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Meio ambiente,
esporte, lazer e turismo
VOLUME 3
estudos e pesquisas no Brasil,
1967-2007
Ana Cristina P.C. de Almeida &
Lamartine P. DaCosta (Editores)
Editora Gama Filho, Rio de Janeiro, 2007

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Universidade Gama Filho
REITORIA
Reitor
Prof. Luiz Eduardo Braune da Gama
Pró-Reitor de Humanidades e Ciências Sociais
Prof. Arno Wehling
Pró-Reitor de Saúde
Prof. Gilberto Chaves
Pró-Reitor de Exatas e Tecnologia
Prof. José Leonardo Demétrio de Souza
Editora Gama Filho
Editor Dante Gastaldoni
Programação Visual Evlen Joice Lauer
Supervisão de textos Lamartine P. DaCosta
Meio Ambiente, Esporte, Lazer e Turismo: Estudos e Pesquisas no Brasil 1967
± 2007/
Editores : Ana Cristina Pimentel Carneiro de Almeida e Lamartine P. DaCosta
Rio de Janeiro : Editora Gama Filho, 2007
455 p.
ISBN 85-7444-062-0
1. Meio ambiente. 2. Esporte. 3. Lazer. 4. Turismo.
5. Desenvolvimento sustentável
CDD ± 809
CDU ± 82.09
³Livro organizado em associação da Editora Gama Filho com a
Universidade Federal do Pará, 2006 - 2007"

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DIREITOS AUTORAIS E CÓPIAS
A presente obra está sendo publicada sob forma de coletânea de
textos fornecidos voluntariamente por seus autores, sem compensação
financeira mas mantendo seus direitos autorais, segundo a legislação
em vigor. Neste termos, este livro tem distribuição gratuita em CD
ROM e outras mídias, como também está disponível em site para
download de livre acesso, sem custos para usuários. Cópias em papel
do livro e dos textos estão autorizadas desde que não tenham
propósito comercial e que sejam citados os autores e fontes originais
em eventuais reproduções.
ENGLISH FOREWORDS AND TEXTS
The ³Introduction´ of this book in English is available following the
³Contents´ section in the next pages. There are several chapters in
English as far as original texts were included using this language.
These texts are also listed in the above mentioned ³Introduction´.
Any part of this book may be reproduced in any form under the
condition of being referred to authors and sources. All rights reserved.
Commercial use of parts of this book only with permission
of the authors.

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Sumário
Volume III
Tendências centrais dos estudos e pesquisas em Meio Ambiente,
esporte, lazer e turismo no Brasil no período 1967 - 2007
Research mainstreams of studies on environment, sport, leisure and
tourism in Brazil within the period 1967-2007
Ana Maria Miragaya, PhD
Atividades de Aventura como Conteúdo da Educação Física:
Reflexões sobre seu Valor Educativo [2005]
Alcyane Marinho
Gisele Maria Schwartz
Atividades de Aventura em Ambientes Artificiais [2005]
Alcyane Marinho
Esportes de Aventura na Natureza um Estudo de Caso no Pará [2005]
Ana Cristina P. C. de Almeida
Sensações dos Praticantes de Trekking [2005]
Claudia Mônica Silva
Fátima Casassola Miguel
Valdo Vieira
Nua Natura [2005]
Éden Silva Pereti
Ecoturismo e Turismo de Aventura como Alternativas para a
Conservação do Carste de Dianópolis ± TO [2005]
Heros Augusto Santos Lobo
Marcos Luis Faleiros Lourenção
Atividade de Aventura e Mergulho Autônomo: Desvelando Emoções
e Sensações no Âmbito do Lazer [2005]
Marilia Freire
Gisele Schwartz
Na Trilha dos Sujeitos Praticantes do Lazer na Natureza: um Debate
Conceitual sobre Lazer e Meio Ambiente [2005]
Mirleide Chaar Bahia
Tânia Mara Vieira Sampaio
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37
39
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Experimentando a sustentabilidade do turismo na Natureza [2005]
Rita Mendonça
Educação Ambiental e Ecoturismo [2005]
Rita Mendonça
O Corpo na Trilha e a Trilha no Corpo: a Discussão Ambiental na
Formação do Profissional de Educação Física [2005]
Simone Sendin Moreira Guimarães
Impactos Ambientais em Práticas Esportivas na Natureza [2005]
Valdo Vieira
Manoel J. G. Tubino
O Turismo e o Lazer e sua Interface com o Setor de Recursos
Hídricos [2005]
Alessandra Daibert Couri
Perfil do praticante de Esportes de Aventura [2005]
Ana Cristina P. C. de Almeida
David Gibb McGrath
Os Impactos Ambientais e os Esportes de Aventura [2005]
Ana Cristina P. C. de Almeida
Esportes de Aventura e Sustentabilidade: Consciência e ética
ambiental [2005]
Ana Cristina P. C. de Almeida
Precarização do Trabalho e Territorialidade da Atividade Turística
em Bonito-MS [2005]
Edvaldo Cesar Moretti
Gilson Kleber Lomba
O equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade
socio-ambiental [2005]
João Meirelles Filho
Políticas Públicas de Turismo no Nordeste nos Anos 90:
O Prodetur/NE [2005]
Lillian Maria de Mesquita Alexandre
O Turismo de Aventura na Região Amazônica:
desafios e potencialidades [2005]
Mirleide Chaar Bahia
Tânia Mara Vieira Sampaio
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A Importância das Atividades Físicas de Aventura na Natureza


(Afan) e os Impactos Ambientais Gerados [2006]
Alcides Vieira Costa
O Âmbito dos Esportes de Aventura e a Qualidade de Vida: aponta-
mentos sobre a aventura, o esporte e o ambiente [2006]
Ana Cristina Zimermann
Sidney Ferreira Farias
A Comercialização das Montanhas Através das Práticas de Lazer a
Partir do Século XX [2006]
Arianne Carvalhedo,
Fabiana Rodrigues de Sousa
Cris Costa Veerman
The Olympic Winter Games: The Quest for Environmental Protection
and Educational Promotion ± an Overview [2006]
Lamartine P. DaCosta
Cris C. Veerman
Atividade Física e o Meio Ambiente [2006]
Lamartine P. DaCosta
Lazer e Educação Ambiental na Hotelaria: um Estudo de Caso [2006]
Evandro Antonio Correa
Nível de Informação de Discentes de Educação Física sobre Meio
Ambiente, Natureza e Suas Inter-relações com o Esporte
Kalyla Maroun
Valdo Veieira
Turismo Comunitário como Proposta de Resistência e em Defesa ao
Meio Ambiente: Cultura e Tradição das Velhas Mulheres da Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Estadual ± Ponta do Tubarão ± RDS [2006]
Lore Fortes
Lenice Lins Goulart
Lazer ± Meio Ambiente: novas demandas da sociedade
contemporânea [2006]
Mirleide Chaar Bahia
Jossett Campagna De Gáspari
Lazer, Natureza e Amizade: Formas de Subjetivação na
Modernidade Tardia [2006]
Sandoval Villaverde Monteiro
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341
345
357
359
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371

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Copa de 70: o Planejamento México [2006]
Marco Santoro
Antônio Jorge Soares
Tiago Lisboa Bartholo
Educação Física, Lazer e Meio-Ambiente: desafios da relação ser
humano e ecossistema [2006]
Tânia Mara Vieira Sampaio
A Participação de Idosos em Atividades de Aventura na Natureza no
Âmbito do Lazer: Valores e Significados [2006]
Viviane Kawano Dias
Viagens, Lazer e Esporte: o Espaço da Natureza [2006]
Alcyane Marinho
Heloisa Turini Bruhns
Caminhar: um relato das cinestesias e das experiências sinestésicas [2006]
Jaqueline Castilho Moreira
O desafio do Movimento Sharing Nature na Educação Ambiental
Contemporânea [2006]
Rita Mendonça
Shin-ichi Furihata
389
405
419
421
425
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Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.
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. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
Introdução
Relacionando meio ambiente com esporte, lazer e turismo, este livro se pro-
põe a ser uma coletânea de textos apresentados a público no Brasil desde 1967
- ano da provável primeira obra no assunto segundo interpretações atuais ± que
sugere representar diferentes caracterizações e tendências assumidas por este
tipo de conhecimento ao longo do tempo. Em resumo, este novo livro está
basicamente proposto como um documento de memória e uma referência para
trabalhos acadêmicos futuros numa área de conhecimento que tem exibido grande
impulso nos últimos anos, no país e no exterior.
Os textos inventariados foram fornecidos voluntariamente por seus autores a
partir de solicitação pública de livros individuais e coletivos, artigos em periódi-
cos, teses, dissertações, contribuições em congressos e seminários, e publica-
ções técnicas diversas. Pesquisas e estudos aceitos para publicação (no prelo
em 2006 - 2007) foram incluídos tendo em vista o objetivo de discernir tendên-
cias à semelhança das obras antecedentes. Como tal, a presente publicação
destina-se à distribuição gratuita e fácil acesso por várias mídias e formatos.
As tendências centrais (research mainstreams) dos trabalhos foram assumidas
na tradição científica de identificar convergências por tipos de abordagens
temáticas e por quantidade de estudos. Entretanto, as interpretações e sínteses
adiante apresentadas devem ser consideradas apenas como indicações de uso
genérico uma vez que não se baseiam em levantamentos exaustivos nem
amostragens estatísticas de trabalhos publicados. Em que pese uma validade
reduzida - mas todavia pertinente - priorizou-se a reprodução de trabalhos
publicados em livros, um meio ainda aceitável e útil nas condições acadêmicas
brasileiras para caracterizar enfoques principais.
Isto posto, encontra-se em seguida nesta ³Introdução´, em ordem cronológi-
ca, a identidade inicial de textos na temática objetivada por este livro com
Tendências centrais dos estudos e
pesquisas em Meio Ambiente,
esporte, lazer e turismo no Brasil
no período 1967 - 2007
Ana Cristina P. C. de Almeida & Lamartine P. DaCosta

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10 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
exame adicional de características e respectivos relacionamentos, quer no tem-
po, no espaço e segundo interesses de seus autores. Esta análise descritiva foi
feita por contextualização histórica a partir de obra publicada no Brasil em 1850
(ver adiante) no tema do meio ambiente e suas influências em entes humanos. A
observação das relações do meio ambiente com o esporte, lazer e turismo foi
feita nos anos subseqüentes até 2007. Para esta tarefa textos e autores não
contemplados nesta Coletânea foram citados à vista de esclarecimentos sempre
que convenientes para melhor compreensão e registro. Em resumo, tais disposi-
ções nesta abordagem inicial incorporam tendências centrais e secundárias por
sínteses e re-interpretação dos textos arrolados.
As contribuições para o livro ora em apresentação foram resumidas pelos
cedentes das obras originais, procurando-se relevar aspectos essenciais dos
estudos. Também foram mantidos os padrões estabelecidos originalmente pelos
autores, incluindo forma de redação e modos de referenciação bibliográfica.
Nos casos de obra publicada no exterior foi mantida a versão em inglês. Em
suma, cada texto constituiu um capítulo do livro também integrado numa ordem
cronológica geral que ao final permitiu uma primeira periodização de tendências
centrais dos estudos e pesquisas: 1967 ± 2000 (fase pioneira) e 2001 - 2007 (fase
de maturidade). Esta mesma disposição permitiu antever dois períodos de
internacionalização independentes entre si dos estudos brasileiros em meio
ambiente, esporte, lazer e turismo: 1967 ± 1987 (enfoque maior no esporte) e
1997 ± 2007 (enfoque prioritário na sustentabilidade com visões integradas do
esporte, lazer e turismo).
Em termos epistemológicos, para que fosse possível identificar research
maintreams dos estudos e pesquisas, os editores deste livro adotaram interpreta-
ções e conceitos amplos (soft definitions) quer do meio ambiente ± por vezes
identificado como ³natureza´ ± como do esporte, lazer e turismo, evitando defini-
ções estreitas e especializadas. Estas últimas hard definitions inviabilizariam a
observação das relações típicas do meio ambiente à luz da sustentabilidade, dis-
tante portanto do objetivo da presente obra. Neste particular, assumiu-se como
diretriz principal a concepção geral de meio ambiente estipulada pelo Comitê
Olímpico Internacional ± COI, isto é : ³todos os fatores externos, condições e
influências que afetam um organismo ou uma comunidade´ (IOC, ³Manual on Sport
and the Environment´, Lausanne, 2001, p. 80). Adicionalmente, definiu-se também
a sustentabilidade como ³o desenvolvimento que atende as necessidades das ge-
rações presentes sem prejudicar as gerações futuras´ (Ibidem, p. 81).
Por sua vez, a mesma fonte do COI (2001, pp. 13 - 14) ajusta a concepção de
esporte aos problemas da proteção ambiental declarando que ³a prática do
esporte inclui atividades físicas em diferentes níveis, com participação informal
e ocasional ou de alto rendimento com normatização, implicando em gestão
especializada ou de livre iniciativa de praticantes´. Já as relações do esporte
com o turismo, sob o enfoque do meio ambiente, seguiram as proposições de

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 11
Tom Robison & Sean Gammon (³Revisiting and Applying the Sport Tourism
Framework´, Journal of Sport Tourism, Volume 9, Number 3, 2004) ³as quais
compreendem pessoas viajando, ou com estadas em locais fora de seu ambiente
usual, com participação ativa ou passiva em atividades esportivas de competi-
ção ou recreativas´. Outra recomendação adotada concerne às inter-relações
entre o turismo e o lazer, segundo Guy Swinnerton (³Recreation and Conservation´,
in Jackson, E.L. & Burton, T.L., ³Understanding Leisure and Recreation´, Venture
Publishing, State College, PA, 1989, pp. 517 - 565), que geralmente ocorrem sob
forma de coexistência, simbiose ou conflito, sendo a última alternativa a mais
comum dada à expansão do turismo em escala mundial.
À vista do exposto, apresenta-se em seguida análises históricas e contextuais
que fundamentam os textos reunidos para a produção deste livro, com base em
revisões equivalentes de DaCosta (1997) elaboradas para a Universidade do Por-
to ± Portugal (ver ³Introduction and Chronology´, pp. 15 - 37) ; de Ana Cristina P.
C. Almeida (2000) para sua dissertação de Mestrado em que fez verificações de
tendências usando a técnica Delphi (texto incluído nesta Coletânea); e, finalmen-
te, mas não menos importante, de Andrade da Costa para o capítulo ³Meio
Ambiente e Esporte ± Produção do Conhecimento´, publicado no µAtlas do Espor-
te no Brasil¶, 2006 (pp.720 ± 721), organizado por Lamartine DaCosta, Ana Miragaya
e Evlen Lauer Bispo.
1850 Eduardo Ferreira França (1809 ± 1857) de Recife-PE, médico formado na
França, publica o livro ³Influência dos Pântanos sobre o Homem´ (Tipografia
Liberal do Século, Salvador, 1850), no qual se analisam os efeitos da insalubrida-
de do meio ambiente sobre a moral humana. Esta obra confirma a idéia dominan-
te no Brasil de que o clima tropical produzia indolência, vícios e doenças.
1888 A Editora Garnier do Rio de Janeiro-RJ, lança a obra do escritor e político
Sílvio Romero (1851 ± 1914) intitulada ³História da Literatura Brasileira´ em cujo
capítulo ³O Meio Fisiologia do Brasileiro´ são descritas as teorias correntes na
Europa quanto à inferioridade dos povos habitantes de regiões de clima quente.
Sílvio Romero interpretando o fato argumenta que era necessário não generali-
zar a questão climática brasileira, pois o ambiente nocivo limitava-se a determi-
nadas áreas da nação. Porém reconhecia a deterioração física de grande parte de
seus cidadãos: ³Temos uma população mórbida, de vida curta, achacada e pesa-
rosa em sua mor parte (...) O trabalho intelectual é no Brasil um martírio; por isso
pouco produzimos; cedo nos cansamos, envelhecemos e morremos depressa´
(p. 93, vol. 1 da 7ª. Edição, 1980). Além destas dificuldades, Romero já como
deputado federal e membro fundador da Academia Brasileira de Letras (Rio de
Janeiro), denunciou em 1902, o tamanho das colônias alemãs no sul do país, que
já comprometiam em sua opinião a identidade cultural lusófona do Brasil.
1902 O escritor Graça Aranha, membro da Academia Brasileira de Letras, publica
o romance ³Canaã´, um livro em que explora em estilo pré-modernista, a deca-

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12 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
dência cultural de colonos alemães no estado do Espírito Santo diante das difi-
culdades de adaptação ao ambiente tropical.
1907 Na França, o Barão Pierre de Coubertin ± onze anos depois de resgatar os
Jogos Olímpicos ± adotava pela primeira vez no mundo do esporte uma posição
de defesa da natureza, ao mobilizar os esportistas para que limpassem seus
campos de prática. Estava inaugurada então a definição do esporte como poluidor
como também um envolvimento permanente do Movimento Olímpico internaci-
onal ± sobretudo manifestado pelos Jogos Olímpicos de Inverno e de Verão ±
com a proteção do meio ambiente. Uma revisão histórico-analítica deste com-
promisso foi produzida no início dos anos 2000, pelo brasileiro Lamartine DaCosta
em capítulo de livro internacional denominado de ³Towards an Olympic
Epistemology: Sport Sciences or Theory of Sustainable Sport?´, como se verifica
em ³Olympic Studies´, Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2002, pp. 131 ± 152
(não incluído nesta Coletânea).
1922 O Exército Brasileiro adota oficialmente o Método Francês de Educação
Física, o qual incorpora nesta versão inicial brasileira ± entre várias outras
tendências de origem francesa - as concepções de George Hébert (1875 ±
1957), líder da ³L¶ École Naturaliste´ criada em 1905. Esta doutrina elegia os
movimentos naturais (saltar, correr, trepar etc.) como base do método de
práticas físicas se aplicados em meio aos elementos naturais (água, sol, flores-
ta, ar etc.). Hoje, a Escola de Hebért ainda apresenta manifestações na França
e na Bélgica (Gleyse, J. et al., 2002).
1932 A Escola de Educação Física do Exército ± EsEFEx, situada no Rio de
Janeiro (Urca), inaugura uma ³Torre de Hébert´ junto à sua pista de atletismo,
marcando a incorporação do Método Natural aos currículos daquela institui-
ção militar. A Torre de Hébert foi mantida até meados da década de 1960
quando o Método Francês foi substituído pelo Método Calistênico na instru-
ção física do Exército Brasileiro (ver site www.esefex.ensino.eb.br/). No Brasil
da atualidade dos anos 2000, o Método de Hébert ainda sobrevive em suas
propostas essenciais em Curitiba-PR, em São Paulo-SP e outras cidades, por
meio de pistas de treinamento de exercícios naturais, com a denominação
original francesa ³Le Parkour´. Há também ainda uma Associação Brasileira de
Parkour ± ABPK, cujo site é www.abpk.br/.
1967 Lamartine DaCosta, professor de Educação Física do Centro de Esporte da
Marinha-RJ, publica um livro com relatórios de pesquisas sobre atividades físicas
em clima tropicais, realizadas na cidade do Rio de Janeiro, durante três anos (1964,
1965 e 1966). O livro foi denominado de ³A Atividade Desportiva nos Climas Tropi-
cais e uma Solução Experimental: o Altitude Training´ (DaCosta, 1967), em razão de
terem as investigações o objetivo de medir o gradiente redutor da performance
física de longa duração sob impacto direto dos raios solares, como também os
efeitos do mesmo esforço ao se realizar à sombra, em meio ao ambiente florestal.
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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 13
O experimento foi feito com 10 atletas masculinos de nível nacional e internacio-
nal do atletismo, em provas de corridas de média e longa distâncias. Como as
análises estatísticas das observações comprovaram uma melhoria no gradiente
redutor à sombra, especificamente nas subidas da Floresta da Tijuca da mesma
cidade, surgiu um método de treinamento como resultado adicional ao estudo. Por
conseguinte, a inibição do esforço físico devido ao calor foi relativizado pelo
modo de se conduzir e dosar o exercício. Em suma, o determinismo que definia o
trabalho físico em ambiente tropical no Brasil desde 1850, tornou-se improcedente
diante dos resultados desta pesquisa. Destaque-se ainda que estas investigações
biometeorológicas foram pioneiras na área esportiva nacional quanto ao uso de
computadores e de protocolos de rigor científico. O livro de DaCosta (1967) en-
contra-se resumido em suas partes principais na presente Coletânea, representan-
do a inauguração no Brasil de estudos e pesquisas sobre o meio ambiente e esporte
e posteriores desdobramentos nas áreas de lazer e turismo. Há uma versão em
inglês deste livro datada de 1966, compondo um manual técnico da Academia do
Conseil International du Sport Militaire-CISM, Brussels, sob a denominação ³Sport
Activities in Tropical Climates and an Experimental Solution: the Altitude
Training´(DaCosta, L.P., 1966). Esta obra marca o início da internacionalização da
produção científica brasileira na área do esporte e possivelmente na do meio
ambiente como disciplina autônoma de conhecimento.
1967 Lamartine DaCosta publica ³Planejamento México´ (obra incluída nesta Coletâ-
nea) pela então Divisão de Educação Física do MEC, em que estuda os efeitos do
meio ambiente encontrado na altitude em geral e na Cidade do México em particular,
a 2.240 metros, local dos Jogos Olímpicos de 1968 e da Copa do Mundo de 1970. Este
pesquisador participara de um grupo de observadores de diversas nacionalidades
que visitaram a Cidade do México em 1967, a fim de levantar as dificuldades de
competições de alto rendimento no local. DaCosta em razão de seus estudos ante-
riores ± desde 1963 - já participava na época da Sociedade Internacional de
Biometereologia e da Academia do Conselho Internacional do Esporte Militar-CISM,
esta última uma entidade de ponta nas questões de treinamento esportivo. Nestes
estudos, tal como ocorrera antes com o clima quente, demonstrou-se que o meio
ambiente adverso à atividade física representado por regiões elevadas, era real
porém eivado de preconceitos. Neste mesmo ano, uma versão reduzida deste livro
foi publicada em artigo em língua inglesa na revista ³Sport International´, Da Costa,
L.P., vol 3, no. 36, pp. 16 ± 23, sob o título ³Altitude Training´. Esta publicação (não
disponível nesta Coletânea) é possivelmente o primeiro texto em inglês na área do
esporte produzida por autor brasileiro para periódico científico de circulação inter-
nacional, e talvez um dos mais citados até hoje.
1968 Os Jogos Olímpicos do México têm lugar neste ano, superando a ameaça de
suspensão do evento pelo COI por existirem ameaças ambientais aos atletas pela
elevada altitude da sede dos Jogos. DaCosta acompanhou o evento e fez um
levantamento minucioso das condições de aclimatação para a Seleção Brasileira
de Futebol no local e em outras regiões do México, para uso quando da Copa do
Mundo de Futebol de 1970 a ser realizada no México.

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14 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
1968 João Lyra Filho publica neste ano o livro ³Desporto e Trópico´, em que
defende a teoria determinista do esporte praticado no clima prevalente na maior
parte do Brasil, a qual subentende efeitos prejudiciais. Este então famoso cultor
do direito e da sociologia do esporte, propôs nesta obra a elaboração de um
³Cadastro Nacional dos Desportos´ com a finalidade de ³explicar, à luz dos
trópicos, em relação a um povo ou outro, as preferências por desportos mais
atuados pelo instinto, pela alma ou pelo espírito´ (Lyra Filho, 1968, p. 6).
1970 Realização da Copa do Mundo de Futebol no México. Lamartine DaCosta
produziu um plano científico de adaptação usando os efeitos benéficos da alti-
tude (super aclimatação) e minimizando suas causas nocivas. Em conjunto com
outras contribuições positivas, o plano biometereológico garantiu a vitória da
Seleção ao final da competição. O relatório oficial da Federação Internacional
de Futebol Amador-FIFA sobre a Copa de 1970, publicado em 1972, enfatizou o
trabalho científico de aclimatação à altitude mexicana de 2.240 metros, consi-
derando como o mais eficaz entre os países concorrentes (FIFA, World Cup
México 70 - Official FIFA Report, Zurich, 1972). A partir deste ano, vários estudos
e registros foram publicados sobre os feitos científicos para Copa de 1970 com
base em conhecimento gerado no Brasil. Este tema repercutiu mais uma vez
durante a Copa de 2006 (Alemanha) como se verifica em estudo incluído nesta
Coletânea (Santoro, Soares e Bartholo, 2006), o que confirma ser uma das ten-
dências dominantes da produção de conhecimento na área de meio ambiente no
Brasil, com quatro décadas de sobrevivência.
1977 Publicação do livro ³Treinamento Desportivo e Ritmos Biológicos´ (José
Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1977) de Lamartine DaCosta, reunindo pesquisas
feitas com atletas brasileiros no Rio de Janeiro e em Atvidaberg, na Suécia,
quando as reações dos sujeitos da investigação à mudança de ambientes foram
mensuradas e comparadas à luz da aplicação de treinamento físico. Neste está-
gio da produção do conhecimento já se considerava importante o cruzamento
de efeitos diversos advindos do meio ambiente (calor, altitude, mudança de fuso
horário etc) buscando-se fatores de maior influência. Neste particular, o relaci-
onamento social destacou-se como variável fundamental da aclimatação ³cru-
zada´, fenômeno de natureza ecológica incluindo influências de vários sistemas
relacionados à vida humana. O livro de DaCosta (1977) não esta incluído nesta
Coletânea, em que pese seu valor para o estímulo do esporte-turismo, hoje em
ampla expansão. Esta obra, também pioneira, recebeu como pesquisa o Prêmio
MEC de Literatura Esportiva de 1976. Estes resultados sugerem também que a
opção biológica e ambientalista de DaCosta e associados situava-se à época em
nível similar às pesquisas internacionais.
1981 Neste ano, publica-se no Rio de Janeiro, o livro ³Teoria e Prática do Esporte
Comunitário e de Massa´, Lamartine P. DaCosta (Ed.), Palestra Edições. Esta obra
consolidou experiências e conhecimentos do chamado ³Esporte para Todos´
(EPT) no Brasil ± gerados nas décadas de 1920 a 1970 -, incluindo autores sobre-

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 15
tudo das áreas de lazer e esporte recreativo. Entre as diversas revisões feitas
pelo EPT brasileiro, destacou-se a valorização da natureza como ambiente de
práticas físicas, como se verifica nos Princípios do Esporte para Todos (ver texto
de DaCosta de 1981, incluso nesta Coletânea).
1981 ± 1982 No Brasil, neste estágio, as atenções para o meio ambiente por parte
dos esportistas permaneceram limitadas a interesses incidentais, tais como aos
relacionados a competições em altitude na Colômbia, Equador, Bolívia e México.
Entretanto, a agenda de pesquisas de DaCosta em termos de influência do meio
ambiente no desenvolvimento atlético neste período incorporou experiências
com atletas brasileiros preparando-se para os Jogos Olímpicos de Moscou (1981);
planejamento in loco da adaptação à altitude de 3.600 metros para a representa-
ção brasileira ao Campeonato Sul-Americano de Natação em La Paz, Bolívia
(1982); reconhecimento dos locais de jogos da Copa do Mundo de Futebol-1982,
na Espanha, para adaptação da Seleção Brasileira de Futebol ao calor, alimenta-
ção e mudança de fusos horários. Em adição a estes desenvolvimentos, DaCosta
fez estágio em Font Romeu, França, no laboratório de pesquisas em altitude dos
Pirineus (1.850m), também em 1981.
1983 Diekert & Monteiro da Universidade Federal de Santa Maria ± UFSM, publi-
cam o possível primeiro livro nacional ± incluso nesta Coletânea - sobre equipa-
mentos e parques de lazer em que privilegiaram atividades físico-recreativas em
ambientes naturais, promovidas por trabalhos comunitários e locais (mutirão).
Jürgen Diekert era à época professor visitante na UFSM e trouxe experiências da
Alemanha quanto ao uso de materiais de origem florestal.
1987 DaCosta publica em Portugal, pelo Ministério da Educação e Cultura, o
estudo ³A Reinvenção da Educação Física e do Desporto segundo Paradigmas do
Lazer e da Recreação´, em que explora especulativamente a oposição funda-
mental entre a idéia da natureza e a de cultura. Este nexo tradicional da filosofia,
revelou-se para o autor brasileiro como um fio condutor para se re-conceituar o
lazer à luz das atividades físicas organizadas de modo pedagógico ou de livre
arbítrio. Possivelmente este texto inaugura o pensar ecológico no lazer no âm-
bito acadêmico de língua portuguesa.
Década de 1990 Neste período, o eixo de compreensão das questões ambientais
no esporte se deslocou da proteção do praticante para a proteção do meio
ambiente em que se pratica ou se competem esportes. Este fato foi produto do
espírito da época desde que em 1992, realizava-se no Rio de Janeiro, a Conferên-
cia das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento de grande
impacto internacional e marcante quanto ao início da responsabilidade dos esta-
dos nacionais, formalmente assumida, a respeito da proteção da natureza em
escala global. Do lado do esporte, o COI assumiu a liderança no plano internaci-
onal e, já em 1995, esta instituição organizava a 1a. Conferência Mundial sobre
Esporte e Meio Ambiente em Lausanne, Suíça. Neste evento se estabeleceram as

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16 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
bases para emendar a Carta Olímpica, documento maior de princípios do COI e
das Federações Internacionais a ele filiadas, o que ocorreu efetivamente em
1996. A partir desta data, o COI passou a assumir publicamente os seus ³três
pilares de sustentação: esporte, cultura e meio ambiente´ (Tavares, 2002). A
modificação da Carta Olímpica incluiu a definição de desenvolvimento sustentá-
vel, já consagrada na histórica Conferência do Rio de Janeiro de 1992. Por este
marco definitório, ³as atividades físicas, os jogos e competições são sustentá-
veis quando sua instrumentalização respeita os valores intrínsecos da natureza
e do esporte´ (DaCosta, 2002). Em síntese, a definição então estabelecida e hoje
corrente, propunha uma adaptação mútua entre praticantes e o meio ambiente,
uma posição bem distinta em perspectivas do passado no Brasil com relação ao
determinismo ambiental de Lyra Filho dos anos de 1960 ou do higienismo radical
de Eduardo Ferreira França do século XIX, que entendia o meio ambiente como
uma ameaça à saúde humana.
1992 DaCosta publica em capítulo de livro seu segundo estudo filosófico sobre
o meio ambiente ³O Olhar e o Pensar Ambientalista´, no qual explora sua expe-
riência científica de três décadas no tema. Neste texto ± ora incorporado nesta
Coletânea ± há um resumo de sua crítica, ao declarar que ³estamos incorporan-
do, enfim, uma cultura ecológica, mas não conseguimos compreendê-la além
dos dados científicos reducionistas ou da informação efêmera da mídia´.
1993 Realização do Simpósio Internacional Cidadania, Esporte e Natureza, orga-
nizado pela Universidade do Porto, em Portugal, por proposta de Lamartine
DaCosta, então professor visitante daquela universidade. Também neste ano, no
Brasil, Rita Mendonça, especialista em Planejamento Ambiental pela UNESCO e
mestre em Sociologia do Desenvolvimento pela École des Hautes em Sciences
Sociales, da França, publica o artigo ³Turismo ou meio ambiente: uma falsa
oposição´ (incluído nesta Coletânea) denunciando que no Brasil ³o turismo, tal
como vem sendo implantado, não apresenta característica de sustentabilidade a
médio e longo prazos´. Este estudo pioneiro, todavia de índole conceitual, cons-
trói preliminares ao pensamento sobre o meio ambiente, que aparentemente
influenciaram autores brasileiros de temas relacionados com o lazer de ativida-
des físicas e turismo. Nas conclusões há perspectivas futuras da parte da autora
que revelam tendências hoje razoavelmente confirmadas: ³Há vários indícios de
que essa sustentabilidade não ficará apenas em nosso exercício de raciocínio: os
novos planos de desenvolvimento turístico vêm incorporando pouco a pouco os
aspectos ambientais; a legislação ambiental brasileira é bastante clara e interes-
sante em muitos aspectos; os conceitos e técnicas em educação ambiental têm
evoluído muito. É claro que tudo isso precisa ser posto efetiva e completamente
em prática. Mas não podemos perder de vista que se trata de um processo,
formado por etapas e pequenas conquistas individuais´
1994 Realização dos Jogos Olímpicos de Inverno de Lillehammer, Noruega, que
representaram os primeiros ³Jogos Verdes´ (Green Games) da história do Movi-

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 17


mento Olímpico Internacional, pelos critérios de sustentabilidade adotados nas
instalações e organização das competições e hospedagem de atletas e visitantes.
Neste ano, Sydney ± Austrália foi escolhida por eleição como sede dos Jogos
Olímpicos de Verão do ano 2000, tendo privilegiado a proteção do meio ambiente
em seu projeto de candidatura. Em condições similares de dar prioridade ao
ambientalismo, Atenas ± Grécia foi eleita em 1998, a sede dos Jogos Olímpicos de
2004. Entretanto, a partir de Lillehammer tornou-se comum o uso dos Jogos
Olímpicos como showcases (projetos - demonstração) de boas práticas
ambientalistas. No âmbito brasileiro, autores como DaCosta, Carvalhedo e Veerman
± seguidores da tradição científica, tecnológica e ética ± adotaram então os even-
tos olímpicos como suporte empírico de seus estudos, incluindo no caso o turismo
e o lazer. Tal opção foi reforçada em 1999 quando da adesão oficial do Programa
Ambiental das Nações Unidas ± UNEP ao trabalho em conjunto com o Comitê
Olímpico Internacional (ver adicionalmente Tavares et al., 2002, nesta Coletânea).
1996 Neste ano, outros autores brasileiros incluem-se na senda aberta antes por
Rita Mendonça, como no exemplo de Ana Cristina P.C. Almeida ao preconizar
³ênfase na Educação Ambiental que direciona a uma atualização voltada, princi-
palmente, ao uso adequado dos recursos naturais, porém, geralmente, discrimina
as relações globais de causa e efeito por falta de tempo, dedicação e até expe-
rimentação científica que tornaria o assunto mais pró-ativo além da simples
µconscientização¶ e, portanto, de maior importância ao aprendizado´ (ver nesta
Coletânea o texto ³A Inter-Relação do Ensino em Recreação e Lazer e a Educa-
ção Ambiental´ de 1996). Por sua vez, Flávio Leonel A. Silveira em seu ³Ecoturismo:
Viagem, Lazer & Aventura´ (incluído nesta Coletânea), adotando uma linha
conceitualista e experimental, levanta perspectivas futuras indicando que ³o
turismo ecológico ou o ecoturismo é um fenômeno recente e em evidência, ou
melhor, é um evento típico do final do século XX, dentro do que se poderia
apontar como uma perspectiva pós-moderna de interação com os naturais. Tra-
ta-se de uma atividade turística que se caracteriza por certo hibridismo, no qual
as questões ecológicas mesclam-se com a experiência turística gerando um
outro tipo de evasão do espaço urbano, a qual prefiro denominar µexperiência
ecoturística¶.´ A própria Rita Mendonça retorna este ano, publicando ³Visitar e
compartilhar a natureza´ (incluído nesta Coletânea), uma reflexão em que se
baseia em destacado pensador ambientalista que tenta combinar posições filo-
sóficas com imperativos pedagógicos: ³Para Joseph Cornell, a verdadeira defini-
ção de educação, que abrange a educação ambiental, é sugerida por J. Donald
Walters: µÉ a habilidade de se relacionar com outras realidades, e não apenas com
a sua própria¶. No fundo, nós estamos ligados a todas as formas de vida, só que
não percebemos mais,.. No nosso dia-a-dia quase não nos damos conta deste
afastamento e de quão longo é o caminho para nos reencontrarmos verdadeira-
mente com elas´.
1997 Neste ano, foi organizado um Seminário na Universidade de Cingapura
sobre os problemas ambientais dos Jogos Olímpicos de Sydney - 2000, no qual
Lamartine DaCosta (Universidade Gama Filho-RJ) debateu com Richard Cashman

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18 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
e Kristine Toohey, da Universidade de New South Wales, Austrália, as questões
centrais sobre o meio ambiente envolvendo os Jogos Olímpicos. Nesta ocasião,
foi divulgado um position paper (não incluído nesta Coletânea) então referenciado
como: DaCosta, L.P., The Green Dream: the Olympic Movement and the
Environment, National Olympic Academy of Singapore Seminar, Singapore, 1997.
Posteriormente, ainda em 1997, este autor brasileiro publicou pela Academia
Olímpica Internacional, Grécia, um estudo de revisão conceitual e tecnológica
para dar suporte à candidatura de Atenas para os Jogos Olímpicos ± 2004; tal
documento (também não incluído nesta Coletânea) está referenciado como:
DaCosta, L. P., The Olympic Movement Today and the Environment Protection,
I.O.A. Report of the 37th Session, Ancient Olympia, 1997, 3-6. Em resumo, no
Brasil, a linha de pesquisa liderada por DaCosta neste estágio já estava consoli-
dada como marcada por bases científicas, filosóficas e tecnológicas ao passo
que o caminho em construção exemplificado por Mendonça, Pimentel e Silveira
mostrava-se como de revisão conceitualista, pedagógica e auto-reflexiva dian-
te uma realidade típica nacional. Significativamente estas duas tendências cen-
trais dos anos de 1990 focalizavam igualmente o meio ambiente, o lazer e o
turismo, gerando um certo hibridismo conceitual e operacional.
1997 Publica-se em Portugal, o livro ³Meio Ambiente e Desporto ± Uma Perspec-
tiva Internacional´, tendo como editor Lamartine DaCosta e como organizador
Antônio Marques, professor da Universidade do Porto. O livro ± escrito em inglês
e português - teve o apoio financeiro do Comitê Olímpico Internacional - COI e
a colaboração de 15 especialistas de vários países no tema proposto. A tese
central do livro dispôs-se na condição ambivalente do esporte que tem atuado
³como vilão e vítima´ do meio ambiente. A presente coletânea inclui a ³Introdu-
ção´ deste livro como também um capítulo de DaCosta em que se apresenta uma
teoria geral sobre o meio ambiente e a prática esportiva, ambos na versão em
inglês da publicação. Esta última construção conceitual, filosófica, empírica de
índole científica e internacionalista demarcou a produção do autor em foco até
2006 quando publica um estudo sobre a proteção do meio ambiente ± com
educação ambiental e turismo correlatos ± nos Jogos Olímpicos de Inverno de
Turim ± Itália (em associação com Cris Veerman e incluído nesta coletânea). No
seu significado de obra coletiva internacional, o livro da Universidade do Porto
constituiu um marco para os especialistas brasileiros em meio ambiente na me-
dida em que se expandiu o intercâmbio com outros países como se verifica nos
anos seguintes desta cronologia. Este viés explica, por exemplo, o destaque
dado pelo European College of Sport Sciences aos trabalhos da linha de pesquisa
de DaCosta e associados em 1991 (ver adiante).
1998 Acontece o Seminário Internacional de Esporte e Meio Ambiente, em
Curitiba-PR, promovido pelo Comitê Olímpico Brasileiro-COB, com a presença de
representantes de países latino-americanos e do COI. Otavio Tavares, Renato
Miranda e Lamartine DaCosta organizaram um livro com os textos apresentados
e as notas das discussões, que foi publicado em 2002 com o título ³Esporte,
Olimpismo e Meio Ambiente´. Neste Seminário teve destaque a ³Agenda 21´

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 19
como base para a revitalização dos esportes tendo em vista as exigências de
proteção ambiental. A Agenda 21 teve também origem na Conferência de 1992 do
Rio de Janeiro, consistindo num compromisso de esforços conjugados de gover-
nos e instituições em projetos de conservação ou de proteção da natureza (³21´
refere-se ao século visado pela Agenda).
1999 Tem lugar no Rio de Janeiro-RJ a Terceira Conferência Mundial sobre Espor-
te e Meio Ambiente, promovida pelo COI e organizada pelo COB. Este evento foi
o maior até então ocorrido no tema proposto, com a presença de 93 represen-
tantes de Comitês Olímpicos Nacionais e de 19 Federações Internacionais de
esportes. O significado desta participação inédita prendeu-se ao crescente
envolvimento das modalidades esportivas per se nas questões ambientais, em
complementação aos interesses voltados para os Jogos Olímpicos e mega even-
tos esportivos em geral. Segundo avaliação de DaCosta produzida em 2001 por
solicitação da Universidade de Colônia, Alemanha, em 29,7% das contribuições e
discussões da Conferência de 1999, o foco se pôs na ética, sobretudo em termos
de comportamento pessoal e de intervenções de governo. Já 27,0% dos trabalhos
voltou-se para perspectivas e projeções futuras do tema de proteção ambiental,
enquanto 24,3% abordou técnicas e instrumentos de manejo ecológico. Os as-
suntos de promoção de eventos e os relacionados com a educação e cultura
foram residuais com 18,9%. Estes resultados indicaram a existência de ambigüi-
dade no trato das questões ambientais por parte dos gestores esportivos das
entidades internacionais, o que foi posto em foco por DaCosta posteriormente
no trabalho ³International Trends of Sport and Environment - a 2001 Overview´,
já aqui citado e resumido pela presente Coletânea.
1999 No Brasil, Rita Mendonça amplia sua linha de reflexão e re-conceituação
do turismo vinculado ao meio ambiente, publicando ³Sentido da Viagem´, capí-
tulo de livro em que a busca de novos sentidos constitui a abordagem principal
(ver texto com este título na presente Coletânea) diante da crescente valoriza-
ção da natureza. Na mesma linha de conta, situam-se Cristiane Ker de Melo & Ana
Cristina P. C. Almeida no estudo ³Nas Trilhas da Relação Educação Física ± Meio
Ambiente´ ± incluído nesta Coletânea ± inserindo os nexos das atividades físicas
organizadas ou de lazer na re-semantização unificada da natureza. Tais re-
significações neste estágio implicaram em verificações empíricas, como o fize-
ram Alba Pedreira Vieira & Priscyla Assis em ³Turismo Ecológico: essa possibili-
dade de lazer é µquente¶´ (ver nesta Coletânea), produzindo levantamento de
campo. Para estas autoras, o desenvolvimento da Educação Ambiental passa
pelo turismo ecológico (EMBRATUR, 1994: ³Um segmento da atividade turística
que utiliza, de forma sustentável, o patrimônio natural e cultural, incentiva sua
conservação e busca a formação de uma consciência ambientalista através da
interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar das populações envolvi-
das´). Este, por sua vez, ³oferece enquanto espaço para vivência tanto do ho-
mem com seus pares, quanto do homem com a natureza; essa vertente do turis-
mo vem a cada dia se consolidando como potencializadora forma de se conhe-
cer a natureza, dela fruindo e usufruindo, de maneira orientada e sustentável´. A

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20 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
verificação prática de propostas de lazer, atividades físicas e Educação Ambiental
foi feita também por Teresa Magro em ³Impactos do uso público em uma trilha
no Planalto do Parque Nacional do Itatiaia´ (ver Coletânea), em que um estudo de
caso demonstrou que ³fatores institucionais, ligados à administração do parque,
contribuíram fortemente para a degradação de parte do ecossistema estudado´.
Outra verificação foi feita por Alba Pedreira Vieira, Priscyla Assis & Fernanda
Fernandes por meio de vivências no município de Tombos-MG (ver ³Ecoturismo
urbano´ nesta Coletânea) quando se comprovou que a ³cultura lúdica´ dos pra-
ticantes pode alavancar um experiência de Educação Ambiental. Uma discussão
destas possibilidades de integração de fatores culturais, educacionais e gerenciais
envolvendo o meio ambiente é feita ainda em 1999 por Alcyane Marinho (ver
nesta Coletânea ³Do Bambi ao Rambo ou do Rambo ao Bambi? As relações com
a (e na) natureza´. Para esta última autora, as novas formas de se relacionar com
o meio natural e com outras pessoas, manifestam-se preferencialmente por
meio da prática de atividades de aventura na natureza. No seu todo, os estudos
e pesquisas inventariados em relação ao final dos anos de 1990, sugerem que a
fase de re-conceituações diminuiu progressivamente enquanto ampliavam-se as
investigações e observações de campo. A explicação, no caso, é a de que o
impacto do ambientalismo em face aos fatos sociais no Brasil exigiu reflexão e
ajustes conceituais no início da década de 1990, dando lugar posteriormente às
constatações práticas para legitimação de intervenções por parte de indivíduos,
grupos sociais e instituições.
2000 A fase identificada para o final da década de 1990 inclui sobretudo as
investigações de Ana Cristina P. C. de Almeida fazendo verificações de tendênci-
as, usando a técnica Delphi reunindo especialistas diversos exercendo projeções
futuras. Nesta Coletânea foram arrolados dois textos da autora em foco, sendo
o primeiro ³Considerações sobre o Futuro das Atividades Físicas de Lazer e
Recreação Ligadas à Natureza - Um estudo Delphi´; e o segundo ³O Futuro das
Atividades Físicas de Lazer e Recreação ligadas à Natureza e à Educação
Ambiental´, ambos extraídos da dissertação de Mestrado desta pesquisadora. De
acordo com a metodologia usada nas pesquisas foram consultados 35 especia-
listas em painéis sucessivos em horizontes de tempo imediato e de três anos
adiante. Ao final, concluiu-se que na opinião dos especialistas entre as práticas
de ocorrência imediata encontram-se caminhadas ecológicas, corridas rústicas,
surfe, canoagem, rodeio, as diversas modalidades esportivas nas areias das prai-
as do litoral brasileiro e fotografia da natureza. Entre 2000 e 2001, os especialis-
tas apontam que o crescimento do ecoturismo, em fazendas, sítios, e no Panta-
nal; as atividades desenvolvidas pelas empresas de ecoturismo, os crescentes
campeonatos em diferentes ambientes naturais, colônia de férias, acampamen-
tos, surgimento e continuidade de eventos científicos, publicações acadêmicas
nas áreas do Lazer e do Turismo e o surgimento de programas relativos às
atividades ligadas ao ambiente natural. No período de 2000 a 2002, destacam-se
o Congresso Virtual do Meio Ambiente, a construção de parques temáticos, as
pressões do poder econômico para a transformação de ambientes naturais para
o lazer de massas, a educação para o lazer e o Meio Ambiente e a construção de

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 21
espaços alternativos para a prática de atividades físicas para a terceira idade.
Não houve consenso quanto aos impactos considerados negativos ao ambiente
natural; porém pressupõe-se que estes eventos possam causar diferentes impac-
tos ao ambiente e no estilo de vida das pessoas. Dos conteúdos analisados
referentes aos programas de Educação Ambiental, observou-se que a disciplina
não consta nos currículos e apenas 10% dos professores responderam no questi-
onário que trabalham a Educação Ambiental. Entre as sugestões metodológicas
apresentadas, destacaram-se em linhas gerais o trabalho interdisciplinar, o in-
centivo a linhas de pesquisas, a efetivação da atividade e a preparação de mate-
riais educativos para a comunidade, entre outros. Ao final, foi possível discernir
que a disciplina Lazer e Recreação deva contemplar a Educação Ambiental devi-
do ao crescimento dos eventos ligados à natureza e seus possíveis comprome-
timentos ao ambiente natural. Estas verificações ainda estão hoje (2006) em
aberto para confirmações. Porém já se pode admitir que os elementos destaca-
dos na consulta Delphi estão presentes nas relações sócio-culturais atuais, mas
continuam desconhecidas as proporções em que se influenciam umas às outras.
2001 Uma avaliação dos principais direcionamentos da produção do conheci-
mento do esporte em seus relacionamentos com o meio ambiente foi feito por
Lamartine DaCosta durante o Congresso do European College of Sport Sciences-
ECSS, na Universidade de Colônia, Alemanha (28 ± 24 de julho de 2001), a convite
dos organizadores. A síntese cobriu as três últimas décadas de exploração do
tema e na essência incidiu sobre o caráter de resolução de conflitos que reveste
os problemas da proteção do meio ambiente, e que inclui o esporte entre várias
outras manifestações humanas. Contudo, o esporte tem apresentado um diferen-
cial nesta relação por expressar fatos ao passo que o meio ambiente expressa
valores (ver nesta Coletânea DaCosta, 2001), explicando assim sua condição
ambivalente já enfatizada no livro de 1997 antes citado. Em conclusão, o pesqui-
sador brasileiro pôs em evidência a ética como caminho apto para a solução do
dilema de ser o esporte simultaneamente vilão e vítima do entorno físico, social
e cultural. Já em relação às outras tendências identificadas no Brasil na temática
ora em exame, percebe-se a partir deste ano que a linha seguida por DaCosta em
quatro décadas de estudos do meio ambiente voltara-se progressivamente para
uma visão micro de relações privilegiando intervenções operacionais técnico-
científicas, fundadas em argumentação histórico-filosóficas. Entretanto, a linha
sócio-pedagógica aqui descrita com maiores empenhos por iniciativas dos anos
1999-2000, situam-se numa visão de predominância macro que visa ao desen-
volvimento social e à proteção da natureza. Enquanto neste estágio a opção de
DaCosta e seus seguidores enfatiza a gestão do esporte, lazer e turismo dando
ênfase a resultados práticos, a linha sócio-pedagógica revela-se
comportamentalista e produtora de valores, tanto por meio de agentes como de
interventores.
2000 ± 2002 Uma outra avaliação dos dois últimos anos desta ordem cronológi-
ca em conjugação com 2002 confirma o surgimento de convergência dos estu-
dos e pesquisas nacionais ± abrangendo as duas linhas dominantes - no sentido

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22 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
de comprovações empíricas e revisões teóricas das propostas de sustentabilidade
típicas da década de 1990 no Brasil e no exterior. De fato, dos 16 trabalhos
inventariados deste estágio, 18,7% são estudos de caso e relatos de experiência;
25,0% compõem pesquisas de campo e levantamentos (surveys); 37,5% represen-
tam artigos de revisão e position papers, e 18,7% se referem a novas abordagens
metodológicas e de re-conceituação. Neste último item, classificam-se o uso do
método Delphi de Almeida (2000) e a abordagem do imaginário social em espor-
tes de aventura na natureza de Costa (2000). Entre os surveys, inclui-se o levan-
tamento internacional de DaCosta (2001) para o ECSS que se desenvolve a partir
dos conflitos entre elementos de intervenção relacionados ao meio ambiente.
Desta investigação, aliás, derivou-se um outro estudo de DaCosta (³Conflitos
Ambientalistas do Desporto e da Educação Física e a Nova Cidadania Ecológica´,
in Vargas, A. (Ed.), Desporto e Tramas Sociais, Sprint, Rio de Janeiro, 2001, pp. 91
± 104) não disponível nesta Coletânea, que incide na ética como âncora da
sustentabilidade e veículo da solução dos inevitáveis conflitos ambientais en-
volvendo esporte, lazer e turismo.
2003 ± 2007 Este período revela mais claramente a maturidade dos trabalhos
inventariados em conjunto, uma tendência já identificada desde 2001. Nestes
termos, sustentabilidade e impacto ambiental são elementos de importância
consensual e como tal constituem fundamentos básicos em estudos e pesquisas.
Já o perfil de caracterização define-se com 17,9% de um total de 67 trabalhos
voltados para estudos de caso e relatos de experiência (cifra próxima àquela
registrada em 2000-2002); 20,8% são pesquisas de campo e levantamentos
(surveys), com queda de 4% em relação ao triênio anterior; 34,3% constituem
artigos de revisão e position papers (redução de 3% em relação a 2000 ± 2002); e
23,8% se referem a novas abordagens metodológicas e de re-conceituação, cifra
aumentada em 5% comparando-se com o período anterior. No geral, esses quan-
titativos revelam uma tendência dominante para a inovação ao se somarem os
trabalhos de revisão ± incluindo position papers - com os de novas abordagens
metodológicas, totalizando 58,3% da produção técnica e científica arrolada nes-
ta amostra indicativa. Este resultado ao se cotejar com a teoria de Sinclair-
Desgagné (1999) sugere a existência de uma orientação adequada para o desen-
volvimento da produção e gestão do conhecimento científico-ambientalista em
esporte, lazer e turismo no Brasil. Segundo esta teoria, a pesquisa de inovação na
área de meio ambiente permite a identificação de intervenções seletivas que
criam um melhor e mais abrangente potencial de desenvolvimento. Entretanto,
para se consolidar esta interpretação há que se avaliar futuramente a qualidade
das investigações produzidas no país na área de saber em foco, o que demanda
um desdobramento da presente apreciação com amostragem e monitoração
mais precisas.
2006 ± 2007 Este último estágio classificado pela presente Coletânea como
inserido no período 2003 - 2007, inclui trabalhos os quais por comparação suge-
rem haver uma convergência entre as duas principais abordagens históricas dos

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 23
estudos e pesquisas em meio ambiente, esporte, lazer e turismo no Brasil: a de
gestão bio-tecnológica de bases éticas e a sócio-pedagógica, de índole
comportamentalista e axiológica. De fato, a coletânea ³Viagens, lazer e esporte:
o espaço da natureza´ de Alcyane Marinho e Heloisa Turini Bruhns (Eds.), São
Paulo: Manole, 2006, amplia o foco sócio-pedagógico optando por autores e
temas que trabalham nos vieses da interdisciplinaridade, de mapeamento, de
impactos ambientais e de monitoramento participativo. Outro exemplo de auto-
res clássicos, reside no texto de Lamartine P. DaCosta & Cris C. Veerman (2006),
publicado em livro na Alemanha sobre os Jogos Olímpicos de Inverno de Turim,
que embora se mantenha na tradição tecnológica-científica privilegia a educa-
ção ambiental e posturas valorizativas. Em geral, os textos inventariados da
produção 2003 ± 2007 convergem para pontos comuns de análise sobretudo
quando abordam a temática do eco-turismo e a dos problemas de impactos
ambientais.
REFERÊNCIAS
DaCosta, L.P., Environment and sport ± An international overview. Universidade
do Porto-Portugal, 1997, p. 44; DaCosta, L.P.,
Conflitos ambientalistas do desporto e da educação física e a nova cidadania
ecológica. In Vargas, A., Desporto e Tramas Sociais. Sprint, Rio de Janeiro, 2001,
pp. 91 ± 104;
DaCosta, Lamartine. A Atividade desportiva nos climas tropicais e uma solução
experimental: o Altitude Training. Rio de Janeiro: Imprensa do Exército, 1967;
DaCosta, Lamartine. Planejamento México. Rio de Janeiro: Ministério da Educa-
ção e Cultura, 1967;
FIFA. World Cup México 70 - Official FIFA Report, 1972;
Tavares, O., DaCosta, L. P. e Miranda, R., Esporte, Olimpismo e Meio Ambiente.
Editora Gama Filho, Rio de Janeiro, 2002;
DaCosta, L. P. Olympic Studies. Editora Gama Filho, Rio de Janeiro, 2002 (em CD
ROM): disponível em 2004 no site: www.aafla.org/search/search.htm;
DaCosta, L.P. International Trends of Sport and Environment - a 2001 Overview.
ECSS Congress, Cologne 24 - 28, July 2001;
Gleyse, J., Pigeassou, C., Marcellini, A., Léséleuc, E, Bui-Xuân, G. Physical Education
as a Subject in France (School Curriculum, Policies and Discourse): the Body and
the Metaphors of the Engine²Elements. Sport, Education and Society, Volume 7,
Number 1, 2002, pp. 5 ± 23;
Sinclair-Desgagné, B. Remarks on Environmental Regulation, Firm behavior and
Innovation. Centre Interuniversitaire de Recherche et Analyse de Organizations,
Montréal, 1999 (position paper)

p 

p 
Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.
›   
      
. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
English forewords and review
Sports and environment have been historically related through the following
perspectives: (i) the environment as agent - acting on the participant¶s body
causing physical performance loss (example: excessive heat); (ii) sports as source
of pollution ± or even destruction ± (example: winter sports in natural
environment), and (iii) sports as agent - participants as environment guardians
(example: surfers protecting local beaches). Although research tradition on human
physical impairment due to hostile climate conditions started in Brazil in 1850, it
was only in the 1960s that sports became part of scientific investigations that
brought successful results such as Brazil¶s conquest of the 1970 Soccer World
Cup, as the main games were held in Mexico City, elevation 2,240m.
The issue that dealt with the protection of the environment where sports
events are held was approached in Brazil in the 1990s as a result of international
action, which produced more theoretical academic research in addition to field
research. After evaluating international research on sports and environment during
this period, the Brazilian researcher Lamartine DaCosta concluded that while
sports express facts, environment expresses values, which generates an ambivalent
condition. The solution in this case would be the development of some type of
ethics that could solve the dilemma permitting sports to be both a villain and a
victim of the physical, social and cultural context at the same time.
Among several lines of investigation in this theme, it is possible to state that
Brazil has had two main groups of research over the years. The first one started up
with DaCosta in 1964 and focused initially on sports, leisure, later on tourism, and
their influences on the environment. This research group was already established
and had scientific, philosophical and technological bases in the early 1990s. As a
result, researchers sharing these same objectives have been publishing their scientific
production in international periodicals since 1967. The second main research group,
Research mainstreams of studies
on environment, sport,
leisure and tourism in Brazil
within the period 1967-2007
Ana Maria Miragaya, PhD
Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro

p 
26 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
which began in the early 1990s, focused on revisions of concepts and of educational
procedures due to the need of environmental conservation. As a result of the
studies developed, this book presents contributions from 86 authors with the purpose
to explore general tendencies within the proposed theme.
At the turn of the millennium, Brazilian research was taken to Europe in 2001,
when DaCosta made a first evaluation of the main directions of the production of
knowledge in sport and its links with the environment during the 2001 Conference
of the European College of Sport Sciences - ECSS, at the University of Cologne,
Germany (28 ± 24 July), as a guest of the organizers. The synthesis covered
research in this area over the last three decades, focusing on conflict resolution
related both to problems of environmental conservation and to sports among
various other human manifestations. The Brazilian researcher indicated ethics as
a way out to solve the dilemma of sport viewed at the same time as both villain
and victim of physical, social and cultural delimitations.
The works published in 2001 and 2002 show a convergence of studies and research
in Brazil ± including both main research groups ± in terms of empirical evidence and
theoretical revisions of the proposals related to sustainability that are typical of
the 1990s not only in Brazil but also abroad. As a matter of fact, out of the 16
studies examined within this period, 18.7% are case studies and reports of
experiences; 25.0% are field research studies and surveys; 37.5% represent review
articles and position papers, and 18.7% refer to new approaches of methods and of
re-conceptualization, which includes not only the use of the Delphi method by
Almeida (2000) but also the social imaginary approach to sports and adventures in
the great outdoors by Costa (2000). Among the surveys, it is important to include
the international survey done by DaCosta (2001) for the ECSS, which was developed
from the conflicts between elements of intervention related to the environment.
The period 2003 ± 2007 reveals more clearly the maturity of the studies as a
whole, a tendency which was identified in 2001. In these terms, sustainability and
environmental impact are elements of consensual importance and as such
constitute basic principles in studies and research. In terms of profiles, it is
possible to define that 17.9% out of 67 works which include case studies and
reports of experiences (similar to the one registered for the period 2000-2002);
20.8% refer to field research and surveys, with a decrease of 4% related to the
previous three-year period; 34.3% constitute review articles and position papers
(reduction of 3% in relation to the 2000-2003 period) and 23.8% refer to new
approaches of methods and of re-conceptualization, number increased in 5% if
compared to the previous period.
In terms of Brazil, as of 2006, it is possible to observe on the one hand that
research conducted by DaCosta during the last four decades of studies on
environment has been going back towards a micro vision of relations which privilege
technological and scientific operational interventions based on historical and

p 

Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 27


philosophical arguments. On the other hand, the social-pedagogical group of
research, which developed initiatives between 1999 and 2000, has shared a macro
vision which aims at social development and nature conservation. In other words,
while DaCosta and his followers have been working on sport, leisure and tourism
management emphasizing practical results, the social pedagogical group of research
has been focusing on the behavior of producers of values by means of agents.
In general, these numbers reveal a major tendency related to innovations if
review works, including position papers, are added to works that deal with new
methodological approaches, reaching 58.3% of the technical and scientific
production registered in this indicative sample. If compared with the theory of
Sinclair-Desgagné (1999), this result suggests the existence of an orientation
that is adequate for the development of the production and management of the
scientific-environmental knowledge in sport, leisure and tourism in Brazil.
According to this theory, the research of innovation in the area of environment
permits the identification of selective interventions which create a better and
more comprehensive potential for development. Nevertheless, in order to
consolidate this interpretation in the future, it is necessary to evaluate the quality
of the investigations produced in Brazil in this area of knowledge This will require
more detailed samples and more precise monitoring.
The research works identified for 2006 and 2007 in terms of comparison suggest
that there is a convergence between the two main historical approaches of studies
and research on environment, sport, leisure and tourism in Brazil. Such coincidence
primarily refers to bio-technological management with ethical bases, and in the
second place to a social-pedagogical tendency, of behaviorist and axiological
character. As a matter of fact, the classic anthology ³Viagens, lazer e esporte: o
espaço da natureza´ (³Trips, leisure and sport: the space of nature´) by Alcyane
Marinho and Heloisa Turini Bruhns (Eds.), São Paulo: Manole, 2006 enlarges the
social-pedagogical focus choosing authors and themes that work with different
viewpoints and biases in the areas of interdisciplinarity, mapping, environmental
impact and participative monitoring. Another example of classic authors resides in
the text of Lamartine P. DaCosta & Cris C. Veerman (2006), published in a book in
Germany about the Winter Olympic Games of Turin, which in spite of keeping itself
within the techno-scientific tradition privileges environmental education and values-
led attitudes. In general, the texts surveyed for the production 2003 ± 2007 seem to
converge to common points of analysis particularly when they approach themes
related to eco-tourism and environmental impacts.
SOURCES AND REFERENCES
DaCosta, L.P., Environment and sport ± An international overview. Universidade
do Porto-Portugal, 1997, p. 44;

p 
28 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
DaCosta, Lamartine. A Atividade desportiva nos climas tropicais e uma solução
experimental: o Altitude Training. Rio de Janeiro: Imprensa do Exército, 1967;
DaCosta, Lamartine. Planejamento México. Rio de Janeiro: Ministério da Educa-
ção e Cultura, 1967;
FIFA. World Cup México 70 - Official FIFA Report, 1972;
DaCosta, L. P. Olympic Studies. Editora Gama Filho, Rio de Janeiro, 2002 (em CD
ROM): disponível em 2004 no site: www.aafla.org/search/search.htm;
DaCosta, L.P. International Trends of Sport and Environment - a 2001 Overview.
ECSS Congress, Cologne 24 - 28, July 2001;
Gleyse, J., Pigeassou, C., Marcellini, A., Léséleuc, E, Bui-Xuân, G. Physical Education
as a Subject in France (School Curriculum, Policies and Discourse): the Body and
the Metaphors of the Engine²Elements. Sport, Education and Society, Volume 7,
Number 1, 2002, pp. 5 ± 23;
Sinclair-Desgagné, B. Remarks on Environmental Regulation, Firm behavior and
Innovation. Centre Interuniversitaire de Recherche et Analyse de Organizations,
Montréal, 1999 (position paper).
p 
Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.
›   
      
. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
Formato da contribuição: artigo
Fonte: MARINHO, Alcyane; SCHWARTZ, Gisele M. Atividades de aventura como
conteúdo da educação física: reflexões sobre seu valor educativo. Lecturas:
Educación Física y Deportes. Revista Digital, Buenos Aires, ano 10, nº.88,
setembro de 2005. Disponível em: http://www.efdeportes.com/efd88/avent.htm
E-mail do(s) autor(es): alcyane.marinho@hotmail.com, schwartz@rc.unesp.br
Títulos acadêmicos principais atuais: Alcyane Marinho:Graduação pelo
Departamento de Educação Física da UNESP de Rio Claro (SP); Mestrado e
Doutorado pela Faculdade de Educação Física da UNICAMP (Campinas, SP), na
Área de Estudos do Lazer, Professora do Curso de Turismo da UNISUL,
Pesquisadora do Laboratório de Estudos do Lazer (LEL) da UNESP de Rio Claro
(SP). Gisele Maria Schwartz: Doutora em Psicologia da Educação e do
Desenvolvimento Humano pelo IPUSP, Professora Livre Docente nos Cursos de
Graduação em Educação Física e Pós-graduação em Ciências da Motricidade
na UNESP de Rio Claro (SP), Coordenadora do Laboratório de Estudos do Lazer
(LEL) da UNESP de Rio Claro (SP).
Ano: 2005
Publicação original: revista digital
Atividades de Aventura como
Conteúdo da Educação Física:
Reflexões sobre seu Valor Educativo1
Alcyane Marinho
Gisele Maria Schwartz
É crescente o surgimento de atividades de aventura - práticas corporais, ma-
nifestadas principalmente no tempo destinado ao lazer, as quais requisitam a
natureza para o seu desenvolvimento e representam de alguma forma, práticas
alternativas e criativas de expressão humana. Os exemplos se estendem desde
simples caminhadas aos mais sofisticados e excitantes esportes.
As atividades de aventura estão sendo compreendidas, aqui, como as diversas
práticas esportivas manifestadas, privilegiadamente nos momentos de lazer, com
características inovadoras e diferenciadas dos esportes tradicionais, pois as
condições de prática, os objetivos, a própria motivação e os meios utilizados
para o seu desenvolvimento são outros; e, além disso, há também a presença de

p 
30 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
inovadores equipamentos tecnológicos permitindo uma fluidez entre o pratican-
te e o espaço destinado a essas práticas - terra, água ou ar.
São atividades cercadas por riscos e perigos, na medida do possível, calcula-
dos, não ocorrendo treinamentos intensivos prévios (como no caso dos espor-
tes tradicionais e de práticas corporais como a ginástica e a musculação). A
experimentação acontece de maneira mais direta, havendo um afastamento de
rendimentos planejados (MARINHO; BRUHNS, 2003).
Devido ao atual interesse por tais práticas, propulsionado com amparo
mercadológico, as mesmas têm recebido um crescente número de adeptos de
diferentes formações culturais, faixas etárias, níveis sociais, campos de atuação
profissional, tornando-se um instigante desafio, no que tange ao respaldo e
conhecimentos necessários para uma atuação prática com qualidade e que pos-
sa favorecer experiências verdadeiramente significativas.
Elas vêm, embora timidamente, porém de forma cada vez mais recorrente,
recebendo atenção de profissionais de diferentes áreas e sendo inseridas nos
contextos escolar e universitário, sejam por meio de cursos de extensão à co-
munidade e aos alunos ou como disciplinas optativas.
No entanto, faz-se necessário refletir sobre esse interesse, tendo em vista as
possibilidades de ganhos e perdas na convivência com atividades de aventura,
uma vez que, do mesmo modo como elas podem trazer benefícios pessoais
inúmeros, podem, inclusive, desencadear ações impensadas e destrutivas ao
meio, consoante a intenção com a qual foram formalizadas.
O que se questiona é, justamente, a legitimidade de tais iniciativas e fomenta-
se a necessidade de compreensão efetiva de como estão sendo estruturadas e
realizadas; sob qual ótica, com quais interesses e perspectivas, inclusive em
âmbito educacional, já que estas podem representar vivências significativas.
Nesse contexto, este artigo propõe uma reflexão sobre as possibilidades de
inserção de atividades de aventura como conteúdo dos programas de aulas na
área de Educação Física, no sentido de se fomentar a educação ambiental e para
o lazer.
EDUCAÇÃO FÍSICA, ECOLOGIA E TURISMO... COMPARTILHANDO ESPAÇOS
Mesmo com o interesse despontado e com o seu rápido crescimento em
diferentes instâncias (econômica, social, esportiva, religiosa, etc.), as atividades
de aventura no meio natural parecem estar encontrando eco, ainda que tímido,
junto ao contexto educativo.

p 
Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 31
A pouca importância atribuída a tais práticas parece ser o principal condicio-
nador de sua implementação. Pereira e Monteiro (1995) indicam que os percur-
sos de iniciação esportiva nessas áreas, raramente, são feitos pela via escolar,
sendo operados por meio de transmissão técnica para grupos interessados, em
entidades especializadas, estruturadas, na maioria das vezes, por agentes cuja
formação, muitas vezes, procede de cursos sem habilitações para tal.
A formação profissional do agente de lazer ou turismo é considerada um
verdadeiro desafio. O tema que centraliza a discussão na relação seres huma-
nos-natureza vinha sendo focalizado, até bem pouco tempo, exclusivamente na
área da ecologia, que, com subsídios teóricos, tentava implementar a tão sonha-
da consciência ecológica.
No entanto, esse tema tomou vulto, também, na área de turismo, uma vez que
a proximidade dos seres humanos com a natureza tornou-se inevitavelmente um
grande atrativo, fomentando o mercado com atividades turísticas cada vez mais
exóticas, ou mesmo, oferecendo a oportunidade de vivências rurais.
Para que sejam implementados os elementos que fazem parte das caracterís-
ticas dessas atividades, tornou-se paulatinamente necessário o acompanha-
mento de profissionais que conseguissem subsidiar praticamente o desenrolar de
tais atividades, tendo em vista a necessidade de alguma fundamentação teórica
sobre as exigências da prática e alguma habilidade específica para acompanhá-
las, ou ainda, trabalhar com a recreação de hóspedes em hotéis, fazendas e
outros.
Percebe-se, então, a necessidade crescente do estabelecimento de uma liga-
ção entre essas três áreas do conhecimento (quais, sejam: Educação Física,
Turismo e Ecologia), tendo em vista a interdisciplinaridade gerada pelas caracte-
rísticas das atividades de aventura. Porém, as áreas parecem querer tomar para si
apenas os lucros envolvidos, deixando de lado os verdadeiros compromissos
que essas práticas exigem de todos, promotores e praticantes.
Isso requer mudanças de valores e atitudes, que já são prementes, tanto em
âmbito pessoal, quanto em âmbito institucional, havendo a necessidade dos
cursos de formação nessas áreas redimensionarem seus enfoques e conteúdos,
no sentido de priorizar a sensibilização necessária para se tornarem
multiplicadores desses novos valores.
Em uma reflexão sobre as relações entre as áreas de Educação Física e Ecolo-
gia no desenvolvimento de novas atitudes frente ao compromisso de
harmonização dos seres humanos com a natureza, Schwartz e Silva (1999) evi-
denciaram a inquietação sobre a conduta humana interferindo diretamente no
equilíbrio, ou mesmo, no desequilíbrio da natureza, uma vez que o estilo de vida,

p 
32 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
a distribuição não eqüitativa de oportunidades de formação cultural e experiên-
cias significativas, os fatores econômicos e sociais que norteiam a participação
humana no ambiente, entre outros, representam elementos decisivos face ao
compromisso com o meio e no tocante a mudanças axiológicas, em todos os
âmbitos, sobre essa relação.
Todos os indivíduos albergam em suas estruturas cognitivas o interesse por
mudanças dessas crenças, mas a implementação disto já se torna uma problemá-
tica, quando se trata de apenas um indivíduo, tendo em vista que, nessa imbricada
rede de significados, estão envolvidos elementos primordiais, como a persona-
lidade e suas predisposições, os componentes afetivo-cognitivos, como a segu-
rança e domínio do conhecimento específico e atitudes e predisposições ao
pensamento mais divergente.
Ao se pensar em operacionalizar mudanças em âmbitos maiores que os pesso-
ais, o processo torna-se ainda mais desafiador, tendo em vista que entram em
jogo fatores como a interação com outros membros do meio social, a redefinição
de papéis sociais relativos à aceitação no grupo, entre tantos outros.
Diante de tal quadro exposto, as atividades de aventura raramente têm surgido
como conteúdo de ensino da Educação Física e, quase sempre, têm sido tratadas
como um ³apêndice´ recreativo e de lazer.
Assiste-se assim, a uma relativa marginalização destas atividades
por parte da escola, em contraponto com o interesse crescente
dos alunos pela prática destas atividades fora dela, que se traduz,
muitas vezes, pelo aumento do número de acidentes, devido a
estas práticas exigirem conhecimentos que nem sempre estão
presentes ou devidamente consolidados (PEREIRA; MONTEIRO,
1995, p.113).
Para que as atividades de aventura sejam propostas como conteúdo da Educa-
ção Física, conforme os autores supracitados, o primeiro passo deve ser uma
análise do conteúdo educativo dessas práticas, como pressuposto preliminar
para a sua utilização como prática de desenvolvimento programático.
Nessa perspectiva, o potencial educativo dessas atividades de aventura junto
à natureza parece ser muito extenso, principalmente porque facilita situações
educativas em experiências pouco habituais para os participantes, possuindo um
forte caráter motivador, carregadas de emoção, de significado e de intenção
(PEREIRA; MONTEIRO, 1995).
A introdução dessas atividades de aventura surge como um ganho fundamen-
tal de inovação pedagógica, no qual, segundo os autores em questão,

p 
Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 33
[...] um quadro metodológico de grande relação e diferenciação
motora propicia um elevado número de vivências não habituais
que contribuem para o desenvolvimento da estrutura motora.
Induz, por isso, ao desenvolvimento de diversas capacidades con-
dicionais, coordenativas e volitivas, que melhoram globalmente
a condição física geral do aluno e conseqüentemente a sua qua-
lidade de vida (p.113).
Nas atividades de aventura, há a possibilidade de se voltar à natureza como
parceira - e não mais como adversária (MARINHO, 1999) - em um jogo no qual se
convive, desfrutando-se de riscos calculados, os quais se constituem em um
fator de grande importância na motivação dos participantes.
O que contribui para este fato é o elemento lúdico ser uma constante nessas
práticas, manifestado, inclusive, por meio do controle que se dá em todas as
esferas da atividade. A partir desse controle, o risco, embutido nas atividades, é
minimizado, garantindo-se, com isso, a fruição da ludicidade com todas as suas
potencialidades.
A natureza humana é bastante adepta aos desafios, porém estes, quando
ultrapassam o limite da segurança e da organização, voltando-se unicamente
para a vivência da sensação de aventura descontrolada, deixam de caracteri-
zar-se enquanto atividade lúdica, representando outros parâmetros, como a
demonstração da prevalência de traços masoquistas de personalidade ou ou-
tros desvios.
Beck (1996, p.21), em seu livro sobre as características de uma sociedade
moderna avançada, aponta que a produção social de prosperidade é acompa-
nhada da produção de risco. Este autor presta sua contribuição nessa discussão,
definindo risco como um ³meio sistematizado de lidar com perigo e insegurança
induzidos e introduzidos pela modernização mesmo´.
Seja na busca pelo risco, na contemplação, na prática segura e controlada de
atividades de aventura, o que se quer destacar é o sentido de preservação que
deve vir incorporado em tais vivências, haja vista os seres humanos não serem
mais apenas espectadores, mas participantes efetivos das decisões planetárias
quanto ao destino do ambiente. Porém, falta-lhes preparo interno, ou mesmo
atitude, que venha a intensificar seu papel diante na manutenção do equilíbrio da
natureza.
A intensificação de uma aproximação qualitativa dos seres humanos ao ambi-
ente natural pode acelerar esse processo, tornando eficiente o sonho de harmo-
nia e, nos espaços institucionais, como a escola, esta pode representar uma
perspectiva excelente para a reflexão de valores catalisadores dessa relação.

p 
34 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Com o foco centrado nessas atividades, tem-se a perspectiva de ampliar a
gama de assuntos abordados em salas de aula e, inclusive, estender esse conhe-
cimento para além dos muros da sala, possibilitando aprendizados mais signifi-
cativos e com maior teor motivacional. Tendo em vista que o conhecimento
dessas modalidades não deve se restringir apenas a uma disciplina curricular
pode-se, inclusive, contribuir para a tão sonhada interdisciplinaridade, estimu-
lando diferentes percepções em relação às condições da vida na terra.
Uma outra questão pertinente ao âmbito educativo a ser tratada, haja vista os
locais de desenvolvimento das atividades de aventura, é a importância da área
de Educação Física no tratamento da Educação Ambiental, aqui entendida como
³processo de aprendizagem permanente baseado no respeito a todas as formas
de vida. Tal educação afirma valores e ações que contribuem para a transforma-
ção humana e social e para a preservação ecológica´ (BARROS, 2000, p.89).
Pastor e Pastor (1997) enfatizam a situação privilegiada da Educação Física
com relação aos seus conteúdos e quanto ao fato de ser uma disciplina baseada
principalmente em experiências práticas e vivências pessoais, facilitando o de-
senvolvimento de questões ambientais, porém atentando-se a possíveis impac-
tos negativos ao meio. Para o autor, a simples realização dessas práticas não
gera, por si mesma, uma sensibilização e/ou Educação Ambiental, mas, contra-
riamente a isso, pode conduzir a diferentes impactos ambientais. Por sua vez, a
sensibilização e a Educação Ambiental dependem do tratamento educativo que
recebem e das atitudes e dos comportamentos das pessoas e/ou grupos ao
iniciarem um envolvimento com atividades ao ar livre. Portanto, faz-se necessá-
ria uma intervenção pedagógica interdisciplinar.
Muitas vezes, os próprios envolvidos não sabem como proceder diante de
determinadas situações na natureza e, por falta de conhecimento e não apenas
por desrespeito, contribuem para os desgastes nos ambientes naturais.
Além da realização dessas atividades propriamente ditas, Pastor e Pastor (1997)
salientam a necessidade de haver planificações e intervenções didáticas
interdisciplinares para que venham a legitimar uma experiência educativa, pro-
pondo a intervenção nos conteúdos e aspectos próprios e específicos da área de
Educação Física.
Contudo, o tratamento das atividades esportivas no meio natural, respal-
dando-se em uma perspectiva crítica, deve, também, centrar-se em aspectos
importantes para a realização da atividade, tais como: diferentes técnicas de
execução e sistemas de segurança. E, por fim, deve relevar um aspecto bas-
tante significativo: a experimentação pessoal - a vivência das atividades que
se constituem no eixo principal de ação sobre o qual as intervenções come-
çarão a fazer sentido.

p 
Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 35
Partindo dessas perspectivas, compartilhamos com Pereira e Monteiro (1995)
que as atividades de aventura no ambiente natural surgem, portanto, como ma-
neiras alternativas de práticas esportivas, nas quais, além de se educar, aprende-
se a valorizar tanto a relação afetiva com a natureza quanto o respeito por sua
biodiversidade.
Sobre estes aspectos, tendo por base a repercussão de um curso de ³Vivências
em Atividades de Aventura´, desenvolvido pelo Laboratório de Estudos do Lazer,
no Dep. de Educação Física da Unesp, Campus de Rio Claro (SP, Brasil) e oferecido
ao longo de 3 anos consecutivos, tem-se que a inserção dessas práticas no
ambiente universitário foi considerada de grande interesse, pertinência e aceita-
ção, fato este que legitima as idéias dos autores anteriormente expostas.
Um relato sobre este curso de extensão foi apresentado por Marinho; Schwartz
e Letízio (2001) no II Congresso Internacional de Educação Física e Motricidade
Humana e VIII Simpósio Paulista de Educação Física, UNESP, Rio Claro (SP -
Brasil).
As 36 horas/aula ministradas neste curso foram teórico-práticas, distribuídas
em quatro horas semanais e ocorreram tanto no campus universitário quanto
fora dele, haja vista a necessidade, em alguns casos, de locais mais apropriados
para as vivências, oferecendo oportunidade de experimentação em alguns seg-
mentos das atividades de aventura: caving (visitação de cavernas), mergulho,
escalada em muro artificial, rapel (técnica de descida por corda) e primeiros
socorros específicos para cada atividade.
No final do curso, foi solicitado aos alunos o preenchimento de um questioná-
rio contendo onze perguntas mistas e, com base neste material, pode-se perce-
ber a valorização destas experiências pelos universitários envolvidos no curso,
bem como, a relevância de tais vivências como conteúdo pedagógico para o
aprimoramento da educação ambiental.
Toda e qualquer oportunidade cultural que venha a fomentar caminhos para
um novo redimensionamento da educação, com um caráter significativo é, nesse
momento, considerado primordial e os desafios para a concretização de mudan-
ças de atitudes e valores referentes às atividades de lazer representam uma
premissa para se minimizar aspectos de discriminações e aprimorar as perspec-
tivas de interdisciplinaridade e desenvolvimento.
Conforme Kleiber (2000), as noções impressas pelas atividades em contato
com a natureza propiciam, especialmente ao adolescente, a oportunidade de
integração da identidade, pois tais experiências representam o contexto relati-
vamente libertador e alternativo para a busca da identidade pessoal, facilitando
a individualização, uma vez que favorecem a expressão da imaginação e da

p 
36 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
experimentação criativa, componentes intrinsecamente relacionados com a
individualização ou autoconsciência, proporcionando a chance de experimen-
tação de interesses incipientes. De novos interesses, surge a mudança do entor-
no, incluindo a aceitação pelo outro, o que define e reforça as potencialidades
da própria pessoa.
Tendo em vista a possibilidade de exploração de vias alternativas de pensar e
agir, o favorecimento dessas experiências, no âmbito escolar, torna-se bastante
significativo, uma vez que, após tais vivências, os indivíduos podem apresentar
avanços no desenvolvimento como um todo, assumindo novas atitudes que
acrescentam novas perspectivas ao ³estar no mundo´, repercutindo profunda-
mente nas instituições, tanto em nível pessoal quanto coletivo.
A educação detém um papel decisivo como espaço socializador, podendo
oferecer canais formais e informais para implementar os aprendizados experi-
mental e criativo, promovendo, com isso, a integração dos aspectos gerais
voltados à qualidade de vida.
A conexão dessas experiências de aventura aos objetivos educacionais do
sistema escolar pode favorecer o desenvolvimento humano em seus diversos
aspectos, por envolverem processos pedagógicos específicos catalisadores de
³competências cognitivas, psicomotoras e socioafetivas´ (PEREIRA; MONTEIRO,
1995, p.114), sendo capazes de fomentar novas atitudes de espectro
interdisciplinar.
A partir do contexto da Educação Física e destas atividades, o compartilhamento
da natureza e seus elementos poderá representar uma significativa forma de
aproximação da sociedade a esse ambiente, permitindo, conforme evidencia
Marinho (2001), que esta aproximação conduza a novas sensibilidades, median-
te conhecimento e acordos de ética e respeito.
[As referências bibliográficas desta contribuição podem ser consultadas na fonte
original]
Notas
2 MARINHO, Alcyane; SCHWARTZ, Gisele M. Atividades de aventura como
conteúdo da educação física: reflexões
sobre seu valor educativo. Lecturas: Educación Física y Deportes. Revista Digital,
Buenos Aires, ano 10, nº.88,
setembro de 2005. Disponível em: <http://www.efdeportes.com/efd88/avent.htm>
(ISSN: 15143465).

p 

Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.


›   
      
. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
Formato da contribuição: resumo
Fonte: MARINHO, Alcyane. Atividades de aventura em ambientes artificiais. In:
UVINHA, Ricardo R. (Org.). Turismo de aventura: reflexões e tendências. São
Paulo: Aleph, 2005.
E-mail do(s) autor(es): alcyane.marinho@hotmail.com
Títulos acadêmicos principais atuais: Alcyane Marinho:Graduação pelo Departamento
de Educação Física da UNESP de Rio Claro (SP); Mestrado e Doutorado pela
Faculdade de Educação Física da UNICAMP (Campinas, SP), na Área de Estudos do
Lazer, Professora do Curso de Turismo da UNISUL, Pesquisadora do Laboratório
de Estudos do Lazer (LEL) da UNESP de Rio Claro (SP).
Ano: 2005
Publicação original: capítulo de livro
Atividades de Aventura em
Ambientes Artificiais
Alcyane Marinho
São inúmeras as formas contemporâneas de estar junto à natureza. Muitas
escolas, por exemplo, têm, em seus programas, estudos do meio, voltados ao
aprendizado em contato com a natureza, longe das salas de aula. Diversas em-
presas também já possuem, em seu calendário, propostas de viagens a locais
naturais, com o objetivo principal de estimular o espírito de liderança e de equipe
(entre outras metas). Igualmente, pessoas engajadas com as mais diversas pos-
sibilidades de práticas alternativas têm, de alguma forma, incluído a natureza em
seus projetos, visando a aumentar a potencialidade de suas técnicas terapêuti-
cas. Estas são apenas algumas, dentre as inúmeras formas por meio das quais as
pessoas têm se aproximado do ambiente natural.
Nunca se falou tanto em destruição ambiental e, conseqüentemente, na neces-
sidade de uma sensibilização (e mobilização) visando à preservação do meio
ambiente, em vários níveis. As iniciativas acima, assim como outras, surgem nesta
perspectiva, de alguma forma, reconciliadora, sensibilizadora. É claro que muitas
propostas não condizem, nem um pouco, com os meios utilizados para sua
concretização; ou, mais ainda, muitas se constituem apenas em chamarizes para
outros objetivos, nada tendo de ³ecológicos´ ou sensibilizador em suas metas.
Neste sentido, os discursos ambientais, presentes nas inúmeras formas de
comunicação, têm despertado, de alguma maneira, o interesse das pessoas pelo

p 
38 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
meio ambiente. Será com base neste atual interesse e busca pelo contato com a
natureza que procurarei, neste texto, delinear algumas idéias que são fruto da
complexidade do momento vivido e muito têm me instigado na investigação
desta temática.
Os momentos de lazer estão sendo, aqui, considerados como eixo norteador
para a análise de aspectos mais amplos da vida cotidiana das pessoas. Logo de
início, é preciso ressaltar que o lazer vem deixando de ser pensado como privi-
légio de poucos, tornando-se, cada vez mais, um direito de todos e parte inte-
grante dos modos culturalmente diferenciados de vida, mesmo na sociedade
contemporânea brasileira, repleta de contrastes socioeconômicos.
Partindo desta premissa, procurarei evidenciar que a instauração de ambientes
artificiais para a prática de atividades, inicialmente e comumente desenvolvidas
na natureza, tem relação direta com a degradação da qualidade de vida nos
centros urbanos (poluição, ausência de verde, violência, trânsito, etc.); porém,
não se limitando a isso. Utilizando exemplos de algumas atividades realizadas
em ambientes artificiais, apresentarei uma outra perspectiva destas dinâmicas.
[As referências bibliográficas desta contribuição podem ser consultadas na fonte
original]

p 
Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.
›   
      
. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
Formato da contribuição: resumo da Tese
Fonte: ALMEIDA, Ana Cristina Pimentel Carneiro de. ³Esportes de Aventura na
Natureza: um estudo de caso no Pará´, 2005. Tese UFPA (Núcleo de Altos Estudos
Amazônicos - NAEA). Orientador: David Gibb McGrath
E-mail do(s) autor(es): anacrisal@hotmail.com
Títulos acadêmicos principais atuais: Professora Adjunta do Curso de Educação
Física ± UFPA / Castanhal; Doutora em Ciências: Desenvolvimento Sócio-
Ambiental; Mestre em Educação Física, Especialista em Psicologia dos Distúrbios
de Conduta; Especialista em Psicomotricidade Relacional Sistêmica.
Ano: 2005
Publicação original: tese
Esportes de Aventura na Natureza
um Estudo de Caso no Pará
Ana Cristina P. C. de Almeida
RESUMO
As experiências adquiridas no cotidiano fazem com que o indivíduo se identi-
fique com um modelo de organização social, afetando a construção de uma
identidade por meio das relações estabelecidas e evidenciando um estilo de
comportamento. Os esportes de aventura refletem esta identidade por meio das
escolhas das modalidades, das motivações e atitudes que os praticantes adotam.
O Estado possui um enorme potencial e diferentes ambientes que possibilitam o
crescimento dos esportes de aventura. Como objetivo geral, este estudo visou
identificar as implicações da expansão dos esportes de aventura no Pará, a partir
da percepção dos praticantes e de uma comunidade envolvida, bem como o
papel do Estado no ordenamento e fomento do setor. Adotou-se uma metodologia
com procedimentos qualitativos e quantitativos, com enfoque em um estudo de
caso, que se dividiu em dois momentos. No primeiro, os dados foram coletados
entre 184 praticantes de entidades cadastradas no órgão estadual de turismo do
Estado/Paratur, para representar as diferentes modalidades no Estado; isto nos
dias de eventos programados, por meio de questionário e entrevistas (estruturadas
e semi-estruturadas). Os resultados da pesquisa demonstraram que entre os pra-
ticantes o grau de instrução que predomina é o de nível superior, que a maioria se

p 
40 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
encontra na faixa etária entre 20 e 35 anos de idade e possuem, em média, uma
renda familiar que varia entre R$1001,00 a R$3000,00 reais. Para a prática dos
esportes de aventura no Estado, destacam que os locais ideais encontram-se na
mesorregião nordeste do Pará, e que a região metropolitana de Belém é a mais
utilizada para a prática devido à facilidade de acesso proporcionada. Acreditam
obter diversão e contato com a natureza como benefícios, e o contato com a
natureza aparece como o mais importante para o praticante, na opção objetiva
do questionário. Aventura, para os praticantes, significa superar limites pessoais
e desbravar novos locais de prática, o que pressupõe aumento de procura por
áreas inexploradas. Acreditam que a natureza deva ser utilizada de forma a
permitir sua reconstituição, e dizem possuir atitudes responsáveis. Entretanto,
acreditam que suas atividades não causam impactos ao meio ambiente, mos-
trando que, apesar das leituras, os informes ligados à prática dos esportes pare-
cem não esclarecer interferências das ações humanas na relação homem/natu-
reza. A propaganda do Estado referente ao turismo de aventura está à frente da
realidade encontrada e as políticas de incentivo ainda são incipientes, não pos-
sibilitando o ordenamento do setor. No segundo momento, o estudo de caso
ocorreu no município de São Domingos do Capim e contou com entrevistas de 37
moradores, 31 comerciantes e 18 surfistas (analisados juntos aos demais prati-
cantes) nos dias do Campeonato de Surfe da Pororoca, referente aos anos de
2004 e 2005. Quanto à possibilidade de os esportes de aventura contribuir para o
crescimento local, constatou-se que existem experiências nacionais em que
este fato já se tornou realidade (Brotas/SP, Bonito/MS), mas que no do estudo
aqui apresentado, a falta de infra-estrutura básica do município, as atuais carac-
terísticas do fenômeno da pororoca (pequenas ondas) e a necessidade de maior
envolvimento dos atores no planejamento do evento estão dificultando o cres-
cimento de maneira a permitir reflexos significativos no desenvolvimento local,
sendo estes apenas no período do campeonato. Portanto, para sua efetiva ex-
pansão, os esportes de aventura no Estado do Pará necessitam de união de
forças dos envolvidos, de pleitearem políticas públicas com ações voltadas a
uma gestão mais atuante e participativa dos diversos atores envolvidos.
[As referências bibliográficas desta contribuição podem ser consultadas na fon-
te original]

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Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.
›   
      
. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
Formato da contribuição: resumo
Fonte: Revista Meta Science, 2005. v. II.
E-mail do(s) autor(es): fcm540@gmail.com
Títulos acadêmicos principais atuais: Claudia Mônica Silva - Graduanda em Educação
Física (UVA); Fátima Casassola Miguel - Mestre em Educação Física (UGF),
Licenciada em Educação Física (UGF); Valdo Vieira - Doutorando em Psicologia
Social (UERJ), Mestre em Ciência da Motricidade Humana (UCB/RJ), Licenciado
em Educação Física (UERJ), Bacharel em Estatística (UERJ).
Ano: 2005
Publicação original: revista científica
Sensações dos Praticantes de Trekking
Claudia Mônica Silva
Fátima Casassola Miguel
Valdo Vieira
RESUMO
As sensações vivenciadas pelas pessoas através da prática esportiva em ambi-
entes naturais são fundamentais para compreender as relações humanas com a
natureza. Este trabalho teve sua origem em uma prática de trekking, na disciplina
Metodologia do Ensino dos Esportes da Natureza da Universidade Veiga de
Almeida, realizada na Ilha do Japonês, Cabo Frio. Quatorze alunos caminharam
por trilhas em matas, atravessando morros, transpondo obstáculos naturais,
equilibrando-se em pedras e finalizaram a atividade com um mergulho no mar. Na
aula seguinte, os alunos foram incentivados a descrever suas sensações durante
o evento. Em seus relatos, os participantes expressaram sensações variadas,
como a de harmonia e integração com a natureza e com as pessoas, de aventura,
felicidade, alegria e bem estar. Em contrapartida, alguns relatos mostraram sen-
timentos como ansiedade, medo, pânico e angústia em relação aos aconteci-
mentos imprevisíveis que poderiam ocorrer. Entretanto, esses sentimentos fo-
ram aos poucos se diluindo com o desenvolver da atividade. Ao final, aqueles
que relataram sensações negativas, conseguiram reverte-las em prazer, supera-
ção de medos, paz e liberdade.
Palavras-chave: trekking, sensações, aventura.
[As referências bibliográficas desta contribuição podem ser consultadas na fonte
original]

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Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.
›   
      
. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
Formato da contribuição: artigo completo
Fonte: Anais do XIV Congresso Brasileiro de Ciências do Esporte. CD-ROM.
UFGRS, 2005.
E-mail do(s) autor(es): edensp@gmail.com, edenpereti@hotmail.com
Títulos acadêmicos principais atuais: Mestre e doutorando em Educação Física
junto ao Centro de Desportos da Universidade Federal de Santa Catarina (CDS/
UFSC), Bolsista da CAPES.
Ano: 2005
Publicação original: anais
¬ ¬ 
Éden Silva Pereti
RAÍZES
Pensar sobre raízes ± sobre aquilo que nutre, embasa e sustenta ± torna quase
inevitável valer-se de uma imagem metafórica provinda do próprio meio natural.
Independente de sua forma, força ou resistência, uma raiz é aquela dimensão do
ser que o possibilita segurança, sustento, alimento e uma ligação cíclica com seu
passado, com aquilo que já foi, é e, em certa medida, será.
Quando tentamos pensar nas raízes da própria Natureza2 buscamos sim uma
aproximação com as raízes da multiplicidade de significados e,
consequentemente, concepções que nossa civilização construiu sobre ela mes-
ma durante a trajetória de sua existência. Mas aqui nosso entendimento de
³concepção´ carrega igualmente em si uma dimensão conceitual e uma dimen-
são empírica, as quais se interpenetram e se modificam reciprocamente. Portan-
to, quando falamos das diferentes concepções de Natureza que permearam nos-
sa história não estamos dicotomizando e nos referindo à apenas ao significado,
ao entendimento mais conceitual de Natureza, mas sim buscamos matizes da
relação empírica que o ser humano estabeleceu com o meio natural durante a
extensão de nosso processo civilizatório.
Pensar sobre as raízes da Natureza é refletir sobre as raízes das significações
e das relações que o ser humano estabelece com a Natureza, e assim estamos
também inevitavelmente o fazendo sobre os significados e as relações que o
humano constrói para com a sua própria dimensão corporal, uma vez que ele
também é uma dimensão desta mesma Natureza. E aqui compartilhamos do en-

p 
44 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
tendimento de Marx (1989, p.163) onde identifica nestas complexas relações
multidimensionais uma diferenciação entre aquela natureza que é ³orgânica´ ao
ser humano e aquela que lhe é ³inorgânica´.
Neste sentido, portanto, a pretensão de debruçar-se sobre as raízes da Nature-
za é, em certa medida, a intenção de atentar para as diversas concepções que o
humano construiu sobre si próprio, sobre seus limites, suas alteridades, seu cor-
po e seu lugar no universo. Refletir sobre a Natureza é perceber a transitoriedade
das fronteiras e dos lugares assumidos pelo próprio humano; perceber as dilui-
ções e os invólucros que atravessaram a história do corpo, a percepção e a
concepção da dimensão corporal humana.
IN NATURA
O termo ³natureza´ provém do latim natura, ³ação de fazer nascer´, ³nasci-
mento´ (KESSELRING, 1992, p.20). Mas na antigüidade grega podemos perceber
que o termo ³natureza´ aproximava-se do conceito physis, o qual buscava re-
presentar o cosmos, o universo e tudo aquilo que existe. O entendimento de
physis se referia mais proximamente a uma força interna de emergência, a uma
força de criação intrínseca aos seres, a um princípio interno de
autotransformação. Neste sentido, poderíamos dizer, portanto, que o termo
³natureza´ possui em suas próprias origens etimológicas uma energia que reme-
te à criação da vida, ao surgimento ou aparecimento de algo.
Para os gregos antigos, o paradigma da physis era a vida orgânica (KESSELRING,
1992, p.21), a imagem arquetípica de um gigante organismo que se emprestava a
muitas outras esferas da vida e do pensamento, como o Estado e o cosmos. A
Natureza era interpretada como um processo circular; a repetição de processos
similares, onde os seresnascem, crescem, envelhecem e morrem. Uma organicidade
latente, com sua dinâmica circular, se encontrava no interior de tudo e de todos,
uma vez que se concebia a existência de uma physis, de uma essência em cada ser
singular, conectando e interligando permanentemente todos os elementos. Por-
tanto, a própria Natureza seria o princípio de tudo o que surge e desaparece em seu
interior, não existindo a necessidade de uma figura genitora, de um ser criador.
Ao contrário do que pode parecer, a derivação de physis para o conceito
contemporâneo de ³físico´, ³corpo´, não é direta e muito menos sem ruídos.
Para os gregos antigos physis não é sinônimo de ³corpo´, mas sim se aproxima
muito mais de ³essência´. O surgimento da escola filosófica estóica apresenta-
se como um dos fatos protagonistas no processo de transmutação interna sofri-
da pelo conceito de physis, uma vez que esta escola possuía como um dos seus
princípios ontológicos fundamentais a exclusividade da existência dos corpos ±
um ³materialismo´ ou ³corporeísmo´, baseada no argumento de que apenas
estes poderiam agir ou sofrer ação. Nesta perspectiva, até mesmo Deus era
considerado um modo de ser da própria matéria (SILVA, 2004, p.35).

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 45
A concepção de corpo apresentada pelos gregos antigos construiu-se sobre
um dualismo muito distante daquele edificado pela Modernidade, e em especial
pela perspectiva cartesiana, pois, para Platão, os domínios do corpo e da alma se
interpenetram em muitas de suas funções e carregam em si a possibilidade, ao
menos em parte, de sua mortalidade. O humano era entendido, nesta concepção,
como um ser unitário composto por dois elementos: corpo e alma. Assim sendo,
a interligação permanente entre todos os elementos construía a perspectiva de
uma busca contínua por um equilíbrio harmônico, sendo impossível compreen-
der o humano como algo dissociado da totalidade da Natureza.
Os novos entendimentos construídos pelo pensamento judáico-cristão, mes-
mo preservando alguns resquícios das concepções da cultura grega clássica,
apresentam várias modificações no que diz respeito ao fundamento moral no
trato com o corpo, bem como
nos fundamentos da concepção de Natureza. Desta forma, a apresenta como
o âmbito da criação e colabora no surgimento de uma nova leitura do mundo, na
qual este passa a ter um começo e um fim. Inicia-se, portanto, a dilapidação de
uma concepção que, até este momento, acreditava na espontaneidade de seu
surgimento.
Neste momento passa então a existir a necessidade de um criador externo, de
um princípio criativo que não mais resida dentro da própria Natureza; surge a
necessidade da imagem de um artesão, de alguém, no extremo de uma idéia
antropomórfica ± à nossa imagem e semelhança ± que esculpa as formas, seres,
volumes e destinos, protegido pela idoneidade de uma suposta distância. E no
conseqüente desdobrar deste raciocínio, a Natureza se esvazia de seu conteúdo,
torna supérflua a existência de forças que lhe sejam interiores, na medida em que
passa a ser um espaço concreto e material, uma conseqüente objetivação de
uma racionalidade externa que se encontra agora em um criador, uma
racionalidade projetada em Deus.
Podemos encontrar como uma forte característica da Idade Média um grande
aprofundamento nos estudos alquímicos. Durante este período, a concepção de
Natureza ± e, conseqüentemente, sua relação com o humano ± foi sofrendo
alterações sensíveis no interior da filosofia, bem como nas dinâmicas do cotidi-
ano social. Neste período, importantes pensadores buscavam tentativas de sín-
teses entre a cosmologia cristã e as diversas cosmologias antigas. Uma signifi-
cativa contribuição foi trazida por São Thomas de Aquino, pois, ao realizar uma
releitura da obra aristotélica, ofereceu elementos que puderam reestruturar sig-
nificativamente as concepções de Natureza e, por conseguinte, de corpo huma-
no (SILVA, 2001, p.10). As idéias de Aquino, uma vez propagadas pela Igreja a
partir do século XIII, se difundem e passam a influenciar todo um imaginário
social da época.

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46 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
A sexualidade poderia ser um rico núcleo de referência para buscarmos uma
maior compreensão sobre os avanços da moralidade no processo de constitui-
ção do cristianismo. Apesar da moral sexual ser anterior ao próprio cristianismo,
as transformações interiores no trato com a sexualidade adquirem cores mais
fortes quando são destacadas no elenco dos pecados listados por São Paulo em
suas epístolas, como nos indica Ariès (1987, p.53). E aqui poderíamos identificar
elementos que auxiliam na criação de um contexto no qual as relações do ser
humano com sua própria dimensão corporal, bem como aquela possível de se
travar com os demais corpos, tornam-se eticamente mais importantes.
A onipresença dominadora da Igreja e seus preceitos se espalham pelo ociden-
te do mundo e propiciam profundas reformulações na perspectiva de corpo
vigente. O cuidado de si implode e se desvincula de uma concepção mais ampla,
onde aparecia como um cuidado integral ± do corpo e da alma ± e contínuo ±
durante toda a existência dos indivíduos. Eis que um turvo contrário pôde se
fazer presente, pois neste momento a preocupação com o corpo passou a ser um
sinal de um conseqüente afastamento das dimensões da própria alma (BOHLER
apud DUBY, 1990, p.366).
As concepções e preceitos que estruturaram o cristianismo e sua moral pude-
ram servir de base para a edificação de um contexto de maior controle sobre o
corpo e a atividade sexual, onde as práticas corporais e os exercícios puderam
encontrar seu espaço somente quando se apresentavam como possibilidade
concreta de uma ampliação de um controle sobre si. E este processo, de alguma
forma, contribuiu para a construção da concepção de um corpo mais frágil e
constantemente ameaçado pelas suas próprias fraquezas; ameaça esta que, nes-
te momento, já se constituía como um risco eminente para as possibilidades de
desenvolvimento da alma.
NATURA DOMINATA
Pensar as transformações da Natureza é, no limite, um fundamental exercício
de auto-reflexão para nossa sociedade. Neste sentido, poderíamos aqui buscar
perceber alguns dos passos pelos quais passou a nossa concepção de Natureza
até a Modernidade. Com a ajuda de Kesselring (1992, p.24), podemos perceber
que as origens de sua construção encontram algumas de suas raízes em três
pontos fundamentais. O primeiro seriam as conseqüências advindas das novas
leituras e significados dados para os escritos dos grandes pensadores da Antigüi-
dade grega; esta redescoberta, principalmente da obra de Platão, pôde alimentar
os germes do pensamento moderno, servindo de matéria-prima, ainda em um
estágio embrionário, para o surgimento das ciências modernas, baseadas em
uma perspectiva de Natureza enfaticamente considerada sob seus aspectos quan-
titativos.

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 47


O renascimento dos escritos platônicos também influencia decisivamente, nos
séculos XVI e XVII, as produções de Copérnico e de Kepler, às quais empresta a
simbologia da centralidade do sol ± como fonte de vida e do bem ± assim como
a forma do círculo e o critério da simplicidade matemática. E aqui já é possível
encontrarmos alguns indicativos de uma certa antecipação da concepção mo-
derna heliocêntrica e as explicações matemáticas das trajetórias dos planetas.
Um segundo fator que pode ter contribuído na consolidação da nova concep-
ção de Natureza foi a herança que o pensamento teológico medieval deixou para
os preceitos das novas ciências, onde se explicita fortemente uma ³suposição
teológica de um determinismo geral e contínuo´ (KESSELRING, 1992, p.26), res-
quícios ainda de um pensamento que acreditava que Deus não só havia criado o
mundo como também o mantinha em constante manutenção, transformando-o
continuamente.
O terceiro elemento para a concepção moderna de Natureza emerge do des-
dobramento vivo e conseqüente dos outros dois, posto que o desenvolvimento
e a instrumentalização do pensamento, bem como a estruturação de metodologias
e lógicas que reduzem o mundo, auxiliam no aprofundamento de uma tradição
experimental na pesquisa científica sobre uma Natureza agora coisificada e
quantificável. Ao mesmo tempo em que esta recíproca pode fazer-se verdadeira,
no passo que o adensamento das pesquisas experimentais científicas,
concomitantemente, também pode ser visto como responsável por esta outra
perspectiva de relação para com a Natureza.
Uma Natureza esvaziada de conteúdo, desprovida de seus próprios significa-
dos internos, apresenta-se agora como um simples objeto de manipulação dian-
te da avidez de um ser humano sedento por luz e esclarecimentos. Um humano
que, com seus próprios punhos e sua iluminada razão, exige abandonar sua
menoridade e se eleva como dono e senhor da Natureza. Um humano que cons-
trói a inversão de sua relação com Deus, pois agora sua razão não mais aparece
como uma representação metafórica da razão divina, mas sim o sentido oposto
se faz presente.
Quando uma Natureza concebida somente como produto externo de uma
racionalidade divina se encontra com as dinâmicas próprias de uma nascente
lógica instrumental, pode sofrer derradeiras transformações em seu corpo e nos
quadros protagonistas de seu governo. É justamente a putrefação do cadáver de
Deus que serve de alimento para que um conjunto de normas, racionais e objeti-
vas, assuma o seu antigo papel na coordenação e manutenção do movimento
contínuo de todos os processos naturais do universo.
Este contexto possibilita o surgimento de uma cosmologia determinista que
passa a afirmar a concepção de um universo representado como um grande
aparelho mecânico, fato que, de certa forma, antecipa, ou ao menos prenuncia,

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48 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
a latência de uma vindoura concepção que passaria a apresentar a própria di-
mensão corporal do humano semelhante à imagem de uma máquina.
O humano ocidental moderno ± dono e senhor consciente de todas as leis do
universo ± se depara com sua própria solidão. Os conhecimentos e representa-
ções que ele mesmo passa a construir daquilo tudo que o cerca, começam a lhe
impor perspectivas mais relativizantes no que se refere à sua própria posição de
centralidade em relação a tudo que lhe é externo. As resistentes descobertas
astronômicas de Copérnico ajudam a derrubar antigos paradigmas e começam a
projetar o ser humano ± como que imergindo-o nas forças centrífugas que regem
a rotação dos planetas ± para a periferia do antigo diagrama do universo.
E assim, relativizado e deslocado de sua importância antropocêntrica, é possí-
vel ao humano conceber suas dimensões e fronteiras a partir de outras perspecti-
vas. Já entre os séculos XI e XIII, é possível identificar alguns dos germes de um
processo de ³emergência do indivíduo´ (DUBY, 1990, p.503), a emergência de um
ser humano que se entendia enclausurado em seu ³envoltório corporal´; tecido e
entremeado pelas preocupações em preservar seus espaços e estreitos limites
diante dos ditames da religião. É possível assim a existência dos germes que cons-
truíram um corpo atravessado pela solidão mas que, entretanto, ainda não se
encontrava desvinculado de uma dimensão cósmica, de uma certa incompletude e
de um movimento permanente de renovação pelo poder cíclico da vida.
Mas foram somente os derradeiros anos do século XIX que puderam assistir a
separação mais profunda dos antigos conceitos de Natureza, tanto daquele indi-
cado pela physis grega, como daquele advindo dos fundamentos da teologia
creacionista, possibilitando a culminação das transformações ulteriores que
desembocaram em nosso conceito moderno, o qual floresceu gestado e calcado
essencialmente sobre as grandes descobertas científicas.
A constituição e a aceitação geral da teoria da evolução exposta por Charles
Darwin, relativiza o lugar do humano no universo, uma vez que ele passa a perder
sua prioridade ontológica. A descoberta do acaso no interior das pesquisas em
ciências naturais ajuda a desestabilizar as certezas do determinismo mecânico
sobre o funcionamento do universo. Os estudos em termodinâmica conheceram
sua segunda principal lei ± a entropia ± a qual torna explícito o fato de que, em
fenômenos que envolvem energia, pode ser observada uma diminuição na quan-
tidade de movimentos regulares, cedendo espaço a movimentos irregulares,
caóticos, que findam em uma desordem máxima e uma ausência total de estrutu-
ra. A principal implicação decorrente deste raciocínio seria uma profunda revira-
volta na história da criação, pois desta forma o mundo poderia não mais ter seu
início, mas sim o seu fim, imerso no caos.
A consubstanciação das ciências modernas questiona a concepção de mundo
até então propagada pela Igreja. As dissecações do corpo humano, realizadas

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 49
pelos experimentos das ciências biomédicas, impõem uma nova perspectiva de
corpo para a sociedade, agora mensurável e dominado pelas emergentes lógicas
internas da cultura ocidental. O corpo humano pôde assim principiar um proces-
so de dessacralização intrinsecamente entremeado por uma decisiva ambigüida-
de, pois ao passo em que ainda se apresentava como fonte primeira de experiên-
cia, desvalorizava-se diante da possibilidade de intervenção e alteração em suas
estruturas. E aqui podemos encontrar os germes de uma concepção que passa a
entender o corpo como uma construção humana (SILVA, 2001, p.12).
ANTIGOS OLHARES MODERNOS
As inúmeras linhas de pensamento que compõem a história da filosofia oci-
dental construíram e apresentaram muitas concepções de universo, Natureza,
sociedade e corpo. Cientes desta multiplicidade, aqui optamos por caminhar, no
percurso deste trabalho, par e passo com algumas idéias de Ernst Bloch, as quais,
neste contexto, nos apareceram junto a um fértil diálogo com alguns elementos
constituintes da obra de Hegel e Schelling.
Alguns princípios e preceitos da antiga alquimia se oferecem como elementos
detonadores do pensamento de Bloch, principalmente no que diz respeito à sua
concepção de Natureza e à técnica mediadora das relações do humano para com
esta sua dimensão externa. Para tanto, ele parte de alguns conceitos criados
pelo filósofo-alquimista Paracelso para representar a Natureza como um fenô-
meno total, onde diferencia (mas não separa) a força natural individualizada
(archeus) da essência cósmica (vulcanus) ± a virtude dos elementos. Mesmo
considerando-os apenas como conceitos míticos e, por isso, limitados, Bloch os
acolhe como denominações que o ajudam a desdobrar seu pensamento em torno
de uma região concreta e objetivamente possível do mundo.
E deste modo, em um certo sentido, empresta uma maior e objetiva concretude
à energia que principia ambos os conceitos, pois os toma como referência para
ajudar a pensar uma filosofia dinâmico-qualitativa da Natureza (BLOCH, 1979,
p.261), onde procura desenvolver um entendimento junto à sua produtividade em
detrimento de uma cansada concepção mecanicista que somente a percebe
como produto. Neste sentido, segundo Bloch, seria possível abrirmos a dimensão
de um verdadeiro realismo; abrirmos a percepção da tensão dialética interna à
própria Natureza, a percepção das tensões e dos movimentos que estão amorte-
cidos abaixo da superfície de uma Natureza paralisada por um mecanicismo.
Poderíamos, enfim, perceber a existência de um foco de produção em seu inte-
rior e possibilitar que a estrutura de sua origem possa apresentar-se inesgotável
diante de todos nossos modelos e leis.
Neste entendimento, o foco de produção da Natureza não limitaria sua origem
aos começos, mas sim se manifestaria permanentemente na tendência, em uma

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50 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
sempre nova ação por meio de processos e de conexões universais (BLOCH,
1979, p.262). Um foco profundo que pulsaria vivo, manifestando a energia dialética
essencial que o configura internamente, situando sua estrutura e seu fundamento
na inconstância, na tensão e na latência. Sob este olhar, a Natureza não seria
entendida como um produto, mas sim como produtora e como tendência.
Esta percepção dinâmico-qualitativa nos propõe um olhar para a materialidade
das manifestações da Natureza embebido da mesma energia motriz que vivifica
a perspectiva materialista-dialética através da qual Bloch percebe todo o univer-
so. E por isso mesmo a imagem de produtividade por ele trazida nos parece em
muito diferir de uma concepção mecânica e utilitária, sustentada pelas lógicas
do mercado e da eficácia, inerentes à dinâmica interna do sistema sócio-econô-
mico capitalista em sua fase contemporânea.
O entendimento de produtividade nos parece se aproximar de algo como a
energia interna e dialética de vida/morte que se contorce nas vísceras das coi-
sas; um movimento contínuo de decomposição e nascimento, o qual pode ali-
mentar a latência do porvir. A concepção de produção trabalhada por Bloch, de
alguma forma atravessa, e é atravessada, pelos conceitos construídos por
Schelling que a entende como ³produtividade originária´ ± como a natura naturans
do Renascimento. De uma certa forma, esta referida produtividade apresenta
dimensões mais próximas ao µconcreto¶ da experiência da Natureza, e de uma
coordenação a seu fator produtivo, do que aquelas dimensões parciais e abstra-
tas indicadas pela dinâmica mecanicista.
Sustentada por estes entendimentos, constrói-se uma concepção de Nature-
za que tem como fundamento o pressuposto da existência de uma co-produti-
vidade que principia humano e Natureza, assim como o era para Paracelso.
Para Bloch (1979, p.267), existe a disposição, a possibilidade real e concreta da
existência de um sujeito da natureza, o qual se apresentaria possivelmente
como elemento, ou dimensão, principal que sustenta e media a existência do
humano. Possibilidade esta que se encontra indicada intrinsecamente à pers-
pectiva que permite à própria estrutura material da Natureza apresentar-se de
forma viva e latente.
Bloch nos ajuda assim a entender uma concepção de inter-relação entre a
Natureza interna e externa do humano que, em suas raízes, deixa viva a possibi-
lidade da presença de uma mediação com uma natura naturans não encerrada e
limitada a uma abordagem mítica, mas sim com uma natura naturans reelaborada,
sustentada por uma perspectiva concreta e real (na profundidade e amplitude
destes conceitos); ressuscitada pelo suor, pelas dores e pela indignação diante
daquilo que cotidianamente a mata, seja na estruturação do olhar e do conceito
ou mesmo nas desmesuradas práticas de desafio e devastação de nossa natureza
interna e externa. Enfim, uma mediação com uma natura naturans que principia
do movimento vivo e dialético que gera o próprio ventre de onde nasce.

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 51
CORPO DE FRONTEIRAS
No arrastar dos séculos, passamos de uma concepção de Natureza auto-
produtiva e fonte primeira da vida e da criação, para a perspectiva de uma
Natureza totalmente transformada em um objeto externo ao corpo, submisso
ao poder técnico do humano de extração e domínio. Encontramo-nos assim,
cindidos e distinguidos claramente por novos limites entre nossa corporeidade
e a Natureza. A alteridade é desenhada com cores mais fortes e contrastantes,
ajudando a criar um invólucro corporal mais impermeável e isolado daquilo
que lhe é externo à pele. Não que os limites do corpo (ou ao menos a consci-
ência destes) já não existissem desde os mais remotos tempos; mas talvez suas
fronteiras (ou a consciência destas) fossem um pouco mais tênues e esboçadas,
mais porosas e, de alguma forma, menos cindidas com aquilo que lhes cerca-
vam e lhes compunham.
Talvez seja aí, nas sombras e entrelinhas da história, que possamos encontrar
os germes de outras possibilidades para nossas fronteiras; encontrar no interior
de alguns pensamentos esquecidos à sombra ou à margem dos paradigmas
hegemônicos, a matéria-prima para o crescimento de outras possibilidades para
as fronteiras do corpo, seja no que se refere ao seu inerente potencial de medi-
ação entre as dimensões internas e externas, ou mesmo às múltiplas contribui-
ções que a re-significação das características essenciais de uma fronteira pode
confidenciar a ambas as dimensões entre as quais se interpõe.
Neste contexto, ao pensarmos uma fronteira, de imediato nos aparece a su-
gestão da imagem de um limite. Uma fronteira nos parece como a dimensão
limítrofe de um território, mas que também se empresta enquanto metáfora à
definição dos corpos de objetos e seres. Uma fronteira cartográfica pode repre-
sentar algo abstrato ou concreto, construído pelo humano ou simbolizado por
algum acidente geográfico natural; já as fronteiras corporais se impõem na per-
cepção física e concreta de sua própria materialidade, apesar de ± quando pen-
samos no corpo humano ± podermos senti-las e significá-las de forma mais
porosa e fluida, na medida em que nos aparecem não só como limite que nos
define mas sim também como possibilidade viva de comunicação.
A pele significada como fronteira pode implodir sua concepção morta de
invólucro inerte, uma vez que se reconstrói no interior da polissemia de seu novo
conceito. A pele concebida como fronteira oferece ao corpo,
concomitantemente, múltiplas possibilidades de significação: apresenta-se como
limite identificador de seu ser e estabelece as formas concretas do corpo, sus-
tentando um fundamento material para a existência do ser humano; ao mesmo
tempo em que se apresenta como ligação deste ser com tudo aquilo que lhe é
externo, como possibilidade de comunicação com o universo. Neste sentido,
podemos perceber a fronteira também como o espaço primeiro do devir, onde se
fertilizam os germes de outras possibilidades para o futuro, ou então, como nos

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52 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
ajuda a pensar Bloch (1980, p.496), a fronteira como o setor mais adiantado do
tempo (e talvez, do espaço), como o contexto onde se decide o tempo próximo.
É justamente através das fronteiras do corpo que nos chegam os prazeres e
alegrias, a dor e os sofrimentos, que tecem, cotidianamente, o tecido de nossa
existência. Quando compartilhamos do pensamento de Pascal (apud VAZ, SILVA
e ASSMAN, 2001, p. 87), podemos perceber que é devido a existência dos limites
e a conseqüente possibilidade de sentirmos os µsentimentos¶, que nos é permitido
a dimensão da alteridade, da abertura para o outro; para a solidariedade, o amor
e o ódio.
Somos constituídos pela materialidade de nossa dimensão corporal, da mesma
forma que o somos pela relação que estabelecemos com aquilo que nos é exter-
no às fronteiras de nossa pele. Mas nossa composição corporal, em certa medi-
da, transcende a própria materialidade de nosso organismo individual, de nossa
natureza interna. Para Marx (1989, p.163-4), a Natureza constitui em si mesma
uma parte da consciência humana, ela é
(...) o corpo inorgânico do Homem, isto é, a natureza na medida
em que não é o próprio corpo humano. O Homem vive da nature-
za, quer dizer: a natureza é o seu corpo, com o qual tem que
manter-se em permanente intercâmbio para não morrer. Afirmar
que a vida física e espiritual do Homem e a natureza são
interdependentes significa apenas que a natureza se interrelaciona
consigo mesma, já que o homem é uma parte da natureza.
A energia dialética interna ao pulsar da vida existe, no interior da materialidade
que estrutura a natureza orgânica e inorgânica do humano ± bem como em suas
latentes fronteiras ±, no momento em que permitimos emprestar à nossa percep-
ção a lógica que subjaz e sustenta o pensamento de Bloch. A possibilidade
latejante da existência de naturezas vivas ganha força e corpo quando atraves-
sadas por uma perspectiva próxima àquela denominada ³dinâmico-qualitativa´,
provinda dos esforços de uma proposta materialista-dialética.
Uma matéria viva e pulsante, inconstante e latente, passa aqui a preencher e
constituir o núcleo da natureza externa e interna do humano, pois ao comun-
gar uma co-produtividade originária, a materialidade que compõem a Natureza
e o corpo humano emprestam-se mútua e reciprocamente, seja em uma dimen-
são conceitual, significante, ou mesmo em uma dimensão empírica. Ressusci-
tar a Natureza do cadáver no qual se encontrava velada pelo olhar mecanicista
instaurado pelos primórdios das ciências modernas, bem como pelos resquíci-
os de um pensamento teológico judáico-cristão, em certa medida, é ressusci-
tar também o próprio corpo humano dos limites e reducionismos aos quais
encontra-se atado.

p 
Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 53
Perceber a criação, o constante devir, no núcleo da Natureza, é também per-
mitir ao corpo humano uma possibilidade de re-significar-se, uma vez que ele
também é uma dimensão desta mesma Natureza. Ressuscitar as forças dialéticas
e vitais que animam o corpo, não é desejar um retorno a cansadas e arcaicas
visões de corpo e Natureza, mas sim é saber escutar as lições que o eco de suas
possibilidades, quando somadas a escritos contemporâneos, podem trazer para
algumas de nossas certezas provisórias e nos apresentar outras possibilidades
para a vida.
Podemos aqui, portanto, admitir a transitoriedade e o movimento inerentes à
Natureza, seja em sua dimensão material ou mesmo na concretude e abstração
de suas múltiplas concepções; e, com isso, buscamos alimentar os esboços dos
germes de outras possibilidades para concebermos o corpo humano e sua natu-
reza externa. Talvez justamente a porosidade osmótica e viva de suas fronteiras
acabe nos convidando aqui para um diálogo pretensamente mais atento e plural
sobre as possibilidades intrínsecas à sua existência.
[As referências bibliográficas desta contribuição podem ser consultadas na fonte
original]
NOTAS
3 Este artigo é uma síntese de um dos ensaios de minha dissertação de mestrado
intitulada ³Alteridades da pele,
fronteiras do corpo´, defendida em março de 2005 junto ao Departamento de Educação
Física do CDS/UFSC,
sob orientação da profª. Drª. Ana Márcia Silva; e apresentada no XIV COMBRACE e I
CONICE, em setembro de
2005.
2 Trabalhamos o termo Natureza em maiúsculo quando nos referimos à manifestação
física do meio natural, à
³natureza inorgânica´ do humano (MARX, 1989, p.163) ± plantas, animais, minérios
etc ± tentando
esquematicamente diferenciá-lo, em algum sentido, do entendimento de natureza como
essência das coisas.

p 

p 
Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.
›   
      
. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
Formato da contribuição: texto resumido
Fonte: ³O Ecoturismo e o Turismo de Aventura como Alternativas de Uso e
Conservação dos Espaços Naturais da Região Cárstica de Dianópolis - TO.
Dourados: UEMS, 2006. (Graduação em Turismo com ênfase em Ambientes
Naturais), Unidade Dourados, Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, 2005.
E-mail do(s) autor(es): heroslobo@hotmail.com; marcos_tur@hotmail.com
Títulos acadêmicos principais atuais: Heros Luis S. Lobo - Bacharel em Turismo
pela Universidade Anhembi Morumbi. Especialista em Gestão e Manejo Ambiental
em Sistemas Florestais pela Universidade Federal de Lavras. Mestrando em
Geografia pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Professor,
Pesquisador e atual Coordenador do Curso de Turismo com ênfase em Ambientes
Naturais da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul ± Dourados, MS. Atual
Presidente do Conselho Deliberativo da Sociedade Brasileira de Espeleologia
(SBE). Filiado à Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Turismo
(ANPTUR). Marcos Luis F. Lourenção - Bacharel em Turismo pela Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul. Especializando em Perícia Ambiental pela
Fundação Oswaldo Cruz. Vice Presidente do Grupo de Espeleologia Serra da
Bodoquena (GESB).
Ano: 2005
Publicação original: monografia
Ecoturismo e Turismo de Aventura como
Alternativas para a Conservação do
Carste de Dianópolis ± TO1
Heros Augusto Santos Lobo
Marcos Luis Faleiros Lourenção
O município de Dianópolis localiza-se no estado de Tocantins, a 343 quilôme-
tros da capital, Palmas. O município se interliga à região pela rodovia estadual
TO-040, a Oeste pelo município de Porto Alegre do Tocantins, e a Sudeste ao
município de Novo Jardim. A rodovia encontra-se em bom estado de conserva-
ção. Existe pouca sinalização e a maior parte dela é de via simples (sem duplica-
ção). Dentro de Dianópolis as vias de acesso são características de cidades
pequenas. Tratam-se de ruas estreitas e de pouco movimento, porém conserva-
das, apesar das dificuldades impostas pelo relevo local.

p 
56 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
O município que já conta com uma demanda para o ecoturismo, o turismo de
aventura e o turismo cultural. Todavia, Dianópolis não otimiza os benefícios que
podem ser gerados pelo turismo, e a atividade turística atual se encontra num
estágio baixo de organização, de forma a beneficiar poucos envolvidos e não
colaborar com a conservação dos atrativos naturais. Paralelo a isso, há um
número muito grande de atividades de mineração e de hidrelétricas que, por
vezes, acabam por territorializar e degradar por completo grandes extensões de
terra. Esse modelo de produção do espaço, que consome os recursos naturais de
forma predatória, já foi observado em outras regiões do país, onde se percebe,
como resultados mais evidentes, as desigualdades sociais e a degradação do
meio ambiente. Propõem-se então, alternativas de ocupação dos espaços natu-
rais com atratividade turística, de forma a conservá-los e auxiliar no desenvol-
vimento sócio-econômico local.
As justificativas que permeiam a execução deste estudo se dão sobretudo por
fatores sócio-ecológicos. Em primeiro lugar, ressalta-se a predominância de
rochas carbonáticas na região do município de Dianópolis. Em termos geológi-
cos, trata-se de uma região cárstica2, definida por Karmann; Sanchéz (1979)
como parte da Província Espeleológica Bambuí. Outros aspectos a serem ressal-
tados são a quantidade e qualidade dos rios (no que se refere a volume e veloci-
dade de fluxo de água) e o relevo (morrarias, vales, borda de serra). Os três
fatores mencionados fazem do município um forte candidato aos investimentos
de grandes organizações ligadas a atividades de mineração e produção de ener-
gia elétrica (hidrelétricas). Pela dimensão social, as atividades de mineração e
produção de energia hidrelétrica geram empregos, movimentam os três setores
da economia e, por vezes, trazem benefícios para a comunidade local.
Contudo, os benefícios que a comunidade local recebe pode vir a recebe são
escassos, em função da forma como tais atividades têm sido realizadas. Como
foi possível observar durante as pesquisas de campo, na região predominam
mini-hidrelétricas, que necessitam de apenas dois funcionários em média e ge-
ram grandes impactos ambientais. Tal situação foi detectada, por exemplo, em
uma usina instalada no Rio Palmeiras. Impactos negativos, como a erosão causa-
da em função do desmatamento da mata ciliar, desvio do leito do rio e
assoreamento, foram facilmente identificados. As UHEs (Usinas Hidrelétricas)
também deixam no leito do rio grandes objetos utilizados em sua construção,
como lajes de concreto, canos, arames e telas de ferro. Outra ação ilegal, de
acordo com Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei n. 9.433 (BRASIL, 1997),
é o desvio de cem por cento do leito natural do rio. O problema se agrava uma
vez que já existem três UHEs em funcionamento no município e há projetos de
construção de mais seis, três delas no Rio Palmeiras, que já estão em início da
fase de construção.
Nesse quadro, percebe-se a oportunidade de propor alternativas de uso sus-
tentável dos recursos naturais. Atividades de exploração controlada e não

p 

Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 57


extrativista, que ampliem o tempo de produção de renda e que alcancem o maior
número possível de pessoas beneficiadas para um desenvolvimento sócio-eco-
nômico local, aliadas à conservação dos ecossistemas e sua biodiversidade.
Para tanto, as alternativas de uso desses espaços naturais se subsidiarão nas
atividades de ecoturismo e turismo de aventura como por exemplo: observação
de pássaros, cavalgada, trekking, canyonismo, boiacross, rafting, espeleoturismo,
entre outras atualmente reconhecidas pela Grade de Classificação de Atividades
e Nichos de Mercado elaborada pelo Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR,
2005). Assim, o objetivo do presente trabalho está centrado em propor formas de
utilização dos recursos naturais do município de Dianópolis de modo mais sus-
tentável, gerando renda a longo prazo para a comunidade local e colaborando
com a conservação desses recursos. Com isso, espera-se contribuir para a con-
servação de parte dos ecossistemas e da biodiversidade do corredor ecológico
Jalapão ± Chapada das Mangabeiras e assim, conseqüentemente, o bioma cerra-
do; a comercialização de um novo destino turístico; a proteção dos recursos
hídricos da região divisora de águas das bacias hidrográficas São Francisco,
Parnaíba e Tocantins; geração de emprego e renda para a comunidade local; o
acréscimo no tempo de permanência e o gasto médio do turista; e, por fim, o
aumento na quantidade e diversidade de produtos turísticos oferecidos pela
organização.
A metodologia para a execução da proposta se deu por meio de pesquisas de
campo ± realizadas no período compreendido entre a segunda quinzena de julho
a segunda quinzena de outubro de 2005, quando foram realizados diagnósticos
locais, num processo de observação direta individual e observação não-partici-
pante (SCHUTLER, 2003: 104), nas esferas operacional, administrativa,
localizacional e sócio-ambiental da única operadora de turismo local e da re-
gião. Também foram realizadas entrevistas científicas não-estruturadas
(SCHUTLER, 2003: 106-107), mapeamento de campo usando sistema de GPS3 e
fichas de levantamento de recursos naturais cársticos do CECAV/MS4. Todo esse
trabalho foi complementado por pesquisas bibliográficas sobre a região e sobre
os aspectos abordados nesse trabalho.
TURISMO SUSTENTÁVEL, ECOTURISMO E TURISMO DE AVENTURA
Com o aumento da poluição e destruição de recursos naturais, as questões de
conservação da natureza, ecoturismo e turismo de aventura vêm ganhando im-
portância nas discussões e tomadas de decisão a respeito da ocupação de espa-
ços naturais e utilização sustentável desses recursos. Tal fato chama a atenção
para compreender a finalidade de se preocupar com a natureza, bem como a
compreender os conceitos de ecoturismo e turismo de aventura. Por outro lado,
chama também a atenção para conceitos sobre turismo sustentável, turismo de
natureza e as diferenças com o ecoturismo. Por conta disso questiona-se: qual a
importância de se conservar os atrativos naturais de Dianópolis?

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58 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Até os anos cinqüenta do século passado, pode-se dizer que o bioma cerrado
estava quase inalterado. No período seguinte, com a interiorização da capital
nacional e a abertura de uma nova rede rodoviária, extensas áreas de vegetação
deram lugar à pecuária, à agricultura extensiva e a cultura de grãos. De acordo
com o Projeto Rota Brasil Oeste (2002), tais mudanças se apoiaram, sobretudo,
na implantação de infra-estruturas viárias e energéticas, bem como na desco-
berta de vocações desses solos regionais, permitindo novas atividades agrárias
rentáveis, em detrimento de uma biodiversidade até então pouco alterada. Ainda
de acordo com o mesmo projeto, durante as décadas de 1970 e 1980 houve um
rápido deslocamento da fronteira agrícola, com base em desmatamentos, quei-
madas, uso de fertilizantes químicos e agrotóxicos, que resultou em 67% de áreas
do Cerrado com grau avançado de degradação. Restam aproximadamente ape-
nas 20% de área em estado conservado.
Paralelo a isso, segundo Carvalho (2003), a partir do final da década de 80 o
ecoturismo se fortaleceu no país, seguindo a tendência internacional. Nas déca-
das de 70 e 80, o brasileiro começou a perceber com mais facilidade a importân-
cia de se conservar a natureza em função da visível poluição e diminuição de
recursos naturais e biodiversidade. As pessoas passaram a se preocupar cada vez
mais com temas como a saúde, qualidade de vida, danos ecológicos, extinção de
espécies, dizimação de comunidades locais e de culturas. Soma-se a isso o
fortalecimento das ONGs (Organizações não Governamentais) ambientalistas,
campanhas ecológicas e movimentos sociais a favor da natureza. Essa ³crise
ambiental´, relatada por Layrargues (2004), apresentou o mérito de ter afetado,
mas não destituído, muitos dos valores do projeto central da modernidade, que
se constitui na valoração do artificial em detrimento do natural, onde a natureza
± antes objeto de apropriação e exploração direta ± passa a ser valorizada frente
ao panorama de escassez de recursos naturais. Nesse sentido, ainda com refe-
rência a Layrargues (2004), parte-se do pressuposto de que o ecoturismo
corresponde a um fenômeno social eminentemente decorrente da eclosão da
crise ambiental, em que a relação entre o ambiente artificial e o ambiente natural
assume novos contornos em termos de valoração simbólica.
Para tanto, faz-se necessário ter bem claro o conceito de ecoturismo que,
segundo Warren et al. (2002: 305-33), é uma atividade econômica perpétua por
não retirar recursos da natureza, mas sim, se beneficiar simplesmente com a
existência e conservação desses recursos. Salvati (2000) traz uma leitura da
definição oficial da EMBRATUR, ao destacar que o ecoturismo também designa
um segmento da atividade turística que fomenta a conservação dos recursos
naturais e culturais, desenvolve a formação e consciência ambiental e integra as
comunidades locais de forma a beneficiá-las através do turismo sustentável em
um ambiente natural.
É comum a confusão entre ecoturismo e turismo de natureza por serem ativi-
dades turísticas de contato com recursos naturais. Porém, Dias (2003: 107) des-

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 59
taca que o turismo de natureza é o desfrute de valores naturais de um território,
mas sem implicar, necessariamente, preocupação particular dos turistas com a
preservação do meio. Já o ecoturismo implica comportamento pessoal, preocu-
pação com a natureza, consciência ambiental e interpretação do meio ambiente.
O ecoturista quer, não só estar em contato com a natureza, mas ser agente
participativo no meio, colaborar com a conservação, conhecer a cultura local e
se relacionar com a população. Já o conceito de turismo sustentável se apresen-
ta de forma um tanto quanto polêmica no meio científico. Considerando ainda
Dias (2003: 107), o turismo sustentável é a atividade que reconhece explicita-
mente a necessidade de proteção do meio ambiente, uma vez que trabalha o
turismo de forma a retirar benefícios da natureza sem comprometê-la. Além
disso, o autor considera três importantes vertentes no turismo sustentável: su-
portável ecologicamente, eqüitativo na perspectiva ética e social e viável eco-
nomicamente.
Outro segmento do turismo que está em expansão, porém em discussão ainda
de forma mais restrita no estudo do turismo é o de aventura. Trata-se de um
campo bastante diversificado, visto que a aventura é um conceito altamente
pessoal, que assume diferentes significados para diferentes pessoas. Para
Swarbrooke (2003: 17), algumas atividades e ambientes estão freqüentemente
associados à aventura, conforme a Tabela 1.
Tabela 1 ± Atividades e ambientes tipicamente associados à aventura
ATIVIDADES ASSOCIADAS À AVENTURA
Atividades físicas ou com habilidades
psicomotoras
Contato com a natureza, vida selvagem
Contatos com diferentes culturas,
pessoas, fé, estilos de vida
Viagens árduas, por tração mecânica,
animal ou humana, por terra, ar ou água
AMBIENTES ASSOCIADOS À AVENTURA
Ambientes ao ar livre, selva
Ambientes ao ar livre, selva
Locais remotos, singulares ou exóticos
Locais remotos, singulares ou exóticos
Fonte: Swarbrooke (2003, p. 17)
Quanto à classificação das atividades dentro dos segmentos de ecoturismo e
turismo de aventura, considerar-se-á, neste trabalho a Grade de Classificação de
Atividades e Nichos de Mercado (EMBRATUR, 2005) exposta na Tabela 2. Todas
essas atividades estão intimamente ligadas à natureza, e podem vir a auxiliar na
conservação dos recursos naturais, uma vez que se beneficiam da existência
destes.

p 
60 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Tabela 2 ± Atividades relacionadas ao Ecoturismo e ao Turismo de Aventura5
Fonte: EMBRATUR (2005).
TURISMO DE NATUREZA EM DIANÓPOLIS, TO
Os ambientes naturais utilizados pelo ecoturismo e turismo de aventura de
Dianópolis integram o Corredor Ecológico6 Jalapão ± Chapada das Mangabeiras,
importante elo de conservação do cerrado brasileiro. O Corredor Ecológico e as
cinco Unidades de Conservação7 que ele interliga, formam uma, dentre as três
regiões consideradas prioritárias para a conservação do cerrado brasileiro, se-
gundo pesquisa da Conservation International apud Arruda (2002). Isso se justifi-
ca devido à riqueza da biodiversidade e à área ser divisor de água de importantes
bacias hidrográficas (São Francisco, Parnaíba e Tocantins).
A importância para a conservação das áreas naturais remanescentes na região
é inquestionável. Entende-se que o ecoturismo e o turismo de aventura poderão
auxiliar nesse processo, dando um sentido maior de valor as áreas naturais
protegidas. Cabe ressaltar que o amparo legal para a existência dessas atividades
firma-se sobretudo na Constituição Federal, que em seu Artigo 225, Capítulo VI,
que afirma: ³Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações´ (BRASIL, 1988). Além disso, o SNUC, em seu inciso
oitavo do artigo 5°, traz também suas determinações sobre a importância para a
conservação e gestão dos corredores ecológicos:
O SNUC será regido por diretrizes que busquem proteger grandes
áreas por meio de um conjunto integrado de unidades de conser-
vação de diferentes categorias, próximas ou contíguas, e suas
respectivas zonas de amortecimento e corredores ecológicos,
integrando as diferentes atividades de preservação da natureza,
uso sustentável dos recursos naturais e restauração e recupera-
ção dos ecossistemas(BRASIL, 2000).
ECOTURISMO
Caminhadas
Espeleoturismo
Flutuação
Observação da Fauna
Ornitologia
TURISMO DE AVENTURA
Trekking
Canyoning e Práticas verticais
Cavalgadas
Mergulho
Rafting

p  
Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 61
A partir disso, buscou-se identificar como se dão as relações de conservação
e uso da natureza face ao uso turístico em Dianópolis, TO, no sentido de identi-
ficar as práticas que devem ser mantidas e outras que precisam ser substituídas.
As atividades turísticas oficialmente desenvolvidas em Dianópolis são execu-
tadas pela empresa Stella Tour, uma agência operadora de ecoturismo e turismo
de aventura situada dentro do município de Dianópolis. A operadora desenvolve
atividades em algumas áreas naturais no município e entorno. O Vale Encantado,
uma trilha de nível moderado a difícil por dentro de um cerradão com vegetação
exuberante, cavernas8, rica fauna e uma ponte de pedra de aproximadamente 65
metros de altura. O Rio Manoel Alves, principal produto que atrai a demanda
efetiva em função do rafting. A Lagoa Bonita, uma lagoa de água cristalina, mata
ciliar exuberante e de fácil acesso. Ainda pode-se citar a Cachoeira da Gameleira
e a Cachoeira da Fumaça, um atrativo já consagrado no estado em função de sua
altura (aproximadamente 30 metros), e a beleza cênica que a queda d¶água
proporciona. Além disso, a empresa se beneficia pela vinda de turistas do país
inteiro que chegam ao Parque Estadual Jalapão, atualmente um dos destinos de
ecoturismo que está em foco no país, os quais passam por Dianópolis para fazer
rafting. Dianópolis está a menos de cem quilômetros do coração do Jalapão.
DIAGNÓSTICO SOCIOAMBIENTAL LOCAL DOS ATRATIVOS
E ÁREAS COM POTENCIAL TURÍSTICO
Será apresentada agora uma breve análise das condições socioambientais
relacionadas ao uso turístico de cada atrativo. O objetivo do diagnóstico é
apresentar as perspectivas de uso e conservação dos espaços naturais, no sen-
tido de fornecer subsídios para as propostas para seu uso sustentável.
VALE ENCANTADO
O Vale Encantado está dentro de uma propriedade rural, localizada no municí-
pio de Dianópolis. Trata-se de um vale no meio do Cerradão, onde predomina
uma vegetação pouco alterada, composta por espécies arbustivas e arbóreas de
grande porte.
A geomorfologia local apresenta consideráveis desníveis, morros com
afloramentos calcários, canyons, córregos com alta variação de volume de água,
ocorrência de cavernas e uma peculiar ponte de pedra. O local é propício ao
turismo de aventura, em atividades como o trekking, ecoturismo ou espeleoturismo.
O trecho que configura o produto turístico da organização se limita a cinco
quilômetros de caminhada realizada em aproximadamente cinco horas. O per-

p  
62 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
curso é nos arredores do vale e com trechos íngrimes. Também há uma passagem
que é feita por dentro do Córrego do Açude ± curso d¶água principal que corre
pelo Vale, fato este que certamente gera impactos no leito do córrego e na fauna
aquática.
A Cachoeira da Ré é um dos atrativos da trilha, uma vez que, em função da
formação geomorfológica, a água do córrego volta por um sumidouro que es-
conde uma caverna de pequenas dimensões atrás da cachoeira, a qual já é parci-
almente visitada. Outro atrativo é a Ponte de Pedra, com altura aproximada de 65
metros de altura e formada pelo colapso da rocha. Esse atrativo, juntamente
com o Córrego do Açude, são os lugares onde há maior impacto da visitação
turística. Na passagem por baixo da ponte há vestígios de quebra e pisoteio de
travertinos9. O local é bem ornamentado e necessita de cuidados para diminuir
os impactos gerados pela locomoção de grupos.
A propriedade está em processo de transformação da Reserva Legal em RPPN
± Reserva Particular do Patrimônio Nacional10, o que denota uma preocupação e
interesse dos proprietários com a conservação do ambiente. Todavia, até o
presente o roteiro não apresenta nenhum tipo de limitação ao uso, como cálculo
da capacidade de suporte, restrições de uso ou plano de manejo e uso da área.
CACHOEIRA DA FUMAÇA
Situada no rio Balsas, na divisa dos municípios de Almas e Ponte Alta do
Tocantins, dentro da Fazenda da Fumaça, 66 quilômetros de Dianópolis, a Ca-
choeira da Fumaça é um dos principais atrativos da região em função da beleza
cênica que a queda da água proporciona. Sua mata ciliar é composta por grandes
taiobas, buritis, samambaias, palmeiras, capim dourado, jalapas entre outras
espécies.
O trecho aberto à visitação possui 600 metros de trilha com desníveis, que
termina na passagem pelas pedras atrás da cortina de água da cachoeira propor-
cionando um bom local para banho. Atualmente não existe arrecadação dos
municípios em relação a esta atividade, nem mesmo para o proprietário da fa-
zenda. Não há controle de visitação. O consumo do produto, na maioria das
vezes, não é organizado por agências e é realizado sem monitores ambientais.
LAGOA BONITA
A Lagoa Bonita, localizada em Dianópolis, é um atrativo turístico próximo a
área urbana. Com dimensões de aproximadamente 60 por 25 metros e profundi-
dade média de 1,5 metros, esse lago de água transparente possui olhos d¶ água

p  
Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 63
por todo seu corpo. Apesar do proprietário ter proibido a visitação recentemen-
te ± a qual era feita de forma descontrolada e sem arrecadação ± a lagoa ainda
é visitada por grupos de parentes e amigos do proprietário. Alguns impactos
ambientais dessa atividade ficaram evidentes, como o desmatamento parcial da
mata ciliar, contaminação da água com produtos de limpeza e pisoteio das
nascentes, ou olhos d¶ água.
RAFTING NO RIO MANOEL ALVES
O rafting no Rio Manoel Alves consolida-se como o principal produto turístico
de Dianópolis. O trecho do rio que compõe o produto está localizado no município
de Rio da Conceição, com seu início na Cachoeira Cavalo Queimado e término em
um balneário no centro deste município (trecho de cinco quilômetros e meio). O
rio conta com água esverdeada, mata ciliar típica da região que circunda o cora-
ção do Jalapão, cerrado, cerradinho, com predominância de jalapas, capim doura-
do, cajueiros, macaúbas, buritis entre outros. O rio possui diversas corredeiras e
cachoeiras, que caracterizam o trecho propício ao rafting amador e brincadeiras
aquáticas. Também sofre alguns impactos ambientais como desmatamento e quei-
madas, principalmente na época de estiagem (abril a setembro), época em que o
baixo nível de água do rio torna-se impróprio para o rafting.
CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO SUSTENTAVEL DOS RECURSOS E O RIO
PALMEIRAS
O uso responsável dos espaços naturais também depende muito da boa vonta-
de da empresa que executa o roteiro, a qual aparenta uma preocupação com a
questão ambiental. Isso pode ser percebido pelo discurso conservacionista dos
proprietários da operadora, que se preocupam muito em aproveitar os roteiros
para estimular a conscientização ambiental.
Sob o ponto de vista da sustentabilidade social dos roteiros, a atual forma de
produção da atividade turística em Dianópolis ainda agrega poucos benefícios.
Aspectos como a sazonalidade da atividade (que ainda se desenvolve sobretudo
em feriados prolongados e no verão), o pequeno fluxo de visitação e a falta de
políticas de incentivo ao turismo, não permitem que a geração de postos de
trabalho e respectiva distribuição de renda ocorram de forma efetiva. Existe uma
expectativa grande por parte dos proprietários rurais cujas terras possuem reco-
nhecido potencial de uso turístico, bem como de membros da comunidade que,
de uma forma ou de outra, recebem alguns benefícios diretos com a visitação
existente11, ainda que em fluxos baixos. Durante o período de pesquisas de cam-
po, foram também realizadas palestras em escolas e junto à comunidade, sobre
a importância do turismo e da conservação do ambiente. Entretanto, ainda não
se pode dizer que em Dianópolis exista um senso comunitário de responsabilida-
de socioambiental. A exceção fica por conta daqueles que perceberam que po-

p  
64 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
dem obter lucros pelo uso turístico das áreas naturais, e que portanto, possuem
interesse direto no desenvolvimento do turismo.
Talvez a postura da população local seja bem representada pelo poder públi-
co, o qual demonstra um certo descaso com a conservação do ambiente,
desconsiderando sistematicamente os impactos que poderão ser gerados pela
construção de duas UHEs no Rio Palmeiras. O Rio é uma área de grande importân-
cia em função dos remanescentes florestais e da existência de cavernas relevan-
tes para fins de conservação na área de influência dos lagos que seriam forma-
dos com as barragens. O Rio Palmeiras também é possuidor de grande
potencialidade para o desenvolvimento do rafting em um nível superior ± em
termos de dificuldade, qualidade do produto e de aventura ± em relação ao Rio
Manoel Alves. Mas ao que foi percebido, o poder públic o local está convencido
de que as perdas seriam pequenas, em função dos benefícios que a construção
das UHEs poderiam gerar, sobretudo no tocante à geração de empregos durante
a fase de construção. Cabe ressaltar que tais empregos tendem a ser sazonais e
temporários e de baixa especialização. Embora esse quadro possa se repetir no
turismo, o fator agravante para as UHEs é o consumo direto e imediato de parte
dos recursos naturais envolvidos em sua produção. O turismo de natureza, o
ecoturismo e o turismo de aventura, se planejados e trabalhados de forma res-
ponsável, atuam sob uma perspectiva diferente, pois precisam dos recursos na-
turais em avançado estágio de conservação para existir.
RIO PALMEIRAS: TURISMO COMO ALTERNATIVA PARA A CONSERVAÇÃO
Apesar da preocupação com o uso responsável da natureza da operadora
Stella Tur ser visível, e de se tratar de uma boa iniciativa, isto na verdade apre-
senta uma falha na sustentabilidade ambiental do turismo em Dianópolis. Deve-
se considerar que as opiniões das pessoas sempre estão sujeitas a mudanças.
Nesse sentido, uma primeira proposição seria a criação de políticas públicas
locais e mecanismos mercadológicos que propusessem o uso responsável dos
recursos naturais de forma institucionalizada ± tanto pelo poder público local
quanto pela iniciativa privada.
Em seguida, propõe-se alternativas de uso sustentável a pelo menos um dos
atrativos pesquisados: o Rio Palmeiras. As propostas sugerem uma nova ativida-
de, dentro do segmento de ecoturismo e do turismo de aventura, assim como
ações ou medidas para estruturação do atrativo, segurança do visitante, medi-
das de conservação dos recursos naturais e medidas para fomentar os benefícios
sócio-econômicos da atividade turística na região. A justificativa para a seleção
do Rio Palmeiras para a presente proposição se dá por diversos motivos, como a
importância do ecossistema local (o Rio Palmeiras é afluente dos rios Palmas e
Tocantins); as ameaças representadas pela atividade de geração de energia elé-
trica ao rio e seu entorno; a rentabilidade econômica do rafting; a existência de

p  
Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 65
recursos locais (materiais e humanos) habilitados; e a existência de demanda
efetiva e potencial.
O rio está sendo usado para a produção de energia elétrica, com duas usinas
em funcionamento e projeto de implantação de mais três, que já estão em fase de
início de construção. Os projetos dessas usinas prevêem que o reservatório de
cada uma alcançará a barragem de outra, transformando o rio em vários lagos,
conforme informações prestadas em Plenária realizada na Câmara Municipal.
Contudo, não há na prefeitura nenhum documento a respeito dessas constru-
ções, bem como não foi feito o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de
Impacto Ambiental (EIA/RIMA). Esses documentos são obrigatórios por lei para a
construção desse tipo de empreendimento e, se foram elaborados, não estão
disponíveis nem ao poder público local nem à comunidade, conforme observado
in loco. A implantação das novas usinas acarretará no alagamento do trecho
superior do rio, submergindo completamente cavernas localizadas no vale, além
de cachoeiras e corredeiras notificadas como classe V pela CBCA ± Confedera-
ção Brasileira de Canoagem. Essa classificação é a medida internacional de
canoagem e tem uma escala de I à VI, considerando nível VI como impossível
para navegação. Esse trecho do rio foi classificado como nível máximo de difi-
culdade para a comercialização de atividades de canoagem. Cabe ressaltar tam-
bém o alagamento de vegetação nativa, de habitats de pássaros, mamíferos,
répteis, insetos, além dos canyons cársticos e de uma paisagem por vezes única.
A alternativa de uso para esse espaço natural, ainda em alto grau de conserva-
ção, é a implantação de atividade de turismo de aventura, mais especificamente
o rafting. Devido à localização das usinas já existentes, propõe-se dois trechos
de rafting: um superior e um inferior, com diferentes níveis de dificuldade. O
trecho inferior é de classe IV e não tem trechos com canyons, com o percurso de
cima sendo um produto um pouco mais fácil para operar e vender por ser menos
técnico, portanto, mais adequado à navegação com clientes.
Seriam, desta forma, produtos diferentes com características diferentes, toda-
via, formatados para o mesmo perfil de turista, que é caracterizado, segundo
Swarbrooke (2003, p.7), como o tipo de turista que busca as seguintes sensa-
ções: emoção, adrenalina, medo, desafio, novidade, risco, conquista, audácia e
superação. A proposta de implantação de rafting nesses dois trechos do rio
conta com subsídios técnicos e de equipamentos já existentes na operadora
Stella Tour. Além disso, sugere-se tomar algumas medidas para a efetivação da
proposta de troca de atividade econômica para o Rio Palmeiras:
‡ Parceria com poder público de Dianópolis e Novo Jardim para mediar as
negociações entre a organização e as propriedades privadas que detêm as
vias de acesso existentes;

p 
66 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
‡ Contrato entre a empresa operadora (Stella Tour), as propriedades detentoras
das vias de acesso e o poder público com intuito de organizar a atividade
turística. Recolhimento de taxa de visitação e de impostos de forma a garan-
tir um retorno no que se refere a melhorias, estruturação e manutenção das
vias de acesso e locais de entrada e saída de botes e visitantes;
‡ O cumprimento da legislação ambiental nacional que exige a elaboração e
aprovação de EIA/RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impac-
to Ambiental) para empreendimentos em ambientes naturais. Conforme o
Conselho Municipal de Turismo de Dianópolis não há registro destes docu-
mentos nem da aprovação dos mesmos para o início da construção das três
novas usinas hidrelétricas no rio Palmeiras;
‡ Qualificação da mão de obra local para trabalhar como instrutores de rafting,
motorista, fotógrafo e segurança; e
‡ Campanha publicitária.
A construção de duas das três novas Usinas Hidrelétricas no Rio Palmeiras
consumirão, apenas para a construção, um investimento de aproximadamente
trinta e seis milhões de reais cada12. De acordo com o projeto, as UHEs terão vida
útil de aproximadamente trinta anos. Isto da uma média de degradação de um
milhão e duzentos mil reais por ano, sem contar os investimentos em manuten-
ção dessas Usinas durante o período. Após trinta anos, elas serão desativadas ou
entregues à administração do poder público, o qual terá que arcar com despesas
de mais dois empreendimentos sucateados.
Paralelo a isso, não há, atualmente, pesquisas quantitativas nem qualitativas
que tenham como objeto de estudo a demanda turística efetiva de Dianópolis.
Tal fato impossibilita, por vezes, o cálculo do retorno financeiro da proposta do
produto Rio Palmeiras. Porém e, conforme a observação durante o período de
pesquisas de campo, a demanda efetiva tem grande interesse em consumir o
produto em questão. Há também considerável demanda potencial através de
³demanda orientada´ por uma agência de viagens e turismo de Palmas, parceira
da Stella Tour assim como demanda do próprio município e de turistas que estão
em Dianópolis por diversas finalidades.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como observado nesse trabalho, a riqueza e diversidade dos espaços naturais
da região cárstica de Dianópolis fazem desse município um pólo receptivo po-
tencial para o ecoturismo e o turismo de aventura. Essa potencialidade turística
está além das fronteiras nacionais, dado o grau de conservação desses recursos
p 

Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 67


naturais, suas paisagens e características propícias às atividades propostas. Des-
taca-se também a importância dos espaços naturais de Dianópolis para a con-
servação do bioma Cerrado, de sua biodiversidade, dos recursos espeleológicos
do país e, também, para a conservação de importantes bacias hidrográficas
como São Francisco, Parnaíba e Tocantins.
Porém, o conceito local de desenvolvimento é baseado em atividades extrativistas
como a agropecuária, a mineração e a geração de energia hidrelétrica. Essas ativida-
des, por vezes, acabam degradando e ameaçando os recursos naturais da região.
Esse é um fator limitante para o desenvolvimento da atividade turística atual uma vez
que a legislação ambiental federal não está sendo integralmente cumprida.
Concomitantemente, a região está passando por uma fase decisiva quanto ao
rumo do desenvolvimento sócio-econômico ambiental. É uma fase de transição
de paradigmas de desenvolvimento na qual a sustentabilidade ambiental, social,
cultural e econômica estão emergindo como novas alternativas de uso dos
espaços naturais. Espera-se que a organização Stella Tour possa se tornar um
referencial para as demais empresas que venham a trabalhar com o turismo em
Dianópolis, a partir operacionalização das propostas ora apresentadas ³loco-
motiva´ o atrativo principal de uma atividade turística organizada, baseada nos
conceitos de ecoturismo e turismo de aventura, e comprometida com a conser-
vação dos espaços naturais locais.
Assim, espera-se que as alternativas de uso propostas nesse trabalho possam
gerar oportunidades de renda e benefícios sócio-econômicos para a comunida-
de local durante um período maior do que o habitual que, atualmente, são os
meses de construção de usinas hidrelétricas. Além disso, espera-se que a distri-
buição dessa renda gerada seja mais justa e de base local.
A comercialização dos produtos propostos dará a oportunidade de formatação
e venda de produtos secundários, aumentando o tempo de permanência e o
gasto médio do turista na região de Dianópolis, visto que há muitas áreas natu-
rais e atrativos potenciais que podem ser explorados. Este fato fomenta a con-
servação de ecossistemas e amplia a abrangência dos benefícios do turismo.
São, portanto, propostas de implantação de atividades que poderão ser, num
futuro próximo, o passo inicial para a projeção da região do município de
Dianópolis como um pólo receptivo de nível internacional do estado do Tocantins,
como prevê o Programa Nacional de Regionalização do Turismo.
Por fim, o trabalho mostra que o turismo, para vir a ser sustentável, depende a
princípio da conservação da natureza. Mostra também que as propostas realiza-
das possibilitarão uma variedade de atividades turísticas possíveis de serem traba-
lhadas, desde que conservados os espaços naturais da região cárstica de Dianópolis.
[As referências bibliográficas desta contribuição podem ser consultadas na fonte
original]

p 
68 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Notas
13 O presente capítulo resulta da adaptação de um Trabalho de Conclusão do curso de
Turismo com ênfase em
ambientes naturais da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, Dourados ± 2005,
sob o título original
³O Ecoturismo e o Turismo de Aventura como Alternativas de Uso dos Espaços
Naturais da Região Cárstica de
Dianópolis ± TO´.
2 O carste pode ser definido como uma paisagem que apresenta formação predominante
por processos de
dissolução e abatimento (KOHLER, 2003), e onde a drenagem é sobretudo subterrânea
(LINO, 2001).
3 Global Positioning System.
4 Centro Nacional de Estudo, Proteção e Manejo de Cavernas/Mato Grosso do Sul.
5 Caminhadas: passeios a pé de baixo grau de dificuldade; Espeleoturismo: turismo em
cavernas; Flutuação:
atividade aquática com o uso somente de máscara e snorkel; Ornitologia: dentro do
turismo é a observação
específica de pássaros; Trekking: caminhadas mais longas, com grau de dificuldade
mais avançado; Canyoning:
quaisquer atividades praticadas em canyons; Práticas verticais: técnicas verticais como
rapel e escalada; Caval-
gada: passeio a cavalo; Rafting: descida de rios com uso de botes infláveis.
6 Corredores Ecológicos são porções de ecossistemas naturais ou semi-naturais, ligando
unidades de conser-
vação, que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando
a dispersão de espécies
e a recolonização de áreas degradadas, bem como a manutenção de populações que
demandam para sua
sobrevivência áreas com extensão maior do que aquela das unidades individuais.
(SNUC ± Sistema Nacional de
Unidades de Conservação, Capítulo I, Parágrafo XIX).
7 Estação Ecológica Serra Geral (divisa TO/BA); Parque Nacional Nascentes do
Parnaíba (PI/MA/TO/BA); APAs
Serra da Tabatinga e do Jalapão (TO), e; Parque Estadual do Jalapão (TO).
8 O termo é aqui empregado de forma genérica, englobando tanto as cavidades naturais
horizontais (como as
cavernas, grutas, lapas etc) e verticais (como os abismos e furnas), ressaltando que as
diferentes nomencla-
turas aqui apresentadas não apresentam base científica para sua distinção, tratando-se
apenas de nomes
regionais. Para maiores informações consultar a Resolução CONAMA 347/2004
(CONAMA, 2004) e o docu-
mento Normas e Convenções Espeleométricas (SBE, s.d.).
9 Os travertinos são micro represas formadas pelo acúmulo de calcário durante o
escoamento de água em
cavernas (SCALEANTE, 1998). No caso da Ponte de Pedra, apesar de não aparentar, a
formação é uma caverna,
propícia a formação de travertinos e outros espeleotemas.
10 Categoria de Unidade de Conservação prevista no artigo 14 do SNUC.
11 Destacam-se nesse grupo algumas pessoas que foram capacitadas pela operadora
Stella Tur para trabalhar no
serviço de condução de visitantes e artesãos, que percebem que os turistas são grandes
consumidores de seus
produtos, sobretudo do famoso artesanato em capim dourado do Jalapão.
12 Segundo informações prestadas pena CNBO - Produtora de Energia Elétrica Ltda em
Plenária realizada dia 28
de Julho de 2005 na Câmara Municipal de Dianópolis.

p 
Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.
›   
      
. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
Formato da contribuição: texto resumido
Fonte: Este texto é parte da dissertação de mestrado intitulada Mergulho ³livre´:
desvelando emoções e sensações (FREIRE, 2005), defendida no Programa de
Pós-graduação em Ciências da Motricidade, na UNESP ± Campus de Rio Claro,
em (2005).
E-mail do(s) autor(es): mariliafr@terra.com.br;shwartz@rc.unesp.br
Títulos acadêmicos principais atuais: Marilia Freire - Mestre em Ciências da
Motricidade Humana/UNESP de Rio Claro; Gisele Schwartz - Doutora em
Psicologia da Educação e do Desenvolvimento Humano pelo IPUSP, Professora
Livre Docente nos cursos de graduação em Educação Física e pós-graduação
em Ciências na UNESP ± Rio Claro ± SP; Coordenadora do Laboratório de Estudos
do Lazer ± LEL - DEF/IB/UNESP
Ano: 2005
Publicação original: dissertação
Atividade de Aventura e Mergulho
Autônomo: Desvelando Emoções e
Sensações no Âmbito do Lazer
Marilia Freire
Gisele Schwartz
.................
o desejo, muitas vezes expresso,
de fusão e harmonia
com os elementos da natureza
(providencial e ameaçadora,
pode ser assimilado ao mito
de um paraíso perdido,
que, no espaço de um instante,
se tem o prazer de reencontrar.
.................
(POCIELLO, 1995, p. 118)
O lazer como palco das grandes transformações históricas é um fenômeno
que tem acompanhado o crescimento tecnológico e conceituá-lo significa
analisá-lo dentro deste contexto social, levantando as concepções presentes na
sociedade.

p 

70 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
De acordo com os diferentes momentos históricos, o lazer se apresenta retra-
tado de forma peculiar e específica, porém, suas mudanças não são fixas num
dado período da história, mesmo porque, as mudanças não ocorrem de forma
linear, elas são dinâmicas, imprevisíveis e inacabadas. Segundo Bruhns (1993), os
três grandes momentos históricos em que o lazer se desenvolveu foram os
períodos pré-industrial, o industrial e o pós-industrial.
O lazer, no período pré-industrial, era concebido como um conhecimento de
direito pertencente à classe mais elevada, tido como mais culta e intelectual. No
entanto, o mesmo podia ser observado entre a classe inferior, sendo vivenciado
por meio de eventos sociais, como festas, comemorações familiares e jogo,
mesmo que para esta classe fosse reservado o trabalho mais árduo, útil e produ-
tivo e à outra, a contemplação do belo, o espírito da criação, o exercício da
reflexão e a condição do ócio.
Com o advento do cristianismo, as atividades com caráter de diversão, con-
tentamento e prazer, as festas e jogos de todos os tipos eram tidos como impró-
prios e pecaminosos, favorecendo a impureza da alma. A reforma protestante
veio como uma crítica ao cristianismo, respaldada pela ideologia Renascentista,
possibilitando atribuir novos olhares para o lazer e para a educação e ampliando
o acesso a esses setores para a classe trabalhadora, o que antes era privilégio
restrito da classe elitizada.
O incentivo do aumento do capitalismo produtivo surge com a Revolução
Industrial, por necessidade de maior produção têxtil e metalúrgica. Segundo
Thompson (1998), com o surgimento do relógio, na era industrial, o tempo pas-
sou a ser cronometrado e as formas de vivência do lazer das pessoas também
sofreram grandes influências naquele período.
As atividades no âmbito do lazer deixaram de ter caráter livre e espontâneo e
adquiriram um caráter de tempo restado, ou seja, as horas vivenciadas no lazer
eram estipuladas dentro de um tempo fechado, tendo hora para começar e hora
para terminar. A concepção de lazer na sociedade industrial era pautada na
crença de atividade não séria, sem fins lucrativos, sem utilidade e não produtiva,
o que desvalorizava estas atividades em detrimento de outras de igual direito.
Na sociedade industrial, as atividades profissionais, os afazeres domésticos,
as pessoas e, até mesmo, as atividades no contexto do lazer, vivenciadas no
espaço urbano, já não satisfazem mais as expectativas de pessoas preocupadas
em ampliar os níveis qualitativos da existência, procurando formas de se distan-
ciarem do sistema seqüencial e monótono dos ponteiros de um relógio, que
marcam uma rotina, muitas vezes, carente de afetividade, de profundidade e de
intensidade nas relações humanas.

p 

Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 71
Conseqüentemente, com a Revolução Francesa, veio a primeira grande quebra da
Revolução Industrial, que prioriza a igualdade, liberdade e fraternidade, mostrando
que a Europa era um mundo e não o mundo, explicando uma outra lógica que não era
apenas racional, vinda para condenar o luxo, o desperdício científico e o lazer.
Mas, pouco a pouco, o lazer é reivindicado pelos trabalhadores, como forma
de contraposição às atividades produtivas e alienantes, minimizando a opressão
sofrida por determinados setores, ocasionando a separação entre atividade pro-
dutiva e não-produtiva, o que, de certa forma, separa lazer de trabalho, estando
a submissão atrelada ao trabalho e a realização humana atrelada ao lazer, im-
possibilitando que ambos estivessem num mesmo contexto de tempo e espaço.
Embora a realização humana fosse possível somente na esfera do lazer, exis-
tia a intenção dos seres humanos em viver integralmente livres, autônomos e
com maior poder de decisão sobre suas próprias vidas em todos os quadrantes
da sociedade. Essa necessidade de mudança sociocultural e histórica dos traba-
lhadores em relação à vida social, tanto no lazer como também na educação, foi
o motivo que levou a sociedade moderna a repensar os valores e sentidos atri-
buídos aos aspectos mais relevantes da vida.
O lazer também é influenciado por esse momento e toma outra perspectiva,
tendo em vista que, conforme evidenciou Csikszentmihalyi (1992), se as institui-
ções sociais são irracionais e não colaboram para a melhoria da qualidade de
vida, deve-se buscar a autonomia e investir no controle sobre as próprias ações,
encontrando alegria e propósito, independente de circunstâncias externas, ten-
do-se como opção a busca por novos sentidos.
Sendo assim, é possível construir novas significações culturais, a partir do ator
social, ampliando a visão de cultura costumeiramente preestabelecida, tentando
superar a visão globalizada de cultura constituída por meio dos sistemas de
organização da sociedade, divulgados pelos meios de comunicação de massa e
impostos pelos interesses dominantes, onde as manifestações geradas pelas
vivências no âmbito do lazer possam representar uma outra perspectiva em
relação ao cotidiano, conforme evidencia Krippendorf (1989), porque esta pos-
sibilidade está em cada um dos seres humanos e não apenas no sistema
organizacional como um todo.
Como representante atual destes momentos fortuitos relacionados ao âmbito
do lazer, uma parte significativa diz respeito à crescente procura por viagens
turísticas, cujos fatores de aderência são denominados por Krippendorf (1989)
de anticotidiano, estando uma grande parcela do público da sociedade moderna
envolvida nesse universo, sem alguma necessidade a priori, como fazer novas
amizades ou conhecer novas culturas, mas, especialmente, para encontrar-se
consigo mesmo, revigorando, revitalizando e experimentando a liberdade e a
felicidade.

p 

72 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Na sociedade moderna, com a tecnologia e o mundo da globalização adentrando
e moldando os valores, atitudes, comportamentos e estilos de vida dos seres
humanos, a visita do corpo à natureza como oportunidade de mergulhar nela de
uma maneira normalmente não possível no meio ambiente urbano, como o rela-
cionamento com os recursos naturais representados por rios, lagos, mares e
cachoeiras, não são mais sensibilidades priorizadas. Embora estas possibilidades
não estejam ao alcance fácil de todos, não é motivo para que a mesma não possa
ocorrer, pois se trata de uma questão de insensibilidade geral da população.1
Não se mergulha mais nos rios e se brinca livremente em cachoeiras como se
fazia antigamente, onde havia a preocupação com a sensibilidade, com o saber
incorporado, apreendido por meio das experiências vividas pelo corpo, numa
dimensão humana, onde o processo criativo podia acontecer de forma que
extrapolava o simples fazer, que implicava nas sensações e emoções que o
corpo pudesse experimentar.
Percebe-se, atualmente, a reflexão da crise da modernidade quando se liga a
televisão e se assiste a programas destinados à prática de atividades físicas na
natureza com ênfase na competitividade, como as competições por equipes
realizadas em diversos lugares do mundo, denominadas de multicompetições ou
raids de aventura,2 em busca de intensas emoções e sensações fortes nos finais
de semana, sem, contudo, valorizar a natureza em seu contexto. O mesmo acon-
tece quando se lê artigos ou capítulos de livros sobre o turismo de aventura,
destinados a oferecer atividades rentáveis e atender a uma grande parcela da
população social.
No que se refere às crianças e o contato com o mar, atualmente, com o
crescimento urbano-industrial, com a televisão, com a tecnologia, com a falta
de segurança e com os brinquedos eletrônicos, elas são, cada vez mais, impos-
sibilitadas de vivenciar esse espaço, como faziam antigamente, mas, quando isto
se torna um desejo, os pais procuram formas alternativas, como as academias e
escolas de natação, em função da dificuldade cotidiana para a aproximação com
os ambientes mais naturais, envolvendo o difícil deslocamento, fator financeiro
e tempo reduzido para as atividades no contexto do lazer.
Estas mudanças fazem parte desse quadro histórico social pelo qual passam as
academias e escolas de natação, caracterizado pela aceleração tecnológica e
outras transformações culturais relacionadas à cultura de massa, nas quais os
indivíduos estão inseridos atualmente.
Mergulhar em piscina de academias, clubes e escolas de natação é uma forma
artificial e simulada de recorrer ao desejo de contato com a água, perdendo, com
isso, muitas experiências lúdicas, de estímulos, quando comparadas às ativida-
des de aventura relacionadas à natureza, as quais proporcionam um caráter de
incerteza, de risco controlado e liberdade, acrescentados a este ambiente natu-

p 

Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 73
ral, facilitando o desenvolvimento maior dos mecanismos perceptivos e de no-
vas emoções.
Hoje, por não ser possível entrar em contato diário com o ambiente natural e
tudo o que ele proporciona, o que se observa é uma tendência à sociedade do
simulacro, em que as atividades desenvolvidas neste local ³artificial´, no caso a
piscina, tornou-se uma das alternativas para minimizar essa distância estabelecida
entre o corpo do homem e o ambiente natural, o contato com a água, a possibi-
lidade do risco, do inesperado, das emoções, da aventura e das coisas que estão
por vir, bem como, a vivência da experiência imensurável que o diálogo com ela
proporciona e representa.
Há vários exemplos de possibilidades de experiências no contexto do lazer, que
podem favorecer o convívio do homem com o meio ambiente natural, com as
quais o ser humano tem buscado uma aproximação mais concreta, tendo como
fatores motivacionais, tanto o modismo, apregoado pela passagem de valores
sociais, quanto um apelo mais sensível, em busca de melhorar a qualidade de vida,
prevalecendo o interesse, ainda, centrado em si mesmo, no entanto, com uma
perspectiva ainda que sutil, de uma reflexão acerca das idéias preservacionistas,
necessitando, com isso, adotar novas regras e valores. Este quadro sinaliza a
importância de refletir sobre a época em que a sociedade vive, sobre o embotamento
das emoções e a deseducação dos sentidos e da necessidade de mudança em
relação à ressignificação da gama de possibilidades de sensibilidades e expressões
estabelecidas no contato do ser humano com o mundo.
Diante de todas estas questões da atualidade e do corpo dividido, moldado e
engessado em suas sensações e emoções mais livres e espontâneas, o ser huma-
no tenta ressignificar seu papel no mundo, procurando atividades que possam vir
ao encontro de novas reestruturações sociais diante do processo de globalização.
Para isto, uma das necessidades prementes é a reflexão sobre a possibilidade de
a natureza ser tomada, não mais como algo que se tivesse que dominar, ou como
adversária a ser vencida, mas sim, como parceira de novas sensações e emoções
(MARINHO, 2001; BRUHNS, 2003).
ATIVIDADES DE AVENTURA
Neste sentido, um novo estilo de vivência do lazer tem acompanhado estas
tendências de transformações sociais, surgindo o crescimento intenso das ativi-
dades físicas de aventura na natureza (AFAN), termo cunhado por Betrán (1995).
As AFAN são representantes das expectativas desta sociedade atual em relação
aos novos estilos do lazer, que, por meio da tecnologia, possibilitou, por exem-
plo, a visita a lugares nunca antes explorados, ou, a vivências de sensações e
emoções novas.

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74 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Estas atividades são práticas que não são novas em existência, mas que ganha-
ram formas atualizadas, em função do avanço tecnológico, dos modismos ou de
sua sistematização no contexto do lazer, reunindo diferentes denominações e
significados. Independente dessas variações e diferenciação de conceito, uma vez
que são também denominadas como esportes radicais, esportes de aventura, es-
portes na natureza, atividade na natureza, entre outras formas, existe um ponto
convergente entre elas: são expressões de um grupo social, que, de alguma forma,
por meio delas, tenta complementar, mudar ou transformar o modo de vida, procu-
rando um novo sentido para suas experiências diárias, embora, muitas vezes, essas
condutas sejam inconscientes e direcionadas, apenas, a mudar a rotina.
Marinho (2003) entende as AFAN como atividades manifestadas privilegiada-
mente nos momentos destinados ao lazer, nas quais a experimentação ocorre
por meio de um contato mais íntimo com o meio ambiente, com características
diferentes das encontradas nos esportes tradicionais, tendo a presença de equi-
pamentos tecnológicos e favorecendo maior fluidez entre o ser humano e o
espaço da prática.
Bruhns (2000) posiciona as AFAN como atividades de aventura vinculadas às
viagens à natureza, envolvendo valores simbólicos e estéticos, com o meio natu-
ral, associados à busca por emoções e riscos, revelando uma relação de incerteza,
de improvisação e de não-linearidade entre o praticante e essas práticas.
Betrán (1995) defini as AFAN como atividades sistematizadas, as quais viabilizam
experiências capazes de auxiliar os praticantes a superarem o embotamento das
emoções mais significativas, que são canalizadas, muitas vezes, para elementos
negativos, como a violência exacerbada, a falta de compreensão e paciência em
situações corriqueiras, como também, propiciam a busca de melhores opções de
vivências, estabelecendo uma nova relação do homem com o ambiente, trazen-
do possíveis ressonâncias positivas para outros contextos, inclusive para o âm-
bito do trabalho.
O conceito de Atividades de Aventura na Natureza (AFAN), proposto por Betrán
(1995), sugere um avanço, diferenciando dos esportes radicais, pelo fato de que
estes são voltados, apenas, a estimular a competição, necessitando, por exem-
plo, de determinado nível de força muscular para sua prática, já as AFAN não
exigem treinamento prévio específico para sua experimentação, tendo caracte-
rísticas peculiares e podendo acontecer na água, na terra e no ar.
Schwartz (2002) vai além, identificando as atividades de Aventura como ativi-
dades físicas as quais permitem que o homem se aproxime dele próprio e do meio
ambiente natural, de maneira mais consistente e permeada por sensações que
transpassam a simples atividade no contexto do lazer, promovendo, inclusive,
estilos de vida diferenciados.

p 

Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 75
Para conduzir as reflexões sobre esta temática, este capítulo não pretende
fechar em um único conceito, com o objetivo de ampliar a visão sobre as Ativi-
dades Físicas de Aventura na Natureza em todas as suas dimensões, valorizando,
acima de tudo, a livre escolha e o sentimento vivenciado pela prática dessas
atividades.
Entre as diversas possibilidades atuais destas vivências, este estudo tenta pene-
trar no silêncio do mundo submarino, por meio do mergulho, atividade que muitas
pessoas têm procurado, sendo difundida no mundo todo, uma prática que tem se
tornado indispensável a certos trabalhos técnicos e acadêmicos, uma vez que, por
suas características de proporcionar diferentes sensações e emoções provenien-
tes do contato com lugares nunca visitados e com um meio diferenciado - a água
± o mergulho pode fornecer experiências bastante significativas, com ressonânci-
as, inclusive, em outras esferas fora do lazer, como no trabalho e na vida social e
pessoal, fundamentando mudanças axiológicas de concepção sobre a importância
do lazer como um aspecto determinante da qualidade de vida.
O MUNDO DO SILÊNCIO
Não foi por acaso que Jacques Cousteau (1983) deu o nome ao seu livro de ³O
mundo do silêncio´, pois a 10 m de profundidade da superfície do oceano os sons
do fundo do mar são típicos, podendo-se ouvir ruídos de motor de barcos ou
navios, muito distantes, o que torna difícil sua distinção.
O fato de se distinguir sons no fundo do mar é uma dificuldade que comparece
pela exigência da modernidade, que cobra pela codificação e interpretação,
onde todas as ³coisas´ têm que ser nomeadas, classificadas e ordenadas.
Conforme enfatiza Sant¶Anna (2001, p. 115), ³[...] que o silêncio não seja com-
preendido unicamente como a falta da linguagem, e sim como a presença de sons
que não conseguimos ouvir´, ou nem sempre se consegue distinguir.
Descobrir as peculiaridades do fundo do mar, não é um fato recente, remonta
desde os primórdios das civilizações antigas, por volta de 2.250 a.C.
HISTÓRIA DO MERGULHO
Culturas antigas já mergulhavam, por meio da prática do mergulho livre, a fim
de combater com os animais marinhos, de buscar alimentação e de procurar
tesouros no fundo do mar (BEEBE, 1934). No entanto, é difícil precisar quando
surgiu o mergulho, porém, por meio de registros em gravuras, é possível observar
guerreiros assírios nadando sob o mar, segurando sacos de couro, que provavel-

p 

76 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
mente, cheios de ar, ajudavam os homens a submergirem e a respirarem embaixo
d¶ água, através do ar contido dentro desses sacos.
Com o objetivo de alcançar maior profundidade, outros meios também foram
utilizados para permanecer por mais tempo embaixo da água, como a cana oca
usada como se fosse um tubo. Mas, até 1800 poucas foram as mudanças e
invenções em relação aos equipamentos utilizados com o intuito de mergulhar
mais fundo e por um período de tempo mais longo.
Entre 1800 e 1900 várias idéias foram desenvolvidas para que o mergulhador
recebesse ar nas profundezas, desde foles, bombas manuais e válvula de escape
acoplados nas costas dos mergulhadores, que enviavam ar para um capacete de
metal e sapatos de chumbo para manter os escafandristas por mais tempo no
fundo do mar até SCUBA (Self-Contained Underwater Breating Apparatus), regu-
lador de ar, primeiramente inventado para circuito aberto e depois para circuito
fechado. Juntamente com a conquista de maior profundidade e maior tempo
embaixo da água, surgiram, também, problemas fisiológicos gerados pelos efei-
tos da pressão, os quais foram minimizados depois, com os estudos dos
fisiologistas Bert e Haldame (1878).
Nos anos 40, cresce a possibilidade de buscar um contato mais prolongado
com os animais marinhos, com a invenção do aqua-lung, equipamento com
cilindro de alta pressão utilizado em circuito aberto, criado por Costeau e Gagman.
Desde o início da história, o mergulho tem sido utilizado para ações militares,
embora muitas outras pessoas tenham se valido dessa prática para descobrir o
mundo que existe sob as águas.
Mesmo Jacques Cousteau, com toda sua sensibilidade e sabedoria, enfrentava uma
dicotomia, porque, contemplando o fundo do mar e se sentindo unido a esta natureza3,
ele possuía em si uma vontade de pesquisar os animais marinhos e equipamentos que
pudessem levar o homem a descobrir as riquezas subaquáticas. Tais fatos refletem o
desconforto gerado pelo avanço da ciência e da tecnologia, podendo servir tanto para
o bem como para o mal, no caso de usar essa tecnologia para explorar os animais e o
fundo do mar, com a intenção de manipulação ou obter o controle sobre estes.
O homem possui tecnologia e habilidade para conquistar e controlar o fundo
do mar, no entanto, seu comportamento diante do mar é ainda primitivo, pois
age como caçador e não como cultivador da flora e da fauna marinhas.
Atualmente, o mergulho é o principal meio de contato entre o homem e o
fundo do mar e pode ser dividido em duas categorias: livre e autônomo, cuja
diferença principal está na utilização do equipamento denominado Scuba, que
significa o tanque de ar.

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 77


Tanto o mergulho livre como o autônomo permitem aos seus adeptos obser-
var as paisagens marinhas tão bem quanto um peixe, o que pode gerar manifes-
tações, sensações e emoções diferentes para cada indivíduo, proporcionando
ao ser humano um contato consigo mesmo e com o meio ambiente.
TIPOS DE MERGULHO
Uma das formas de vivência do mergulho é feita em apnéia, denominada de
mergulho livre ou snorkeling, feito quando o praticante utiliza máscara, snorkel
e nadadeira e prende voluntariamente a respiração nos pulmões sem a utilização
de equipamentos, podendo se manter por mais tempo embaixo d¶ água, confor-
me o volume de ar inspirado.
A duração do mergulho em apnéia pode variar dependendo dos exercícios
respiratórios de hiperventilação feitos antes da imersão, pelo fato de aumentar
a taxa de oxigênio nos tecidos e no sangue. A uma certa profundidade, o mergu-
lhador pode sentir fortes dores nos ouvidos e, até mesmo, ocorrer uma perfura-
ção do tímpano, devido à pressão da água, o que se torna obrigatório fazer uma
manobra de compensação (equalização), que consiste em pinçar (fechar) as
narinas, expirando e comprimindo o ar, como quando se assoa o nariz, ou fazen-
do voluntariamente a deglutição parcial da saliva, ou ainda, deslocando a man-
díbula para os lados.
Caso o mergulhador não respeite seus limites e capacidades respiratórias e
venha a exceder, ficando por mais tempo do que o sistema cárdio-circulatório
permite, pode ocorrer uma síncope, devido ao aumento do trabalho cardíaco,
mais exigido em ambiente pobre em oxigênio e queda na temperatura corporal,
já que a perda de calor do corpo embaixo d¶água é maior.
Embora exista o caráter competitivo no mergulho, quando se associa o mer-
gulho à caça submarino ou aos campeonatos de mergulho em apnéia, pode-se
notar seu fator cooperativista, o qual pode ser observado quando se recomenda,
e de certa forma é obrigatório a um mergulhador, mesmo que experiente, mergu-
lhar na companhia de outro mergulhador, que poderá prestar-lhe socorro, se
necessário, o que, sem dúvida, desperta o espírito coletivo e a formação de
equipe. Dentro da modalidade do mergulho livre, existe a possibilidade de se
mergulhar em oceano ou em caverna, o que permite vivenciar emoções e
interações inusitadas com a natureza.
Um outro tipo de mergulho, feito com respiração autônoma, é chamado de
mergulho autônomo ou SCUBA, praticado com aparelho que possibilita ao mer-
gulhador permanecer por mais tempo sob a água. Este aparelho é constituído por
uma garrafa de ar comprimido, que é levada junto com o mergulhador, permitin-
do fornecer oxigênio durante sua permanência subaquática.

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78 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Por motivos de segurança, torna-se necessário a quem deseja praticar este
tipo de mergulho um treinamento prévio especializado, com monitores capaci-
tados e experientes, para se aprender a controlar a quantidade de gás absorvido
embaixo da água e as diversas manobras de descompressão - vinculadas à pro-
fundidade que o praticante mergulha, evitando riscos de intoxicação gasosa.
Diante de todas as dificuldades, riscos, ansiedade e preocupações, existe a
fascinação e paixão vivenciadas quando o ser humano mergulha no mundo subma-
rino, sendo breves instantes ³roubados´ de um universo, ao qual o homem não
pertence, que permitem ao mergulhador momentos de intensa alegria e emoção.
Desta forma, algumas considerações se tornam pertinentes em relação aos
significados e mudanças ocorridas no organismo diante das sensações e emo-
ções experimentadas pelo ser humano, inclusive quando se evidencia a experi-
ência como o mergulho.
AS EMOÇÕES DO MERGULHAR
O mergulho autônomo é considerado neste estudo como uma atividade de
aventura no âmbito do lazer, dentre as inúmeras outras possibilidades que pos-
sam existir de atividade física de aventura na natureza (AFAN).
Para a prática do mergulho é necessário, na maioria das vezes, se deslocar do
seu local de moradia e viajar para uma cidade praiana, onde existam bons pontos
de mergulho, como foi o caso desse estudo, que foi desenvolvido na cidade
praiana de Ubatuba/SP.
A pesquisa de Freire (2005) objetivou investigar as sensações e emoções que
permeiam os praticantes de mergulho autônomo, atividade física de aventura na
natureza, no âmbito do lazer. A metodologia utilizada foi composta de revisão
de literatura combinada com pesquisa exploratória, utilizando-se como instru-
mento para coleta dos dados uma entrevista semi-estruturada.
A amostra selecionada para estudo constou de 30 participantes, de ambos os
sexos e faixa etária entre 29 e 40 anos, praticantes regulares de mergulho, há
mais de 1 ano. Os dados coletados foram analisados descritivamente, por meio
da técnica de Análise de Conteúdo Temático, conforme evidenciam Richardson
(1989) e Bardin (1977).
A pesquisa contou, em grande maioria, com mergulhadores do sul do Brasil, que se
deslocaram de Curitiba/PR, a fim de encontrar melhor visibilidade de água, diversida-
de marinha, melhor qualidade de embarcação e condições de hospedagem, em detri-
mento das existentes em sua região, conforme relatados por alguns participantes.

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 79
Existem motivos outros que justificam esse deslocamento, que vão além dos
aspectos físicos da região, mas, incluem a necessidade de busca, de contato, de
admiração pelas belezas da vida submarina e pela oportunidade de sair do mundo da
superfície e ingressar num mundo totalmente fora do cotidiano. Todos esses ele-
mentos estão diretamente relacionados aos aspectos sensitivos e emocionais, os
quais são diferentes dos normalmente vivenciados no ambiente urbano-industrial.
As atividades de aventura, especialmente no caso do mergulho autônomo,
requerem desafios, superação, atração pelo novo, pelo inesperado, rompimento
de barreiras, além da busca pela diversão, pelo risco controlado, pelo aprimora-
mento pessoal e social. Estas sensações e emoções estão diretamente relacio-
nadas ao estado de plena satisfação e prazer pela prática da atividade, denomi-
nados por Csikzentmihalyi (1999) como estado de fluxo.
Outro aspecto desta prática torna-se bastante instigante ao se analisar a respos-
ta de um dos praticantes de mergulho autônomo há mais de um ano, o qual relata
que ocorreram mudanças em sua vida depois de ter começado a praticar o mergu-
lho, evidenciando estar viciado na adrenalina que a atividade lhe proporciona.
A adrenalina, embora popularmente associada à sensação de aventura, de
estar voando de alegria, de euforia, de medo, de desespero e de liberdade, mis-
turada com as sensações de paz, tranqüilidade, plenitude, prazer e satisfação,
não designa propriamente uma única emoção, mas se enfatiza como a percep-
ção de sensações agradáveis e instigadoras.
Tomando-se por base os estudos de Fox e Mathews (1986), a adrenalina,
juntamente com a noradrenalina, são hormônios secretados pela medula supra-
renal, estando fisiologicamente relacionados com as ações do sistema nervoso
simpático, podendo ser ativados quando o ser humano está sob uma condição de
luta ou de fuga.
Estes hormônios são contribuintes importantes para o individuo e sua redução
ou aumento está diretamente atrelado ao estados de ânimo, a exemplo de crian-
ças agitadas, impacientes, irritadas, com falta de concentração, problemas de
memorização e dificuldades de administrar suas emoções, sintomas que são
ocasionados pela diminuição da quantidade destes hormônios em determinadas
regiões do sistema nervoso central. (MATTOS, 2004).
Portanto, a sensação de medo relatada pelos praticantes de mergulho há mais de
um ano, chega a ser benéfica, conforme evidenciam Fox e Mathews (1986), ao
afirmarem que, diante de uma situação de ³luta ou de fuga´, a medula supra-renal
é ativada a secretar quantidades de adrenalina e noradrenalina na corrente sanguí-
nea, ocasionando efeitos positivos sobre os sistemas cardiovasculares e metabó-
licos com relação ao aprimoramento do desempenho nas atividades físicas.

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80 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Entretanto, no que se tange às atividades físicas, as catecolaminas
(noradrenalina e adrenalina), denominação utilizada pelos fisiologistas do exer-
cício quando se referem às duas substâncias químicas secretadas, são encontra-
das em diferentes quantidades no organismo, cuja produção está atrelada à
intensidade das atividades, sendo que, quanto maior a intensidade requisitada no
exercício, maior o aumento dessas substâncias.
Pelo fato de a quantidade de produção desses hormônios estar vinculada à
intensidade do exercício, pode-se intuir que, conforme um tempo maior de prá-
tica, menor o esforço requisitado, e, desta forma, apresenta-se também uma
possível redução de adrenalina e noradrenalina na corrente sanguínea.
A busca por situações cada vez mais desafiadoras é uma característica que
atrai o mergulhador, a exemplo dos mergulhos profundos, feitos em cavernas, os
quais requerem informações técnicas e complexas em relação à utilização dos
equipamentos.
Estas informações justificam o motivo pelos quais os praticantes de mergulho
autônomo se mantém nessa atividade e a demanda consideravelmente crescente
por esta experimentação.
Outro fator importante é a busca pelo contato consigo mesmo, pois o ser
humano não está acostumado a expressar espontaneamente certas emoções,
acabando por trancafiá-las, com receio de magoar alguém, de receber críticas,
de não ser aceito socialmente e, ao sair da superfície, do contato com o ritmo
acelerado do mundo, da rotina do dia-a-dia, no fundo do mar, ele pode ter a
oportunidade de permitir um contato pessoal e interior com as próprias emo-
ções, em condições de retornar para a superfície, ³[...] brincando, até mesmo
quando a gente tem alguns problemas sai alguma coisa errada no mergulho, no
planejamento, a gente, mesmo assim sai sorrindo, é uma coisa muito boa´, como
diria o mergulhador n° (12).
Depois da vivência desta atividade, o mergulhador permanece num estado de
intuição, numa zona perceptiva, onde a liberdade está fluindo, percebendo
mais detalhes, detectando mais subjetividades comparadas às de antes de mer-
gulhar. Quando se mergulha, no fundo do mar não se pensa em mais nada,
somente no mergulho, a atenção e a concentração estão voltadas para a
atividade, portanto, não se consegue pensar em outra coisa a não ser no
mergulho em si, nas ações exigidas pelo momento e nas sensações daí advindas,
sendo que os acontecimentos extra-mergulho se tornam sem importância.
Lembrando um pensamento budista:
A mente pode ser comparada a um lago. Quando ele pára e a água
não mais se agita é que se pode ver o fundo. Dessa maneira

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 81
acontece com a mente, dispersa numa infinidade de pensamento.
Cabe então direciona-los e fixa-los num objeto qualquer. A partir
disso aumenta-se a concentração que é uma das etapas para se
chegar a níveis mais profundos de consciência. Aquietando os
µondas¶ mentais o que está além da superfície do lago é revelado.
(MCDONALD, 1998, p. 12-16).
Na vida urbana o ser humano está tão envolto com uma avalanche de informa-
ções que não lhe sobram espaço e tempo para pensar em suas próprias emoções,
ou seja, a emoção chega, mas, devido a uma atenção intelectual, ela é deixada
de lado, dependendo da prioridade com que é selecionada. Por isso, a emoção
pode ser considerada como o sexto sentido, uma vez que, após ter privilegiado
um mergulho consigo mesmo, o ser humano é capaz de experimentar um ³senso´
em relação a si mesmo e ao ³outro´ nunca antes percebido.
Sendo assim, depois de mergulhar, o ser humano sente uma aproximação com
a percepção de que os sentimentos são importantes e são normalmente bloque-
ados na ³superfície´, mas, no mergulho, os sentimentos são liberadas, ficando à
disposição, porque uma vez sentido-se bem consigo mesmo, o ser humano esta-
rá aberto a viver a vida da mesma forma como se sente em relação a si mesmo
naquele momento, pelo fato de sentir prazer na experiência de estar consigo
mesmo e deixar fluir as emoções sentidas.
Permitir que as emoções sejam ³soltas´ possibilita conhecer a si mesmo sem
culpa, deixando a pessoa que se encontra em seu interior se desvelar. Viscott
(1982, p.135) ao relatar sobre µo se permitir sentir¶, e o ser melhor a partir disso,
permitindo que os outros também o sejam, com a possibilidade de se vislumbrar
um mundo melhor, afirma que:
Se cada dum de nós usasse seus sentimentos como guia para
percorrer o caminho, para nos tornarmos o melhor de nós mes-
mo, pelo menos estaríamos no caminho da descoberta da reali-
zação em nossa própria vida, e o mundo maior começaria a ter
sentido. A pessoas que não for compreensível para si mesma não
pode esperar experimentar um mundo que tenha muito sentido.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo revelou que um dos principais motivos da prática do mergulho está
na busca pela interação com a natureza, com o mar e a vida marinha, sendo,
também, um fator de preocupação a consciência da proteção ambiental, obser-
vada por meio de um interesse pequeno, porém crescente, em relação a atitudes
preservacionistas e compromisso ético, no que tange a este meio.

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82 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Existe, nesta questão, uma nova interação na aproximação entre o ser humano
e a natureza, a qual gira em torno do fator de sustentabilidade, de preocupar-se
com a finitude das áreas naturais, da necessidade de não pensar apenas sobre os
problemas ambientais, mas promover ações efetivas e intervir adequadamente,
para que o olhar sobre este problema não fique apenas ligado a atitudes filosófi-
cas, mas que se efetive um debate ecológico com proposições e ações eficazes.
A tímida, porém, crescente preocupação com atitudes e comportamentos éti-
cos e ecológicos possibilita a discussão de valores em relação à natureza, de
forma a visualizá-la, não somente como forma de exploração, mas como par-
ceira e necessária para a vivência de sensações e emoções significativas
(SCHWARTZ, 2001).
O mergulho, na visão destes participantes, possibilitou o desenvolvimento da
percepção de si e o encontro com sensações e emoções, muitas vezes sublima-
das no cotidiano, cujas reverberações vão além da atividade em si, extrapolando
para o dia-a-dia, de forma a suscitar adequadamente o respeito e a ética nos
envolvimentos humanos.
Segundo Sant¶Anna (2001, p. 95), apropriar-se das vivências na natureza de
forma ética requer, conforme a autora:
[...] o estabelecimento de relações nas quais, no lugar da domina-
ção, se exercem composições entre os seres; estas não são nem
adequações harmoniosas entre diferenças, nem fusões totalitári-
as fadadas a tornar todos os seres similares. Trata-se de estabe-
lecer uma composição na qual os seres envolvidos se mantêm
singulares, diferentes, do começo ao fim da relação[...].
Sob este contexto, há que se pensar, não somente em contemplar e admirar a
natureza, utilizando-a para fins próprios e pessoais, mas adotar uma postura de mu-
dança em relação à própria natureza humana, na possibilidade de pensar no ser huma-
no como composição da natureza, num processo de construção mútua e simbiótica.
[As referências bibliográficas desta contribuição podem ser consultadas na fonte
original]
Notas
4 Esse assunto é bem discutido por Bruhns (1999) em O corpo visitando a natureza:
possibilidades de um
diálogo crítico. In: SERRANO, Célia M.: BRUHNS, Heloísa T. (Org.). Viagens à
natureza: turismo, cultura e ambi-
ente. Campinas: Papirus, 1999. p. 125-140.
2 Os raids de aventura ou multicompetições são provas realizadas em lugares que
propiciam fortes sensações,
baseadas na competição por equipes, nas quais utilizam-se equipamentos tecnológicos
para superação dos

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 83
obstáculos naturais. Dentre as mais importantes provas internacionais está a prova
realizada no Brasil, deno-
minada Expedição Mata Atlântica. (BETRÁN, 1995).
3 Como pode ser observado nos relatos feitos sobre suas primeiras experiências
embaixo d¶água, em O Mundo
silencioso, de J. Y. Costeau e F. Dumas (1955).

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Almeida, Ana Cristina P.C. de & DaCosta, Lamartine P.
›   
      
. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 2007
Formato da contribuição: texto completo
Fonte: Revista LICERE ± Revista do Centro de Estudos de Lazer e Recreação/EEF/
UFMG, Belo Horizonte - MG, v. 08, n. 01, p. 79-92, 2005.
E-mail do(s) autor(es): mirleide@superig.com.br ; tsampaio@unimep.br
Títulos acadêmicos principais atuais: Mirleide Chaar Bahia ± Graduada em Educação
Física e Mestre em Educação Física pela Universidade Metodista de Piracicaba
± UNIMEP; Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Lazer ± GPL/ UNIMEP;
Coordenadora do sub-grupo ³Lazer e Meio Ambiente´ do GPL, Professora
Assistente do Curso de Educação Física da UFPA; Tânia Mara Vieira Sampaio -
Graduada em Pedagogia e Doutora em Ciências da Religião pela UMESP desde
1997. Docente no Mestrado de Educação Física da UNIMEP na linha de pesquisa
³Corporeidade e Lazer´.
Ano: 2005
Publicação original: revista
Na Trilha dos Sujeitos Praticantes do
Lazer na Natureza: um Debate Conceitual
sobre Lazer e Meio Ambiente1
Mirleide Chaar Bahia
Tânia Mara Vieira Sampaio
Na atualidade, as atividades realizadas na natureza ± explorando as diferentes
variáveis do meio ambiente: montanhas, cachoeiras, corredeiras, rios, ar, entre
outros ± vêm ao encontro da necessidade cada vez mais latente do ser humano
em vivenciar experiências ao ambiente natural, estabelecendo relações lúdicas
com o meio ambiente através de jogos, esportes e desafios.
Cotidianamente, convivemos com informações veiculadas na mídia televisiva,
expostas em revistas e folders de divulgação mercadológica de agências de
turismo sobre novas formas de vivências na natureza como prática de lazer,
muitas vezes com nomenclaturas atrativas e vinculadas à temática ecológica.
Não obstante, o processo de industrialização e a crescente urbanização têm
causado nas pessoas um sentimento de busca por experiências próximas à natu-
reza, sejam elas de contemplação, de práticas esportivas de aventura, entre
outros motivos.

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86 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Assim, a crescente expansão de práticas de lazer realizadas na natureza vem
ganhando adeptos a cada dia, causando uma preocupação em relação aos pro-
cedimentos adotados neste tipo de prática, tanto em relação à utilização do
lazer enquanto ³mercadoria´, quanto pelo ³uso´ indiscriminado e mal planejado
do meio ambiente natural.
A disseminação de expressões que vinculem a prática de lazer na natureza,
³vendendo´ sonhos e uma imagem de adoção de princípios ³ecologicamente
corretos´ , nem sempre está refletida na vivência cotidiana de algumas agências
e grupos promotores deste tipo de atividade.
É notória a expansão e a proliferação de atividades de aventura em todo o
mundo, e na Floresta Amazônica, por exemplo, o interesse é redobrado, pelas
possibilidades de vivências em áreas diversas ± mata fechada, rios caudalosos,
cachoeiras, cavernas, áreas de mangue, entre outras ± e o desejo de aproximação
mais intensa com o meio natural, possibilidade esta diminuída após a urbanização
cada vez mais crescente das áreas rurais. Com a diversidade de cenários naturais
da Amazônia, nota-se que ainda é bastante incipiente a ordenação do uso público
em áreas naturais. Apesar da criação do Sistema Nacional de Unidades de Conser-
vação - SNUC2, por sua vasta extensão territorial, a região Amazônica, e mais
especificamente o Estado do Pará, não possuem muitas unidades de conservação
com características voltadas ao uso público ordenado e controlado.
Apesar dos conflitos de terra, áreas tomadas pela grilagem, exploração ilegal
de madeira, surgem propostas de uso público das áreas naturais ± com certeza,
bem menos abordadas na mídia e pouco consideradas pelo poder público ± mas
que lentamente vêm se manifestando como uma das formas de conviver com a
natureza de forma mais responsável. Trata-se da vivência de atividades de aven-
tura realizadas na natureza e o surgimento de organizações não-governamen-
tais, associações, grupos independentes voltados à prática e organização de tais
atividades em diversas regiões do país.
Com um grande mercado aberto para a exploração dos recursos naturais e do
tempo de lazer das pessoas ± que se dispõem a vivenciar práticas de aventura na
natureza ± cresce o surgimento de agências, grupos independentes e do próprio
poder público, interessados em divulgar as belezas naturais e as práticas de
ecoturismo, turismo sustentável e turismo de aventura ± este se voltando à
prática de esportes de aventura ± nem sempre preocupados com valores verda-
deiramente comprometidos com a vivência de um lazer crítico e criativo e uma
conduta sustentável em áreas naturais.

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 87


DESENVOLVIMENTO:
Concepções de Lazer e Meio Ambiente
Há vários entendimentos no que se refere ao Lazer e ao Meio Ambiente, tanto
enraizados no senso comum, quanto defendidos por autores (Uvinha, 2001;
Costa, 2000; Betrán, 2003; Marinho, 2003; Bruhns, 2003), que se propõem a discu -
tir tais temáticas. Portanto, precisamos deixar claro em quais bases
epistemológicas nos apoiamos, para que seja possível tornar transparentes as
nossas concepções individuais e a linha de raciocínio que pretendemos tomar.
Em relação ao Lazer, propomos uma concepção que se paute na contraposição
à uma lógica de compensação, de alienação ou de exploração do mercado ao
qual este é submetido. Um lazer marcado pela criticidade e criatividade, alicerçado
no objetivo de Denúncia de uma realidade historicamente construída e no Anún-
cio de uma utopia focada na mudança do possível, a ser alcançado dentro de
nossas vidas.(MARCELLINO, 2000, p.15)
Seria o que Alves (1986), denomina como um significado Ético e Profético do
Lazer. Ético, no sentido de perceber outros valores que permeiam o lazer, dife-
rentes do mundo produtivo e consumista e Profético, no sentido de transportar
tais descobertas para fora do lazer e do lúdico. Desta forma, um lazer crítico e
criativo seria capaz de possibilitar a transferência de tais valores para a vida real.
Assim, Marcellino, que defende tal lógica ± enraizada nos valores de um lazer
capaz de propiciar o descanso, o divertimento e o desenvolvimento individual e
social ±, e em quem achamos pertinente pautar nosso trabalho, pensa o lazer como:
Cultura entendida no seu sentido mais amplo, vivenciada,
consumida, ou conhecida no tempo disponível, que requer deter-
minadas características como a livre adesão e o prazer, propici-
ando condições de descanso, divertimento e desenvolvimento
tanto pessoal quanto social. (MARCELLINO, 2003, p.31)
A noção de cultura, neste caso,pauta-se em uma concepção antropológica,
isto é, ³num conjunto de modos de fazer, ser, interagir e representar que, produ-
zidos socialmente, envolvem simbolização e, por sua vez, definem o modo pelo
qual a vida social se desenvolve´. (MACEDO, 1979, p.35)
Falar de lazer remete a um campo amplo de possibilidades, as quais Dumazedier
(1980) classifica e distingue segundo os interesses3 verificados pelas vivências de
lazer, tendo como conteúdos culturais atividades pautadas nesses diversos inte-
resses: artísticos, físico-esportivos, manuais, intelectuais, sociais e turísticos4.

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88 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Nessa lógica, há preponderância de um dos conteúdos, de acordo com o
interesse principal buscado pelo indivíduo prioritariamente, podendo surgir um
outro interesse secundário, o que significa que ao escolher um conteúdo físico-
esportivo na natureza, apesar do interesse principal ser o de exercitar-se fisica-
mente, paralelamente pode ser percebida uma gama de outras possibilidades:
contemplação da natureza e busca de conhecimentos(interesse turístico) ou
estar com um grupo de amigos na prática das atividades ( interesse social).
Dumazedier (1980) também estabelece dimensões de gênero ou tipos de
envolvimento, as quais se apresentam como: o prático, o conhecimento e a
fruição ou a assistência propiciada pelo consumo de um espetáculo. Os três
gêneros estão diretamente ligados à atitude tomada pelo indivíduo, caracteriza-
da pelo autor como o nível de envolvimento na atividade em questão, podendo
ser: elementar (conformismo), médio (criticidade) e superior (criatividade). As-
sim, uma atividade física de aventura na natureza pode caracterizar-se por ser
prática, não apenas por exigir movimentos, mas por estar ligada efetivamente à
níveis crítico-criativos.
Percebendo, portanto, algumas nuances que fazem parte da teoria do lazer e,
conseqüentemente, os aspectos inerentes aos conteúdos culturais do lazer, faz-
se necessário delimitarmos em que bases de sustentação o presente trabalho
estará alicerçado, no que se refere às concepções ecológicas.
Ao discorrermos sobre as questões do Meio Ambiente, concordamos com
Guattari (1990), quando afirma uma ecologia pautada não apenas numa consci-
ência parcial dos perigos mais evidentes que ameaçam o meio ambiente natural
e em perspectivas tecnocráticas, mas sim numa perspectiva que leve em consi-
deração outros aspectos:
[...] ao passo que só uma articulação ético-política - a que chamo
ecosofia- entre os três registros ecológicos (o do meio ambien-
te, o das relações sociais e o da subjetividade humana) é que
poderia esclarecer convenientemente tais questões. (GUATTARI,
1990, p.8)
Numa lógica de compreensão dos desequilíbrios ecológicos, ameaçando a
vida em sua superfície, paralelamente com a deterioração dos modos de vida
humanos individuais e coletivos, o autor considera que não é possível haver uma
verdadeira resposta à crise ecológica, se não houver uma ³autêntica revolução
política, social e cultural reordenando os objetivos da produção de bens materi-
ais e imateriais´ (GUATTARI, 1990, p. 9), ocorrendo não apenas em relação às
forças visíveis, mas em escalas de domínios moleculares de sensibilidade, de
inteligência e de desejo, nas quais a subjetividade humana está intimamente
relacionada.

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 89
O que se põe em questão é a maneira de viver daqui em diante sobre o planeta
e não apenas uma consciência parcial dos perigos mais evidentes e maiores
sobre o meio ambiente natural. É comum nos preocuparmos apenas com os
grandes desastres ecológicos e com os grandes danos industriais, porém não
atentamos para o fato de que cada ato individual, em nosso dia-a-dia reproduz-
se em atos coletivos e geram grandes mudanças no meio ambiente local e,
conseqüentemente, em escala global.
Em função do contínuo desenvolvimento do trabalho maquínico
redobrado pela revolução informática, as forças produtivas vão
tornar disponível uma quantidade cada vez maior do tempo de
atividade humana potencial5. Mas com que finalidade? A do de-
semprego, da neurose, ou a da cultura, da criação, da pesquisa, da
re-invenção do meio ambiente, do enriquecimento dos modos de
vida e de sensibilidade? (GUATTARI, 1990, p. 8-9)
A adoção de uma ética ³ecosófica´ em todas as esferas da vida, depende de
reflexões e ações humanas sobre suas práticas e sua visão androcêntrica (o ho-
mem no centro) e antropocêntrica (o ser humano dominando o meio ambiente). A
mudança de tais paradigmas é urgente e necessária, devendo adotar uma relação
dialética entre reflexão ± através de pesquisas ± e ação ± através de nossas práti-
cas diárias. Nesta concepção, o meio ambiente assume um significado mais
abrangente, na medida em que é interpretado como o resultado das Inter-relações
entre natureza e sociedade, valorizando-se a relação meio ambiente-qualidade de
vida (social, e não apenas natural) numa esfera de amplitude holística. E será
justamente esse grau de compreensão e valorização, que deverá orientar uma
definição do modelo de desenvolvimento sustentável e seu nível de envolvimento
e compromisso com as atividades realizadas na natureza, com a cultura das popu-
lações locais e com uma lógica de lazer crítico e criativo no meio ambiente.
As atividades de lazer na natureza e a sustentabilidade
Desde o começo da industrialização, no século XVIII, a popula-
ção mundial cresceu 8 vezes, consumindo mais e mais recursos
naturais; somente a produção, baseada na exploração da nature-
za, cresceu mais de cem vezes. O agravamento deste quadro com
a mundialização do acelerado processo produtivo faz aumentar
a ameaça e, conseqüentemente, a necessidade de um cuidado
especial com o futuro da Terra. (BOFF, 1999, p. 133)
Percebemos, que houve um gradativo rompimento de uma lógica racional de
desenvolvimento, de uso racional de recursos naturais e de qualidade de vida das

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90 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
populações, inserindo-se a preocupação com os aspectos que se referem ao
tempo disponível para o lazer. A mudança histórica na contagem do tempo é
percebida na transformação do tempo pastoril para o industrial e na transforma-
ção do tempo natural para o artificial (RYBCZYNSKI, 2000).
Atualmente, percebendo a problemática das questões ambientais, o ser huma-
no estaria buscando (re)descobrir a essência e a importância de saber viver (e
cuidar). Passando a preocupar-se com o ³meio´ de forma ampliada, numa recu-
peração de valores aparentemente desaparecidos, poderíamos supor que isto
pode significar estar buscando mudança nos paradigmas que ditam a relação
dele mesmo com o meio natural.
Surge, então, uma mentalidade ambientalista, manifestada, na atualidade, por
um campo amplo de relações, no qual,
(...) está embutida não apenas a preservação, de maneira
isolada e estanque, mas integrando uma infinidade de conteúdos,
de complexificação do conhecimento, articulando uma visão di-
ferenciada sobre os acontecimentos naturais, sócio-culturais, po-
lítico-econômicos, num entendimento do ser humano como ele-
mento co-responsável, fundamental, em tudo o que ocorre no
âmbito da sobrevivência física do planeta e da própria qualidade
de vida em um sentido amplo, renovado e diferenciado (CASCINO
apud BRUHNS, 1999, p. 502).
E eis que se estabelece um conflito no ser humano: as possibilidades de explo-
ração da natureza versus a responsabilidade de conservá-la.
Diante da natureza desconhecida, os seres humanos são acome-
tidos tanto da melancolia e desejo de conservá-la intocável,
compreendê-la e encontrar respostas às indagações suscitadas,
quanto do ímpeto de explorá-la, quer econômica, quer cientifica-
mente (COELHO, 1999, p. 55).
Perante a necessidade de sobrevivência e de desenvolvimento das popula-
ções, buscam-se alternativas que se contraponham ao paradigma hegemônico
de desenvolvimento e crescimento desenfreado, de modo que venham a suprir as
necessidades atuais, sem o comprometimento das gerações futuras e a degrada-
ção do meio ambiente.
Não obstante, a necessidade de vivenciar atividades e momentos de lazer na
natureza, numa busca pela reaproximação, na medida em que a urbanização das
cidades causou um rompimento das relações ser humano±natureza, faz com que
este se engaje cada vez mais em tais discussões.

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 91
Assim, na lógica de preservação dos recursos naturais e culturais das popula-
ções tradicionais ± habitantes de áreas naturais remotas com potencial para
exploração, visitação, vivências de lazer, entre outros ± houve um estabeleci-
mento de preceitos que pudessem permitir um manejo consciente de tais ativida-
des, de modo a não esgotar tais recursos.
Surgem discussões acaloradas em reuniões mundiais sobre a temática ambiental,
com a presença de vários chefes de Estado, sobressaindo-se dentre elas a ECO
92, na qual algumas metas de desenvolvimento, pautadas numa preocupação
com gerações futuras e o esgotamento dos recursos naturais e culturais, foram
discutidas e sistematizadas num documento intitulado AGENDA 21 GLOBAL, após
a publicação anterior (1988) de um relatório denominado ³Relatório
Brundtland´(Nosso Futuro Comum). (COELHO,1999)
Impulsiona-se, portanto, o desejo e a tentativa de um equilíbrio social, econô-
mico e ecológico, num tripé que, para Figueiredo, baseado no Relatório Brundtland,
significa ³justiça social, eficiência econômica e prudência ecológica´, denomi-
nado Desenvolvimento Sustentável´.6
(FIGUEIREDO,1999, p. 36). Assim, uma das perspectivas de entendimento do
desenvolvimento sustentável é trabalhada por Sachs apud Coelho (1999),
Desenvolvimento sustentável vem sendo comumente definido
como desenvolvimento que leva em consideração a finitude dos
recursos naturais, a sustentabilidade ou durabilidade no uso dos
recursos com vista às gerações futuras. Além da sustentabilidade
social, econômica e ecológica, neste conceito de desenvolvi-
mento é também ressaltada, com propriedade, a sustentabilidade
cultural. (p. 57)
Várias são as questões estabelecidas na Agenda 21 em nível mundial, inclusive a
visitação pública em áreas naturais, o que incluiria o lazer, tanto em seu conteúdo
cultural de turismo, quanto na prática de atividades físico±esportivas. A preocupa-
ção a partir de então era a do cumprimento de metas exeqüíveis, em nível local ou
regional, com uma AGENDA 21 LOCAL passando a ser pensada em cada região.
Assim, o entendimento de que cada região deve buscar soluções específicas
para seus problemas particulares, considerando dados ecológicos e igualmente
culturais, bem como as necessidades imediatas e de longo prazo, remete à ob-
servação primordial da diversidade cultural.7
O conceito de Desenvolvimento Sustentável busca, portanto, uma concepção
sistêmica de mundo e estabelece seu apoio em visões orientais de harmonia8
entre seres humanos e natureza. Tal abordagem suscita a compreensão de que

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92 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
todas as formas de ação do ser humano no meio ambiente, principalmente no
que se refere ao estabelecimento de práticas as quais busquem recursos naturais
ou a própria área natural como suporte, necessitam essencial e prioritariamente
de planejamento, envolvimento com as comunidades da área, levantamento de
capacidade de suporte, enfim, uma série de medidas capazes de minimizar a ação
antrópica ( ação do homem) em tais áreas e na busca do desenvolvimento com
sustentabilidade e responsabilidade. (FIGUEIREDO, 2001)
Surgindo como uma forma alternativa de utilização dos recursos naturais ± em
consonância com os preceitos do Desenvolvimento Sustentável ± alguns conteú-
dos culturais do lazer passam a estabelecer uma relação íntima com o meio ambi-
ente, tendo como destaque o Turismo em dois segmentos: o do Ecoturismo9 e o
do Turismo de Aventura10, este último, vinculando atividades físicas na natureza
chamadas de Esportes de Aventura (PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
SUS-
TENTÁVEL DO TURISMO DE AVENTURA-EMBRATUR, 2001), Radicais
(UVINHA, 2001)
ou Atividades Físicas de Aventura na Natureza - AFAN (BETRÁN, 2003).
Apesar de ainda serem incipientes as discussões epistemológicas sobre tais
atividades no Brasil havendo necessidade de fazê-lo em nível acadêmico, a fim
de que se entre num consenso sobre a terminologia a ser adotada para tais
práticas o foco de discussão deste texto não estará voltado a esse assunto.
A compreensão do estabelecimento de uma conexão entre lazer-esporte-
natureza, vivenciada na contemporaneidade, é descrita por Da Costa (1999, p.553),
como uma das principais tendências do esporte e do lazer, neste final de século,
em ³busca de auto-realização e auto-expressão através do crescente
envolvimento com o meio ambiente natural´.
Bruhns (1997, p.38) também discorre sobre o assunto, ao demonstrar que exis-
te uma multiplicidade de agrupamentos, independentemente de sexo, idade ou
nível técnico, que se unem para fazer turismo ecológico ou turismo de aventura,
podendo tomar forma por meio de clubes de caminhada, montanhismo, alpinis-
mo ou outros similares.
As novas sensibilidades relacionadas às questões ambientais têm possibilitado
abertura para outras mentalidades engendrando práticas diversas de lazer(BRUHNS,
1999), notadamente dentro do esporte, estabelecendo relações com a natureza,
assumidas preliminarmente por uma tendência,
(...) nomeadamente a de levar tais práticas para o espaço aberto,
para o ar livre, para o exterior, para a natureza. Esta naturaliza-
ção efetivamente é um retorno às raízes do esporte, e, como tal,
uma das expressões principais do lazer atual em qualquer país.
(DA COSTA, 1999, p.553)

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 93
Nesta lógica, alguns autores começam a discutir significativas características
inerentes a este tipo de prática, buscando diferenciá-las do esporte que aconte-
ce em ambientes ³estandartizados ou ³domésticos´, onde a ação motriz se
orienta a um automatismo repetido cuidadosamente nos treinamentos, signifi-
cando que ³as práticas domésticas supõem um gesto sem surpresas,
automatizado, programado, sem improvisação possível´(PARLEBÁS, 1987, p.14)
Por outro lado, quando o esporte é considerado ³selvagem´, ³radical´, ³na
natureza´ ou não estandartizado, como no caso do ³surf´, do ³mountain-bike´ e
outros, o praticante está sujeito às constantes alterações do meio, tendo que
manter um diálogo constante com o espaço. Necessita, então, adaptar-se às
condições impostas pela natureza e estar atento aos possíveis obstáculos natu-
rais. ³As práticas µselvagens¶ requerem um ajuste à novidade e uma orientação
para a adaptabilidade frente ao imprevisto´. (PARLEBÁS, 1987, p. 14).
Uvinha (2001, p.21), ao adotar a terminologia ³Esportes Radicais´11 para este
tipo de atividade física na natureza, defende a perspectiva conceitual de que
³esses esportes têm em comum o gosto pelo risco e pela aventura, muitos, com
a proposta de se engajar também em causas de preservação ecológica´.
O autor ainda se aprofunda em estudos quanto ao significado do ³imprevisto´,
haja vista que os esportes radicais remetem às mais variadas situações. E cita este
encontro com o imprevisto nas palavras de Pociello apud Uvinha (2001, p. 24):
Poder-se-á brincar de sentir medo no ar e no mar, sobre a onda ou
sobre o rochedo, nas subidas ou nas descidas, no vazio que beira
a catástrofe, de forma a experimentar realmente as sensações
excitantes dos sonhos de vôo, ou saborear essa dinâmica mais
modesta do salto.
Ao fazerem referência à experiência do ³risco´, tanto Uvinha (2001) quanto
Costa (1999) abordam o tema de acordo com o enfoque dado por Caillois em sua
tipologia para os jogos.12
Trata-se, hoje, de uma aventura eivada de sentidos lúdicos, uma
vez que a atitude dos sujeitos que vivem a aventura no esporte é
tomada por um risco calculado, no qual ousam jogar a si mesmos
com a confiança do domínio cada vez maior da técnica e da
segurança propiciada pela tecnologia. Manifestam uma audácia
para poder desencadear, em risco, uma transgressão de limites
possíveis, autorizada pela confiança de ser capaz de fazer (lan-
çar-se no espaço, na profundidade, na imersão, na luta contra os
obstáculos da natureza), associada a um excitante e reconfor-
tante prazer de realização (³ilinx13, vertigem) e de tê-lo feito com
alta competência (COSTA, 1999, p. 19).

p  
94 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
Para Uvinha (2001, p. 24), o elemento ³ilinx´ proposto por Caillois caracteriza-
se por ³um estado orgânico de confusão e estupor´, sinalizando ainda que os
jogos inseridos na classificação do autor, que fazem parte do ³ilinx´, consistem
³em uma tentativa de destruir por um instante a estabilidade da percepção e
infligir à consciência lúdica uma espécie de pânico voluptuoso´, o que pode
estar ligado ao ³risco´ encontrado nos esportes radicais.
Assim, ao buscar o risco, os praticantes dos esportes radicais procuram emo-
ções que se enraízam no universo fictício14.
Da mesma forma, esses esportes adotam singularidades individuais na busca de
qualidade de vida, de sensibilidade extrema, proclamam o indivíduo e o seu direito
de se realizar à parte do que é comum, o direito de ser autônomo. (COSTA, 1999)
Alguns grupos se formam, de acordo com a convergência de seus interesses e
desejos, em torno dessas práticas, revelando emoções, sentidos, simbolismo,
dimensões culturais de vivenciar tais experiências e buscam, em atividades de
risco e aventura, o sentimento de glória, de vitória.
É comum os segmentos ecoturísticos e o empresariado adotarem
as práticas de aventura e risco como arte de viver, desafiando
calculadamente, com risco de vida, o fim trágico ou a sobrevi-
vência gloriosa, prestigiada com sucesso (COSTA, 1999, p. 18).
A existência dos elementos da competição, da incerteza das informações do
ambiente e do parceiro ou do adversário, por exemplo, desloca-se, nesses es-
portes, de um sujeito humano concreto, para um confronto com adversários da
natureza antropomorfizados: ventos, avalanches, enxurradas, ondas, tempera-
tura ambiente (COSTA, 1999, p. 16).
Assim, a competição existente nos esportes de aventura é travada com os
próprios limites individuais e com os elementos da natureza, dando novas con-
figurações aos existentes em outras práticas convencionais (as modalidades
olímpicas ou as vivenciadas no ³esporte espetáculo´). Para Costa (1999, p. 16),
³o fato de o praticante estar só diante da natureza faz com que a competição
desloque o sentido do outro para si mesmo´.
Neto apud Uvinha (2001, p. 25), ao se referir à ³paixão´ pelo risco, acredita que
esta se manifesta simbolicamente como:
Uma forma de afrontar a morte segundo um modo metafórico, ga-
rantir a existência, abandonar provisoriamente o conforto e a segu-
rança ou a necessidade antropológica de existência em situações
ativas no sentido de um sistema simbólico que estrutura mudanças.

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Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo 95
Acredita-se, portanto, que o ser humano possui diversas motivações15 e ra-
zões intrínsecas para a realização de atividades que intensifiquem o espírito
aventureiro, o que repercute na busca de esportes de aventura e na busca de
risco. Mas além das motivações, há necessidade de descortinar quais os valores
vivenciados em tais práticas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
A discussão crescente da problemática da sustentabilidade do meio ambiente,
tanto em nível mundial, quanto em níveis locais, deverá ser levantada no meio
acadêmico, de forma a privilegiar uma discussão multidisciplinar , envolvendo
atores diversos.
O lazer, enquanto manifestação humana, possui características próprias, com
grandes possibilidades para a transformação do ser humano e da sociedade, a
partir de valores comprometidos com o rompimento da lógica hegemônica do
³lazer mercadoria´ e de um lazer alienado das questões de sustentabilidade
mundial.
Com o crescente aumento da divulgação de atividades de lazer na natureza e
com o surgimento de novas práticas, fica evidente a necessidade de discussões
que tragam à tona os valores subjacentes a tais práticas, com uma preocupação
em contribuir para um debate que propicie um processo consciente de vivência
de um lazer crítico e criativo, na busca de um desenvolvimento de relações
saudáveis entre os indivíduos, a sociedade e a natureza.
[As referências bibliográficas desta contribuição podem ser consultadas na fonte
original]
Notas
16 Esse artigo representa uma parte da monografia ³Esporte e Natureza: aproximações
teórico-conceituais e
impactos ambientais no Estado do Pará´, defendida no Núcleo de Meio Ambiente da
Universidade Federal do
Pará em 2002.
2 O Conjunto de Unidades de Conservação do Brasil (áreas naturais protegidas)
constitui o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza ± SNUC. ³Mediante o Projeto de Lei nº 2.892,
de 1992 ± que regula-
menta o art.225, 1º, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal ± instituiu-se a lei nº
9.985, criou-se o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação da Natureza´ ( COSTA, 2002, p. 27)
3 O interesse deve ser entendido como o ³conhecimento que está enraizado na
sensibilidade, na cultura vivida´
(DUMAZEDIER, 1980, p.32).
4 O interesse turístico foi acrescentado por CAMARGO (1992).
5 ³Nas fábricas Fiat, por exemplo, a mão-de-obra assalariada passou de 140 mil para 60
mil operários numa
década, enquanto a produtividade aumentava em 75%.´ (GUATTARI, 1990, p. 9)

p 
96 Meio ambiente, esporte, Lazer e turismo
6 Na década de 1970, a perspectiva teórica designada ³Desenvolvimento Sustentável´
surgiu da crítica ao pla-
nejamento econômico tal como foi concebido no mundo ocidental pós-50 e os seus
resultados ambientais
danosos e socialmente injustos, sobretudo nos países então denominados ³Terceiro
Mundo´ (COELHO,
1999).
7 Sachs apud Figueiredo (1999), destaca que diversidade cultural significa diversidade
de formas de relação do
ser humano com a natureza e das adaptações de modelos tecnológicos à realidades
regionais, criticando a
prática da transferência
c

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