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Psicologia da Educação

Material Teórico
Psicologia da Educação e Formação de Professores

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Renan de Almeida Sargiani

Revisão Textual:
Prof. Ms. Natalia Conti
Psicologia da Educação e
Formação de Professores

• Apontamentos Históricos sobre a Formação do Professor Brasileiro


• O Professor em Construção: Descobrindo Identidades
• Identidade Docente: Alguns Elementos Construtivos
• Ser Professor do Século XXI: Implicações para a Formação
de Identidade Docente
• A Definição de Funções e Papéis
• O Compromisso Social Consigo e com Outros Agentes

OBJETIVO DE APRENDIZADO
· Discutir as principais contribuições da Psicologia da Educação para a
formação docente. Abordar a temática da construção da Identidade
pedagógica do professor do ponto de vista individual e coletivo.
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem
aproveitado e haja uma maior aplicabilidade na sua
formação acadêmica e atuação profissional, siga
algumas recomendações básicas:
Conserve seu
material e local de
estudos sempre
organizados.
Aproveite as
Procure manter indicações
contato com seus de Material
colegas e tutores Complementar.
para trocar ideias!
Determine um Isso amplia a
horário fixo aprendizagem.
para estudar.

Mantenha o foco!
Evite se distrair com
as redes sociais.

Seja original!
Nunca plagie
trabalhos.

Não se esqueça
de se alimentar
Assim: e se manter
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte hidratado.
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e
horário fixos como o seu “momento do estudo”.

Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar, lembre-se de que uma


alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo.

No material de cada Unidade, há leituras indicadas. Entre elas: artigos científicos, livros, vídeos e
sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você também
encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua
interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados.

Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discussão,
pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato
com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e aprendizagem.
UNIDADE Psicologia da Educação e Formação de Professores

Contextualização
Nesta unidade nós iremos discutir em maior profundidade as contribuições da
Psicologia da Educação para a formação dos professores. Desse modo, um foco de
especial interesse é a construção da identidade profissional do professor que deve
ser entendida tanto em seus aspectos individuais quanto coletivos.

Os estudos em Psicologia, de modo geral, oferecem muitos elementos para o


entendimento sobre os processos de construção de nossa identidade. Alguns desses
estudos nos mostram que nós não temos uma única identidade, mas sim diversas
identidades que vamos adquirindo durante a nossa vida, dentre elas há uma identidade
profissional. Outros estudos mostram que nós construímos e reconstruímos nossa
identidade agindo no mundo. Por meio de papéis pré-estabelecidos que assumimos
nós vamos resignificando esses papéis e construindo nossa própria identidade.

Dessa forma, podemos perguntar como formamos nossa identidade pedagógica


ou docente? Como nos tornamos professores? O que a formação do professor
tem a ver com a sua identidade profissional? Para darmos início a essa discussão
faremos primeiramente alguns apontamentos históricos a respeito da formação do
professor brasileiro, para então discutir o que as pesquisas dizem sobre a constitui-
ção identitária do professor.

Apontamentos Históricos sobre a


Formação do Professor Brasileiro
Até serem expulsos do Brasil em 1759, os Jesuítas dominavam a educação na-
cional. Após a sua expulsão, durante a reforma pombalina, foram implantadas no
Brasil as aulas régias (ou estudos menores) que compreendiam o estudo das huma-
nidades, desta vez sendo pertencentes ao Estado e não mais à Igreja, configurando
o primeiro sistema de ensino público no Brasil, porém, limitado às elites brasileiras.
Basicamente se ensinava a ler, escrever, contar e um pouco de retórica, grego e
filosofia, o restante da formação poderia ser feito por aulas particulares ou em es-
colas religiosas que ainda podiam existir. Mais tarde, com a vinda de D. João VI em
1808 são criados também os primeiros cursos superiores e as primeiras faculdades
no Brasil. Contudo, para Saviani (2009), a questão do preparo de professores só
emergiu verdadeiramente no Brasil de forma explícita após a independência, quan-
do se começou a cogitar a organização da instrução popular.

Segundo Saviani (2009), a questão da formação de professores só é explicitada


a partir da promulgação da lei das Escolas de Primeiras Letras em 15 de outubro de
1827, que destacava que os professores deveriam ser treinados, às próprias custas,
nas capitais das respectivas províncias, enfatizando assim o preparo pedagógico do
professor. Em seguida, após a promulgação do Ato Adicional de 1834, a instrução

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primária passou a ser responsabilidade das províncias, e com isso a formação dos
professores que vinha sendo seguida nos países europeus passou a ser realizada no
Brasil com a criação das Escolas Normais.

Em 1835, é inaugurado na cidade de Niterói o primeiro curso de formação de


professores, denominado de Curso Normal. Seguido pela criação de outros cursos
na maioria das províncias ainda no século XIX. Essas escolas, entretanto, fechavam
e eram abertas periodicamente, seu funcionamento era instável e intermitente, pois
eram onerosas e ineficazes, formando poucos professores. As Escolas Normais
preconizavam uma formação específica, que deveria guiar-se pelas coordenadas
pedagógico-didáticas, contudo predominava nessas escolas a preocupação com o
domínio dos conhecimentos a serem transmitidos nas escolas de primeiras letras.
O currículo de formação de professores era então apenas as mesmas matérias que
seriam ensinadas nas escolas de primeiras letras com base na suposição de que os
professores deveriam ter o domínio daqueles conteúdos que lhes caberia transmitir
às crianças, e desconsiderando o preparo didático-pedagógico (SAVIANI, 2009).

Além disso, os cursos normais apresentavam como característica principal a


tendência de uma escola limitada à formação da elite brasileira que apenas aceitava
alunos do sexo masculino. Nestas condições, fica claro que a verdadeira demanda
educacional brasileira não era atendida, pois a grande maioria da população era
pobre e poucos eram alfabetizados. Segundo o Mapa do Analfabetismo no Brasil
(2003), chegamos ao final do Império com apenas 1,8% da população que sabia
ler e escrever.

No período republicano, a profissionalização do magistério é ainda tímida,


recebendo pouco apoio governamental. Era necessário, então, redefinir o papel
do professor na sociedade brasileira, que se industrializava e abria portas para
uma economia capitalista. Consequentemente, sua formação também deveria ser
repensada. Com a consolidação do Estado Novo, a constituição de 1937 estabelece
como competência da União: “fixar as bases e determinar os quadros da educação
nacional, traçando as diretrizes a que deve obedecer a formação física, intelectual
e moral da infância e da juventude” (art. 15, inciso IX). Os desdobramentos legais
de decretos e legislação educacional fixam normas para a formação do professor, e
assim, consolidam o Curso Normal em nível secundário profissionalizante.

Esse quadro será revisto a partir de 1945, com o fim do regime político do
Estado Novo, período que foi caracterizado pela centralização do poder, pelo
nacionalismo exacerbado, pelo anticomunismo e pelo autoritarismo. De acordo
com Decreto-Lei 8530, de 02/01/1946, o Ensino Normal tinha por finalidade
duas frentes: à primeira cabia prover a formação do pessoal docente necessário
às escolas primárias; e habilitar administradores escolares destinados às mesmas
escolas; à segunda, desenvolver e propagar os conhecimentos e técnicas relativos
à educação da infância.

Além da questão técnica e legislativa, devemos considerar o que significava ser


professor neste período. O que se observava era que a profissão de “Professor” era

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UNIDADE Psicologia da Educação e Formação de Professores

“romantizada”, havia certo status social em ser professor que significaria respeito
e ascensão social. Assim, a classe pobre e feminina brasileira - tornando-se profes-
sora - encontraria na profissionalização uma saída, uma mudança para uma classe
economicamente mais estável. Leia um trecho da música gravada por Nelson Gon-
çalves em 1949 e perceba o universo romântico em que está inserida a Normalista,
ou seja, as professoras.

Figura 1
Fonte: iStock/Getty Images

Normalista

Vestida de azul e branco

Trazendo um sorriso franco

No rostinho encantador

Minha linda normalista

Rapidamente conquista

Meu coração sem amor...

Além deste romantismo ingênuo pertencente à época, observamos que o


gênero feminino predominou nos cursos da modalidade Normal, para formação de
professores. Nestas condições, as professoras eram atraídas a se profissionalizarem,
a fim de atenderem às demandas pela educação primária cada vez mais procurada
pela classe pobre. Demanda que não foi atendida, porque chegamos em 1960 com
39,7% da população acima de 15 anos analfabetas segundo a tabela 2 do Mapa do
analfabetismo no Brasil (2003).

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Tabela 1 – Analfabetismo na faixa de 15 anos ou mais – Brasil 1900/2000
População de 15 anos ou mais
Ano
Total(1) Analfabeta(1) Taxa de Analfabetismo
1900 9.728 6.348 65,3
1920 17.564 11.409 65,0
1940 23.648 13.269 56,1
1950 30.188 15.272 50,6
1960 40.233 15.964 39,7
1970 53.633 18.100 33,7
1980 74.600 19.356 25,9
1991 94.891 18.682 19,7
2000 119.533 16.295 13,6
Fonte: IBGE, Censo Demográfico
Nota: (1) Em milhares

Do ponto de vista técnico-legislativo, a formação oferecida por essa modalidade


de ensino apresentava-se marcada pela dicotomia: formação para a sala de aula e
formação para a gestão escolar, características dos cursos superiores de pedagogia
até os dias atuais. Observe a imagem a seguir:

Figura 2
Fonte: Acervo do Conteudista

Observe a predominância de mulheres na formatura de Normalista no Rio de


Janeiro em 1963. Assim chegamos ao Brasil durante o regime militar que teve início
em 1964. A educação profissional neste período vai sendo consolidada atrelada ao
desenvolvimento econômico capitalista industrial em processo de aceleração e que,
consequentemente, exige formação de demandas para atender as suas exigências.
E dando oportunidade de profissionalização aos menos favorecidos. Neste período
não houve grandes mudanças na formação de professores.

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UNIDADE Psicologia da Educação e Formação de Professores

Anos mais tarde, depois do período de redemocratização, com a ainda vigente


Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: LDB Nº 9394/96, uma nova
configuração de formação de professores se estabelece, segundo a lei:
Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-
se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena,
em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como
formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e
nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível
médio, na modalidade Normal. [...]

Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:

I – cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o


curso normal superior, destinado à formação de docentes para a educação
infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental; [...]

Assim, além do curso de formação de professores da Educação Infantil e séries


iniciais do Ensino Fundamental denominado Pedagogia, temos a possibilidade de
um curso Normal Superior, já extinto pelo Ministério da Educação (MEC) em 2006.

O curso Normal Superior era uma graduação e foi criado no Brasil para
substituir o curso técnico de magistério, desenvolvido no segundo grau e atualmente
nomeado de Normal Médio. Apesar da semelhança à Pedagogia, tal curso não
habilitava para a gestão escolar, orientação educacional ou supervisão escolar, sua
habilitação se referia à licenciatura em Educação Infantil e ao magistério do Ensino
Fundamental I. Com a sua extinção, os professores ficaram sendo obrigados a
cursar Pedagogia para o trabalho com turmas de educação infantil e séries iniciais
do Ensino Fundamental.

De forma geral, estes cursos propõem a formação de um Professor que articule


no seu desempenho os saberes que definem sua identidade profissional. Além do
saber referente ao conhecimento dos conteúdos da formação, o Professor deverá
articular um saber pensar, para refletir sobre a própria prática em função da teoria
estudada, e um saber intervir para melhorar ou transformar sua própria prática.
Deste modo, a formação profissional está intimamente ligada à construção de uma
Identidade Pedagógica.

O Professor em Construção:
Descobrindo Identidades
Ensinar sempre causou curiosidade entre os educadores/professores. Parecer
haver uma espécie de mistério quanto ao fato de levar/orientar para que alguém
possa apreender conhecimentos e saberes relacionados à sobrevivência tanto física,
quanto mental e social.

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O fantástico parece estar na situação de poder assumir uma postura de poder
sobre o outro, conduzindo-o para o que nos parece correto e lógico. É transformar
e mudar o percurso de vida de sujeitos postos em nossas mãos (pensem em
educadores como um todo, incluindo pais).

Portanto, intervir na existência de outro(s), pela via do ensinar, configura-se


como um ato de muita responsabilidade e compromisso. O poder contido nessa
ação altera vidas para o bem ou para o mal, tornando o nosso próprio existir
confortável ou desconfortável conforme o que objetivarmos enquanto educadores.

Certo de que a educação não nos serve como panaceia, porém é um dos grandes
movimentos da humanidade para formar o ser que seja compatível com o tempo e
espaço vivido e para planejar elementos do futuro.

Sendo assim, nada mais justo que pensarmos em um lugar para educar e formar
pessoas coerentes para o ensinar nesse lugar. Esse lugar foi escolhido culturalmente
e é a Escola, sendo que o ensino ficou a cargo dos professores.

Considerando o exposto; você já imaginou o quanto o professor, dentro da escola, é


Explor

“poderoso”, é uma liderança na formação de pessoas para o mundo? Será que reconhecemos
e valorizamos a importância dos professores nas sociedades? Será que os professores são
cientes da importância de suas ações e da necessidade de que estejam cientes de que suas
ações podem tanto formar pessoas que pensem por si mesmas como pessoas alienadas?

Abramovich (1994) no livro “Que raio de professora sou eu?” conta a história
de Laura, uma professora de História de 33 anos que escreve um diário falando
sobre seu trabalho como professora e sua vida pessoal. Dessa forma, ela apresenta
em pequenos relatos o quanto o professor inconsciente do poder de sua ação
pode fazer “coisas” no ato de ensinar que “levem” o aluno a organizar-se como
pessoa (personalidade) para seu aperfeiçoamento ou total destruição. Ela enfatiza
que ensinar parece ser um ato confuso em que não se tem clareza em se “passar”
certezas pessoais ou arriscar para que os alunos encontrem as suas verdades.
Formar cabeças feitas ou abrir cabeças pro que der e vier? Pas-
sar minhas certezas ou arriscar que os alunos escorreguem, caiam
e achem a sua resposta, o seu caminho? Talvez, até oposto ao meu.
[...] Complicado tudo isso. É onde mais me debato. Cada mergulho e
cada volta à tona pra respirar me trazem novas perguntas. Novas dúvidas.
Novas incertezas. (ABRAMOVICH, 1994, p. 84)

Então, para ser professor há a necessidade de consciência profissional e pessoal.


Saber que é um líder poderoso, “fazedor” de cabeças e, muito mais, organizador
de vidas em um contexto de existências (tempo e espaço determinados); agindo
para que o movimento do mundo assuma características de qualidade ou de um
mesmismo sem sabor e meramente impositivo e destruidor.

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UNIDADE Psicologia da Educação e Formação de Professores

Enfatiza Abramovich:
Chega deste vai levando... Chega de botar a culpa nos outros e lavar as
minhas mãos. Está na hora de crescer. Crescer como professora. Como
pessoa. Como pessoa-professora. Assumir as minhas responsabilidades
nisto tudo que está ai. Parar de me achar uma vítima.

Sou vítima sou carrasco. Sou decapitada e decapito. Sou mandada e man-
do. Ensino e sou ensinada. Aprendo com os meus alunos e desaprendo
com outros professores. Sou cutucada por alguns professores e desani-
mada por um montão de alunos. Tudo acontecendo junto. Ao mesmo
tempo. Tenho que parar de me lamentar. Tomar uma atitude. Depende
de mim. A escolha é minha. Só minha. (ocit. p. 90).

Pelo que foi exposto até o momento, é possível afirmar que o ato educativo
não é tarefa fácil. É, pois, um trabalho árduo que exige do profissional reflexão
constante para tomada de decisões e organização de atos gestores do que se
pretende enquanto ação deliberada sobre outros. Na proposição de Paulo Freire
(1979; 1985; 1998), é decidir “politicamente” entre o libertar (emancipar) ou
escravizar pessoas pelo ato educativo na ação profissional do professor. A escolha
é do próprio sujeito que se colocou à disposição de “ser professor”.

Não se trata de imposições, porém, de informações em que a pessoa se


conscientize do seu campo de atuação e referencie seus atos reconhecendo-o como
útil à formação de outras pessoas para responder, com qualidade, os desígnios no
contexto vivencial onde se encontra.

Teóricos da Psicologia como Wallon diriam que educar é um ato necessário


para a adaptação do ser humano no mundo de cultura e também para humanizá-
lo. Assim, poderíamos complementar com as ideias de Vygotsky, de que não
basta impor conhecimentos sem que haja neles sentido e significado para que
possamos nos tornar “homens do mundo”; convivendo e comungando harmônica
e interativamente dos prazeres de saber, ser e fazer.

Nesse sentido, pensando sobre a construção da identidade do professor, a Psico-


logia tem muito a contribuir. A Psicologia como Ciência tem como foco de estudo
o ser humano – indivíduo/sujeito. Tenta estabelecer um sistema de estudo reconhe-
cendo as relações constantes entre esse sujeito e o mundo (objeto). Defende que é
viável a observação do sujeito nessa constante interação para compreender como
se constroem suas ações e pensamentos, bem como tudo aquilo que é representa-
tivo de sua intervenção no universo e em si mesmo. O mistério está em como o ser
humano torna-se ele mesmo e como esta “identidade” o faz agir e reagir de modo
peculiar àquilo que lhe aparece como estímulo no mundo em que vive.

A Psicologia nos mostra que cada pessoa é única – indivisível – porém, convive
em grupo adaptando o que é individual ao que é coletivo (interação constante en-
tre o sujeito e o objeto). Resultado: nós como somos! Nem bom, nem mau! Nem
certo, nem errado! Porém, necessários ao que temos de enfrentar no mundo por
nós mesmos.

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No contexto homem-mundo (sujeito-objeto), conhecer como ambos se relacio-
nam tem como objetivo fazer deles o melhor qualitativamente para mútuo aper-
feiçoamento. Propor evolução, mudanças significativas e pertinentes ao tempo e
espaço em que se encontram o homem e o seu mundo.

Fatalmente, as transformações podem até ocorrer naturalmente, porém, sem


certeza dos resultados que serão obtidos. Para amenizar erros, como recomendaria
Paulo Freire (1979;1985;1998) é importante planejar e planificar ações sobre
o mundo e o sujeito, buscando conscientemente o que fazer, como, para quê e
para quem. Aqui, enfatizamos a importância do ato de educar e a formação de
profissionais para tal.

É o profissional da educação – professor – que terá o compromisso e a


responsabilidade de projetar sistematicamente ações que orientem o ser humano
à mudança; à transformação. A consciência está no ato de pensar o porquê de
educar – libertar ou escravizar? – qualidade de vida ou empurrar com a barriga?
Que raio de professor sou eu?

A Psicologia, enquanto ciência e na educação, visa orientar o futuro educador


para que se torne consciente de seu poder de liderança na transformação do sujeito
e do mundo. Assim, não é fazer de qualquer jeito; é fazer tendo a real noção do que
se deseja como interventor do mundo.

A Psicologia da Educação está em um curso de formação de professores muito


mais para fazê-lo entender-se como indivíduo que influencia e que é influenciado e
como esta relação repercute no movimento da coletividade e da pessoa a ser formada.

Não se trata de terapia, mas de fornecer elementos para que o futuro profissional
encontre a sua identidade profissional e se assuma como corresponsável dos
resultados da ação educativa no mundo. Trata-se de contribuir para construção da
nossa identidade pedagógica.

Trocando ideias...Importante!
Tendo como base o clássico livro de Glória Pimentel (1996), cujo título é “O professor
em construção”, vamos refletindo; pensando em como nos tornamos professores. Mais
especificamente, o que é ser professor. Ser não é o mesmo que estar... Óbvio? Não
tanto como pensamos. Ser é assumir posições e atitudes que nos identificam perante o
mundo e, mais especialmente, a nós mesmos. É possuir um referencial que nos permita
a consciência do real em tudo que nos cerca e nos dá a condição de saber do nosso existir.

Quando pensamos em ensinar temos que pensar em questões como: o que


quero ensinar? Formar quem? Para quê? Que mundo? Que tempo? Que cultura?
Quem irei encontrar no futuro enquanto sujeito que formei? Então também diante
destas questões também temos que pensar sobre a formação dos professores.
Como formar professores? Que professores serão esses? Que formação será a
melhor? O que esperar dos professores?

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UNIDADE Psicologia da Educação e Formação de Professores

Flores (2003) destaca que a maneira de se enfatizar a formação de professores


está diretamente ligada a determinadas concepções que se tem do papel do docen-
te, da escola e do currículo em determinada sociedade. Assim, ensinar implica em
levar à aquisição de atitudes, valores, conhecimentos, técnicas e também requer
um processo reflexivo e crítico do que significa ser professor, propósitos e valores
relacionados à própria ação e ao que se impõe nas políticas públicas de educação.
É então, não só o “fazer” ou desenvolver conteúdos impostos por diretrizes curri-
culares, mas tomar decisões, emitir pareceres e decisões fundamentados, justificar
e reconhecer as próprias ações, ler e interpretar ocorrências do contexto educa-
cional/escolar em que atua agindo coerente e logicamente. O propósito sendo
sempre o de conduzir/orientar o ensino para o aprender.

Se pretendermos formar professores para um bom desempenho profissional,


ainda ressalta Flores (2003), é então necessário promover novas atitudes em tais
professores que estão ainda em formação, pois além de aprenderem conteúdos,
processos de pesquisa, reflexão e fazeres metodológicos, implica em por em
discussão o que significa ser professor, em um tempo de desafios em que sociedade
e escola são cada vez mais exigentes para responder às imposições da sociedade
local e mundial.

Tornar-se professor trata-se de um processo complexo e multidimensional que


abrange inúmeras facetas, desde motivações individuais até imposições sociopolí-
ticas e culturais.

Flores (2003) ainda estabelece quatro elementos básicos para contextualizar a


formação do professor que são:
• contexto político: o enquadramento legal para formar professores; as ênfases
nacionais e regionais e a normatização de Leis Educacionais.
• contexto curricular: o papel do professor; o papel de aluno; a compreensão
do que é ensinar e aprender; as matrizes curriculares (conteúdos propostos
para as disciplinas específicas) e as noções de políticas para formar sujeitos.
• contexto de investigação: aprender a ensinar; aperfeiçoamento e desenvol-
vimento profissional; constante reflexão sobre a prática educativa (conscienti-
zação); socialização profissional (trocas entre parceiros de profissão).
• contexto prático: condições de trabalho; interação com as instituições
educacionais; aquisição de cultura e estruturação de liderança; organização de
papéis e tarefas; oportunizar aprendizagens (formação ao longo do tempo).

Desta forma, percebe-se a responsabilidade de ser professor e de formar o pro-


fessor. É fundamental a manutenção da ligação com o real e plano consciente sem
perder o foco de que ser profissional da educação exige constante investigação,
reconhecendo desafios da sociedade de informação, potencialidades de cada insti-
tuição e de si mesmo em contextos direcionados por valores e propósitos políticos.

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Identidade Docente: Alguns
Elementos Construtivos
Diversas pesquisas buscam compreender como a identidade se organiza e,
principalmente, nos tempos atuais, compreender a construção da identidade
profissional. Em nosso caso estamos tratando mais especificamente da construção
da identidade docente, ou seja, como as pessoas se tornam professores? O que é
ser um professor?

O tema da construção da identidade e a formação de professores é assunto


que preocupa não só a Educação como outras áreas do conhecimento, como a
Psicologia, a Filosofia e a Sociologia. Acredita-se que entender a construção da
identidade docente auxilia na explicação dos processos que envolvem a docência,
especialmente no que se refere ao modo de ser professor. Por conseguinte,
a compreensão do processo de constituição identitária do professor traria
contribuições para a sua formação e a melhoria de suas práticas nas instituições,
resultando também na melhoria da qualidade de ensino (FARIA; SOUZA, 2011).

A importância da temática pode ser revelada por uma pesquisa de estado da


arte, ou seja, que investigou o conhecimento mais atual sobre o tema formação
de professores e identidade docente. Marli André e seus colaboradores (1999)
identificaram que de 1990 a 1996 foram publicados somente na área da Educação,
284 estudos sobre o tema, o que fez com que eles concluíssem que havia pouco
interesse pelo estudo da identidade docente. Contudo, em uma pesquisa mais
recente, focalizando a produção de 1999 a 2003, Marli André identificou 1184
pesquisas sobre o tema, revelando uma mudança importante que indica um aumento
no interesse dos pesquisadores sobre a problemática da constituição identitária do
professor (André, 2009).

Um importante e renomado teórico sobre o estudo da construção da identidade


é o psicólogo brasileiro Antônio da Costa Ciampa, que discute a construção da
identidade sob a óptica da Psicologia Social. Para Ciampa (1987) a identidade é
uma metamorfose, ou seja, está em constante transformação, sendo o resultado
provisório da intersecção entre a história da pessoa, seu contexto histórico e social
e seus projetos. Por esta razão a identidade sempre tem caráter dinâmico, e as suas
transformações representam uma personagem. Para Ciampa, essa personagem é
a forma como a pessoa vivencia papéis previamente padronizados em sua cultura,
em um movimento fundamental na construção identitária. Ao representar papéis,
age-se de determinados modos e pode-se construir a sua própria identidade. Em
outras palavras, a identidade se constrói na e pela atividade. Nas palavras de
Ciampa, “o indivíduo não é mais algo: ele é o que faz” (CIAMPA, 1987, p. 135).

Dessa forma, o professor constrói a sua identidade na e pela atividade ser


docente. É sendo professor, atuando como professor que nós criamos a nossa
identidade docente. O que faz com que a construção identitária docente dependa

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UNIDADE Psicologia da Educação e Formação de Professores

também do contexto em que estamos inseridos. Assim, cabe dizer também que
nos últimos anos tanto a profissão de professor quanto a escola têm passado por
questionamentos e modificações que implicam em mudanças no que é ser docente.
A dificuldade que a escola enfrenta na resposta às mudanças sociais que se
registram tem conduzido ao que alguns autores designam por “crise da escola”,
inserida naturalmente numa crise mais global que atinge outras estruturas com res-
ponsabilidades educativas. As profundas alterações na sociedade atual têm provo-
cado efeitos profundos nas políticas de educação e a criar para o trabalho docente
contextos novos de grande complexidade, com implicação na (des)motivação dos
professores, nomeadamente, no que diz respeito ao seu desempenho profissional.
O ensino é agora a chave para novas formas de aprendizagem, para o incremento
de indicadores e níveis de sucesso educativo, para o aumento da receptividade por
parte dos alunos, para os novos e flexíveis procedimentos de trabalho, para outra
atenção aos problemas de formação e do desenvolvimento profissionais. Com
esta mudança do sentido da educação escolar, estão necessariamente a emergir
novas identidades do professor, relacionadas com seus papéis e a identificação do
trabalho na escola. (ADÃO; MARTINS, 2004, p. 9-10).
Percebemos que, além da grande dificuldade de se construir uma identidade
própria, a identidade enquanto profissional – e da educação – o ser professor tem
uma ligação estreita com a consciência do mundo e suas transformações, que
exigem tomadas de decisões e ações rápidas, seguras, lógicas e que promovam o
bem-estar próprio e dos outros.
Georges Gudsdorf, em seu clássico livro de 1987, “Professores para quê?”
questiona qual o real papel de um professor na relação com seus alunos e com a
sociedade; e o quê fazer para superar ser um mero repetidor ou um “ignorantista”?
O que fazer para que o professor não seja substituído por um livro, pelo rádio ou
pela TV e outros meios de comunicação – hoje: a internet?”
O que afinal é SER professor? Quando? Como? Para quê?
Paulo Freire (1979; 1985; 1998), em diversos momentos estabelece que, ser
professor tem a ver com o compromisso que se assume em contribuir amoro-
samente para conscientizar pessoas e fazê-las emancipadas, no sentido lato da
democracia. Ser educador-professor é libertar pessoas pela via da proposição de
conteúdos reais e diálogos animadores para o debate sobre a vida e como torná-la
significativa e qualitativa. Propondo a superação de pensamentos fantasiosos e as
falsas crenças que limitam e alimentam ideologias da escravidão.
Paixão Netto (2001) lembra-nos que professor é uma palavra que vem do latim
e significa aquele que fala (fateor) aberta e francamente diante de um público (pro)
aquilo que pensa, acredita e defende como a própria condição de ser. Defende ele:
Um professor é sobretudo um indivíduo íntegro, autêntico, confiável. Um
ponto de referência para seus discípulos. É o que fala com convicção, sem
rodeios. Professor não é ventríloquo nem porta-voz ou porta-mentira.
Não é aquele que “dá a matéria”. É aquele que incentiva a pensar. (p.19)

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Ser professor, então, exige esforços ligados ao propósito de mostrar-se, colocar-
se, de assumir posições perante si e ao mundo. Obriga a “agir na urgência e
decidir na incerteza” (PERRENOUD, 2001). Portanto, a consciência se faz como
condição ideária em uma performance de consciência absoluta do ser – identidade;
em contrário não há afirmação de posições e tampouco convicções do pensar e do
fazer – morre-se como pessoa e como profissional.

De acordo com Abreu e Landini (2004), identidade docente é um conceito


complexo, problemático, múltiplo e que abarca uma enorme gama de fatores tanto
no âmbito da própria profissão como no âmbito social e político. Defendem:
O construto identidade docente é, acima de tudo, um conceito poliédrico.
Os aspectos que deve incluir essa identificação são numerosos e diversos e
não só se referem às funções incluídas na atividade docente mas também às
condições sociais em que se produzem e ao plano jurídico e regulamentar
que as condiciona. Mas, para além disso, é um conceito problemático,
porque os múltiplos aspectos que convergem na sua definição apresentam-
se normalmente de forma contrária. Sua complexidade externa impede
de abordar todos os seus aspectos [...] (p. 356).

Desta forma, ao tocarmos em aspectos relacionados aos elementos que compõem


a construção da identidade do professor, precisamos eleger, prioritariamente,
aspectos considerados como basilares para contribuir com a reflexão e a elaboração
de modo explicativo desse fato.

Assim priorizamos:

Identidade coletiva e identidade individual


Coletivamente, há modelos sociais considerados válidos e que fornecem ele-
mentos de interpretação e que facilitam a incorporação de papéis que, suposta-
mente, respondem ao que é esperado como perfil docente. Há o corporativismo
que garante a construção de um protótipo da população docente e que garantem a
aceitação e o sentido de pertencimento no contexto que milita. É a tentativa de se
obter uma autoimagem satisfatória de si mesmo (TAJFEL; TURNER, 1979).

Individualmente, consiste na significação e percepção que o sujeito tem


do seu próprio trabalho e está relacionada à maneira peculiar que o sujeito
interpreta os retornos de suas ações no coletivo. O sujeito observa os efeitos de
sua ação docente e constrói, em seu imaginário, hipóteses, teorias, elementos de
julgamento e valorização para o seu processo de ensinar, sobre a escola, alunos e
todos os elementos implicados no autoreconhecimento e, principalmente, na sua
diferenciação quanto aos demais professores. É firmar-se enquanto alguém que,
mesmo pertencendo a um grupo corporativo, não se perde enquanto mais na
massa profissional. Tenta-se buscar a consciência de si e sentir-se enquanto real.

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UNIDADE Psicologia da Educação e Formação de Professores

As distintas identidades: as opções educativas individuais


Não existe uma identidade pedagógica universal; mesmo que tenhamos leis ou
regulamentação do Estado para o ensino em teorias específicas sempre haverá a
capacidade de o sujeito fazer interpretações. É sua participação e envolvimento
com o que existe no contexto educativo que vai orientando-o para rumos que
supostamente dão a ele maior conforto em encontrar-se e sentir-se como alguém
que produz e aplica teorias e métodos que garantem sucesso e aliviam a tensão.
Agir conforme o que acredita dá ao sujeito retornos que o fazem firmar-se enquanto
liderança e sensação de ser senhor do seu próprio espaço. Porém, há o risco de,
em se afastando do contexto coletivo, cair em ações isoladas e solitárias, a ponto
de esgotar-se por ausência de renovação e espelho para o feedback necessário ao
fortalecimento de sua existência real. Para fortalecimento da identidade, cabe o
balanço entre semelhanças e diferenças do contexto.

A história de vida a e construção da identidade docente


Não há professor que se forme por normas rígidas pré-estabelecidas ou por
aparição episódica. Ele se constrói paulatinamente em um movimento constante e
contínuo ao longo de sua existência, primeiro como pessoa e, depois, na própria
prática profissional.

Temos ao longo de nossa vida uma gama enorme de experiências com supostos
professores (mãe, tia, irmão, vizinhos) e com os efetivamente ditos ao longo de
nossa escolarização. Todos com algum tipo de exemplo que influencia a maneira
de significa o que seja educar e ensinar.

Assim, a construção da identidade do professor se faz por elementos estabelecidos


em relação dialética da pessoa com a sociedade, em momentos da história e da
cultura. Há uma projeção, ao mesmo tempo, quantitativa e qualitativa que impulsiona
para que a identidade não seja fixa e sim em permanente aperfeiçoamento.

De certo modo, a identidade deixa de ser o que permanece, o intrínseco ou o


estrutural, para incluir também o conjuntural ou a capacidade para destruir, como
sejam necessárias, as certezas do estrutural. A identidade requer, assim, uma atu-
alização constante que contradiz sua imanência e a sua permanência (SANTANA,
2004, p. 363).

Nóvoa, Hubermam e Tardif são teóricos que defendem e acreditam que discutir a
identidade profissional dos professores e suas identidades pedagógicas representam
um grande avanço no sentido de superar escolas e professores ativistas que fingem
que possuem ações efetivas, no entanto não assumem qualquer posição no cenário
educativo, deixando que tudo aconteça como obra do acaso.

A responsabilidade e o compromisso com o ato de ensinar requerem pessoas


despojadas, corajosas, íntegras e autênticas que assumam posições firmes e
conscientes, entendendo que em suas mãos pode estar o futuro dos seus aprendizes,
mas e, principalmente, a sua sobrevivência harmônica e equilibrada no contexto do
qual também faz parte.

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Explor
Imaginem um profissional sem identidade. O médico que não sabe o que é, um engenheiro
nas mesmas condições, dentistas, controladores de máquinas etc. Iríamos nos sentir seguros
nas “mãos” desses sujeitos?
E quanto ao professor? Teríamos sentimentos de amparo diante de alguém que não sabe o
que é? O que será que ocorreria em sala de aula e nas escolas?
Achou pesado? Temeroso? Pois é o quê temos ultimamente nos domínios da educação e em
todos os níveis. Precisamos então refletir sobre o que é ser professor desde a formação de
professores e mesmo depois.

Ser Professor do Século XXI: Implicações


para a Formação de Identidade Docente
Considerando o que defende Sacristán (2007) em “A Educação que ainda é
possível”, cabe-nos considerar que na sociedade atual, ligada aos processos de
globalização e tecnologias de informação, um primeiro passo é possibilitar
ao professor (ou futuro professor) a consciência do estado da coisa, ou seja,
conhecimento da realidade em todos os setores da existência humana em sociedade,
incluindo saber da crise ideológica e mercadológica da educação e da escola.

Não podemos mais sustentar uma educação alheia às necessidades do sujeito e


das suas condições de existir. Conscientizá-lo, inclusive, sobre a sua posição neste
universo e como está sendo treinado para responder aos interesses que nem sem-
pre lhe são significativos enquanto pessoa que tem capacidade de ser e pensar; par-
ticipando ativamente das decisões de seu contexto na real concepção de cidadania.

Também, na conscientização, que haja discussão dos conflitos das dissonâncias


percebidas nos setores social, político, econômico, cultural e as condições implicadas
na educação. Dialogicamente (FREIRE, 1979), despertar a vontade da participação
como referência para “ser”; é na ação motivada que será possível encontrar saídas
para a crise do sistema global (principalmente escolar/educacional).

Concretamente, é afirmar a relação indivíduo e sociedade, porém em uma


sociedade que é possível: não utópica e não negada. Trata-se de utilizar reflexões
para ações pautadas em projetos que visam negociações e aproveitamento do que
é posto como realidade imediata.

Hoje, temos de ser modestos e pensar que nem as esperanças devem ser
supervalorizadas nem o fracasso ou crise generalizados. Onde está o ponto até
onde pode chegar a imaginação de esperanças e a partir do qual as aspirações
levam à frustração? Nunca sabemos com certeza. Portanto, é preciso se arriscar
a incrementar o nível de aspirações para aproveitar as possibilidades que possam
aparecer. Se a política é a arte do possível, a educação e as suas reformas também
o são (SACRISTÁN, 2007. p. 156).

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Vontade e esperança são elementos que permeiam a consciência e a fazem


potencializar-se em termos de projeção para mais e para frente, constituindo
fatores que reafirmam a existência e, consequentemente, firmam posturas, atitudes
e o autoreconhecimento de um eu objetivado em identidade. (FREIRE, 1979)

Somos e nos reconhecem como tal pela maneira de nos apresentarmos frente
ao mundo e aos outros, autêntica, convicta e integramente.

A Definição de Funções e Papéis


Sacristán sustenta que as funções dos professores são conhecidas e possíveis na
teoria, porém, na prática, o seu papel muitas vezes é restringido ao mero exercício
de ensinar (e olhe lá!). Para ele, esse empobrecimento está diretamente ligado a
concepções idealistas e a um reducionismo de ações como mecanismo de defesa
para responder às necessidades de uma adaptação ao sistema de forma geral.

Assim sendo, papéis e funções do professor (identidade) são confusas e pouco


compreendidas enquanto projeto de desempenho. Temos que seguir a teoria ou
improvisar frente ao que temos como real? Qual a condição de poder ter certeza da
boa atuação profissional? São perguntas cujas respostas não são simples e fáceis.

Em termos de indicação, cumpre dizer que a teoria é a base concreta, no entanto


a ação deve ser construída de forma a responder ao que se projeta como o melhor
e mais coerente para atender demandas tanto de si (individuais) quanto coletivas
(alunos, escola, comunidade, legislações, currículo etc.).

Trata-se da difícil prática de “agir na urgência, decidir na incerteza” (PERRENOUD,


2001). É a ação com competência e lógica que não está escrita em nenhum livro
ou em qualquer academia para formação de professores.

Trata-se da posição tomada pelo professor no contexto de atuação considerando


tudo e extrapolando mecanismos legais e códigos de ética, pois representa
explicitamente o compromisso pessoal de cada um.

Dado o compromisso estabelecido consigo e que visa, também, aos outros.


Minha identidade como sustentáculo de ações sobre mim e o mundo, ter que ser
professor; não é uma profissão/trabalho para quem quer, mas para quem está
integralmente preparado.

Para ser respeitado, é preciso se fazer respeitar; para enfrentar situações novas
é preciso primeiro conhecê-las; para atrair cultura é preciso ser atraente comuni-
cando-a; para ser apreciado como alguém valioso deve-se mostrar a utilidade do
serviço que presta. Tudo isso exige professores motivados por seu ofício, bom co-
nhecedor do mundo em que vivemos, dos jovens, seguros de si mesmo, que saibam
converter em cultura viva os conteúdos e em procedimentos racionais os métodos
de ensino e as exigências dos estudantes. Ou seja, são necessários professores
cultos, bem formados, com vocação e equilibrados. (SACRISTÁN, 2007. p. 171).

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O Compromisso Social Consigo
e com Outros Agentes
A escola e os professores não estão isolados no processo de educar; outros
agentes são necessários para que o trabalho, de formação dos sujeitos seja levado
a efeito.

Família e Comunidade são elementos que, quando integrados à escola, funcionam


como suporte e reforço para os ensinos desenvolvidos e facilitam a compreensão
das condições das vivências e necessidades reais.

Para as camadas populares, em escolas públicas essencialmente, muitas vezes


o professor precisa atuar como um agente comunitário orientando e coordenando
comunicações para evitar a disparidade entre o que prediz a escola e o que necessita
a família e a comunidade.

Não existe concorrência entre o interior escolar e o exterior, comunidade social;


deve existir mútua cooperação no sentido de que todos são importantes peças de
uma totalidade que negocia o bem viver e a sustentação de ações ideárias para
possibilitar significações das relações estabelecidas.

Escola, família e comunidade, nas ações do professor como função própria e so-
lidária para compor o compromisso de fazer para mais e qualitativamente; respon-
sabilidade assumida como condição pessoal e de firmação de posição de identidade.

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UNIDADE Psicologia da Educação e Formação de Professores

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Livros
Que Raio de Professora Sou Eu?
ABRAMOVICH, F. Que raio de professora sou eu? São Paulo: Scipione, 1994.
A Alegria de Ensinar
ALVES, R. A alegria de ensinar. São Paulo: Editora Papirus, 2003.
A Estória do Severino e a História da Severina
CIAMPA, A. C. A estória do Severino e a história da Severina. São Paulo: Brasi-
liense, 1987.

 Filmes
Ao Mestre com Carinho
(To Sir with Love). Direção: James Clavell, 1967.
Sociedade dos Poetas Mortos
(Dead Poets Society). Direção: Peter Weir, 1989.

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Referências
ABREU, C. B. M.; LANDINI, S. R. Proletarização e profissionalização: ques-
tões sobre a identidade docente. In: ADÃO, A. e MARTINS E. (org.) Os professo-
res: identidades (re)construídas. Portugal, Lisboa: Universitárias Lusófonas, 2004,
p. 345-353.

ADÃO, A.; MARTINS E. (org.) Os professores: identidades (re)construídas.


Portugal, Lisboa: Universitárias Lusófonas, 2004, p. 379-386.

ANDRÉ M., SIMÕES R. H. S., CARVALHO J. M., BRZEZINSKI, I. Estado da


arte da formação de professores no Brasil. Educação e Sociedade, 20(68), 301-
309, 1999.

ANDRÉ, M. A produção acadêmica sobre formação de professores: um estudo


comparativo das dissertações e teses defendidas nos anos 1990 e 2000. Formação
Docente – Revista brasileira de Pesquisa sobre Formação Docente, v. 1, n. 1,
p. 41-56, ago./dez. 2009.

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de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
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Disponível em: http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/2762/
ldb_5ed.pdf. Acesso em 15/04/2012.

BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas


Educacionais. Mapa do analfabetismo no Brasil. Brasília, DF: MEC/ INEP,
2003. Disponível em: <http://www.inep.gov.br/estatisticas/analfabetismo/>.
Acesso em 13/04/2012.

CIAMPA, A. C. A estória do Severino e a história da Severina. São Paulo:


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v. 15, n. 1, p. 35-42, Junho de 2011.

FLORES, M. A. Dilemas e Desafios na formação de professores. In: Moraes, M.


C. et. al. Formação de Professores. Perspectivas Educacionais e Curriculares.
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FREIRE, P. Conscientização: teoria e prática da libertação. São Paulo: Mora-


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________. Educação e Mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.

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GUDSDORF, G. Professores para quê? Para uma pedagogia da pedagogia. São


Paulo, Martins Fontes, 1987.

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UNIDADE Psicologia da Educação e Formação de Professores

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Crônicas ao professor. São Paulo: Paulus, 2001, p.18-25.

PERRENOUD, P. Ensinar: agir na urgência, decidir na incerteza. Porto Alegre:


Artmed, 2001.

PIMENTEL, O professor em construção. Campinas. S.P.: Papiris, 1996.

SACRISTÁN, J. G. A educação que ainda é possível. Ensaios sobre uma cultura


para a educação. Porto Alegre: Artmed, 2007.

SANTANA, M. R. Bem estar/mal estar na profissão docente. Ambiguidade,


incerteza e outras patologias da identidade docente. In: ADÃO, A. e MARTINS E.
(org.) Os professores: identidades (re)construídas. Portugal, Lisboa: Universitárias
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SAVIANI, D. Formação de professores: aspectos históricos e teóricos do proble-


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