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O Jornalismo na Comunicação

Organizacional: uma perspectiva crítica


Wilson da Costa Bueno (Org.)

JORCOM
Grupo de Pesquisa ECA/USP
O Jornalismo na Comunicação
Organizacional: uma perspectiva crítica

2020
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
_______________________________________________________________
O Jornalismo na Comunicação Organizacional: uma perspectiva crítica/
Organização de Wilson da Costa Bueno. São Paulo: JORCOM/
Comtexto Comunicação e Pesquisa, 2020.
166 p.
ISBN 978-65-992314-0-7
1.Comunicação Organizacional 2. Jornalismo 3. Relacionamento com
a mídia 4. Conteúdo de marca 5. Jornalismo patrocinado.
I. Título

CDD 658.45
_______________________________________________________________
Capa com ilustração de Peggy um Marco Lachmann-Anke por Pixabay
JORCOM – O Jornalismo na Comunicação Organizacional é um grupo de
pesquisa certificado pela ECA/USP e cadastrado no CNPq
(http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/498577).
E-mail para contato: jorcom@comtexto.com.br ou wilson.bueno@usp.br

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Não é permitida a reprodução, parcial ou


integral, desta obra. A afronta aos direitos autorais constitui crime (art. 184 e parágrafos
do Código Penal) que inclui prisão e multa, além de busca e apreensão e indenizações
diversas, conforme rezam os artigos 101 a 110 da Lei 9.610, de 19/02/1998,
denominada Lei dos Direitos Autorais.
SUMÁRIO

Apresentação 1
Os autores 2
A pandemia não decretou o lockdown da Comunicação
Organizacional 4
Wilson da Costa Bueno
Assessor de imprensa é ou não é jornalista? 18
Ana Maria Dantas de Maio e Victor Dantas de Maio Martinez
O impacto das mídias sociais no processo de relacionamento
com a mídia 32
Anelisa Maradei
O jornalismo nas organizações e a comunicação com
os públicos internos 63
Juliana Luiza de Oliveira Canêdo
Não basta pesquisar, precisa divulgar. Desafios e perspectivas
para o jornalismo científico nas universidades públicas brasileiras 76
Luciane Treulieb e Arquimedes Pessoni
Inovação em media training: um estudo a partir de
três agências de comunicação 94
Marcia Cellos Zica e Jorge Duarte
Os limites entre jornalismo e conteúdo de marcas:
os casos do MediaLab e do Estúdio Folha 108
Marli dos Santos
Relacionamento com a mídia em situações de crise:
o governo federal e a Covid-19 121
Paulo Roberto Salles Garcia
De revistas customizadas a webséries: o conteúdo de marca
como narrativa das organizações 134
Rosiane Moro
As múltiplas ausências da mulher no Jornalismo brasileiro 148
Wilson da Costa Bueno
Informações gerais sobre o grupo de pesquisa JORCOM 164
APRESENTAÇÃO

Este e-book representa a primeira publicação do grupo de pesquisa JORCOM – O


Jornalismo na Comunicação Organizacional, criado em 2019, certificado pela Escola
de Comunicações e Artes da USP (ECA) e cadastrado no Diretório dos Grupos de
Pesquisa do CNPq.

O JORCOM reúne uma dezena de pesquisadores de comunicação e tem como objetivos


principais: a) realizar investigações que tenham como foco a contribuição do jornalismo
para a comunicação organizacional; b) publicar livros, e-books e artigos sobre o tema; c)
organizar eventos (seminários, cursos, webinars) que tenham adesão às suas linhas de
pesquisa.

Esta edição tem a participação da maioria dos colegas que integram este grupo de
pesquisa além de convidados com pós-graduação em Comunicação e experiência
profissional em Jornalismo e Comunicação Organizacional.

A proposta do e-book é apresentar e debater temas atuais e relevantes que caracterizam


estas duas áreas – Jornalismo e Comunicação Organizacional, a partir de uma perspectiva
crítica, com atenção aos conceitos, processos e às práticas profissionais.

Como é possível perceber pelo sumário desta obra, ela incorpora aspectos fundamentais
da intersecção entre o Jornalismo e a Comunicação Organizacional, como o
relacionamento com a mídia (assessoria de imprensa), media training, a comunicação
com os públicos internos, comunicação governamental e gestão de crise, a publicação de
revistas customizadas pelas organizações, a diversidade corporativa, o jornalismo
patrocinado, o esforço de divulgação da pesquisa realizada nas universidades brasileiras
e o impacto das mídias sociais. Inclui, ainda, um capítulo sobre a comunicação
organizacional durante a pandemia do novo coronavírus.

Esperamos contribuir para o incremento do debate nas áreas de Comunicação


Organizacional e Jornalismo, comprometidos com uma visão plural, com a consolidação
destas atividades profissionais e o fortalecimento do ensino e da pesquisa em
Comunicação em nosso país. Boa leitura para todos.

Wilson da Costa Bueno (Org)

1
OS AUTORES

Ana Maío
Doutora em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo, mestre em
Comunicação pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp),
graduada em jornalismo pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Atua como
jornalista do Núcleo de Comunicação Organizacional da Embrapa Pecuária Sudeste, em
São Carlos (SP). E-mail: anamaio@uol.com.br

Anelisa Maradei
Doutora em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (Umesp) e
pela Universidade da Beira Interior, UBI, Portugal. E-mail: ane@amaradei.com.br

Arquimedes Pessoni
Doutor em Comunicação Social (UMESP, 2005), Mestre em Comunicação Social
(UMESP, 2002), Bacharel em Comunicação Social, habilitação Jornalismo (UMESP,
1987). Docente dos Mestrados Profissionais em Inovação na Comunicação de Interesse
Público (USCS) e Inovação no Ensino de Saúde (USCS). E-mail:
arquimedes.pessoni@online.uscs.edu.br

Jorge Duarte
Jornalista e relações-públicas. Doutor em Comunicação. Trabalhou em jornais e rádios.
Desde 1990 está na Embrapa, onde é gerente de comunicação estratégica. É professor,
autor de livros e pesquisas sobre comunicação. Entre 2004 e 2012 atuou na Secom da
Presidência da República, onde foi diretor do Núcleo de Comunicação Pública e
coordenou cursos de capacitação para profissionais de comunicação e dezenas de media
trainings com dirigentes públicos. E-mail: j_duarte@terra.com.br

Juliana Luiza de Oliveira Cañedo


Graduada em Comunicação Social/Jornalismo pela Universidade Federal de Goiás
(2005); especialista em Comunicação e Multimídia pela Pontifícia Universidade Católica
de Goiás (2011); mestre em Educação Profissional e Tecnológica pelo Instituto Federal
de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano (2019), onde atua como jornalista desde 2008.
Membro do grupo de pesquisa Jornalismo e Comunicação Organizacional (Jorcom) da
Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. E-mail:
juliana.luiza@ifgoiano.edu.br

Luciane Treulieb
Jornalista na Universidade Federal de Santa Maria, foi editora-chefe da Revista Arco-
UFSM, de jornalismo científico e cultural entre 2013 e 2019. Mestranda em Inovação na
Comunicação de Interesse Público (USCS) e cursando a Especialização em Divulgação
e Popularização da Ciência (Fiocruz). E-mail: lu.treulieb@gmail.com

2
Márcia Cellos Zica
Jornalista, formada pela Universidade Federal de Mato Grosso, e pós-graduada pelo
Centro Universitário de Brasília (UniCEUB). Trabalhou como repórter e apresentadora
em veículos de imprensa de Mato Grosso, e há 13 anos integra a Assessoria de Imprensa
do Banco do Brasil, onde exerce, entre outras funções, a coordenação do media training
para os executivos da empresa, já tendo participado da formação de mais de 400 fontes
na instituição bancária. E-mail: marciacellos@gmail.com

Marli dos Santos


Jornalista, doutora em Ciências da Comunicação pela ECA/USP, docente do Programa
de Pós-Graduação em Comunicação da Faculdade Cásper Líbero. Coordenadora do GT
Estudos sobre Jornalismo da ALAIC e do GP Gêneros Jornalísticos da Intercom. Líder
do GP Jornalismo contemporâneo, práticas para a emancipação social e membro do GP
JORCOM, liderado pelo prof. Dr. Wilson da Costa Bueno. E-mail:
msantos@casperlibero.edu.br

Paulo Roberto Salles Garcia


Doutor em Comunicação Social, é jornalista e pesquisador nas áreas de relacionamento
com a mídia, comunicação organizacional e gestão de crise. Integra o grupo de pesquisa
JORCOM – Jornalismo na Comunicação Organizacional – da Escola de Comunicação e
Artes da USP. Coautor dos livros “Estratégias de comunicação nas mídias sociais”,
“Comunicação Empresarial e gestão de marcas”, “Comunicação Empresarial:
Planejamento e Gestão”, “Comunicação Empresarial: tendências e perspectivas” e
“Educação a distância: uma trajetória colaborativa”. E-mail:
paulo.garcia@belaprosa.com.br

Rosiane Moro
Mestre em comunicação social com graduação em jornalismo pela Umesp. É docente na
pós-graduação do Senac nas disciplinas de marketing digital e planejamento integrado de
comunicação. Sócia da Parágrafo Editora, tem mais de 20 anos de experiência em
produção de conteúdo de marca online e offline, assessoria de imprensa e edição de
publicações customizadas. E-mail: rosiane.moro@gmail.com

Victor Dantas de Maio Martinez


Jornalista formado pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
(Unesp); graduando em Direito pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP) da
Universidade de São Paulo (USP). Bolsista auxiliar de Pesquisa do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (IPEA). E-mail: victordantas@usp.br

Wilson da Costa Bueno


Jornalista, professor sênior da ECA/USP, com mestrado e doutorado em Ciências da
Comunicação, especialização em Comunicação Rural. Líder do grupo de pesquisa
JORCOM – O Jornalismo na Comunicação Organizacional, certificado pela USP e
cadastrado no Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq. Diretor da Comtexto
Comunicação e Pesquisa, empresa de consultoria nas áreas de Comunicação
Organizacional e Jornalismo Especializado E-mail: professor@comtexto.com.br

3
A pandemia não decretou o lockdown
da Comunicação Organizacional
Wilson da Costa Bueno

A pandemia alterou dramaticamente a vida das pessoas em todo o mundo, provocando


centenas de milhões de infectados e um número também expressivo de mortes. Da mesma
forma, acarretou mudanças importantes para o universo do trabalho, com a demissão em
massa de trabalhadores e, no Brasil, em função de uma medida provisória do Governo,
provocou a redução de jornada e salário (em alguns casos, em até 70%), bem como a
suspensão de contratos por vários meses.
É possível, no entanto, perceber que as mudanças não se localizaram apenas nas áreas da
saúde e do emprego, mas que elas ganharam maior abrangência, atingindo também os
modelos de gestão, os hábitos de consumo e, o que interessa especialmente para o objeto
desta análise, o próprio ethos da comunicação organizacional.
Uma análise, ainda que ligeira, indica, porém, que a ruptura radical provocada pelo novo
coronavírus desencadeou uma reestruturação significativa das práticas tidas como
“normais” antes da pandemia, exigindo de governantes, gestores e profissionais novas
posturas que podem, se assumidas com coragem e competência, capacitá-los para o
enfrentamento de desafios futuros.
O primado do home office
A exigência de distanciamento social, indispensável para diminuir o índice de
contaminação pelo vírus, obrigou as empresas e organizações de maneira geral a
buscarem alternativas para o desenvolvimento dos trabalhos e a manutenção dos
negócios, de que resultou a utilização intensa da prática do home office.
Depois de meses de isolamento, em que o contato presencial foi reduzido unicamente às
atividades consideradas essenciais, ficou patente a necessidade de incorporar, de maneira
ágil e adequada, a comunicação virtual como modalidade prioritária para o
relacionamento das organizações com os seus públicos estratégicos, internos e externos.
O home office foi definitivamente implantado e, para que ele obtivesse sucesso, duas
condições tiveram que ser cumpridas, de maneira ampla e urgente: a adesão a plataformas
digitais e a capacitação dos profissionais para o trabalho (e a comunicação) a distância.
É verdade que muitas empresas já, há algum tempo, tinham incorporado esta alternativa
e que os eventos virtuais (lives, webinars, webcasts) faziam parte do processo vertiginoso

4
de transformação digital pelos quais elas estavam passando. O que ocorreu, no entanto,
foi a conscientização, pela quase totalidade das organizações, de que não havia outra
saída: ou a comunicação on-line seria assumida em sua plenitude ou os negócios não
sobreviveriam, sobretudo porque a pandemia tinha fincado raízes e não havia qualquer
expectativa de que ela iria se desfazer a curto e médio prazos.
Decorridos alguns meses da consolidação da pandemia em todo o mundo, o cenário havia
se modificado literalmente: a comunicação a distância ganhou corpo e, mais ainda, passou
a ser considerada como opção a ser fortemente considerada mesmo após a volta à
“normalidade”. As organizações se deram conta de que a tecnologia disponível permite
substituir, com vantagem, a comunicação tradicional, favorecendo os contatos e
reduzindo substancialmente os custos. O Google, por exemplo, comunicou que deverá
manter a maioria dos seus 200 mil empregados e funcionários terceirizados em home
office até julho de 2021, confirmando a informação veiculada recentemente pelo Wall
Street Journal. Segundo Sundar Pichal, presidente executivo da empresa, em e-mail
encaminhado aos seus empregados,
“a intenção é de dar mais facilidade para muitos funcionários e
seus filhos se adequarem com escolas e habitações. Espero que
essa decisão ajude com a flexibilidade que vocês precisam para
trabalhar e também para se manter bem”. (O ESTADO DE S.
PAULO, 28/07/2020, p.B10)
Decisão similar, embora com algumas variações em termos da intensidade de adesão ao
teletrabalho, também foi manifestada por outras companhias, como o Twitter, o Facebook
e a Apple, dentre outras.
Essa nova realidade tem sido comprovada, gradativamente, por inúmeras pesquisas que
indicam, de forma contundente, a adesão crescente ao home office e que essa condição
permanecerá no futuro.
Pesquisa da ISE Business School, de maio de 2020, junto a 518 executivos brasileiros
evidenciou dados relevantes a favor do home office: 1) Gestores de empresas nacionais e
multinacionais concordam que a experiência com esta modalidade de trabalho tem sido
positiva (respectivamente para 80% e 83%); 2) Eles admitem que o home office contribui
para melhorar a eficiência e a produtividade (respectivamente 60 % e 65%) e 3) as
preocupações com a família não atrapalham a concentração no trabalho ( para 70% para
os gestores entrevistados).(MENEZES, 23/05/2020, p. B8)
Outra pesquisa, realizada pela FIA e FEA/USP (JAKITAS, 28/06/2020, p.B7) e que
analisou percepção do home office por mais de 1.500 empregados em cargos de média e

5
alta gestão, nos meses de abril a junho de 2020, concluiu que a avaliação desta experiência
foi positiva e 70% deles confessaram que gostariam de continuá-la mesmo após o fim da
pandemia. Esta alternativa de trabalho foi destacada mesmo nos casos em que a jornada
de trabalho superou as 8 horas diárias e, apesar de não receberem, em boa parte dos casos,
ajuda das empresas no que diz respeito aos equipamentos e ao custeio das despesas com
energia elétrica e internet.
Os responsáveis pela pesquisa entendem que a avaliação positiva pode ser explicada por
vários motivos e apontam pelo menos dois deles: a) o trabalho em casa livra os
empregados de um tempo significativo utilizado para o deslocamento da residência para
a empresa; e b) estar trabalhando em home office significa a garantia da manutenção do
emprego, o que é fundamental em situações de crise.
Inúmeras empresas, após vivenciarem a prática do teletrabalho, tomaram a decisão de
aderir a ele de forma permanente, convictas de que ele deve ser considerado fortemente
porque implica, quase sempre, em redução significativa dos custos fixos, levando-se em
conta o aluguel, condomínio, estacionamento, manutenção e alimentação dos
funcionários, sobretudo, para aquelas sediadas em determinadas capitais brasileiras. Elas
reconhecem que há necessidade de se estabelecer regras para o bom andamento dos
trabalhos, mas destacam o fato de poderem, desta forma, reduzir a estrutura hierárquica.
Principalmente, chamam a atenção para a importância estratégica da comunicação,
indispensável para manter o relacionamento, incrementar a motivação e promover o
alinhamento. Outras empresas admitem que deverão transformar os escritórios em
ambientes de convivência e que o contato direto, olho no olho, entre os funcionários não
precisa acontecer durante todo o tempo, embora possa não ser eliminado totalmente.
(CAMPOS; BIGARELLI, 06 a 08/06;2020, p.B2).
O debate sobre o home office, no entanto, deve continuar por algum tempo, visto que ele
impõe algumas mudanças importantes, no que diz respeito ao modelo de liderança, à
comunicação e pode, para determinados perfis de trabalhadores, gerar alguma incerteza.
Pesquisa da consultoria Robert Half, junto a 800 profissionais brasileiros, embora
conclua, como a maioria das já realizadas sobre esta temática, pela avaliação positiva do
home office (em termos de produtividade, qualidade de vida), identificou, também, uma
preocupação:
...há um receio para um terço daqueles que não acham ‘nada provável’
trabalhar apenas em casa de perder oportunidades. É o velho ditado do
‘quem não é visto, não é lembrado. Aquela conversa de corredor e, até

6
de certa forma, a política que o escritório pode trazer, são sentidas nesse
momento.” (VALOR ECONÕMICO, 06 a 08/06/2020, p.B2.)
Pesquisa da JLL, uma multinacional do setor imobiliário, tida como uma das mais
conceituadas administradoras de escritórios em todo o mundo, que entrevistou mais de 3
mil pessoas, constatou uma realidade, que agora se torna mais evidente com a pandemia:
“os patrões não veem mais a necessidade de presença do escritório para aferir
produtividade” e “há outras prioridades para os escritórios”:
O espaço de um negócio é bem mais relevante para funções como
promover colaboração (segundo 50% dos entrevistados), agilidade de
decisões (48%), atração de talentos e inovação (ambos com 42%).
(SCHELLER; SCARAMUZZO, 19/07/2020, p. B6)
Qualquer que seja a decisão, no entanto, há uma certeza: a arquitetura interna dos
escritórios deverá ser alterada drasticamente, para dar atenção a questões de segurança e
isso significa que haverá uma densidade “populacional” menor, incremento da
higienização, redução dos contatos e que o próprio momento do cafezinho coletivo poderá
perder o “seu sabor”.

A capacitação nas novas tecnologias


A exigência do trabalho remoto trouxe à tona a discussão, que já era travada com alguma
intensidade, sobre a utilização (em particular, as vantagens e desvantagens) das novas
tecnologias de comunicação e de informação, que têm protagonizado uma vertiginosa
aceleração digital.
Destacam-se, a esse respeito, a importância estratégica das plataformas que favorecem a
interação, ampliam a audiência e a circulação de informações, responsáveis pela
multiplicação de eventos, debates e conversas na web. Essas plataformas, como o Google
Meet e o Zoom, dentre outras, têm se aperfeiçoado com rapidez, incorporando,
gradativamente, novas funções, que potencializam a comunicação das empresas e
organizações com os seus públicos internos e externos.
Os comunicadores, de uma hora para outra, tiveram que se capacitar para dar conta destas
novas ferramentas, muitas vezes sem a ajuda da estrutura técnica (o indispensável setor
de TI) das empresas, como acontecia normalmente. quando as suas atividades eram
desenvolvidas internamente nos locais de trabalho. Agora, sem o suporte técnico, eles
ficaram por sua conta e risco e sentiram a necessidade de fazer um upgrade urgente nos
equipamentos disponíveis em casa, de aumentar a sua velocidade de conexão e de

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incorporar novos programas e aplicativos que lhes permitem participar de forma
competente dos desafios inerentes à comunicação digital.
Entregues à própria sorte, os comunicadores passaram a ter mais autonomia e mais
responsabilidade na gestão de suas atividades, mesmo porque agora não podem mais ficar
na dependência (acabou a zona de conforto!) das ordens e conselhos das chefias, que
esperam ansiosamente que seus subordinados tomem a iniciativa. Os comunicadores
passaram, também, a gerenciar o seu próprio tempo, os seus momentos de descanso, a
sua agenda de trabalho que, para muitos, ficou mais sobrecarregada, porque a
flexibilização dos horários, a priori uma vantagem, estendeu, em contrapartida, a jornada
para os três períodos do dia (manhã, tarde e noite).
Gerenciar o microfone (para evitar que ele capte conversas paralelas, opiniões e sons
inconvenientes) e a câmera (que pode registrar flagrantes não esperados) constitui, de
agora em diante, uma realidade para os que participam dos encontros virtuais que exigem
protocolos e etiquetas adequados, a serem rigorosamente obedecidos.
O uso intensivo das plataformas digitais para conversas coletivas on-line tem provocado
mudanças relevantes no planejamento das gigantes da tecnologia e, já nos primeiros
meses da pandemia, convictas de que essa utilização só tenderia a crescer, o Facebook, o
WhatsApp e muitas outras empresas, com foco prioritariamente na comunicação digital,
têm anunciado projetos para ingressar ou ampliar a sua participação neste modelo de
negócios.

Mídias sociais: entre o céu e o inferno


As mídias sociais têm mantido, ao longo de toda esta trajetória dolorosa de contaminação
global pelo novo coronavírus, sua condição de protagonista fundamental do processo de
comunicação, em função de suas virtudes e de suas vulnerabilidades.
Ao mesmo tempo em que elas se consolidaram, inclusive na comunicação organizacional,
como ambiente essencial para o relacionamento das organizações com os seus públicos
estratégicos e com a sociedade de maneira geral, firmaram sua contribuição negativa ao
estabelecimento de um debate democrático. Durante esta etapa sombria da ação agressiva
da covid-19, elas foram utilizadas para disseminar informações fraudulentas, para acirrar
a polarização de ideias e posições e para afrontar a reputação de pessoas, grupos e
instituições.
As mídias sociais, reconhecidamente, contribuíram para o incremento da interação, para
a troca de informações e conhecimentos, para “aproximar” as pessoas que,

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presencialmente, estavam distantes, reféns de uma política acertada de isolamento social.
Elas potencializaram o contato entre as chefias e os seus subordinados e, quando
gerenciadas de forma competente, permitiram que o engajamento e a mobilização dos
públicos internos se mantivessem em nível razoável, dadas as circunstâncias da
pandemia.
O deslocamento das conversas organizacionais para os ambientes virtuais trouxe, no
entanto, riscos razoáveis para a segurança das informações corporativas e propiciaram,
de forma inimaginável, a invasão da privacidade dos cidadãos e das empresas.
A ausência de um sistema de regulação adequada do processo de comunicação
desenvolvido nas mídias sociais, a ineficácia do monitoramento e da punição aos desvios
éticos inerentes à sua utilização de forma irresponsável, e muitas vezes até criminosa,
ampliaram a circulação de narrativas de ódio, de intolerância e de desrespeito aos
princípios da ética e da cidadania.
As pessoas, já traumatizadas pelo impacto brutal da pandemia, que tem vitimado
familiares, colegas, amigos e celebridades, tiveram que conviver também com a ação
nefasta de grupos organizados que, sob a justificativa de exercerem a liberdade de
expressão, têm promovido o linchamento moral e ameaças à integridade física dos que
escolheram como adversários, sobretudo no campo da política e dos costumes. A
manifestação abusiva de preconceitos de credo, gênero ou raça, para citar apenas alguns
deles, tem provocado rupturas na democracia, exigindo a presença da Justiça, em suas
esferas mais elevadas (como o Supremo Tribunal Federal), para estabelecer parâmetros
mínimos de convivência.
O Facebook, por exemplo, sofreu campanha violenta (“Stop Hate for Profit”) e perdeu,
em poucas semanas, inúmeros patrocinadores de peso ao ser acusado de omissão ao
permitir a manifestação sem controle de mensagens consideradas como lesivas à
democracia e aos direitos civis.
Assistimos a episódios extremamente tensos, como os protestos raciais nos Estados
Unidos, em virtude da violência policial contra negros (caso George Floyd, assassinado
de forma covarde no dia 25 de maio de 2020, em Minneapolis), que se estenderam para
vários países e que, em consequência, desencadearam a destruição de estátuas
centenárias, especialmente na Europa, erguidas em homenagem a colonizadores brancos
que dizimaram populações negras na África em sua ação de conquista de novos
continentes (em especial, a África e a América).

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Em todo o mundo, inúmeras marcas tiveram que reavaliar os seus portfólios de produtos
e suas campanhas de publicidade para excluir menções preconceituosas a traços
identificados com as populações negras. No Brasil, a Bombril foi obrigada a retirar do
mercado a esponja de aço Krispinha após manifestação intensa de pessoas pela associação
do produto, que foi lançado há décadas, com o cabelo negro das mulheres negras. Nos
Estados Unidos, as marcas Aunt Jemima (Tia Jemima), da PepsiCo e a Uncle Ben´s, da
Mars, também foram estigmatizadas e estão se aposentando porque suas origens
remontam aos tempos da escravidão e à imagem dos negros como cidadãos de categoria
inferior.
A reação generalizada à “circulação desenfreada de mensagens de ódio” (no Brasil, há
evidências de que elas, em muitos casos, se originam de salas localizadas no Palácio do
Planalto, em Brasília, conhecidas como “gabinetes do ódio”) tem culminado com a ação
do Congresso Nacional, empenhado em debater e aprovar um projeto de lei sobre fake
news, Este projeto , segundo pesquisa Ibope, realizada em maio de 2020, junto a
aproximadamente mil pessoas acima de 16 anos, em todos os Estados e no Distrito
Federal, é apoiado por 90% dos brasileiros.
Ele tem gerado, no entanto, grande controvérsia, com vozes discordantes em relação à
sua constitucionalidade e ao seu impacto na vida democrática. Ele prevê regras para os
provedores de redes sociais, prega a identificação das contas (condenando o anonimato),
mas contribui para estimular o debate sobre os limites da “liberdade de expressão” e a
abertura para a invasão da privacidade e o estabelecimento de um sistema de censura
prévia.
A comunicação interna além dos muros
A prática do home office legitimou uma realidade que já estava em transformação antes
da pandemia: a consolidação do processo de comunicação com os públicos internos
(empregados, servidores) como algo que se realiza, também ou até mesmo
prioritariamente, fora dos muros das empresas ou organizações.
O isolamento social tornou inevitável que o contato com os funcionários (e dos
funcionários entre si) ocorresse sobretudo (em alguns casos, de forma exclusiva)
virtualmente, pelo uso do sistema de e-mail e, principalmente, pelas mídias sociais
(WhatsApp, em particular).
Essa condição, mesmo em grupos privados, favorece a circulação de informações
externamente e abre brechas para que as mensagens não se limitem mais aos seus
destinatários, que mantêm vínculos formais com as empresas, e sejam facilmente

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compartilhadas. Torna-se difícil, quase impossível, manter o sigilo das informações e das
conversas que “ganham o mundo”, sendo utilizadas também, por funcionários,
descontentes com a postura de determinadas empresas durante a pandemia, para subsidiar
ações trabalhistas e documentar os abusos à legislação.
É preciso lembrar que, em função da crise provocada pela covid-19, muitas organizações
recorreram à redução da jornada e do salário e mesmo à suspensão de contratos de
trabalho e demissão em massa. Empregados penalizados com essas medidas podem
disseminar informações que, a priori, teriam permanecido nos limites das empresas, com
riscos à segurança das informações e a exposição ampla de posturas e decisões
empresariais.
Outras práticas também têm sido incorporadas no processo de gestão de pessoas e é
possível destacar as que definem a relação das empresas com os novos funcionários que,
em boa parte neste período não tiveram contato presencial com seus chefes e com os
colegas, e que foram submetidos a um sistema particular de integração (“onboarding”).
O novo cenário exigiu dos gestores de Recursos Humanos criatividade e esforço para que
a integração destes novos trabalhadores fosse realizada de forma adequada, o que
significa (ainda que pareça difícil à primeira vista) promover o seu engajamento e
compromisso com os valores e objetivos institucionais.

O impacto no jornalismo e na comunicação organizacional


A pandemia também deu uma nova chance ao jornalismo tradicional que, pela adesão
crescente às mídias sociais, sobretudo das novas gerações, estava sendo submetido a um
processo gradativo de desvalorização.
A consciência de que os ambientes virtuais, como já mencionamos neste texto, tem
incentivado a circulação de informações imprecisas ou fraudulentas (por
desconhecimento ou má fé daqueles que a produzem) empoderou novamente os grandes
players do jornalismo em nosso país, que passaram, em virtude da demanda por notícias
atualizadas e confiáveis, a dedicar espaço e tempo significativo à sua veiculação.
O jornalismo foi considerado, a exemplo de algumas outras atividades (cuidados com a
saúde, comercialização de remédios e de alimentos) como essencial e os profissionais de
imprensa passaram a atuar, de maneira mais intensiva, na linha de frente, sobretudo
cobrindo os impactos da pandemia na saúde e na economia. Esta condição tem tido como
consequência a contaminação (e mesmo a morte) de muitos colegas da mídia. Eles têm
sido expostos mais facilmente à ação do vírus, em jornadas estressantes, que incluem

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noites mal dormidas e abalos psicológicos resultantes do contato com ambientes
insalubres, medo permanente e contato com situações que se mostram terríveis,
especialmente para os mais sensíveis.
Relatório do Centro de Pesquisa em Comunicação & Trabalho, da ECA/USP, coordenado
pela profa. Roseli Fígaro que investigou o trabalho dos comunicadores durante a
pandemia, trouxe dados reveladores. Para a maioria deles, a jornada de trabalho
aumentou, em alguns casos, em até 40%, e o ritmo de trabalho também se acelerou com
a prática do home office. Os comunicadores que participaram da pesquisa (quase 600)
declararam que houve uma intensificação do trabalho e o uso generalizado de aplicativos,
criando uma situação de permanência on-line por um tempo prolongado. Para os
responsáveis pela pesquisa,
as mensagens vindas via aplicativos demandam resposta imediata e
assim faz-se um círculo virtuoso de aceleração, intensificação e
produtividade. Ampliam-se também as horas à disposição para o mundo
do trabalho, pois o home office é um estar em casa disponível para o
trabalho todo o tempo, graças à ubiquidade das redes sociais e seus
aplicativos. (FIGARO, 2020, p.56).
Eles complementam, analisando criticamente esta nova condição de trabalho:
A manutenção do status online desses trabalhadores em seus
dispositivos e aplicativos pode ser lida como uma faceta do capital que
se vale das tecnologias para vigiar trabalhadores e consumidores para
deixá-los sempre em estado de alerta (24 horas por dia, sete dias na
semana) para trabalhar ou consumir... (FIGARO, 2020, p. 56)
A pesquisa também constatou que, principalmente os jornalistas, usam mais o WhatsApp,
além de outros recursos como o e-mail, o Telegram e o Messenger, e que a infraestrutura
disponível para a realização das atividades está longe da ideal, visto que, em casa, os
comunicadores não podem contar com os softwares a que estavam acostumados nos
locais de trabalho, com computadores mais atualizados e mesmo com uma velocidade de
conexão compatível com as necessidades de acesso a informações e produção no ritmo
exigido pela intensificação do trabalho.
Dividir o espaço do trabalho com os familiares não tem sido uma tarefa fácil e, com isso,
as rotinas habituais foram alteradas, gerando preocupação, ansiedade e estresse, de tal
modo que “o resultado de tudo isso é a sensação de cansaço constante e de insegurança...”
(FIGARO, 2020, p.60)
Os comunicadores manifestaram, ainda, seu receio em relação ao novo coronavírus,
sobretudo pelo fato de muitos deles, sobretudo os jornalistas que atuam na linha de frente
e não se mantêm obrigatoriamente de forma exclusiva em home office, estarem mais

12
vulneráveis ao contágio. Com certeza, se a pesquisa tivesse sido realizado um pouco mais
à frente no tempo (ela se encerrou em abril de 2020) essa preocupação seria ainda maior
porque, particularmente de maio em diante, o número de infectados e de óbitos cresceu
exponencialmente, vitimando, inclusive, um número significativo de comunicadores,
jornalistas em especial..
É preciso lembrar também que os veículos jornalísticos e a imprensa de maneira geral
sofreram ataques frequentes do Poder Executivo, em especial do presidente da República,
que, repetidamente, em suas lives, postagens nas mídias sociais (Twitter, sobretudo),
vídeos e declarações no “cercadinho do Palácio do Planalto, se referia à categoria de
forma desrespeitosa, quando não ameaçadora.
A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), que monitora ataques contra o jornalista
realizados pelo presidente da República, divulgou, no início de julho, que, no primeiro
semestre de 2020,
“foram registradas 245 ocorrências (...) sendo 211 categorizadas como
descredibilização da imprensa, 32 ataques pessoais a jornalistas e 2
ataques contra a FENAJ. São quase dez ataques ao trabalho jornalístico
por semana, neste ano.”(FENAJ, 02/07/2020).
Segundo ela,
Para além dos números, os dados mostram que as notícias sobre as
ações do governo ou a postura do presidente sobre diversos assuntos
transformam a imprensa em sua “inimiga”, com a construção de uma
narrativa de ataques com o objetivo de promover a descredibilização do
trabalho jornalístico e da credibilidade da produção de notícias.
Algumas vezes o presidente coloca a imprensa e os jornalistas como
“inimigos do País”, por conta de coberturas que o desagradam. (FENAJ,
02/07/2020).
A agressão e a ofensa aos jornalistas e aos órgãos de imprensa, evidentemente, não se
limitou ao Brasil. A ABRAJI – Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, em
parceria com uma dezena de organizações da sociedade civil, elaborou um dossiê sobre
estas ameaças, intitulado “182 dias de contrastes: a situação da imprensa na América
Latina”, que contabilizou, de janeiro a junho de 2020, um total de 630 ataques contra
jornalistas em 11 países da América Latina. Este dossiê é fruto do projeto regional Voces
del Sur, criado em 2017, com o objetivo de defender a liberdade de expressão e a imprensa
na América Latina. O relatório constatou agressões físicas, inclusive mortes de
jornalistas, prisões arbitrárias, fechamento de veículos jornalísticos e restrições ao acesso
a informações.

13
A valorização da imprensa em tempos de pandemia é inconteste. Pesquisa do Datafolha,
realizada em março, que ouviu 1.558 brasileiros, indicou que o jornalismo profissional é
a fonte mais confiável para a obtenção de notícias sobre a Covid-19, em oposição às
mídias sociais que são percebidas como responsáveis pelo processo crescente e perigoso
de desinformação.
Segundo o levantamento, programas jornalísticos da TV (61%) e
jornais impressos (56%) lideram no índice de confiança sobre o tema,
seguidos por programas jornalísticos de rádio (50%) e sites de notícias
(38%). Em posição oposta à imprensa profissional estão os conteúdos
que vêm de WhatsApp e Facebook. Nas duas plataformas, apenas 12%
dizem confiar em informações sobre o coronavírus. Nelas, o índice dos
que dizem não confiar nas informações atinge 58% (WhatsApp) e 50%
(Facebook). (ANJ,23/03/2020)
Dados recentes mostram também que a audiência dos jornais e dos programas
jornalísticos em rádio e TV cresceu significativamente durante a pandemia. Segundo
dados do Google Analytics, as edições digitais e os sites de alguns jornais bateram
recordes no primeiro semestre de 2020: o jornal Folha de S. Paulo registrou quase 177
milhões de visitas, em abril de 2020, superando a marca anterior de outubro de 2019, às
vésperas das eleições. Se considerarmos os exemplares digitais, veremos que a Folha de
S. Paulo passou de 218 mil, em 2019, para uma média de 250 mil, enquanto o jornal O
Globo oscilou de 202 mil exemplares para 2030, na comparação entre 2019 e este período
de 2020. O Estado de S. Paulo também experimentou incremento em suas edições digitais
(10 mil a mais do que em 2019) e o Valor Econômico cresceu 20 mil exemplares em 2020
(81 mil contra 61 mil em 2019). (NEGÓCIOS DA COMUNICAÇÃO, 2020).
Resultado significativo também foi registrado para emissoras de TV que dedicam boa
parte de sua programação para a veiculação de noticiário sobre a pandemia e o exemplo
mais emblemático é a Globonews, que tem mais de 20 horas diárias para o jornalismo ao
vivo. O canal conseguiu ser, nos primeiros meses da pandemia (março a junho), o canal
de maior audiência na TV paga, com um total, no período, de mais de 24 milhões de
telespectadores (FOLHA DE S. PAULO, 22/06/2020).
Estes dados reforçam a necessidade, sentida pela sociedade e pelos cidadãos
individualmente, de estarem respaldados em informações e fontes confiáveis, para se
orientarem durante a pandemia, ainda que existam grupos organizados, não
comprometidos com a ética, a transparência e a cidadania, interessados em alimentar a
infodemia.

14
Não foi, porém, apenas o Jornalismo, dentre as atividades tradicionais da comunicação,
que se valorizou diante da ameaça da Covid-19. As Relações Públicas, a Comunicação
Organizacional e, mesmo o Marketing e a Propaganda, que se mantiveram em sintonia
com os valores defendidos na contemporaneidade (como a ética, a transparência, a
igualdade social, a sustentabilidade, os direitos humanos, a liberdade de expressão), têm
se fortalecido como atividades fundamentais para garantir a “saúde dos negócios” das
companhias.
O discurso das empresas que prega a importância da comunicação estratégica e integrada,
mas que, em muitos casos, não a implementa em sua plenitude, tem passado por
importante reformulação e, agora, é mais fácil reconhecer que aqueles que produzem estas
narrativas a favor da comunicação estão, cada vez mais, agindo com sinceridade.
As situações de crise – e esta crise sanitária é certamente a mais dramática dos tempos
modernos – acabam, quase sempre, exigindo que as pessoas e as organizações reflitam
sobre a conveniência e a adequação de suas posturas.
A comunicação organizacional e as diversas competências em comunicação passaram a
ocupar lugar de destaque não apenas no discurso, mas na prática das organizações, mesmo
porque a consciência do enorme impacto da crise (em sua dimensão econômica, política,
institucional, financeira, além da sanitária) evidenciou o protagonismo da comunicação
(e dos comunicadores).
É possível imaginar que, finalmente, a alta administração das companhias se convenceu
de que não é possível superar os desafios enormes colocados pela pandemia sem um
esforço e uma excelência no relacionamento com os públicos estratégicos e com a opinião
pública.
A realidade do trabalho remoto, com o distanciamento obrigatório dos empregados, exige
que sejam implementados e processos e fluxos de comunicação capazes de manter o
engajamento, a produtividade e o vínculo indispensável com os valores e os objetivos
institucionais. Um novo modelo, apoiado em uma nova mentalidade, deve ser construído
para fazer emergir lideranças autênticas, capazes de mobilizar os funcionários e de
planejar alternativas que permitam não apenas superar a crise, mas traçar novos caminhos
para as organizações no futuro.
As novas rotinas do home office podem contribuir para que os comunicadores disponham
de tempo (ainda que, de imediato, a pressão seja grande para a continuidade do trabalho
e a manutenção do ritmo) para uma reflexão mais profunda sobre o planejamento de sua

15
carreira e, sobretudo, para a necessidade de conciliar seus interesses profissionais e
pessoais.
A crise provocada pela pandemia deixou claro para os comunicadores, e os trabalhadores
em geral, que é necessário dispor de um plano B, porque, de uma hora para outra, por
motivos alheios à sua vontade, e sem que tenham culpa, os empregos podem ir embora e
que eles precisam estar em condições de retomar a sua vida profissional, perfeitamente
capacitados e dispostos para trilharem novos caminhos.
A pandemia aponta para a importância do desenvolvimento de ações empreendedoras,
para a necessidade de cultivar a autonomia e a coragem, para o risco da acomodação a
uma zona de conforto que, cada vez menos, garante estabilidade no emprego, tendo em
vista a concorrência acirrada e as mudanças que ocorrem, de forma acelerada e intensa,
no universo da comunicação.
A comunicação organizacional, apesar dos percalços deste momento, da precarização do
emprego, da degradação dos direitos trabalhistas, e das pressões de chefias que ainda
estão amarradas a uma visão ultrapassada (dinossáurica!) de liderança, sairá fortalecida
desta crise. Diferentemente das cidades que foram brutalmente abaladas pela ação
agressiva do novo coronavírus, a comunicação organizacional não precisou e não
precisará decretar o lockdown. Os comunicadores devem estar mobilizados para impedir
que isso aconteça.

Referências bibliográficas
ANJ. Datafolha: Jornalismo é a fonte mais confiável sobre a COVID-19, enquanto
redes sociais têm baixa credibilidade. 23/03/2020. Disponível em:
https://www.anj.org.br/site/component/k2/73-jornal-anj-online/27131-datafolha-
jornalismo-e-a-fonte-mais-confiavel-sobre-a-covid-19-enquanto-redes-sociais-tem-
baixa-credibilidade.html. Acesso em 29/07/2020.
CAMPOS, Stela; BIGARELLI, Barbara. Companhias já aderem ao home office
permanente. Valor Econômico. 06 a 08/06/2020, p. B2.
FENAJ. Presidente Bolsonaro promove 245 ataques contra o jornalismo no primeiro
semestre. 02/07/2020. Disponível em: https://fenaj.org.br/presidente-bolsonaro-
promove-245-ataques-contra-o-jornalismo-no-primeiro-semestre/. Acesso em
28/07/2020.
FIGARO, Roseli (org). Como trabalham os comunicadores em tempos da pandemia
da Covid-19? São Paulo: ECA/USP, 2020. Disponível em:
http://www2.eca.usp.br/comunicacaoetrabalho/wp-

16
content/uploads/Relat%C3%B3rio_Executivo_Covid19-_CPCT2020-2.pdf. Acesso em
28/07/2020.
FOLHA DE S. PAULO. Líder na TV paga, Globonews contabiliza 24 milhões de
telespectadores em cem dias de pandemia. 22/06/2020. Disponível em:
https://telepadi.folha.uol.com.br/lider-na-tv-paga-globonews-contabiliza-publico-de-24-
milhoes-em-cem-dias-de-pandemia/. Acesso em 29/07/2020.
JAKITAS, Renato. Executivos aprovam home office, aponta pesquisa. O Estado de S.
Paulo. 28/06/2020, p.B7.
MENEZES, Carla. Home office é aprovado por 80% dos gestores de empresas no País.
O Estado de S. Paulo. 23/05/2020, p. B8.
NEGÓCIOS DA COMUNICAÇÃO. Jornalismo cresce em audiência na pandemia do
coronavírus. 2020. Disponível em:
https://portaldacomunicacao.com.br/2020/05/jornalismo-cresce-em-audiencia-na-
pandemia-do-coronavirus/. Acesso em 29/07/2020.
O ESTADO DE S. PAULO. Google vai manter escritórios fechados até julho de 2021.
28/07/2020, p. B10.
SCHELLER, Fernando; SCARAMUZZO, Mônica. Pandemia impõe dilema sobre
escritório. O Estado de S. Paulo, 19/07/2020, p. B6.
VALOR ECONÔMICO. Funcionários aprovam, mas temem ser esquecidos. 06 a
08/06/2020, p. B2.
VOCES DEL SUR. 182 dias de contrastes. Janeiro a Junho de 2020. Disponível em:
https://view.genial.ly/5f1f9da5c2b34d0d9cf08281. Acesso em 28/07/2020.

17
Assessor de imprensa é ou não é jornalista?

Ana Maria Dantas de Maio


Victor Dantas de Maio Martinez
Introdução
O objetivo deste capítulo é atualizar análises anteriores já feitas pela academia sobre a
polêmica relação entre a assessoria de imprensa e a prática do jornalismo, mais
especificamente sobre conflitos de interesse no exercício simultâneo das duas atividades.
Durante a coleta de dados em campo, foi possível observar a rejeição ao termo “assessor
de imprensa”, devido à evolução que a comunicação organizacional vivenciou nas últimas
décadas. Hoje, o profissional que atua em ambiente corporativo entende que seu trabalho
extrapola a definição clássica de “assessoria de imprensa”, que se consolidou no país entre
os anos de 1970 e 1980.
Mas a história dessa polêmica atividade remete ao início do século 20, quando os
primeiros esforços de divulgação institucional no âmbito público foram registrados no
Brasil. Na iniciativa privada, as primeiras assessorias iniciavam suas atividades na década
de 1950 (DUARTE, 2008).
As controvérsias sobre a nomenclatura da atividade vão muito além das tarefas incluídas
em sua rotina. No mundo todo, não há consenso sobre os profissionais que devem atuar
nas assessorias. Esse estudo ouviu 253 comunicadores por meio de um questionário
online para saber o que eles pensam sobre o assunto. A proposta é abordar o tema sob três
perspectivas: técnica, jurídica e ética. Os resultados indicam que a grande maioria dos
profissionais consultados vê algum conflito de interesses quando jornalistas atuam em
redações e em assessorias simultaneamente.
Comunicadores consultados utilizaram termos ligados à técnica, à ética e à formação
superior para fundamentar suas respostas à pergunta “Assessor de imprensa é jornalista?”.
De certa forma, a abordagem jurídica também revela o viés tecnicista e teleológico nas
últimas decisões tomadas por tribunais envolvendo a questão. Uma delas, de 2019, do
Tribunal Superior do Trabalho (TST), tem potencial para afetar diretamente a prática
profissional no país.
Proposta metodológica
Pesquisas bibliográfica e documental permeiam todo o estudo, que buscou na literatura
das ciências da comunicação e do direito trabalhos já consolidados sobre a origem e a

18
prática da assessoria de imprensa no Brasil e em outros países. A busca por esse
conhecimento prévio permitiu contextualizar o assunto antes de apresentar os resultados
levantados nesta pesquisa.
Decisões jurídicas sobre o exercício da assessoria de imprensa e sua relação com a função
de jornalista foram consultadas, na tentativa de apresentar outro olhar para o tema. A
decisão de ouvir profissionais da área antes de produzir este artigo se respalda exatamente
na polêmica que envolve a questão. A própria denominação de “assessoria de imprensa”
parece incomodar comunicadores que atuam ou já atuaram na área. A intenção foi trazer
para o debate jornalistas e assessores como forma de enriquecer a discussão.
A consulta online foi feita por meio de formulário Google na semana de 9 a 15 de
novembro de 2019. O questionário, intitulado “Assessor de imprensa é jornalista?”, tinha
cinco perguntas, sendo quatro fechadas e uma aberta. O link de acesso foi enviado por
meio do aplicativo WhatsApp e por e-mail à rede de contatos de jornalistas que atuam em
redações, em organizações, na academia, em outras áreas e que estão desempregados1,
com pedido para que repassassem aos seus conhecidos. A intenção inicial era que apenas
jornalistas respondessem, mas outros profissionais da comunicação acabaram
contribuindo.
No dia 15 de novembro, o formulário foi encerrado com 260 retornos recebidos. Na fase
de processamento, foram descartadas sete respostas consideradas repetidas – o que foi
possível constatar devido ao texto idêntico da resposta à pergunta aberta e ao horário
aproximado do envio, capturado pelo formulário.
Os dados das perguntas fechadas foram processados em planilha Excel por um
especialista em estatística2. A pergunta aberta foi interpretada com a ajuda do software
AntConc 3.5.8, um concordanciador utilizado em estudos de linguística. A ferramenta
permite mensurar a frequência de palavras no corpus de pesquisa, bem como avaliar o
contexto em que elas são mencionadas.
Diferentemente da análise de conteúdo, o concordanciador é um instrumento que permite
conhecer os termos ou expressões mais frequentes no texto, independente de categorias.
Antes da análise é preparada e aplicada uma stoplist (listagem com palavras ou expressões

1
Como a primeira autora atua na comunicação organizacional da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária), houve o cuidado de não enviar as perguntas para grupos de comunicadores da empresa,
tentando evitar um viés nas respostas. Dos mais de 200 comunicadores da organização, apenas dois
receberam o link da fonte original. Essa medida não garante, no entanto, que outros profissionais de
comunicação da Embrapa tenham respondido à pesquisa por outras vias de acesso.
2
Agradeço ao apoio do engenheiro Vernon Richard Kohl. 19
sem relevância para o estudo) e esses vocábulos são excluídos. Sem eles, o corpus da
pesquisa ficou com 3.590 termos.
Os resultados são indicadores que ajudam na interpretação das respostas, mas não
substituem a leitura integral do material, que ocorreu em dezembro de 2019. Essa leitura,
somada à experiência profissional da primeira autora – que já atuou em redações, na
academia e em assessorias –, permitiu validar o resultado.
Convém sempre lembrar que, nas ciências humanas e sociais, o conhecimento não é
exato. Assim, a interpretação apresentada a seguir é uma, entre tantas outras possíveis
dentro do campo da comunicação – e da linguística.

Peculiaridades da prática profissional no Brasil


No Brasil, historicamente, a assessoria de imprensa ou de comunicação é exercida
também por jornalistas, que muitas vezes integram equipes compostas por outros
comunicadores – relações públicas, publicitários, designers, profissionais do marketing,
entre outros. Duarte (2008) explica como os jornalistas ocuparam esse espaço e aborda a
questão ética, relativizando a visão de que apenas o jornalista de redação teria uma postura
isenta.
Uma redação não tem monopólio da ética ou da competência. E a
assessoria de imprensa pode, em muitos casos, ter uma vantagem, afinal
produz informação com determinado enquadramento, assumidamente
posicionada, mas, necessariamente, verdadeira, e que será submetida
aos filtros jornalísticos, até mesmo de questionamento e confrontação
com outras fontes. Isso nem sempre ocorre nos veículos de
comunicação de massa, que se postulam como imparciais e
independentes, mas veiculam, em variadas circunstâncias, informações
editadas de acordo com sua linha editorial e interesses. Não há, assim,
vício de origem. (DUARTE, 2008, p. 95).

Mais de um terço dos profissionais consultados e boa parte da discussão científica sobre
o assunto indicam preocupações com o dilema ético envolvendo a prática do jornalismo
em redação e em assessoria. Para Marques, Miola e Siebra (2014), a orientação dos
empregadores é fator condicionante para a atuação de jornalistas e assessores.

Uma dimensão geralmente omitida no debate sobre os princípios do


Jornalismo e as tensões entre profissionais e estudiosos da área quando
confrontados com a atividade de AI [assessoria de imprensa] se refere
ao papel das instituições quanto ao direcionamento do trabalho de quem
lida com a informação. As organizações não podem ser pensadas de
maneira isolada na medida em que moldam os campos de atuação e
estabelecem diretrizes de trabalho. (MARQUES; MIOLA; SIEBRA,
2014, p. 161).

20
Assim como Duarte, a observação dos autores não dissocia a conduta profissional de
jornalistas e assessores dos diferentes tipos de organizações que os contratam. Essa
discussão embasa, inclusive, a permissão para o exercício da assessoria de imprensa em
outros países.
Em Portugal, o profissional que decide trabalhar com assessoria de imprensa precisa
abdicar da função de jornalista. Ao se filiar à Comissão da Carteira Profissional de
Jornalista, “o profissional tem que assinar um documento em que se compromete a
devolver a carteira se for trabalhar como assessor de imprensa” (BUCCI, 2000, p. 124).
O veto vale para a atuação simultânea e a carteira pode ser devolvida se o jornalista voltar
a trabalhar exclusivamente em redações.
A legislação e códigos de ética da União Europeia distinguem com determinação as duas
atividades, como forma de resguardar o interesse público na produção e consumo de
informações.
O atual quadro legal, ético e de costumes da assessoria de imprensa e
do jornalismo na União Europeia permite manter esperanças na
independência dos jornalistas e do sistema jornalísticos, assegurando ao
mesmo tempo a qualidade da informação que circula no espaço público.
(MOUTINHO; SOUSA, 2008, p. 79).

Nos Estados Unidos, a assessoria de imprensa é uma prática profissional de relações


públicas e “relacionamento com a mídia” é uma das habilidades requeridas. De acordo
com Amaral (2008, p. 67), não há obrigatoriedade “de ‘carta’, ‘registro’ e diploma para
assessores de relações públicas, de imprensa, e jornalistas exercerem seus ofícios”.
No Brasil, a comunicação corporativa ganhou impulso na década de 1980, quando as
empresas passam a entender e valorizar os resultados da assessoria. De acordo com Bueno
(2009, p. 7), foi nessa época que a comunicação empresarial “ganhou status nas
organizações e passou, efetivamente, a se constituir em um campo de trabalho profícuo,
atraindo profissionais de todas as áreas”, com destaque para jornalistas e relações
públicas.
Desde o início, houve uma predisposição no país a contemporizar impasses éticos
envolvendo a prática profissional. “Submetido a exigências conflitantes, o jornalista
assessor de imprensa foi capaz, no Brasil, de criar padrões de comportamento aceitáveis
para um lado e para outro” (DUARTE, 2008, p. 94).
Do ponto de vista histórico, não é difícil compreender como jornalistas começaram a atuar
nas assessorias. Geralmente oriundos de redações, eles conheciam bem a rotina dos
colegas jornalistas e mantinham relações que poderiam facilitar divulgações empresariais.

21
Além disso, a comunicação empresarial mantinha – e ainda mantém – a prática de
produzir informativos internos ou externos para divulgar informações para diferentes
públicos.
Jornalistas, em geral, dominam as técnicas de pauta, entrevistas, redação de notícias,
diagramação, fotografia, filmagem, revisão e edição de textos, áudios e imagens, além de
outras atividades que fazem parte da rotina de assessores. No entanto, a comunicação
empresarial evoluiu nas últimas décadas (DUARTE, 2008) e o trabalho passou a
incorporar outras tarefas e exigir novas habilidades. A atuação conjunta com outros
comunicadores passou a ser indispensável.
Gestão de relacionamentos, comunicação interna, planejamento estratégico, produção de
conteúdo, acompanhamento de métricas em redes sociais, elaboração e execução de
políticas de comunicação, auditoria de imagem na mídia, uso estratégico da comunicação
face a face no ambiente corporativo, gestão da imagem em redes sociais, gestão da
inovação, gestão de informação e do conhecimento: apenas a comunicação integrada,
resultado de uma atuação conjunta entre profissionais de diferentes formações, é capaz
de atender às demandas atuais das organizações. Essas novas atribuições permitem
entender por que boa parte dos comunicadores empresariais rejeita a nomenclatura
“assessoria de imprensa”.
E mesmo aqueles profissionais que continuam atuando “apenas” como assessores de
imprensa também precisaram evoluir porque a relação com a mídia mudou. Processos
como a segmentação, a digitalização e o enxugamento das redações impõem aos
assessores outras atitudes e habilidades. “As exigências são significativamente maiores e,
para atendê-las, o assessor de imprensa precisa, mais do que nunca, ser um estrategista,
um gestor de comunicação” (BUENO, 2014, p. 177).

O que pensam os comunicadores


A consulta feita aos comunicadores revela que 66,4% dizem acreditar que assessor de
imprensa é, sim, jornalista. Responderam que não 12,6% e outros 20,9% indicaram a
alternativa “depende” (figura 1). O cruzamento estatístico permite identificar que o “sim”
é menor entre os profissionais que atuam em redação, aqueles que não se enxergaram nas
categorias pré-definidas3 e entre aqueles que se formaram em jornalismo, mas atuam em
outras áreas.

3
No survey, 2,8% da amostra se identificaram como outros, incluindo três relações públicas, dois redatores
de conteúdo e dois com outras combinações.

22
Figura 1. Assessor de imprensa é jornalista?

Você considera que assessor de imprensa é jornalista?

12,6%

20,9%

66,4%

Não Depende Sim

Fonte: Elaborada pelos autores


Outro dado interessante é que a percepção de que “assessor não é jornalista” diminui à
medida em que aumenta o tempo de carreira do profissional. A faixa do “depende”, ou
seja, daqueles que relativizam a questão, é maior entre os profissionais que estão há mais
tempo no mercado de trabalho (figura 2).

Figura 2. Tempo de carreira e percepção sobre a atuação

Tempo de carreira x assessor é jornalista?


100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Menos de 5 anos De 5 a 10 anos De 11 a 20 anos Mais de 21 anos

Não Depende Sim

Fonte: Elaborada pelos autores


Quase a metade dos respondentes (49%) se identificou como assessor de imprensa.
Outros 13,8% disseram ser formados em jornalismo, mas atuam em outras áreas; 13,4%
dos consultados foram identificados como jornalistas de redação. Veja abaixo (figura 3)
todas as qualificações:

23
Figura 3. Atuação profissional dos respondentes

Atualmente você atua principalmente como: 2,8%

6,7%
7,1%

7,1%
Assessor(a) de imprensa 49,0%

Sou formado (a) em jornalismo, mas atuo em outra área 13,4%

Jornalista de redação
Na academia 13,8%

Nas duas áreas simultaneamente


Sou jornalista ou assessor(a), mas estou desempregado(a)
outros

Fonte: Elaborada pelos autores


a) Olhar jurídico
A análise jurídica sobre o tema ganha relevância em função de uma decisão de 2019 do
Tribunal Superior do Trabalho (TST) que desconsiderou a atividade de assessoria de
imprensa como jornalística. Avaliar o assunto sob a perspectiva jurídica envolve estudar
três dimensões nas quais a matéria se apresenta: na legislação, na doutrina e na
jurisprudência. Em sua categorização das fontes do direito (que são os instrumentos pelos
quais o direito se faz inteligível), Dimoulis (2011) explica que a legislação, em seu sentido
amplo, abrange diversas espécies normativas (e não somente “leis”, em sentido estrito);
que a doutrina é a produção intelectual e teórica do direito; e que a jurisprudência é o
conjunto de decisões uniformes (ou ainda dominantes, assentadas, pacificadas) dos
tribunais.
a.1) Legislação
Na Constituição Federal, o artigo 220 garante que a manifestação do pensamento, a
criação, a expressão e a informação não sofrerão qualquer restrição, observado o texto
constitucional – reforçando valores de liberdade de expressão e informação, já
consagrados no artigo 5º. Já o parágrafo 1º do artigo 220 estabelece que nenhuma lei pode
“constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de
comunicação social”.
Desses dispositivos depreende-se que a atividade jornalística é considerada essencial para
a ordem social do Estado Democrático de Direito brasileiro, de modo que a plena
liberdade de imprensa – que, em termos fáticos, será concretizada pelo exercício
profissional do jornalista – é protegida pelo texto constitucional.

24
Na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o ofício do jornalismo também recebe
destaque, com seção dedicada à profissão entre os artigos 302 e 306. Destacam-se o artigo
302 e seus parágrafos, que tentam definir o empregado e a empresa do ramo:

Art. 302 - Os dispositivos da presente Seção se aplicam aos que nas


empresas jornalísticas prestem serviços como jornalistas, revisores,
fotógrafos, ou na ilustração, com as exceções nela previstas.

§ 1º - Entende-se como jornalista o trabalhador intelectual cuja função se


estende desde a busca de informações até a redação de notícias e artigos
e a organização, orientação e direção desse trabalho.

§ 2º - Consideram-se empresas jornalísticas, para os fins desta Seção,


aquelas que têm a seu cargo a edição de jornais, revistas, boletins e
periódicos, ou a distribuição de noticiário, e, ainda, a radiodifusão em
suas seções destinadas à transmissão de notícias e comentários.

Por fim, em termos legislativos há também o Decreto-Lei nº 972/69, ainda vigente e que
elenca atividades desempenhadas pelos jornalistas profissionais, entre elas a redação,
condensação, titulação, interpretação, correção ou coordenação de matéria a ser
divulgada, contenha ou não comentário; entrevista, inquérito ou reportagem, escrita ou
falada; e execução da distribuição gráfica de texto, fotografia ou ilustração de caráter
jornalístico, para fins de divulgação.
É importante observar que tanto as definições da CLT quando do Decreto-Lei nº 972 são
de caráter tecnicista, não preocupadas com a teleologia da profissão (a finalidade do fazer
jornalístico), de modo ligeiramente diverso de como se entende a proteção ao jornalismo
na Constituição Federal – conforme aponta a doutrina jurídica que será discutida a seguir.
a.2) Doutrina
Ao comentar o título “Da Ordem Social” do capítulo “Da Comunicação Social” (V) da
Constituição Federal, trecho que é inaugurado pelo já referido artigo 220, Novelino
(2014, p. 977) pondera que “em virtude do papel fundamental que os meios de
comunicação desempenham em uma sociedade democrática, a Constituição conferiu ao
exercício desta liberdade por intermédio da imprensa uma proteção especial”.
Sobre a liberdade de imprensa, o autor afirma ainda que ela é uma forma
institucionalizada do direito de informar, essencial para a construção de uma sociedade
democrática (NOVELINO, 2014, p. 490). Dessa leitura entende-se que a Constituição
Federal conferiu proteção especial ao exercício do jornalismo em decorrência da
finalidade do fazer jornalístico e sua utilidade à democracia. Conforme antecipado, esse

25
compromisso com questões de teor público/político não aparece na CLT e no Decreto-
Lei sobre a profissão, que assumem uma perspectiva tecnicista.
Na ótica da doutrina trabalhista, o jornalista é tido como um trabalhador intelectual
(afinal, apesar da descrição tecnicista, essa valoração é expressa no artigo 302 da CLT),
em um conjunto com outras profissões tais quais médicos, professores, químicos,
engenheiros, artistas, economistas (DELGADO, 2019). Cassar (2017, p. 306) aponta que:
Trabalhadores intelectuais ou profissionais são aqueles empregados que
têm especial cultura científica ou artística. Distinguem-se daqueles que
exercem serviços manuais ou meramente técnicos por dois motivos:
desenvolvem trabalhos intelectuais ou artísticos e porque o grau de
dependência e subordinação é mais tênue, pois executam seu trabalho
com mais autonomia.

Sobre a necessidade de capacitação profissional, Delgado (2019) ressalta uma


peculiaridade no que diz respeito à profissão do jornalista: apesar de ser um trabalho
considerado intelectual (logo, científico ou artístico), houve decisão do Supremo Tribunal
Federal afastando a exigência de diploma e registro para exercício da profissão –
conforme será analisado na jurisprudência sobre o jornalismo.
a.3) Jurisprudência
Em 2009, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), fundamentada no mesmo
artigo 220, afetou de maneira mais direta a prática profissional do jornalismo: o Supremo
derrubou a exigência de diploma para o exercício da profissão no Brasil, no julgamento
de um recurso extraordinário4. No caso, a Corte entendeu que impor a exigência do
diploma à prática do jornalismo seria uma restrição que violaria a liberdade de imprensa
prevista no artigo 220.
No ano seguinte, 88 cursos de jornalismo deixaram de existir no país, de acordo com
resultados do Censo da Educação Superior do Inep (INSTITUTO NACIONAL DE
ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2018), vinculado ao
Ministério da Educação5 (Figura 4).
Por fim, em um julgamento mais recente e na seara trabalhista, o Tribunal Superior do
Trabalho determinou que a atividade de assessoria de imprensa não poderia ser

4
Recurso Extraordinário (RE) é aquele usado na Justiça Comum para levar à Suprema Corte a discussão
sobre a constitucionalidade ou não de algum fato. No caso dos diplomas, o RE foi o 511.961.
5
Esse dado considera apenas o curso específico de Jornalismo, assim identificado pelo Inep no Censo da
Educação Superior. Os cursos que, em geral, se enquadram na área de Comunicação Social (publicidade e
propaganda, relações públicas, marketing, radiojornalismo, cinema e vídeo, comunicação institucional,
entre outros) mantiveram a oferta nos anos seguintes à decisão do Supremo. 26
enquadrada como jornalística, em recurso de revista6. Na ação, uma jornalista diplomada
disse ter trabalhado de maio de 2011 a março de 2015 para a Empresa Brasileira de
Comunicação Produção Ltda., de São Paulo, realizando tarefas de assessoria de imprensa,
como redação de textos jornalísticos distribuídos para agências de notícias e para sites
corporativos e produção de revistas institucionais e eletrônicas.

Figura 4. Evolução dos Cursos de Jornalismo e Comunicação Social


Cursos de Jornalismo e Comunicação Social no Brasil
2009-2018
400 1.600
350 1.400
300 1.200
250 1.000
200 800
150 600
100 400
50 200
0 0
2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018

Jornalismo (escala vertical à esquerda)


Comunicação Social (escala vertical à direita)

Fonte: Censo da Educação Superior do Inep – elaborada pelos autores

A profissional pediu seu enquadramento como jornalista e o reconhecimento do direito à


jornada especial de cinco horas, a fim de receber diferenças referentes a horas extras. Ela
perdeu na primeira instância, mas o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) reconheceu o
enquadramento no recurso ordinário, que depois foi negado pelo tribunal superior.
A ministra responsável por relatar o acórdão, Maria Cristina Peduzzi, argumentou que,
na assessoria de imprensa, “a essência da atividade não é a busca da verdade dos fatos,
mas a construção da imagem da empresa” (ASSESSORA..., 2019). O assessor estaria
mais alinhado com os interesses do cliente, enquanto o jornalista, com a verdade dos fatos
– assumindo, como critério de distinção das ocupações, a perspectiva mais teleológica da
Constituição, em detrimento da mais tecnicista da legislação trabalhista.
a) Abordagem técnica
A análise do concordanciador corrobora a interpretação das 253 respostas abertas à
pergunta “Você considera que assessor de imprensa é jornalista?”. O corpus (já com a
exclusão da stoplist) indicou maior frequência de termos técnicos para explicar o
posicionamento dos respondentes. No total, foram 269 citações, sendo 33 literalmente

6
Recurso de revista (RR) é um termo jurídico da Justiça do Trabalho e é utilizado para se levar uma
discussão ao tribunal superior. No caso, trata-se do RR 2102-13.2015.5.02.0026.

27
indicando palavras como “técnica”, “técnicas”, “tecnicamente”, “habilidades”, entre
outras, e 236 vocábulos associados às práticas de jornalismo, como “releases”, “pautas”,
“entrevistas”, “notícia”, “divulgação”, entre outras.
Também nesta linha de interpretação aparece a preocupação dos respondentes com a
formação acadêmica dos profissionais. Termos como “diploma”, “formados”,
“faculdade”, “graduação”, “universidade”, “formação” e outros apareceram 100 vezes no
corpus avaliado. Seguem algumas respostas, na íntegra, que ilustram as argumentações
captadas pelo software.
“O Assessor produz notas, notícias, reportagens, releases como um jornalista.
Tecnicamente faz trabalho semelhante. Como se a empresa fosse sua editoria. A
diferença é que as pautas são sempre positivas.”

“Sou jornalista por formação e atuo como assessora de imprensa há 20 anos. Uso as
habilidades de jornalista na minha rotina profissional.”

“Um bom trabalho de assessoria exige apuração, coleta de dados, escrita excelente.
Tudo isso aprendemos durante a formação de jornalista.”

Observa-se, assim, forte presença de argumentos envolvendo o conjunto de técnicas


jornalísticas e a formação acadêmica dos profissionais para justificar as respostas sobre a
interrelação das duas ocupações. Ou seja, os entrevistados recorrem ao conhecimento
técnico para fundamentar que jornalistas e assessores são atuações compatíveis.
b) Perspectiva ética
O concordanciador também indicou a atenção dos respondentes para questões ligadas ao
conflito de interesse e à ética no exercício da assessoria de imprensa. Em 96 ocasiões,
surgiram palavras como “conflito”, “verdade”, “imparcialidade”, “ética”, “imoral” e, com
maior destaque, “interesse” ou “interesses” (que apareceram 43 vezes). As respostas
abaixo foram algumas obtidas durante a consulta e contemplam essa percepção:
“O assessor de imprensa precisa defender a empresa. O jornalista de redação, embora
de forma velada, também defende a sua, falando ou omitindo fatos dependendo da
vontade de seus superiores.”

“Na maioria das vezes, o profissional que presta assessoria se vê obrigado a abrir mão
de um dos mais elementares princípios que regem o bom jornalismo; a imparcialidade.
Mesmo tendo conhecimento da técnica jornalística para elaborar textos e outros

28
conteúdos, o assessor está atrelado aos interesses de determinadas organizações ou
mesmo do poder público.”

“Há um limite muito tênue na atuação de ambos. Assessor é jornalista por conta de sua
formação acadêmica. Mas não pode ser jornalista no momento de atuar no mercado ao
misturar os interesses do seu assessorado com a facilidade de acesso na divulgação das
ações na imprensa.”

Os argumentos acima refletem a preocupação de entrevistados com o conflito de


interesses que envolve as duas carreiras – basicamente o interesse público, da sociedade,
e os interesses privados, de organizações atendidas pelos assessores.
Uma questão quantitativa do questionário também indicou preocupações com o conflito
de interesse. O gráfico abaixo (figura 5) revela que apenas 7,9% dos 253 respondentes
indicaram ver “nenhum conflito” entre profissionais que exercem o jornalismo e a
assessoria ao mesmo tempo. Os itens 2, 3, 4 e 5 são crescentes e representam uma escala
que vai de “algum conflito” até “conflito total”. Ou seja, do total de entrevistados, 92,1%
disseram entender que existe ao menos algum conflito de interesse no exercício
simultâneo das duas atividades.

Figura 5. Percepção sobre conflito de interesse

Você considera que há conflito de interesses em profissionais


que atuam em redação e em assessoria simultaneamente?

7,9%
9,1%
26,9%

34,4%
21,7%

1 (nenhum conflito) 2 3 4 5 (conflito total)

Fonte: Elaborada pelos autores


As abordagens jurídica, técnica e ética, aqui detalhadas, buscam ampliar a visão sobre o
tema e não defender posicionamentos. Há que se considerar, ainda, uma perspectiva que
foi apenas mencionada anteriormente, sem ampla discussão: a cultural. O exercício
simultâneo da assessoria de imprensa por jornalistas não apenas é aceito como é
considerado normal no Brasil. A academia, vez ou outra, questiona. Os cursos superiores

29
de comunicação ensinam práticas de assessoria a jornalistas. Artigos como este buscam
tão somente fomentar o debate entre estudiosos e profissionais.

Considerações finais
A análise sobre a prática do jornalismo na assessoria de imprensa deve, portanto, ser
compreendida a partir de dimensões diversas, descartando-se uma análise simplista que
responda “sim” ou “não” à pergunta título deste capítulo. Do ponto de vista técnico, a
maioria dos comunicadores entrevistados entende que sim, assessores e jornalistas
utilizam o mesmo conhecimento, as mesmas ferramentas e os mesmos procedimentos em
suas rotinas: pautam, entrevistam, escrevem e publicam matérias.
Já a dimensão da ética – a mais polêmica – divide até mesmo a própria categoria. Embora
a maioria (66%) dos consultados considere que assessor de imprensa é jornalista, ao
menos 92% enxergam algum conflito de interesse quando as duas atividades são
exercidas simultaneamente. Essa abordagem coincide com as preocupações da União
Europeia sobre o assunto, que impede jornalistas de atuarem como assessores.
O dilema ético fundamenta ainda a decisão jurídica do TST, que desconsiderou a
Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) e optou por um argumento baseado na
suposta diferença de finalidade das duas funções – uma busca a verdade dos fatos e outra
a construção da imagem de uma empresa. Embora ainda caiba recurso, para o Tribunal
Superior do Trabalho, em março de 2019, assessor de imprensa não poderia ser
considerado jornalista. Essa decisão, se confirmada, trará reflexos para o exercício da
profissão de jornalista e de assessor de imprensa no Brasil. No entanto, ainda é cedo para
antecipar possíveis efeitos na formação, no enquadramento e na prática profissional, bem
como na legislação que regulamenta a profissão.
A evolução da assessoria de imprensa no Brasil, no entanto, possui peculiaridades que a
diferenciam dos modelos adotados em outros países. Culturalmente, o ambiente
corporativo aceita que jornalistas atuem na assessoria e a própria academia forma
profissionais para essa função. A barreira que a Justiça ameaça impor restringe vantagens
financeiras, mas não limita o exercício da profissão. A ver.

Referências
AMARAL, Luiz. Assessoria de imprensa nos Estados Unidos. In: DUARTE, Jorge
(Org.). Assessoria de imprensa e relacionamento com a mídia: teoria e técnica. 2. ed.
São Paulo: Atlas, 2008. p. 52-68.

30
ASSESSORA de imprensa não consegue ser enquadrada como jornalista. Notícias do
TST, Brasília, 29 mar. 2019. Disponível em: http://www.tst.jus.br/noticias/-
/asset_publisher/89Dk/content/assessora-de-imprensa-nao-consegue-ser-enquadrada-
como-jornalista. Acesso em: 19 nov. 2019.

BUCCI, Eugênio. Sobre ética e imprensa. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

BUENO, Wilson da Costa. Comunicação empresarial: políticas e estratégias. São


Paulo: Saraiva, 2009.

______. Comunicação empresarial: da rádio peão às mídias sociais. São Bernardo do


Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2014.

CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do trabalho. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense; São
Paulo: Método, 2017.

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr,
2019.

DIMOULIS, Dimitri. Manual de introdução ao estudo do direito. 4. ed. São Paulo:


Revista dos Tribunais, 2011.

DUARTE, Jorge. Assessoria de imprensa no Brasil. In: ______ (Org.). Assessoria de


imprensa e relacionamento com a mídia: teoria e técnica. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
p. 81-102.

INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO


TEIXEIRA. Sinopses Estatísticas da Educação Superior – Graduação. Brasília, 2018.
Disponível em: http://portal.inep.gov.br/web/guest/sinopses-estatisticas-da-educacao-
superior. Acesso em: 5 jan. 2020.

MARQUES, Francisco Paulo Jamil Almeida; MIOLA, Edna; SIEBRA, Nayana.


Jornalismo, assessoria de imprensa e seus condicionantes organizacionais: uma reflexão
a partir das teorias do jornalismo. Animus, Santa Maria, v. 13, n. 25, p. 145-166, 2014.
Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/animus/article/view/9068/pdf. Acesso em: 19
jan. 2020.

MOUTINHO, Ana Viale; SOUSA, Jorge Pedro. In: DUARTE, Jorge (Org.). Assessoria
de imprensa e relacionamento com a mídia: teoria e técnica. 2. ed. São Paulo: Atlas,
2008. p. 69-80.

NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense;


São Paulo: Método, 2014.

31
O impacto das mídias sociais no processo
de relacionamento com a mídia
Anelisa Maradei

Introdução
Falar em Comunicação Corporativa na atualidade é falar em mudanças. As razões para
essas transformações em curso são muitas (profissionalização da área acelerada a partir
da década de 1980, percepção crescente da Comunicação como estratégica para as
organizações, criação do Código de Defesa do Consumidor na década de 1990,
globalização etc). Mas, entre as mais relevantes mudanças que têm impactado o cenário
da Comunicação Organizacional, está a chegada das novas tecnologias da informação e
comunicação.
Em primeiro lugar, em meados dos anos 1990, a Internet7 começou sua trajetória de
popularização como plataforma de comunicação cotidiana. Em segundo lugar, na esteira
da internet, surgiram as mídias sociais digitais, como Facebook8, criado em 2004; o
Youtube9, que surgiu em 2005 e foi comprado pelo Google em 2006; o WhatsApp10, que
nasce em 2009 , sendo em 2014 adquirido pelo Facebook; e o Instagram11, criado em
2010 e também adquirido pelo Facebook em 2012.
As mídias sociais digitais permitem que as pessoas se conectem em redes sociais
(Castells, 1999), num processo que dá aos cidadãos a possibilidade de comentar
conteúdos da imprensa e de outras mídias, criar novos temas de debate, sobrepor
perspectivas e participar do processo de produção da informação. Embora o conceito de
redes sociais não seja novo, com o advento da internet, ele ganha mais visibilidade e
relevância. Uma rede é “formada por pessoas que se conectam porque têm um objetivo,

7
ÉPOCA Negócios. Brasil é 2º em ranking de países que passam mais tempo em redes sociais.
Disponível em: < https://epocanegocios.globo.com/Tecnologia/noticia/2019/09/brasil-e-2-em-ranking-de-
paises-que-passam-mais-tempo-em-redes-sociais.html>. Acesso em 13 jun 2020.
8
KLEINA, NILTON. A história do Facebook, a maior rede social do mundo [vÍdeo]. Disponível em: <
https://www.tecmundo.com.br/mercado/132485-historia-facebook-maior-rede-social-do-mundo-
video.htm>. Acesso em 4 maio 2020.
9
BRASIL Escola. Youtube. Disponível em: < https://brasilescola.uol.com.br/informatica/youtube.htm>.
Acesso em: 18 abr 2020.
10
MAQUES, Julia. Quem inventou o Whatsapp? Veja oito curiosidades sobre a história do app. Tech Tudo.
Disponível em: <https://www.techtudo.com.br/listas/2019/01/quem-inventou-o-whatsapp-veja-oito- 32
curiosidades-sobre-a-historia-do-app.ghtml>. Acesso em: 28 abr 2020.
11
WIKIPÉDIA. Instagram. Disponível em: < https://pt.wikipedia.org/wiki/Instagram>. Acesso em: 16
maio 2020.
um assunto ou propósito em comum. A partir do encontro virtual ou presencial entre elas,
da conversa, da interação, da troca de histórias, percepções, opiniões, surgem novas
conexões, conhecimentos, ideias, soluções e respostas” (GUARALDO; SEINO, 2020, p.
182). Mas, como sustentam as autoras, nas redes sociais digitais ocorre um “tipo de
interação não hierárquica, de pessoa a pessoa, caracterizada pela confiança mútua, pela
reciprocidade entre emissor e receptor no fluxo de informações, e pela comunhão de
interesses e objetivos” (p.183).
Com advento das mídias sociais online surge a possiblidade de conexão em rede, pela
internet. Houve alterações substanciais na forma de exercer diversas atividades, em vários
campos: trabalho, educação, consumo, entretenimento etc. Também nas práticas da
Comunicação Corporativa emergiram novas formas relacionais, novas possibilidades de
associação. Surgiram outras maneiras de se exercer a prática profissional, tanto no âmbito
das relações com os públicos internos, quanto com os diversos públicos externos de
interesse. Exemplo disso é a revolução ocasionada pelas formas de se comunicar dentro
das empresas, motivada pelo Workplace, ferramenta do Facebook, que ganha cada vez
mais espaço na interação entre os públicos internos.
Podemos citar ainda o uso crescente das mídias sociais proprietárias de empresas para dar
as versões oficiais dos fatos em momentos de crises organizacionais. Como exemplo
temos o reconhecido Blog da Petrobras “Fatos e Dados”12, que já conta com mais de 35
milhões de visitas, e que tem por objetivo dar transparência aos dados da companhia e
tornar público o posicionamento oficial da empresa.
São muitas as iniciativas de organizações que demonstram que a tecnologia tem trazido
mudanças na forma de relacionamento e comunicação entre organizações e sociedade:
chatbots para atendimento a clientes, áudio releases, apps para imprensa, lives com
investidores, canais no Youtube com tutoriais, blogs corporativos, entre outras. Para se
aproximar de seus públicos de interesse de forma efetiva e direta, além de muito mais
interativa e envolvente, a criatividade e a tecnologia têm entrado em ação.

12
BLOG Petrobras. Fatos e Dados. Disponível em: <https://petrobras.com.br/fatos-e-dados/sobre-o-
blog/>. Acesso em 07 jun 2020.

33
Mas, no presente texto, interessa-nos um recorte específico no tocante à observação do
impacto das mídias sociais digitais13 e das novas tecnologias da informação e
comunicação nas atividades cotidianas dos profissionais da área de Comunicação.
Buscamos investigar como se expressam os sentidos e as relações de comunicação no
universo de trabalho de um grupo específico de profissionais. São eles:
1) Os assessores de comunicação, profissionais que atuam em agências e consultorias
terceirizadas e que têm, historicamente, a função estratégica de mediadores entre as
organizações e a imprensa;
2) Os profissionais de comunicação corporativa que exercem suas funções dentro das
organizações, como gestores de comunicação, analistas e gerentes, muitas vezes se
relacionando diretamente com a imprensa, outras levando informações das instituições
em que atuam à mídia por meio de suas agências terceirizadas.
3) Os jornalistas da grande imprensa, imprensa especializada e blogueiros
Jornalistas, assessores e profissionais que operam na comunicação corporativa das
organizações (diretores, gerentes, analistas de comunicação etc) têm demonstrado
reflexos em suas práticas profissionais decorrentes dos impactos da tecnologia em suas
atividades. Mas, na verdade, tais impactos são ocasionados pelas transformações culturais
que ela fomenta. São alterações no exercício cotidiano das tarefas e nas mediações dos
sentidos entre esses grupos de profissionais, como veremos no decorrer de nossas análises
e articulações nas próximas páginas.
Como proposto por Thompson (2014), em A Mídia e a Modernidade, os meios de
comunicação são um dos vários fatores que moldam a formação das sociedades modernas,
mas eles próprios só podem ser entendidos adequadamente em termos sociológicos.
Assim também as mídias sociais, enquanto meios de comunicação, devem ser entendidas
e “analisadas em relação às formas de ação e interação que o seu uso provoca”
(THOMPSON, 2018, p. 18). O autor sugere que: [...] o uso dos meios de comunicação
está relacionado à criação de novas formas de ação e interação, novos tipos de relações
sociais e novas formas de relacionamento com os outros e consigo mesmo (p.19).

13
Embora alguns autores entendam as redes sociais digitais como espaços onde se aglutinam pessoas com
interesses comuns na internet e as mídias sociais digitais as ferramentas utilizadas para a comunicação na
internet, neste trabalho, em muitos momentos, mídias sociais e redes sociais aparecerão como sinônimos,
até em decorrência do uso dos termos por parte dos respondentes. Lembramos, porém, que algumas das
mídias analisadas são, ao mesmo tempo, redes e mídias sociais digitais, caso do Facebook e Twitter, por
exemplo. 34
Nesse sentido, entendemos que esses grupos profissionais se utilizam das mídias sociais
digitais para realização de tarefas profissionais, mas também para manifestar sua
compreensão de mundo atual. “Cada tecnologia carrega em si potencialidades para
determinados usos, que, de certa forma, influenciam os atores humanos que com ela terão
contato” (CARVALHO; RUBLESCKI; BARICHELLO, 2015, p. 116). Uma perspectiva
relacional e não apenas transmissional, numa complexa circulação de sentidos
Percurso Metodológico
O nosso desejo de verificar como se encontra o relacionamento entre esses grupos
de profissionais partiu inicialmente da observação participante de um grupo existente no
Facebook, chamado DR entre Assessores e Jornalistas. Nessa rede social digital,
jornalistas solicitam fontes, assessores oferecem pautas, mas também há desabafos sobre
práticas profissionais, maus tratos entre colegas de profissão ou práticas pouco pertinentes
ao campo de atuação. Ao acompanhar a ambiência, rica em conteúdo, percebemos um
campo fértil que nos motivou a estruturar a pesquisa.

Imagem 1: Exemplo de post do Grupo DR entre assessores e jornalistas

Fonte: Grupo Privado no Facebook: DR entre assessores e jornalistas. Disponível em:


<https://www.facebook.com/groups/231567910280762/>. Acesso em: 14 maio 2020.

35
Imagem 2: Exemplo de post do Grupo DR entre assessores e jornalistas

Fonte: Grupo Privado no Facebook: DR entre assessores e jornalistas. Disponível em:


<https://www.facebook.com/groups/231567910280762/>. Acesso em: 14 maio 2020.
A pesquisa, qualitativa foi estruturada nos meses de janeiro e fevereiro e aplicada entre
março e abril. A tabulação e redação foi feita entre maio e junho de 2020. No total, foram
entrevistados 30 profissionais, que responderam a questionários, por e-mail
(complementados por Whatsapp), contendo 16 perguntas. Selltiz (1987) ressalta as
vantagens do questionário em relação à entrevista: “ele evita vieses potenciais do
entrevistador”, além de deixar o respondente mais “à vontade para expressar pontos de
vista” (Selltiz, 1987, p.16).
Minayo (2001) entende que a pesquisa qualitativa, metodologia por nós utilizada, se
preocupa com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja,
ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações,
crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais
profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem
ser reduzidos à operacionalização de variáveis. (Minayo, 2001, p.
21,22)
No tocante ao perfil dos respondentes de imprensa, podemos dizer que foi bastante
diversificado. Havia, entre os entrevistados, editores, repórteres e colunistas.
Profissionais de grande imprensa (Folha de S. Paulo, R7, Diário do Comércio de São
Paulo), mídia segmentada e técnica (Revista UpPharma, voltada ao setor farmacêutico,
Portal CalltoCall, direcionado ao segmento de telecom, Meio & Mensagem, que trata de
temas relacionados ao universo da Propaganda e Marketing), entre outros. Havia ainda
blogs, portais, além de mídia impressa na amostragem, conforme demonstrado na Tabela
1.

36
Foram entrevistados, no total, quatro jornalistas do sexo masculino e seis do sexo
feminino com idades que variaram de 30 a 68 anos. Todos os profissionais tinham mais
de sete anos de experiência na profissão.

Tabela 1
Perfil dos Jornalistas Entrevistados

Tempo Tempo
Cargo Sexo Idade Veículo no cargo na área
1 ano e
repórter masc 35 Tudo celular.com meio 17 anos
editor masc 68 Diário do Comércio 5 anos 49 anos
editora fem 53 Portal R7 6 anos 32 anos
editor masc 39 Meio e Mensagem 5 anos 18 anos
colunista fem 49 Portal R7 3 anos 27 anos
editora fem 51 Blog Cinquenta com Pimenta 7 anos 31 anos
repórter fem 42 Blog da Maturidade 9 meses 19 anos
editora fem 53 Revista UP Pharma 22 anos 30 anos
repórter fem 30 Folha de S Paulo 4 anos 7 anos
editor masc 65 Call to call 20 anos 40 anos

Fonte: elaboração da autora

Já os profissionais que responderam à pesquisa pelas empresas, como demonstram as


tabelas a seguir, foram divididos em dois subgrupos. O primeiro, o dos que atuam em
agências de comunicação e realizam o trabalho como prestadores de serviços das
organizações e propagam suas informações à mídia. No total, entrevistamos nove
mulheres e um homem. Havia profissionais de agências de pequeno e de grande porte,
como RPMA e G&A. Outros tiveram passagem por grandes agências e hoje operam em
negócio próprio. Foram dois profissionais com cargo de sócios, seis diretores, um
coordenador, um executivo de atendimento e um assessor de imprensa.
Essa nomenclatura de cargos é muito controversa, pois pode haver diretores que são
sócios, ou diretores que são funcionários, assim como há agências que não dão ao assessor

37
de imprensa e ao executivo de atendimento exatamente o mesmo status. Da mesma forma,
um diretor de uma grande agência, como a RPMA, talvez tenha menos atribuições
operacionais que o de uma agência de menor porte. Entretanto, não temos a pretensão de
dar conta de todas essas variáveis, mas de trazer contribuições para um debate sobre o
uso das mídias sociais digitais por esses três grupos de profissionais de forma mais
abrangente. No que se refere às contas atendidas por esses profissionais, podemos dizer
que são as mais diversas, de grandes indústrias, passando por franquias até startups e
restaurantes.
Tabela 2
Perfil dos Profissionais de Agências de Comunicação

Tempo no Tempo
Cargo Sexo Idade Veículo cargo na área
Diretora Fem 35 PUBLIKAI 6 meses 5 anos
ENGAJE
Sócio Masc 50 COMUNICAÇÃO 7 anos 28 anos
MERLO
Diretora Fem 38 COMUNICAÇÃO 3 18
TRADE
Diretora Fem 52 COMUNICAÇÃO 24 30
Coordenadora
de
Comunicação Fem 27 ABOUTCOM 5 meses 6 anos
Executiva de
Atendimento Fem 26 G&a 8 meses 5 anos
Diretora de
Atendimento Fem 50 RPMA 13 anos 30 anos
Assessor de MARKABLE
imprensa Fem 27 COMUNICAÇÃO 15 dias 7 anos
Diretora Fem 45 Mandarina 3,5 anos 24 anos
Sócia Fem 50 Expressão Máxima 20 anos 20 anos
Fonte: elaboração da autora
Por fim, o terceiro e último grupo por nós entrevistado foi o de profissionais que atuam
dentro de empresas de diversos segmentos, mas que também realizam interlocução com

38
a imprensa, algumas vezes direta, outras indiretamente, por meio da elaboração de
planejamento estratégico. De qualquer forma, o objetivo desses profissionais é divulgar
temas de interesse de suas organizações, consolidando a imagem e reputação das marcas.
Entre as empresas que participaram da pesquisa estão gigantes como: Gol Linhas Aéreas,
Mastercard, Grupo CCR, Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, Mercedez-
Benz do Brasil, Via Varejo, Siemens, entre outras.

Tabela 3
Profissionais que atuam como Executivos de Comunicação

Tempo
Tempo
Cargo Sexo Idade Veículo na
no cargo
área
Coordenador 7 anos
de fem 48 anos Via Quatro 1 ano e6
comunicação meses
Gerente de 2 anos e 12
fem 33 anos Mastercard
comunicação meio anos
Coordenadora
20
de fem 39 anos CCR 2 anos
anos
comunicação
Gerente
executiva de 20
fem 44 anos CCEE 15 meses
relações anos
institucionais
Analista de
fem 26 anos Mercedez 5 anos 7 anos
comunicação
Coordenadora
19
de fem 37 anos Via Varejo 2 anos
anos
comunicação
2 anos
Analista de 1 ano e 5
fem 23 anos Siemens e5
comunicação meses
meses
Analista de 10
fem 29 anos Porto Seguro 2 anos
comunicação anos
Coordenadora 1 ano e
1 ano e 5
de fem 46 anos Engie 5
meses
comunicação meses
Gerente de 25
fem 46 anos Gol 1 ano
comunicação anos
Fonte: Elaboração da autora
Todos os respondentes desse grupo eram do sexo feminino, tinham entre 23 e 48 anos.
Esse foi o grupo de respondentes mais jovens de nossas análises, e ocupavam os seguintes
cargos: 4 coordenadores de comunicação, 3 gerentes de comunicação e 3 analistas. Para

39
preservar a identidade dos entrevistados, não usaremos em nenhuma tabela o nome dos
profissionais.
Além da pesquisa empírica, complementamos nossas observações, com revisão
bibliográfica, utilizando da reflexão de estudiosos que vem investigando sobre a as
mudanças de comportamento dos atores sociais na ambiência das redes sociais digitais
(BENKLER, 2006; CASTELLS, 1999, 2015; LEMOS; LÉVY, 2010), o cenário da
precarização do mercado da profissão de jornalismo(GUEDES, 2004; LELO, 2019) e o
universo da comunicação corporativa (BUENO, 2003; SILVA NETO, 2010;
GUARALDO; SEINO, 2020).

Empresas, Assessores e Jornalistas


É importante ressaltar, que, por décadas, o processo de comunicação corporativa, no que
tange ao relacionamento com a imprensa, se estabeleceu da seguinte forma: organizações
do setor público e privado utilizavam-se de suas assessorias de comunicação para
propagar informações, via mídia, aos mais diversos stakeholders. O processo era
basicamente o seguinte: as fontes eram as organizações públicas e privadas. As agências
contratadas por essas organizações acionavam os mediadores dos fatos, os jornalistas, que
levavam as notícias até a sociedade por meio dos veículos de comunicação de massa.
Esse fluxograma parece ter caído por terra, ou, ao menos, em muitos momentos foi
reconfigurado. Como sustenta Lemos, no prefácio da obra O futuro da Internet “A
transformação da esfera midiática [...] retira das mídias de massa o monopólio na
formação da opinião pública e da circulação da informação. Surgem novas mediações e
novos agentes...” (Lemos e Levy, 2010, p.25). Para Benkler (2006), dentro da mesma
perspectiva, há a possibilidade de ação de múltiplos atores sociais, que passam a ser
produtores de informação.
Além disso, se antes havia, como proposto por Pereira (2015, p. 204) “uma única história,
a história contada pelas organizações, hoje há sobre elas muitas diferentes histórias
contadas por diversos atores sob distintos pontos de vista”. Isso implica, como proposto
pelas autoras, em novas formas de se estabelecer relações de poder (CASTELLS 2015).
Mas, não se trata simplesmente de observar a forma como a notícia é atualmente mediada,
mas sobretudo como as relações profissionais se processam e são impactadas diante das
novas tecnologias da comunicação e informação. Buscamos estabelecer discussões que
respondam à seguinte pergunta problema: Quais os principais impactos, desafios e
oportunidades que as novas tecnologias da informação e comunicação têm imposto ao

40
trabalho dos profissionais que estão interconectados na missão de levar informações sobre
as organizações à sociedade?
O primeiro aspecto que cabe aqui ponderar é a razão de as empresas se comunicarem. Em
busca de sucesso em mercados altamente competitivos, as empresas ambicionam
construir, a partir da comunicação, um “capital cultural” (BOURDIEU, 1984). Procuram
comunicar seus propósitos, divulgar seus produtos e serviços. Como esclarece Wilson
Bueno, há uma tendência crescente de que
as organizações sejam admiradas mais pela forma como
interagem com a sociedade do que pela qualidade de seus
produtos ou serviços, até porque tem sido muito difícil, para os
cidadãos, distinguir os produtos [...], já que a tecnologia e a
excelência na produção foram basicamente apropriadas pela
maioria das fabricantes, (BUENO, 2003, p. 25)

Cada vez mais as instituições surgem, aos olhos dos stakeholders, humanizadas, dotadas
de personalidade, refletindo sua forma de atuação. Dentro dessa perspectiva, muitos
profissionais de comunicação corporativa (executivos das empresas) têm incorporado nas
práticas cotidianas o uso das mídias sociais digitais, como forma de incrementar relações
com diversos stakeholders, incluindo a imprensa. Ao serem interpelados sobre se a
“tecnologia melhorou ou piorou os processos de relacionamento entre mídias e
empresas”, todos consideraram que “melhorou”. Apenas dois respondentes fizeram
ressalvas no tocante ao aspecto relacional com jornalistas:
Acho que trouxe muita coisa bacana, acelerou a venda de pautas, o
acesso à informação; porém [grifo da autora], creio que distanciou
empresas da imprensa e dos respectivos jornalistas que acompanham as
pautas de interesse.

Melhorou, desde que [grifo da autora] atrelada ao relacionamento


pessoal [...]levou tempo até conseguir gerar relacionamento e chegar
à proximidade de ter o WhatsApp deles (jornalistas)

Já os assessores de comunicação, provavelmente por estarem mais na linha de frente, em


contato mais frequente com as redações, nos trouxeram outra percepção para a mesma
pergunta. Embora também tenham respondido que a tecnologia melhorou os processos
de relacionamento com a imprensa, fizeram mais ressalvas. Dos dez respondentes, um
disse até mesmo que a tecnologia piorou seu relacionamento com a mídia corporativa,
seis disseram que melhorou sem maiores ressalvas (pela uso do WhatsApp, proximidade
24 horas, contato direto, agilidade, produtividade, possibilidade de transmissão de
coletivas em tempo real), e três disseram que melhorou, com ressalvas. As principais

41
ressalvas foram também relativas ao distanciamento provocado no contato pessoal ou
telefônico: “jornalistas já não atendem telefone”, “preferem se comunicar via WhatsApp”
(o que, no caso, significa texto).
Melhorou, principalmente no que se refere à agilidade para divulgação
de conteúdo, como por exemplo transmissão em tempo real de coletivas
e eventos. Por outro lado [grifo da autora], os jornalistas já não
atendem mais telefone. Preferem se comunicar via WhatsApp. A
questão não é exatamente a tecnologia. É o comportamento. Os
jornalistas, com raras exceções, retornam a respeito de sugestões de
pautas, convites para encontros ou viagens

A mesma questão foi feita aos jornalistas, evidentemente, para saber como eles se sentem
em relação ao uso da tecnologia para o acesso às empresas, seja por meio de assessorias
ou não. Entretanto, percebe-se no discurso desses profissionais um certo olhar de
resistência às mídias sociais. Uma percepção de espaço concorrencial à função do
jornalista e não de auxiliar tecnológico ao exercício funcional.
As mídias sociais abocanharam uma parte do trabalho do jornalista
porque hoje cada empresa/marca/poder público pode ter seu próprio
‘veículo’ e passar suas mensagens direto para clientes, consumidores e
cidadãos. Mas ‘desviar’ da imprensa é a pior estratégia a ser adotada,
pois a mediação do profissional é que faz a diferença para uma notícia
com credibilidade.

Enquanto os profissionais da Comunicação Corporativa (executivos e assessores)


levantaram o aspecto relacional em consideração para responder à pergunta, os
profissionais de imprensa trouxeram a perspectiva da busca da informação para seus
discursos. Os jornalistas foram mais críticos, sendo que três profissionais consideraram
que as mídias sociais melhoraram as relações com as empresas ( ampliação dos canais de
comunicação, obtenção de informações institucionais, conhecimento de projetos para
geração de pautas, contatos, atualização sobre o mercado), três disseram que melhoraram,
mas fizeram ressalvas (excesso de demanda, perda de privacidade, pautas irrelevantes,
demora nas respostas por parte das empresas, mesmo com o uso das ferramentas); dois
consideram que as redes são indiferentes e dois acreditam que piorou o relacionamento
com as organizações com o advento das novas tecnologias.
Ao simplificar processos, as mídias sociais contribuíram para a
simplificação e massificação de informações empresariais. Os contatos
pessoais sempre foram a melhor maneira de se obter informação
exclusiva.

42
Perguntamos também quais os benefícios e prejuízos que esses profissionais percebiam
no uso nas redes sociais para o exercício de suas atividades. Abaixo relacionamos os
principais termos que apareceram por categoria profissional
Tabela 4
Benefícios e Prejuízos das Mídias Sociais

Assessores de
Jornalistas Empresas
Comunicação

Agilidade Agilidade
(contatos e Agilidade Rapidez
entrevistas) Rapidez Divulgação
Humanização da Mobilidade Interação
relação Privacidade Transparência
Visibilidade Liberdade de Personalização
Benefícios Facilidade Expressão Segmentação
Proximidade Assertividade Proximidade
Mercado de Proximidade Frequência
trabalho Contato Acesso
Acesso Dinamismo Facilidade
Espaço para Facilidade Democratização
Questionamento Resultado

Distanciamento Ansiedade
social Distanciamento Volume de
Privacidade social mensagens
Superficialidade Impessoalidade Crises
Prejuízos Fake news Superficialidade Fake News
Stalking Banalização Coberturas
Polarização Haters superficiais
Excesso de contatos Hackers Perda de Privacidade
Diminuição do Exposição Erros de informação
contato pessoal

Fonte: Elaboração da autora


Percebemos que há recorrência em alguns termos e percepções, tanto no que tange a
aspectos positivos como negativos. Por exemplo, a agilidade trazida pelo uso das
ferramentas digitais está presente nas menções dos três grupos profissionais. A questão
da possibilidade do acesso e do contato também é percebida pelos três grupos como

43
aspecto positivo. Mas há questões que são mais latentes a cada uma das atividades. Os
jornalistas reconhecem que passaram a ter nas redes sociais das empresas um espaço
“ampliado” para o “alcance do veículo”, como mencionou um dos respondentes do Portal
R7. Muitas vezes, o conteúdo produzido pela imprensa é replicado nas mídias
proprietárias das organizações, ganhando visibilidade e trazendo audiência e engajamento
ainda maior.
A facilidade para encontrar as fontes também é celebrada pelos jornalistas. Entretanto,
um dos respondentes que vê nos benefícios das redes sociais a “humanização da relação”,
ao relatar os prejuízos trazidos pelas mesmas ferramentas digitais para o exercício
profissional, desabafa que há “perda de privacidade, stalking” e que sente falta de
momentos para relaxamento no exercício profissional. Ou seja, um discurso controverso.
A perda de privacidade foi um dos relatos frequentes entre os profissionais de imprensa,
que, embora celebrem a aproximação das fontes, criticam os excessos de alguns colegas
que atuam em nome das organizações: “... na maioria das vezes, não há laços de amizade
que permitam mensagens em horários inoportunos....”, reforça um respondente.
Mas, embora critiquem tal prática, o assédio por meio das redes sociais também é
cometido por eles em direção, especialmente, aos profissionais que atuam em grandes
agências ou nas próprias corporações. Em busca da notícia, ou tendo que cumprir prazos
apertados de fechamento, os profissionais da imprensa cometem excessos. Isso ocorre
porque os jornalistas vivem uma grave crise com o surgimento das atualizações em tempo
real da informação. Como sustenta Romanet, “O que é um jornalista? É o analista de uma
jornada, de um período, como a própria palavra diz” (RAMONET, 2013, p.56). Mas,
segundo o autor, o período não existe mais e, em consequência, haveria profissionais
imediatistas, com pouca capacidade de analisar, pois para isso seria preciso tempo. Hoje,
“[...] a informação é arrastada por uma aceleração geral [...] todos se organizam em função
da velocidade dominante... (RAMONET, 2013, p.56)
Assim, diante de jornalistas acelerados e pressionados pelo tempo, um de nossos
entrevistados, executivo de uma grande empresa do setor automobilístico, pontua sobre o
desconforto do “recebimento de solicitação de imprensa em qualquer dia, e em qualquer
horário”. Além disso, as empresas também se ressentem por erros cometidos pela
imprensa e por não serem procuradas em algumas oportunidades para a checagem dos
fatos, o que é atribuído à velocidade imposta pelas novas práticas profissionais, como o
uso dos meios digitais, que exigem a divulgação da informação em tempo real.

44
“Informações são postadas mais rapidamente. Então, o risco de ter dados errados é
maior”, salienta um executivo de uma das empresas participantes da pesquisa.
Da parte das assessorias há reclamações como o contato direto feito por meio das redes
sociais digitais com as empresas (clientes) o que, segundo um dos entrevistados “pode
causar ruído na comunicação”. Além disso, segundo o mesmo respondente, atualmente,
as queixas de consumidores feitas nas redes sociais digitais “podem expor a empresa e
suas marcas negativamente” diante da imprensa. Em outro caso, uma das assessoras,
mencionando a ação dos haters, ressalta que, muitas vezes, essas críticas são infundadas.
Infundada ou não, o fato é que todas as críticas necessitam ser monitoradas e respondidas
com agilidade.
Também buscamos averiguar se o uso da tecnologia tem mantido os jornalistas,
assessores e executivos das empresas mais distantes. Tentamos mapear se há nos dias de
hoje frequência de encontros presenciais em algum segmento, ou pelo lado das
organizações, ou pelo lado das mídias que abordamos. De fato, essa parece ser uma
prática do passado. O que fica como um indicativo, tendo em vista que nossa base
amostral não é quantitativa, é que os respondentes mais jovens não percebem esse
“distanciamento” como um problema relacional. Eles desconhecem outras formas de
executar as atividades profissionais, pois já iniciaram suas práticas utilizando as redes
sociais digitais. Assim, procuram desenhar suas estratégias com criatividade e adaptando-
se a esses canais.
Entretanto, como abordamos profissionais que fizeram história no Jornalismo brasileiro,
com passagem por publicações como Revista Exame, a extinta Gazeta Mercantil, Grupo
Estado, pudemos perceber diferentes percepções entre a “velha” e a “nova’ escola do
Jornalismo brasileiro. Os profissionais que viveram o auge das coletivas de imprensa,
entrevistas presenciais, exclusivas, reportagens no exterior a convite das marcas, visitas
técnicas, entre tantos momentos de contato entre organizações e imprensa, parecem ter
saudades desses tempos.

Mídias sociais, Crises e Fake News


Procuramos ainda saber como as organizações, agências e a imprensa utilizam-se das
redes sociais digitais em momentos de crises organizacionais. Alguns respondentes
deixaram evidente a falta de experiência que têm na atuação nesses episódios críticos.
Entretanto, muito do que foi compilado nos dá indicativos importantes para nosso
trabalho e para pesquisas futuras.

45
Em primeiro lugar, o que são as crises? Na visão de Silva Neto (2010, p. 179) “A crise é
um evento específico e inesperado, que cria altos níveis de incerteza e ameaça às empresas
e aos seus públicos e geram grande pressão por respostas sobre causas e consequências”.
Ao contrário do autor que traz o inesperado como elemento caracterizador das crises,
Maradei (2013) acredita que poucas são as crises imprevisíveis. Para a autora: “As crises
de imagem podem ocorrer por uma infinidade de motivos, mas não seria exagero dizer
que, em boa parte delas, o fator desencadeador pode ser esperado e calculado”
(MARADEI, 2013, p.67). Não nos surpreende, nessa perspectiva, a percepção maciça,
por parte dos assessores e executivos de empresas, da necessidade de monitoramento das
redes sociais na atualidade para prever, acompanhar e combater episódios críticos e fake
news.
Da parte dos jornalistas, ao tratarmos do tema crise, vieram relatos relevantes, como a
percepção de que as organizações, sejam públicas ou privadas, usam “a rede social para
se posicionar sobre a crise geralmente com lentidão”, mesmo com todas as possibilidades
trazidas pela tecnologia. Dessa forma, para um jornalista respondente parece ser mais
efetivo “o contato com o departamento de comunicação da empresa”. Mas, o acesso veloz
às fontes por meio das mídias sociais digitais foi celebrado pelos profissionais de
imprensa como forma de desvendar os aspectos controversos da crise, especialmente
quando há disposição por parte da organização em apresentar documentos, retratação,
dados oficiais sobre medidas para reparação de danos a envolvidos etc. Outro ponto
destacado foi a possibilidade de “informações publicadas no Facebook [serem] facilmente
incorporadas [...] nas matérias”.
Um dos entrevistados lembrou ainda da importância da ferramenta de busca Google nos
processos de crise digital. Antigamente os jornalistas ficavam reféns das informações
passadas pelas empresas, ou tinham que realizar processos investigativos demorados para
recuperar episódios de erros pregressos das empresas. Agora, na era digital, as marcas
estão expostas na internet e, num simples clique, os fatos negativos podem ser
prontamente recuperados, ampliando o desgaste à imagem das organizações.
Já as assessorias e os executivos da área de comunicação das empresas ressaltaram em
larga escala que as crises da era das mídias sociais digitais impõem a necessidade de
monitoramento constante dessa ambiência por parte das organizações: "hoje, boa parte
das crises começa nas redes sociais”. Dessa forma, é de fundamental importância estar
atento a esse espaço “para identificar e, sempre que possível, se antecipar a uma crise”.
Outro entrevistado do mesmo grupo reforça que atualmente “a resposta precisa ser ainda

46
mais rápida”. Mas, como ponto positivo, comemora que o profissional de agência não é
mais refém de informações do cliente e nem da intermediação do jornalista para tomar
decisões e elaborar respostas às crises: “Você está vendo o que está acontecendo e pode
tomar atitudes mais assertivas”.
Uma das executivas lembra ainda que as mudanças nos processos de gestão de crises
foram “drásticas” e reforça a importância das redes proprietárias para o sucesso das
organizações. “Hoje, é necessário ter agilidade nas tomadas de decisão, bem como nas
divulgações de posicionamentos. [...] Por isso, é fundamental que as empresas tenham
redes proprietárias”.
Também ouvimos os profissionais sobre o uso das mídias sociais para o combate às fake
news que se abatem sobre as organizações. As fake news trazem, por certo, crises e
contratempos para as corporações. Muitas vezes, quando a narrativa empresarial é
colocada em xeque, há necessidade de recuar para recuperar a credibilidade. Mas isso
deve sempre ser feito com estratégia. Por isso, muito do que aparece no discurso dos
respondentes ao tratar do tema crise e mídias sociais digitais é retomado ao abordar fake
news, como a questão da necessidade de agilidade nas repostas, monitoramento dos fatos,
possibilidade de diálogo direto com os públicos de interesse sem intermediação do
jornalista.
Mas para a pergunta: “Você acredita que as mídias sociais são um canal efetivo para que
as empresas possam combater fake news que se abatam sobre produtos e serviços das
organizações?” tivemos também devolutivas específicas interessantes. Primeiramente,
queremos esclarecer que seguimos o conceito da UNESCO, previsto no relatório
publicado em 2018, intitulado Journalism, ‘Fake News’ & Disinformation, que evita
admitir que o termo fake news tenha um significado correlato a “notícias falsas”. Isso
porque, segundo o trabalho, ‘“notícias” significam informações verificáveis de interesse
público, e o que não atenda a esses padrões não mereceria rótulo de notícia (UNESCO,
2018).
Segundo constata o relatório, a expressão “notícias falsas” vem sendo considerada por
alguns autores “um oxímoro que se presta a danificar a credibilidade da informação que,
de fato, atende ao limiar de verificabilidade e interesse público – isto é, notícias reais”
(idem, 2018). O referido trabalho combina duas noções: informação incorreta e
desinformação. No documento, desinformação é usada para tentativas deliberadas para
“confundir ou manipular pessoas”. Já “informações incorretas” é um termo usado quando
a informação é criada sem intenção manipuladora. Além disso, o relatório traz a diferença

47
entre desinformação e informação incorreta do “jornalismo de qualidade”, que cumpre
com a ética e normas profissionais. Este último diferencia-se ainda do “jornalismo
problemático” que comete erros contínuos por verificação malfeita, sensacionalismo,
parcialidade (UNESCO, 2008, p.8).
Não nos aprofundaremos no conceito de fake news no presente artigo, mas interessa-nos,
sim, demonstrar que, muitas vezes, o que é compartilhado sobre as marcas, por não
corresponder à realidade, ocorrendo por interesses comerciais escusos, ou por boatos,
informações distorcidas e descontextualizadas que podem circular entre os atores nas
redes sociais digitais, pode trazer sérios prejuízos à imagem e até à reputação das marcas.
Relembremos rapidamente o caso do ar nos sacos da batata Ruffles, da Pepsico, por
exemplo.14 Espalhou-se uma onda de “informações” de que o ar contido nas embalagens
era para ludibriar o consumidor em relação à quantidade do alimento, quando, na verdade,
segundo a empresa, o ar nos pacotes de batata faz parte de um processo da indústria para
que o produto mantenha a crocância até o destino final. De tanto receber críticas em redes
sociais como Twitter e Facebook, a marca publicou em sua página oficial um infográfico
explicando o processo de empacotamento do produto e demonstrando que o ar servia
como uma espécie de airbag para as batatinhas.
Os executivos de comunicação e os profissionais de agência, em sua maioria, reconhecem
e ressaltam a importância das redes proprietárias e contam com elas para a educação e
orientação de seu público em torno de questões controversas. Mas o que revela
amadurecimento é a recorrente ótica relacional em seus discursos. A perspectiva da
educação e orientação por meio de e-books, vídeos, blogs foi uma manifestação expressa
por alguns profissionais como forma de combate às fake news. Essa perspectiva nos
parece animadora, na medida em que usa novos conteúdos, novas narrativas, atreladas às
tecnologias da informação e comunicação para esclarecimento de dados, prestação de
contas, diálogo, treinamento e informação.
A transparência aparece recorrentemente como forma de combate a tal fenômeno. “O
caminho é ocupar com propriedade e criatividade as mídias sociais... A comunicação
transparente e pontual é a melhor ferramenta de combate a iniciativas que visam a
desinformar o público”, ressalta um profissional de agência. Já outro respondente, do

14
SIMON, Cris. Ruffles explica “mito do saco de ar” no Facebook. Exame. Disponível em:
<https://exame.com/marketing/ruffles-se-defende-do-mito-do-saco-de-ar-no-facebook/>. Acesso em: 15
maio 2020.

48
mesmo grupo, bem pondera que a iniciativa não deve ser pontual e combativa, mas
anteceder o processo e ser preventiva: “Os perfis oficiais das empresas são os melhores
canais para a comunicação do que é verdadeiro por meio da transparência nos conteúdos,
que deve ser prévia e não somente durante crises” (no caso, o respondente refere-se às
crises provocadas por fake news). .
A imprensa não foi esquecida no processo como forma de auxiliar as organizações na
“cruzada” às fake news: “No caso de informações falsas de grande impacto, esta
estratégia pode ser reforçada com pautas na mídia tradicional, de forma a ter o aval
externo e independente de um veículo para reforçar a veracidade dos fatos", acrescentou
um dos respondentes de agência terceirizada. É certo que se trata de um profissional com
28 anos de atuação na área, para quem a mídia corporativa provavelmente ocupa um papel
fundamental na estratégia de elucidação de episódios críticos em sua trajetória. De fato,
em alguns momentos, para crises de grande repercussão, a mídia corporativa ainda
continua sendo uma grande aliada.
A falta de agilidade das empresas para estruturação de posicionamentos foi um recorrente
ponto de crítica às organizações por parte, especialmente das agências terceirizadas
“Acredito que as empresas/marcas devem alterar seus processos para ganharem mais
agilidade na aprovação de posicionamentos e conteúdo. Isso porque a sociedade, cada vez
mais conectada, exige respostas rápidas e transparentes”, reforça outro respondente
também do grupo de agências.
Um ponto que chama a atenção na auditoria das respostas é que, enquanto os profissionais
que atuam nas agências pedem urgência nas repostas e no combate às notícias falsas, os
executivos que atuam nas organizações se revelam mais cautelosos. “Levar um caso que
não teve ainda grande repercussão para ser discutido nas redes sociais pode ser um ‘tiro
no pé’. O uso de “public affairs”, “government affairs” e PR deve ser avaliado antes de
levar o assunto para as redes sociais”, argumenta o executivo com cargo gerencial em
uma grande corporação.
De qualquer forma, os profissionais dos dois grupos (assessores e executivos de
empresas) reconhecem que, se as redes sociais digitais podem ser usadas para o bem e
para o mal, há nas redes proprietárias uma oportunidade para ampliar o diálogo, a
aproximação, o relacionamento e traspor a antiga barreira da mediação dos jornalistas,
agora, realizando o contato diretamente com os públicos de interesse por meio de blogs,
vídeos, relatórios digitais, “lives”, comunicados nos sites das organizações etc. E mais,
os rastros dessas crises deixam aprendizados para as empresas ao serem monitorados por

49
modernas ferramentas que utilizam a tecnologia para gerar relatórios, sistematizar dados,
agregar inteligência para oportunidades futuras.

A relação com os jornalistas


A relação com jornalistas, mediada pelas mídias sociais digitais também tem
apresentando substanciais mudanças. Como propõe Guedes (2004, p. 6) “O jornalismo
precisa exercer uma busca constante pela verdade, uma maneira de mostrar a notícia de
uma forma responsável para que a audiência se sinta bem por estar sabendo e sendo
informada sobre a realidade contida nos fatos”. Entretanto, desde o século XIX, cada vez
mais caracterizado como atividade industrial, o Jornalismo vive sob permanente tensão,
que vem sendo agravada pelo advento das mídias sociais digitais, pela precarização da
profissão, maior ativismo dos cidadãos na propagação da notícia, crise de. confiança na
imprensa enquanto instituição; redução do número de veículos em atividade,
especialmente observada pela diminuição sistemática da circulação das mídias impressas.
Como nos recorda Guedes (2004, p.6) “o jornalista corre pelo furo da reportagem com o
próprio cidadão”, além de operar na lógica do tempo real. Torna-se, cada vez mais, uma
atividade comprometida, como qualquer outra, por interesses políticos e econômicos
pertinentes ao sistema.
Observa-se ainda ondas de demissão em massa, sendo que, segundo pesquisa do Volt
Data Lab32, ao menos 1836 comunicadores15 foram demitidos entre os anos de 2012 e
2017 no Brasil. Só em 2016 teriam sido efetuadas 236 exonerações, sendo pelo menos
120 delas em veículos de imprensa paulistas. Além disso, de acordo com Lelo (2019),
para os que estão na ativa, há a realidade dos baixos salários, sendo que 37% dos
profissionais ganham entre três e seis salários mínimos, o que os força a buscar outras
atividades para complementar a renda, num processo de precarização da atividade
jornalística.
Somado a tudo isso, há novos formatos na atuação profissional, uso de novas tecnologias
para elaboração de pautas, produção e apuração da notícia. Investigamos entre os
assessores e jornalistas como eles percebem alguns pontos da relação com os profissionais

15 LELO, Thales Vilela. Reestruturações produtivas no mundo do trabalho dos jornalistas:


precariedade, tecnologia e manifestações da identidade profissional. Tese (Doutorado em Ciências Sociais),
Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Campinas, São Paulo,
2019. Disponível em: <https://fenaj.org.br/wp-content/uploads/2019/03/Tese-LELO-T-
Reestrutura%C3%A7%C3%B5es-produtivas-no-mundo-do-trabalho-dos-jornalistas.pdf>. Acesso em 04
jul 2020. 50
.
de imprensa nos dias atuais. Nesse recorte, foram 20 profissionais da Comunicação
Corporativa (Agências e Empresas) respondentes. Sistematizamos a seguir as respostas,
lembrando que nosso objetivo não é quantificar, mas entregar ao leitor inferências sobre
o tema e ampliar o debate.

Tabela 5
Relação com Jornalistas

Nem
Concordo Concordo Concordo Discordo Discordo
Pergunta
totalmente Parcialmente Nem Parcialmente Totalmente
Discordo
Falta de tempo
dos jornalistas-
interlocutores
50% 35% 5% 10% 0%
para ouvir
sugestões de
pauta, convites
Falta de preparo
e compreensão
dos jornalistas
devido à má 30% 35% 20% 15% 0%
qualidade da
formação
profissional
Ausência dos
profissionais
nas redações 40% 30% 20% 5% 5%
para prestar
atendimento
Blindagem das
secretárias nas
redações-não 30% 15% 30% 5% 20%
atendimento de
ligações
Poucos
profissionais 65% 20% 15% 0% 0%
nas redações

Fonte: Elaboração da Autora

Em linhas gerais, os respondentes consideram que há poucos profissionais nas redações


e que os mesmos estão sobrecarregados. Nota-se que há uma percepção relevante, de 85%
dos respondentes (concordo totalmente ou parcialmente), em relação à falta de tempo por

51
parte dos jornalistas para se relacionar com os colegas ligados às empresas (assessores e
executivos de comunicação). A falta de tempo é decorrente da já mencionada
precarização da profissão e das recorrentes demissões que vem acometendo a categoria
nos últimos anos.

Em relação à falta de profissionais nas redações, há na pesquisa algo interessante a se


observar. Há duas questões similares: a pergunta sobre se “há poucos profissionais nas
redações”, que aparece com um indicativo de 75% dos respondentes, sinalizando para
concordo totalmente ou parcialmente, e “ausência dos profissionais nas redações para
prestar atendimento”, que também tem um indicativo similar de 70% para os mesmos
quesitos. Entretanto, se observarmos a tabela, a palavra ausência do profissional “para
prestar atendimento” fez diferença para alguns respondentes, como já era esperado,
elevando o índice dos que nem concordam e nem discordam e dos discordantes nessa
categoria. Nossa hipótese é que alguns dos respondentes podem considerar que os
jornalistas podem estar na redação, mas não disponíveis para atendimento aos colegas,
por isso a diferença entre as duas respostas.
Já o questionamento de haver “blindagem” por parte de secretárias nas redações, não foi
uma percepção da maioria. Por fim, observamos se os respondentes consideravam os
jornalistas mal preparados para o exercício da função. Trinta por cento foram
contundentes, dizendo que concordam com tal afirmação totalmente. Os que concordam
totalmente ou parcialmente sobem para 65%.

O uso da tecnologia: novas formas de interação


Usamos duas perguntas para avançar na investigação sobre a forma como os profissionais
têm usado a tecnologia nas atividades profissionais. Uma delas era subdividida em três
tópicos. As questões foram as mesmas para o grupo de agências e executivos de empresas.
Entretanto, para os jornalistas, por razões da característica da atividade profissional,
houve variação nos questionários. Reproduzimos a seguir o que foi apurado em duas
etapas. A primeira, decorrente da auditoria realizada junto aos dez profissionais de
imprensa. Na segunda etapa, realizamos a demonstração do que encontramos nas
investigações junto ao grupo ligado às organizações.

52
Primeira Etapa – Questionários aplicados aos jornalistas
Tabela 6
Formas de contato usadas por jornalistas para solicitar
entrevistas, realizar matérias e receber conteúdos
Jornalista
1 2
Telefone 100% -
WhatsApp 90% 10%
e-mail 100% -
Skype - 100%
Twitter - 100%
Facebook 60% 40%
LinkedIn 20% 80%
Instagram 30% 70%
Google 70% 30%

1-Utilizo Muito ou com Alguma Frequência


2- Pouco ou Nunca
Fonte: Elaboração do Autor

Tabela 7
Canais de comunicação utilizados no processo de
busca/localização das agências-empresas.
Jornalista
1 2
Registros 90% 10%
Próprios
Telefone 70% 30%
WhatsApp 50% 50%
e-mail 70% 30%
Skype - 100%
Twitter - 100%
Facebook 40% 60%
LinkedIn 20% 80%
Instagram 20% 80%
Google 90% 10%

1-Utilizo Muito ou com Alguma Frequência


2- Pouco ou Nunca
Fonte: Elaboração do Autor

53
Tabela 8
Canais de comunicação utilizados para
o primeiro contato coma as agências-empresas

Jornalista
1 2
Telefone 100% -
WhatsApp 40% 60%
e-mail 100% -
Skype - 100%
Twitter - 100%
Facebook 10% 90%
LinkedIn 10% 90%
Instagram 30% 70%
Google 70% 30%

1-Utilizo Muito ou com Alguma Frequência


2- Pouco ou Nunca
Fonte: Elaboração do Autor

Tabela 9
Canais de comunicação utilizados para a realização da entrevista
Jornalista
1 2
Presencial 70% 30%
Telefone 90% 10%
WhatsApp 80% 20%
e-mail 80% 20%
Skype - 100%
Facebook 30% 70%
LinkedIn - 100%
Instagram - 100%
Google - 100%

1-Utilizo Muito ou com Alguma Frequência


2- Pouco ou Nunca
Fonte: Elaboração do Autor

54
Pelo exposto em nossas análises, percebe-se que o telefone e o e-mail ainda são utilizados
nas interações realizadas pelos jornalistas nas atividades profissionais, tanto para receber,
solicitar conteúdos, quanto para a realização de entrevistas. Mas o WhatsApp já está se
equiparando a essas formas de comunicação, exceto para o primeiro contato realizado
com os profissionais que atendem as empresas. Nesse caso, verifica-se que, enquanto e-
mail e telefone são utilizados maciçamente pelos respondentes, apenas 40% dos
respondentes declararam utilizar essa mídia social para esse tipo de abordagem inicial.
Embora em nossas investigações tenham aparecido relatos de um decréscimo no número
de contatos presenciais realizados entre grupos analisados nos últimos anos, 70% dos
jornalistas ainda afirmam utilizar muito ou com alguma frequência essa forma de
relacionamento para realização de entrevistas
Outro ponto a destacar é que, ainda que o Google não seja propriamente uma mídia social
(o Google + pode ser considerado uma), incluímos a ferramenta de busca em nossa
amostra. Isso deve-se ao fato de ser utilizado para realizar matérias e para contato por
70% dos respondentes (utilizo muito ou com alguma frequência) dos respondentes. Na
sequência, verifica-se o uso do Facebook em alguma medida, especialmente para solicitar
e receber conteúdos (60%), seguido do Instagram e do LinkedIn, com menções pontuais,
sendo que o Twitter e o Skype não tiveram projeção nos relatos.

Segunda etapa – Questionário aplicado às agências e profissionais que atuam junto


às organizações

Nessa etapa buscamos informações sobre as principais formas que os profissionais


ligados às empresas (executivos e assessores) se utilizam para se relacionar com a
imprensa. Perguntamos ainda se há diferença entre a comunicação para localização do
jornalista, expedição de releases, convite para eventos e almoços de relacionamento. O
objetivo era verificar as formas relacionais e as mídias sociais usadas no processo de
contato com os jornalistas em diferentes situações e etapas do processo profissional.

55
Tabela 10
Formas que se relaciona com a imprensa para vender pautas, gerar
aproximação e relacionamento, propagar conteúdos da organização

Empresa Agência
1 2 1 2
Telefone 60% 40% 100% -
WhatsApp 90% 10% 100% -
e-mail 90% 10% 100% -
Skype - 100% 10% 90%
Twitter 10% 90% 20% 80%
Facebook 20% 80% 50% 50%
LinkedIn 40% 60% 40% 60%
Instagram 30% 70% 30% 70%
Google 20% 80% 50% 50%

1-Utilizo Muito ou com Alguma Frequência


2- Pouco ou Nunca
Fonte: Elaboração do Autor

Tabela 11
Forma de comunicação no primeiro contato

Empresa Agência
1 2 1 2
Mailing 60% 40% 100% -
Telefone 50% 50% 100% -
WhatsApp 90% 10% 90% -
E-mail 90% 10% 100% -
Skype - 100% 20% 80%
Twitter 10% 90% 10% 90%
Facebook 10% 90% 50% 50%
LinkedIn 20% 80% 50% 50%
Instagram 10% 90% 20% 80%
Google 40% 60% 70% 30%
Sites da mídia 50% 50% 60% 40%

1-Utilizo Muito ou com Alguma Frequência


2- Pouco ou Nunca
Fonte: Elaboração do Autor

56
Tabela 12
Forma de comunicação usada para expedição de release

Empresa Agência
1 2 1 2
Mailing 50% 50% 100% -
WhatsApp 50% 50% 90% 10%
E-mail 80% 20% 40% 60%
Facebook - 100% - 100%
LinkedIn - 100% 10% 90%
Instagram 10% 90% 10% 90%
Sites da mídia 20% 80% 20% 80%

1-Utilizo Muito ou com Alguma Frequência


2- Pouco ou Nunca
Fonte: Elaboração do Autor

Tabela 13
Forma de comunicação usada para realizar convites
para eventos, coletivas, almoços de aproximação

Empresa Agência
99 1 2 1 2
Mailing 30% 70% 90% 10%
Telefone 50% 50% 80% 20%
WhatsApp 50% 50% 80% 20%
E-mail 80% 20% 100% -
Facebook - 100% 20% 80%
LinkedIn - 100% 20% 80%
Instagram - 100% 10% 90%
Sites da mídia 10% 90% 20% 80%

1-Utilizo Muito ou com Alguma Frequência


2- Pouco ou Nunca
Fonte: Elaboração do Autor

57
Enquanto o mailing é muito utilizado pelas agências, 100% a 90% dos profissionais
declaram utilizar muito ou com alguma frequência, no grupo dos executivos que atuam
em empresas, uma ampla parcela de profissionais afirma não usar ou usar pouco esse
recurso. A razão provável é a característica da atividade. O perfil do profissional das
organizações é menos operacional do que o das assessorias. Além disso, realizamos a
pesquisa com organizações de grande porte, que costumam ter a parte operacional
delegada a suas agências terceirizadas. Essas, sim, se encarregam do uso do mailing para
expedição de materiais diversos: notas, releases, convites à imprensa.
Da mesma forma percebe-se que as agências se valem muito mais do telefone para o
contato com a imprensa, pois por meio desse canal que normalmente são realizados os
“follow ups16” e abordagens diversas para aproximação com os jornalistas em nome das
empresas. Enquanto o uso do telefone, em média, teve entre os respondentes executivos
das organizações 50 a 60% de adesão (utilizo muito ou com alguma frequência), nas
diversas etapas de contato, entre os assessores, esse número sobe para 80 a 100%, mais
próximo ao que foi encontrado no grupo de imprensa. Na mesma perspectiva
Entre o grupo em análise, como no caso dos jornalistas, o WhatsApp já parece ser uma
realidade. Mas ao observarmos a tabela há uma surpresa. Percebe-se que quando o assunto
é expedição de release ou envio de convites há resistência no uso da ferramenta, em
detrimento do tradicional e-mail. Talvez seja pela informatização dos processos em
decorrência de softwares contratados como I -Maxpr17, Press Manager18, Comunique-
se19, que dão agilidade à localização de contatos e expedição segura de materiais por, e-
mail e ainda geram relatórios de mensuração de resultados. Mas essa é, evidentemente,
apenas uma inferência.
O Facebook merece ser destacado quando o assunto é contato e aproximação com
jornalistas, especialmente no que se refere às agências. Embora a mídia social não seja
utilizada de forma relevante entre este grupo como um todo, verifica-se que para a
localização dos profissionais de imprensa essa mídia social tem sido demandada como
um novo canal. Mas, isso ocorre especialmente entre as agências e para contatos e
aproximação (50% dizem utilizar muito ou com alguma frequência). Em contrapartida,

16
Follow-up é um termo em inglês que significa “fazer o acompanhamento”. É muito utilizado por
assessorias de imprensa para retomar um contato pré-estabelecido com o jornalista.
17
https://www.i-maxpr.com/n/
18
https://www.pressmanager.com.br/
19
https://www.comunique-se.com.br
58
quando a pergunta é sobre expedição de materiais ou convite para eventos, a mesma mídia
social não é tão prestigiada e o índice cai, indo para a casa de 80 a 100% que afirmam
utilizar pouco ou nunca.

Considerações Finais
As mídias sociais digitais trouxeram aos profissionais envolvidos com os processos
comunicacionais do universo corporativo novas formas de atuação e de relacionamento.
O papel do assessor de comunicação de hoje, assim como em outros tempos, é auxiliar os
jornalistas e orientar as fontes, tanto em relação às características das mídias, quanto ao
contexto das pautas, mas há agora novas e ampliadas atribuições destinadas a esses
profissionais.
Muitos são responsáveis pelas mídias sociais proprietárias dos clientes (organizações),
produção de conteúdo de blogs corporativos, boletins digitais, vídeos, além da gestão de
crise, especialmente no universo digital, bem como monitoramento desses espaços, e
treinamento de executivos. Além disso, esses profissionais produzem conteúdo em novos
formatos: vídeos, aplicativos, podcasts, chats etc. As mídias sociais deram a esses atores
outras tarefas, mas também criaram novas oportunidades de receita e diversificação de
produtos e serviços.
Ao mesmo tempo, percebe-se um engajamento e uma preocupação relacional e dialógica
com novos stakeholders, lançando um olhar para além da imprensa. Até mesmo porque,
com a precarização do Jornalismo, há a necessidade de descoberta de novos caminhos
para a prática profissional, e essas possibilidades chegam pelas mídias sociais digitais,
que amplificaram a voz das organizações.
Por outro lado, se há um distanciamento entre os profissionais de redação e os da
Comunicação Corporativa, há também, e isso é reconhecido nas narrativas de todos os
grupos analisados, aproximação. Os discursos dos respondentes, aliás, são controversos:
fala-se em agilidade adquirida com o uso das mídias sociais, mas reclama-se da perda de
privacidade. Exalta-se a humanização do relacionamento e ampliação de possibilidade de
contatos promovida pela tecnologia e, na sequência, queixa-se de distanciamento e falta
de acesso. Reclama-se da mídia social como concorrente profissional, mas reconhece-se
que, em muitos momentos, ela fomenta a projeção do próprio trabalho realizado pelo
comunicador e amplia possibilidades do mercado profissional. Assim é a tecnologia,
controversa.

59
Outro ponto que pudemos verificar é que os executivos de comunicação que atuam nas
organizações parecem estar ocupando posições cada vez mais estratégicas, em detrimento
de atividades operacionais. Pelo menos foi o que detectamos em nossa amostragem, que
foi realizada com grandes corporações. A pesquisa revelou isso na própria forma como
se comunicam com a imprensa. Observamos, por exemplo, pouca operacionalização
cotidiana de ferramentas como mailing e menor uso de telefone.
Ao contrário do que supúnhamos inicialmente, embora o WhatsApp já seja usado em
grande escala na comunicação cotidiana desses profissionais (praticamente vem
substituindo o uso do telefone), outras mídias, como Facebook, Instagram e LinkedIn
ainda aparecem timidamente. O maior destaque foi dado ao Facebook, que, ainda assim,
ganha relevância em determinadas situações, como na localização de contatos na rede
social.
Formas de comunicação como telefone e e-mail convivem com a emergência de novas
práticas comunicacionais, como o uso em larga escala do WhatsApp. Foi o que auditamos
especialmente entre os respondentes da imprensa e de assessoria de comunicação. Vale
ainda ressaltar que duas mídias sociais não surgiram com relevância: Twitter e Skype.
Por fim, conseguimos também distinguir uma diferença entre os discursos dos
profissionais mais jovens e os com mais tempo de profissão. O primeiro grupo é mais
otimista em relação ao uso da tecnologia, não incluem tanto em suas narrativas a questão
do afastamento interpessoal. Mas, a questão da invasão de privacidade é uma constante
reclamação em todas as categorias analisadas, especialmente entre os jornalistas e os que
atuam na Comunicação Corporativa em nome de grandes marcas.

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62
O jornalismo nas organizações e
a comunicação com os públicos internos
Juliana Luiza de Oliveira Canêdo
Introdução
Uma organização que não está preparada para o diálogo fica vulnerável a prejuízos em
sua reputação e imagem, bem como no relacionamento com seus públicos. E quando se
trata de instituições recém-criadas como os Institutos Federais, por exemplo, essa
comunicação tem importância ainda maior.
Contudo, antes de se preocupar com a imagem levada à sociedade, é necessário que as
organizações, juntamente com suas estruturas profissionalizadas de comunicação,
priorizem ações integradoras para seus públicos internos. Afinal, eles são os parceiros
habituais e estratégicos das instituições (BUENO, 2019a) e estão constantemente
interagindo entre si.
Pesquisa de mestrado realizada entre 2017 e 2019 mostra que uma política de
comunicação pode auxiliar nessa comunicação interna, inclusive no ambiente
educacional, desde que a opinião dos agentes seja considerada durante a construção desse
instrumento. Esse texto mostra o desenvolvimento de projeto dessa natureza e, para tanto,
foi estruturado em três partes, a fim de mostrar como as organizações tratam a
comunicação interna, o papel do jornalista nesse contexto e os resultados do estudo,
realizado numa instituição federal de ensino.

A comunicação com os públicos internos


Bueno (2019a) considera os públicos internos das organizações como seus parceiros
habituais e estratégicos. Portanto, eles merecem prioridade nas ações de comunicação.
Para o autor, no século XXI, a comunicação interna assumiu uma nova dimensão e
transcendeu os limites estabelecidos pelos locais de trabalho e pela proximidade física
dos funcionários. Em boa parte das organizações, ela se estabelece mais nos ambientes
virtuais – intranet, grupos de discussão, e-mail etc. do que a partir de contatos diretos
(BUENO, 2013, p.67).
Isso implica no fato de que, muitas vezes, ela acaba fugindo ao controle da gestão
tradicional, exigindo mais flexibilidade organizacional e descentralização do poder. Isso
sem falar que os funcionários conversam entre si de qualquer forma, e a falta de diálogo

63
na organização acaba, muitas vezes, por alimentar a famosa Rádio Peão20. Para o autor, a
comunicação interna – se praticada de forma dialógica e participativa – desempenha,
portanto, papel fundamental no sentido de promover a articulação dos funcionários,
consolidando relacionamentos duradouros, confiáveis e produtivos, bem como para
comprometer os públicos internos com a solução coletiva de questões de natureza
institucional.
Cabral (2004) observa, contudo, que apesar das mudanças, muitas organizações insistem
em tratar a comunicação de forma instrumental – uma fórmula considerada ultrapassada,
tendo em vista que “a comunicação interna plena, tal qual defendemos hoje, não tem lugar
para esse tipo de ambiente, onde os empregados não são pagos para pensar e sim para
executar, cumprir ordens” (CABRAL, 2004, p. 61). Em complemento, a autora explica
que se privilegia, assim, a burocracia na produção de mensagens e notícias, a hierarquia
para o acesso à informação e à apresentação de ideias; que ainda trata pessoas como
recursos descartáveis em momentos de crise e, muitas vezes, considera mais importante
a apresentação de resultados. A superação desse modelo, por conseguinte, consiste em
considerar a análise do contexto social, político, econômico, tecnológico e
organizacional.
Marchiori (2010) destaca que as organizações estão repensando seus comportamentos em
relação a funcionários, comunidades e públicos de interesse (stakeholders). Cita estudo
de Grates (2006), no qual 84% dos respondentes acreditam que as informações não fluem
livremente nas empresas. Para a autora, é determinante um processo que promova a
interação social e o desenvolvimento de atividades que tenham sentido para as pessoas
no interior das organizações.
Entre os benefícios de se adotar tal perspectiva, Marchiori enumera: sobrevivência da
organização; fortalecimento de suas redes de relacionamento; valorização interna de suas
relações; ambiente de trabalho humanizado, colaborativo e participativo; estreitamento
de laços de confiança na gestão dos negócios; fortalecimento de lideranças – permitindo
maior flexibilidade, criatividade e inovação organizacional; comprometimento e respeito;
equilíbrio entre necessidades de informação da empresa e expectativas dos funcionários;
aproximação de pessoas; conquista de credibilidade e legitimidade organizacionais
internas.

20
É o processo de comunicação que se origina dos funcionários e, quase sempre, é comandado por eles,
com o objetivo de se contrapor à comunicação oficial (BUENO, 2019b).

64
Obviamente, tal situação afeta os profissionais de comunicação, que nunca foram tão
demandados em termos de agilidade, criatividade e eficácia. Nesse cenário, Cabral (2004)
lembra que, de modo geral, há o aceno para que os profissionais que desejarem se manter
inseridos numa organização precisam da especialização, porém devem atuar de forma
generalista; serem competentes como gestores ou flexíveis integrantes de uma equipe; ter
desenvoltura interpessoal; serem inovadores; comunicativos; bem-informados; bem-
humorados; cumprirem metas e, ainda, serem capazes de gerir o tempo – o que ela
considera, portanto, uma verdadeira reprodução do discurso da busca pela felicidade.
Diante disso, discorre-se, no próximo tópico, sobre o papel do jornalista na comunicação
organizacional.

O jornalista na comunicação organizacional


Duarte e Duarte (2014) lembram que, em geral, a figura do jornalista é frequentemente
vinculada à imprensa escrita ou aos meios audiovisuais. Contudo, a década de 1980 - dada
a necessidade de prestação de contas à sociedade devido à redemocratização, bem como
à redução dos jornalistas nas redações e aumento de profissionais formados nas
faculdades - levou à profissionalização do mercado de assessorias de imprensa,
inicialmente, mas ampliando-se para várias outras atividades.
O relacionamento com a mídia, entretanto, também deu as bases para a profissão de
relações públicas, de modo que ambas passaram a coexistir nas organizações. Apesar
disso, os autores enfatizam que, embora a profissão de relações públicas preveja a
administração do relacionamento com vários públicos, a tarefa de ligação entre as
organizações e a imprensa foi, geralmente, atribuída a jornalistas.
Ademais, até essa década, as vertentes institucional e mercadológica da comunicação
organizacional chegaram a ser vistas como antagônicas, com os profissionais de
comunicação, em geral, enquadrados na primeira e os de marketing na segunda. Mas, aos
poucos, os estudiosos passaram a abordar a comunicação organizacional de forma mais
ampla, estratégica e integrada (BUENO, 2019d).
Torquato (2015) foi um dos pioneiros a adotar essa perspectiva. Já em 1972, propôs um
modelo sistêmico de comunicação, incorporando nichos clássicos da comunicação social –
jornalismo empresarial, assessoria de imprensa, relações públicas (eventos, endomarketing),
propaganda (institucional e mercadológica), editoração (livros e folheteria), sistemas de
pesquisas etc.

65
Kunsch (2003) admite que a comunicação organizacional integrada compreende, além das
vertentes institucional e mercadológica, a comunicação interna21 e a comunicação
administrativa22. Essa filosofia, conforme a autora, é uma proposta que vai ao encontro da
fragmentação da comunicação e deve ser praticada a fim de se obter eficácia, eficiência e
efetividade23 organizacional.
Por meio dessa perspectiva, conforme a autora, as áreas fundamentais para dirigir a
comunicação organizacional são as relações públicas - com as comunicações institucional,
interna e administrativa -, e o marketing, com a mercadológica. Fonseca Júnior (2007), no
entanto, problematiza essa delimitação de práticas profissionais a determinadas subáreas da
comunicação social.
Para ele, uma vez que se prega quem deve gerir a comunicação organizacional – disputa essa
que também vai para o âmbito acadêmico - a tão propalada filosofia da comunicação
integrada não passa de um mero discurso, pois só é conveniente “se subordinada à orientação
de uma determinada disciplina ou atividade profissional” (FONSECA JÚNIOR, 2007, p. 26).
Bueno (2019d, p. 1) também questiona essa dissidência entre discurso e prática

coexistem duas forças em oposição: a que trabalha no sentido de buscar


a integração das atividades, eliminando barreiras antepostas por "egos
avantajados", que pretendem impor suas posturas e opiniões, e a de
categorias profissionais, ainda presas ao ranço corporativista, como o
que, durante muito tempo (essa situação ainda não foi totalmente
superada!) contrapôs jornalistas e relações públicas, em disputa
acirrada por espaço mais generoso no campo da Comunicação
Organizacional/Empresarial.

Duarte e Duarte (2014) compartilham da ideia de que jornalistas e relações públicas


devem atuar em conjunto para a melhoria da comunicação, com base nas convergências
existentes. Sem entrar no mérito da questão corporativista, Cabral (2004), também, trata
da necessidade da integração no ambiente organizacional e deste com a sociedade para o
sucesso empresarial – e a comunicação, assim, ganha relevo e destaque. Nesse sentido,
profissionais de comunicação devem

21
É um setor planejado para que haja toda interação possível entre a organização e seus empregados,
utilizando ferramentas de comunicação institucional e mercadológica – endomarketing. (CRUZ, 2007).
22
A comunicação administrativa tem a finalidade de orientar, atualizar, ordenar e reordenar o fluxo das
atividades funcionais. Circulares, ofícios, memorandos, editais e murais são os meios mais utilizados neste
tipo de comunicação (CRUZ, 2007; CABRAL et. al, 2009).
23
Eficiente porque cumpre as funções que lhe são esperadas e eficaz porque alcança os objetivos iniciais
propostos (CABRAL et.al., 2009). Efetivo porque traz melhorias para a população visada (MARÇAL, 66
2019).
prover informações e clarificar, dar às pessoas suporte para a expressão
de seus sentimentos, envolver no planejamento e implementação da
mudança, habilitar gestores e empregados como comunicadores e
prover feedback, retroalimentando a comunicação interna (CABRAL,
2004, p. 67).

Independente, portanto, de quem assume a gestão da estrutura profissionalizada de


comunicação da organização, é importante que tal profissional tenha um perfil
multidisciplinar, entenda a comunicação como um processo dialógico e busque gerenciar
as demandas e expectativas dos diversos públicos com as quais ela interage. Além do
caminhar rumo à integração, a Comunicação de uma organização precisa buscar o sentido
estratégico de suas ações. Admitida dessa forma, ela assume uma instância que extrapola o
tático/operacional (formulação de ações ou planos, por exemplo), partindo da leitura do
macroambiente (econômico, político, sociocultural etc.), incorporando a auditoria interna e
estabelecendo métodos de avaliação. Em resumo, pressupõe um processo e não uma ação
específica (BUENO, 2019d).
Para Kunsch (2006), exercer a função estratégica significa ajudar as organizações a se
posicionarem perante a sociedade, demonstrando qual sua missão e seus valores, no que
acreditam e o que cultivam, bem como definirem uma identidade própria e como querem ser
vistas no futuro. E para encontrar as melhores estratégias organizacionais é preciso pesquisa
e planejamento. “Trata-se de participar da gestão estratégica da organização, assessorando a
direção na viabilização de sua missão e seus valores” (KUNSCH, 2006, p. 131).
Adicionalmente, Vianna (2005) destaca o envolvimento da alta direção e a inserção da
comunicação no processo decisório como princípios básicos para a comunicação integrada
se desenvolver nas organizações. Com isso, a comunicação passa a ser vista como estratégica,
devendo estar inserida no seu planejamento.
Apresentados tais pressupostos, será apresentado a seguir projeto que propõe aliança
coletiva nessa perspectiva integrada e estratégica em uma instituição de ensino, a fim de
nela promover uma cultura de comunicação, ou seja, a percepção de que todos os agentes
internos são responsáveis pela comunicação.

Política de comunicação: instrumento estratégico para a comunicação interna


4.1) Importância das políticas de comunicação para as organizações
Seguindo na perspectiva de Bueno (2019d), ainda que a operacionalização das atividades de
comunicação seja descentralizada, conforme as especificidades de cada subárea (Jornalismo,
Relações Públicas, Publicidade etc.), o planejamento de uma organização como um todo

67
precisa ser centralizado e respaldado em uma política de comunicação. Segundo ele, tal
escolha contribui para a economia de recursos e esforços e a consecução de objetivos
estratégicos, como aumentar a vantagem competitiva da organização ou consolidar sua
imagem24, e reputação25 junto aos públicos. O autor conceitua política de comunicação como

processo articulado de definição de valores, objetivos, diretrizes, normas e


estruturas, que tem como finalidade orientar o desenvolvimento de ações,
estratégias e produtos de comunicação para uma organização tendo em
vista seu relacionamento com os diversos públicos de interesse. (BUENO,
2019a, p. 1).

Duarte e Silva (2007) lembram que, somente a partir da década de 1980, após a
redemocratização do Brasil, houve ambiente propício para uma nova etapa na
comunicação das organizações brasileiras, pois a interação dessas com seus públicos se
tornou mais complexa com as conquistas no âmbito da cidadania, importância cada vez
maior da opinião pública e aumento do nível de exigência dos consumidores. Políticas de
comunicação que se tornaram referências para o campo da Comunicação Organizacional
nascem nesse contexto, por iniciativa de organizações que não ficaram passivas a essas
mudanças.
É o caso da Rodhia26, que na segunda metade da década de 1980 colocou em prática seu
Plano de Comunicação Social27, num processo de “abertura de portas”. Esse documento
é considerado a política de comunicação pioneira no país e, portanto, um marco para a
comunicação organizacional brasileira (BUENO, 2009).
Foi, também, o que ocorreu na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa),
em 1995, ao priorizar o desenvolvimento de um amplo programa de comunicação com
seus públicos, orientados por uma Política de Comunicação Empresarial (DUARTE;

24
A imagem de uma organização é sua representação mental construída por um indivíduo ou grupo a partir
das experiências concretas ou influências recebidas por outras pessoas ou pela mídia. Bueno (2019a)
explica que a organização pode ter várias imagens, pois a experiência de cada um com a organização é
individual. Nessa lógica, dois amigos podem ter imagens positivas ou negativas de uma mesma instituição
de ensino, se, por exemplo, um deles teve algum problema específico com determinado professor, e o outro,
não.
25
A reputação é a “fama” da organização. Diferente da(s) imagem(ns), trata-se de uma leitura mais
aprofundada, construída por uma vivência mais intensa e duradoura. Construir ou consolidar a imagem e a
reputação de uma organização é um processo contínuo e ininterrupto (BUENO, 2019a). Para Iasbeck
(2007), a reputação é uma imagem consolidada, ao passo que a imagem em si é uma construção fugaz e
68
inconstante, pautada em sensações e afetividades.
26
Empresa mundial de química de especialidades.
27
O documento é, na verdade, considerado um misto de plano (pela proposição de ações concretas e
datadas) com política (por conter diretrizes mais gerais de comunicação). Geralmente, o plano de
comunicação flui da política.
SILVA, 2007). Em ambos os casos, a construção dos instrumentos possibilitou o
posicionamento da comunicação organizacional no processo de tomada de decisões.
Apesar disso, Bueno (2019a) explica que é difícil encontrar exemplos reais de políticas
de comunicação efetivamente traçadas, devidamente escritas, documentadas ou
construídas coletivamente, servindo de referência para o trabalho de comunicação da
organização. Na área da Educação, em especial nas instituições de ensino, a ausência de
políticas de comunicação explícitas é ainda maior. Alves (2014), por exemplo, constatou
que as universidades federais não tinham, à época, políticas de comunicação
institucionalizadas. Segundo o pesquisador, essas autarquias focam mais na oferta de
produtos de comunicação do que no planejamento das ações.
Scrofernecker (2003), ao pesquisar políticas de comunicação em universidades gaúchas
públicas e privadas, concluiu que apesar de todas as instituições afirmarem dispor desses
instrumentos, quase 70% delas não possuíam documento que comprovasse ou
descrevesse a política adotada. Beltrame (2014), em estudo sobre política de comunicação
na Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, constatou situação
semelhante. Várias autarquias divulgavam em seus sites, dentre as responsabilidades dos
setores de Comunicação, a coordenação da política de comunicação. Contudo, na maior
parte delas não foi encontrado nenhum documento dessa natureza.
Em pesquisa realizada entre 2017 e 2019, esta autora identificou somente 13 políticas de
comunicação entre as 38 autarquias que formam essa Rede Federal, além da criada pelo
Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica
e Tecnológica (Conif) – colegiado que congrega seus dirigentes. Diante desse cenário,
propôs a criação de uma política de comunicação para o Instituto Federal Goiano (IF
Goiano), lócus do estudo da pesquisadora, onde atua como jornalista há dez anos
(CANÊDO, 2019). Detalhes desse trabalho serão apresentados na sequência.

4.2) Rumo à integração: projeto para o Instituto Federal Goiano


Com o intuito de promover ações de comunicação integradoras para instituições de ensino
que compõem a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, esta
pesquisadora desenvolveu, entre os anos de 2017 a 2019, a pesquisa Política de
Comunicação na Rede Federal: Proposta para um Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia. O estudo de caso foi realizado no Instituto Federal Goiano (IF
Goiano), criado em 2008 por meio da Lei 11.892, de 29 de dezembro.

69
Essa legislação instituiu a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e
Tecnológica e criou 38 Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. A Rede é
formada, também, pela Universidade Federal Tecnológica do Paraná, Centros Federais de
Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet-RJ) e de Minas Gerais (Cefet-
MG), além de escolas técnicas vinculadas a universidades federais e o Colégio Pedro II.
Todas as instituições são fruto de um reordenamento e expansão, iniciados em abril de
2005.
Conforme esse dispositivo, Goiás ficou com dois institutos: o Instituto Federal Goiano,
com vocação para as ciências agrárias, e o Instituto Federal de Goiás (IFG), voltado para
cursos na área industrial. O IF Goiano integrou os antigos Centros Federais de Educação
Tecnológica (Cefets) de Rio Verde, Urutaí e sua respectiva Unidade de Ensino
Descentralizada de Morrinhos (Uned) e a Escola Agrotécnica Federal de Ceres (EAFCe)
– todos provenientes de antigas escolas agrícolas (IF GOIANO, 2019).
Como órgão de administração central, o IF Goiano teve sua reitoria instalada em Goiânia,
capital de Goiás. Entre unidades mais antigas e mais recentes, com e sem autonomia
administrativa, a Instituição tem, atualmente, 12 unidades em Goiás, instaladas em
praticamente todas as regiões do Estado. Ela conta, também, com um Polo de Inovação
no município de Rio Verde, voltado para o desenvolvimento de projetos de pesquisa e
inovação em parceria com agroindústrias.
O IF Goiano é uma autarquia federal equiparada às universidades federais. Oferece
educação básica e profissional, com cursos técnicos preferencialmente integrados ao
Ensino Médio, além de educação superior (BRASIL, 2008). Atende, hoje, mais de 25 mil
alunos (IF GOIANO, 2019). Possui uma estrutura multicampi, buscando interiorizar a
educação a cada vez mais municípios, não só por meio de unidades físicas como também
por polos de educação a distância. Figura, também, como instituição comprometida com o
desenvolvimento tecnológico, econômico e socioambiental das regiões onde está inserido,
contribuindo, desta forma, na construção das políticas públicas.

4.3) Resultados teóricos e práticos


A proposta de construção de uma política de comunicação para o IF Goiano já havia sido
assunto de discussão em reuniões de trabalho dos comunicadores da reitoria e dos campi.
A sistematização de diretrizes foi comentada, inclusive, em trabalhos acadêmicos. Ao
estudar como a comunicação do IF Goiano era percebida pelos seus servidores, Oriente
(2015), por exemplo, atestou que cada campus vinculado à Instituição tinha uma forma

70
particular de comunicar, mas ressaltou a importância de uma unidade de comunicação
que represente o Instituto como um todo.
Essa fragmentação da comunicação levou, ao longo dos anos, à desintegração dos agentes
do IF Goiano e, consequentemente, ao enfraquecimento da imagem institucional junto
aos seus diversos públicos. Na última década, observou-se que, mesmo com significativo
investimento em equipamentos, novos servidores e recursos orçamentários, existem
poucas ações integradoras, normativos e diretrizes instituídos para a área.
Há dificuldade de integração até mesmo entre as equipes responsáveis pela comunicação
organizacional, nos diversos âmbitos da Instituição. O projeto de integração, portanto,
constitui em um grande desafio para o Instituto, dada sua complexidade, caracterizada
principalmente pela capilaridade geográfica e multiplicidade de públicos com quem
precisa dialogar.
Para dar os primeiros passos, estabeleceu-se um grupo de pesquisa, formado pela
pesquisadora responsável – autora deste trabalho - e outros dois pesquisadores
participantes, sendo uma jornalista e um publicitário. Por meio de reuniões presenciais e
fóruns on-line, essa equipe atuou em conjunto na validação dos temas propostos, sujeitos
e amostra, coleta e análise de dados, elaboração de produto educacional e divulgação dos
resultados.
O estudo foi realizado na reitoria e nos campi Rio Verde, Trindade e Ipameri, escolhidos
intencionalmente por critério de representatividade – campus antigo, em expansão e
avançado, respectivamente. Considerou-se que, no geral, as unidades do IF Goiano têm
características comuns às três unidades, conforme essa classificação. Nesses locais, entre
comunicadores, gestores, servidores docentes e técnico-administrativos, foram
consultados 387 indivíduos. Como resultados da pesquisa, definiu-se, entre
comunicadores e gestores da Instituição – em um processo inédito - os públicos
estratégicos prioritários do IF Goiano. Esse é considerado pela literatura acadêmica
(BELTRAME, 2014; BUENO, 2014) o primeiro passo para a construção de uma política
de comunicação. Também foi realizado, entre estudantes e servidores dos três campi, um
diagnóstico que constatou, entre outros pontos, que a falta de integração entre os públicos
é a principal dificuldade para a comunicação se desenvolver na autarquia. Além disso,
por meio de entrevistas semiestruturadas junto a gestores e comunicadores e análise
documental de instrumentos normativos do IF Goiano, foi possível detectar que há uma
dissonância entre teoria e prática no que se refere à comunicação estratégica.

71
Isso significa que, embora a comunicação esteja presente e em lugar de destaque na lei
de criação dos Institutos, no Estatuto e no Regimento Geral do IF Goiano, e seus gestores
considerarem o setor de Comunicação essencial para a Instituição, no dia a dia ainda há
um longo caminho a ser percorrido. É necessário, por exemplo, que a estrutura
profissionalizada da organização seja ampliada e comece a participar efetivamente dos
processos de tomada de decisão.
Por fim, o estudo trouxe uma proposta de roteiro para que o IF Goiano construa sua
política, e com base nos levantamentos e resultados, a pesquisadora criou o produto
educacional Política de Comunicação na Rede Federal: guia para gestores. Trata-se de
uma publicação eletrônica disponível nas versões PDF e web
(www.politicadecomunicacaoif.com.br), voltada a gestores da alta gestão, a fim de
despertar a consciência para a importância da temática, mostrar exemplos de organizações
que criaram suas políticas, apresentar resultados da pesquisa no IF Goiano e oferecer um
passo a passo para as instituições que desejarem empreender projetos dessa natureza.
Tal produto foi aplicado e aprovado junto a gestores do IF Goiano e, desde março de
2020, a Instituição está criando sua política de comunicação, a partir de um processo de
construção coletiva, envolvendo diversos públicos – com atenção especial aos internos.
O processo consiste em reuniões temáticas, com participação de membros de uma
comissão permanente, constituída por servidores da Comunicação e de diversas outras
áreas da autarquia, além de um assessor externo e diversos convidados.
A experiência em curso já trouxe alguns resultados práticos. Entre eles, maior
interlocução entre profissionais de comunicação e gestores, que passaram a planejar
juntos processos que, antes das discussões, eram delegados ao setor de Comunicação
apenas no final, para divulgação. A previsão é de que o IF Goiano lance, ainda em 2020,
sua política de comunicação, mas o trabalho não termina aí. Pois como recomendam
pesquisadores (BUENO, 2019a), após a construção da política, há um intenso trabalho de
sensibilização para implementar os planos e produtos dela derivados – e é isso que vai
gerar, de fato, uma mudança no sentido da integração dos públicos internos da
organização.
Acredita-se que o caráter coletivo e, portanto, democrático de construção da política
influencie na adesão dos agentes nesse processo – perpassando inclusive diversas gestões,
sendo repassada ao longo do tempo como um valor da cultura organizacional
(BELTRAME, 2014). Essa cultura deve caminhar no sentido de despertar nos públicos

72
internos o sentimento de pertencimento e de que todos na Instituição são, em alguma
medida, responsáveis pela comunicação.
Ressalta-se, porém, a necessidade de que, mesmo antes de implementada, a política do IF
Goiano – assim como qualquer outra política de comunicação – preveja, já no seu
lançamento, possibilidades de avaliação permanente e revisão (BUENO, 2019a). Do
contrário, funcionará somente como um documento institucional a mais, desgastando-se
com o tempo.

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75
Não basta pesquisar, precisa divulgar
Desafios e perspectivas para o jornalismo científico
nas universidades públicas brasileiras
Luciane Treulieb e Arquimedes Pessoni

No Brasil, as universidades públicas são espaços que desempenham um papel crucial na


sociedade ao impulsionarem o desenvolvimento científico, tecnológico e intelectual da
nação. Existem, no país, 199 universidades, sendo 107 delas instituições públicas (INEP,
2019). São essas universidades e institutos de pesquisa os responsáveis por mais de 90%
das pesquisas científicas realizadas no Brasil (CROSS et al., 2018) e que colocam o país
entre os 15 países que mais produzem ciência no mundo (FAPESP, 2020).
As pesquisas de percepção pública da ciência revelam um grande interesse da população
brasileira por temas de Ciência e Tecnologia (C&T). O resultado mais recente, divulgado
pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e o Museu da Vida em 2019, mostrou que 62%
dos respondentes estão interessados ou muito interessados em algum assunto relacionado
à C&T. Entretanto, há dois outros números que chamam a atenção e são desalentadores:
90% dos brasileiros não lembram ou não sabem apontar o nome de um cientista do país
e 88% não lembram ou não sabem indicar alguma instituição de ciência e tecnologia.
“Nem mesmo as universidades foram muito citadas, embora sejam os principais centros
de produção de conhecimento científico” (CGEE, 2019, p.17) salienta o relatório. Como
analisa Teixeira (2018, p.229), “o índice é muito alto e demonstra que quem produz não
está conseguindo se aproximar da população a ponto de se fazer lembrar como instituição
de referência neste campo”. A pesquisadora ainda questiona: “por que a população não
lembra que nas universidades se produz ciência, se nestas instituições a pesquisa é um
dos seus tripés fundamentais, ao lado do ensino e da extensão?” (TEIXEIRA, 2018,
p.230).
Estamos vivendo um período histórico em que as evidências científicas estão sendo
deliberadamente minimizadas nos chamados movimentos anticientíficos, como o
terraplanismo e os grupos antivacina, que são crescentes e mundiais. Nesse contexto, a
ciência brasileira também está sob ataque, que é percebido, de forma clara, nos cortes

76
orçamentários sofridos nos últimos anos28. A falta de apoio popular às universidades
públicas e o do não-reconhecimento das atividades ali realizadas, parecem ter dado uma
“chacoalhada” nessas instituições, que demonstram estar despertando para a importância
de realizar atividades e projetos de divulgação científica e de jornalismo científico.
Consideramos importante, ainda neste ponto inicial do texto, apresentar esses dois
conceitos: é chamada de divulgação científica a produção e veiculação de informações
científicas e tecnológicas em linguagem acessível ao público leigo, visando atingir ampla
audiência (BUENO, 2009). Por público leigo entende-se a “pessoa não especializada, o
cidadão comum” (BUENO, 2014, p.6). Segundo Bueno, para alcançar tal objetivo, podem
ser utilizados distintos recursos, técnicas, processos e produtos (veículos ou canais), como
livros, vídeos, espetáculos teatrais e palestras. São vários os propósitos conferidos, ao
longo do tempo, à atividade de divulgação científica: garantir legitimidade à própria
ciência junto à sociedade, despertar vocações de futuros cientistas e promover a
“participação das pessoas em processos de tomada de decisão que, cada vez mais,
envolvem o conhecimento científico e tecnológico” (PEZZO; MARQUES; FABRICIO,
2018, p.70).
Já o jornalismo científico é uma forma particular de divulgação científica. Trata-se de
uma atividade jornalística especializada em assuntos de C&T, ou seja, deve obedecer aos
princípios e técnicas fundamentais do sistema de produção jornalístico e seguir alguns
atributos básicos, como atualidade, difusão coletiva, compromisso com o interesse
público e ética (BUENO, 2009). Queiroz e Becker (2016, p.183) apontam que o
jornalismo científico “atua especialmente através da imprensa, dando movimento ao
processo de circulação de informações em C&T e agindo, inclusive, como mediador entre
as fontes de informação e o público receptor”. Em geral são os jornalistas - profissionais
que dominam os processos e os atributos comuns da profissão - os responsáveis pela
produção dos conteúdos de jornalismo científico (QUEIROZ; BECKER, 2016). A escrita
jornalística, como norma, deve ser coloquial, amena, atraente, objetiva e simples
(OLIVEIRA, 2010, p. 43). E, nos conteúdos que tratam de ciência, para que haja uma
melhor compreensão por uma audiência ampla, a linguagem e os conceitos científicos
precisam ser recodificados, ou seja, “transpostos de uma linguagem especializada para
outra não especializada” (BUENO, 2014, p.6).

28 “Mesmo blindado, orçamento da ciência já nasce contingenciado para 2020” do Jornal da USP, publicada
em 13 de dezembro de 2019 e disponível em https://jornal.usp.br/universidade/politicas-cientificas/mesmo-
blindado-orcamento-da-ciencia-ja-nasce-contingenciado-para-2020/. Acesso em: 27 jun. 2020.
77
Kunsch (1992), ao discorrer sobre comunicação nas universidades, enfatizava a
importância da popularização da pesquisa, da ciência e da tecnologia. Segundo a autora,
o papel da universidade é: “criar condições para que a sua produção científica chegue até
a sociedade” (KUNSCH, 1992, p. 82). Para exercer a cidadania, os conhecimentos
científicos e tecnológicos são essenciais à população. Além disso, é fundamental o
entendimento, por parte da comunidade, de que questões rotineiras, como nutrição, saúde,
economia e mudanças climáticas, são, também, questões de ciência. Por isso, é tão
importante torná-la acessível e divulgar como as descobertas científicas influenciam no
dia a dia das pessoas. O fato de a produção de conhecimento realizada nas universidades
federais ser viabilizada graças a investimentos públicos torna ainda mais necessário que
os resultados obtidos retornem à sociedade, e a divulgação científica é uma das principais
formas para que isso ocorra:
[...] a universidade tem não só o dever, mas também a responsabilidade
social de reproduzir sua pesquisa, de forma aberta, a toda a sociedade.
Não se justifica mais uma produção científica enclausurada em arquivos
e prateleiras, com restrito acesso de uma minoria privilegiada. É preciso
democratizar a universidade. Um serviço de comunicação é o melhor
caminho para a abertura de novos canais de diálogos e democracia,
dentro e fora da universidade (KUNSCH, 1992, p.27).

No que se refere à produção de conteúdo científico, as universidades são, de acordo com


Oliveira (2010), detentoras de informações primárias, ao lado de institutos de pesquisas,
agências de fomento, fundações de amparo, entre outras. Para que exista um fluxo
contínuo de informações sobre C&T, essas instituições são vistas como pontos de partida
estratégicos. Segundo Teixeira (2016), o trabalho que essas instituições produtoras de
conhecimento realizam por meio dos setores de comunicação e, quando possível, do
jornalismo científico, é o ponto em que os campos de ciência e tecnologia e da
comunicação se tocam.
O papel do jornalismo científico exercido nas universidades precisa ser de protagonismo no
resgate da legitimidade da ciência perante a sociedade. Além de serem propulsoras de
pesquisas, as universidades podem colaborar para transformações sociais positivas ao
transmitir, democratizar e difundir os conhecimentos oriundos dos cientistas aos seus
diversos públicos. Contudo, como veremos nos tópicos a seguir, muitas universidades
públicas brasileiras ainda não possuem políticas específicas de divulgação científica e
acabam não investindo suficientemente neste quesito.

78
Essas instituições deveriam ser protagonistas dos esforços para produção, de forma
responsável e com foco no cidadão, de conteúdos de jornalismo científico. Quando
relaciona achados científicos com o dia a dia do cidadão comum e leva ao público leigo
informações sobre a ciência produzida nos centros de ensino e pesquisa, o jornalismo
científico tem uma função de inclusão social, proporcionando conhecimento técnico-
científico à população.
Sabe-se que há semelhanças, em termos de possibilidades e dificuldades de ação, nos
setores de comunicação nas instituições de ensino superior públicas. Como destaca
Silveira (2019, p.216), o fato de as assessorias das universidades serem vistas como
veículos de comunicação que trabalham para seu próprio canal de notícias é um grande
diferencial, “pois não há a obrigação de corresponder apenas à agenda da mídia, e assim
possibilitando produzir conteúdo que faça sentido, em primeiro lugar, para os públicos da
instituição”.
As inúmeras maneiras encontradas para divulgar a ciência produzida nas universidades e
instituições de pesquisa vêm atraindo o interesse de pesquisadores brasileiros já há algum
tempo, mas houve um boom de pesquisas e artigos tanto sobre divulgação científica
quanto jornalismo científico nesses espaços principalmente na última década (BUENO,
2014; CARMO, 2015; FONSECA, 2019; QUEIROZ; BECKER, 2016; TEIXEIRA,
2018). Têm-se percebido um esforço nas universidades federais de incorporar essas
atividades à rotina da instituição, muitas vezes de forma tímida e esbarrando em situações
já conhecidas pelos estudiosos da área e pelos profissionais dos setores de comunicação,
como equipes enxutas e não profissionalizadas; não-priorização de pautas sobre ciência
no dia a dia e a relação, às vezes tensa, entre cientistas e jornalistas. Esses são alguns
pontos que serão ampliados a seguir, numa tentativa – sabemos que não definitiva – de
reunir as discussões sobre dificuldades e também de apresentar propostas para solucionar
ou melhorar esse cenário.

Quer tornar a divulgação científica prioridade? Institucionalize!


Sabine Righetti contou, em entrevista publicada na revista Objethos, sobre uma palestra
que realizou, no início de 2020, na Universidade Federal de Pelotas, na qual lhe foi
perguntado sobre as ações que poderiam ser tomadas para melhorar a divulgação
científica de tal instituição: “O primeiro passo é ter uma decisão institucional: a prioridade
é ter uma agência científica” (RIGHETTI, 2020), respondeu. A resposta dada por Righetti
vai ao encontro do que Kunsch destacava, já em sua tese pioneira sobre a comunicação

79
nas universidades, em 1992, ou seja, a “importância de possuir, em sua estrutura
organizacional, um sistema planejado de comunicação, apto a difundir de forma eficaz a
sua produção científica” (KUNSCH, 1992, p. 9).
Estudos realizados nos últimos anos demonstram que isso ainda não está acontecendo no
Brasil. Queiroz e Becker (2016) concluíram, após análise da presença da divulgação
científica nos portais das 50 melhores universidades brasileiras elencadas pelo Ranking
Universitário Folha de 2015, que
[...] seria de suma importância que a divulgação em C&T recebesse o
merecido destaque e que estivesse presente em todas as universidades.
Contudo, percebeu-se através desta pesquisa que isto não ocorre, pois
em alguns casos o tema recebe um tratamento profissional, mas na
maioria ele fica totalmente relegado a segundo plano (QUEIROZ;
BECKER, 2016, p. 194).

Os autores ainda perceberam, em sua análise, que, mesmo tendo sido facilitada pela
internet nos últimos anos, para muitas universidades a divulgação científica “não aparenta
ter a importância merecida; pelo contrário, parece ser um gasto desnecessário ou um
investimento sem retorno, já que nem todas investem neste recurso” (QUEIROZ;
BECKER, 2016, p. 184). Na mesma linha, a dissertação de Carmo (2015), dedicada a
estudar a divulgação científica em três instituições de ensino superior do ABC Paulista
(uma federal, uma municipal e uma privada), apontou que existiam diretrizes
organizacionais no sentido de valorização da divulgação científica, mas nenhuma
apresentava fluxo de comunicação e ações efetivas nesse sentido. Ou seja, não era algo
que estava institucionalizado, pois, apesar de se reconhecer a importância da divulgação
científica, pouco se fazia para efetivá-la na prática das universidades. Outro exemplo
demonstrativo que ciência não é prioridade entre temas e enfoques dados pelas equipes
de comunicação institucionais é a análise realizada em abril de 2014 por Bueno, em quatro
portais de universidades (uma federal, uma estadual e duas privadas). Segundo concluiu
o autor, levando em conta o tripé ensino, pesquisa e extensão, a pesquisa científica foi a
menos presente nas notícias e, quando contemplada, recebeu cobertura não qualificada,
não permitindo apreender o essencial da investigação científica realizada (BUENO,
2014).
Para a institucionalização das ações de divulgação científica, é fundamental que exista,
em primeiro lugar, uma equipe de comunicação profissionalizada e com infraestrutura
adequada em cada universidade. Idealmente, universidades grandes deveriam contar com
comunicadores em cada instituto/departamento. Contudo, ainda hoje, nem toda

80
instituição possui uma equipe de comunicação com servidores públicos profissionais- e
campi afastados tendem a ser mais desprovidos de um setor de comunicação
profissionalizado do que as sedes centrais. É comum que estagiários, bolsistas, estudantes
de pós-graduação ou até mesmo profissionais de outras áreas assumam a responsabilidade
pela comunicação institucional, demonstrando a falta prioridade que é dada à área.
Kunsch (2019, p.15) enfatiza a necessidade de “tornar as Assessorias de Comunicação
mais estratégicas, dinâmicas e produtivas”. Também é importante que os setores
responsáveis pela comunicação das universidades trabalhem, junto às unidades
acadêmicas, para que se tornem conhecidos e enfatizem qual o seu papel na instituição.
A partir disso, dever-se-ia criar uma cultura da divulgação científica que incluísse todos
os membros da universidade, instituindo um trabalho estruturado e um projeto concreto
com o apoio dos dirigentes (reitores e pró-reitores), a gestão e os profissionais do setor
de comunicação, em conjunto com os pesquisadores e em diálogo constante com a
comunidade leiga, tanto interna como externa. Tal resultado poderia ser obtido a partir da
discussão e implementação de uma política de comunicação que contemplasse a
divulgação da pesquisa como ação prioritária a ser desenvolvida (BUENO, 2014).
A institucionalização poderia também abrandar uma questão que ameaça constantemente
o desenvolvimento e a manutenção de projetos de divulgação científica: segundo Musse
(2019, p.152), muitos sofrem solução de continuidade devido à mudança do reitorado,
que ocorre nas universidades federais a cada quatro anos. Para a autora (MUSSE, 2019,
p. 152), “a disputa política tem [...] abortado muito boas ideias e ações, o que acena desde
já para a necessidade de se discutir a Comunicação em fóruns que não estejam sujeitos às
intempéries eleitorais e que possam formular políticas dinâmicas, mas também
duradouras”. A inclusão da priorização da divulgação científica como um dos pontos
considerados no Plano de Desenvolvimento Institucional de cada universidade também
poderia ser uma estratégia para que se criasse e mantivesse uma cultura da divulgação da
ciência independentemente das gestões que estão no poder.

Menos agenda do reitor, mais ciência


Equipe integrada ou agência de divulgação científica? Não parece haver uma resposta
única e correta para esta questão, pois sabemos que as universidades públicas possuem
estruturas comunicacionais desiguais e é necessário se organizar a partir dos recursos
disponíveis. Contudo, pesquisadoras da área de divulgação científica apontam alguns
caminhos. Ao pensar sobre a estrutura necessária para o desenvolvimento de um trabalho

81
de divulgação científica e de jornalismo científico, Kunsch (2019) retomou aspectos que
já defendia em 1992:
[...] que a Universidade possua em sua estrutura organizacional uma
Comunicação Integrada, que contemple também um Centro de
Comunicação Científica. Este centro deve existir para atuar na difusão,
disseminação e divulgação, como polo irradiador e capaz de
desenvolver/executar novos projetos voltados para a ampliação da
interação da sociedade, mediante a promoção de uma maior visibilidade
para a produção científica, tecnológica e cultural da Universidade.
Acrescentaria hoje que esse centro seja regido por uma Comunicação
Pública da ciência e que esta seja praticada de forma dialógica
(KUNSCH, 2019, p.16).

Righetti (2020b) também acredita que precisa estar claro, na estrutura da universidade, o
que é comunicação institucional e o que é divulgação científica. Carmo (2015) propõe
que as instituições de ensino e pesquisa tenham um espaço específico para reunir todas
as ações de divulgação científica. Esse setor serviria como referência para que todos os
públicos encontrassem informações sobre as pesquisas desenvolvidas pela universidade.
Ela sugere, ainda, que haja profissionais dedicados somente para esse fim: “[...] o
profissional de comunicação deve fazer parte da estrutura de um processo de divulgação
científica para que ele possa contribuir com seu conhecimento sobre públicos,
ferramentas de comunicação e linguagem”. (CARMO, 2015, p. 73). Contudo, sabe-se que
a realidade é outra: quando há equipes que incluem comunicadores, elas são enxutas e
muitas vezes não permitem essa divisão. Portanto, chega-se a uma equação a ser resolvida
no dia a dia: a que pautas priorizar, quando há uma comunidade interna que precisa ser
informada sobre fatos institucionais relevantes, sabendo que também existe um público
externo à universidade, a quem se deve contar sobre a ciência produzida na instituição?
Segundo Orsi (2020), historicamente, as estruturas de comunicação das universidades
foram concebidas como “guardiãs da imagem da instituição e das autoridades que a
representam – reitores, diretores, chefes de departamento, etc. – e não como veículos de
interação com o público e divulgação científica”. Nesse sentido, para o autor, esses
setores não têm a tradição, tampouco foram estimulados a “desenvolver as competências
necessárias para comunicar ciência de forma agradável, interessante e eficaz”. Isso pode
explicar porque, de acordo com levantamentos realizados nos últimos anos (BUENO,
2014; FONSECA, 2019) a maior parte das informações veiculadas nos sites das
universidades trata de temas de interesse somente do público interno, ou seja, da
comunidade acadêmica, como assinaturas de convênios, lançamento de editais e
solenidades: “Por mais que os reitores tenham de prestar contas de suas atividades de

82
gestão, há um desequilíbrio nos conteúdos veiculados pelas assessorias de imprensa das
universidades”, critica Fonseca (2019, apud PIERRO, 2019).
Silveira (2019), ao discorrer sobre a realidade da Universidade Federal de Juiz de Fora,
revela que muitos dos esforços que poderiam ser aplicados em abordagens mais criativas
de pautas ou na divulgação científica acabam sendo despendidos em demandas internas
institucionais. A pesquisadora vê como essencial que o tratamento da informação
institucional seja definido em uma política, “minimizando as disputas do dia a dia
por espaço e visibilidade” (SILVEIRA, 2019, p. 217).
“É preciso seguir protocolos de divulgação condizentes àquilo que a equipe é capaz de
fazer”, afirma Righetti (2020c). Para ela, esses protocolos devem estar claros para toda a
comunidade acadêmica e conter informações como: quantos estudos vão ser divulgados
semanalmente? Por qual mecanismo eles devem chegar até o setor de comunicação
institucional? Quais são critérios que serão utilizados para avaliar e selecionar as pautas?
Assim, os pesquisadores podem entender melhor por que “foi veiculada uma matéria
sobre a pesquisa do meu colega, mas sobre a minha não”, evitando problemas e crises
internas na universidade. Por outro lado, Righetti relata que, para a criar a Agência Bori29,
foram feitos estudos nos quais se constatou que as assessorias de imprensa das
universidades não sabem o que os cientistas estão fazendo: “elas não conseguem
acompanhar em tempo real. Olhamos bases de periódicos e descobrimos que as próprias
comunicações das universidades não acompanham a produção científica de seus
pesquisadores” (RIGHETTI, 2020a).
A Comunicação Científica, ou seja, os periódicos especializados, após serem
recodificados, poderiam servir de fonte para os jornalistas e divulgadores para a
elaboração de pautas. Como lembra Bueno, “em muitos casos, citações literais de
material ou reprodução de falas identificadas com a Comunicação
Científica são repassadas ao público leigo” (BUENO, 2019, p. 108). No caso das
universidades, é perceptível que os artigos científicos produzidos pelos pesquisadores
muitas vezes não chegam ao conhecimento dos setores de comunicação, pois há falta de
diálogo entre a estrutura comunicacional institucional e os grupos de pesquisa ou
pesquisadores em particular (BUENO, 2014). Equipe pequena e excesso de demandas
fazem com que “esse processo de realizar uma curadoria e acompanhar pesquisas para

29 A Agência Bori é uma iniciativa criada para conectar o conhecimento inédito produzido por
pesquisadores brasileiros a jornalistas de todos os tipos de veículos de comunicação do país. Disponível
em: https://abori.com.br/
83
descobrir se elas são relevantes ou interessantes acaba não sendo prioridade”, explica
Righetti (2020a). Como expõe Bueno, “há reduzida ou mesmo nenhuma articulação entre
os responsáveis pelos portais e as instâncias de pesquisa na universidade, de tal modo que
as informações sobre as pesquisas desenvolvidas internamente não estão disponíveis para
veiculação” (BUENO, 2014, p. 14). Carmo já sugeriria que era necessário elaborar rotina
consistente que incluísse um fluxo de comunicação da divulgação científica para que
“consigam desenvolver, formalizar, distribuir funções e terem metas e resultados” com a
difusão do conhecimento (CARMO, 2015, p. 80). Para Fonseca (2019), é necessário um
papel decisivo dos gestores na priorização de pautas sobre temas científicos “ao
estabelecer políticas de uso em páginas institucionais, além de estimularem rotinas de
atualização”.

Pesquisadores e jornalistas- aliados ou oponentes?


Parece haver, entre os estudiosos da divulgação científica, um consenso: divulgar a
pesquisa deve ser considerado parte da própria ciência, pois “Ela não termina no paper,
mas na comunicação com a sociedade” (RIGHETTI, 2020a). Fonseca (2019) argumenta
que a tese defendida, o artigo publicado ou o livro lançado não podem ser considerados
o objetivo final do trabalho acadêmico:
Essas são etapas indispensáveis, pois a ciência precisa de seu sistema
de avaliação por pares para que os resultados sejam validados. Contudo,
o trabalho científico só deve ser considerado concluído quando os
resultados, depois de validados, são compartilhados com a sociedade
— seja através de produtos ou serviços, seja por meio de políticas
públicas nos mais diversos campos, incluindo a educação científica
(FONSECA, 2019).

Ocorre que alguns cientistas consideram desnecessária a popularização das suas


pesquisas, pois pensam serem suficientes os espaços conseguidos nos congressos e
periódicos científicos e, muitas vezes, se negam a conceder entrevistas, mesmo a veículos
institucionais da universidade em que trabalham. Como dito anteriormente, a existência
de protocolos explicando como as agências e assessorias institucionais funcionam poderia
ser uma forma de fazer alianças com esses pesquisadores e estimulá-los a serem mais
colaborativos.
Além disso, muitos cientistas brasileiros não compreendem a dinâmica do jornalismo,
pois há uma questão de timing, ou seja, o tempo necessário para a produção de uma
pesquisa científica em comparação ao tempo do jornalismo. Como comentam Castilho e
Facó,“enquanto o jornalista preza pelo imediatismo da informação, o que pode

84
comprometer a qualidade da apuração e transmissão dos dados, os cientistas buscam a
riqueza de detalhes e uma fidelidade à linguagem científica” (2011, p.6). Devido à rotina
de produção jornalística, os pesquisadores não deveriam esperar que os repórteres
tivessem disponibilidade de ler integralmente teses ou livros, principalmente pelo tempo
que isso demandaria. Às vezes, mesmo um resumo ou um artigo com poucas páginas,
mas com termos muito complexos, pode não ser compreendido. Como a função dos
jornalistas é ser um “mediador entre o público, de um lado, e o cientista e o que ele faz,
do outro” (CAIRES; NAOE, 2018, p. 14), a responsabilidade do comunicador é fazer
perguntas e produzir um texto contextualizado a partir das respostas recebidas- e ele conta
com a colaboração do entrevistado para conseguir elaborar o material com linguagem
acessível ao público leigo.
Buscando sanar essas dificuldades de compreensão das rotinas jornalísticas por parte dos
pesquisadores, a USP lançou, em 2019, o Guia “De cientista para jornalista”, no qual
busca oferecer aos pesquisadores da instituição informações sobre os meios de
comunicação institucionais e subsídios para quando eles forem abordados por veículos da
imprensa, além de discutir o importante papel que os pesquisadores têm a desempenhar
ao exporem suas pesquisas. Neste guia, algumas pistas são dadas para orientarem os
cientistas, que devem levar sempre em conta que entre os principais valores que norteiam
o jornalismo estão a atualidade e o ineditismo: “se seu projeto/pesquisa for o primeiro,
novo, o mais antigo, o maior, exclusivo em alguma característica, acabou de ter
financiamento aprovado, ou já apresentar alguns resultados promissores, ele poderá se
tornar uma notícia” (CAIRES; NAOE, 2018, p. 6).
Há, ainda, muita resistência dos acadêmicos em tornar públicas as pesquisas em
andamento e/ou em estágios “embrionários”. Não haveria, contudo, problema em contar
sobre uma investigação que ainda está sendo desenvolvida se se explicasse ao público
questões envolvendo o processo científico. No entanto, mesmo nos (ainda poucos)
conteúdos produzidos pelas assessorias de comunicação das universidades sobre
pesquisas científicas, a ênfase costuma ser posta nos resultados e produtos, e não nos
processos de construção do conhecimento. Para Orsi, “o que torna a ciência especial não
é o que a ciência diz, mas como determina o que deve dizer” (2020). O autor comenta
sobre a tentação, muitas vezes em virtude da falta de tempo ou espaço, de o jornalista ir
direto aos resultados. Porém, para ele, “sem dar a devida atenção aos processos e à lógica
da ciência, tudo o que temos são pessoas de jaleco dizendo ‘confie em mim’, o que não
funciona mais nem em comercial de pasta de dente” (ORSI, 2020).

85
Talvez a reclamação mais comum entre os assessores-jornalistas é de que parcela dos
cientistas ainda acreditam estarem instalados em torres de marfim (SANTOS, 2000). Por
outro lado, os cientistas queixam-se de que a imprensa deturpa suas falas, prejudica o
entendimento correto da sua pesquisa e gera sensacionalismo. Isso acaba causando a falta
de interesse de alguns especialistas em expor o trabalho ao grande público. “Outros
evitam expor na mídia suas ideias por falta de segurança em relação a seu trabalho ou
medo de ser avaliado por milhares ou até milhões de pessoas, dependendo do meio de
comunicação, em vez do público restrito das revistas científicas” (FALCÃO, 2005, p.
102). Às vezes existem críticas, entre os próprios pares, de que poderia “pegar mal” para
os cientistas aparecerem muito na mídia. Duarte (2004) recomenda que sejam feitas
discussões internas nas universidades para conscientização, mobilização e estímulo à
divulgação científica. Além disso, manuais- como o guia da USP- e capacitações
poderiam ser preparados como ferramentas para orientar os pesquisadores para atuarem
com desenvoltura na relação com a imprensa. Segundo Bueno, a capacitação do cientista
em comunicação poderia ajudar a minimizar as incompreensões, preconceitos e atritos de
relacionamento existentes entre esses dois grupos. “o pesquisador deve estar disposto e
em condições de dialogar com públicos não especializados, adaptando as suas falas e
escritos ao universo de conhecimentos e ao nível de linguagem do cidadão comum”
(BUENO, s/d).
Os cientistas deveriam perceber os jornalistas como parceiros e buscar desenvolver uma
relação mais harmoniosa com a mídia, pois tais ações poderiam beneficiar o trabalho
científico realizado, a instituição da qual fazem parte e o público a ser atingido. Rehen
(2018) conta que muitas colaborações surgiram para ele a partir da visibilidade adquirida
por meio de atividades de divulgação científica. “Você acaba identificando parceiros,
pessoas interessadas no teu trabalho, além daquele teu nicho [...] pessoas de outras áreas
identificaram minha pesquisa como algo interessante e inclusive potencialmente
estratégico, pensando em colaborações científicas”. É fundamental, ainda, no que diz
respeito à divulgação científica por meios institucionais, que professores e estudantes
desenvolvam o hábito de informar as assessorias de imprensa quando publicarem artigos
em periódicos importantes. Outras ações simples, porém efetivas, são manter os contatos
(e-mail e telefone) sempre atualizados e responder à imprensa com presteza sempre
quando forem contatados, seja a assessoria da universidade ou a imprensa externa.
Os profissionais de comunicação não pretendem, propositadamente, deturpar o que os
pesquisadores dizem. Há de se reconhecer, porém, que “a desconfiança do pesquisador

86
em relação ao comunicador não é infundada, se olharmos para casos em que a imprensa
erra ou distorce a fala do entrevistado” (CAIRES; NAOE, 2018, p.1). Apesar de ser uma
prática questionada em manuais de jornalismo, acontece, às vezes, de os repórteres
enviarem os textos finalizados para os cientistas (fontes das matérias) revisarem,
principalmente quando não há deadlines apertados. No jornalismo científico institucional,
tal envio, além de assegurar a precisão das informações, pode evitar crises internas e a
perda de cientistas-aliados nas universidades. Entretanto, como relembra Dias (apud
CAIRES; NAOE, 2018, p.12), “O envio é para a conferência de possíveis erros técnicos
ou conceituais apenas”. Ou seja, os entrevistados não devem alterar palavras, estilos e
formatos, pois as matérias publicadas são de autoria dos jornalistas.
A lógica da vida acadêmica atual pressiona para que os pesquisadores tenham um grande
número de publicações em periódicos voltados para os pares. Como viemos abordando
ao longo do texto, as universidades precisam reconhecer a importância e,
fundamentalmente, agir para que a divulgação científica seja incorporada às atividades
dos estudiosos. Barata ressalta que “É preciso haver um movimento para que, mais do
que nunca, as instituições incentivem os seus pesquisadores [a divulgar ciência]. Não
precisamos que todo mundo faça, mas devemos reconhecer aqueles que fazem e que
fazem bem” (BARATA, 2019, apud JULIÃO, 2019).
Um papel que todos os cientistas deveriam tomar para si, praticando ou não a divulgação
científica, é exigir que as universidades incentivem e valorizem esse tipo de ação. Os
critérios de avaliação dos pesquisadores e docentes deveriam ser repensados. As ideias
para a valorização institucional da atividade passam, principalmente, pela validação de
horas e pontos para os pesquisadores que se dedicam à socialização dos resultados obtidos
nas pesquisas. No mesmo sentido, entende-se que as pró-reitorias deveriam incluir e
pontuar iniciativas de divulgação científica em seus mais variados editais de bolsas e
financiamento à pesquisa. “A gente acha que precisa ser institucional, que seja parte do
que se espera de um cientista”, revela Righetti (2020b). Para ela, falar com a imprensa e
com a sociedade precisa contar nas avaliações dos programas de pós-graduação. “A
grande mudança vai ser quando a Capes considerar, na avaliação dos programas, a
presença daquele programa na imprensa, por exemplo. A presença na internet. Que ações
de fato aquele programa tem pra falar com a sociedade?”. A pesquisadora relata que isso
existe fora do Brasil e exemplifica que, nos Estados Unidos, “se um cientista não fala

87
com a sociedade, não consegue grant30”. Segundo ela, é necessário transformar a
divulgação científica num protocolo do cientista, ou a situação vai se manter a mesma,
com os pesquisadores reclamando da sobrecarga que seria atender a imprensa. Outra
forma de incentivar a participação dos pesquisadores na divulgação científica seria que
houvesse o posicionamento dos periódicos exigindo o comprometimento do cientista a
falar com a imprensa e divulgar o estudo. De acordo com Righetti (2020b), isso já
acontece em alguns periódicos internacionais, por meio de um termo assinado no
momento de submissão e posterior aprovação do artigo.
Estimular colaborações entre jornalistas/comunicadores das assessorias de comunicação
institucional e cientistas também pode ser uma forma de atrair os pesquisadores para a
popularização da ciência. Bueno (2010) considera que as iniciativas das mídias que mais
têm avançado são aquelas que “contemplam a parceria entre comunicação e divulgação
científica”. Os jornalistas poderiam se dedicar à produção de conteúdos e ajudar na
adequação do texto, pois “Muitas fontes (pesquisadores e cientistas) têm dificuldade em
se comunicar com o público leigo, exatamente porque isso implica em alterar o nível do
discurso e mesmo simplificar certos processos ou conceitos” (BUENO, 2019, p.106). É
preciso, neste contato com os jornalistas, que os pesquisadores percam o receio de falar
de um jeito simples e tentem pensar com a cabeça de quem não é especialista na área. É
necessário um esforço bilateral para resultados satisfatórios. Além disso, alguns projetos
institucionais têm aberto espaços para os próprios divulgadores produzirem conteúdos,
como é o caso dos Blogs de Ciência da Unicamp e do Blog UFABC Divulga Ciência.31

Universidades, cientistas e imprensa


Um estudo realizado por Santos, em 2000, mostrou que a mídia pouco repercutia o
esforço de pesquisa das universidades. Nesse trabalho, de vinte anos atrás, se evidenciava
a reclamação dos jornalistas em relação aos jornalistas-assessores e aos cientistas. Para
os jornalistas da grande mídia, a burocracia das universidades acabava prejudicando a
divulgação científica nacional (SANTOS, 2000). Considerando a relevância das
universidades como principais centros geradores de Ciência e Tecnologia no Brasil,
Kunsch (2008) defende a necessidade da divulgação das pesquisas através dos meios de

30 Apoio financeiro concedido ao pesquisador, comumente por órgãos oficiais, como entidades de apoio à
pesquisa.
31
Disponíveis, respectivamente, em: https://www.blogs.unicamp.br/ e
http://proec.ufabc.edu.br/ufabcdivulgaciencia/
88
grande penetração e reconhecida eficácia comunicativa. A autora citou, em 2008, o rádio
e televisão. Hoje, incluiríamos, sem dúvida, os meios digitais.
Contudo, de acordo com Queiroz e Becker (2016), ao analisarem os sites das 50 principais
universidades brasileiras, percebe-se uma lacuna entre a demanda por informação por
parte dos profissionais da imprensa e a oferta por parte das universidades. Righetti
(2020a) assinala que os jornalistas e comunicadores das instituições “recebem muita
demanda e não conseguem projetar para fora das universidades o que está acontecendo”.
O ideal seria que acontecesse um oferecimento mais ativo de pautas para a mídia externa,
sempre tendo em mente a importância de sugerir a pauta de acordo com o perfil editorial
do veículo, sabendo que as informações científicas produzidas em uma instituição pública
não deveriam ser oferecidas em entrevistas exclusivas (CAIRES; NAOE, 2018).
Apesar de o senso comum ainda indicar para a imagem do cientista como um pesquisador
de jaleco no laboratório, verdadeiramente as universidades abrigam especialistas nas mais
diversas ciências: econômicas, sociais, exatas, políticas, entre outras. Por estarem
presentes em todos os campos do saber, essas instituições têm a obrigação de contribuir
para o debate público - e uma das formas pelas quais isso pode acontecer é os especialistas
das universidades se fazerem presentes nos órgãos de comunicação. Queiroz e Becker
(2016, p.179) lembram que uma maneira efetiva de tornar acessíveis as informações sobre
ciência e tecnologia é por meio da “mediação correta das assessorias de imprensa ou de
um trabalho conjunto que facilite que o conhecimento produzido nos laboratórios
percorra satisfatoriamente um trajeto até os meios de comunicação”. Além disso, é
necessário que os setores de comunicação das universidades e seus pesquisadores se
reinventem, utilizando, com competência e destreza, todos os recursos digitais da
comunicação contemporânea, em especial as redes sociais digitais.

Pandemia, universidades e jornalismo científico


Desde meados de 2019, as universidades brasileiras já estavam fazendo um esforço maior
de comunicação visando à sociedade, devido às diversas crises e cortes que vinham
sofrendo. Inadvertidamente, durante a redação deste capítulo, a pandemia da Covid-19
instalou-se em todo o planeta, fazendo com que a ciência passasse a ser o principal
assunto nas nossas vidas e na imprensa. A pandemia acabou gerando a oportunidade para
informar, de modo mais enfático, sobre as realizações científicas das instituições públicas
de ensino e pesquisa e, também, para se contrapor aos ataques recebidos. Nunca as
universidades estiveram tão em evidência, o que leva a crer que este momento infeliz do

89
coronavírus tenha sido favorável para a divulgação da ciência brasileira, pois são os
pesquisadores das instituições nacionais quem estão respondendo às angústias e anseios
da sociedade para a superação da pandemia.
Se, como expôs a pesquisa de percepção pública de 2019, havia um enorme
desconhecimento da sociedade em relação às instituições brasileiras de ciência, a crise
provocada pela Covid-19 fez com que as universidades públicas realçassem qual é sua
importância para ajudar na solução de problemas sociais. Por causa dessas demandas, o
setor de comunicação passou a ser reconhecido, internamente, como um órgão estratégico
das universidades. Foi necessário que, em poucos dias, fossem centralizadas informações,
elaborados bancos de fontes e realizados inúmeros atendimentos à imprensa. Além disso,
foram intensificados os esforços nas redes sociais digitais institucionais. Como resultado,
houve uma ampla divulgação das pesquisas das universidades brasileiras em todos os
principais veículos do país, com vasta audiência também nas mídias sociais.
Conforme relataram as chefias de comunicação de algumas universidades públicas em
debate ocorrido online em junho de 202032, há instituições que, ao se verem ou verem
seus pesquisadores na mídia, passaram a reconhecer a importância de estar na pauta.
Houve universidades que reforçaram equipes e investiram verba- estruturando mais
adequadamente o setor para melhor se comunicar. Muitos gestores, a partir da crise
provocada pela pandemia e à exaustiva demanda, perceberam o quanto a comunicação
institucional é fundamental. A sociedade pôde testemunhar, por meio de um aumento
substancial de notícias divulgadas, a ciência produzida nas universidades sendo aplicada.
Cientistas das mais diversas áreas precisaram se familiarizar com as rotinas jornalísticas
e aprender a se comunicar com a imprensa para poder atender às demandas de entrevistas
quando acionados.
A questão que deixamos para concluir este capítulo é: o que fazer, quando a crise da
pandemia passar, para que as universidades mantenham a visibilidade sobre seus projetos
e atividades? Existiria alguma forma de manter a atenção da imprensa voltada para
instituições de pesquisa e cientistas, para que, dessa forma, a sociedade continue
acessando essas informações científicas? Para manter a presença da ciência nacional na
imprensa e em evidência, acreditamos que os desafios apresentados no decorrer deste
texto precisam ser encarados e vencidos. A visão da comunicação como institucional e
estratégica precisa permanecer, assim como investimentos para aumentar o número de

32
“A comunicação social das universidades”, no III Fórum Metricas.edu, disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=6A7bVojl08c. Acesso em: 27 jun. 2020.

90
comunicadores nas instituições. É urgente que haja a valorização aos cientistas que
trabalham em prol da divulgação científica. Também é fundamental conservar e estreitar
as relações com a imprensa tradicional criadas neste período de pandemia e investir cada
vez mais na utilização adequada das redes sociais, aproveitando-se do crescimento e
alcance obtidos neste período. A pandemia propiciou que o protagonismo da ciência e das
universidades públicas fosse alcançado. O desafio, agora, é fazer com que essa mudança
de cultura permaneça.

Referências
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compromissos. In: Christina Ferraz Musse. (Org.). Comunicação e Universidade:
reflexões críticas. 1ed.Curitiba: Appris, 2019, v. 1, p. 101-114.
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https://comtexto.com.br/artigos/a-divulgacao-da-pesquisa-cientifica-depende-da-
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93
Inovação em media training: um estudo
a partir de três agências de comunicação

Marcia Cellos Zica e Jorge Duarte

Com a revolução da internet e no ecossistema de informação a partir dos anos 1990,


multiplicaram-se os atores capazes de intervir na produção de notícias, colocando em
xeque os conceitos clássicos sobre comunicação de massa e sobre as práticas de diálogo
e informação com a sociedade. Visibilidade das fontes, mudança na dinâmica da
circulação de informações, maior capacidade de acesso da sociedade, potencial maior de
fiscalização e cobranças por transparência acompanham essa evolução e desafiam a forma
tradicional de construir reputações. Assad e Passadori (2011, p. XIII) afirmam que não
há mais espaço nas corporações para o “nada a declarar”. Rendimento e bom desempenho
nos negócios ficam cada vez mais dependentes da qualidade do relacionamento das
organizações com os stakeholders e com o mundo, embora estratégias de invisibilidade
ou de baralhamento de fatos e ênfases para incompreensão de uma situação possam ser
alternativas (SILVA; BALDISSERA, 2020).
A interação dos executivos com as diferentes mídias, noticiosas ou não, exige preparo
técnico, inteligência emocional, domínio dos diferentes canais, conhecimento sobre os
processos de construção da notícia e das percepções que se formam sobre a imagem de
uma pessoa e da instituição que representa. Saber se posicionar, reativamente ou
proativamente, é um desafio. O chamado media training é uma das ferramentas mais
tradicionais e eficientes na preparação de fontes para o relacionamento com a imprensa
buscando alcançar a sociedade.
O conceito de media training é definido por Passadori e Assad (2009, p. 50) como “o
treinamento que orienta porta-vozes das empresas para lidar com a mídia. O básico em
um programa de media training se resume a resolver uma só questão: como se apresentar
na mídia”. People e Skills (2017) consideram que “media training é uma das ferramentas
de comunicação mais importantes da atualidade, porque oferece maior conhecimento das
regras do jogo nos bastidores do jornalismo, a fim de preparar quem deseja se expor nos
veículos de comunicação”. De acordo com Mota et al. (2016), “o media training prepara
quem deseja espaço nos veículos de comunicação por meio do conhecimento das ‘regras’
de funcionamento da redação e dos bastidores do jornalismo” na atualidade.

94
Schiavoni (2007) afirma que, após a realização de um media training, o porta-voz estará
apto para falar com segurança e objetividade sobre estratégias, produtos, serviços, e, até
mesmo, pronto para gerenciar inesperadas crises. A experiência dos autores deste texto é
de que nem sempre isso ocorre, mas, o fato é que a capacitação geralmente significa um
avanço com relação ao domínio dos processos de interlocução com jornalistas e de
exposição pública. Para Duarte (2018, p.247), “o investimento em capacitação é uma das
melhores maneiras de qualificar o relacionamento com a imprensa, porque ajuda a fonte
a compreender e atender as necessidades do jornalista para aproveitar melhor as
oportunidades de exposição”. Em um contexto de expansão e multiplicidade de canais e
de crescente ampliação da necessidade de interações dos atores sociais, a capacitação
deve abranger a experiência cotidiana dos porta-vozes e as crescentes exigências
resultantes da ampliação dos formatos e canais. Além disso, cada vez mais é reduzida a
diferenciação entre o privado, e o público.
Cada indivíduo se torna um representante público da marca e da imagem corporativa nos
seus perfis pessoais. Também por isso, é crescente a busca pelo aprimoramento das
habilidades de comunicação dos executivos designados como porta-vozes institucionais,
seja nas relações com a imprensa, na interação com demais stakeholders e mesmo em
diálogos com a sociedade em geral. Diante desse cenário, a busca das corporações pelo
media training para seus representantes, um grupo cada vez maior em face a capacidade
de todos a representarem, é um fenômeno facilmente explicável.
Na era da informação, em que qualquer indivíduo deve ter a capacidade de ser um
produtor de conteúdo e influenciador, pode ser limitante não ter a ajuda de um profissional
ou equipe que avalie e oriente sobre posicionamento, mensagens e consequências
específicas da exposição na formação da imagem pública. E a construção adequada da
representação pública da empresa passa fundamentalmente pela capacitação dos porta-
vozes e fontes de informação institucionais em saber lidar com as diferentes formas de
visibilidade.
A capacitação da fonte ou porta-voz - Duarte (2009) diz que todo porta-voz é uma fonte,
mas nem toda fonte é um porta-voz - para lidar com veículos de comunicação é um dos
pilares em que as assessorias de comunicação se baseiam para obter resultados
consistentes. Capacitando fontes em lidar com a imprensa, obtém-se, também,
compreensão mais aguçada sobre interesse público, sobre a importância da didática, da
objetividade, da adaptação ao contexto e da empatia. Também se espera que o porta-voz
amplie sua compreensão sobre a necessidade de oferecer transparência e dar agilidade e

95
qualidade na prestação de informações aos representantes das diferentes mídias. Enfim,
lideranças treinadas fortalecem e favorecem o trabalho da área de comunicação e do
relacionamento da organização com a sociedade.

Ofertas variadas de capacitação


O mercado oferece diversos tipos de capacitação, que, normalmente, são adaptados à
necessidade do cliente. O treinamento mais comum, disponível nas “prateleiras” das
agências de comunicação, é o modelo Básico, que engloba uma visão geral da imprensa,
noções de relacionamento com as diferentes mídias e interação com jornalistas. E, claro,
laboratórios de simulações de entrevistas. Nestas ocasiões, fontes têm exercícios com
câmeras e microfones e passam por entrevista de rádios e de mídia impressa.
Num estágio seguinte, há, no mercado, por exemplo, oferta de cursos para enfrentar
situações de crise, recomendado para aqueles que já passaram por treinamentos básicos,
e que são potenciais fontes de informação em situações críticas que exponham a imagem
da empresa. Esse tipo de treinamento costuma ser desenvolvido por jornalistas ainda mais
experientes, que passaram pelas redações de importantes veículos de comunicação. De
modo geral, a equipe de treinamento é multidisciplinar e pode contar com fonoaudiólogo,
preparador artístico e até “personal stylist”. E, então, os profissionais dão dicas que vão
do conteúdo das mensagens à entonação vocal.
Interligado à evolução das práticas de realização dos media trainings está a disseminação
do uso das mídias sociais. Elas que facilitam e dão agilidade à comunicação em ações
cotidianas (GRANOVETTER, 2005). Não mais é possível, claro, imaginar as práticas de
disseminação de informação de interesse público utilizando apenas a imprensa
tradicional. Nogueira (1999, p.15) avalia que “se a comunicação com os vários públicos
é cada vez mais essencial e valiosa no mundo empresarial, temos que entender que o
gestor moderno, o novo empresário, o novo executivo, precisa ser um comunicador”. É
cada vez mais imprescindível para alguém que pretenda ser uma liderança empresarial,
um executivo eficiente, um representante de uma organização, dominar os conceitos
básicos de comunicação e saber aplicá-los em uma variedade grande de situações.
Assim, a necessidade de criar e agregar valor às marcas e negócios impõe o domínio de
diferentes ferramentas para alcançar todos os públicos ou influenciadores dos negócios
corporativos (LUCAS, 2007, p. 9). Executivos despreparados correm maior risco de
comprometerem a marca, o nome da empresa ou o governo por erros na forma como se
relacionam com a imprensa. Nesse contexto entra o que vamos chamar de

96
“universalização” do uso das técnicas de media training, que hoje não se resumem ao
mundo empresarial.

Explicar e persuadir
Bazanini e Ponzetto (2015) avaliam que persuadir o público é a principal função do media
training “seja em campanhas políticas, seja em um sermão na igreja, seja em uma aula na
universidade ou em redes sociais”. Também dizem que “a principal função do media
training contemporâneo está em preparar o agente para persuadir o seu público”
(BAZANINI; PONZETTO, 2015). E essa necessidade de persuasão por parte das
empresas pode estar associada a diversos fins. Monteiro (2006, p. 125) descreve que um
dos efeitos pretendidos (talvez o mais importante) pelas instituições (quaisquer que sejam
elas), com a presença na mídia, é a conquista do apoio da opinião pública e, em
consequência, a sobrevivência no mercado. Nesse sentido, a notícia institucional, sem
abandonar suas características informativas, assume caráter político, passando a ser
utilizada estrategicamente nos segmentos sociais que detêm o poder de decisão ou o poder
de influenciar decisões que possam beneficiar a instituição que a originou.”
Pessoni et al. (2014) apontam que o método histórico-crítico permite observar as
atividades do media training contemporâneo. Eles estabelecem uma relação entre, por
exemplo, o treinamento em comunicação praticado pelos sofistas, os conselhos de
Maquiavel e as técnicas de relações humanas do Instituto Carnegie como base de
realização do media training em sentido lato.
Assad e Passadori (2011) afirmam que a organização disposta a desenvolver
performances e capacidades comunicacionais sintonizadas com as novas exigências da
sociedade deve ir além do velho modelo de media training. Essa indagação norteou
trabalho acadêmico de conclusão de especialização recente (Zica, 2018). Ele aprofunda
os estudos nos elementos que permeiam o media training tentando identificar como os
treinamentos acompanham a dinâmica dos novos processos de comunicação a que estão
submetidos fontes e porta-vozes corporativos e é fonte original deste artigo.

Procedimentos metodológicos
Com o propósito de verificar como os treinamentos oferecidos no mercado têm
acompanhado a dinâmica da comunicação nos últimos anos foi desenvolvida pesquisa
descritivo-exploratória. Este método permite trabalhar processos sociais ainda pouco
conhecidos referentes a grupos particulares, propiciando a construção de novas

97
abordagens, revisão de conceitos e categorias durante a investigação (MINAYO, 2010).
Por meio dele, foram entrevistadas profissionais de larga experiência no mercado,
selecionadas por terem formatado propostas consideradas originais e avançadas de
capacitação de porta-vozes institucionais.
A pesquisa caracterizou-se por uma metodologia exploratória-descritiva, baseada em
entrevistas individuais em profundidade de natureza qualitativa, semiestruturada. De
acordo com Duarte (2009), “a entrevista em profundidade é extremamente útil para
estudos do tipo exploratório, que tratam de conceitos, percepções ou visões” para ampliar
a compreensão da situação analisada. A entrevista semiestruturada, segundo o mesmo
autor, é aquela que parte de um roteiro de questões que são aprofundadas a partir da fala
do entrevistado, buscando saber ao máximo sobre o assunto, de maneira aberta, livre e
nos termos de quem presta informações e não do entrevistador.
Como ponto de partida para a obtenção de informações para o presente estudo, foram
utilizadas propostas formais de media training recebidas no segundo semestre de 2016
pela assessoria de imprensa do Banco do Brasil. Na ocasião, foram consultadas sete
empresas de comunicação de porte nacional que atuavam em Brasília. O objetivo era o
fornecimento de propostas para aplicação de treinamentos avançados, de espectro amplo
e original, a partir de necessidades específicas dos porta-vozes mapeadas e identificadas
pela instituição bancária.
As sete empresas foram pré-selecionadas por sua experiência e destaque no mercado
nacional, incluindo o uso de metodologia avançada em treinamento de porta-vozes. Todas
as agências de comunicação apresentaram propostas a partir do briefing fornecido pela
área de comunicação do Banco. A instituição bancária realizaria a contratação de serviços
especializados de treinamento e desenvolvimento profissional de porta-vozes
institucionais para o relacionamento com a imprensa e stakeholders, com a finalidade de
contribuir para a qualificação da gestão da comunicação da empresa.
A partir da realização de mapeamento do público alvo, e confecção de aprofundado
diagnóstico sobre as necessidades da instituição financeira em treinamento de porta-
vozes, as empresas de comunicação elaboraram propostas técnicas que contemplavam
diferentes tipos de treinamentos contemplando canais e linguagens utilizadas pelos
executivos em seu cotidiano, a exemplo de ferramentas de troca de mensagens, vídeos,
uso de gamificação, situações lúdicas que aproximassem os treinandos à realidade do
novo modelo de comunicar, entre outras exigências. As propostas de treinamento
precisavam refletir a atualidade do panorama digital, de convergência das tecnologias, de

98
múltiplos canais de comunicação, e de múltiplos atores que podem ser agentes dessa
comunicação. De maneira geral, as diferenças entre os produtos eram fundamentadas no
público que seria treinado e no contexto em que o mesmo se inseria – em situações
rotineiras ou de crise.
A resposta original das empresas de comunicação foi de que não havia tamanha
diversidade de produtos prontos e acabados “na prateleira” para serem ofertados, mas
seria possível preparar o treinamento com igual nível de qualidade ao que já
desenvolviam. Dentro do prazo estabelecido, as sete empresas apresentaram modelos
originais para o treinamento. Após análise pela equipe do Banco do Brasil das propostas
apresentadas pelas sete empresas de atuação nacional, três delas se destacaram no
julgamento da equipe por sua inovação em atender às exigências.
Com base neste caso e, com a finalidade de obter dados para subsidiar o estudo, adotou-
se o uso de técnica de entrevista semiestruturada para entrevistar as profissionais que
estiveram à frente no desenvolvimento das três propostas selecionadas. A atividade não
constava da proposta original e foi realizada com fins acadêmicos. O objetivo das
entrevistas foi obter percepções acerca da inovação nos treinamentos de mídia para
executivos, e sua evolução ao longo do tempo. Segundo Duarte (2009, p.68) nos estudos
qualitativos é preferível poucas fontes de qualidade, a muitas sem grande relevância.
Dos profissionais escolhidos para a entrevista, uma está baseada na cidade de Brasília e
duas em São Paulo. Essas profissionais e suas empresas realizavam treinamento de porta-
vozes em todos os estados do país, para os públicos mais diversos: políticos, juízes,
promotores, executivos do mercado financeiro, profissionais liberais como médicos,
engenheiros, entre outros. Todas têm formação e larga experiência em comunicação, em
diversas mídias (jornais, rádios, sites e até passagem pela assessoria de grandes
empresas). Duas estavam no mercado há mais de 15 anos se dedicando ao tema media
training. Destaque-se que os autores deste estudo também têm experiência similar no
assunto.
A entrevista com a profissional de Brasília, entrevistada I, foi realizada pessoalmente e
durou aproximadamente duas horas. As outras duas entrevistas foram realizadas por
telefone e duraram pelo menos uma hora cada. Elas partiram de um roteiro com 4
categorias de análise, aprofundadas ao longo de cada entrevista. Buscou-se contribuições
na tentativa de explicar quais as inovações na metodologia do media training estão
disponíveis no mercado e se esses treinamentos têm acompanhado o fenômeno de
reinvenção constante da comunicação nos últimos anos.

99
Resultados e Análises
Para efeito de organização das respostas, foram estabelecidas as quatro categorias de
análise: customização de treinamentos, foco no conteúdo do que será objeto de
treinamento, a diversidade de canais e o acompanhamento pós-treinamento. Para citação
das fontes, chamaremos pelas referências entrevistadas I, II e III.
Customização dos treinamentos
A entrevistada I, sócia-diretora da empresa de comunicação e palestrante em
treinamentos, afirma que há algum tempo a empresa que dirige não trabalha com o
modelo padrão conhecido no mercado, porque, de acordo com ela, cada vez menos é
media training que se precisa, e sim comunicação integrada. “A fonte não fala mais com
um jornalista apenas, que viva fora da aldeia global, como diz Umberto Eco. Ele é um
multimídia. Se não falar com o jornalista, vai falar com um cidadão que também é um
distribuidor de conteúdo”.
Para a entrevistada I, não é viável um modelo pré-definido de treinamento. “Não dá mais
para acharmos que o media training é um modelo com o capítulo básico e avançado; isso
acabou. Se eu for propor um curso para daqui seis meses, vai ser outro curso, diferente
do que eu estou propondo no momento. Hoje mesmo, estamos desenvolvendo um curso
para ensinar magistrado que aquilo que ele posta nas redes sociais não é ele postando,
mas o seu CNPJ, principalmente quando se trata de gestor público”. No conteúdo ainda
há noção básica de imprensa, mas a customização de acordo com o diagnóstico é o que
vai definir o treinamento, pautado na convergência de mídia.
A demanda maior hoje, segundo relata a entrevistada I, é por cursos de gestão de crise de
alto risco reputacional, preparar executivo para prestar depoimento em audiência pública,
preparar a fonte para falar em determinada audiência. Isso requer, necessariamente,
customização do conteúdo do treinamento. A entrevistada esclarece que hoje elabora
diagnóstico de imagem, faz monitoramento de redes, investiga o perfil de quem vai para
a sala de aula, faz análise de mídia do cliente, tudo antes da aplicação do treinamento. A
finalidade é garantir a efetividade e apreensão do que será ensinado ao cliente.
A entrevistada I ainda chama a atenção para uma atividade que tem sido desenvolvida por
sua empresa: Media Training Ongoing. Com ela, a empresa mergulha no conteúdo da
área do executivo que será treinado. Para elaboração do diagnóstico, a empresa define até
mesmo as pautas que esse executivo vai trabalhar na imprensa. Todo o processo é
desenvolvido em parceria com a assessoria de imprensa da empresa do treinando. Para a

100
entrevistada, o modelo de Media Training Ongoing é, sem dúvida, a evolução do
treinamento de porta-vozes.
A entrevistada II afirma que em sua empresa há muitos modelos disponíveis com
diferentes opções. O que os diferencia é a customização de acordo com a demanda ou
necessidade do cliente a ser treinado ou do momento que ele vive. Diz que,
simplificadamente, os modelos mais comuns são: a) básico para quem nunca fez
treinamento antes; b) aperfeiçoamento ou reforço para os que precisam reciclar ou
atualizar suas habilidades; c) modelo focado na presidência, ou na diretoria, ou nos
assessores ou mesmo em formadores internos de opinião.
“Hoje você ainda encontra clientes que buscam muito fortemente o serviço de assessoria
de imprensa, e outros que necessitam de outros tipos de soluções para suas demandas de
comunicação”, relata a entrevistada III. Isso ocorre porque os canais também são
diversificados, aponta.
A avaliação geral é que a customização é o fundamental para um treinamento eficaz.
Trabalhar com ênfase absoluta na necessidade do cliente parece permitir melhores
resultados. Com isso, perdem interesse os treinamentos generalistas, de prateleira, prontos
para consumo.

Foco no conteúdo
As informações apuradas junto às entrevistadas levam à percepção de que o caminho
para o porta-voz ter boa aceitação e penetração no mundo midiático passa por oferecer
conteúdo que agregue valor à marca que representa, e que, claro, ganhe relevância e papel
de preponderância no nicho em que atua. De nada adianta a forma, se o conteúdo não
estiver rico, embasado, e, acima de tudo, justo – e aqui é importante chamar a atenção
para a transparência e veracidade das informações prestadas.
“O que vai fazer diferença hoje é o conteúdo, em uma sociedade com valores estranhos
que exigem instituições mais sérias, com “compliance” correto. O cidadão está cada dia
mais engajado. Portanto, o executivo porta-voz tem que ter um vasto e bom conteúdo para
vender”, avalia a entrevistada I. De acordo com a entrevistada III, a principal demanda
hoje são cursos de gestão de crise. Mas não o curso tradicional de gestão de crise com a
imprensa. Agora os temas são mais amplos e envolvem mídias sociais. O porta-voz tem
que estar preparado para lidar com a rotina de interlocução das mídias sociais, evitar e
gerenciar crises naquele ambiente. E isso passa essencialmente pela capacidade de
conceber, se engajar e fazer circular determinado conteúdo.

101
A entrevistada III explica que “as propostas de treinamentos atuais precisam levar as
pessoas a uma reflexão e ensinar não só a apagar um incêndio, mas a como não causar
um incêndio”. Diz também que, “da mesma forma que hoje há uma multiplicidade de
canais, temos disponível uma grande diversidade de público: funcionários, imprensa,
autoridades, investidores, comunidade, terceiro setor”. Assim, de acordo com ela, é
necessária atenção ao conteúdo que será disseminado para garantir uma boa reputação.
Os especialistas que ministram a capacitação trabalham em função do conteúdo e também
dos canais. “Muitas vezes o treinamento vai demandar mais dinâmicas de redes sociais,
que TV e rádio, dependendo do perfil do cliente”, avalia a entrevista I. As entrevistadas
também concordam que as assessorias, de modo geral, já entenderam isso, e estão
trabalhando de uma forma unificada: comunicação interna com comunicação externa e
redes sociais de forma integrada e articulando caráter pessoal e corporativo. O foco no
conteúdo permite a diversificação de público e ampliação do meio, visto que o foco passa
a ser na mensagem.

Multiplicação de canais
A partir das entrevistas foi possível identificar que o fenômeno da multiplicação de
canais ainda atrapalha muito as fontes. As entrevistadas concordam que a dificuldade
reside em convencer o cliente que a mídia mudou - principalmente aqueles que vêm de
uma herança em que tinham espaços, num momento do jornalismo em que a fonte era o
centro das atenções e fator decisivo para a matéria. De acordo com as essas fontes da
pesquisa, em muitos casos, há resistência do treinando em sair de sua zona de conforto.
A entrevistada III avalia que a principal mudança nos treinamentos é que, hoje, o porta-
voz não vai aprender apenas a se comunicar com a imprensa, mas com o público interno,
os clientes, o terceiro setor, investidores. “Este treinamento nem deveria mais se chamar
media training. O nome está inapropriado para o que o mercado vem demandando”,
avalia.
“Explicar para um profissional de uma entidade de classe, por exemplo, que está entrando
para o mundo midiático que, para atingir objetivo dele pode ser muito mais interessante
ter um post no Facebook que vai atrair diversos compartilhamentos, a uma matéria de
destaque em jornal tradicional, por exemplo, é mais fácil, pois ele vai aceitar
tranquilamente. Mas, muito provavelmente, não será a mesma reação que outro que já
tem um ranço, que queria uma matéria, que queria coletiva, uma foto, coluna”,
exemplifica a entrevistada I.

102
“Hoje temos públicos muito mais complexos. Antes você tinha rádio, TV e impresso.
Hoje há rádio, podcast, TV, impresso, blog, Twitter, LinkedIn, Facebook, Instagram,
fanpage. Com a tecnologia nós somos o meio de comunicação, não mais só a imprensa.
Boa parte da população tem hoje um celular que grava, tira foto, faz vídeo, e que
possivelmente está interligado à internet, com a possibilidade de passar a informação
instantaneamente”, descreve uma das fontes ouvidas.
A entrevistada II avalia que é vital que os treinamentos acompanhem as transformações
da imprensa e as novas formas das pessoas se comunicarem e disseminarem informação:
“sem essa atualização constante e diuturna, seria impossível manter os porta-vozes
alinhados aos novos tempos e o treinamento seria inócuo. Quanto mais rapidamente a
comunicação e as mídias mudam, mais necessário são os treinamentos”, pondera.
A entrevistada II afirma que os treinamentos têm acompanhado o dinamismo das mídias
e a criatividade das pessoas em seu uso no dia a dia. Ela afirma que, se não há essa
incorporação, os treinamentos falham em preparar os porta-vozes para o enfrentamento
dos arguidores. E essas inovações podem ser percebidas nas plataformas que são
colocadas à disposição nos treinamentos, como tablet, Ipad, Iphone, gravações à
distância, inserção de post em ambiente fechado das mídias sociais como forma de
simulação, wi-fi. A avaliação das entrevistadas é que não há mais como não trabalhar
com a articulação de mídias para levar adiante a mensagem corporativa.
De forma geral, a visão das três profissionais entrevistadas, é de que ficou mais trabalhoso
para os porta-vozes e para as agências de comunicação. É necessário contemplar a
diversidade de canais. “Hoje, o porta-voz precisa ter muito mais estratégia. Ele vai ter que
fazer uma pesquisa, ele vai ter que ser melhor de oratória, com uma outra urgência, porque
a demanda é outra.

Acompanhamento das fontes pós-treinamento


Chama a atenção na fala dos entrevistados a importância atribuída ao acompanhamento
pós-treinamento. Multiplicaram-se os produtos disponíveis no mercado que são aliados
do media training para ajudar a fonte após os exercícios tradicionais nas oficinas. Há
serviços de dicas semanais que apontam cases factuais sobre tropeços ou acertos no trato
com a imprensa, aplicativos de celulares à disposição das fontes com discurso
institucional, posicionamentos, grandes números, tudo a um clique. Outra prática é o
acompanhamento de entrevistas reais. Um serviço é acompanhamento de entrevistas
conquistadas pelas agências após o treinamento, como complemento e continuidade. Para

103
a entrevistada, II o pós-treinamento é fundamental para a melhor manutenção do que foi
apreendido. A empresa em que atua oferece o serviço de pílulas de informação por
diferentes plataformas após o treinamento.
Um exemplo dessa inovação é o citado Media Training Ongoing. O produto de uma das
empresas oferece acompanhamento antes, durante e após treinamento. O treinamento
inclui até mesmo um serviço que define as pautas a serem aprimoradas na imprensa pelo
executivo treinado. A empresa realiza o acompanhamento da entrevista à publicação da
matéria, com uma análise posterior à publicação, em um ciclo completo de consultoria.
Todo o processo é desenvolvido em parceria com a assessoria de imprensa da instituição
do treinando. Para uma das entrevistadas, o modelo é a evolução do media training.
De forma geral, parece não haver dificuldades, por parte das empresas, de acompanhar as
inovações midiáticas e aplicá-las aos treinamentos. O que pode existir é uma eventual
dificuldade em fazer com o cliente tenha a compreensão da mudança no formato original,
abandonando o foco apenas no modelo tradicional de jornalismo e incorporando
particularmente o uso das mídias sociais no desafio de dialogar e informar a sociedade.
Na visão da entrevistada I, a velocidade dessa dinâmica atua como “peneira de triagem”
das empresas de treinamento. Para ela o mercado tem provado que a empresa que não
acompanha, simplesmente deixa de existir, ou em suas palavras, “morre”, já em curto ou
médio prazo.

Considerações finais
O estudo buscou identificar e mapear o que há de inovador na formação de porta-vozes,
ofertado pelas empresas de comunicação no Brasil e verificar como empresas de
comunicação estão atuando a partir dos avanços na capacitação daqueles que são porta-
vozes corporativos.
Nos limites do estudo constatou-se que surgem novos formatos e múltiplas possibilidades.
Verificou-se também, que versões avançadas do media training aliam o ensino de técnicas
para relacionamento com as mídias convencionais ao uso de novas técnicas para o
aprendizado, com foco principalmente no conteúdo do que será tratado pelos porta-vozes.
E propõem soluções que acompanhem o executivo mesmo após treinamento.
Esta realidade emergente é resultado de novos desafios para executivos e gestores, que
têm de se preparar para interagir de todas as formas e em todos os canais, noticiosos ou
não. Eles precisam acompanhar a dinâmica e a interação das novas linguagens, nas quais
se fundem o público e o privado e os papéis de receptor ou de emissor. Não é mais

104
possível considerar apenas exercícios de prateleira. O treinamento deve ser adaptado à
realidade do cliente, tornando-se customizado a partir de uma série de condicionantes de
cada contexto e necessidades. Particularmente, a articulação da mídia tradicional com as
chamadas mídias sociais passa a ser parte do conteúdo.
Outro ponto de atenção, é que o conteúdo ganha relevância. O porta-voz pode ser
altamente capacitado em oratória e persuasão, mas sem conteúdo interessante, que esteja
adaptado e chame a atenção do seu público-alvo, verá em risco a eficácia do seu projeto.
Com a customização, os treinamentos passam a ser ainda mais exclusivos, saindo do
modelo tradicional em que vários executivos são colocados em uma mesma sala para
aprender sobre a imprensa. Apesar dessa forma de serviço ainda estar disponível no
mercado, não é, segundo as agências consultadas, a que tem melhor resultado. Reduziu-
se muito a quantidade de pessoas por turma, fato que faz com que tenha crescido muito o
número de treinamentos individuais, elevando os custos.
A duração do tempo de treinamento também se altera. Os cursos tradicionais de media
training normalmente adotavam carga horária de oito a doze horas. Hoje isso foi reduzido
significativamente, segundo as entrevistadas e os programas examinados durante a
avaliação das empresas pelo banco. Tornou-se comum cursos de três horas e até menos,
adaptando-se ao tempo que os porta-vozes têm disponível.
A inovação em media training passa cada vez mais por customizar e entender a
necessidade do cliente em cada momento. A pandemia do novo coronavírus em 2020,
quando da elaboração deste texto, trouxe desafios adicionais e avanços na capacidade de
adaptação, conforme os autores identificaram. Entrevistas sem repórter presente, “lives”
e produção de conteúdo sem grande elaboração para envio a veículos de comunicação,
por exemplo, tornaram-se comum. Mais do que garantir o atendimento à imprensa
tradicional, muitas fontes tiveram que atuar também como seus próprios videomakers;
improvisando em entrevistas e transmissões ao vivo via notebook e smartphone ou
gerando seu próprio conteúdo audiovisual, isolados e às vezes sem apoio presencial da
estrutura de comunicação. A fonte da informação, além do domínio do conteúdo e da
forma de transmitir os dados, passou a ter que entender também de softwares de
transmissão, iluminação, cenário, posicionamento da câmera, microfone. Assessores de
comunicação tiveram que realizar treinamentos à distância, elaborar roteiros com
recomendações sobre presença na frente do vídeo e orientar discretamente ao mesmo
tempo em que as transmissões aconteciam. Com essa mudança inesperada, treinamentos

105
de preparação da fonte passaram a acontecer de forma virtual, incluindo palestras e
análise de experiências de outros porta-vozes.
O media training segue evoluindo em relação ao modelo tradicional oferecido pelo
mercado (DUARTE; FARIA,2018) acompanhando a diversidade, impacto e efetividade
das mídias. Inova também ao focar mais no conteúdo, na comparação com a forma. Busca
se adaptar, ainda, ao interesse e disponibilidade de tempo do treinando propondo soluções
que acompanham o executivo mesmo após treinamento, como num pós-venda.
Permanece inovando ao se adaptar à forma em que o treinando pode participar do
treinamento, de maneira presencial ou virtual, em um momento em uma crise altera
bruscamente a circulação de pessoas no ambiente.

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comunicação eficaz com a imprensa e a sociedade. São Paulo: Gente, 2009.
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107
Os limites entre jornalismo e conteúdo de marcas:
os casos do MediaLab e do Estúdio Folha
Marli dos Santos

Introdução
Há muito que se fala das relações entre jornalismo e publicidade. Desde que Benjamin
Day criou os classificados, no século XIX, e a tecnologia das rotativas surgiu para
propiciar a impressão de grandes quantidades de exemplares de cada edição diária dos
jornais em menor tempo, inaugurou-se uma nova etapa denominada jornalismo moderno
ou mercadoria. A penny press, como ficou conhecida essa fase da imprensa, propiciava a
compra de um exemplar pela menor moeda americana.
Na indústria do jornalismo, a publicidade se efetivou como fonte de renda majoritária.
Mas ao mesmo tempo em que se constituiu como indústria, tendo a publicidade como
fonte de manutenção e lucro, o jornalismo difundiu informação de qualidade. A partir do
singular cristalizado no fato e do particular (o contexto) da notícia, potencialmente se
tornou uma forma de conhecimento do mundo (GENRO FILHO, 1987).
Para Chaparro (1994), que apresenta uma teoria da ação jornalística, há uma tríade
essencial que caracteriza o jornalismo: a ética, a técnica e a estética. Diz o autor que a
ética é o vetor das ações jornalísticas; a técnica está relacionada ao método de apuração
e à linguagem; e a estética do jornalismo é a da veracidade.
Para essa reflexão, trazemos também as definições de Bueno (2018, p.6) sobre jornalismo
patrocinado, conteúdo de marca (branded content), denominado também por alguns como
jornalismo de marca (brand journalism).
O objetivo é refletir sobre os limites entre jornalismo e conteúdo de marca, e as estratégias
de veículos noticiosos em criar publicidade nativa. Escolhemos dois veículos para
apresentar como exemplos, O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo, que produzem
conteúdos de marca no MediaLab Estadão e Estúdio Folha, respectivamente.

Dicotomias aparentes e a tríade que distingue o jornalismo


O jornalismo, que surge como indústria cultural na esteira do capitalismo, guarda uma
tradição do liberalismo que “assegura ao cidadão a representatividade de sua palavra”,
função garantidora do “pacto de credibilidade implícito na relação entre os meios de
comunicação e a sua comunidade receptora” (SODRÉ&PAIVA, 2011, p. 23). Entretanto,

108
as dicotomias que são apontadas, entre o compromisso de fiscalizar o poder como função
social, em sintonia com o interesse público, e os interesses privados das empresas de
comunicação (no caso da TV e do rádio, são concessões públicas exploradas pelo setor
privado); a divisão entre informação e opinião; e a objetividade que não considera a
dimensão subjetiva no relato do fato, podem ser consideradas aparentes dicotomias.
Isso porque, como diz Genro Filho, existe uma relação dialética entre “a particularidade
dos interesses da classe dominante e a constituição da generalidade do gênero humano”
(1987, p. 11), tendo o jornalismo potencial para ultrapassar o modo de produção
capitalista, como uma forma de conhecimento própria, baseada na práxis.
Em Chaparro (2008) podemos examinar também a crítica contundente à separação entre
opinião e informação, uma vez que, ao informar, todo o processo de produção jornalística
é presidido por escolhas, portanto, atribuição de valor a este ou aquele fato, a esta ou
aquela fonte, a uma ou outra abordagem ou léxico, e, para formar opinião, é preciso
informação. Desse modo, é importante sublinhar que informação e opinião não estão
dissociadas, nem se excluem, como diz o autor.
Sobre objetividade e subjetividade, é preciso considerar que a objetividade no jornalismo
está ligada a uma perspectiva positivista, que a presume como aspecto absolutamente
indispensável como garantia à veracidade do jornalismo; entretanto, “por ser uma
categoria relacional – relação sujeito/objeto – a objetividade não nega a dimensão da
subjetividade (sujeito)” (OLIVEIRA, s.d, p. 7). Para Chaparro, a veracidade do relato
jornalístico não está relacionada à acurácia, ou seja, ao compromisso do jornalista com o
método de apuração.
Não vamos nos alongar na discussão sobre a perspectiva dialética do jornalismo. Vamos
ressaltar também as importantes contribuições de Chaparro sobre tríade do jornalismo,
que nos ampara no esclarecimento dos limites entre jornalismo e conteúdo de marca,
denominados em alguns casos como jornalismo de marca, jornalismo patrocinado ou
ainda brand journalism.
Para explicar essa tríade é necessário primeiro recorrer à ideia de que toda ação humana
e, portanto, jornalística, é controlada conscientemente por seu autor (ou pelo jornalista),
portanto, guiada por propósitos que as orientam. Os propósitos do jornalismo devem ser
ligados a princípios éticos, que têm compromisso com os direitos humanos e com a
democracia, os quais lhe dão credibilidade. Caso contrário, não se chega ao que se pode
defender como uma ação jornalística. Assim, os princípios éticos, segundo Chaparro
(1994), ligam o jornalismo à sociedade.

109
O jornalismo se concretiza no universo das ações, ou seja, no seu fazer, que deve
contemplar o método jornalístico de apuração e a linguagem (relato ou comentário), e a
estética da veracidade, que lhe dá o status de discurso social credível (CHAPARRO,
1994), dessa forma, a ligação com a atualidade.
Por fim, continua o autor, a ação jornalística circunscreve-se no âmbito da informação.
O que acontece depois depende do leitor, ou seja, é o lugar da “recepção ativa”. Portanto,
diferente da publicidade, que pretende com seu discurso persuadir à compra, o jornalismo
deve contemplar aquilo que lhe é mais caro, ou seja, divulgar aquilo que é de interesse
da sociedade: “denunciar à sociedade o comportamento corrupto e imoral de um
presidente da República é dever do jornalismo e do jornalista; derrubá-lo é prerrogativa
do povo organizado” (CHAPARRO, 1994, p. 150).
Assim, a tríade tem ligação com a sociedade, no âmbito da ética; com a atualidade, no
que se refere à técnica e à estética; e com a recepção ativa, sobre as ações que os leitores
decidirão ter a partir de um determinado relato ou comentário.

Jornalismo versus conteúdos de marca


Partindo da premissa das características do jornalismo, e segundo a tríade de Chaparro,
discutimos aqui alguns limites entre jornalismo e conteúdo de marca (ou branded content)
e as formas que ele adquiriu. Bueno (2018, p. 6) analisa que o branded content avança
nas formas de a marca se comunicar com os públicos, materializando-se em novos
formatos, ações e estratégias, com o objetivo de chamar a” atenção do consumidor e
conduzi-lo a uma prontidão indispensável para a realização de negócios”. Dessa forma,
a intenção é o negócio, o consumo, ou seja, uma ação posterior que se dá recepção que
não extrapola o ato de informar do jornalismo.
Bueno apresenta a visão de alguns estudiosos, que tomam o conteúdo de marca ou
branded content como “sinônimo de marketing de conteúdo”, e de outro, os que dizem
que sua aplicação é mais pontual, voltada à publicidade, a uma campanha específica, já
o marketing de conteúdo é perene, contínuo, “visando criar uma audiência cativa e que
não se resume a campanhas que podem ser lançadas pontualmente ao longo do tempo”
(BUENO, 2018, p. 6). Mas a confusão que se faz entre publicidade, marketing e
jornalismo não para por aí. Segundo Bueno, não se deve relacionar marketing de conteúdo
com conteúdo de marca, sem considerar as características específicas de cada atividade.
Dessa forma, o pesquisador assume uma abordagem de conteúdo de marca, como
“qualquer forma de publicidade que use ‘conteúdo’ (...) para apoiar, apresentar ou

110
promover produtos ou serviços”, mas que “difere de publicidade direta na medida em
que não funciona principalmente como veículo para promoção de marca, mas sobretudo
como um veículo de informação ou entretenimento que adicionalmente contribui para
promover a marca”, citando o site Market Track (Apud BUENO, 2018, p. 7).
Concordamos com essa visão, portanto, estamos no campo da publicidade.
Assim, o conteúdo de marca (branded content) se apropria de diversos formatos e
linguagens, por várias razões: o consumidor está mais atento, participativo, e aceita menos
a publicidade tradicional, que é vista como uma intrusão; há a abundância de informação
nos meios digitais; o consumo de conteúdos em larga escala via streaming; a facilidade
de acesso à linguagem multimídia e o consumo por meio de aparelhos móveis, entre
outros motivos.
A escolha pela linguagem e veículos jornalísticos para apresentar conteúdos ligados às
marcas não é novidade. Isso porque o jornalismo é “linguagem mediadora das mais
importantes”, compondo “o discurso público de segmentos sociais” e disputando “a
legitimidade de suas posições, ideias (sic), propostas, idiossincrasias” (REIS, 1996, p. 4).
Em editorias como turismo, veículos/automóveis, moda, saúde, economia, por exemplo,
não é incomum encontrar a publicidade de empresas como conteúdo patrocinado. Há
também vários exemplos sobre essa prática, às vezes não éticas, como em diversas
situações em que não há transparência e o leitor não é informado sobre patrocínios feitos
pelas marcas a profissionais e redações.
Os publieditoriais ou informes publicitários estão presentes nos veículos jornalísticos há
muito tempo, bem como as publicações customizadas e patrocinadas por marcas. Ambas
são estratégias já consolidadas de conteúdos de marcas nos meios de comunicação. Mas,
hoje, o cenário mais complexo e menos atrativo para a propaganda convencional,
estimulou o crescimento desses conteúdos patrocinados em espaços editoriais mais
sofisticados, produzidos em setores especializados nas empresas jornalísticas,
denominados laboratórios ou estúdios, destinados especificamente à atividade de
branding, com um leque de ofertas em linguagens, formatos, estratégias, inclusive no que
diz respeito ao jornalismo.
Importante ressaltar que, independentemente da estratégia dos conteúdos de marcas
associadas aos veículos noticiosos, os limites entre jornalismo e publicidade estão na
natureza desses discursos sociais e do que se espera deles:
O jornalismo investiga para informar e esclarecer o máximo possível
sobre os acontecimentos, trabalha com a diversidade possível das

111
informações e versões relevantes; ao contrário, a publicidade e a
propaganda só difundem informações favoráveis aos interesses
particulares a que estão vinculadas. (ALBERTOS, 1992, p. 278)

Reis (1996, p. 8) é muito elucidativa sobre a natureza dos discursos institucionais.


A autora considera, ao analisar ações promovidas pelas assessorias de comunicação, que
há “um jogo de claro/escuro, de informação/omissão em meio a relações intersubjetivas
nas quais (...) estão envolvidos diferentes níveis de contribuições pessoais, sociais,
culturais, mercadológicas e psicológicas”. Mas ela também destaca que o jornalismo não
está isento disso não.
Embora concordemos com Reis, é preciso considerar que há um limite para esse
jogo de claro/escuro e de informação/omissão, no caso do jornalismo. O limite são as
intenções nos fazeres e a credibilidade, que devem estar baseados na ética, na técnica e
na estética jornalística, para que o jornalismo tenha eficácia. Caso não haja transparência
e o jornalismo não cumpra o seu compromisso com o leitor, ele perde credibilidade. Sem
credibilidade, portanto, perde a sua eficácia como relato e comentário da realidade, como
diz Chaparro (1994).

Estratégias de conteúdo de marca em veículos jornalísticos


Tendo em vista a abordagem como discurso social que precisa ser eficaz, o jornalismo
tem algumas características essenciais. Não basta a apropriação da técnica jornalística,
todos os elementos da tríade de Chaparro são essenciais para a credibilidade do discurso.
Por isso, não se pode enganar o leitor, é preciso transparência.
Neste artigo apresentamos dois exemplos de conteúdo de marca (branded content)
produzidos por dois jornais importantes e tradicionais: O Estado de S. Paulo e a Folha de
S. Paulo. Os dois possuem divisões específicas, que constituem braços das duas empresas
jornalísticas, para produzirem conteúdos de marca. No caso do Estadão, o MediaLab
Estadão cria conteúdos de marca “com a credibilidade” e “expertise” dos profissionais do
Estadão, com “narrativas em sintonia com as qualidades da marca e em formatos
inovadores e dinâmicos” (MEDIALAB..., 2020). Já o Estúdio Folha é um dos serviços
prestados pela Publicidade Folha, ligada à Folha da Manhã, cujo principal título é a Folha
de S. Paulo. De acordo com o site, “o Estúdio Folha utiliza as ferramentas do jornalismo
para oferecer conteúdo feito sob medida para marcas, em diferentes plataformas”
(ESTÚDIO..., 2020, grifo nosso). A própria empresa assume que nos conteúdos são
usadas “ferramentas do jornalismo”, e não jornalismo. Ressalta também que são

112
produzidos por jornalistas, para garantir o domínio da técnica. Nas ilustrações 1 e 2, é
possível observar duas telas de apresentação dos serviços pelos setores de branded
content. Usam denominações diferentes, “conteúdo patrocinado” (Folha) e “branding
content” (Estadão).

Ilustração 1 – Estúdio Folha

Fonte: Estúdio Folha, disponível em: http://estudio.folha.uol.com.br/institucional/

113
Ilustração 2 – Medialab Estadão

Fonte: MediaLab Estadão, disponível em: http://patrocinados.estadao.com.br/medialab/branded/

Como pode ser verificado nas ilustrações acima, a criação de um serviço especializado
em conteúdo de marcas das duas empresas jornalísticas mostra que esse é um movimento
cada vez mais comum entre os prestigie papers, que esperam, ao mimetizar o discurso do
jornalismo, emprestar o conhecimento técnico e a credibilidade do jornal às marcas, como
oferta atraente para anunciantes. O coordenador de produção de conteúdos de marca da
Editora Globo, Edward Pimenta, considera que ao se associar a um publisher de prestígio
(como O Globo), o anunciante “ganha força e credibilidade. Essa associação faz bem a
uma estratégia de comunicação, pois garante alcance, contexto e endosso”
(ASSOCIAÇÃO..., 2018).
Em estudo feito por Nunes e Costa (2017, p. 5), os jornais de prestígio brasileiros
começaram a criar divisões para a chamada “publicidade nativa” (2017, p. 5), dando
tratamento aos conteúdos de marcas para surfar na onda dos principais jornais
internacionais, como The New York Times, que possui o T Brand Studio, do The
Washington Post, WP BrandConnect Studio, The Guardian, que criou o Guardian Labs.
Além da Folha e do Estadão, o jornal O Globo criou o Estúdio Infoglobo; o Grupo RBS,
o Clic Studio; e a Gazeta do Povo possui o Gazeta do Povo Branded Content, conforme
os autores.
Os serviços oferecidos por essas áreas especializadas nos jornais extrapolam as
“ferramentas do jornalismo”. Há uma variedade de oferta bastante eclética. O MediaLab

114
Estadão oferece: “estratégias de publishing integradas, brand journalism, curadoria
editorial, brand channels, infográficos (on e off), media wall integrado às redes sociais,
listicles, testes e quis, webdocs & webséries, transmissão ao vivo, pesquisa e acervo,
cadernos customizados, inserções modulares impressas, webrádios, podcast, eventos,
fóruns, debates, sampling, blitz e exposições” (MEDIALAB..., 2020). O da Folha
apresenta formatos para ofertas em pacotes: pacote impresso (circula no produto ou em
cadernos especiais), com páginas exclusivas e personalizáveis, infográficos e especiais
dedicados; pacote impresso e digital (página na internet com atualizações periódicas,
chamadas na home da Folha de S. Paulo, inclusão do patrocinador nas redes sociais), com
páginas exclusivas e personalizáveis, infográficos interativos, vídeos exclusivos,
especiais e atualizações periódicas; pacote digital (página na internet com conteúdo
exclusivo, chamadas na home da Folha de S. Paulo e inclusão do patrocinador nas redes
sociais), com páginas exclusivas e personalizáveis, infográficos interativos, vídeos
exclusivos, especiais dedicados e atualizações periódicas; eventos (produzem e divulgam
eventos), com vídeos e eventos personalizados; e vídeos (produção e documentação em
vídeos).
Como se vê, essas ofertas de serviço constituem efetivamente um leque bem variado de
linguagens e formatos de conteúdos de marca, cujo apelo maior é a própria credibilidade
do jornal, como já foi dito. De um lado, uma alternativa para atrair anunciante, de outro,
ao anunciar que produz conteúdo editorial para marcas e que os divulga nos seus espaços
editoriais, pode gerar certa desconfiança, porque a aparência jornalística pode confundir
o leitor. Destacamos o texto do Medialab Estadão que anuncia fazer publicações
integradas (Publishing) e Jornalismo de marca (assumindo o conteúdo de marca como
jornalismo).
Tratar o jornalismo como ferramenta ou adotar a denominação “jornalismo de marca”
pode confundir, porque nem sempre o leitor sabe identificar o que é conteúdo patrocinado,
especialmente os jovens, mesmo quando há a identificação como tal.
Em uma pesquisa feita pela Faculdade de Educação da Universidade de Stanford, nos
Estados Unidos, com crianças e adolescentes, em 2016, mostrou que mais de 80% dos
alunos do ensino fundamental não sabem diferenciar notícia de conteúdo de marca ou
“conteúdo publicitário”, mesmo com a referida identificação. Já os conteúdos de
publicidade tradicional foram identificados com facilidade. Segundo os pesquisadores,
“os jovens focam mais nos conteúdos do que nas fontes e, apesar da ampla participação
nas redes, eles desconhecem – ou ignoram – ferramentas básicas como a de verificação

115
na hora de ler as notícias” (JOVENS..., 2016, s/n). Em outra pesquisa feita por Doretto
(2019, p. 128) com crianças e jovens sobre notícias, a autora aponta que é necessário
haver mais transparência “no processo de construção do discurso noticioso, o que
envolve, por exemplo, deixar mais claras as etapas de apuração e revelar aquilo que não
foi possível comprovar, em vez de sua obliteração na estrutura do texto.” A pesquisadora
conclui após o estudo que, não só no caso de crianças como também de outros faixas
etárias, é preciso “ajudar os leitores (...) a compreenderem melhor os critérios que
auxiliam na comprovação da veracidade de um fato transformado em notícia,
principalmente no ambiente digital”.
Costa e Nunes (2017, p. 10) também mencionam pesquisas feitas por Lazauskas (2014),
realizadas com usuários da internet nos Estados Unidos, entre 18 e 65 anos. Os resultados
apontam que os usuários não têm muito claro o que significa conteúdo patrocinado: “48%
acreditavam que Conteúdo Patrocinado significa que um anunciante pagou para a matéria
ser criada e teve influência no conteúdo dela, mais da metade (52%) achava que
significava algo diferente”. Em outra pesquisa citada pelos autores (2017, p. 11), realizada
em parceria pelo site Contently33, Tow-Knight Center for Entrepreneurial Journalism (da
Escola de Graduação em Jornalismo CUNY) e Radius Global Market Research, também
procurou entender como os consumidores identificam e percebem o conteúdo de marcas
nativas, ou a publicidade nativa, e os principais resultados foram: “54% dos participantes
já se sentiram enganados por publicidade nativa; 77% dos participantes não interpretaram
anúncios nativos como publicidade; 44% não conseguiram identificar corretamente o
patrocinador do anúncio nativo que leram”. Portanto, é preciso orientar de maneira mais
efetiva o leitor, ser transparente e compreender que conteúdo de marca tem o limite da
publicidade.
A seguir, alguns exemplos de conteúdos de marca produzidos pelo Medialab Estadão e
pelo Estúdio Folha.

33
Mais informações do site em https://translate.google.com/translate?hl=pt-
BR&sl=en&u=https://contently.com/&prev=search&pto=aue.

116
Ilustração 3 – Estúdio Folha – Live Nexpresso

Fonte: Estúdio Folha, disponível em: http://estudio.folha.uol.com.br/nespresso-


sustentabilidade/2020/06/1988754-isolamento-aumenta-preocupacao-com-sustentabilidade.shtml

Ilustração 4 – Estúdio Folha - Impresso

Fonte: Estúdio Folha, disponível em:


http://media.folha.uol.com.br/estudiofolha/2020/05/28/igreja-crista-maranata.pdf

117
Ilustração 5 – MediaLab Estadão - Novartis

Fonte: Estadão, disponível em https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,abril-marrom-chama-


a-atencao-para-a-prevencao-de-doencas-oculares,70003287634

Ilustração 6 – MediaLab Estadão – Prefeitura Municipal de S. Paulo

Fonte: Estadão, disponível em: https://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,programa-cidade-solidaria-


arrecada-doacoes-para-ajudar-populacao-vulneravel-da-cidade-de-sao-paulo,70003287400

118
Algumas considerações
Neste texto procuramos discutir os limites do jornalismo e do conteúdo de marca,
aprofundando nos conceitos do jornalismo a partir de Genro Filho, especialmente de
Chaparro, e das análises de Bueno sobre branded content. Escolhemos trazer como
exemplos para essa discussão o MediaLab Estadão e o Estúdio Folha, braços de dois
grandes veículos jornalísticos, os quais produzem conteúdos de marca.
Pudemos também verificar que as estratégias dos conteúdos de marca são oferecer a
credibilidade do veículo jornalístico para atrair anunciantes, ofertando outros modos de
publicidade. A diversidade de tipos de serviços, linguagens e formatos não se limitando
a conteúdos editoriais patrocinados. São ações para compensar os espaços anteriormente
ocupados pela publicidade tradicional, com formatos menos intrusos.
Os dois casos apresentados como exemplos de produção e veiculação de conteúdos de
marcas são denominados como “publicidade nativa”, o que nos leva a questionar as
nomenclaturas jornalismo de marca (brand journalism) e jornalismo patrocinado,
baseando-nos na tríade de Chaparro, na concepção do jornalismo como forma de
conhecimento, e na perspectiva do conteúdo de marca como publicidade, ou seja, com
um propósito de realização de negócios ou de reforço de imagem institucional.
Mas esse assunto não se esgota aqui, a ideia foi colocar alguns aspectos sobre o tema. Há
dimensões do conteúdo de marca, ou branding content, no jornalismo que precisam ser
aprofundadas em pesquisas, como a análise sistemática desses conteúdos, bem como as
políticas dos veículos jornalísticos sobre o tema e a percepção dos leitores (no sentido
amplo) sobre os conteúdos patrocinados no jornalismo. É um campo vasto de reflexões e
aprofundamento.

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120
Relacionamento com a mídia em situações de crise:
o governo federal e a Covid-19
Paulo Roberto Salles Garcia

Introdução
Diante de cenários de crise, o que mais se almeja é que se busquem soluções para pôr fim
a ela ou amenizar os prejuízos decorrentes. O novo coronavírus deflagrou em âmbito
planetário um contexto extremamente complexo e desafiador para líderes mundiais,
governantes e setores da sociedade. Estamos experimentando uma situação que não foi
provocada por governos, corporações ou por qualquer tipo de poder do mal interessado
em promover uma destruição massiva. Do mesmo modo em que ocorre com um
fenômeno da natureza, a ocorrência do Covid-19 é algo que foge ao controle.
Entretanto, o modo como se responde à epidemia é determinante para exponenciar os
estragos – tanto nos aspectos econômicos, mas, especialmente, na preservação de vidas –
ou, com vontade política e alicerçado na ciência, estabelecer ações que façam encurtar o
tempo de sofrimento. Nesse sentido, os diversos atores da sociedade precisam aliar-se (e
alinhar-se) nesse esforço conjunto, cada qual desempenhando o papel correspondente.
O objetivo deste artigo é refletir a respeito de uma relação nem sempre harmoniosa, que
envolve a mídia e as organizações/instituições em situações de crise. O foco de análise
será o governo federal e a forma como vem conduzindo o relacionamento com jornalistas
e veículos de comunicação – marcadamente caracterizado por conflitos – no contexto do
novo coronavírus. A intenção é propor um cruzamento entre as posturas adotadas
especialmente pelo chefe do Executivo e o que preconizam as boas práticas de
Comunicação Organizacional.

Breves apontamentos teóricos


Ao se iniciar esta reflexão, duas analogias contribuem para contextualizar uma crise. A
primeira delas é proposta por Jorge (2015), referindo-se ao “efeito borboleta” – depois
batizado de Teoria do Caos –, proposto pelo matemático norte-americano Edward Lorenz
e que buscava explicar os fenômenos meteorológicos. A tese era a de que o bater de asas
de uma borboleta durante a primavera no Sul pode ocasionar um tufão no outono do norte.
A segunda analogia é proposta por Rosa (2001), quando evoca a figura mitológica grega
chamada Aquiles. Tido como invencível, saía vitorioso das guerras nas quais se envolvia,

121
destruindo os inimigos e tantos quantos passassem por seu caminho. Tal aura de
invencibilidade – ou quase invencibilidade – tinha uma explicação: sua mãe, a semideusa
Tétis, o havia mergulhado nas águas do Rio Estige, providência que, segundo os mistérios
da magia, garantiria à criança o poder de ser indestrutível. Entretanto, o calcanhar de
Aquiles foi a única parte não banhada – já que a mãe precisava segurar o garoto por
alguma parte do corpo. Ironicamente, essa parte do corpo foi atingida por uma lança
durante uma batalha, matando o herói.
O que as analogias sugerem é que, primeiramente, dependendo do modo como pessoas e
organizações (públicas ou privadas) se conduzem ou conduzem seus negócios/gestão, os
mínimos abalos, como o bater de asas de uma borboleta, podem, em um futuro distante
ou próximo, trazer consequências positivas, como o fortalecimento da imagem e da
reputação, ou negativas, com possibilidades reais de prejuízos a esses ativos. “É bater
uma asa, gerar um tufão e colocar a perder todo um trabalho de construção de imagem,
que se acreditava bem fundamentado, mas que, em geral, se revela fragmentado,
equivocado, ultrapassado” (JORGE, 2015, p. xiii).
Outra percepção bastante razoável possível de se apreender é que pessoas e organizações
não são invencíveis. Por mais que pareçam sê-lo – seja por causa de sua relevância, seja
por causa do seu prestígio, seja por causa do poder que exercem –, pode haver situações
nas quais será necessário lidar com crises, e isso fará diferença nos desdobramentos delas.
Disso se depreendem conceitos importantes e que devem fazer parte das reflexões acerca
de crises de imagem. O primeiro deles diz respeito à sua dimensão democrática (BUENO,
2009). Não importa se a empresa é líder no segmento em que atua, não interessa se a
personalidade é reconhecida por sua conduta ética, não faz diferença se o órgão público
está cumprindo a legislação ambiental: nada disso representa antídoto, ainda que sejam
atributos e comportamentos reconhecidamente valorizados. Exemplos não faltam para
ilustrar tal situação: o clássico case do Tylenol, medicamento produzido pela gigante
Johnson & Johnson; as denúncias de abusos sexuais cometidos por padres e outras
pessoas ligadas à Igreja Católica; o escândalo sexual envolvendo o então-presidente Bill
Clinton e sua estagiária; e outros.
A prevenção é outro aspecto a ser considerado. O bater de asas de uma borboleta pode se
transformar em um tufão se medidas não forem adotadas. Aliás, vale lembrar, a bem da
verdade, que nem é necessário que as asas desse inseto comecem a se movimentar, pois
prevenir não pressupõe necessariamente que haja de antemão alguma ameaça; trata-se,
antes de tudo, de uma postura sábia de quem busca manter-se crível, consolidando a cada

122
dia a imagem e a reputação; deve, enfim, fazer parte da cultura organizacional. Mas
certamente, se/quando a crise chegar, haverá melhores condições de lidar com ela, não
permitindo que evolua ou então minimizando os prejuízos. O inverso também é
verdadeiro: “[...] aos despreparados está reservado o peso dos tufões provocados pelo
bater das asas da borboleta” (JORGE, 2015, p. xvi).
Existem outros aspectos que não podemos deixar de mencionar e que são munição para
deflagrar crises. É o caso, por exemplo, de acidentes naturais, como terremotos, furacões,
tsunamis, dos quais não há controle absoluto – por mais que as tecnologias de
monitoramento dos fenômenos meteorológicos e geológicos sejam um aliado importante.
É certo que desdobramentos desses desastres podem arranhar a reputação de empresas e
órgãos públicos, a depender da forma como são conduzidos. Um exemplo foi o tsunami
no Japão em 2011, em que 16 mil pessoas morreram e outras 2,5 mil continuam
desaparecidas (PORTAL MIE, 2020a).
Desde então, o governo central daquele país vem realizando sucessivos estudos no sentido
de estimar a ocorrência de outros tsunamis. O mais recente relatório, apresentado em
2020, tem o objetivo de aumentar a conscientização da população a respeito do risco de
um acidente com proporções ainda maiores nos próximos anos, bem como “a encorajar
autoridades locais a pelo menos fazer algum tipo de preparação” (PORTAL MIE, 2020b).
Uma constatação também relevante está no fato de que, com raras exceções, as crises se
anunciam. Indícios de que algo está fora do planejado, de que riscos estão sendo
desconsiderados, e cuidados, negligenciados, podem funcionar como uma bomba-
relógio. Entretanto, em muitas situações tudo isso não mobiliza empresas ou gestores. Foi
o que ocorreu no episódio do Parque Hopi Hari, no interior do Estado de São Paulo, em
2012, quando uma adolescente caiu de um brinquedo a uma altura de quase 70 metros e
faleceu instantes depois. A cadeira na qual ela estava sentada estava com defeito – não
tinha um dos cintos de segurança necessários –, mas não estava interditada nem sequer
havia qualquer aviso a respeito (FORNI, 2015).

O relacionamento com a mídia em situações de crise


Situações de crises institucionais ou aquelas que envolvem pessoas com reconhecida
notoriedade implicam a existência de alguns personagens. Para o que nos interessa neste
artigo, vamos identificar dois: a empresa/organização (ou a pessoa pública) e a mídia.
A empresa/organização (ou pessoa pública) se torna o foco das atenções quando a crise
eclode. Seja como responsável pelos fatos que levaram àquela situação, seja como vítima

123
do que está ocorrendo, mas que, no frigir dos ovos, acaba por afetá-la, dela se esperam
providências, reparos, soluções que busquem minimizar os prejuízos causados e
resguardar a imagem e reputação dela.
A mídia, por sua vez, exerce uma função essencial, pois deve defender aquilo que é do
interesse público. Aliado ao conceito de noticiabilidade – para Silva (2005, p. 96), trata-
se de “todo e qualquer fator potencialmente capaz de agir no processo da produção da
notícia, desde características do fato, julgamentos pessoais do jornalista, cultura
profissional da categoria, condições favorecedoras ou limitantes da empresa de mídia,
qualidade do material (imagem e texto), relação com as fontes e com o público, fatores
éticos e ainda circunstâncias históricas, políticas, econômicas e sociais” –, está presente
a tarefa a ser exercida pelo jornalista. De acordo com Ash (2011, p. 13, citado por FORNI,
2015, p. 179), “o primeiro dever [...] do jornalista é descobrir os fatos. [...] Os fatos são
as pedras a partir das quais construímos caminhos de análise, os ladrilhos de um mosaico
que encaixamos para compor imagens do passado e do presente”.
A relação das organizações com a mídia carrega um razoável caráter pragmático. Isso
certamente está relacionado à busca da visibilidade midiática, por meio da qual elas
podem obter legitimidade em relação às ideias que pregam ou aos produtos e serviços que
transacionam. As organizações precisam ser e estar no mundo, e para tanto a mídia
contribui efetivamente. Scheid e Barichello (2006, citados por SARTOR, 2008, p. 129)
defendem que:
é obrigatório passar pela mídia diante do interesse de obter adeptos para
determina causa. É através da visibilidade midiática que as
organizações buscam justificar suas ações e disputar o apoio ou a
simpatia da opinião pública. Os meios de comunicação (re)produzem
os diversos discursos sociais e, assim, oferecem o ambiente em que as
atitudes individuais e coletivas são publicamente explicadas. Caminho
compulsório para a conquista da legitimidade, a mídia abre “novos
espaços para a representação dos indivíduos e instituições perante a
sociedade”.

Entretanto, tal relação segue dois caminhos: se estreita, na medida que os órgãos de
imprensa valorizam, reconhecem e enaltecem o trabalho que é feito; ou se torna tensa,
quando temas desconfortáveis são tratados ou quando críticas ou denúncias das mais
diversas naturezas se tornam públicas por meio de jornalistas, repórteres, colunistas e
outros profissionais da mídia. Ora, nessa perspectiva aplaude-se a mídia quando há
notícias favoráveis, ou a recrimina quando explora assuntos espinhosos. Isso, numa
situação mais radical, esbarra até mesmo na liberdade de imprensa: “A liberdade de

124
imprensa é fundamental para manter a população informada, especialmente em
momentos de crise [...]. O acesso às autoridades é prerrogativa do trabalho dos/as
jornalistas em sua missão de informar a população e cabe aos governantes serem
transparentes e prestarem contas à sociedade” (FENAJ, 2020a).

Governo Federal versus mídia: análise de casos


Vamos tratar a seguir de três episódios que caracterizam o modo como o governo federal
– especialmente o chefe do Executivo – vem lidando com a mídia no contexto da crise do
novo coronavírus. Por uma questão de recorte temporal, eles estão compreendidos no
período que corresponde aos meses de março, abril, maio e junho de 2020.
Vale ressaltar que, longe de estabelecer qualquer debate sob o viés político-ideológico, o
que abordaremos aqui é a percepção do chefe do Executivo, evidenciada em posturas,
declarações e posicionamentos, a respeito do papel dos profissionais da imprensa. Os
apontamentos propostos vão ao encontro do que preconizam as melhores práticas de
Comunicação Organizacional e os autores que se debruçam sobre essa temática.

Primeiro episódio – “Vão abandonar o povo? Nunca vi isso, a imprensa que não
gosta do povo”
É possível dizer que desde sempre o presidente Jair Bolsonaro não considera que a
pandemia do novo coronavírus seja algo tão grave como ela de fato é. Mesmo diante de
evidências incontestáveis e de alertas de cientistas e de organismos internacionais ligados
à saúde – e de números de casos e de mortes dentro e fora do país –, a postura tem sido a
de menosprezar a tragicidade do Covid-19 e a de criticar setores, como a mídia, que,
segundo ele, é responsável por difundir o pânico entre a população. No princípio de
março, quando participou de um evento nos Estados Unidos, o mandatário declarou que
a crise do coronavírus era uma “fantasia” e que não representava tudo aquilo que a grande
mídia propagava através do mundo inteiro (FENAJ, 2020b).
No dia 31 do mesmo mês, durante a entrevista que costuma conceder na saída do Palácio
da Alvorada, o presidente foi perguntado a respeito do posicionamento do então ministro
da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que dava orientações contrárias às dele em meio ao
Covid-19. Antes da resposta, adeptos de Jair Bolsonaro passaram a gritar insultos e a
agredir verbalmente os profissionais de imprensa que ali estavam. “O presidente reagiu,
incentivando os apoiadores a seguirem os ataques e ainda mandou os jornalistas ficarem

125
quietos enquanto ouviam os xingamentos” (FENAJ, 2020a). “‘É ele [um dos apoiadores]
que vai falar, não é vocês (jornalistas) não’, disse” (MENDONÇA, 2020).
O grupo de repórteres abandonou o local, encerrando a entrevista, fato que mereceu o
seguinte comentário do chefe do Executivo: “Vão abandonar o povo? Nunca vi isso, a
imprensa que não gosta do povo” (PARAGUASSU, 2020). Dias antes, ele já havia dito
que, com o trabalho que parte da mídia realiza, a tendência é se criar um clima tenso.
Fica perceptível a falta de clareza a respeito dos papéis que desempenham as fontes (ou
porta-vozes) e os profissionais da mídia. Às primeiras – especialmente se estiverem
representando órgãos públicos – cabe resguardar a imagem destes, sem absolutamente
abrir mão de prestar contas à sociedade acerca de assuntos de interesse público. Os
jornalistas, por sua vez, estão incumbidos de pesquisar, investigar, questionar, com vistas
a oferecer informação de qualidade a leitores, ouvintes e telespectadores.
Vale ressaltar que esses atores não são inimigos, o que implica a importância de um
relacionamento cortês e correto. Em um contexto de crise, isso precisa ficar ainda mais
evidenciado. Rosa (2001) nos traz, a esse respeito, dois modos corretos de pensar: 1) as
fontes (ou porta-vozes) das empresas privadas ou órgãos públicos sabem mais do assunto
em questão do que o jornalista, portanto cabe a elas agir com serenidade, equilíbrio e
firmeza, “transmitindo [ao profissional da mídia] detalhes cruciais que coíbam a
propagação de erros” (ROSA, 2001, p. 161), os quais, depois que forem veiculados,
podem dar a impressão de que foram provocados pela postura de má vontade do jornalista,
o que nem sempre é verdade; e 2) as fontes (ou porta-vozes) das empresas privadas ou
órgãos públicos não devem se arvorar em teorias de conspiração – estas até podem
ocorrer, mas isso não é uma regra – nem esperar que haja uma torcida favorável. “Você
nunca vai conseguir que a torcida adversária torça a seu favor, mas poderá fazer com que
o respeite. E para obter esse respeito contam, de modo decisivo, a sua atitude, o seu
posicionamento, a sua forma de agir” (ROSA, 2001, p. 163).

Segundo episódio – “E daí?”


No dia 28 de abril, o presidente Jair Bolsonaro foi perguntado por uma repórter a respeito
do fato de o Brasil ter superado a China em relação ao número de mortes provocadas pelo
Covid-19 e respondeu: “E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas
não faço milagre”. Como a notícia ganhou enorme repercussão nos veículos de
comunicação do país e do exterior, entre os quais a TV Globo, o presidente acusou a
emissora de deturpar a sua fala – disse que só respondeu daquela maneira depois de

126
repórteres “insistirem em fazer perguntas idiotas”. “Essa imprensa lixo chamada Globo.
Ou melhor, lixo dá para ser reciclado. Globo nem lixo é, porque não pode ser reciclada”
(BBC, 2020).
Na sequência, o mandatário vislumbrou o ano de 2022, quando será tratada a renovação
da concessão da emissora e de outros veículos de comunicação, e sinalizou: “Não vou dar
dinheiro para vocês [Rede Globo]. E, em 2022, não é ameaça não, assim como faço com
todo mundo, vai ter que estar direitinho a contabilidade para que possa ter a concessão
renovada. Se não estiver tudo certo, não renovo a de vocês e nem a de ninguém"
(BENÍCIO, 2020).
Sob o ponto de vista do relacionamento com a mídia, dois aspectos chamam a atenção. O
primeiro diz respeito à postura de classificar determinadas perguntas como “idiotas”. A
prerrogativa de fazer perguntas é do jornalista, e não cabe ao entrevistado juízo de valor
a respeito delas. Noblat (2002, p. 71) defende que se a intenção é “descobrir ou esclarecer
algum fato de interesse público, ele [jornalista] deve perguntar o que achar que deve”. O
autor acrescenta que “não há perguntas inconvenientes. Pode haver respostas
inconvenientes. Mas este é um problema para quem responde” (NOBLAT, 2002, p. 71).
O outro aspecto se refere ao fato de o presidente da República – poderia ser também o
diretor de uma grande empresa multinacional ou uma pessoa de notória influência entre
a opinião pública – se valer de sua posição de poder para insinuar algum tipo de retaliação,
mesmo que veladamente. É difícil pensar que não haja alguma intenção de prejudicar tal
emissora diante do desconforto com a reportagem divulgada se no mesmo instante o
mandatário a chama de “Globo lixo”. Em última instância, vale uma das máximas dos
manuais de media training: se não quer que divulgue alguma informação ou fato, não fale
nem faça. Até porque, salvo exceções que confirmam a regra, negar o que disse (o que
foi publicado/exibido) é um artifício comum quando a repercussão é negativa; isso tem a
ver com o que Rosa (2001, p. 158-159) chama de “efeito bumerangue”: “Mentir pode lhe
dar a vitória numa batalha menor, mas essa mentira pode lhe custar a guerra”.

Terceiro episódio – “Acabou a matéria do Jornal Nacional”


A escalada da pandemia do novo coronavírus requer do Poder Público todo esforço
possível para manter a população informada – seja acerca dos números, seja das
iniciativas para combater a doença, seja das descobertas científicas em torno de vacinas.
Além do recurso das redes sociais, isso passa também pela divulgação que ocorre por

127
meio dos veículos de comunicação – jornais, revistas, emissoras de TV e de rádio, sites
noticiosos etc.
A troca constante dos titulares do Ministério da Saúde vem trazendo consigo uma
mudança na dinâmica com que as informações são transmitidas, especialmente em
relação à frequência com que isso acontece. Recente comentário do ministro interino, o
general Eduardo Pazuello, é revelador a respeito da importância que atribui ao contato
com os jornalistas: realizar entrevistas é “tirar o pessoal da produção, do trabalho” (O
ANTAGONISTA, 2020). Desde que assumiu o cargo, “o general não costuma participar
de coletivas. ‘Tem muito o que fazer’, costuma dizer nos bastidores” (O
ANTAGONISTA, 2020).
No dia 5 de junho, o presidente da República, ao ser questionado por jornalistas a respeito
do atraso na divulgação das informações sobre o Covid-19, declarou: “Acabou matéria
do Jornal Nacional”. Na perspectiva do chefe do Executivo, falta “seriedade” à emissora:
“O Jornal Nacional gosta de dizer que o Brasil é recordista em mortes” (FONSECA,
2020); ela ainda se referiu à Rede Globo como a “TV Funerária” (MARTINS, 2020).
Desde o início da pandemia, o Ministério da Saúde vinha repassando as informações à
imprensa por volta de 17 horas; com a queda de Luiz Henrique Mandetta e a nomeação
de Nelson Teich, o horário passou para as 19 horas, e, em seguida – com nova troca de
ministros e a chegada do interino, o general Eduardo Pazuello, – para as 22 horas, quando
os noticiários já foram ao ar.
De acordo com o argumento do presidente, o objetivo é ter em mãos os dados mais
consolidados, apesar de não ter explicado como, durante mais de dois meses, foi possível
que fossem sistematizados mais cedo, nem o motivo de apenas torná-los públicos às 22
horas considerando que constam de uma planilha que sistematiza os números até as 19
horas. “Ninguém tem que correr para atender a Globo”, disse o mandatário (COLLETA;
SALDAÑA, 2020).
À postergação da divulgação das informações, soma-se a mudança da metodologia
utilizada até então. A nova sistemática é adotar os óbitos nas datas em que ocorrem,
excluindo-se do número diário os registros atrasados de dias anteriores, o que causa queda
significativa no total de mortes inserido no boletim diário, porque há atrasos nos testes no
país (MATTOS, 2020). Na opinião de LOPES (citado por MATTOS, 2020), “com essa
nova metodologia, vai cair o número de mortos por dia [...] porque o sistema demora a
contabilizar o total de óbitos devido aos atrasos das notificações. Seria importante

128
informar que ocorreram tantos óbitos no dia e qual dado está sendo divulgado. O melhor
acompanhamento é ser transparente e completo”.
Como forma de buscar assegurar transparência às informações, um pool de veículos de
comunicação formado por G1, O Globo, Extra, O Estado de S .Paulo, Folha de S. Paulo
e UOL está recolhendo diariamente às 20 horas os dados diretamente nas secretarias
estaduais de Saúde, sinalizando a evolução dos casos, o total de óbitos, bem como
números consolidados de casos testados e com resultado positivo para a doença (G1,
2020).
Uma das premissas essenciais da Comunicação Organizacional é a transparência. Isso é
válido tanto em situações nas quais empresas, instituições e pessoas públicas se
encontram na normalidade de suas atuações/operações quanto em cenários de crise. O
fato é que esse atributo favorece a criação ou o fortalecimento de uma relação de
confiança com a mídia; entretanto, quando ele é negligenciado, está aberto um caminho
perigoso que pode trazer desdobramentos desastrosos para a imagem das corporações.
Bueno (2009) chama a atenção para a importância de que os canais de relacionamento
estejam bem “azeitados”; dito de outro modo, há que existir um histórico de bom
relacionamento com veículos de comunicação, repórteres, editores, blogueiros, colunistas
etc. “[Jornalistas] desconfiam de contatos oportunistas realizados em momentos
específicos, quando de interesse da empresa ou entidade. Repudiam tentativas de
mascarar a verdade e não perdoam, quando assessores, executivos ou empresários
pretendem ‘passar-lhes a perna’” (BUENO, 2009, p. 220).
Outro aspecto que revela a atenção por parte das empresas e instituições é conhecer a
dinâmica de funcionamento dos veículos. Existe uma rotina – majoritária em meios
massivos, como a TV e jornais impressos – que inclui invariavelmente horário de coleta
e de averiguação das informações, bem como prazo de conclusão delas para que sejam
redigidas e editadas com vistas a ser veiculadas nos noticiários. O compromisso em fazer
com que o que se tem a dizer/mostrar seja disponibilizado em consonância com esse jeito
de se construir uma narrativa noticiosa revela um esforço que é reconhecido pelos
profissionais da imprensa. O inverso também é verdadeiro: artifícios criados para
dificultar ou mesmo inviabilizar o acesso a informações as quais venham a se transformar
em notícias podem ocultar intenções escusas e certamente vão predispor a mídia a
investigá-las.

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Considerações finais
Nesta reflexão, poderíamos explorar outros fundamentos essenciais a respeito do
gerenciamento de crise, como o cuidado na unidade do discurso. Falar a mesma
linguagem permite o controle de quem a emite e demonstra uma sintonia para quem a
recebe. O que vimos na maior parte deste período que compreende esta reflexão foi a
existência de discursos dissonantes. De um lado, o presidente da República demonstra,
por meio de palavras e atitudes, o quanto é irrelevante o isolamento social e quão
desnecessários são o uso de máscara e o cuidado em não haver aglomerações; somam-se
a isso a ênfase em retomar rapidamente as atividades econômicas e o uso de cloroquina
aos pacientes com Covid-19. De outro lado, ministros, inspirados nas orientações da
ciência e de organismos internacionais, criticam (ou criticaram) a prescrição desse
medicamento, a flexibilização da quarentena e eventos nos quais se juntam muitas
pessoas.
Associado diretamente a isso está a importância de se definir quem é(são) o(s) porta-
voz(es). Nenhum problema há em que seja mais de um – mas que também não sejam em
número exagerado –, mas é essencial que seja quem detenha as melhores condições para
cumprir esse papel. Estamos falando de aptidões técnicas e científicas e de domínio dos
assuntos, mas também de capacidade emocional para lidar com os questionamentos que
são característicos de repórteres. Certamente comentários como “E daí?”, “Cala a boca,
cala a boca”, “essas perguntas idiotas”, “Vocês são uma espécie em extinção”, “Você é
da Folha, Folha fora, não quero conversa com a Folha”, “Vou dar uma banana pra vocês,
tá ok?” e outros não condizem com a postura de um porta-voz nem estimulam um diálogo
saudável com a mídia e a sociedade.
Há um aspecto bastante perverso na postura do chefe do Executivo e que merece menção.
Em março de 2020, o governo federal, por meio do Ministério da Mulher, da Família e
dos Direitos Humanos, reeditou a Cartilha Aristeu Guida da Silva – Proteção dos direitos
humanos de jornalistas e de outros comunicadores e comunicadoras, em cujas páginas
se explicitam alguns cuidados com os quais o Estado brasileiro se compromete:
reconhecer a importância da liberdade de expressão e de imprensa
enquanto direito humano essencial para o devido funcionamento da
sociedade democrática; [...] incentivar, nos meios de comunicação,
espaços que permitam a discussão franca, diversa e plural, fazendo
efetivo o direito à informação; [...] fortalecer a liberdade de expressão,
incentivando a denúncia de ações violentas, tanto físicas quanto
psicológicas, contra jornalistas, comunicadores e comunicadoras [...].
(BRASIL, 2020)

130
Contraditoriamente a esse discurso, a forma como se relaciona com jornalistas e
repórteres chama a atenção. De acordo com levantamento feito pela Federação Nacional
dos Jornalistas (Fenaj), nos três primeiros meses de 2020, foram 141 ataques desferidos
a esses profissionais nas redes sociais: 117 descredibilizam a imprensa de modo geral; 22
se dirigem aos jornalistas; e 2 se voltam para a organização sindical (FENAJ, 2020b).
Em que pesem as idiossincrasias da mídia e os interesses que defende – isso não pode ser
desconsiderado em nenhuma análise que se pretenda honesta –, é inegável o papel que
ela cumpre na sociedade. Trata-se de um canal importante de reverberação do que ocorre
em diferentes âmbitos – sociais, econômicos, políticos, culturais etc. – e exerce (ou deve
exercer) papel fundamental como guardião dos interesses públicos.

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participa-da-primeira-entrevista-coletiva-no-ministerio-da-saude/>. Acesso em: 29 jun.
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VEÍCULOS de comunicação formam parceria para dar transparência a dados de Covid-


19. G1, 8 jun. 2020. Disponível em:
<https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/06/08/veiculos-de-comunicacao-formam-
parceria-para-dar-transparencia-a-dados-de-covid-19.ghtml>. Acesso em: 29 jun. 2020.

ZYLBERKAN, M. Primeira entrevista coletiva de Teich será quase uma semana após
indicação. Veja, 21 abr. 2020. Disponível em:
<https://veja.abril.com.br/blog/maquiavel/primeira-entrevista-coletiva-de-teich-sera-
quase-uma-semana-apos-indicacao/>. Acesso em: 29 jun. 2020.

133
De revistas customizadas a webséries:
o conteúdo de marca como narrativa das organizações
Rosiane Moro

No contexto da pós-modernidade, a comunicação das marcas busca seu lugar no vasto


mundo da fragmentação. O que antes cabia em territórios específicos, como comunicação
interna, comunicação externa, publicidade e relações públicas; hoje, convive em um
ambiente de “tudo junto e misturado”. O mesmo acontece com os meios de divulgação:
os conteúdos das publicações impressas, do mural de comunicados e das TVs e rádios
corporativas concentrados até pouco tempo atrás em espaços midiáticos próprios e
facilmente identificáveis, na atualidade convivem e disputam a atenção da audiência em
um emaranhado de canais digitais. Decidir o que comunicar, como e onde difundir o
discurso das marcas de maneira estratégica é o grande desafio dos profissionais de
comunicação diante de um consumidor multicanal, multitela e soterrado por mensagens
que se sobrepõem e são consumidas enquanto ele geralmente executa várias atividades
ao mesmo tempo.
Há tempos, a crueza do discurso publicitário convencional ecoa como um ruído num
mundo em que as pessoas procuram propósitos, sentidos e significados para a própria
vida. Na tentativa de adequar a tonalidade dos seus discursos para divulgar produtos e
serviços, grandes corporações (Goodyear, Mercedes-Benz, Varig) elegeram nos idos dos
anos 1980 as revistas customizadas como o veículo ideal para entregar suas mensagens,
desviando-se assim do apelo da mídia de massa. Na esteira da cibercultura, essas
narrativas não apenas se mantiveram como cresceram e se multiplicaram. De revistas
digitais a filmes para webséries e conteúdos de podcasts, as marcas estão em pleno
processo de aprendizagem e apropriação do melhor discurso para cada mídia ao mesmo
tempo em que aprofundam sua compreensão sobre o comportamento dos consumidores,
garimpando nas mesmas redes as tematizações de memórias, fantasias e desejos que irão
temperar as suas narrativas.
Mas delimitar a comunicação organizacional ao tripé canal, conteúdo e público-alvo é
restringir seu campo de pesquisa e sua capacidade de atuação. Adotar uma perspectiva
mais ampla permite compreender que o esforço comunicacional de uma organização é
antes de tudo uma manifestação cultural (HALL, 2016, p.19) na medida em que gera e
faz circular significados. Antes de abordar como os conteúdos são pensados para construir

134
narrativas apropriadas às estratégias das marcas, vale aprofundar a compreensão da
comunicação como um processo cultural porque as relações de consumo validam certas
atitudes sociais, interferem no modo de vida de uma sociedade ou de um grupo, legitima
conceitos, mobiliza seus afetos e seu senso de pertencimento a determinados grupos. Um
processo vivo, dinâmico e retroalimentável.
Embalada por novos e mutantes hábitos de consumo tanto as marcas modificam a
sociedade quanto são modificadas por ela (ZOZZOLI, 2010). Estão aí a Netflix, a
Amazon e a Apple ensinando novos modos de consumir produtos audiovisuais, a Airbnb
modificando as formas de hospedagem e o Spotify revolucionando o jeito de consumir a
produção musical. Poderíamos ir adiante citando a Uber e a sua transformação nos
deslocamentos nas grandes cidades ou o recente uso de tecnologias e aplicativos para
intermediar as práticas de trabalho adotadas durante a pandemia com forte tendência a se
tornarem permanentes. As nuances do espaço social, portanto, interferem diretamente nas
narrativas das marcas e perspectivas de comunicação das marcas.
A transformação do modelo fordista de publicidade até o momento da interconectividade
foi muito bem captada por Kotler, Kartajaya e Setiawan (2017, p. 11) ao descreverem a
evolução social do marketing. A trajetória começa pela valorização do produto
(marketing 1.0), passa pela identificação dos anseios do consumidor (marketing 2.0),
entra em terreno mais abstrato e intenso do comportamento humano, com a tríade “mente,
corpo e espírito” (marketing 3.0), até chegar à tecnologia e ao embate entre o mundo real
e o mundo virtual, voltando o olhar para a necessidade de um “envolvimento mais
profundo” e “sob medida” impostos pela superficialidade dos relacionamentos na era da
conectividade (marketing 4.0).
A compreensão do comportamento do consumidor é a matéria-prima para a definição das
narrativas das marcas. Há tempos o discurso vendedor, disruptivo e impessoal não
encontra acolhida e ressonância na audiência, assim como atitudes egocêntricas e
calcadas apenas em retorno financeiro são rapidamente rechaçadas pelos consumidores.
As relações impessoais e fundamentadas no trabalho caracterizadas por Habermas (1989)
como o modelo da sociedade capitalista do mundo moderno foi substituído pelo culto à
leveza na sociedade hipermoderna como contraponto ao excesso de informação,
velocidade, trabalho, conexão e consumo. São os tempos da leveza e fluidez
(LIPOVETISKY, 2016; BAUMAN, 2001).
Na tentativa de oferecer um mundo sem peso, com mais envolvimento, entrega e
relevância, as marcas precisaram repensar seus métodos de atuação porque falar apenas

135
do produto em si, seja um automóvel, um sabonete ou uma lata de energético, não dá
conta de tudo. A relação compra-venda-posse-uso é permeada por muitas camadas de
valores psicossociais, precisa de aportes simbólicos, que não se consolidam de maneira
vertical (a marca fala e o consumidor acata) e nem podem ser embutidas a fórceps dentro
de um logotipo.
Nesse contexto, as marcas alimentam o diálogo com clientes e potenciais consumidores
com outros referenciais, como sua inteligência, sua visão de mundo, o propósito por trás
de cada produto ou serviço para então criar conexão e vínculos com o cliente que
ultrapasse o ato de compra e venda.
Esses elementos de expressão marcária são levados à mídia audiovisual
ou só de áudio, impressa, exterior, digital, entre outras, com a intenção
de penetrar em nossos sentidos e causar sensações agradáveis e até
afetivas que nos levam a uma aproximação. O objetivo é estabelecer
uma conexão – e se esta for emocional, tanto melhor (PEREZ, 2017, p.
47).

As marcas parecem ter compreendido enfim, que sua imagem não é construída somente
com o poder dos budgets milionários da verba publicitária ou institucional e nem podem
ser definidas numa equação de branding. Isso ajuda, claro, mas a construção real de
significados, a decodificação do que aquela marca representa de fato se dá no contato com
a vida que corre, na interação com as pessoas, nas ideias e conceitos em movimento. E
foi para entrar no passo dessa caminhada que muitas organizações lançaram mão de seus
próprios conteúdos para criar engajamento.
As revistas customizadas podem ser identificadas como um esforço nesse sentido. Elas
abriram uma trilha pela qual hoje transitam as webséries, os blogs, os podcasts e uma
infinita variedade de produtos de comunicação em formato de entretenimento criados
para expandir a cultura das marcas. É a tentativa de contar as próprias histórias, de ampliar
os aspectos humanizados das marcas buscando vínculos com a audiência. Trindade e
Perez (2014, p. 167) reconhecem que a comunicação em marketing sempre buscou
construir os tais vínculos, com a diferença de que hoje investem mais na carga de sentido
dessa relação: “sentidos de pertencimento, de pertinência, e de afetividades nas vidas das
pessoas, [...] uma vez que, todo vínculo tem origem numa relação, mas nem toda relação
constrói vínculos”.
O que temos visto é que os discursos mais coesos e consistentes reverberam de um canal
a outro num efeito transmidiático mais potente, como apontado por Jenkins, 2009:

136
Uma história (ou narrativa) transmídia desenrola-se através de
múltiplas plataformas de mídia, com cada novo texto contribuindo de
maneira distinta e valiosa para o todo. Na forma ideal de narrativa
transmidiática, cada meio faz o que faz de melhor - a fim de que uma
história possa ser introduzida num filme, ser expandida pela televisão,
romances, quadrinhos; seu universo possa ser explorado em games ou
experimentado como atração de um parque de diversões (JENKINS,
2009, p.138).

Na prática a multiplicidade de canais de comunicação trouxe às empresas variados pontos


de contato com os clientes e a transposição do discurso focado no produto para o estilo
de vida da marca ampliou as possibilidades de criação e o campo de atuação dos
profissionais da área. Resta agora fazer o uso correto das novas narrativas e adequar o
discurso a cada plataforma. Compreender o significado e o objetivo por trás da produção
de conteúdo torna-se essencial não só para a sua aplicação, mas também para obter
melhores resultados com a sua prática.

Afinal, o que é conteúdo de marca?


Falar sobre o conteúdo de marca é entrar em um terreno delicado justamente pela falta de
consenso em torno da sua definição e utilização. É comum em congressos sobre o tema
gerentes de marketing de grandes marcas apresentarem cases como conteúdo de marca
quando na prática são publicidade embalada em produções hollywoodianas. Em alguns
casos, os trabalhos até entregam conteúdo, mas erram a mão ao forçar a presença do
produto sem conexão com o roteiro, virando um corpo estranho na produção e jogando a
comunicação organizacional de volta ao seu eterno dilema: é conteúdo ou é publicidade?
Existe uma regra básica e muita propagada pelos pesquisadores, porém raramente
utilizada, que pode solucionar de vez esse quebra-cabeça: conteúdo de marca não vende,
é um trabalho de construção de imagem, de formação de comunidades, de fortalecimento
de laços com o intuito de gerar engajamento e compartilhamento. Kotler, Kartajaya e
Setiawan (2017) trazem a seguinte definição para o termo:
Em poucas palavras, marketing de conteúdo é uma abordagem que
envolve criar, selecionar, distribuir e ampliar conteúdo que seja
interessante, relevante e útil para um público claramente definido com
o objetivo de gerar conversas sobre esse conteúdo. O marketing de
conteúdo também é considerado outra forma de brand journalism
(“jornalismo de marca”) e brand publishing (“publicações de marca”)
que cria conexões mais profundas entre marcas e consumidores. As
marcas que estão realizando um bom marketing de conteúdo fornecem
aos consumidores acesso a conteúdo original de alta qualidade enquanto

137
contam histórias interessantes sobre si mesmas (KOTLER;
KARTAJAYA; SETIAWAN, 2017, p.147).

Apesar clara e objetiva, a descrição aumenta o nó da questão ao usar uma abundância de


termos como sinônimo: conteúdo de marca, marketing de conteúdo, jornalismo de marca
e publicações de marca. Os pesquisadores e professores da universidade de Navarra,
Arrese e Pérez-Latre (2017) preferem nomear a prática como jornalismo de marca
justamente para evitar conflitos com outras atividades relacionadas ao marketing de
conteúdo, como o native advertising tentam com a definição abaixo diferenciá-lo de
outras atividades de comunicação:
[...] tem como objetivo comum alcançar credibilidade, influência e
engajamento positivo pela participação no fluxo de informações e
conversas sociais mediadas, especialmente em ambientes digitais, com
conteúdos claramente diferenciados dos conteúdos de publicidade, RP
ou marketing de conteúdo (ARESE; PÉREZ-LATRE, 2017, p. 123)
[tradução nossa].

Com vertente voltada ao marketing, Pulizzi (2016, p. 5) descreve o marketing de conteúdo


como a “criação e distribuição de conteúdo valioso...”, mas faz uma menção ao retorno
financeiro: “...com o objetivo de gerar uma ação lucrativa do cliente”. Esse pequeno
adicional remete automaticamente à venda de algum produto ou serviço, porém ao
transitar pela obra completa do autor entendemos que a “ação lucrativa” provém da
concretização dos atributos intangíveis das marcas, fonte comprovada de rentabilidade
(AAKER,1998) e que leva o consumidor a optar por marcas com a qual possui afinidade
ou ligação emocional.
Existe ainda a comparação de conteúdo de marca com o storytelling. Definido usualmente
como a arte de contar boas histórias, o storytelling ganhou notoriedade ao trocar a
narrativa clássica do discurso publicitário por apelos emocionais para a cativar a
audiência. Palacios e Terenzzo (2016, p. 63) definem storytelling como “uma tecnologia
de comunicação que implica em saber encontrar e contar uma história fabulosa, com um
propósito épico, de forma fantástica”. Pode-se dizer, então, que o storytelling é uma
técnica, uma ferramenta ou um recurso de comunicação usado pelo conteúdo de marca.
Xavier (2016, p. 16) atribui o crescimento da tática de contar histórias à necessidade de
cooptar a atenção do público frente à dispersão causada pela globalização, ao uso
frenético das redes sociais e a transformação de todas as pessoas, físicas ou jurídicas, em
produtores de conteúdo.

138
Há ainda a associação do conteúdo de marca com o brand entertainment ou
advertainment. Covaleski (2015) ao analisar as propagandas contemporâneas encontrou
nelas uma “narrativa híbrida”, uma união entre conteúdo de marca e entretenimento,
evidenciado por quatro características básicas: “capacidade de persuasão, viés
‘entretível’, nível de interação e estímulo ao compartilhamento”. Levando em conta o
contexto publicitário, o autor define conteúdo de marca como “a fusão de dois produtos
midiáticos em um destinado a ser distribuído como conteúdo de entretenimento, embora
mantendo qualificações a uma marca anunciante” (COVALESKI, 2014, p. 3042).
Se analisarmos rapidamente o famoso caso de conteúdo de marca Retratos da real beleza,
um minidocumentário criado para a marca Dove, da Unilever, em 2013, temos a presença
clara dos quatro itens descritos acima, o que já o classificaria como brand entertainment,
mas ao analisar um produto de comunicação organizacional é preciso ir além da peça em
si, uma vez que dificilmente uma ação de conteúdo de marca é composta por um único
elemento.
No caso da Dove, a marca se apropriou da narrativa da beleza real em 2004 e até hoje
desenvolve projetos com a temática. Não fosse a adoção da causa como mote de suas
ações futuras, o documentário seria enquadrado automaticamente como peça publicitária.
Mas ações como a criação de um banco de imagens aberto para ser usado por meios de
comunicação com mais de 10 mil retratos de mulheres e pessoas não-binárias de diversas
partes do mundo, produzidos também por mulheres, sem o uso de distorções digitais e em
cenários reais, mostra a apropriação da marca pela temática, tornando-se uma autoridade
no assunto. Há ainda o Projeto Dove pela Autoestima criado com o intuito de melhorar a
consciência corporal das adolescentes, com material para ser utilizado por professores
dentro do ambiente escolar, o que demonstra a longevidade e investimento da marca na
temática da beleza como fonte de confiança para as mulheres.
Para finalizar, temos ainda a apropriação do termo conteúdo de marca para nomear os
publieditoriais ou matérias pagas produzidos por estúdios de alguns veículos de
comunicação, como é o caso do portal UOL. Apesar de adotarem as técnicas jornalísticas
para apresentar produtos e serviços de determinada marca, a intenção dessa comunicação
é confundir o público, fazendo a mensagem ser considerada pelo leitor como o conteúdo
noticioso da publicação (BUENO, 2017, p. 7), não podendo, portanto, ser considerada
conteúdo de marca.
Passando por todos os conceitos, percebemos que o conteúdo de marca se afasta do
contexto da publicidade tradicional, do publieditorial, do brand entertainment e da

139
técnica de storytelling ao usar como matéria-prima os atributos intangíveis das marcas,
ressaltando seus propósitos, compartilhando os conhecimentos produzidos internamente
e tornando-se autoridade em determinados assuntos. Objetivos bem distantes do ato de
contar histórias, entreter ou vender. Separar o joio do trigo torna-se a grande missão dos
profissionais que pretendem trabalhar com o tema e exige a compreensão de que “embora
o conteúdo não contribua diretamente para seu valor de marca nem melhore o volume de
vendas, seja valioso para quem assiste” (KOTLER; KARTAJAYA;SETIAWAN, 2016,
p.149 e 150).
A valorização do conteúdo de marca e sua adoção em massa pelas empresas se dá
justamente pela necessidade de aproximação com o consumidor e estar perto dos clientes
na atualidade significa encontrar o equilíbrio entre a oferta de conteúdo online e off-line.
Em alguns casos a escolha de um canal de comunicação substitui o outro, mas há
situações em que haverá pontos de convergência não só de plataformas, mas também de
mídias. O dilema agora não está mais em optar entre o físico e o virtual, publicações em
papel ou online. A realidade é que o mundo on e o mundo off coexistem e será correta
convergência entre canais e conteúdo que ditará o sucesso da comunicação organizacional
no futuro.

Plataformas de conteúdo
Seguindo uma tendência internacional e dentro do contexto das empresas como
produtoras de conteúdo, as revistas customizadas podem ser vistas como precursoras do
conteúdo de marca. Com um estilo leve, editorial e visual elegante, marcas como
Goodyear, Mitsubishi, Volkswagen, Varig, Gol, Nestlé, Latam, Mercedes-Benz e
Unilever, só para citar algumas, elegeram a partir dos anos 1980 as publicações impressas
como o veículo ideal para levar informação e entretenimento até a casa dos clientes.
A escolha da revista como mídia não aconteceu ao acaso e em alguns casos foi uma
evolução natural do tradicional jornal interno, veículo de comunicação muito utilizado
pelas empresas para manter os funcionários informados sobre as diretrizes da companhia.
Entre seus principais atributos a revista estabelece uma relação intimista, olho no olho,
com o leitor (SCALZO, 2003, p.15), o leva a viajar e a sentir-se parte de um mundo ao
qual ele não pertence (PRADO, 2010, p. 65), cria laços e “traz acolhimento” ao tratar de
aspectos da vida cotidiana (TAVARES;SCHWAAB, 2013, p. 37), além de enaltecer o
senso de pertencimento a uma comunidade. Há ainda os aspectos sensoriais como a

140
facilidade de carregar e folhear, o aroma da tinta sobre o papel, os apelos visuais das
imagens cuidadosamente selecionadas e o aspecto físico do presente palpável e perene.
Analisando as revistas sob a perspectiva do conteúdo de marca podemos dizer que elas
não conseguiram se desvencilhar totalmente do viés publicitário ao retratarem em suas
páginas algumas matérias sobre os produtos das marcas patrocinadoras. Por outro lado,
algumas publicações se destacaram no mercado por seu apuro jornalístico, caso da revista
Goodyear, lançada em 1986, época em que a mídia tradicional passou a enfrentar severos
cortes de orçamento e de pessoal e as longas reportagens foram pouco a pouco
desaparecendo das publicações de massa.
Outro case de sucesso, porém vindo do exterior, e que inspirou grande parte dos
produtores de conteúdo ao redor do mundo é a Colors34, revista da marca italiana United
Colors of Benetton, e encerrada em 2014. Reconhecida por suas companhas publicitárias
irreverentes e provocativas, a marca conseguiu fazer o que nenhuma outra empresa fez
até hoje: transformar sua ousada visão de mundo em matérias de revistas e sem usar a
logomarca na publicação. Assuntos proibidos na maioria das empresas era comum ver
em suas capas temas como homossexualismo, racismo, Aids, religião, aborto, violência,
entre outros. Mesmo fora de circulação, a revista gerou frutos, como o Fabrica, um centro
de estudos de comunicação com a função de “unir a arte, a cultura, a pesquisa para
desenvolver novas ideias”35, voltado para jovens criativos de até 25 anos.
Com a popularização da internet e o crescimento do acesso à rede mundial por
dispositivos móveis, houve uma migração natural das revistas impressas para o virtual.
Algumas título transformaram-se em 100% digitais, como a revista Com Você, da Nestlé,
e a MOB, do segmento de vestuário. Outras possuem versões híbridas para ganhar
audiência sem precisar aumentar os custos com impressão e distribuição, como as revistas
Piccadilly, Gol, Latam, Faap e Fleury. Há ainda as marcas que apostam fortemente no
papel, como Droga Raia e a Drogasil, com as revistas Sorria e Todos, o supermercado
Zaffari, com a Estilo Zaffari, e a loja de roupas femininas Gregory, com a publicação de
mesmo nome.
Por outro lado, muitas deixaram de existir, caso das revistas da Volkswagen, Mitsubishi,
Pão de Açúcar, Pirelli, Audi, Itaú Personalité, Renner e tantas outras. É muito provável

34
As capas das principais edições da Colors estão disponíveis em www.colorsmagazine.com.

35
www.fabrica.it

141
que existam mais títulos fora de circulação do que revistas em produção na atualidade.
Existe ainda o caminho inverso trilhado pelas empresas nativas digitais, que buscam no
impresso uma forma de materializar suas atividades, caso do Facebook, Airbnb, Uber e
IBM.
A ocupação do ambiente virtual pelas empresas abriu espaço para as revistas
customizadas deixarem de promover uma conversa unilateral para adentrarem no campo
da interatividade e assim abriram-se a outras possibilidades de produção de conteúdo
adaptadas aos novos suportes tecnológicos (JENKINS, 2014; PULIZZI, 2016). A
transição das revistas da versão off-line para o online, no entanto, foi gradual, começando
pela simples réplica da versão impressa e posteriormente migrando para os aplicativos,
que possibilitavam entre outras facilidades a inserção de conteúdo dinâmico, como
vídeos, música e gráficos animados. O alto custo de produção de conteúdos adicionais
em conjunto com a queda mundial nas vendas de tablets36 e o amplo uso dos celulares
para acesso à internet acabaram inviabilizando o uso de aplicativos e o conteúdo migrou
para as páginas tradicionais da web.
Na busca por experiências mais significativas e interativas com os clientes e com a
possibilidade de veiculação de conteúdos longos a custos mais baixos, as marcas
passaram a divulgar suas mensagens em novos formatos inovadores utilizados
anteriormente apenas pela indústria da comunicação, como as webséries e os podcasts.
Segundo Hergesel (2016, p.1), a websérie é “uma narrativa midiática produzida,
prioritariamente, em linguagem audiovisual, de maneira serializada, cujos episódios
ficam disponíveis para acesso nos espaços on-line passíveis de circulação, especialmente
os sites de armazenamento de vídeos”. Batizados como branded webseries, os seriados
corporativos utilizam as técnicas do marketing de entretenimento para cativar a audiência
e fortalecer a imagem de marca (SEGARA-SAAVEDRA; TUR-VIÑES; ROMERO,
2017) ao entregar conteúdo atrativo e produzido com o mesmo rigor de produções
televisivas.
A Red Bull com seu conglomerado de mídia, composto por revista, TV, estúdio de
música, rádio, banco de imagens, entre outros, é uma das poucas marcas que sabe utilizar
o conteúdo de marca de forma orgânica, com o produto perfeitamente “encaixado” no
roteiro. Um exemplo é o minidocumentário Sonhos concretos – o skate encontra

36 Disponível em https://valor.globo.com/empresas/noticia/2019/06/25/venda-de-tablets-no-brasil-cai-11-
no-primeiro-trimestre-diz-idc.ghtml, acesso em 04 de julho de 2020.

142
Niemeyer, lançado em 2020, que transforma em realidade o desejo dos skatistas Pedro
Barros e Murilo Peres de andarem de skate nas icônicas obras do arquiteto, em cidades
como Rio Janeiro, Brasília, São Paulo e Belo Horizonte. Outras marcas como Philips,
Sempre Livre, Molico e Petrobras também investem no formato de webséries.
O podcast é outra mídia usada pelos meios de comunicação tradicionais que caiu no gosto
das empresas pela popularidade e facilidade de consumo. Segundo dados da Podcast Stats
Soudbites37, o Brasil ocupa a segunda posição no ranking dos países que mais consomem
podcasts no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Barbosa (2015, p. 4), define o
podcast como “um programa em áudio cujos episódios são disponibilizados para
download ou reprodução com determinada periodicidade, e podem ser escutados em
qualquer aparelho, a qualquer momento”. Sua capacidade de reter a atenção do ouvinte é
visto como um dos principais benefícios.
A Natura, por exemplo, usou a expertise do podcast Mamilos, produzido pelas jornalistas
Juliana Wallauer e Cris Bartis, para fazer sua minissérie Viva seu corpo e o Itaú utiliza a
mídia para conversar com seus investidores por meio do programa Investcast.
No variado cardápio de conteúdo de marca não há um ranking demonstrando se uma
mídia é mais eficiente do que a outra. Cabe a cada empresa analisar o canal que melhor
se adapta ao conteúdo a ser entregue, sendo que na maioria das vezes é possível utilizar
mais de uma plataforma e combinar novos e velhos formatos de mídia, como demonstra
o case da marca Granado, apresentado a seguir.

O caso Granado
Não vamos proceder aqui a uma análise a partir de parâmetros metodológicos rígidos,
mas apenas a título de exemplificação dos conceitos que acima buscamos identificar e
separar por uso e vocação, um projeto que merece a atenção de estrategistas de marca é o
da Granado. A empresa que nasceu no Rio de Janeiro, em 1870 e passou mais de 90 anos
reconhecida como fabricante de um único produto, um talco aromático, experimentou na
última década uma virada substancial. A botica cresceu, internacionalizou-se, comprou
marcas, formou portfólio, abriu centenas de pontos de vendas pelo país. A ligação com o
pensamento que aqui queremos esmiuçar está nos eventos preparados para o aniversário
de 150 anos da Granado, comemorados em janeiro de 2020, um projeto que conjuga

37
Disponível em https://bit.ly/3e1ywUS, acesso em 04 de julho de 2020.

143
branded content e brand entertainment com as práticas de storytelling, compondo um
discurso coeso de múltiplas articulações.
Duas historiadoras foram convocadas a resgatar a história imagética da Granado. Uma
restauradora cuidou de revitalizar cada embalagem e material para que pudessem ser
reproduzidos. Um jornalista investigou a história da empresa criando pontos de contato
entre a trajetória da marca e o desenvolvimento econômico e artístico da cidade do Rio
de Janeiro, de modo que ambas se fundissem em um único enredo. Junto com os
elementos visuais antigos e com o trabalho de atualização gráfica, confiado à uma equipe
de designers, costurou-se uma narrativa nova. O conteúdo recheia as páginas de um livro
de fine-art, à venda nas lojas e franquias da Granado. Impressos e embalagens
revitalizados formaram um acervo raro que deu origem à exposição “A história da botica
mais tradicional do Brasil”, prevista para ficar quatro meses no Museu Histórico Nacional
do Rio de Janeiro. Fragmentos dessa história e do seu processo de reconstituição,
incluindo pesquisas e entrevistas alimentaram o site da marca e também as mídias sociais.
O making of virou um minidocumentário, disponível no brand channel.
A ação não ficou restrita ao museu ou ao livro, mas ganhou vida nas centenas de
fotografias dos visitantes que alimentaram suas mídias pessoais, acrescentando mais
predicados e personagens ao projeto, conforme o conceito de convergência proposto por
Jenkins (2009). Falamos aqui de uma ação que integrou a velha mídia (livro impresso),
com estratégias experienciais (exposição), conteúdos para internet (filmes de making of),
suvenires com a temática do evento (canecas, molesquines e bolsas) disponíveis na loja
virtual, recriação de embalagens de produtos (ressignificação de portfólio) e forte
presença em mídias sociais.
A narrativa transmídia não é moda ou mania; narrativa transmídia é uma
estratégia de comunicação; essa estratégia organiza uma história,
dividindo-a em partes, ou até expandindo-a em outras histórias, e as
oferece ao público por meio das plataformas que melhor possam
expressá-las, ainda que de modo independente, mas garantindo o
máximo de coerência entre elas e, sempre que possível, fazendo o
melhor uso da cultura colaborativa e da participação do seu público
(GOSCIOLA, 2015, p. 1132).
Agora penetrando um pouco mais nas camadas do conteúdo que a ação como um todo
propõe, os apelos de ordem emocional são os primeiros a buscar identificação com a
audiência. Ao revisitar a própria história, a marca divide o protagonismo com o Rio de
Janeiro. É a silhueta do Cristo Redentor e não a caixa de sabonetes que estampa a capa
da publicação. Claro que não a cidade da violência, da criminalidade e dos desmandos,

144
mas a cidade do cartão postal, o charme do carioquismo, o Rio da zona sul, celebrando
um certo jeito de ser e viver. A associação não cria pontos de conexão apenas com os
cariocas, mas desencadeia um processo de semiose em que ganha sentidos muito próprios
para boa parte dos brasileiros. É o estereótipo do que temos de mais belo, das linhas que
inspiraram Niemeyer e tantos poetas. A marca atua como mediadora do processo de
identificação do Brasil com os brasileiros ao mesmo tempo em que se apoia nos
estereótipos da brasilidade bastante convenientes para uma marca com pretensões
internacionais.

Considerações finais
O conteúdo de marca chega para quebrar o paradigma entre as velhas e novas mídias,
entre a briga do impresso com o digital. O que importa no extenso vale da comunicação
é a mensagem que se leva ao consumidor e não a sua plataforma de divulgação. Entende-
se, portanto, o branded content como uma estratégia de gestão de marca que em sua
materialidade poderia ser definido como um grande arcabouço, um repositório por onde
trafegam várias histórias que se entrelaçam e se amalgamam à imagem de uma marca,
num processo orgânico de aderência e significação. E na medida em que ganham novos
desdobramentos e possibilidades de interação sugerem ao leitor/seguidor diversos
percursos possíveis para que ele participe da construção da narrativa.
Porém, para obter os devidos resultados precisa ser bem elaborado, deixar o discurso
vendedor e a exposição excessiva das marcas para entregar conhecimento e compreender
que o retorno não é imediato. Precisa de precisa de perenidade para comprovar sua
maturação e que não apenas mais um modismo de marca. Os exemplos apresentados neste
recorte demonstram que o jornalismo de marca está mais vivo do que nunca e que ainda
apresenta inúmeras possibilidade de criação e cocriação, inclusive com os próprios
consumidores.

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julho de 2020.

147
As múltiplas ausências da mulher no Jornalismo brasileiro

Wilson da Costas Bueno

Uma leitura, ainda que rápida, dos principais jornais brasileiros, mesmo se considerarmos
um período restrito (por exemplo duas semanas de um determinado mês), evidencia com
facilidade a presença crescente de uma temática associada ao universo feminino e à
situação da mulher no mercado e na sociedade. Em sua maioria, ela assume um tom
negativo que denuncia preconceito, desigualdade de oportunidades e tratamento em
relação ao homem, o incremento da violência ou a existência de condições nada
favoráveis no que diz respeito à saúde, educação ou segurança.
Tomemos um exemplo: no período entre 14 a 29 de outubro de 2017, apenas tendo como
referência os jornais O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e O Globo, encontramos
nada menos do que nove grandes reportagens que ilustram este cenário.
No dia 14 de outubro, em O Estado de S. Paulo, matéria intitulada “Os órfãos do
feminicídio” revela e analisa dados de um estudo que indica que, “na maioria das vezes,
mães assassinadas deixam dois ou três filhos” (PEREIRA, 2017, p.A10). No mesmo dia,
na Folha de S. Paulo, reportagem revela que “mão de obra feminina é maioria nas oficinas
de costura onde imigrantes são presas para o trabalho análogo à escravidão” (NOMURA,
2017, p. B4).
No dia 17 de outubro, o Globo e o Valor Econômico também apresentam fatos e
estatísticas que se reportam à temática geral que trata das questões de gênero. O Globo
traz matéria com o título “No Brasil, quase metade dos bebês não é planejada” e
acrescenta: “levantamento destaca como gravidez precoce se relaciona com desigualdade
social e de gênero” (PAINS; RODRÍGUEZ, 2017, p. 23) e o Valor abre espaço para
alguns indicadores de exclusão e desigualdade no país. O lead da matéria, que tem como
título “Acesso desigual à saúde reduz desenvolvimento econômico”, afirma: “No Brasil,
um em cada cinco mães é filho de mãe adolescente, com 10 a 19 anos. Sete em cada dez
mães nessa faixa etária são afrodescendentes e aproximadamente metade mora nas
regiões Norte e Nordeste”. (CONCEIÇÃO, 2017, p. A4).
No dia 23 de outubro, com a manchete “Riqueza concentrada” e o subtítulo
“Desigualdade de gênero”, O Globo relata que o “patrimônio de mulheres que declaram
IR corresponde a 54% dos bens acumulados pelos homens”. (ALMEIDA; ZARUR, 2017,
p.29). No dia 23 de outubro, novamente O Globo destaca: “Aborto: todo mundo quer

148
influenciar debate no STF” (SOUZA, 2017, p.33) e, também no dia 28 de outubro,
reproduz reportagem do Washington Post sobre o assédio sexual nos EUA, lembrando
que a “enxurrada de denúncias nos EUA propicia um momento especial de reflexão pra
os homens – e sobre comportamentos que não mais podemos ignorar”. (HESSE; ZAK,
2017, p.33).
A Folha de 29 de outubro revela, com o título “4 de cada 10 startups brasileiras não têm
mulheres na equipe”, que “profissionais de empresas iniciantes afirmam sofrer
discriminação na hora de negociar com investidores”. (OLIVEIRA, 2017, p.A26).
A última reportagem coletada neste período, e publicada pelo O Globo no dia 21 de
outubro, traz informações bastante atuais sobre o interesse da temática sobre diversidade
por brasileiros, apresentando uma pesquisa do Google BrandLab sobre a busca de
determinados temas na Internet, com destaque ao que denomina de “feminismo”.
(BARROS, 2017). A matéria explica:
As buscas nos primeiros cinco meses de 2017 por feminismo no
Google, por exemplo, já acumulam o dobro do volume do que no ano
de 2012 como um todo. Ainda em relação a 2012, a procura pelo termo
“empoderamento feminino” foi quatro vezes menos em relação a este
ano. Além disso, a busca pela expressão “igualdade de gênero” subiu
50% entre agosto de 2016 e o mesmo mês em 2017. (p.26)
Segundo a gerente de Insights da empresa, “o que vemos em 2017 é o feminismo
alcançando volumes de busca equivalente ao do racismo, que historicamente é o tema
mais discutido no Brasil quando se fala em diversidade.” (BARROS, 2017, p.26). A
matéria traz ainda uma informação adicional: as buscas sobre o tema aumentaram mais
de 200% nos últimos dois anos.
É de fato inquestionável o interesse despertado pelo tema e ele não se limita aos jornais
impressos, mas impacta as redes e mídias sociais, o universo digital de maneira geral
(blogs e portais), a mídia tradicional como um todo (em particular o rádio e a TV) e
mesmo o estudo e a pesquisa nas universidades brasileiras. Uma consulta ao Diretório
dos Grupos de Pesquisa do CNPq, com as expressões “questões de gênero” e
“feminismo”, retorna, respectivamente 38 e 157 grupos, indicando que há núcleos de
estudo e de investigação focados nesta temática, a maioria dos quais formado há poucos
anos, o que significa uma preocupação recente, mas já relevante.
É preciso reconhecer, de imediato, que existe uma distinção importante entre os estudos
feministas, patrocinados pelos movimentos feministas bastante atuantes nos séculos XIX
e XX, e os estudos mais recentes que tratam de forma mais abrangente as questões de
gênero. Martinez et al (2016) concluem que nos estudos contemporâneos, em que se

149
contemplam as questões de gênero, fica patente que “o feminino só pode ser
compreendido em relação, não apenas com o masculino, mas interseccionado a uma
ampla gama de diferenças: de gênero, classe, etnias, faixas etárias etc.” É possível
perceber, a partir da análise dos três veículos da grande imprensa que compõem o corpus
da pesquisa que inspirou este artigo, que a mídia ainda contempla a mulher sob uma
perspectiva reducionista, quase sempre analisando o seu papel e a sua condição em
relação ao homem. Embora não estejamos assumindo esta visão restrita do ponto de vista
teórico, optamos, metodologicamente, por estabelecer comparações entre a condição da
mulher jornalista e a do homem jornalista num território específico da mídia: as páginas
de opinião. Isso não significa ignorar a amplitude necessária dos estudos de gênero, mas
ter como foco uma situação bastante singular: a mulher, embora com presença expressiva
no mercado de trabalho jornalístico como um todo, ainda sofre limitações em relação ao
seu papel como autora, o que pode ser mais facilmente percebida nas páginas de opinião.
Em certo sentido, esse nosso olhar reproduz uma constatação mais abrangente em relação
à condição da mulher no mercado de trabalho de forma geral: embora esteja cada mais
presente no mundo do trabalho, a mulher, comparativamente ao homem, não ocupa,
proporcionalmente, com a mesma intensidade, os cargos de chefia nas empresas
brasileiras, ainda que este quadro tenda a se modificar ao longo do tempo.
De maneira geral, partimos de um pressuposto básico: a mulher tem presença inexpressiva
como protagonista nas páginas de opinião e a temática associada a ela está quase invisível
neste espaço importante da grande imprensa. Ao mesmo tempo, admitimos que, quando
ela está presente e se manifesta, incorpora novos olhares, novas temáticas à produção
jornalística, o que, do nosso ponto de vista, seria altamente desejável porque ampliaria e
qualificaria a cobertura da imprensa brasileira.

Mídia, mulher e páginas de opinião


A literatura brasileira contempla um número também significativo de publicações sobre
a mulher na contemporaneidade, feminismo e mesmo sobre a mulher no mercado de
trabalho e no jornalismo (livros, dissertações e teses, artigos em revistas acadêmico-
científicas) . Há também um número crescente de trabalhos sobre essa problemática em
congressos, sejam eles de caráter científico, sejam eles profissionais, inclusive nos
promovidos por entidades, movimentos sociais, ou Ongs que têm como foco a defesa dos
direitos da mulher e atentos às suas reivindicações. Pode-se citar com destaque pelo
menos dois periódicos com atenção especial às questões de gênero. Uma delas, a “Revista

150
Estudos Feministas”, criada há 25 anos, que circula no Brasil e no exterior, e que publica
artigos, ensaios e resenhas, em português, inglês e espanhol, sobre gênero e feminismos.
Inicialmente editada na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, está desde 1999 vinculada diretamente ao Centro de Filosofia e Ciências
Humanas e ao Centro de Comunicação e Expressão da Universidade Federal de Santa
Catarina. Ela pode ser acessada pelo link:
https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/index. Outra publicação com perfil editorial
similar é os “Cadernos Pagu”, editado pela Unicamp, e publicado há mais de 25 anos,
com regular e significativa contribuição para estudos, pesquisas e reflexões associados a
esta temática.
Mesmo quando restringimos a consulta à bibliografia existente sobre o tema, centrando
nosso foco na perspectiva da mulher na comunicação e especificamente no jornalismo,
objeto de nossa pesquisa, as referências já são generosas. Embora a limitação de espaço
não nos permita apontar todos os principais trabalhos sobre esta temática, podemos
resgatar aqui, dentro do contexto em que se insere este artigo, inúmeras contribuições.
Santos (2014) reporta-se a relatório sobre o “Perfil do jornalista brasileiro”, um trabalho
realizado pelo Núcleo de Estudos sobre Transformações no Mundo do Trabalho, da
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em parceria com a Federação Nacional
dos Jornalistas ( Fenaj), a Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo
(SBPJor) e o FNPJ- Fórum Nacional de Professores de Jornalismo em 2012, que concluiu
pelo que a autora denomina de “feminização das redações”, visto que as mulheres
representavam quase 64% dos profissionais de imprensa, atuando em sua maioria (55%)
na mídia.
Rocha (2004) cita dados de 1998 do Ministério da Educação que evidenciam a supremacia
da mulher, já neste ano, no vestibular dos cursos de graduação em jornalismo no Brasil
(14.969 mulheres contra 10.015 homens), o que correspondia, segundo a pesquisadora,
“a quase 67% do mercado universitário nacional em jornalismo”. (p.102).
Santos & Temer (2016), ao se referirem às subjetividades das jornalistas, admitem que “a
consciência das relações sociais contraditórias” se constitui numa “marca do feminino
(...) e que pode influenciar a forma como abordam temas, na diversidade de fontes,
remetendo à possibilidade de uma cobertura com outro olhar”. E acrescentam:
Designadas a coberturas especiais, mais factuais e complexas, essas
subjetividades podem aflorar ainda mais. As mulheres tornam-se mais
sensíveis à alteridade, tentam aproximar-se, entender e retratar com
vigor outras mulheres e/ou outros grupos excluídos. (...) As mulheres

151
tendem a ser mais solidárias e a valorizar mais as oportunidades
profissionais, entendendo que elas são uma conquista mais difícil. Da
mesma forma, ainda conservam a percepção do jornalismo como
elemento que trabalha a favor da justiça social, por isso a diversidade é
essencial. Assumindo o papel da pseudo-heroína (na verdade, a
trabalhadora duplamente explorada) embrenha-se em várias jornadas.
Ainda assim, ou talvez por tudo isso (e aí se inclui a fragilidade perante
o emprego) a jornalista parece mais sensível à ética profissional. (p.55)
Jorge et al (2014) concluíram, em sua pesquisa junto a mulheres que ocupam cargos de
direção nos jornais, que “e o trabalho jornalístico realizado por mulheres em cargos de
chefia pode influenciar, mesmo que de maneira sutil, os critérios de seleção das notícias
e o foco dado às matérias”, ainda que admitam que se trata, no entanto, de “uma situação
inconsciente e pontual, dependendo da ocasião, da pauta e dos demais elementos
envolvidos, como pressões editoriais, industriais e até comerciais.” (p.14)
Em todas estas contribuições, é fundamental ressaltar o fato de que os seus autores (na
maioria esmagadora dos casos, mulheres) apontam para uma característica bastante
singular, diferenciada, na produção, seleção de notícias ou na atuação profissional de
maneira geral, fruto das condições de trabalho ou de inserção da mulher na sociedade.
Os resultados não concluem ou sugerem uma qualidade melhor do trabalho jornalístico
realizado pelas mulheres em comparação ao dos homens, mas apontam para o fato de
serem diferentes. Essa constatação inspirou-nos a fazer a pesquisa sobre a presença da
mulher como protagonista nas páginas de opinião dos grandes jornais brasileiros. Como
poderemos ver a seguir, há uma diferença sensível entre a participação dos jornalistas e
das jornalistas, como sujeitos de fala, nestes espaços prestigiados de opinião na imprensa,
o que se reflete também para as mulheres leitoras que se manifestam nas colunas dos
leitores, em número significativamente menor do que os leitores. A temática que está
presente nestas falas também encerra diferenças importantes, quando se considera o
gênero dos que falam, o que reforça a tese de que há um olhar particular, diferente,
condicionado socialmente, nas opiniões das jornalistas e das leitoras em relação aos
jornalistas e aos leitores.
As páginas de opinião constituem território privilegiado no jornalismo brasileiro e
incorporam, dentre outros gêneros jornalísticos, os editoriais, os artigos, as charges ou
caricaturas e, quase sempre, um espaço reservado à reprodução resumida dos e-mails ou
cartas dos leitores encaminhados à redação.

152
Os editoriais, em geral, são publicados sem autoria explícita e expressam a opinião do
veículo, reportando-se a temas de atualidade e que estão presentes, no caso dos jornais
impressos, em reportagens ou notícias inseridas na mesma edição.
Os artigos refletem a opinião de jornalistas/colunistas do veículo (alguns com
participação permanente e outros de forma episódica) e também de fontes externas,
abordando temas pautados previamente para debate ou de livre escolha individual dos
autores.
As charges ou caricaturas são tradicionais no jornalismo brasileiro e se constituem em
ilustrações que incorporam um tom crítico, muitas vezes humorístico, com respeito a
personagens e fatos contemporâneos. Ao longo do tempo, no entanto, têm perdido espaço
nas páginas de opinião e hoje já não frequentam a maioria delas.
Os e-mails ou cartas dos leitores trazem, resumidamente, a opinião da audiência sobre
fatos de atualidade, já noticiados pelos veículos em edições anteriores. É comum que os
leitores se refiram, em seus comentários, aos editoriais e aos artigos já publicados pelo
veículo, expressando em relação a eles sua concordância ou divergência.
A literatura brasileira que contempla as páginas de opinião e aspectos específicos dos
diversos gêneros jornalísticos que as integram não é generosa, mas é possível destacar
algumas contribuições relevantes. Francisco Alves Filho (2006), por exemplo, analisou
a autoria destes gêneros, chegando a propor, esquematicamente, comparações entre eles,
como indicado no Quadro 1 a seguir, mas, na prática, focou o seu estudo especificamente
nos editoriais:

Quadro 1 – Tipologia de autoria no agrupamento argumentar da esfera jornalística

Gêneros jornalísticos Tipo de autoria Instância que assume Instância interna ou


do agrupamento a autoria externa ao jornal?
argumentar

Editorial Institucional Empresa jornalística Interna

Coluna de opinião Sócio-profissional Colunista (jornalista) Interna


assinada

Artigo de opinião Sócio-profissional Articulista (figura da Externa


sociedade)

Cartas de leitor Individual privada Leitor Externa

Fonte: Francisco Filho (2006, p.6)

153
É fundamental observar que os jornais têm adotado, em suas páginas de opinião,
notadamente no que diz respeito aos articulistas formatos particulares, muitas vezes
mesclando colunistas que integram o seu corpo editorial com membros externos,
convidados, por critérios de relevância ou proximidade com o veículo, para uma
contribuição regular. Há veículos, como a Folha de S. Paulo, que mantêm uma seção
própria para estes articulistas externos ao veículo e que muitas vezes são convidados para
debater um tema proposto pela redação do jornal, quase sempre, expressando opiniões
divergentes, o que contribui para enriquecer a discussão.
Congyu Huang (2012) estabeleceu a comparação entre as páginas de opinião de um jornal
brasileiro (Zero Hora) e um jornal chinês (Diário Yangcheng), com o objetivo de
relacionar a teoria de agenda-setting com o processo de produção destes espaços
editoriais.
Fernando Azevedo e Vera Chaia (2008) se valeram dos editoriais para a análise da
presença do Senado em jornais paulistas, concluindo que os comentários sobre membros
específicos desta Casa legislativa, em geral negativos, repercutiam sobre a imagem do
Senado como um todo. Camila Mont’ Alverne e Francisco Marques (2015) discutiram as
características do editorial como gênero jornalístico, evidenciando a sua função e
influência na formação da opinião pública.
Solange Costa (2005) examinou as cartas de leitores de um jornal carioca (O Dia),
considerando-as como instrumento importante de interação entre os veículos e sua
audiência e destacando sua relevância como porta-voz de queixa e denúncia.
Jacira Melo (1997), em relatório parcial da sua pesquisa sobre Aborto e mídia, examinou
o posicionamento de determinados veículos brasileiros a partir de editoriais, colunas,
notícias e reportagens e dos leitores sobre a questão do aborto, buscando aferir o
posicionamento da imprensa e da audiência a este respeito.
Odete Boff e outros (2009) descreveram a estrutura de um artigo de opinião, concluindo
pela sua importância para o ensino da língua materna, considerando a sua capacidade de
interação e argumentação.

A pesquisa: hipóteses e metodologia


Este artigo, que busca examinar a presença da mulher como protagonista efetiva das
páginas de opinião em seus distintos gêneros (como articulista e como autora de e-mails
ou cartas dos leitores) e da temática associada a ela, inclusive nos editoriais, concentrou-
se na análise dos espaços de opinião em três importantes veículos da grande imprensa:

154
Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e O Globo, limitando-se às suas versões
impressas. Constitui-se, portanto, em uma pesquisa que privilegia basicamente a análise
temática e de conteúdo, na medida em que elege como principal objetivo identificar,
quantitativa e qualitativamente, a presença da mulher e do homem enquanto autores de
textos jornalísticos opinativos (percentualmente quanto cada um produz e sobre quais
temas eles se manifestam).
A pesquisa levou em conta 14 dias do período de 18 de setembro a 12 de outubro de 2017
e construiu o universo dos jornais a partir da técnica da “semana construída”, ou seja,
foram consideradas duas edições de cada um dos dias da semana (domingo a sábado),
admitindo que os diferentes dias da semana definem (ou podem definir) instâncias
singulares da dinâmica de produção jornalística. A leitura atenta deste farto material
consumiu dezenas de horas de trabalho, mas foi essencial para que se pudesse identificar,
com precisão, as categorias de análise e também para subsidiar as hipóteses de estudo. A
análise não contemplou as charges e as caricaturas porque elas só estão presentes na Folha
de S. Paulo, e abrangeu, portanto, apenas os editoriais, os artigos de opinião e as cartas/e-
mails dos leitores.
O trabalho teve início com uma ampla revisão bibliográfica sobre a presença da mulher
no mercado de trabalho jornalístico, sobre a pauta feminina (ou feminista) que vem sendo
recorrentemente debatida pelas mulheres e pela sociedade como um todo, e sobre as
páginas de opinião da grande imprensa. Foram propostas três hipóteses, estritamente
articuladas, que contemplam a expressividade da presença da mulher nestes espaços (em
que proporção, em relação ao homem, ela o ocupa) e também as especificidades desta
presença (como sua atuação como profissional de imprensa impacta a cobertura
jornalística).
A primeira hipótese declara que, de maneira geral, os temas que dizem respeito à agenda
feminina estão praticamente ausentes das páginas de opinião, independentemente do
gênero jornalístico considerado (editorial, artigo e cartas/e-mails dos leitores). Para
validá-la, levantamos os temas destes gêneros nos jornais analisados, buscando identificar
quantos e quais deles se reportam ao debate geralmente associado à condição feminina na
contemporaneidade.
A segunda hipótese enuncia a presença reduzida da mulher nas páginas de opinião, ou
seja, ela ocupa papel secundário, quase residual, como autora de artigos e de cartas/e-
mails dos leitores. Da mesma forma, buscamos avaliar a presença da mulher enquanto
produtora de informações jornalísticas e, também, comprovar se ela, como autora, se

155
reporta aos temas considerados “feministas” (ainda que, como explicitamos, sob a ótica
reducionista da imprensa em relação às questões de gênero).
A terceira hipótese relaciona as duas primeiras, buscando evidenciar que a ausência da
mulher enquanto protagonista nas páginas de opinião contribui para que os temas de seu
interesse não estejam colocados para apreciação e debate e que, quando ela se manifesta,
esses temas comparecem com maior destaque na mídia.
De imediato, é preciso relatar as características das páginas de opinião destes periódicos
porque eles apresentam semelhanças e divergências, seja no que diz respeito à sua
localização nos jornais, ao perfil dos autores, e aos formatos utilizados pelos veículos
para a construção de suas páginas de opinião.
A Folha de S. Paulo traz suas páginas de opinião já no início do primeiro caderno (páginas
2 e 3) e as distribui da seguinte forma. O lado esquerdo da página 2 está reservado sempre
para dois editoriais, a parte central para opinião de seus articulistas da redação
(geralmente três e permanentes) e a coluna à direita para um articulista que pode ser ou
não vinculado à redação do jornal. A parte superior da página 3, à direita, inclui uma
charge ou caricatura produzida por autores diversos (Jaguar, Renato Machado, João
Montanaro). O restante da página 3 é ocupado em boa parte pela seção “Tendências e
debates” que inclui dois articulistas externos e que tanto podem trazer sua contribuição
individual abordando temas de sua escolha ou opinar sobre um tema proposto pela
redação. Nesse caso, a Folha de S. Paulo tem como norma trazer duas opiniões não
coincidentes sobre um mesmo tema. No período analisado, dos 14 dias que incluíram o
universo de análise, a seção “Tendências e Debates” apenas um dia foi dedicado ao debate
de um tema proposto pela redação e os demais a temas livres, de escolha dos articulistas.
Além disso, a página 3 traz à direita o “Painel do Leitor” com os e-mails e cartas
encaminhados pelos leitores à redação.
O Estado de S. Paulo, de maneira geral, tem uma proposta para suas páginas de opinião
semelhante à Folha de S. Paulo. Elas também estão localizadas nas primeiras páginas do
primeiro caderno (páginas 2 e 3), mas com um formato e distribuição dos gêneros de
forma distinta. O Estadão traz na página 2 dois artigos sob a responsabilidade de
articulistas que normalmente contribuem para o jornal e que têm perfil diverso. Na parte
inferior da página 2, está o “Fórum dos Leitores”, que se estende para a página 3. Os
editoriais, sempre em número de três, ocupam toda a página 3, excetuada a sua parte
inferior que, como já mencionado, está reservada para a continuação do “Fórum dos
Leitores” e que também inclui um outro espaço específico para a sua audiência, intitulado

156
“Você no Estadão.com.br”. Nele, o jornal publica três opiniões de leitores sobre um tema
específico, resgatando a interação com o seu público na sua versão on-line.
O jornal O Globo procede de maneira distinta dos jornais paulistas. As páginas de opinião,
em número de três (e não duas como nos jornais paulistas), não se localizam logo no
início da edição, mas em geral em páginas internas, quase ao final do caderno (geralmente
começam na página 17). A primeira destas três páginas intitula-se “Dos leitores” e traz a
síntese de seus comentários ou opiniões sobre temas diversos, quase sempre pautados
pelas notícias, reportagens ou mesmo as páginas de opinião do jornal. As duas outras
páginas ficam reservadas para os editoriais e os artigos, com a seguinte distribuição: a
segunda página (que fica no verso da página “Dos leitores”) tem como título “Opinião” e
traz, na parte superior, dois editoriais e abaixo um grande artigo. Na terceira página de
opinião, o jornal traz mais quatro artigos de autores diversos.
Há uma característica importante para os articulistas de O Globo: alguns não são
brasileiros. escreveram originalmente para veículos do exterior e tiveram seus artigos
traduzidos para a língua portuguesa. Como na Folha de S. Paulo, alguns articulistas são
permanentes e outros não, representando setores diversos da sociedade, mas, quase
sempre, recrutados na área empresarial ou nos poderes executivo, legislativo e judiciário.
Há também uma singularidade no que diz respeito aos editoriais de O Globo. Em algumas
oportunidades, o jornal abre espaço para uma outra opinião que contrapõe a opinião do
veículo. Nesse caso, ele divide o espaço editorial em “Nossa opinião” e “Outra opinião”,
promovendo um debate sobre um tema por ele proposto. No período analisado, por duas
vezes O Globo utilizou esta alternativa.

Os resultados e análise
A apresentação dos resultados e a discussão sobre as hipóteses levantadas estão a seguir
descritas a partir de cada gênero jornalístico (editorial artigos e e-mails/cartas dos leitores)
que integra as páginas de opinião.
No período, os três jornais publicaram 84 editoriais distribuídos da seguinte forma: 28 na
Folha de S. Paulo, 42 no Estadão e 28 em O Globo. De maneira geral, a maioria dos
editoriais reportou-se a temas nacionais (a sua maioria sobre política e economia, nesta
ordem), notando-se apenas maior presença de temas da cidade ou do Estado no caso de
O Globo, certamente em função das condições dramáticas daquele Estado, bastante
penalizado pela corrupção que deteriorou a sua condição financeira e pelo
recrudescimento da violência. A presença das Forças Armadas para conter a escalada de

157
violência, com atenção principal sobretudo à Rocinha, local de embates violentos entre
as facções criminosas e o sistema de segurança oficial (estadual ou federal) repercutiu
nos editoriais. Embora com menor frequência, os editoriais abrigaram temas
internacionais, em especial a tensão entre EUA x Coréia do Norte, a eleição na Alemanha
e o referendo da independência da Catalunha, que tiveram algum destaque no conjunto
global de editoriais.
A hipótese primeira, que contempla a presença inexpressiva da agenda feminina nos
editoriais, ficou absolutamente comprovada: apenas 9 editoriais trataram desta temática,
embora fatos relativos a ela estivessem presentes no noticiário, como, por exemplo, o
assédio sexual no transporte urbano, notadamente em São Paulo, com casos recorrentes e
enorme repercussão junto à opinião pública, além de casos escandalosos envolvendo
diretores de cinema no exterior, reportagens sobre direitos humanos, desigualdade social,
discriminação das mulheres, saúde e educação de maneira geral, dentre outros. Dos nove
editoriais, aqui considerados como associados a uma temática feminina (ainda que não
exclusivos), dois foram publicados pelo Estadão, três pela Folha e quatro pelo O Globo,
e eles representam, somados, apenas 10,71% do total dos editoriais existentes.
As temáticas abordadas no editorial e que, de forma direta ou indireta, preenchem a pauta
feminina foram violência no Rio de Janeiro (seis editoriais) e saúde (três editoriais), mas
é possível reconhecer que, pela abordagem realizada nesses casos, não poderiam ser
considerados como exclusivamente associados às mulheres.
A Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e O Globo publicaram, no período 182 artigos
e a mulher apareceu como autora em apenas 18 oportunidades, o que representa
inexpressivos 9,89% do total. Três artigos foram publicados no Estadão, nove na Folha
e outros seis em O Globo. Os temas por elas abordados, além disso, não estiveram,
necessariamente, inseridos na agenda feminina, evidenciando que a maioria das mulheres
se reporta, quando elabora os seus artigos de opinião, aos temas gerais, especialmente de
economia e de política, certamente influenciada pelo debate nacional a este respeito. Dos
18 artigos elaborados pelas mulheres, dez se reportaram a temas da agenda feminina
(55,55% do total), porcentagem maior em O Globo (66,66% do total) do que na Folha
(55,55%) e no Estadão (33,33%). O perfil das mulheres articulistas que trataram de temas
bastante afeitos à mulher é ilustrativo: em O Globo, foram duas profissionais ligadas à
Educação e duas ligadas à Literatura; na Folha, foram uma jornalista, uma lésbica que
atua como colunista em revistas, uma psicanalista, uma dirigente de um movimento pela

158
valorização da Educação, além de uma advogada; já no Estadão, a profissional que tratou
de tema sobretudo feminino (“O que é estupro?”) é uma advogada.
Da mesma forma, é sintomático perceber que a mulher participa muito pouco como autora
de e-mails e cartas dos leitores e que essa presença representa apenas 11,22 do total de
opiniões/comentários nos três veículos analisados. Das 589 cartas/e-mails publicados,
apenas 72 foram escritos e encaminhados pelas mulheres. Não há diferença significativa
se considerarmos os jornais individualmente: essa porcentagem foi de 11,55% para o
Estadão, 13,01% para a Folha e 12,21% para O Globo.
A temática destas cartas ou e-mails não está vinculada, em sua maioria, a questões
associadas à mulher: essa condição só é atendida por 31,13% das cartas/e-mails no
Estadão, 36,38% na Folha e 44,44% em O Globo e, no total, por 40,22% do total das
cartas/e-mails publicados pelas mulheres nos três jornais. Os temas predominantes nesse
caso foram, pela ordem: Violência, Educação e Saúde, casamento gay e condições do
transporte urbano, sobretudo no que diz respeito aos riscos para os idosos.
Esses dados demonstram que a segunda hipótese também se confirmou porque a presença
da mulher como protagonista nos artigos de opinião se mostrou secundária, o que
evidencia um obstáculo importante a ser superado na grande imprensa. Se a mulher está
ausente do espaço de opinião, é de se esperar que os temas de seu interesse também
fiquem ocultos, comprometendo o debate das questões de gênero em nosso país.
A terceira hipótese merece uma análise mais acurada porque a pouca presença da mulher
nos espaços de opinião ainda não nos autoriza a concluir que, se ela fosse maior, a agenda
ou pauta feminina teria sido mais ampla e mais bem colocada. O fato de muitas mulheres,
entre as que estiveram presentes nas páginas de opinião dos três jornais sob análise, não
se reportarem à sua temática não invalida, no entanto, uma conclusão importante: as
mulheres, em porcentagem significativamente maior do que os homens, trouxeram à baila
questões relevantes da agenda feminina.
Uma comparação entre a porcentagem de temas femininos que frequentaram os artigos e
os e-mails/cartas das mulheres e a que caracterizou a manifestação dos homens escancara
esta diferença. Senão vejamos: 1) Nos artigos escritos pelas mulheres, os temas femininos
representaram, como vimos anteriormente, 55,55% dos casos. Para os homens que
escreveram artigos (164 no total), os temas que integram, majoritariamente, a pauta
feminina constituíram apenas 4,26% dos casos; 2) Para as cartas/e-mails dos leitores, das
72 escritas pelas mulheres, 40,22% do total abordavam a sua agenda de interesse ou
reivindicações, enquanto para os homens a temática predominantemente feminina só

159
compareceu em 12,57% do total ( das 517 cartas ou e-mails e apenas 65 tinham como
foco em temas prioritários ou normalmente associados ao universo das mulheres).

Considerações finais
A pesquisa chegou a conclusões importantes e as hipóteses que a balizaram trouxeram
dados relevantes para o debate e a reflexão sobre a cobertura das questões de gênero no
jornalismo brasileiro.
Embora o número de mulheres presentes nas redações, portanto que integram o mercado
jornalístico, já represente a maioria, elas ainda não ocuparam, qualitativamente, espaços
privilegiados da cobertura e da atividade jornalística de maneira geral, como, por
exemplo, o comando das redações. Esse é o caso das páginas de opinião, onde as
mulheres, particularmente como produtoras de artigos, representam, nos três maiores
veículos de prestígio da chamada grande imprensa - Folha, Estadão e O Globo, menos de
10% do total (precisamente, 9,89%).
Se levarmos em conta a mulher como leitora ativa, aquela que escreve e encaminha cartas
ou e-mails para as redações, portanto presentes no Fórum/Coluna dos Leitores, a situação
não é mais alentadora: apenas 12,57% destes espaços têm a mulher como produtora, ou
seja, ela participa muito pouco do processo de interação com os jornais e as pautas de seu
interesse não estão, portanto, adequadamente colocadas.
Se acreditarmos que a interação dos leitores contribui para o processo de seleção de
notícias em um veículo, ou seja, influencia a pauta dos jornais, chegaremos à conclusão
de que essa reduzida participação tem a ver com os temas tratados pela grande imprensa.
A comparação entre o protagonismo de mulheres e homens na elaboração de
comentários/opiniões, seja por intermédio de artigo, seja pelas manifestações a partir de
e-mails ou cartas, evidencia claramente que os temas estão, de forma direta, associados
ao gênero de quem os produz. Os resultados da pesquisa nos autorizam afirmar que, se
houver maior participação das mulheres, como colunistas ou leitoras que produzem textos
opinativos (artigos ou cartas e e-mails), certamente a temática em pauta será alterada e
passará a incluir questões de interesse da “alma” feminina.
A pesquisa também nos convida a analisar, em outra oportunidade, essas circunstâncias:
a) por que razão, os veículos não incrementam a participação das jornalistas e outras
profissionais (advogadas, professoras, parlamentares, representantes de entidades
públicas ou privadas) para o debate de temas de atualidade?; b) por que as mulheres,

160
enquanto leitoras, comparativamente aos homens se manifestam de maneira tão pouco
expressiva em nossos grandes jornais?
Fica aqui também uma sugestão para os empresários e gestores da comunicação que
costumam proclamar a importância da diversidade nas organizações e, inclusive, cobram
esta condição das empresas públicas e privadas, no Parlamento etc. O compromisso com
a diversidade não deve, para os veículos jornalísticos, se limitar a pautas de reportagem
que se reportam a outras empresas ou organizações, mas estar presente também no seu
próprio processo de gestão. A grande imprensa, em questões de gênero, deve também
olhar para o seu próprio umbigo, ou seja, começar a fazer direito a lição dentro de casa.

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de Janeiro, 23/10/2017, p.33.

163
Informações gerais sobre o Grupo de Pesquisa
JORCOM
O Jornalismo na Comunicação Organizacional

Descrição
O JORCOM – O Jornalismo na Comunicação Organizacional é um grupo de pesquisa
certificado pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo
(ECA/USP), cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq e criado em 2019.
O link para o espelho do grupo é: http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/498577 .
O jornalista e professor sênior da USP, Wilson da Costa Bueno, é o líder do grupo de
pesquisa e seu currículo Lattes pode ser acessado em:
http://lattes.cnpq.br/9495822246558650 . Ele é diretor da Comtexto Comunicação e
Pesquisa (www.comtexto.com.br), empresa de consultoria nas áreas de Comunicação
Organizacional e Jornalismo Especializado. É também responsável pelos cursos a
distância nestas áreas e que estão disponíveis na Plataforma Comunicação a Distância
(www.comunicacaoadistancia.com.br).
Objetivos
O JORCOM tem como objetivos principais: a) realizar pesquisas que tenham como objeto
a contribuição do jornalismo à comunicação organizacional; b) editar livros, e-books e
artigos sobre o tema; c) organizar eventos (seminário, workshop e cursos) com adesão às
linhas de pesquisa e participar de eventos promovidos por terceiros (universidades,
empresas, sindicatos, associações).
O grupo de pesquisa aglutina, para cada uma destas atividades, membros dos seus grupos
ou mesmo convidados que tenham adesão às linhas de pesquisa do Grupo e que
produzem, regularmente, artigos, estudos e trabalhos em geral associados à Comunicação
Organizacional e ao Jornalismo.

164
Linhas de pesquisa
O JORCOM tem duas linhas de pesquisa principais:
1) O jornalismo como processo estratégico nas empresas e organizações
2) O jornalismo na formação da imagem e da reputação das empresas e organizações
Atividades
O JORCOM publicou, em 2020, o e-book O Jornalismo na Comunicação
Organizacional: uma perspectiva crítica e planeja editar, a cada semestre, um novo e-
book ou livro impresso com a participação de seus pesquisadores e convidados, além de
publicações que possam servir de guia ou manuais para professores, pesquisadores,
profissionais e estudantes.
O JORCOM também promove eventos que tratam de temas vinculados às suas linhas de
pesquisa e incentiva os seus pesquisadores a publicar artigos ou a participar de eventos,
individualmente ou em parceria com investigadores e estudiosos brasileiros ou do
exterior. No menu Eventos da página Publicações e Eventos há menções aos eventos
para os quais é possível a reprodução dos vídeos relativos a eles.
O JORCOM tem como proposta realizar pelo menos uma pesquisa anual, com a
participação de pesquisadores integrantes do Grupo e/ou convidados. No período de
setembro de 2020 a junho de 2021, o JORCOM estará desenvolvendo, em parceria com
a Comtexto Comunicação e Pesquisa, a investigação intitulada Os grupos de pesquisa
em Jornalismo Especializado no Brasil, sob a coordenação do prof. Wilson da Costa
Bueno, líder do JORCOM. Maiores informações podem ser encontradas na página
Pesquisas.
Pesquisadores
Os pesquisadores que integram o JORCOM estão listados abaixo com o link que
permite acessar diretamente os respectivos currículos Lattes:
Aline Maria de Castro Silva Rossi (http://lattes.cnpq.br/7534964652670572)
Ana Maria Dantas de Maio (http://lattes.cnpq.br/8945378092236790)
André Chaves de Melo Silva (http://lattes.cnpq.br/1812815861955321)
Anelisa Maradei (http://lattes.cnpq.br/2170777587809471)
Arquimedes Pessoni (http://lattes.cnpq.br/1885567484339052)
Jorge Antonio Menna Duarte (http://lattes.cnpq.br/8185622727042840)
Juliana Luiza de Oliveira Canêdo (http://lattes.cnpq.br/1376970092315030)
Marli dos Santos (http://lattes.cnpq.br/2138863738197222)
Paulo Roberto Salles Garcia (http://lattes.cnpq.br/7548945711715208)
Wilson da Costa Bueno (http://lattes.cnpq.br/9495822246558650)

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Publicações e Eventos
1) Publicações
O JORCOM tem como proposta a edição de uma publicação (livro, E-book, Relatório,
Manual) a cada semestre. Este e-book, intitulado O Jornalismo na Comunicação
Organizacional: uma perspectiva crítica (2020) representa a primeira produção do
grupo de pesquisa.
2) Eventos
O JORCOM promove e participa de eventos presenciais ou virtuais para apresentação e
debate de temas relacionados com as linhas de pesquisa
Pesquisas realizadas e em andamento
O JORCOM realiza, anualmente, uma pesquisa com a participação de seus pesquisadores
e/ou convidados, sob a coordenação do prof. Wilson da Costa Bueno, líder do Grupo. Em
ocasiões especiais, poderá desenvolver também pesquisas sob temas específicos,
atendendo a demandas que levam em conta atributos como a oportunidade e a relevância.
No período de setembro de 2020 a junho de 2021, o JORCOM, em parceria com a
Comtexto Comunicação e Pesquisa, realizará pesquisa com foco na área de Jornalismo
Especializado. Esta investigação – Os grupos de pesquisa em Jornalismo
Especializado no Brasil - tem como objetivo mapear os grupos de pesquisa que mantêm
linhas de pesquisa que abrangem três modalidades do Jornalismo Especializado,
respectivamente o Jornalismo Científico, o Jornalismo em Saúde e o Jornalismo
Ambiental. O levantamento terá como base os grupos que integram o Diretório dos
Grupos de Pesquisa do CNPq. A proposta é identificar esses grupos, destacando as suas
linhas de pesquisa e o perfil de seus pesquisadores, com a referência à sua produção nos
últimos 5 anos.
Contato
O contato com o JORCOM poderá ser feito por e-mail ou telefone, diretamente com o
líder do Grupo, prof. Wilson da Costa Bueno, ou pelo e-mail do Grupo.
E-mail do Grupo: jorcom@comtexto.com.br
E-mail do líder do Grupo: professor@comtexto.com.br
Fone para contato: (11) 95340-6948 ou (11) 3831-6329
Site do grupo: jorcom.jor.br

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