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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE LETRAS E ARTES


ESCOLA DE BELAS ARTES
DEPARTAMENTO BAE
BACHAREL EM ARTES VISUAIS - ESCULTURA

Escultura II

Joana Amora

Rio de Janeiro
2021
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Joana Amora

Escultura II - 2020.1

Monografia como requisito para conclusão


da disciplina Escultura II do professor e
doutor Floriano Romano

Rio de Janeiro
2021
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Sumário

● Palavras-chave ...……………………………………………………………………………… 4
● Resumo ………………………………………………………………………………………... 5
● Introdução …………………………………………………………………………………….. 6
● Os Jardins …………………………………………………………………………….. 8
● 2020.1 ……………………………………………………………………………………..… 10
● Trepadeiras ……………………………………………………………………….…. 11
● Kombucha …………………………………………………………………………… 19
● Antotipia e Pigmentos Naturais ……………………………………………….…… 24
● Terra ………………………………………………………………………………..... 32
● Bibliografia & Iconografia ……………………………………………………………….… 38
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Palavras-chave:

Vida

Cultivo

Relação
5

Resumo

A presente monografia pretende relatar e discorrer acerca das minhas investigações como
artista-jardineira no semestre de 2020.1. Baseando-se em uma contextualização sobre minha pesquisa
artística e uma história introdutória, o documento mostra imagens de pesquisas artísticas atuais,
relacionando-as poeticamente e desenvolvendo questões para futuros desdobramentos. As linhas de
pesquisa trabalhadas se interceptam dentro de questões da mutabilidade, relacionalidade, vida,
Natureza, site-specific e processos de cultivo, ou cultivo de processos. É possível perceber uma
metodologia artístico-científica que observa curiosamente os fenômenos naturais do mundo físico e
imaginário, bem como as relações afetivas e linguísticas humanas. Durante o período mencionado as
pesquisas abrangem os 3 reinos naturais, Vegetal, Animal e Fúngico, manifestando inconscientemente
uma busca integrativa que se interessa pelos diversos campos dessa Natureza múltipla, que envolve
tudo.
A pesquisa se mostra como uma ferramenta brincante de criação de novas possibilidades e
combina situações e realidades, para que se descubra existências possíveis mais sustentáveis de relação
humano-natureza. A partir disso, investiguei a Kombucha, as Trepadeiras, os possíveis Pigmentos e
Processos Fotográficos Naturais, bem como a relação simbiótica com Animais de Estimação e a
criação de um Mito.
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Introdução

Experimentação Agroecológica Sensorial I (Jardim I)


Parque Tecnológico da UFRJ
2018 - presente
(Registro de mini mutirão no Jardim - Pablo Piñar - 2019) 

“Escute a sua volta. A obra é um jardim sensorial-experimental-agroecológico que busca


induzir uma experiência de contemplação e atenção aos sentidos. Não se propõe um jardim
completamente pronto de início. A narrativa será considerada iniciada já com as sementes e
mudas ainda em estágios iniciais, que poderão ser observadas crescendo com o passar tempo.
Propondo aos visitantes-participantes observarem e experienciarem o jardim no momento,
contexto e condições em que ele for vivenciado, se induz ainda a fabulação de seu futuro. A
experimentação convida e incentiva todos visitantes-participantes a serem ativos, intervirem
no manejo e plantarem, e admite ainda seus passantes como elementos primordiais da
paisagem.”

(AMORA, 2018)
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“Joana Amora é artista-jardineira e pesquisadora multimídia. Se interessa em aprender com


a vida e busca investigar sobre jardins, paisagens, cultivo e cuidado de realidades. Como
artista-cientista, observa e experimenta os fenômenos naturais, cultivando obras vivas e
processos, por meio da co-criação com a Natureza. Pensando os jardins como sistemas, biomas,
paisagens, realidades, Amora elabora práticas artísticas que brincam com a ideia de um
todo-natureza, no qual criamos e somos criados pela realidade a todo momento.”

- Mini Bio da Artista

Desde 2018, quando fiz meu primeiro jardim, venho refletindo sobre a articulação entre a Arte
e a Natureza. Antes disso, eu já tinha dedos verdes desde pequena e ao entrar na Universidade, em
2017, descobri a Agroecologia, através da Rede de Agroecologia da UFRJ. A Permacultura eu já
conhecia, superficialmente, mas foi lá que isso se aprofundou e inclusive me fez buscar me certificar
posteriormente em Design de Permacultura. A permacultura se trata de uma forma de gerir recursos, de
forma planejada, integrada, estratégica e sustentável. A Agroecologia vai além, engloba a
Permacultura e muito mais. A Agroecologia se trata de um movimento político sócio-ambiental e fala
sobre soberania da própria saúde, e da saúde da Terra, através principalmente do alimento. Mas
basicamente, pelo menos para mim, ela fala de criar novas formas de se relacionar, consigo, com os
outros e com a Natureza. Formas essencialmente sustentáveis.
Nesse ano que citei, 2018, foi quando comecei a ter contato com uma história e reflexão mais
contemporânea da arte, na Faculdade. Das muitas sementes que me foram trazidas esse ano, por aulas e
pessoas diversas, comecei a entender que arte não precisava ser separada do meu fazer Agroecológico,
científico, político, ambiental. Ah, antes disso, eu pintava, e me lamentava de ter que sair da nossa
Agrofloresta no Fundão para ir pra casa pintar. Antes disso cheguei a fazer faculdade de Física
também, e me lamentava ter que sair da nossa Agrofloresta para ir pra casa estudar cálculo. Nesse ano
descobri os jardins, onde poderia unir tudo.
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De lá para cá, dois acontecimentos foram essenciais para que eu criasse o corpo de trabalho que
criei em torno do meu então objeto de estudo, o Jardim. O primeiro, foi eu ser selecionada em 2019
para participar de uma Residência na Ecovila Terra UNA (União Natureza e Arte), que viria a se
realizar somente ano passado. Essa Residência se chamava Arte e Magia. O segundo, foi conhecer o
GAE, Grupo de Pesquisa Arte: Ecologias, do qual sou bolsista PIBIAC, desde 2019. No GAE, me
encontrei entre outras pessoas-natureza, em meu habitat natural. Em nossas reuniões e pesquisa pude
ter o prazer de compartilhar de trocas teóricas e práticas férteis, que articulam desde ciência, ecologia,
arte, e artistas e teóricos que também tratam de ambos.
Depois do meu primeiro Jardim, após muito me alimentar de reflexões e referências teóricas,
nas disciplinas e no GAE, e depois de muita experiência prática de plantação através da Rede de
Agroecologia da UFRJ e da eco guerrilha urbana, que pratiquei na cidade do Rio de Janeiro, foi
somente em 2020 que todo esse Jardim artístico de fato brotou.
Em Terra UNA tive o prazer de trabalhar com terrários, bombas de sementes, cerâmica,
arranjos, canteiros agroflorestais, culinária, magia, coleta de sementes, terras e outros materiais vivos.
Manifestações do que eu tinha muito refletido da minha ideia de Jardins. Bem, então o que são os
jardins?

Os Jardins

Os jardins são sistemas complexos, plurisensoriais e multidimensionais, que articulam


experiências, seres e processos diversos em constante movimento; um organismo vivo composto de
muitas partes; um espaço de cultivo, crescimento e colheita; um recorte de realidade, uma realidade.
Foi a partir de “A Invenção da Paisagem”, de Anne Cauquelin, que foi plantada a semente. Essa
semente sobre paisagens e como elas são compostas por sentidos diversos muito além da visualidade, e
como uma paisagem evoca antes de tudo, um imaginário, uma fantasia (CAUQUELIN, 2007). Para
mim, um mito. Cauquelin que me atentou da “demagogia autoritária da visualidade”, como escreve, e a
partir disso que tomei confiança para manifestar as características artísticas que eu, dentro de mim, já
prezava (CAUQUELIN, 2007). Principalmente, um caráter processual, relacional, fantasioso, criativo
(em um sentido subversivo) e micropolítico (Como diria Suely Rolnik).
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“A paisagem é um recorte de realidade. Mas que aspectos podem ser explorados a partir da ideia desse
fenômeno complexo e sinestésico?

Mas mais precisamente, o que especifica uma paisagem como um jardim?

Se

especifica uma paisagem como um jardim

Ou toda paisagem

pode ser vista como um jardim?“


“Som, fotografia, vídeo, escrita, proposições de interação coletiva,
experimentações performáticas e bioesculturas (planta-esculturas,
corpo-esculturas, alimento-esculturas) seriam algumas linguagens e
possibilidades para se investigar. Desdobrar as imagens psíquicas do
Jardim e

das Paisagens; signo, significado, significante e referente que podem


surgir da comunicação a partir dessa ideia. A partir de experimentações
com os sentidos e sinestesias,

explorar as mais diversas linguagens e dimensões, espaciais ou não.”

(AMORA, 2018)
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2020.1

No semestre 2020.1, após toda a catarse durante Terra UNA que se estendeu à quarentena,
realizei uma pesquisa multimídia a partir de organismos vivos diversos, que considero trabalhos
vivos em andamento, dando procedimento a minha pesquisa pessoal como artista. Os trabalhos
apresentados durante o semestre permeiam:

- Métodos de fermentação como a Kombucha e experiências com o crescimento do


Scooby, que é a cultura de micro-organismos dessa fermentação;
- Estruturas preenchidas por plantas trepadeiras, como a grade do meu prédio,
acompanhado desde 2019, e o meu varal de roupa a partir de 2020;
- Pesquisa de extração de Pigmentos Naturais e de Fotografia Natural Vegetal, a
antotipia;
- Performances arte/vida com animais domésticos, a partir da convivência com a minha
própria gata, adotada no final de 2020.

Os trabalhos executados mostram um processo documental-científico-experimentativo a


partir de um olhar curioso perante os fenômenos naturais. A partir desses fenômenos e das
observações do mundo, minha pesquisa se dá através de questionamentos dos limites entre a
Natureza e o ser humano, ou a Natureza é Urbes, buscando descobrir e co-criar novas formas de
existir no mundo como pessoa-natureza.
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Trepadeiras
As trepadeiras são plantas capazes de subir ou se entrelaçar a objetos inanimados ou outros
seres vivos. Dentro da minha pesquisa, as trepadeiras são consideradas esculturas vivas, as quais se
pode observar uma característica de preenchimento compositivo de determinada paisagem. Esse
processo de preenchimento, explora também esses limites mencionados entre a Natureza e a Urbes. E
ilustra um processo de re-ocupação dessa Natureza viva e resiliente.

Atualmente, duas esculturas vivas se encontram em andamento, sendo uma intervenção na


grade do prédio onde habito e uma intervenção no varal de roupas da área do meu apartamento. As
duas trepadeiras pesquisadas principalmente nesses trabalhos, até agora, foram o maracujá e a
bertalha. Ambas as plantas são seres mais perenes que duram ciclos grandes de vida. O maracujá tem
um crescimento devagar e demorou para, visualmente, tomar potência na grade do prédio, já a
bertalha, demonstra um crescimento mais acelerado nas condições do bioma inserido. Essas
esculturas vivas demonstram, para além da visualidade, uma criação de paisagem relacional, na qual
cultivam percepções e realidades novas nos seres os quais passam e habitam os ecossistemas em que
vivem.

Desde 2019, quando, como ato subversivo, plantei o maracujá no jardim de meu prédio,
ciente da possibilidade dele ser retirado, me surpreendi com o afeto que foi criado pelos moradores
do prédio. Através de conversas, pude compreender a percepção da beleza criada na paisagem, por
essa escultura viva, e o afeto à imaginação de possíveis futuros Maracujás, que poderiam ser
comidos. A beleza da escultura viva se trata de criar imaginação de possibilidades, uma visualização,
uma projeção para realidade possíveis, integradas e sustentáveis. Realidades abundantes e prósperas
como a própria Natureza.

Ao longo do tempo, o maracujá cresceu e chegou a dar cerca de trinta frutas, os quais foram
recolhidos pelos moradores e passantes ainda verdes após um ataque de lagartas. A escultura, no
final do ano, teve todas as folhas completamente devoradas pelas predadoras, em cerca de dois dias.
O preenchimento foliar da composição dessa paisagem desapareceu e o acontecimento gerou tristeza
e desânimo aos moradores e habitantes da região. Porém, após a aplicação de algum inseticida
natural pelo Seu Almir, trabalhador do prédio, em alguns dias as folhas começaram a brotar com
muito vigor. Atualmente, a escultura se assemelha novamente a seu estado anterior ao ataque,
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trazendo esperança e felicidade novamente para o público que vive essa grande narrativa da
Natureza.

Título: “ ​Maracujá sobre Grade”

“Plantado em 2019, ao colocarem a grade na frente do prédio, o


maracujá cresce. A intervenção é uma ação de militância, uma ação de
resistência à desconexão com a Natureza, com o alimento, um ato de
apropriação dos limites impostos. O maracujá é uma escultura viva, que
toma conta da grade através do espaço e do tempo. Essa escultura
ambiental cria conexão, empatia, relação e logo se tornou parte da
vizinhança, e parte do campo afetivo daqueles que habitam essa
paisagem. Causando emoção, alegria, tristeza. Mais animado que
futebol. Nesse mais de 1 ano ai, foram cerca de 40 maracujás, centenas
de lagartas e algumas dezenas de registros, dessa obra em processo e
em constante mutação. Um trabalho que observo, mexo, mas acima de
tudo aguardo.

Aí foi maracujá e um carázinho que tarda a crescer. Mas eu quero


mesmo é compor essa grade com trepadeiras diversas, de formatos e
cores diferentes. As próximas da lista são a bertalha e feijão.”

(AMORA, 2020)
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03.12.20

08.12.20

03.02.20
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Outra intervenção com trepadeiras foi, então, executada dentro do meu próprio apartamento e
vinha de um desejo de pelo menos um ano. Já sonhava em plantar maracujá em um varal de roupa
fazia um tempo, e me encantava e encanta a possibilidade de confundir ações cotidianas urbanas com
uma realidade rural. A partir disso, e da oportunidade de experimentação vinda do fato de eu estar
sozinha em casa durante esse período pandêmico, pude finalmente reservar um dos varais de roupa
apenas para este trabalho artístico. Daí, visto que o maracujá não se desenvolve bem dentro de um
apartamento por conta da luminosidade e falta de espaço, experimentei a intervenção a partir de
outras trepadeiras, concomitantemente, como: o Feijão, a Ora-pro-nóbis e a Bertalha. A Bertalha foi
a que se desenvolveu mais rápido e com mais vigor, possivelmente devido ao fato de estar muito
tempo em meu vaso e por ter uma propagação rápida mesmo. A experiência pretende ser um
protótipo para um projeto de instalação a ser apresentado ao edital da Bienal de Veneza 2022. Por
enquanto, chamo ludicamente esse trabalho de “Cipó”.

Rascunho e listagem de possibilidades de trepadeiras para o trabalho.


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Montagens-rascunhos
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Último registro
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Kombucha

A pesquisa artística a partir da Kombucha se deu através do consumo semanal da bebida.


Virou um hábito beber o líquido probiótico, de enormes benefícios para a saúde, e logo busquei saber
como produzi-lo eu mesma. Ao descobrir que para cultivar essa colônia eu não precisaria ter o
Scooby (que é considerado a muda da Kombucha), vi que a partir somente de uma bebida pronta eu
poderia começar meu cultivo. Necessitando apenas chá, açúcar e paciência. Durante meu estudo para
realização da minha colônia, descobri que o Scooby, que se trata de uma esponja a qual fica na
superfície do líquido boiando, cresce e se adequa dimensionalmente ao formato do recipiente o qual
se encontra.

A partir disso surgiu a vontade de brincar com esse fenômeno natural pensando em futuras
esculturas de vidro as quais poderiam moldar formas não-convencionais de Scooby. Pensando nos
recipientes e formatos os quais havia disponíveis, experimentei duas dimensões possíveis, e
experimentei a possibilidade de pigmentação natural dessa Esponja viva. Essa pesquisa de
pigmentação surgiu entrelaçando minhas descobertas com a antotipia e os pigmentos naturais.

Penso que essas futuras grandes esculturas de vidro possam moldar colônias de Kombucha
em exposições, ao mesmo tempo que possam oferecer o consumo da bebida aos visitantes.
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Cultivo de Kombucha em jarro grande de vidro


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Scooby do cultivo
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Cultivo de Kombucha em forma retangular. Feito e colorido a partir de chá de Hibisco.


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Scooby produzido
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Antotipia e Pigmentos Naturais


A Antotipia é uma técnica de fotografia alternativa natural. Processos fotográficos
alternativos me interessam desde 2018, quando realizei um curso no Instituto Moreira Salles. Lá,
conheci a Cianotipia, o Fotograma e outra técnica a qual não me lembro o nome. A Antotipia se
assemelha ao processo da Cianotipia, mas ao invés de uma emulsão química, usamos emulsões
realizadas a partir de substâncias vegetais. O processo fotográfico se dá também de forma oposta da
Cianotipia, a qual produz pigmento nos locais sob exposição do sol, já na Antotipia, se perde
pigmento nos locais sob exposição ao sol, imprimindo, em ambos processos, o negativo colocado
sobre o papel ou tecido emulsionado.

Em 2020, conheci essa técnica a partir de uma oficina de apenas 2 horas, disponibilizada por
um projeto virtual chamado Duna Project. Nele já me apaixonei pelo fazer. Esse ano, descobri o
curso oferecido por Denise Cathilina na EAV, o qual seriam dias diversos e poderia realizar um
aprofundamento maior. Logo, me animei a fazer. A partir dos ensinamentos de proposições da
Denise, fomos instigados a buscar, experimentar e catalogar vegetais diversos, e anotamos como
cada um realizava esse processo fotográfico.

A partir disso, realizei como proposto por ela, um caderno. Nele fiz diretamente as Antotipias
e registrei algumas informações da experimentação. No curso, aprendemos também a técnica de
Fitotipia e Ecoprints, porém mais superficialmente. As minhas experimentações acabaram se dando
de modo a testar o processo, muito mais do que as composições e visualidades possíveis a partir dele.
Portanto, segundo Denise, o próprio caderno poderia se tratar do meu trabalho artístico. Um trabalho
de investigação.

Uma única experimentação de Fitotipia foi realizada por mim. Essa técnica permite
registrarmos momentaneamente impressões fotográficas sobre a superfície de folhas. Embora tenha
me dedicado pouco a ela, me interessa muito o fato de, opostamente a Antotipia, fotografarmos sobre
a folha, sem processá-la.

Durante o curso, uma emulsão esquecida na geladeira da oficina do ano anterior, me fez
descobrir acidentalmente um processo possível de extração de pigmentos naturais. Após alguns
meses na geladeira, a solução de álcool com cúrcuma, que havia sido mantida descoberta em um
pote, evaporou. Todo o álcool sumiu deixando somente o pó do pigmento da cúrcuma. Atualmente,
experimento o mesmo processo com outras substâncias vegetais.
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Processos de Antotipia - Exposição ao sol


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Beterraba esfregada sobre o papel


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Registros do caderno
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Fitotipia realizada sobre folha de suculenta


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Processamento de cenoura com álcool para extração de pigmento


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Terra

Terra é minha gata, adotada em Novembro de 2020. Ao realizar uma residência junto a
colegas da EBA, no sítio de uma de nós, lá em Areal, essa pequena filhote recém nascida foi deixada
em frente ao portão de entrada, sem ter quem adotá-la. Eu já queria uma gata, 1 mês antes disso
coloquei uma estatueta de gato sobre minha mesa, a qual desejava ritualizar e me alimentar de suas
energias felinas. Quando criança, assisti muito o filme “Mulher Gato”, com Halle Berry, e meu ato
simbólico me projetava nesse mito. Terra veio para mim desse pedido, acredito eu.

Trouxe-a para casa sem ter certeza de assumir tal responsabilidade. Mas com poucos dias já
dizia que a amava o tempo todo, era tarde demais. Dei a ela esse nome para que pudesse cuidar da
Terra. Me lembro muito do filme “Os Homens de Preto”, nele, existe um gato que carrega a galáxia
de Órion na coleira. Queria que Terra fosse um astro. Grande, enorme, em um corpo de escala
humana, ou menor ainda. Bem queria esse diálogo com o planeta, e a vi como Deusa Terra, essa
pequena gata que veio atender meu chamado. Terra veio da terra, nasceu no mato e retornará a ele
muitas vezes ainda. Essa gata a qual já adestrei tão bem que realiza truques como rodar e sentar, e
que passeia comigo pelas ruas da vizinhança. Um dia Terra viajará pela Terra comigo. E também me
acompanhará no meu semi-êxodo urbano.

Nesse tempo Terra triplicou de tamanho, aprendeu a passear pelos vasos de minha casa,
pegou e se livrou de pulga, destruiu muito arranjos da minha casa, se apropriou das paisagens e
construções que criei para ela e me fez bem. Um bem que sei que a faço também. Desse afeto,
surgiram as “Construções para a Terra” (Construções que pretendo elaborar como instalações de
escalas maiores no futuro), “Paisagens para Terra” (Pequenas tentativas de aproximação desse lar ao
lugar de onde ela veio) e “Diálogos com a Terra” (Esse, mais imaterial, e se trata do meu falar
cotidiano com esse Mito-Gata).

Essa experiência imaginativa e lúdica me remete de forma humorística a Joseph Beuys e o


Jaguar. Entretanto, essa se trata de uma performance que durará uns anos, até o fim da vida, meu ou
da Terra.
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Terra com 1 / 2 meses de idade


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Experimentação de “Caixa de Serrapilheira”


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“Construção para Terra” no banheiro


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“Paisagem para Terra” na sala


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Vaso de Terra
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Bibliografia e Iconografia

DEREN, Maya. ​At Land​. 1944. Disponível em: ​https://youtu.be/SB_qluIAeJ4​. Acesso em: 4 de
novembro de 2020.

BUSCHBACHER, Robert, ​A TEORIA DA RESILIÊNCIA E OS SISTEMAS


SOCIOECOLÓGICOS​: COMO SE PREPARAR PARA UM FUTURO IMPREVISÍVEL?. 2014

CAUQUELIN, Anne. ​A Invenção da Paisagem​. Martins Fontes, 2007.

BIOY, Adolfo. ​A Invenção de Morel​. Rocco, 1986.

FOUCAULT, Michel. ​O corpo utópico, as heterotopias. Posfácio de Daniel Defert. ​São Paulo. N-1
Edições,​ ​1966.

CAMPBELL, Joseph. ​O Poder do Mito.​ 1988.

GROSSMAN, Evelyne. ​Corpos hipersensíveis: Para além da diferença dos sexos​. 1ª edição. São
Paulo. Zazie Edições, 2016.

KRENAK, Ailton. ​Constelações Insurgentes: Fim do Mundo e Outros Mundos Possíveis. 2019.
Disponível em: ​https://www.youtube.com/watch?v=k5SP0GHjWfw​. Acesso em: 4 de novembro de
2020.

ROLNIK, Suelly, ​Cartografia Sentimental. Transformações contemporâneas do desejo​. Estação


Liberdade, São Paulo, 1989.

GIL, José. ​Abrir Corpo​. Artigo publicado no livro Corpo, Arte e Clínica, organizado por Tania Mara
Galli Fonseca e Selda Engelman. Porto Alegre: Ed.UFRGS, 2004.

COCCIA, Emanuele. ​A Vida das Plantas​. 2ª edição. Lisboa. Editora ​Documenta,​ 2019.

MENNA, Jorge. ​Seminario Entre campo y campo: arte + agroecología​, con Lena Ortega, Sebastián
Lomelí y Jorge Menna. 2020. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=dwEfAIQ_gLI&t=3267s​. Acesso em: 23 de Fevereiro de 2020

KINNUP, Valdely. ​Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC) no Brasil​. 4ª edição. São
Paulo. IPSIS Gráfica e Editora, 2019

LEE, Rita. ​Rita Lee: Uma autobiografia. ​1ª edição. São Paulo. Globo Livros, 2017

AMORA, Joana. Projeto ​“Desdobramentos do Jardim”​ para Residência Arte e Magia em Terra
UNA. 2019

AMORA, Joana. Texto sobre ​“Maracujá sobre grade”​. 2020

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