada – empreiteiro que
faz mal o seu trabalho, viola a obrigação que tinha de concluir a obra sem defeito e entrega uma obra deficiente.
Até aqui falamos da doutrina clássica, até que surge uma doutrina da eficácia
externa, que diz que a obrigação pode não ser só relativa, uma doutrina que rejeita a
relatividade das obrigações e que reconhece que do ponto de vista estrutural a obrigação é
relativa – credores e devedores determinados – mas do ponto de vista da responsabilidade
quando a obrigação não é cumprida e há uma intervenção de terceiro, este é passível de
responder? Esta doutrina da eficácia externa da obrigação diz que o terceiro também responde.
Esta doutrina tem algumas boas razões, mas admita-se que, já na opinião do professor Carneiro
da Frada, a doutrina clássica é a mais certa, e para o professor as obrigações são relativas e
não têm eficácia externa. Vamos ver como é que se respondem aos problemas de intervenção
de terceiros que esta última doutrina levanta.
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Por exemplo: uma cantora que na ida do aeroporto para o hotel e apanha um táxi tem um acidente, cancelando o
espetáculo. O dono do espetáculo que deixou de vender bilhetes porque o espetáculo foi cancelado, tem uma pretensão
indemnizatória contra o taxista? Se o taxista transporta e identifica a cantora torna-se responsável se, porventura, atua
com alguma pequena negligência que todos nós podemos fazer enquanto condutores.
Por exemplo 2: E aquele individuo que furta o relógio que o devedor devia entregar ao credor? Relógio esse que
se destinava a uma exposição de relógios. O credor, que não é proprietário, tem, aqui, direito a uma pretensão contra o
autor do furto? Trata-se de questões difíceis de responder.
Concluindo, ainda quanto ao caso do taxista, ele não deverá, em princípio, responder, a não ser que tenha agido com dolo.
Para a generalidade dos autores a tutela do crédito contra terceiros é uma tutela que
não é automática, imediata, mas opera através de institutos particulares em que se se verificarem
os respetivos requisitos podem desencadear a responsabilidade civil, p.e., abuso do direito – se
atuar abusivamente atuará de forma ilícita.
Por exemplo, um canalizador, ao não cumprir o contrato com outra pessoa, se ele quiser mudar essa minha influência
apenas para prejudicar um terceiro, ele torna-se responsável, mas porque agiu abusivamente, de outra maneira não seria
responsabilizado. A tutela nestes casos é imediata – no abuso de direito e na concorrência
desleal.
Aquele que colabora com o devedor na violação do crédito torna-se responsável para com o
credor?
53
Aqui falamos numa outra doutrina – Doutrina do Terceiro Cúmplice – o cúmplice na medida
em que partilha da intenção danosa de prejudicar o credor, e quem atua neste propósito, torna-
se obviamente responsável. O cúmplice não é responsável porque há um dever que lhe assiste
especificamente, ele tem um dever de não prejudicar ninguém intencionalmente.
A obrigação não tem eficácia externa, não significa que não possa haver situações de
responsabilidade de terceiros que interfiram num vínculo obrigacional, mas não é uma
responsabilidade que se possa efetivar através do art.º 483º, CC – responsabilidade aquiliana
(cláusula geral) – disposição que só vale para direitos absolutos, não tutela direitos de crédito,
não inclui a proteção de direitos meramente relativos. Esta cláusula de direitos de tutela de
crédito não diz que são direitos absolutos, mas também não diz que tutela direitos de crédito.
Quando dizemos que a tutela de crédito não é uma tutela imediata, não estamos a dizer
que o crédito numa circunstância específica não possa ser invocado contra terceiros, que o
crédito não possa ser oposto a um terceiro, sempre que houver razoes para isso (o ordenamento
jurídico prevê essa possibilidade). Claro que um credor na entrega de uma coisa, p.e., no caso
do dono da obra e o empreiteiro através do mecanismo da ação direta pode apressar-se da coisa
que deve ser entregue pelo empreiteiro, se a pessoa contra a qual vai exercer ação direta não
tem direito real incompatível, não tem direito de propriedade.
Por exemplo: A tem um devedor B que tem um credor C – B deve 500 ao indivíduo A e, por sua vez, C deve 500 a B à o
credor A caso o seu devedor não exerça o seu crédito perante terceiro, esse credor pode substituir-se ao seu devedor no
exercício de um crédito perante terceiro, ou seja, temos a possibilidade de invocar um crédito a um terceiro, mas não
podemos admitir a invocabilidade de um crédito perante qualquer terceiro.
Outro exemplo: F, filho de P, é credor de alimentos de P. P é atropelado por X e fica impossibilitado de trabalhar.
Pode F exigir a X a prestação de alimentos invocado o seu direito de crédito? Art.º 495º CC.
Por exemplo: A é devedor da entrega da coisa X, ao senhor C (direito de crédito) – temos uma obrigação de dare – A
vende o quadro ao indivíduo A (direito real) – prevalece o direito real sobre o direito de crédito. O credor tem apenas o
direito a que o devedor lhe entregue a coisa, mas não tem um poder direto sobre a coisa. B tem um poder direto e imediato
sobre a coisa, a coisa pode ainda não lhe ter sido entregue, mas de facto esse poder é-lhe atribuído, ele tem o direito sobre
a coisa (direito de sequela) e tem o poder jurídico de exigir a coisa.
Os direitos de crédito ficam sacrificados ainda que tenham sido substituídos anteriormente. B até podia saber do
compromisso de A para com C, mas decide comprá-lo. A posição de C não tem uma mais-valia em relação à posição de B.
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A doutrina da eficácia externa não permitia isto, não funciona. É titular de um direito real e por isso prevalece.
Imaginando, A vende a C e depois vende a B – dupla venda – a segunda venda é uma venda de bem alheio – falta legitimidade
para alienar a coisa.
A venda de bens alheios é nula e claro que não pode opor ao titular do direito real – o primeiro comprador. Esta regra
realiza o princípio da preferência ou prevalência dos direitos reais – prevalece primeiramente constituído, mas esta
regra não funciona nos direitos de crédito. O corolário desta regra, se A vendeu a C e depois quer vender a B, tem um
problema de legitimidade (algo que já não é dele) – «aquisição a non domino».
É evidente que no caso dos créditos, qualquer um é válido, seja o primeiro a ser
constituído ou não, ele tem de escolher. O canalizador não pode estar nos dois lados, p.e., ele
tem de escolher. Quando há conflitos com direitos de crédito, não prevalece nenhum, o devedor
é que sabe, o devedor que se vincula vai ter de escolher aquele perante o qual vai responder
perante o incumprimento.
Imaginemos que A vende a B e depois vende a C – há aqui uma situação de dupla venda. De acordo com a regra
da prevalência, o direito real primeiramente constituído sobreleva ao segundo – a posição de B prevalece sobre a de C –
mas o registo introduz uma alteração – B só pode opor o seu direito a um terceiro se C não tiver uma posição registral,
porque se C regista, mas B adquiriu primeiro, não pode opor a sua posição a terceiro.
O que está em causa na exigência do registo é a forma de resolver o conflito entre dois direitos
reais. Nem todos os direitos reais decorrem de factos constitutivos que necessitem de registo –
se estiver em causa uma joia, por exemplo, a alienação não está sujeita a registo, portanto,
prevalece a posição do primeiro adquirente sobre a posição do segundo adquirente.
Num prédio, a situação já é diferente – aquele que adquire de quem tinha o prédio
registado em seu nome, confiando nesse registo, precisa dessa proteção perante outros
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adquirentes que tenham adquirido em primeiro lugar. É uma matéria que está à margem do
direito das obrigações, porque temos conflitos entre dois direitos reais
Nota: Para percebermos bem o sentido destas soluções é preciso notar que no
subconsciente das várias reflexões, está o problema da responsabilidade civil.
Por exemplo, A constitui crédito de 1000 euros a favor de B e depois a favor de C – se o devedor só dispõe de
1000 euros, então, concluímos que o seu património obviamente não chega para satisfazer os dois créditos constituídos.
Como todos os credores têm direito por igual de satisfazer o seu crédito, o credor que for mais diligente e célere a ameaçar
o património do devedor “ganha”, isto é, satisfaz o seu crédito, sem prejuízo do outro credor.
A “distribuição pro rata” (uma expressão latina que tem um sentido de divisão, podendo
ser traduzida livremente como algo que é ‘medido proporcionalmente’) como os credores são
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todos iguais e não prioridade dos credores sobre os outros em função do momento que
constituição dos seus créditos, aquele que for mais célere satisfaz-se primeiro, os que vem a
seguir “contentam-se com o que lá está”. O credor apenas cuida de si. A exceção disto é que
pode haver acordo para ação comum, mas não precisa, nem sequer quando o devedor não tem
património suficiente. Há também, na senda do que temos vindo a dizer, a possibilidade de
liquidação total das dívidas de uma pessoa, que consiste no processo de insolvência – a
insolvência é um processo de liquidação universal do património do devedor, ao qual são
chamados todos os credores, são convidados a exercer os seus créditos. O facto de que um
devedor ter muitos credores e não estar em condições de satisfazer todos, resulta que, em
determinadas circunstâncias, é possível iniciar este processo se o património do devedor for
insuficiente, pelo que um credor pode preferir, por qualquer razão, desencadear um processo de
liquidação universal das dívidas desse devedor. Dessa forma, líquida todo o património do
devedor suficiente para colmatar os seus créditos e todos os credores vão ser chamados para
exercer os seus créditos. O credor hipotecário vai à frente do credor comum, por exemplo. O
credor hipotecário é satisfeito antes do credor comum. Sendo credores comuns, divide-se o
património dele por todos. Fora desse âmbito, cada um cuida de si, em posição de perfeita
igualdade.
Há muitas razões pelas quais podemos considerar que o que está certo é que a obrigação é
relativa, que não há eficácia externa, mas tal não significa que um credor não possa obter a tutela
do seu interesse através de terceiro, quando houver outros institutos que o facultem – ninguém
discute isto. As hipóteses que a lei resolve não trazem qualquer problema, o problema é o que a
lei não diz explicitamente, mas de acordo com o sistema, não há eficácia externa das
obrigações.
Para alguns trata-se de direitos obrigacionais, relativos, e, por isso, incluídos no livro
do direito das obrigações, enquanto que para outros se trataria de direitos reais ou de figuras
não reconduzíveis ao direito das obrigações.
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Ao abrigo do art.º 407º CC – prevalece o direito mais antigo em data, sem prejuízo das regras
próprias em juízo. Imaginemos que A aluga o automóvel a B e aluga depois o mesmo automóvel a C – há um conflito
entre direitos pessoais de gozo. Como resolvemos? Segundo a lei, prevalece o direito mais antigo,
dando a impressão que aqui vigora o princípio da prevalência, característico dos direitos reais.
«Direitos pessoais de gozo» é uma designação que tem na sua origem um jurista
italiano Virgilio Giorgiani – não são direitos de crédito comuns, porque nesses o credor só tem
direito a uma prestação do credor, mas estes têm uma particularidade: são decorrentes de uma
relação pessoal entre duas pessoas, em que se atribui ao credor um direito sobre a coisa.
Vejamos o exemplo da locação – temos um locador que, por contrato, se obriga a prestar o uso da coisa ao
locatário, há relação pessoal a semelhança de qualquer relação creditícia, mas decorre para o
locatário o direito de usufruir da coisa – serão direitos de crédito que concedem ao seu titular
o direito de aproveitar o uso da coisa. Esse é um traço comum da posição do locatário, do
depositário, do arrendatário, etc.
Por outro lado, alguns autores dizem que os direitos pessoais de gozo são verdadeiros
direitos reais e, portanto, estão mal colocados no CC – pelo que deveriam estar no livro III e
não no livro II.
A lei portuguesa concedeu direitos pessoais de gozo como direitos de crédito, daí o
interesse para a nossa disciplina. Como resultado disto, o gozo da coisa é o resultado da
prestação da contraparte – o locatário tem o gozo da coisa porque o locador lhe concedeu essa
prestação. O comodante não pode interferir no gozo da coisa por parte do comodatário –
emprestou e depois não pode prejudicar. O comodante deve abster-se de atos que impeçam o
uso da coisa pelo comodatário. Este que não é obrigado a assegurar o uso da coisa ao
comodatário, é um favor – há uma relação jurídica contratual, mas é diferente. Portanto, são
direitos pessoais decorrentes de uma relação com outrem.
Alguns autores, como Oliveira Ascensão, defendem a natureza real destes direitos,
dizendo que são verdadeiros direitos reais e que nada têm de direitos pessoais, assim como
Menezes Cordeiro. Que argumentos favoráveis existem?
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arrendatícia. Este é um regime específico da obrigação, não é um regime que se aplique
em geral. Para Menezes Cordeiro, isto é um direito de natureza real.
Para a doutrina clássica, por outro lado, defende-se que:
• O regime da locação não se aplica no geral, na ausência do art.º 1057º, CC não seria
possível – esta regra só está prevista para a locação. Por conseguinte, o direito do
locatário é um direito meramente pessoal. A regra da locação permite alguma dúvida,
mas aceita-se que essa regra, concebida para proteção do locatário, é específica e se
ela não existisse, a posição do locatário não seria protegida face ao novo proprietário.
• A regra do art.º 407º CC não é muito feliz, significa que no âmbito dos direitos pessoais
de gozo temos prevalência daquele primeiramente constituído. Isto não permite
atribuir eficácia real a estes direitos. Se se atribui ao locatário a defesa da sua posse, a
tutela está limitada pelo âmbito da tutela possessória. Nos direitos reais, o titular tem a
garantia da reivindicação contra o possuidor não proprietário. Na reivindicação o
proprietário não possuidor exige a entrega da coisa. Na locação o que está previsto tem
apenas meios possessórios, a lei não lhe atribui um meio correspondente ao direito
real. A ação possessória caduca se não for exercida no prazo de um ano a partir do
momento em que o sujeito está apossado da coisa. Quem tiver a posse de uma coisa
por mais de um ano, fica essa pessoa a beneficiar da tutela possessória contra o
anterior possuidor – esta limitação só opera no prazo de um ano, sendo que também
se aplica ao locatário, assim, se o locatário não defender a sua posse, ele não tem mais
possibilidades de defesa – caduca o seu direito se ele no âmbito de um ano não o
exercer.
Estamos a falar de uma discussão doutrinária, que tem subjacente grandes problemas práticos.
Se os direitos pessoais de gozo não são direitos reais, significa que, onde a lei não proteja a
oponibilidade a terceiros, os direitos pessoais de gozo não são oponíveis perante direitos reais
que estão em conflito com eles. Os direitos do locatário, depositário, etc., são derivados das
ações relacionadas com as pessoas e não com as actiones in ren. Depois temos que,
efetivamente, nos termos do art.º 1306º CC – numerus clausus do livro III – diz respeito aos
direitos reais previstos no livro III e não nos que estão em livros diferentes.
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do parceiro pensador ou do depositário, não se adquire pela usucapião, este que só existe na
medida em que a locação seja violada, porque é um direito derivado, cuja fundamentação
depende do direito do locador. O direito do locatário só existe na medida em que a locação seja
válida, porque ele é derivado dessa relação.
Exemplo: Vamos supor que A dava de arrendamento a B, mas que a coisa era de D – obviamente que, sendo a posição de
B uma posição pessoal de uma relação de crédito, a sua posse depende da posição de A, na medida em que haja um direito
de outra pessoa prevalecente sobre a posição de A, o que acontece neste caso, porque A não era o senhorio – resulta que
a posição do locatário cede, logo, como este é um direito pessoal, um direito derivado, ele depende da regularidade da
posição de A, que neste caso não é proprietário, então, a posição de B fraqueja perante a de D. Se a locação tivesse sido
celebrada por quem tivesse legitimidade para a celebrar, tudo bem.
Outro exemplo: A vende a B um relógio. Como é que B demonstra que é proprietário? C diz que o relógio é seu,
e B diz que é seu porque adquiriu o relógio de A. Mas quem é que garante que A é o verdadeiro proprietário? Ou que A não
o roubou de C? Não chega invocar o facto transmissivo do direito que se alega para demonstrar um
direito real, porque o facto transmissivo pode estar incorreto, quem transmitiu podia não ter
legitimidade para tal. Para demonstração do direito real, é preciso chegar a um facto
constitutivo originário – só o consegue provar se for possuidor ao tempo da usucapião, mas
a usucapião não é a única forma de aquisição originária, claro, p.e., a acessão natural ou a
artificial também o são. Portanto, quando houver dúvidas sobre quem é o proprietário, recorre-
se às figuras de aquisição originária.
Se as ações forem de direitos de crédito temos uma situação diferente, para constituir
uma situação de crédito não é preciso que o devedor tenha legitimidade real para o efeito –
para que o A fique vinculado pelo contrato de locação comum B não precisa que B seja
proprietário – ele pode ter recebido a autorização do próprio proprietário ou pode ter adquirido
tal legitimidade de outra forma. Para a posição do locatário não é preciso demostrar através de
factos constitutivos, porque a locação não é um direito real, pode exigir do locador a defesa da
sua posse, exibindo o contrato de locação, não precisa de demonstrar a legitimidade do locador.
Se se tratasse de direito real, sim.
Há ainda a acrescentar que sendo direitos de natureza pessoal, não estão sujeitos a
numerus clausus – pode haver direitos para lá do que a lei apresenta no livro II.
O elenco das fontes das obrigações que está previsto no Código Civil é ou não adequado?
• Contratos
• Negócios jurídicos unilaterais
• Gestão de negócios
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• Enriquecimento sem causa
• Responsabilidade Civil
Fora desta sistematização, sobram as obrigações não autónomas, uma série de fontes
mais circunscritas relacionadas com situações particulares, a situação daquele que está numa
situação particular relativamente a outrem, por força de vínculos sucessórios, familiares e reais.
Entre o contrato e o delito sempre se percebeu que havia outras figuras que não
encaixavam em nenhum dos dois, p.e, quando uma pessoa causa dano alheio a outrem, mas
por negligência, de facto, essa situação pode até gerar responsabilidade civil, mas foge ao
padrão do delito que, à partida, requer dolo, os crimes negligentes são uma exceção.
Outras hipóteses parecidas com contratos, mas que não são contratos podem também
existir – p.e., indivíduo A vai passar férias ao Algarve, e deixou o cão com o vizinho B, este que vem a comprar ração na
falta da mesma, ainda que sem a autorização e na ausência de A – o proprietário A tem ou não o direito ao pagamento da
ração quando voltar de férias? É como se houvesse um mandato, mas de facto faltou a autorização –
há uma hipótese quase contratual.
É uma pergunta delicada, mas não somos nós a fazê-la. Se a boa-fé fundar um dever de
contratar a respeito da frustração da confiança, a resposta é que ela não funda uma obrigação
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de contratar – se não há obrigação de contratar, houve outra fonte idónea, como a boa-fé. É uma
matéria delicada a de saber se temos um sistema de fontes de direito das obrigações concluso
ou não. O interprete aplicador não consegue identificar um contrato, etc., capaz de resolver o
problema, por isso, ele pode questionar-se se pode aceitar outras obrigações, mas o professor
Carneiro da Frada ainda não se convenceu que o sistema de fontes que decorre do nosso
ordenamento jurídico é incompleto – a doutrina ainda não se convenceu disso, mas acrescenta
que, apesar disso, consegue-se conviver bem com este sistema de fontes.
São cinco as fontes principais que estão previstas no Código Civil, como já se disse
supra.
Se for, chegamos à conclusão de que o elenco não está completo, mas não se trata aqui
de discutirmos apenas a completude, trata-se também de discutir se as fontes estão bem
formuladas como estão no CC, pelo que seria muito interessante abrir uma perspetiva de Direito
Comparado. Temos de estar atentos ao que se passa à nossa volta, o que se passa nos outros
ordenamentos jurídicos. As relações jurídicas são cada vez mais plurilocalizadas. Por exemplo,
em matéria de contratos, se lermos o Livro das Obrigações Inglês, o desenvolvimento dado à
temática do contrato e do consenso é muito pequeno. Não encontramos o contrato como fonte
das obrigações, encontramos a promessa, porque realmente nos contratos há promessas, por
exemplo: o carpinteiro promete reparar, o explicador promete explicação. Estamos na realidade
controversa. Mas afinal o que conta? O contrato ou a promessa do contrato? Este é um apenas
um dos casos em que se verifica nitidamente a complexidade das fontes.
Em termos práticos, podemos dizer que quanto ao contrato não há particulares razões
para nos afastarmos do modo como o ordenamento jurídico português trata as obrigações. Aquilo
que nos interessa são as promessas que o contrato gera. A perspetiva anglo-saxónica não é
inconciliável com a do direito continental. Não haverá especial motivo de preocupação, mas sim
especial interesse em aprofundar o conhecimento.
O professor Carneiro da Frada defende que não. Não é uma fonte geral de obrigações.
O que ocorre é que a responsabilidade civil, fonte das obrigações, deve ser entendida
amplamente e dentro desta cabe a confiança. Não é possível configurá-la como fonte geral, mas
há circunstâncias em que a defraudação da confiança pode levar a situações que gerem
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responsabilidade civil. A responsabilidade civil deve ser entendida de modo a albergar no seu
seio a responsabilidade pela confiança.
O universo do direito das obrigações é muito amplo. Dogmat, francês, cujos trabalhos
permitiram a elaboração do Código Napoleónico, fala em obrigações que nascem da vontade
mútua, negócio bilateral, mas também gestão de negócios (art.º 464º) – vontade unilateral.
Mas também há obrigações que nascem sem a vontade de ninguém. Por exemplo, também
na responsabilidade civil a pessoa atropela sem querer porque lhe faltam os travões, isto é, um
quase delito (que não o é porque não há culpa), mas que não radica na vontade do sujeito.
Assim como fonte das obrigações temos os negócios jurídicos, atos jurídicos unilaterais
(operações), atos humanos que têm relevância jurídica, ocorrências independentes da vontade
que convocam considerações que sujeitam o indivíduo a determinadas obrigações (a vontade
não participou, prescindem da voluntariedade do sujeito. P.e., reembolso de despesas do
gestor).
Contrato
O contrato é, desde sempre, a fonte mais relevante das obrigações. Tem efeito real
no nosso ordenamento jurídico, mas tem efeitos obrigacionais. O contrato como fonte das
obrigações, temos esse reconhecimento no art.º 405º CC. Preceito cardinal que decorre da
legitimidade contratual. O respetivo regime permite que o contrato seja feito nos termos que as
partes determinarem, sendo que a lei preenche o que as partes não previram. Autonomia privada,
característica da elasticidade, a liberdade contratual de constituição de obrigações é uma
liberdade genérica de agir. Vai até onde a lei o consente.
Olhando ao regime destas obrigações claro que temos um conjunto de princípios que
regem os contratos que são conhecidos de todos:
• Princípio da Autonomia Privada – é aos sujeitos contratantes que cabe decidir. Têm
autonomia para decidir o conteúdo do contrato e certas disposições ainda que não
previstas na lei. Mas essa autonomia não sem mais, é temperada com outros 2 grandes
princípios:
63
o Princípio da Tutela da Confiança – a autonomia privada tem de ser temperada
com as exigências de tutelar a confiança da outra parte. Como a autonomia
privada de um, choca com as disposições de outras, há que proteger a confiança
da contraparte;
o Princípio da Justiça Contratual – a ordem jurídica não abdica de um mínimo
de justiça, confiem as partes ou não confiem, independentemente. Por isso, há
uma ordem pública de direção e uma ordem pública de proteção. Não está
em causa a tutela das expectativas porque mesmo que a parte abdique destas,
a ordem jurídica não permite abdicar de certas proteções. Temos uma vigência
autónoma do princípio da justiça contratual. Caráter imperativo que se opõe às
partes. Este princípio também molda, penetra os regimes supletivos que a ordem
jurídica estabelece para os contratos atípicos. A ordem jurídica nesse aspeto,
estabelece os regimes jurídicos supletivos em que as partes podem afastar as
disposições dos regimes típicos, dos contratos típicos, que são os contratos
atípicos. A ordem jurídica estabelece um conjunto de diretrizes que são uma
encarnação das concessões de justiça do legislador. Estabelece regimes
supletivos tendo em conta aquilo que considera justo. São uma precipitação
daquilo que são as concessões de justiça do legislador. A estratégia da ordem
jurídica é informar as pessoas, assegurar-se de que as pessoas estão de forma
esclarecida e livre a celebrar os contratos, processo de formação da vontade
esclarecida e livre (libertá-las da coação) e com este modelo temos todo um
controlo por parte da ordem jurídica. Se o contrato vencer o teste da vontade,
segue os efeitos que as partes determinaram. É esse o modelo informativo,
modelo paradigmático. Ordem pública de direção. Modelos residuais que não
afetam o paradigma do modelo informativo. No entanto, há muitas
manifestações do modelo corretivo. A partir do momento em que a pessoa
decide celebrar o contrato este deixa de estar apenas nas suas mãos. Até aqui
tinha o controlo integral do contrato, mas quando o celebra há mais do que uma
pessoa. Sujeição do contrato a critérios de equilíbrio, proporcionalidade. O
primeiro autor a fazer referência a esta mudança que o fecho do contrato
provoca foi Batista Machado, fala na cláusula do razoável, pretende transmitir
que a partir do momento em que o sujeito celebra o contrato fica sujeito a
critérios que não são apenas da sua autonomia. Se olharmos aos diversos
elementos descortinámos que há uma série de critérios objetivos que não têm a
ver com a sua autonomia. É o exemplo dos art.º 287º; art.º 437º e art.º 812º CC
– redução equitativa da cláusula penal – se se revelar excessiva pode ser
reduzida pelo juiz, há essa preocupação de equilíbrio.
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Todos sabemos que o contrato depende de um consenso das partes. Na Inglaterra e
na América o papel do consenso está esbatido, não se fala tanto no consenso mas mais na
negociação.
Entre nós, ao abrigo do art.º 232º CC, olhamos para o contrato como um consenso entre
duas ou mais pessoas. Para os americanos o que está na base são as promessas e são estas
que são vinculativas. Será que são os americanos que têm razão ou somos nós. O professor
Carneiro da Frada diz que cada um tem as suas razões.
Qual o papel do consenso por comparação à categorização das promessas como fonte
das obrigações?
A simples promessa, diz-se, não chega para cumprir obrigações, porquanto seria
sempre preciso demonstrar que alguém confiava efetivamente no cumprimento da promessa.
Parece que não basta fazer uma promessa para criar uma obrigação que o credor possa
judicialmente exigir no tribunal mediante o direito de crédito. Os americanos têm uma variedade
de exemplos para estas situações.
Por exemplo, padrinho diz ao afilhado que se ele passar no exame lhe dá um carro. Isto
é válido ou não? O afilhado intentou ação no tribunal. No direito continental dizemos que não
houve contrato, não há um consenso entre ambos no sentido de produzir efeitos jurídicos.
De facto, não temos ainda nenhuma doação, para isso é necessário contrato na
ausência de uma aceitação formal correspondendo à formação de um negócio jurídico.
A promessa é fonte das obrigações, mas tem de ser uma promessa credível face à
ordem jurídica e merecedora de tutela jurídica.
São-no se o sujeito que beneficiar da promessa tenha feito um sacrifício por ela. Na
doação não.
Consideration – promessa que tenha sido feita em troca de algo. Sempre que uma
pessoa tenha feito um sacrifício em troca da promessa. A consideration é um teste no fundo da
eficácia da promessa. Nós não temos porque consideramos que só os contratos são fonte de
obrigação. As promessas unilaterais só são fonte de obrigação nos casos previstos na lei –
tipicidade. Esta é uma das razões pelo qual faz sentido exigir-se o consenso. Caso não o fosse
meras promessas seriam obrigacionais.
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→ A situação de atribuição é diferente de negócio condicional. No primeiro
perguntamos se o negócio realmente existe, no segundo ele existe. Se houver um contrato e
ambas as partes concordarem na promessa que ambas fazem. Os americanos e os ingleses
também falam na doação – contrato em que há uma obrigação por parte de apenas uma das
partes.
Há várias teorias e muito pouco esclarecidas. Na base, na raiz, até historicamente, mas
o fundamento da vinculatividade do contrato é o cumprimento da palavra dada – ser humano,
ente ético jurídico é capaz de respeitar, de ser leal, à palavra dada. Nuno Álvares Pereira é um
homem de palavra, portanto, à margem do direito, cumpria com aquilo que dizia. São as
qualidades que estão na base do contrato, a grande força do contrato é que realmente pertence
à natureza ética da pessoa, esta consequência de que há de haver eficácia para a palavra que
essa pessoa dá, é por isso que realmente se torna importante controlar se a pessoa que promete
está em condições de cumprir com a sua palavra validamente. Claro que o contrato tem outras
justificações, e podemos apresentar outros argumentos para justificar a vinculatividade do
contrato, mas este é o argumento talvez mais forte. A confiança é também uma justificação
porque é preciso tutelar a confiança do destinatário da promessa contratual, o contrato funciona
de um sistema social em que se tutelam as partes, a questão que se coloca é:
Fora do contrato, diz-se que acredita quem quer, no contrato, tutela-se a confiança
porque se pode esperar que a pessoa que promete cumpra, que seja reta e verdadeira quando
prometa. O fundamento do contrato não é o gasto social.
A razão última será o preceito ético-jurídico da palavra dada, e nesse sentido não é que
seja a ordem jurídica a atribuir efeitos jurídicos ao contrato, é a realidade da natureza humana,
não se trata de um ato de eficácia do contrato, é um acordo entre privados que tem já de si a
possibilidade de adstringir juridicamente.
O contrato é usado para múltiplos fins e muitas vezes como mero instrumento técnico de
se alcançarem determinados efeitos. A figura do contrato tem de facto esse paradigma essencial,
o paradigma que está no cerne do contrato em algumas implicações, esbate-se. Por exemplo,
66
as PPP’s – assentam no contrato – o que tem isso a ver com palavra dada? É um instrumento
técnico engenheiro-social – os administradores estão vinculados aos compromissos que pelas
pessoas coletivas assumem, mas as pessoas coletivas não estão subordinadas ao respeito da
palavra dada, este paradigma de legitimação do contrato explica-se muito bem para pessoas
individuais/físicas, não funcionam muito bem para as pessoas coletivas/jurídicas. Tem de se
fazer uma adaptação do contrato como sistema de adaptação social ao desenvolvimento
económico. Mesmo sistemas que não assentavam no respeito pela autonomia privada tinham
contrato-programa de acordo com o qual instituições sociais cooperavam no sentido de
determinada finalidade.
67
→ Requisitos ad substantiem - formalidades insubstituíveis cuja a falta determina a
nulidade do negócio.
→ Requisitos ad probationem - formalidades cuja a ausência pode ser suprida por outros
meios d prova.
• Contratos Consensuais por oposição aos Contratos Reais – aqueles que requerem
para além do consenso negocial, a entrega da coisa – a necessidade de entrega da
coisa, p.e., no comodato justifica-se pela absoluta necessidade de demonstrar que há
vontade de produção de efeitos jurídicos, se não se exigisse a entrega da coisa, a
promessa de disponibilizar uma coisa a outrem facilmente passaria por promessa
jurídica – se entrega a coisa, há vínculo. O consenso só por si nem sempre vale, porque
não é suficiente para demonstrar a juridicidade daquele acordo. Quando se fala em
contratos reais por ‘constitutione’ são antagonismos e esquece-se a profunda sabedoria
que esta incita no nosso CC de exigir a entrega, porque aqui dá-se a manifestação de
que é preciso tutelar aquela posição. Há aqui uma série de razões que alguma doutrina
desvaloriza, mas que são importantes para justificar a existência destes contratos reais
‘constitutione’.
68
o Contratos Normativos – criam regras aplicáveis a várias relações contratuais.
Criam regras aplicáveis a todo aquele setor e nesse aspeto são normativos, os
contratos de abertura de conta, p.e., que naquelas cláusulas gerais de que
dispõem, muitas delas disciplinam os contratos que o cliente possa vir a querer
celebrar com o banco.
o Contratos-Tipo – contratos que constituem o modelo a adotar em contratos
anteriores. São modelos que as partes podem usar nos contratos individuais que
celebrem. Não vinculam ninguém, são um modelo, e para vestir o modelo é
preciso celebrar esse contrato chamando o contrato tipo ao contrato definitivo.
o Contratos-Quadro – conferem um enquadramento geral a uma (ou várias)
relação contratual que se vai desenvolver no futuro. Estabelecem um conjunto
de regras gerais a desenvolver em contratos futuros ou noutros contratos que
venham a ser posteriormente celebrados.
69
§ Contratos de tipo duplo ou germinados – uma das partes se obriga à
prestação própria do tipo contratual e outro à prestação própria de outro
tipo contratual.
§ Contratos mistos em sentido estrito – contratos em que a mistura é
mais forte, que não se distinguem os elementos. Utiliza-se o tipo
contratual para se prosseguir o fim de outro tipo contratual. P.e., doação
mista, há uma mistura de compra e venda e doação – A vende a B um
apartamento que vale 50.000€ por 25.000€, porque quer fazer atribuição
do restante valor à outra parte. Neste tipo de contrato qual o regime que
se vai aplicar?
§ Contratos Complementares – aqueles em que há uma obrigação
preponderante própria de um tipo contratual, mas que é acompanhada
por uma obrigação própria de outro tipo de contratual. Por exemplo, uma
venda de automóvel, em que se estipula que o vendedor prestará
assistência nos primeiros dois anos – à prestação principal de entrega
do automóvel acresce uma complementar de prestação de um serviço
de garantia – se surgirem problemas que regime se aplica, da CV ou da
prestação de serviços?
Nenhuma delas pode pretender resolver a totalidade das situações aplicadas ao contrato
misto, por isso surgem três doutrinas:
Doutrina da Absorção
Doutrina da Combinação
De acordo com esta doutrina o regime do contrato misto encontra-se na combinação dos
vários regimes típicos de acordo com os elementos que estejam em causa no contrato misto. Se
o problema surge em relação a empreitada aplicamos o contrato de empreitada. Se o problema
surge na explicação aplicamos o contrato de exploração. O problema desta doutrina, que parece
boa para resolver grandes questões é que há uma unidade de contratos mistos, não podemos
ignorar essa unidade e explicar segmentadamente o regime dos diversos contratos.
Na doação mista, para saber se o individuo pode ou não, em relação ao valor dos
25.000€ só podemos admitir uma responsabilidade se houver dolo por parte do doador. No que
70
diz respeito à doação mista de compra e venda, a venda de coisas defeituosas – art.º 913º e
seguintes, CC. Há de facto aqui algumas diferenças.
Doutrina da Analogia
Esta terceira doutrina diz que o contrato misto corresponde a uma lacuna que não é
regulada pela lei, mas que deveria ser. Devíamos integrar essa lacuna, aplicando
analogicamente os preceitos da lei existentes aos contratos típicos. É uma doutrina apenas
formal, porque diz que há uma lacuna, mas não diz como é que se integra a lacuna e para alem
disso errada, porque o contrato misto corresponde ao exercício da autonomia privada dos
sujeitos, e o facto de não haver essa matéria regulada no OJ não significa que haja uma lacuna,
a OJ pode ser imperfeita noutros campos, mas neste não, não podemos ter todas e quaisquer
matérias reguladas, a própria OJ deixou em aberto de forma a deixar ao critério a forma como
resolver, a lacuna é uma incompletude que não devia existir considerando um todo, e não é isso
que se verifica aqui.
Todas estas doutrinas existem por forma a contribuir para percebermos melhor o
funcionamento e problema destes contratos mistos, nenhuma delas pode pretender responder
completamente ao problema destes contratos mistos e atípicos. O aplicador como diretriz
fundamental deve tentar prosseguir aquilo que é uma decorrência da vontade das partes. O
regime aplicável deve ser um regime que sirva essa autonomia privada de acordo com o OJ. O
interprete deve encontrar o regime proporcionado, critério de razoabilidade subjetiva expressa
pela regra da boa-fé. O regime tem de reconhecer um regime que incorpore, materialize as
exigências da boa-fé.
Nos contratos mistos temos um único contrato que combina elementos de vários
contratos, nos atípicos também. Na união de contratos há uma ligação entre vários contratos,
mas são autónomos. A dificuldade é saber quando é que há contratos autónomos ou quando há
um complexo de vários tipos. Há um universo dos contratos em que os mesmos são autónomos
mas estão ligados entre eles – união interna. Um dos contratos pode ser condição do outro.
71
importante – as PPP’s assentam muitas vezes em união de contratos o túnel do marão –
aglomerados de contratos, contratos em rede. Há necessidade de compatibilizar os diversos
tipos, de forma a encontrar a solução mais justa.
PARTE II
União de Contratos
Trata-se, nestes casos, de dois ou mais contratos que, sem perda da sua individualidade,
se acham ligados entre si por certo nexo. Será de ter em conta que o número de contratos não
tem necessariamente a ver com o número de documentos existentes e, por conseguinte, o que
deve relevar é a vontade das partes para distinguir aquilo que são contratos separados embora
unidos entre si daquilo que é um único contrato composto por vários tipos contratuais.
1) União de contratos com nexo externo (superficial e ocasional): o vínculo que prende
os contratos é puramente exterior ou acidental e, por conseguinte, os contratos
mantêm a sua individualidade própria, embora estejam conexos. Acabam por existir,
no fundo, dois contratos distintos.
Exemplo: na mesma tarde A dirige-se a uma relojoaria para comprar um relógio e,
mais tarde, para reparar o relógio.
→ São dois contatos com individualidade própria, em que as eventuais
vicissitudes num dos contratos não são comunicadas à validade do outro
contrato, não o afetando.
v A arrenda casa na Guarda porque está convencido de que vai ser transferido pela
empresa onde trabalhar, para esse local. Mas a transferência dá-se para Lisboa.
→ Trata-se de um caso típico de erro sobre os motivos
72
d) Casos em que um dos contratos é a base negocial do outro
Em alguns casos, portanto, levanta-se a questão de saber se está em causa uma união
de dois contratos ou se se trata de um único contrato com três sujeitos distintos e obrigações
distintas:
Habitualmente, o que temos é uma união de contratos, porque, apesar de não haver uma
independência absoluta entre cada contrato, cada um segue uma finalidade própria. Assim
sendo, temos:
a) Por um lado, o contrato que o sujeito celebra com o banco para obter o crédito;
b) Por outro lado, o contrato que o sujeito celebra com o vendedor do andar que
o banco deve financiar;
→ Exemplo 2: imagine-se uma empresa vendedora de automóveis que simultaneamente é também uma
instituição de empréstimo/financiamento. Supondo que a empresa financia um crédito para que B lhe adquira um
Mercedes.
Aqui já haverá repercussão das vicissitudes de um dos contratos para o outro contrato.
Entende-se que o comprador do carro possa opor ao comprador a falta de fornecimento de
financiamento, pois enquanto não obtiver o empréstimo não poderá pagar a prestação de compra
do veículo. O comprador está aqui a excecionar o cumprimento da obrigação de um contrato
(exceção do não cumprimento) com base na falta de cumprimento da prestação, da contraparte,
num contrato distinto. Assim, admite a ordem jurídica a existência de exceções de não
cumprimento que podem ser impostas pelo contraente, derivadas de incumprimento não daquele
contrato, mas de outro com quem a parte tem relação contratual.
Quando a empresa que vende o bem ao consumidor financia esse mesmo bem, teremos dois
contratos distintos:
73
→ e o contrato do financiamento dessa compra, por outro.
Resumindo
v Subcontrato
o Trata-se de um contrato de segundo grau, que cobre duas situações:
§ Empreitada e subempreitada
§ Locação e sublocação
Contrato-promessa
Ex: A quer comprar um prédio a B e este quer vender-lho. Todavia, não podem celebrar já o contrato, porque
faltam documentos necessários.
74
→ Contrato-promessa: convenção pela qual ambas as partes (promessa bilateral), ou
apenas uma delas (promessa unilateral), se obrigam, dentro de certo prazo ou verificados certos
pressupostos, a celebrar determinado contrato (contrato-prometido).
Nota
< o contrato-promessa é um contrato preliminar no sentido em que é um contrato que
aponta para outro contrato.
→ Art.412º CC: afirma a regra da transmissibilidade dos direitos e obrigações dos promitentes.
O SINAL
SINAL
confirmatório penitencial
como antecipação da
como prova de seriedade indemnização devida ao
do seu propósito negocial e outro contraente na
garantia do seu hipótese de o autor do sinal
cumprimento se arrepender do negócio e
voltar atrás
→ A coisa entregue a título de sinal pode coincidir em todo ou em parte com a prestação devida
pelo contrato, pelo que desta forma o sinal representa uma cláusula dependente de outro negócio
no qual se inscreve, podendo acompanhar o contrato-promessa ou qualquer outro contrato.
75
pode representar a constituição do sinal como representar uma antecipação do cumprimento, e
só tem carater de sinal se lhe for atribuído esse significado.
Nota
< O que é que acontece quando o sinal não chega a funcionar porque o contrato-
promessa foi cumprido? → o sinal é imputado na prestação devida pelo promitente
comprador. Quando a imputação não é possível porque coisa/objeto do sinal é
diferente daquela que há de ser prestada, o contrato sendo cumprido, é preciso
restituir o sinal.
Princípio da Equiparação
→ Art.410º CC: o princípio da equiparação consiste em aplicar, como regra, aos requisitos e aos
efeitos do contrato-promessa as disposições relativas ao contrato prometido. Deste modo,
aplicam-se ao contrato-promessa as disposições e requisitos relativos ao contrato prometido.
76
c) Se o contrato-prometido estiver subordinado a qualquer outra formalidade, que não
seja a redução a documento, vale para a respetiva promessa a regra geral da liberdade de forma
(219º CC).
A. O que acontece quando o contrato-promessa não reveste a forma exigida (ou quando
apenas uma das partes assina o documento tratando-se de promessa bilateral)?
→ Não havendo solução clara entre a utilização da conversão ou redução surge o acórdão de
25 março de 1993 que vem estabelecer que o anterior assento tem de ser interpretado no
sentido de consagrar a nulidade parcial do negócio e portanto, utilizar-se o mecanismo da
redução.
77
→Trata-se aqui de uma forma de proteger os promitentes compradores,
evitando-se a celebração de contratos de compra e venda de construções
clandestinas/não licenciadas.
→ Antunes Varela: A solução aplicável ao caso não podia deixar de ser a nulidade do
contrato nos termos dos arts.286º e 605º. E argumenta que se o legislador quisesse aplicar um
regime especial, tê-lo-ia feito, tal como fez para o regime de arrendamento. Se nada estabeleceu
aplica-se o regime geral.
Estamos perante uma nulidade atípica, uma vez que não pode ser invocada por
terceiros, nem reconhecida oficiosamente pelo Tribunal. A inalegabilidade
formal* do 410º/3 só pode ser usada pelas partes. Falamos de Nulidade atípica
porque não se sana com o decurso do tempo.
78
Mas é precisamente no capítulo dos efeitos da promessa que tem pleno cabimento esta
segunda exceção do princípio da equiparação, afastando as disposições que, pela sua razão de
ser, se não devam considerar extensivas ao contrato-promessa, visto haver disposições
reguladoras do contrato prometido que, pelo seu fundamento, não devem efetivamente ser
aplicadas à simples promessa.
Para sabermos se determinada regra do contrato-prometido é ou não aplicável ao regime do
respetivo contrato-promessa, há que apurar, em obediência à diretriz traçada, a razão de ser
dessa regra.
Ou seja, em princípio, o contrato-promessa tem eficácia meramente obrigacional, pelo que
teremos de afastar as disposições que valem para contratos promessa com eficácia real, dos
contratos-promessa com eficácia obrigacional.
Assim, não são aplicáveis os seguintes artigos:
• Art.879º a) CC
o No contrato-promessa sem eficácia real não se transmite de imediato a
propriedade, apenas se gera a obrigação de celebrar o contrato prometido.
• Arts.796º/1
o As regras do risco não se aplicam porque ainda não se transferiu o direito
real, que apenas ocorrerá com a celebração do contrato prometido.
• Art.886º CC
o Ainda não houve transferência da propriedade. Apenas se geraram efeitos
obrigacionais.
• Art.892º CC
o Pode haver contratos-promessa que versem sobre bens alheios, mas o
promitente vendedor nestes casos obriga-se não só a realizar a prestação
principal que é objeto do contrato prometido, mas também a obter a coisa
de terceiro que promete vender
• Arts.1405º
o Um comproprietário pode celebrar sem o outro comproprietário um contrato-
promessa mediante o qual promete vender o bem que pertence a ambos,
necessitando de autorização desse comproprietário apenas no momento
que vai alienar o bem, ou seja, aquando da celebração do contrato
prometido.
• Art.1682º-A/1
o O marido pode celebrar validamente um contrato-promessa que incida
sobre bens revistos neste artigo, porque o consentimento apenas é
necessário no momento da celebração do contrato prometido. Mediante a
celebração do contrato-promessa o cônjuge está a:
1. Obrigar-se a vender; e
2. Obter o consentimento do outro cônjuge
79
Na fixação das consequências do não cumprimento do contrato promessa, há também que
corrigir o princípio da equiparação à luz das prescrições especiais constantes dos art.442º e 830º
para a falta de cumprimento do contrato-promessa.
80
Por isso face a negócios que importassem a
transferência de direitos reais admitiu-se atribuir
eficácia real às promessas
81
→Ou de não cumprimento da obrigação depois do prazo fixado pelo
credor na interpolação admonitória
Exemplo: o credor dá um prazo ao devedor para cumprimento sob pena de a mora se
transformar em incumprimento definitivo
82
Exemplo de execução especifica: o promitente fiel pode pedir que o tribunal se substitua ao faltoso e declare transferida a
propriedade de um andar. Ou seja, o tribunal faz uma declaração negocial de compra e venda – não condena o faltoso mas
substitui-se a ele
Sentença constitutiva pois produz efeitos no ordenamento jurídico
≠
Sentença condenatória são declarativas
→ mecanismo judicial ao dispor das partes em que o tribunal se substitui à parte faltosa através
da emissão da declaração negocial em falta, dado que a sentença do tribunal vai produzir os
mesmos efeitos do que essa declaração realizando-se, assim, a celebração do contrato.
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real, algumas conclusões se podem considerar como seguras acerca dos reflexos externos
do registo da sentença que julgue definitivamente procedente a ação de execução específica
baseada na promessa de venda de coisa imóvel destituída de eficácia real:
a) O direito do promitente-adquirente, convertido em adquirente pela sentença de
procedência da ação, prevalece pela publicidade que o registo conferiu à ação, sobre o
direito de todos os promitentes-adquirentes baseados em contratos-promessa de data
posterior, quer estes tenham, quer não tenham eficácia real.
b) A prevalência do registo da sentença favorável ao promitente-comprador estendesse
ao próprio registo da transmissão efetuada pelo promitente-vendedor a terceiro, depois de
registada a ação de execução específica, por duas razões: primeiro, porque o registo da
ação, embora provisório por natureza, tornou pública a pretensão do promitente e alertou,
por conseguinte, qualquer futuro adquirente contra o perigo decisivo da sua aquisição; depois
porque, de outro modo, o promitente vendedor, depois de demandado na ação de execução
específica, teria sempre um meio fácil de inutilizar o efeito principal da procedência da ação,
alienando entretanto o imóvel a terceiro.
Pacto de preferência
O pacto de preferência é um negócio muito conhecido na nossa prática jurídica e a sua
fundamentação é dada no artigo 414º do CC, alguém que dá preferência a outrem na venda de
uma coisa. No direito de dar preferência o sujeito não está obrigado a contratar.
Temos várias preferências que são convencionadas, há pactos de preferência e há
direitos legais que decorrem da lei. São muitos os direitos legais de preferência que estão muito
ligados aos direitos reais e, por isso se fala muito em direitos reais de preferência, tal e qual
como a lei os define.
Os direitos de preferência dividem-se enquanto legais e concecionais. Sendo que estes
direitos de preferência podem ser direitos de preferência com eficácia real e direitos de
preferência com eficácia obrigacional; os direitos de preferência podem ser meramente
creditícios, e podem ser direitos reais de preferência quando forem oponíveis a terceiros. Estes
direitos reais de preferência seguem o regime dos pactos reais de preferência, no entanto, os
pactos de preferência aos quais as partes tenham conferido eficácia real vão conferir ao regime
direitos reais de preferência.
Regime do pacto de preferência (artigo 410º/2 do CC)
O pacto de preferência tem que constar de documento escrito da parte que se vincula, é
uma obrigação unilateral.
O pacto de preferência pode ser aplicado singelamente ou assumido bilateralmente, tem
que ser um documento escrito, sempre que se trata de um negócio alvo da preferência este
requer documento escrito ou escritura pública autenticada. O negócio alvo da preferência deve
ser um negócio oneroso, como a compra e venda, porque na realidade não faz sentido que exista
uma obrigação de preferência na doação, porque se assim fosse estaríamos a contrariar o
84
carácter voluntário da doação apresentada. No artigo 415º do CC enuncia-se a forma do pacto
de preferência, contudo o silêncio da lei sobre a legitimidade para o pacto, faz com que tenhamos
que recorrer ao regime do contrato alvo de preferência, fazendo assim uma adoção do regime
do contrato alvo de preferência para o regime do pacto de preferência, como podemos verificar
no exemplo que segue: a venda de pais a filhos que é um negócio anulável.
O artigo 416º menciona que se está obrigado a dar preferência nas tais cláusulas do
contrato e deve-se dar conhecimento ao preferente no processo alvo e preferência (passo a
redundância), há, deste modo, a necessidade de informar o titular do direito de preferência. Trata-
se de um negócio concreto, embora o último artigo diga que não é preciso identificar o terceiro,
a doutrina diz que é relevante saber quem é o terceiro interessado no negócio. Há várias opções
a cargo do titular do direito de preferência nos termos do nº2, a lei diz e que o titular deve exercer
o seu direito no prazo de 8 dias como prazo supletivo sob pena de caducidade, isto significa que
se o sujeito nada disser o seu direito caduca; também albergamos a hipótese do sujeito dizer
que não está interessado na preferência. Aquando da receção da comunicação o titular de direito
de preferência deve exercer o seu direito.
No artigo 417º do CC temos a venda de uma coisa em conjunto com outra, temos que
saber se a preferência se exercer-se à globalidade do negócio ou não. O legislador entende que
se pode exercer apenas direito de preferência sobre o objeto que estabelecido. Se o obrigado
receber de terceiro uma prestação, esta é excluída da preferência. Se a preferência for avaliável
em dinheiro pode ser paga nestes termos, se não for avaliável em dinheiro exclui-se a
preferência, exceto nos casos em que a prestação acessória seja constituída para afastar a
preferência e nesse caso aplica-se a preferência. Temos a hipótese de um direito de preferência
pertencer a várias pessoas, na aquisição de quotas todos têm direito de preferência, como é que
se decide quem é que terá preferência? Tem que se abrir uma licitação entre eles, tem que ser
leiloado o bem, e quem der mais fica com o bem e o excesso reverte para o alienante, no artigo
420º do CC, à partida os direitos convencionais de preferência que nascem do contrato são
direito intuito persona e por isso não são transmitidos por morte ou em atos inter vivos.
85
sujeito poder colocar-se no lugar do terceiro, o facto de pode substituir-se a este terceiro, que
permite ao titular do direito de preferência exercer uma titularidade do bem e não um direito.
O artigo 421º do CC prevê também situações que não foram convencionadas pela lei,
mas têm eficácia real. Este direito legal de preferência é um direito que tem base legal e para o
legalizar (passo a redundância) é lhe conferido direitos de preferência para evitar conflitos, no
entanto, fora destas situações a lei pode estabelecer situações de preferência com eficácia real.
Há muitas hipóteses de direitos reais de preferência com base na lei e salvo estas questões há
possibilidade de ter eficácia real os direitos de preferência não expressos na lei.
Antunes Varela diz que não pode ser intentada uma ação contra o terceiro porque ele não estava
obrigado a nada, deve ser só intentada uma ação contra o obrigado à preferência.
Mas esta explicação de Antunes Varela está ultrapassada porque o artigo 1410º do CC
foi “retocado” e a partir desse momento este artigo apenas exige que ação fosse intentada contra
o terceiro e isto basta para sustentar a legitimidade.
Agora deveremos averiguar os termos desta ação referentes a casos de simulação,
porque existem dois tipos de simulação.
No primeiro caso A vende a terceiro com o preço simulado para que B não preferisse o bem, pelo artigo
243º do CC ele está protegido face a preços exagerados.
No segundo caso há simulação, sim, mas não para prejudicar o preferente mas para prejudicar o fisco,
A só declara 100 euros para enganar o fisco, porque o preço que foi declarado era inferior ao preço real.
Esta situação descrita permite ao titular do direito de preferência invocar um direito que
só existiu porque houve uma simulação, ele teve um benefício acarretado pela simulação
realizada com o intuito de enganar o fisco e este benefício não vincula porque não poderá obtê-
lo à custa de uma ilegalidade de outrem. Isto demonstra o regime da simulação e temos aqui
uma opção do legislador que não é fácil no que toca ao negócio dissimulado.
Na Alemanha o negócio dissimulado mesmo que seja válido não sendo o negócio simulado
válido, o negócio dissimulado automaticamente deixa de o ser, porque os casos em que os
negócios sejam simulados com o instituto de enganar o fisco nada valem na Alemanha, mas em
Portugal sendo um regime latino aqui já vale e isto deriva-se pela apta capacidade que temos
que fugir aos impostos. Há uma caducidade de conhecimento do facto gerador da preferência
no prazo de 6 meses. Quem se obriga a dar preferência não está a dar uma oferta.
Temos um negócio subordinado a uma dupla condição, esta dupla condição não se
coaduna com a preferência. Mais importante é a teoria do facto negativo, segundo esta teoria o
obrigado à preferência não podia vender sem dar preferência, esta teoria não caracteriza bem
o pacto de preferência, porque, nesta situação real, partir do momento em que o titular dá
preferência ao titular do direito de preferência o obrigado à preferência não podia dar a
preferência a terceiro. Portanto, a melhor teoria para explicar o pacto de preferência é o pacto
positivo, esta necessidade é o facto de ter que se adotar um conjunto de decisões para se adotar
os direitos do pacto de preferência.
86
Pactos de opção
Figura parecida com o pacto de preferência, mas não é similar – pacto de opção. Não
está regulado especificamente no CC, mas ao abrigo do princípio da autonomia privada não se
admite esse pacto. Por este dá-se por contato a um dos contraentes a possibilidade de
unilateralmente por uma simples declaração de vontade celebrar outro contrato com a
contraparte.
Qual a diferença em relação ao pacto de preferência?
Neste o sujeito só tem o direito de caso o obrigado à preferência decida celebrar
diferente, só tem a possibilidade na medida em que nas mesmas obrigações que o terceiro.
→ No pacto de opção, o sujeito adquire o direito de unilateralmente decidir sobre se quer
celebrar ou não um determinado contrato que previamente acordou com a contraparte. Estes
direitos de opção podem ser convencionados pelas partes no âmbito da autonomia privada e são
frequentes no mercado dos direitos imobiliários (stock options, warrants – direito de subscrever
determinadas ações, tem o direito de fazer uso no futuro). Os acionistas podem estabelecer entre
eles que um deles adquirirá potestativamente as ações de um outro. Ou as put options – um
acionista sair da empresa e vender unilateralmente a outra parte.
O contrato de leasing é uma espécie de aluguer com clausula de venda, no final há
possibilidade, a opção de compra que pode ser exercida ou não pelo sujeito que tem a
disponibilidade do direito.
Os pactos de opção não estão regulados, é preciso encontrar o regime e só são lícitos
na medida em que os contratos a respeito dos quais se estabelece e a opção sejam lícitos.
O pacto de opção tem de ter a forma exigida sobre que essa opção versa, caso seja um
contrato sujeito a forma. Mas em si mesma não há nenhuma exigência especifica de forma para
o pacto de opção. Como é um contrato que gravita em torno de um outro contrato, é normal que
dependa dele. Exercida a opção, a outra parte n cumpre, temos uma situação de incumprimento
de contrato. Claro que pode acontecer que efetivamente a contraparte que se obrigou a estar
disponível a que outra fizesse a sua posição pode acontecer que a outra parte inviabilize o
contrato e celebre o negócio com terceiro. Às vezes o pacto pode decorrer de uma obrigação de
contratar – contrato que se entenda ser precedido de contrato promessa, aplica-se o regime do
contrato promessa. É uma vantagem muito grande que se atribui a alguém e normalmente têm
um correspetivo, são pactos onerosos.
assume o segurado a obrigação de por morte deste pagar uma determinada quantia aos seus filhos. Exemplo
típico de contrato a favor de terceiros. Isso é possível.
87
É verdade que o artigo 406 do CC estabelece que a eficácia dos contratos se cinge às
partes – princípio da relatividade dos contratos e das obrigações. Mas há exceções e essas
previstas na lei que o próprio artigo refere e uma delas, a mais significativa é o contrato a favor
de terceiro. É relativamente recente a figura uma vez que sempre se entendeu que o contrato
vinculava apenas as partes e só elas podiam retirar o benefício do contrato e que ninguém pode
ser prejudicado por um contrato que outrem celebra. Não há contrato para encargo de terceiros,
n podem ser prejudicados indiretamente por um contrato celebrado por outra pessoa. A
relatividade tinha uma certa logica, mas percebeu-se que havia situações que se justificava
atribuir-se a terceiros a possibilidade de terrem direitos de crédito emergentes de contratos
alheios, atribuir benefício e não prejuízo ou encargo.
Exemplo: doação com encargos – pode ocorrer que o encargo seja a favor de uma terceira pessoa.
Este contrato preenche uma multiplicidade de funções, é um tipo formal de contrato,
puro, n estamos a falar de contratos que têm uma função económico-social determinada, são
formas. Quando olhamos para os contratos típicos percebemos que têm funções económico-
sociais próprias. Estes contratos a favor são tipos estruturais podem preencher uma
multiplicidade de funções. Na doação com encargos há uma liberalidade, uma graciosidade que
se quer fazer. No seguro de vida n se trata de atribuir benefício àqueles que vão ter, mas atribuir
uma determinada quantia para determinadas funções no âmbito do risco da vida que cabe ao
segurado prevenir. Tem uma grande plasticidade – artigo 443º nº 2. No contrato a favor de
terceiro uma pessoa pode obrigar-se a transmitir a propriedade de um determinado bem a
terceiro. Pode também obrigar-se a perdoar a divida de terceiro, está a atribuir-se um benefício.
Temos uma multiplicidade de funções. Diz o próprio artigo 443º que há que atribuir um nome a
estes sujeitos- o promitente é aquele que promete a terceiro, o promissário é a quem a promessa
é feita e o terceiro é quem tem o direito emergente do contrato a favor de terceiro. O contrato
confere verdadeiros direitos a terceiro. No contrato de arrendamento para a família celebrado
pelo pai não se atribui nenhum direito que possa ser exercido por outro locador, locatário só há
um. Só se fala destes contratos quando o terceiro tenha um direito de crédito que
autonomamente possa exercer. Há contratos em que as prestações são feitas a terceiros, mas
n conferem quaisquer direitos a prestação: exemplo – namorado oferece ramo a namorada e
combina com florista que lhe entregue. Esta prestação de entrega é feita ao terceiro que não é
parte ao contrato, mas a namorada n é titular de qualquer direito autónomo contra a florista. São
apenas os que têm eficácia constitutiva a terceiros, têm direito autónomo a exigir o cumprimento.
Portanto temos de distinguir este contrato com figuras afins. O promissário (aquele perante o
promitente se vincula) não é representante de terceiro. Quando há representação há uma terceira
pessoa, mas essa nem é terceira porque o representante n assume direitos para ele, mas para
o representado. A contraparte do negócio está a celebrar com o representado verdadeiramente.
Também não se pode confundir com o mandato sem representação – alguém encarrega outrem
para celebrar negócio com terceiro, o terceiro parte do negócio só está vinculado perante o
mandatário. O mandante permanece oculto, é aquele em cujo interesse o mandatário age e
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celebra o negócio, por conta de quem o mandatário age, mas não é ele que assume o direito ou
obrigação, tem direito a que o mandatário lhe transfira a obrigação que o contrato celebra.
Não se confunde também com o contrato com eficácia de proteção para terceiro – são
aqueles contratos que não atribuem a terceiros direitos, mas atribuem-lhes uma certa proteção,
é o que acontece com o contrato de arrendamento do pai de família para a família.
O contrato de locação confere-lhes uma certa proteção em virtude de alguns deveres
que a lei possa estabelecer em benefício deles, em virtude de deveres de boa fé.
O locador não está obrigado apenas às regras de urbanidade do trato com o locatário,
também com a família do locatário, o contrato tem eficácia de proteção para terceiros. Se a
mulher receber insultos do locador, pode resolver o contrato com fundamento em incumprimento.
Também aquele que contrato com médico para operar o filho menor. Este é beneficiário
do contrato, se o medico operador comete negligencia grave é responsável perante a pessoa
menor que está protegida pelo contrato que o pai celebrou para ele e não em nome dele. Há 3
tipos de relações que temos de considerar no contrato a favor de terceiro e que convém
identificarmos.
É uma figura triangular, tem 3 relações. - Relação base ou fonte: de onde emerge a
promessa de celebrar o contrato de realizar a prestação a favor de terceiro. O contrato de seguro
é a relação base, entre segurado e segurador. - Relação de atribuição: existe entre o promitente
que faz a promessa e o terceiro, atribui-lhe a prestação, há uma atribuição de vantagem.
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prejuízo nem a obter um benefício, a ordem jurídica permite rejeitar a promessa, mas pode aderir
a ela. Se aderir, deixa a promessa feita por terceiro de ser revogada, temos um efeito importante
da aceitação – a promessa do promitente a favor de terceiro, se não aceita pode revogá-la em
princípio, é um regime supletivo. Mas depois de manifestada essa mesma aceitação, temos uma
situação diferente porque o direito torna-se firme e deixa de haver possibilidade de revogação –
artigo 448º. O promissário adquire também o direito.
Há na verdade 2 credores: aquele perante a promessa é feita e o beneficiário da promessa.
Também o doador por exigir do donatário que satisfaça o encargo. Há dois direitos de crédito. A
finalidade é atribuição de um benefício a favor de terceiro e é por isso que na medida em que
possa haver discrepância de entendimento entre o promissário e terceiro diz-se que a posição
do terceiro prevalece em princípio. Às vezes as prestações são em benefício de pessoas
indeterminadas: exemplo – incêndios de Pedrógão, a câmara contrata com a construção civil que
repare as casas que arderam. Quando há pessoas indeterminadas o direito tem de ser exigido
pelas pessoas indeterminadas mas há interesses difusos, insuscetível de concretização e
quando assim é todos temos interesse, não pertence a nenhum de nós em particular mas tem
de haver alguém a favor de quem se exerce o crédito, nomeadamente entidades – artigo 445º.
Contrato para pessoa a nomear: regulado nos artigos 452º e seguintes. Nº 1 – é um contrato
que permite a uma das partes nomear par ao seu lugar outra pessoa que adquira as posições
para ela advenientes desse mesmo contrato. Temos mais uma vez 3 figurantes: o promitens –
aquele que promete uma prestação a outrem que é o stipulans, aquele que estipula a clausula
para pessoa a nomear e temos o amicus que é aquele que pode ser nomeado ou em virtude de
cujo interesse essa cláusula é aposta ao contrato. Qual o interesse da cláusula? Muitas vezes a
uma das partes convém manter um certo segredo sobre o verdadeiro interessado do negócio. E,
portanto, apresenta-se a contratar reservando-se a faculdade de ser outra pessoa. Estes
contratos são muitas vezes utilizados por grandes empresas, por exemplo um banco que quer
comprar um imóvel, o dono vai querer aumentar o preço. Claro que serve uma multiplicidade de
interesses, ou a ocultação ou a falta definitividade do interesse do stipulas que ainda não sabe
se lhe convém ou não e arranja uma pessoa para o substituir caso não lhe convenha. No caso
do banco, não seria possível um mandato sem representação? Serviria, mas com uma
dificuldade – no contrato com pessoa a nomear, ele adquire retroativamente a posição do
contraente que o celebrou e o contrato é ab inicio celebrado apenas com ele. No mandato temos
um primeiro negócio e depois outro de transmissão e tal pode ser relevante para efeitos fiscais.
Só se pagava uma vez o IMT no contrato para pessoa a nomear, daí que não sejam muito bem
vistos pela autoridade fiscal. É uma cláusula que pode ser aposta a qualquer contrato, seguindo
o regime respetivo. São frequentes em vendas em hasta pública, em leilões. Mas há algumas
exceções – artigo 452º. Há contratos personae e aí não há a faculdade de uma das partes
assumir esta cláusula. Exemplo: casamento. Figuras próximas: - representação: no contrato a
nomear não há representação, celebra em nome próprio mas beneficia terceiro. Há aqui uma
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alternatividade nos sujeitos do negócio porque ou nomeia terceiro e este aceitando adquire a
posição dele no contrato retroativamente. Se não nomear o terceiro no prazo ou não aceitar, fica
com a posição definitivamente. Artigo 455º - se quiser usar dessa cláusula deve declarar por
escrito ao outro contraente, num prazo supletivo de 5 dias, a ordem jurídica quer que se
estabeleça num curto espaço de tempo quem é o titular dos direitos e obrigações. Só é eficaz,
só produz a consequência se houver uma ratificação do contrato por parte do nomeado, ele
aceita ingressar na posição do contraente ou então se ele tiver emitido antes uma procuração
àquele que celebra o contrato para pessoa a nomear com possibilidade de o nomear. Para
vincular terceiro exige-se legitimidade, que ou advém de uma procuração anterior ou de uma
ratificação posterior – instrumentos de atribuição e poderes de legitimidade para vincular um
sujeito a um contrato do qual não é parte. Não é representação pois aqui o sujeito não age logo
em nome próprio. - Contrato a favor de terceiro: o terceiro neste contrato a favor nunca se torna
parte do contrato, enquanto aqui operada e aceite a nomeação, o nomeado adquire a posição
de parte no contrato ab originae. - Mandato sem representação: neste o terceiro adquire direitos
e obrigações por meio de uma transferência do mandatário, não se torna parte no negócio. O
negócio é celebrado diretamente entre o mandatário e o terceiro, o mandate beneficia desse
negócio, mas nunca chega a ser parte desse negócio. Não basta a nomeação para que o sujeito
fique nomeado. A pessoa nomeada coloca-se retroativamente na posição do estipulante, se a
nomeação n for feita ou for incorretamente o contrato produz os seus efeitos relativamente ao
contraente originário – regra supletiva porque pode estipular-se outra coisa (artigo 455º). É uma
figura distinta da representação, é uma faculdade esta de nomear terceiro que pode ser usada
ou não, não existe a contemplatio dominii, não estamos a contemplar a figura do dono do
interesse, não há qualquer representação, o sujeito limita-se a reservar para si a possibilidade
de indicar outra pessoa. Figura autónoma que representa uma dupla condição: condição
resolutiva quanto ao contraente originário e suspensiva quanto ao contraente nomeado.
Resolutiva porque assumirá as suas obrigações a não ser que nomeie outrem que aceite essa
posição, se o fizer desfazem-se os vínculos para ele. Suspensiva porque enquanto não aceitar
não fica vinculado e essa vinculação depende do ato de aceitação.
Os contratos que temos estudado até aqui é no prisma da constituição de obrigações. Mas muitas
vezes eles têm efeitos reais para alem de obrigacionais.
É uma das características mais marcantes da nossa ordem jurídica. Noutras ordens o contrato
cria apenas uma obrigação de direitos reais que dependem de contrato anterior. Na Alemanha,
só cria obrigações para o comprador e vendedor e a transferência de propriedade depende da
traditio e do registo. No direito romano, a entrega da coisa era a transferência de propriedade e
em bens imoveis entregava-se um bocado de terra ou uma telha como entrega simbólica. No
direito romano a venda era obrigacional tal como é na Alemanha, em Espanha, no Brasil, em
Inglaterra. Só não é em Itália, França, Portugal. A vontade só por si pode transferir direitos reais.
Esse princípio está inscrito no artigo 408º nº 1, só que ao contrário do que as vezes se pensa,
um contrato com eficácia real não tem de produzir esse efeito real no momento da celebração
do contrato. Basta o consenso para transferir direitos reais, tal n significa que a produção do
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efeito real se tenha de verificar no momento exato do acordo celebrado. O que se compreende
porque às vezes a transferência pode dizer respeito a coisas futuras (não estão na esfera jurídica
do contraente) ou indeterminadas (não estão especificadas). Uma das características dos
direitos reais que conferem ao titular o poder imediato e direito sobre a coisa exigem a
individualização da coisa – princípio da individualização. O efeito real só se pode operar desde
que esteja individualiza concretamente aquela coisa sobre a qual incide o direito. Até escolher o
cão da ninhada, só tem um direito de crédito. O direito real só se dá com essa determinação.
Pode-se fazer a compra de um fruto natural (artigo 212º), mas se a coisa ainda n estiver
produzida, suscetível de ser separado da coisa mãe, o direito real ainda não se pode transferir.
O direito real só existe com a disponibilidade da coisa que aliena. Pode haver também contratos
de alineação de partes integrantes ou até componentes. Pode-se vender as vigas da casa que
habita, mas como é parte componente, a transferência do direito real só se dá quando as vigas
forem destacadas da casa de modo a poder sobre elas incidir um direito real autónomo. A
transferência requer uma individualização da coisa, uma colheita, ou uma separação, é sempre
o efeito do contrato, mas essa transmissão não foi imediata. Pode ocorrer que as partes
estabeleçam clausulas de reserva de propriedade. O efeito translativo pode ser contemporâneo
do acordo das partes, estas podem estabelecer que a transmissão se faça noutro momento
qualquer. É possível determinar o momento no qual há de operar a transferência de propriedade
nos contratos com eficácia real, ao abrigo da autonomia privada. Isto pressupõe que o direito
real se podia transferir num momento diferente daquele que as partes escolhem. A determinação
da transferência de propriedade tem de estar harmonizada com as limitações decorrentes da
necessidade de individualizar que o artigo 408º nº 2 exige. Mas efetivamente as partes podem
determinar o momento em que é transferida a propriedade. No artigo 409º há reserva de
transferência de propriedade. O próprio preceito dá uma noção do que são as consequências de
uma cláusula destas. Numa venda com espera de preço, o vendedor fica a aguardar a entrega
do preço, há o risco de o comprador não pagar. Se não pagar, sendo ele o proprietário, essa sua
posição é inatacável porque o direito de propriedade prevalece. Não se pode destruir o direito
real. Por isso é que os vendedores têm interesse em estabelecer a reserva de propriedade –
reservam para si a titularidade até ao momento do cumprimento para que caso n seja cumprido
a coisa possa reverter sem nenhum problema à posição do alienante. Caso não haja uma
cláusula dessas, o comprador fica apenas devedor de um preço e caso não o satisfaça fica
apenas sujeito a uma ação de execução, mas o vendedor perde o direito à coisa. Acaba por ser
uma garantia quando fazem vendas a crédito. Podemos ver a reserva como condição suspensiva
até que o comprador satisfaça o cumprimento total ou parcial do preço, só aí é que se transfere
a propriedade. Mas há outras perspetivas sobre esta reserva de propriedade. Pode-se configurar
como compra e venda sujeita a condição resolutiva de o adquirente n pagar aquilo que deve num
determinado período de tempo, há uma transferência de propriedade precária, sujeita a condição
resolutiva, vai dar ao mesmo resultado. Fala-se da propriedade e não da posse/detenção. Muitas
vezes os bens são colocados à disponibilidade do comprador. A titularidade não tem a ver com
a detenção. Este ponto é importante para saber quem corre o risco da coisa. Artigo 796º nº 1 –
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quem corre o risco da perda ou deterioração é o proprietário. Nestas compras e vendas com
reserva de propriedade em que a coisa é entregue imediatamente ao adquirente, compreende-
se que o alienante não queira correr esse risco. Depende daquilo que as partes convencionarem,
muitas vezes há os seguros para estes riscos, mas esta lógica assenta na forma como a ordem
jurídica distribui o risco. Todo o negócio segurador, toda a contratação dos seguros depende da
alocação do risco que a ordem jurídica faça, porque é em função da maneira como a ordem
jurídica distribui o risco que as partes vão prever essas contingências que podem surgir sobre
elas. A cláusula de reserva precisa de ser registada tratando-se de móveis sujeitos a registo ou
imóveis, sob pena de não ser oponível a terceiros de boa fé. E nas hipóteses de bens não sujeitos
a registo, não estão contempladas no artigo 409º nº 2, há um direito que deva prevalecer, há um
conflito entre quem vendeu com reserva de propriedade e o terceiro que compra. Prevalece a
posição do vendedor, porque há reserva de propriedade, a posição de terceiro é sempre mais
frágil porque tem de ceder. O terceiro adquire de quem não tem legitimidade para o vender
porque está onerado com reserva de propriedade – artigo 892º. No sistema alemão não é assim,
quem tem a posse à partida tem o título, a ordem jurídica protege assim o terceiro, quem vê
quem está na posse pode confiar que está protegido.
Exceção de não cumprimento do contrato – artigo 428º. Exceção dilatória, não preclude os
direitos da contraparte, apenas temporariamente impede o seu exercício enquanto ela não
cumprir da sua parte. Também pode operar em relação a contratos com prazos diferentes se
estiver em benefício do devedor e ele perder o seu benefício. Por
exemplo: aceitar pagar mais tarde se constituir fiador. Se não apresentar fiador, pode-se a
exceção de não cumprimento. Mostra como a prescrição não extingue os direitos, apenas afeta
a sua exigibilidade, por isso é que a ENC funciona nos contratos sinalagmáticos só atinge a
exigibilidade e não a sua existência. O sujeito pode recusar-se cumprir enquanto o outro não
cumprir. Em relação à prescrição presuntiva, presume o cumprimento, aí a exceção não pode
operar.
Resolução do contrato: é uma destruição em princípio retroativa do contrato, pode ser fundada
em convenção (as partes estabelecem que se ocorrer este acontecimento, uma delas terá direito
a resolver o contrato) ou na lei (sempre que a lei confira a possibilidade de resolver o contrato a
uma das partes, acontece quando uma das partes impossibilita culposamente a prestação
bilateral – artigo 401º do CC). Pode-se falar de uma condição resolutiva tácita – caso uma das
partes não cumpra, a outra possa destruir o contrato através da declaração de resolução. Mas
não está em causa nenhuma condição nem estipulação das partes ainda que tácita. O que está
em causa neste mecanismo em que a ordem jurídica confere a possibilidade de resolver o
contrato está em causa um regime decorrente do direito objetivo. Há uma expressão do
sinalagma, mas a resolução não opera apenas nos contratos sinalagmáticos, ao contrário da
ENC. Artigo 432º nº 2 – quem n puder restituir aquilo que recebeu por motivo imputável a outra
parte, não pode haver resolução, porque podia prejudicar o outro contraente que em nada
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contribuiu. A resolução é equiparada à nulidade ou anulabilidade – remissão oculta para o artigo
289º. Na nulidade ou na anulabilidade temos vícios congénitos do negócio jurídico, este nasceu
doente e é destruído. Na resolução o negócio é valido e eficaz, mas é destruído. Tem efeitos
retroativos, salvo se contrariar a vontade das partes. São contratos de execução continuada ou
periódica têm efeitos ex nunc, para o futuro. Salvo se estiver em causa um objetivo a não ser
atingido represente a causa do contrato e a sua frustração, aí se compreende que haja efeito ex
tunc, ou seja retroativo. Artigo 435º - efeitos para terceiros, a resolução não prejudica efeitos
adquiridos por terceiro, o terceiro não é afetado por essa situação. Para ser oponível a terceiro,
tem de constar de registo. Exemplo: A vende a B que vende a C. A e B resolvem o contrato. B
tem de restituir o valor e não a coisa. Ao contrário do que acontece na nulidade e na anulação.
A tutela do terceiro aqui opera através do artigo 291º, o terceiro não é prejudicado na resolução
porque é inoponível, só não lhe é inoponível, o terceiro só ficará sujeito à contingência da
resolução caso a ação de resolução seja registada. Essas ações de registo fazem com que C
não seja protegido se tiver adquirido depois do registo. Têm o ónus de ir ver o registo. Como se
faz a resolução? Mediante declaração da contraparte, corresponde a um direito potestativo
extintivo da relação contratual, verificados determinados efeitos e circunstâncias e pode haver
discussão sobre se há ou não direito de resolução, os tribunais averiguam se os direitos se
verificam, se ocorreram os factos constitutivos. Artigo 252º nº 2 – a ordem jurídica remete para
alteração de circunstâncias. O contrato pode ser afetado por uma serie de vicissitudes que
alteram o programa contratual e às vezes pode ser injusto manter o contrato. A ordem jurídica
permite resolver o contrato ou modificá-lo. Coronation cases – cedência de lugar para ver o
cortejo de coroação do rei Eduardo VII de Inglaterra, há uma doença posterior do rei que não
representa nenhum erro sobre a base do negócio, representa uma divergência ex post, e a
alteração de circunstancias prevê-se a resolução do contrato, quando o contrato perde de todo
o seu sentido.
Saber se pode ou não haver relações contratuais sem contrato. O contrato é a fonte voluntária
de obrigações mais importante, com toda a sua amplitude é reconhecido pela ordem jurídica,
mas há situações que parece n se enquadrarem bem nos contratos. Por isso coloca-se o
problema de saber se não haverá situações em que pode surgir posições contratuais, mas sem
contrato. Esta expressão deriva das relações contratuais de facto, usada por um alemão em
1941 – Peter Hault. Explica que ao lado dos verdadeiros contratos há relações contratuais sem
contrato. Há matérias que parecem ser reguladas de acordo com o regime dos contratos, mas
não há contrato. Exemplo: parque de estacionamento de Hamburgo (1956). Um individuo decide
pôr o seu carro num parque de estacionamento explorado pela câmara local dizendo que esta
não tem legitimidade para o explorar, advertindo aos funcionários que não vai pagar o preço do
bilhete. A câmara exigiu o preço do bilhete. Como se resolve esta hipótese? O preço é devido?
Aparentemente não há contrato porque o sujeito declarou não querer celebrar contrato. O
contrato pressupõe um consenso. Esta advertência preclude a possibilidade de se ver um
contrato. Mas não vale uma pessoa adotar um comportamento e depois excluir o seu significado.
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Mas é evidente que isto só opera quando o sujeito adota comportamentos quando na sua
aparência equivale a emitir declarações negociais. Não vale quando o sujeito diz que não quer
celebrar contrato. Outro alemão Thomas Reiter dizia que o contrato assente no consenso é uma
exigência injustificada porque devemos admitir o contrato quando funcionalmente for
conveniente haver contrato – conceito funcional de contrato. apesar do sujeito não querer
celebrar o contrato, funcionalmente é conveniente aceitá-lo e, portanto, tem de pagar o bilhete.
Mas violou a propriedade se se concluir que a câmara tinha propriedade. Mas então não paga o
bilhete, mas sim indemnização por lucro cessante, mas se o parque estivesse vazio, nem isso
pagaria. Parece que tendo a camara direito a explorar temos de resolver o problema de saber se
paga bilhete ou não e tal testa a noção de contrato porque há quem queira alargar esta noção,
afetando a legitimidade voluntarista do contrato, que está fundado na vontade das partes.
→ Exemplo um contrato de trabalho que só mais tarde se vê que é nulo seria injusto obrigar o trabalhador a
restituir a contribuição que lhe foi dada pelo seu trabalho.
3) relações obrigacionais que advém de contratos típicos - fazem o típico de uma contrato mas
não há contrato.
→ Exemplo Quando entramos todos os dias no metro, são praticas rotineiras que fazemos todos os dias e nem
nos apercebemos que estamos a realizar um contrato, são contratos de factos. // O comportamento do sujeito
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que coloca o automóvel no parque de estacionamento, o seu comportamento é de quem quer celebrar um
contrato, neste caso o sujeito numa produção normal faria o contrato de aparcamento da viatura. Mas ele não
quer celebrar contrato nenhum (não paga o parquímetro) este sujeito acaba por afastar a rotina comum de
qualquer sujeito
O que o professor acha do pensamento de Rauf?
O grande problema desta doutrina é que os contratos que são produto da vontade da
expressão da autonomia privada como os entendemos e depois aquelas realidades que parece
que não tem haver com contrato mas apenas com facto, esta bifurcação não implicará uma cisão
nos elementos de qualquer patologia da vontade, pode destruir um contrato o que já não tem
porque se verificar nas relações contratuais de facto. Depende do conceito de contrato.
→ Casos de contrato social culpa in contrahendo- as doutrinas das relações contratuais de facto
para admitirmos a eficácia jurídica da entrada em negociações, deriva da boa fé, a boa fé
determina que as pessoas a contratar devem respeitar alguns valores e deveres, e esses deveres
não derivam de nenhum contrato, este deveres são ex leges, derivam da lei, não de uma lei
especifica, mas de uma lei de pessoas honestas.
Portanto não é preciso admitir uma relação contratual de facto para admitir esses
deveres nos relacionamentos humanos, temos uma lei que facilita (o 227º).
Aquele que diz ao outro que o levava para o exame ele tem o dever de avisar “toma um táxi que não vou poder”,
isto advém da boa fé se admitíssemos que fosse uma contrato era admitir que a parte que pede a boleia poderia
intentar uma ação contra a outra parte, claro que não é necessário isso.
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→ Comportamentos sociais típicos- será que ao menos para estes vai ser necessário abrir a
nova categoria dos contratos de facto?
O professor pensa que não mas é o ponto mais sensível, grande autor kallax??, mudou muitas
vezes de posição.
O metropolitano são verdadeiros contratos não são? Mas o problema é onde está a vontade?
- Não sabe naquele momento porque se questionarmos as pessoas elas têm noção do
comportamento reciproco, essa consciência acaba por existir mas não é uma consciência atual
é a consciência de quem pergunta. Mas é verdade que isto põe em causa a fundamentação do
contrato na vontade, a verdade é que há rotinas, não há consciência atual da produção e de
efeitos jurídicos contratuais mas isto não significa que não há uma vontade de produção de
efeitos. Há uma produção de vontade de negócio jurídico daquele que tem o comportamento
social típico (daquele que aparca o carro), pode não haver consciência atual mas se alguém
perguntar.
→ Teoria dos efeitos práticos, efeitos jurídicos, efeitos prático-jurídicos - segundo estas
teorias principalmente a última não dá resposta nenhuma, efetivamente percebe-se que não
explica como é que estes polos opostos de compatibilizam. A vontade é demonstrada quando
há uma consciência sensivelmente sobre isso, exemplo a pessoa compra o passe, não há lá
ninguém físico, á certos contratos que dispensa a declaração de aceitação, no 274º, este não
dispensa os comportamento mas em certas situações a própria declaração.
Negócios unilaterais
Princípio do contrato - segundo o qual 457º a promessa unilateral de uma prestação só obriga
nos casos previstos na lei, ao contrário do contrato só é percetível de realizar prestações que só
obrigam nos casos revistos na lei, é um contraponto do 405º.
Princípio do contrato é o mesmo que dizer que o negócio unilateral rege o princípio da tipicidade,
este princípio restringe. Esta explicação os autores não entendem, se formos para o espaço
anglo-saxónico esta dúvida ainda mais se identifica, isto porque nestes sítios a fonte das
obrigações estão nas promessas, porque os negócios estão sempre entrelaçados com
promessas.
Mas porque é que isto acontece? Porque só vincula nos casos previstos na lei?
Este princípio é antigo, já vem do direito romano. É claro que com o liberalismo todo o
contrato cresceu e nestes códigos liberais sempre existiu negócios unilaterais, talvez porque o
contrato tem que vir com consenso das vontades e é por isso é que os contratos são vinculativos.
Mas todos percebem que com consenso o que importa é que as partes se comprometem,
mesmos nos contratos, a promessa tem o seu valor.
Por exemplo - a doação pode ser unilateral, dispensa-se a aceitação nomeadamente no caso dos
incapazes.
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O consenso não é explicação suficientemente segura para a ordem jurídica que os
negócios unilaterais encaram. Aqui há uma grande discussão e saber porque se restringe o
âmbito dos negócios unilaterais. O melhor autor que melhor fala disso é o Pedro Pais
Vasconcelos
Se costumamos ir a favor da tipicidade, a justificação seria que ninguém* pode ser compelido a
ter benefícios que não quer ter, ninguém pode ser obrigado a tornar-se credor sem querer, não
podemos fazer com que uma pessoa seja prejudicada em nada sem o seu consentimento.
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Promessa Pública
A promessa mantem-se pelo prazo de validade indicado pelo promitente, se nada disser
a promessa mantem-se ate ser revogada 461º
A promessa publica não existe apenas nestes casos, um autor português que dinamizou
muito foi o Doutor Carlos Figueira de Almeida, nomeadamente as mensagens publicitárias.
São certo tipo de promessas que são feitas pela publicidade, logo o anunciante tem a
obrigação de as cumprir porque tem que haver uma tutela do consumidor.
Concurso Públicos
No que toca aos concursos públicos, estipulado no artigo 463º do CC, temos uma
promessa que só se válida quando houver a necessidade de oferecer ao vencedor do mesmo o
prémio prometido.
463º/1 – a oferta de prestação só é válida quando seja fixado no anúncio público o prazo
para a apresentação dos concorrentes.
463º/2 – a decisão sobre a admissão dos concorrentes pertence ao promitente, sem
prejuízo dos casos em que esse poder de decisão seja atribuído a outras pessoas
designadas no anúncio.
Gestão de negócios
464ºCC figura simpática – nota-se a parte final, atua com interesse de outrem “vou
comprar ração para o animal porque o dono não pode está cá”, esta a gerir um negócio alheio
no interesse do respetivo sem para tal esta autorizado, “é o caso do advogado que não tendo
procuração do cliente perante uma prova que é preciso contestar se impeça esperando que o
dono do interesse depois venha ratificar essa questão”, temos aqui uma atividade no interesse e
por conta de outra.
Atuo pelo interesse da outra pessoa mas é por conta dela porque vou querer a
retribuição, na gestão de negócios não há vinculação, há atuação não havendo autorização para
tal.
Se houver qualquer outro instrumento jurídico que autorize o gestor a atuar não se coloca
a gestão de negócios porque esta a agir com a autorização do dono do negócio, na gestão de
negócios não está autorizado a empreende-la.
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→ Gestão simples ou complexa consoante vise apenas o interesse alheio ou vise também o
interesse próprio.
Exemplo- A pode limpar o prédio para proteger apenas o vizinho (simples) ou então pode ser porque
também lhe protege (complexa)
→ Gestão própria e imprópria- própria porque o gestor atua na gestão do interesse de outra
pessoa, impropria se o sujeito atua exclusivamente para seu interesse.
Exemplo- limpo a mata adjacente não porque pode prejudica o vizinho mas sim para me proteger a mim
próprio. Aqui não se aplica a gestão de negócios, porque aqui não á há interesse de outrem
→ Gestão de lucro capiendo- atribui a outrem um benefício que ele não alcançaria.
→ Gestão regular ou não regular- uma gestão pode ser legitima pode iniciar bem mas pode
ser mal executada “ repara o telhado do vizinho mas depois descuida-se não se importa mais
com o telhado deixa um buraco e deixa a casa do vizinho pior do que estava” no momento inicial
era legitima mas depois foi irregular, ninguém o mandava iniciar mas a partir do momento que
iniciou tem que o terminar, porque se o iniciou está vinculado a terminar pelos deveres de
conduta. Aqui o dono do negócio não tem que retribuir o gestor.
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→ Gestão conforme a vontade real ou conforme a vontade presumida- às vezes ao sujeito
sabe qual é a vontade do dono do negócio ou pode não saber qual a vontade mas presume que
seria aquela. Não confundir a vontade e o interesse, a atividade até pode ser conforme o
interesse mas pode não haver a vontade ou pode ser correspondente há vontade mas não ao
interesse “ o dono do negócio quer pagar uma divida mas o sujeito sabe que aquela divida não
existe. Pode o sujeito impedir o dono do negócio de realizar o seu interesse? Não”
→ Gestão aprovada e não aprovada- primeiro o dono do negócio manifesta o seu agrado e
aprova e reembolsa o gestor, mas pode não ser pode não ter a aprovação da gestão, isto não
tem nada haver com a regularidade da gestão, porque pode ter corrido tudo mal e o dono do
negócio dizer que esta tudo bem.
→ Gestão ratificada e não ratificada – ratifica produz efeitos não ratifica não produz “ o dono
do negócio ratifica para receber o dinheiro das uvas” a ratificação tem haver com o efeito do
negocio face a 3º . “posso ratificar o negocio mas não aprovar, mas quero receber o reembolso”
Aqui coloca-se o problema da responsabilidade civil, aqui não se confunde com o
mandato ou com a prestação de serviços porque aqui não á nenhum contrato com o dono do
negócio.
Na gestão temos uma causa distribuição de benefício, não há enriquecimento sem
causa, a gestão tem que ser regular, aqui o dono do negócio tem que retribuir o gestor, aqui
reembolsamos as despesas independentemente da totalidade das despesas.
Estado de necessidade - de facto aqui pode haver gestão de negócios, “tem fogo na
casa do vizinho arromba a porta e estraga os sapatos mas depois vê se qua não era
incendio era uma água a ferver” o individuo pode exigir uns sapatos novos? O juiz atribui
uma indemnização a quem praticou o ato mas não diz em que termos, por isso poderá
ver se aqui uma gestão de negócios. A gestão de negócios é aplicada quando por
exemplo “individuo salta para água para salvar o outro e perde o emprego porque não
vai a entrevista” aqui não é estado de necessidade, aqui é um interesse potestativo, há
diferenças de tratamento.
Uma vez que a atividade do gestor se orienta pelo interesse do dominus pode-se dizer
que se o dominus soubesse da sua necessidade e disponibilidade do gestor que não se
importaria de celebrar o contrato com o gestor. Por isso se fala de quase mandatos, de mandatos
tácitos. Talvez para abarcar as situações em que o dominus venha a saber da conduta do gestor
e não reage, porque até concorda, parece-lhe bem. A concordância faz com que a figura se
aproxime do mandato tácito. A gestão de negócio é muito parecida no seu regime com o
mandato. A gestão de negócios funciona de uma forma diferente do enriquecimento sem causa,
não se deve confundir com esta figura. Neste trata-se de corrigir deslocações patrimoniais, fazer
com que aquele que se encontra enriquecido injustificadamente restitua o que enriqueceu. O
facto de reembolsar as despesas feitas do gestor trata-se de compensar o gestor da sua conduta
pagando-lhe as despesas feitas em prol do dominus e independentemente daquilo com que se
encontra enriquecido à custa do gestor. Às vezes o gestor pode incorrer em responsabilidade
civil se não obedece às diretrizes que a ordem jurídica estabelece. Mas também n há confusão
entre o regime da gestão e destes institutos que podem ajudar a conformar o regime de certas
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condutas no caso de a gestão de negócios n ser adequadamente realizada. Pode haver
responsabilidade civil se o gestor intervém na esfera jurídica alheia, mas porque quer beneficiar
por exemplo de alguma circunstância daquele em cuja esfera intervém e causam-se prejuízos
que devem ser indemnizados. Se a gestão for realizada de acordo com aquilo que a ordem
jurídica estabelece, a gestão acaba por ser uma causa de justificação da intervenção na esfera
jurídica alheia. Significa que há intervenções na esfera jurídica alheia que são legítimas e lícitas,
justamente se for no interesse do dominus. O gestor age para proveito do dominus e na
obediência da sua vontade presumível. Mesmo quando prossegue interesses próprios na medida
em que tenha essa ponta de boa vontade isso já leva a ordem jurídica a olhar com beneplácito
a intervenção em esfera jurídica alheia, favorecendo essa cooperação humana. Menezes
Cordeiro explica que a gestão de negócio acaba por ser um instituto jurídico que se justifica cuja
função é dar acordo à solidariedade humana espontânea não contratualizada. Serve outras
funções, como por exemplo uma função de facilitação do tráfico jurídico, de desburocratização.
Exemplo: advogado de família que não tem procuração e é preciso apresentar uma contestação,
a gestão permite superar a ausência de procuração, substitui-a na prática e desburocratiza. A
prevenção de danos que se exemplifica com o gestor que repara o telhado do vizinho, é uma
função de gestão de negócio. Quando se permite a alguém obviar prejuízos que podem atingir
todos nas gestões conexas, há uma distribuição dos encargos decorrentes da prevenção desses
prejuízos – alguém que limpa a mata para proteger a sua casa e a dos vizinhos. Há diversas
funções que esta solidariedade na verdade desempenha e que complementam a figura. Por isso
é que alguns autores falam desta figura como abrangente, sem contornos claros. Exemplo: saber
como condutor que para evitar atropelar criança, acaba por se despistar (não são atos reflexos).
É uma figura que abrange diversas realidades.
Regime: tem um sentido triangular porque temos a relação básica (gestor e dominus) –
relação gestória, mas pode haver terceiros envolvidos quando implica contratos ou intervenção
desses terceiros. Na relação gestor-dominus, temos de ver direitos e deveres. Deveres do gestor
– artigo 465º a), o gestor tem de se conformar simultaneamente com o interesse e a vontade.
Quando a atividade for no interesse, mas contrária à vontade, o gestor deve abster-se
de a atuar. O que se diz é que atue no interesse e na vontade, há uma cumulatividade dos
referentes da conduta lícita do gestor, não é uma alternativa. Ou é uma vontade real ou
presumível. É preciso que o interesse e a vontade sejam compatíveis com a lei e observem os
limites impostos pela ordem publica e bons costumes. O gestor que pratique um desses atos
incompatíveis, torna-se cúmplice num ato ilícito. Alínea b) – algo que se recomenda, se há
espírito de boa vontade tem de providenciar para que trate do assunto. Deve prestar contas. É
um pressuposto que terá direito a prestação de contas, se obteve proveitos tem que apresentar
essas mesmas contas. Deve prestar todas as informações. Uma coisa é prestar contas, outra
coisa é o ato de entregar. São deveres de conduta. O dever de avisar, de se conformar com
interesse e vontade, de prestar contas, são deveres de conduta, não são obrigações. Artigo 466º
- regra que sendo da responsabilidade do gestor, ajuda a perceber um dever importante a cabo
do gestor. A atividade da gestão de negócios é livre de ser assumível, mas a partir do momento
em que inicia a atividade, não a pode interromper se causar prejuízos. O dever de continuar a
gestão, uma vez iniciada há o dever de a continuar. Estabelece a responsabilidade do gestor,
pelos danos que tiver causado por culpa sua no exercício da gestão. Se avalia mal a situação e
a atividade que se propõe não tem nada a ver com o interesse nem a vontade do dominus, se
apesar de tudo houve desleixo manifesto na forma como a gestão é iniciada ou realizada, o
gestor responde, torna-se responsável pelos prejuízos causados. A doutrina apresenta uma
questão: a culpa do gestor deve-se aferir em função das próprias aptidões do gestor ou de acordo
com a doutrina geral? Uma pessoa fez o melhor que podia, mas é desleixada, não tinha aquela
diligencia adequada, não percebia nada sobre obras, é responsável porque correu mal? Olhando
às características não deveria ser responsabilizado.
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Mas se não agiu com a aptidão média que tem que se exigir de todos. E na gestão de
negócios em que é de índole motivacionista?
A doutrina divide-se. O Dr. Varela diz que só está obrigado a colocar a diligência das
suas próprias coisas, não é responsável ainda que fique aquém daquilo que em princípio se deve
exigir da capacidade das pessoas. Remete-se para o bom pai de família do artigo 487º ou se é
de acordo com as suas próprias possibilidades? O professor presume que o facto de haver um
conjunto autonomista possa ser uma causa de exclusão da responsabilidade. Solidariedade dos
gestores – artigo 467º. Quando há uma pluralidade de devedores, em princípio cada um
responde pela sua parte. A não ser que a obrigação seja solidária, mesmo havendo 2 devedores
ou mais, um pode ser chamado a pagar por todos e depois temos direito de regresso quanto aos
demais.
Na gestão de negócios, havendo pluralidade de gestores, o regime é de solidariedade.
Isso fortalece a posição do dono do negócio. Quando há pluralidade de sujeitos numa atividade
q não é vinculada, pode a pessoa desinteressar-se, as pessoas desculpam-se umas com as
outras e a solidariedade garante o interesse das pessoas, porque ao cada um ser solidário e
poder ser chamado a responder pelos demais vai criar o sentido de vigiar os demais e assegurar
que a gestão é levada a bom porto. Posição do dominus negocii: o dever do reembolso e
indemnização da gestão (artigo 468º).
Se a gestão for regular, este é obrigado a reembolsar o gestor das despesas que este tenha
considerado indispensáveis, com juros legais. E para alem do reembolso, também os prejuízos
que tiver sofrido por causa da gestão, porque a atividade foi no interesse alheio. É justo que seja
o dominus negocii a suportá-lo. E é uma diferença este regime daquele que se aplicaria caso a
gestão não fosse regular. Se não for exercida de acordo com aquilo que a ordem jurídica
estabelece, a consequência é que o dono do negócio responde apenas segundo as regras do
enriquecimento sem causa, só é obrigado a restituir aquilo com que beneficiou da atividade do
gestor. Pode ainda acontecer que no reembolso das despesas às vezes a gestão é levada a
cabo por profissionais, a atividade gestória corresponde à profissão, diz o artigo 470º que nesses
casos é devida remuneração correspondente a essa atividade. Se a gestão é regular, o dominus
aprovará a gestão, é o reconhecimento de que foi exercida de acordo com o seu interesse e
vontade e a aprovação significa que aceita reembolsar e indemnizar dos prejuízos – artigo 469º.
Ao aprovar, renuncia ao direito a uma indemnização que possa ter contra o gestor, no caso de
ter havido um descuido do gestor. Mas a gestão pode não ser aprovada e se não o for isso não
significa que o gestor esteja despojado dos seus direitos contra o dominus, não significa que este
esteja eximido de satisfazer ao gestor os direitos deste. O que acontece é que esses direitos
dependem da prova da regularidade da gestão. Não se confunde com a ratificação. Temos de
considerar a posição de terceiros com os quias o gestor possa ter celebrado negócios jurídicos.
A ratificação é o ato mediante o qual o dominus (representado sem poderes) chama a si
os efeitos dos atos praticados pelo gestor (representante sem poderes). Na aprovação, está em
causa saber se o dominus reconhece os direitos do gestor e renuncia ao direito a uma
indemnização, estamos apenas na relação gestória. Na ratificação consideramos negócios
celebrados com terceiros e o dominus tem de decidir se quer fazer seus os atos praticados pelo
gestor com terceiros. Pode querer ratificar o negócio e desaprovar a conduta do gestor.
Como pode acontecer o contrário. Qual o problema para o terceiro?
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ausência de poderes, o terceiro pode para alem de poder revogar a sua declaração, o prejuízo é
liquidado nos termos do artigo 227º (culpa in contrahendo), apresenta poderes que não tem e
não esclarece a contraparte disso, está a violar a regra de conduta sobre a boa fé e há
responsabilidade do gestor não por falta de cumprimento de contrato mas porque falseou o
processo de negociação e ter causado o prejuízo de terceiro (por exemplo o prejuízo de custo
de oportunidade).
Consideramos ontem, o que se passa em relação gestão não representativa – em que o
gestor praticas atos jurídicos em nome próprio.
O código, diz-nos como essa situação se resolve – art.º 471 CC. Sem desproveito do
que se diz nos preceitos anteriores, nomeadamente em relação à aprovação, temos de ver qual
o regime em relação aos terceiros. É aplicável aos negócios jurídicos celebrados pelo gestor em
nome do dono do negócio o disposto no art.º 268 – “representação sem poderes” – negocio
ineficaz perante o representado enquanto ele não retificar, o terceiro pode exigir ao dominus que
ratifique, com possibilidade de revogar a sua declaração e se o terceiro também não conhecia
também pode revogar a declaração.
Se o gestor tiver agido em seu próprio nome, se a gestão não for representativa “vendeu
a fruta do dominus como se fosse dele” – são extensíveis a esses negócios celebrados pelo
gestor em nome próprio, os preceitos relativos ao mandato sem representação. Esses preceitos
– art.º 1180 e ss. Efetivamente, o mandatário é obrigado a transferir para o mandante os direitos
adquiridos em execução do mantado – art.º 1181n.º 1 – se o gestor tiver vendido a tal fruta ao
terceiro, ele é obrigado a transferir para o dominus o direito de crédito ao preço – uma obrigação
de contratar, de transferir direitos – obrigação de emitir uma declaração negocial de
transferência, que é no fundo similar à promessa de contratar para a qual existe uma execução
especifica – art.º 830 – se o gestor tem um credito contra o terceiro, e não o transfere como cabe
no art.º 1181, para o dominus, temos aqui uma obrigação de transferir que não é cumprida, e o
dominus pode recorrer ao art.º 830 (estes não diz apenas respeito á obrigação de contratar no
contrato promessa, mas há obrigação de emitir de declarações contratuais proveniente de outras
fontes). As posições jurídicas que cabem ao gestor, o dominus pode-se substituir ao gestor em
relação aos direitos contra terceiros – porque é que o dominus não haverá de fazer isso?
Art.º 1181 n.º 2 – “relativamente aos créditos o mandante pode substituir-se ao mandatário” –
mas não são só direitos, também há obrigações do gestor. O mandante (dominus) deve assumir
as obrigações contraídas pelo gestor – se quer ter o direito ao preço tem de entregar a fruta, e
tem de assumir o lugar do gestor. Tudo isto significa também reembolsar o gestor das despesas
feitas – o próprio mandato sem representação diz isto – porque a atividade do mandatário foi no
interesse dele, devendo reembolsá-lo das despesas. O dominus deve reembolsar o gestor das
despesas que ele fez, apenas de atuar em nome próprio, foi no seu interesse. O mandato sem
representação, esta remissão do art.º 471 para os art.º 1180 e ss, pressupõe que o dominus
queria chamar a si o negocio celebrado pelo gestor em nome próprio. Diferenciação em relação
ao mandato – no mandato sem representação há um encargo logo que o mandata atribuiu ao
mandatário – eles combinaram isso, o mandatário age em nome próprio porque combinou com
o mandante, mas aqui para o dominus também responder pelos encargos tem de chamar a si o
negocio (mas não está obrigado) – é uma ratificação, mas diferente do art.º 268 – ele chama a
si os efeitos do negócio feito sem representação em nome do gestor. Com isto, esclarecemos o
fundamental. Também na gestão não representativa, o facto de dominus negoci chamar a si os
efeitos do negócio celebrado pelo gestor em nome próprio, não significa que ele concorde com
a gestão, mas pode preferir por qualquer razão chamar a si os efeitos do negocio. Não concorda
por exemplo com a venda da fruta, mas agora não há nada a fazer, é preferível guardar o dinheiro
da venda do que não ter dinheiro nenhum. O dominus quando chama a si o negocio não significa
que esteja concretamente a abdicar dos direitos contra o gestor, se se tratar de uma gestão
irregular por exemplo – ratificação e aprovação não implicam uma á outra, pode haver uma sem
a outra. A aprovação diz apenas respeito ao sinalagma histórico – relação entre dominus e
gestor, nada a ver com terceiros. Considerações finais – situações parecidas com a gestão de
negócios mas que não o são: Art.º 472 CC – “alguém gere negócio alheio convencido de que ele
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lhe pertence, só é aplicável o disposto em matéria de gestão de negócio se houver aprovação
de gestão” – se não aplica-se o enriquecimento sem causa; e houver culpa do gestor – aplica-se
a responsabilidade civil.
Ex: individuo que procede à limpeza do pinhal convencido que o pinhal lhe pertence quando afinal
pertence a outra pessoa. Ou um conjunto de herdeiros que numa situação qualquer não muito clara de distribuição
de património recebe uma renda relativa a uma fração que pensa ficar para ele mas ficou para o irmão. Acha que
o negocio lhe pertence quando afinal é alheio. Mas há aqui um beneficio que se atribui a outrem – mas é diferente
da gestão porque não há nenhuma intenção de prática de um ato no interesse e conta de outrem. Objetivamente
trata do negócio alheio, mas sem atuar no interesse do respetivo dono, estava enganado. Quid Iuris?
O indivíduo gastou dinheiro a limpar o pinhal, dia resultou também um benéfico – só há aplicação
da gestão de negócio se efetivamente houver aprovação. Se o titular do pinha aprovar a conduta
do sujeito que agiu convencido que o negócio lhe pertencia, se houver aprovação, o proprietário
do pinhal tem de reembolsar as despesas feitas pelo sujeito que a praticou convencido que o
pinhal era dele – reembolsar dos prejuízos que possa ter sofrido. Se não houver aprovação,
como a situação não é de gestão de negócios não podemos aplicar o disposto nessa secção –
aqui são aplicáveis as regras do enriquecimento sem causa - sem prejuízo de outras – porque
objetivamente no exemplo do pinhal – em que não sabe bem o limite entre os dois terrenos e
acaba por limpar o do outro – aplica-se o enriquecimento sem causa – há enriquecimento do
titular, ele tem de restituir aquilo que tem injustamente à custa daquele que realizou aquela
despesa convencido de que o negocio era dele. Não houve aprovação, mas se ele gastou
10.000€ com os trabalhadores mas o benéfico foi só de 5.000€, e o trabalho até foi mal feito, o
enriquecido só tem de restituir o montante do seu enriquecimento – os 5.000€, não de restituir a
totalidade da despesa. Se tiver havido aprovação há que restituir a despesa independentemente
do proveito que tenha tirado. Há uma vantagem na aplicação da gestão de negócio – o gestor
acaba por ser protegido pela ordem jurídica relativamente ao regime regra do enriquecimento
sem causa. Claro que também pode causar prejuízos, e se causar aplica-se as regras da
responsabilidade civil. Individuo que manda concertar o telhado de um casa que julga que e dele
quando é de outro herdeiro, foi inapto no concerto do telhado e ainda estragou mais, se atuou
culposamente, porque devia saber que aquilo que não era dele – é responsável pelo prejuízo de
acordo com as regras gerais, mas na medida em que atuou em ignorância do carater alheio da
coisa – se agiu negligentemente – ignorância censurável – deveria saber – responde.
Totalmente diferente da gestão de negócio alheio no interesse próprio – no julgado
próprio, julga que o negócio é próprio, mas age subjetivamente com a convicção que está a tratar
de assunto próprio – licitamente.
Muto diferente da situação do indivíduo que sabe perfeitamente que o assunto não lhe
diz respeito, mas que pratica esse mesmo negocio para tirar dele um proveito – o indivíduo que
recebe a renda que sabe que não lhe pertence a ele mas a outra pessoa - é para beneficio
próprio – situação diferente – intervenção na esfera jurídica alheia não no interesse e por conta
do dominus, mas no interesse próprio. Para estas hipóteses não há uma previsão direta no CC
– O art.º 472 prevê apenas a hipótese de o agente atuar no negocio alheio por julgar
interesse próprio. Ele presume que é dele, e com aquilo que é dele faz o que bem entende.
Mas na outra hipótese – alguém interferir na esfera jurídica alheia no interesse pp, sabe
que negócio é alheio, mas atua no interesse próprio – claro que se aplica a responsabilidade civil
quando houver prejuízo e o do enriquecimento sem causa – tem de restituir tudo aquilo que
obtém independentemente do prejuízo que tenha causado – porque aí não há complacência da
ordem jurídica – nada na atitude do interventor justifica esta atitude – a ordem jurídica é severa
– mesmo sem o dizer diretamente. A ordem jurídica alemã é muito clara nestas questões, e
ninguém as discute também entre nós, mas não há uma norma direta.
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. Enriquecimento sem causa
Ex: alguém paga uma divida que não existe – A paga 50€ a B porque acha que lhe deve – B recebe a
quantia e enriquece á custa de A. A arranja o prédio d a B convencido de que o prédio é ele quando na verdade
não
Aqui há enriquecimento sem causa (pode cair na gestão de negócio se aprovar, mas se
não a aprovar, aplica-se o enriquecimento sem causa). Pelo menos, quando o sujeito agiu em
boa fé, realizando benfeitorias em coisa alheia, terá direito a ser compensado – art.º 269 e ss. E
se for de ma fé – a má fé do benfeitor dispensa o beneficiado de devolver aquilo que enriqueceu
á custa de outrem – embora o benfeito soubesse e agisse na mesma? Quando há um
cumprimento de uma divida por um terceiro – o credor fica beneficiado – alguém que paga dividas
que não lhe são exigíveis – porque não existem ou porque pertencem a outro sujeito, ou ainda
por erro (ex: obrigação eu existe mesmo, e em que o sujeito acha que é fiador mais não é) – art.º
476 – 478 do CC.
Se o credor sabe que o indivíduo está em erro tem de restituir. São hipóteses de
realizações de prestações que não têm uma causa -e que é preciso anular. Mas não são só estas
as hipóteses – vamos identificar um conjunto de situações muito precisas que dão lugar à
obrigação de restituir o enriquecimento. No direito romano existia as “condictiones” – condições
dentro das quais é possível obter a restituição de um determinado enriquecimento – uma delas
era a “condictione in debito” – o facto de não existir a divida, ou não ser própria, ou o sujeito está
erradamente convencido. Mas há outras condições que se foram acrescentando. A “condictio
obre” – CC no art.º 473 n.º 2 – “em virtude uma causa que deixou de existir” – ex: indivíduo paga
a renda achando que o contrato está em vigor quando já foi renunciado pelo senhorio – a causa
deixou de existir; ou também aquilo que foi recebido em vista de um efeito que não se verificou
– e portanto tem de ser restituído – “condecitione in ren”. Estas causas do direito romano,
pertenciam a um sistema de tipos – havia um conjunto de hipóteses em que havia lugar à
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restituição – com a passagem do tempo fez-se uma teoria geral do enriquecimento sem causa –
e hoje em dia temos uma clausula geral do enriquecimento sem causa (não distingue o legislador
entre as diversas “condictines”, os diferentes tipos. Figura com muita amplitude. Art.º 812. A
corrupção – as luvas que não são atribuições patrimoniais têm de ser restituídas – problema de
enriquecimento sem causa. No DA – indivíduo que recebe um imposto das mais valias, alguém
que beneficia porque passa uma estrada no terreno, e o terreno aumenta brutalmente de preço
– o enriquecimento que alguém obtém deve ser e alguma medida restituído á comunidade, à
custa do qual o benéfico foi obtido? Através do imposto – restitui-se o benéfico à comunidade.
Na base está o problema do enriquecimento sem causa. No Direito Criminal – correção dos
desequilíbrios patrimoniais é atribuído ao enriquecimento sem causa. Centrando no Direito Civil
Há uma intervenção na esfera jurídica alheia, porque o sujeito usa a areia, mas não há
prejuízos nem diferença patrimonial – aqui a responsabilidade civil entra num impasse – não há
dano a liquidar – há um enriquecimento sem dano. Mas o tribunal veio obrigar a empresa que
tirou a areia a restituir o enriquecimento.
O caso do padeiro alemão – fazia uma formada à parte e vendia autonomamente fora da padaria – o
dono da padaria não notou, porque vendeu sempre os pães todos (na mesma quantidade – ele tirava apenas uma
pequena quantidade), mas esse padeiro enriqueceu á custa do seu patrão – o problema é saber como levanta a
questão patrimonial? Tem ou não de restituir o enriquecimento? Porque o patrão não pode invocar prejuízo – tem
de ser pelo enriquecimento sem causa.
Quem pratica um ato ilícito não tem de ficar com os lucros desse ato ilícito. Se alguém
beneficia de um ato ilícito tem de restituir, independentemente de saber se alguém sofreu dano
– se até nem se souber, restituiu-se ao estado como representante de todos. Deparamos-mos
aqui com uma deslocação patrimonial que não tem causa – quando pensamos no contrato de
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CV pensamos nele como causa de atribuições patrimoniais, o vendedor tem direito a receber o
preço e o comprador a coisa – mas a verdade é que há situações de enriquecimento que não
tem causas válidas – temos de fazer o raciocino ao contrario – saber se alguém tem beneficio (e
não começar pela causa desse benefício). Se não houver causa há que restituir o enriquecimento
na mesma. Se um negocio é invalido tem uma causa invalida, e tem de se restituir tudo o que foi
prestado – mas no art.º 289 não se fala do enriquecimento sem causa – diz que é uma restituição
automática de tudo o que foi prestado. Alguns autores dizem que o enriquecimento sem causa
não tem nada a ver com isto – aplica-se o art.º 289 – para que aplicar o enriquecimento sem
causa? Mas, se repararmos, o fundamento do art.º 289 é não haver causa. O professor entende
que o art.º 289 tem a sua explicação mais profunda no enriquecimento sem causa (não diz que
o regime deste seja idêntico ao regime regra do enriquecimento sem causa, mas a explicação
dogmática do art.º 289 é que quando um negócio é inválido desparece a causa do
enriquecimento patrimonial). Não podemos de forma alguma prescindir do enriquecimento sem
causa.
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