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2011anoVn9p83
Dinafilmes e o Cineclubismo:
a distribuição alternativa de
curtas-metragem durante a
década de 1970 no Brasil
Resumo
Este artigo discorre a respeito da organização do cineclubismo durante a década de 1970 no
Brasil. Suas bandeiras, suas controvérsias e disputas internas de poder. Vislumbra o circuito
cineclubista e sua relação com a produção de curtas-metragem à época, bem como discute,
também, uma das principais iniciativas desse movimento social organizado: a criação de sua
própria distribuidora independente de filmes, a Dinafilmes.
Palavras-chave: Audiovisual; Política cultural; Cineclubismo; Curta-metragem.
Abstract
This article talks about the film clubs organization during the 1970’s in Braszil. Their flags, their
controversies and internal power disputes. Sees the film clubs circuit and their relationship with the
production of short films at the time, and also discusses one of the main initiatives of organized
social movement: the creation of his own independent film distributor, the Dinafilmes.
Keywords: Audio-visual; Cultural policy; Film clubs; Short film.
Dinafilmes e o Cineclubismo:
a distribuição alternativa de curtas-metragem durante a
década de 1970 no Brasil
Novo geraria uma série de contradições de filmes, qualquer cineclube pode ter certeza
e divergências no interior do movimento de que não conseguirá uma programação
decente (VIII JORNADA NACIONAL DE
cineclubista, ainda mais com a apropriação CINECLUBES, 1974, p. 2).
deste mesmo discurso por parte do Estado
ditatorial e sua crescente interferência Além desta constatação, analisa-se as
nos meios culturais no mesmo período. saídas que já vinham sendo tomadas pelas
Entretanto, deveremos abordar isto com mais associações:
detalhes no decorrer do texto.
A s d i f i c u l d a d e s s e m p re f o ra m a Esta situação leva os cineclubes localizados
realidade para o cineclubismo. Problemas fora do eixo Rio/São Paulo a deparar-se
com duas alternativas principais: Estabelecer
financeiros, de espaço físico, com a censura
informalmente acordos com os exibidores
e, principalmente, com a locação de filmes, comerciais locais. Desse modo, o cineclube
estiveram entre as preocupações desta passa a trabalhar com o 35mm, abandonando
atividade, realizada, quase sempre, por suas projeções em 16mm. Estes acordos, de
um modo geral, tendem a tornar o cineclube
pessoas realmente interessadas em cinema. dependente da sala comercial, passando a
A obtenção de filmes para a programação aceitar determinadas exigências do exibidor,
dos cineclubes esbarrava ou na falta de que após um período de institucionalização
das sessões promovidas pelo cineclube,
títulos na bitola 16mm (‘bitola consagrada
aproveita o prestígio conquistado para impor
nos cineclubes’) ou na falta de um projetor a programação que lhe interesse ou criar
35mm por parte das associações, além, claro, obstáculos fictícios para que os filmes do
da falta de dinheiro para pagar a locação dos seu interesse possam ser programados (VIII
JORNADA NACIONAL DE CINECLUBES,
filmes que, em boa parte, eram alugados 1974, p. 2).
junto a distribuidoras comerciais. Algo que
ilustra bem esta situação é um trecho de um Não são poucos os cineclubes brasileiros
relatório entregue na VIII Jornada Nacional que adotaram este tipo de organização para
de Cineclubes1, do Cineclube Glauber Rocha sobreviver, o que acabou por acarretar em
do Rio de Janeiro, a respeito deste assunto: uma acomodação que ‘descaracteriza a
atividade cineclubista’, já que havia pouca
A experiência com as distribuidoras: O
mercado consumidor de 16mm, como o de possibilidade de decisão dos filmes a serem
35mm, está voltado essencialmente para a projetados, além do cinema brasileiro ficar
produção comercial. Por opção do consumidor relegado a pouquíssimas exibições.
ou imposição das distribuidoras, o fato é que
Além disso, a outra saída possível era:
apenas os filmes com sucesso de bilheteria são
copiados em 16mm. Isto garante o ridículo “Realizar uma programação exclusiva ou
investimento que a copiagem representa para paralela ao do ‘cinema de arte’, de filmes
as distribuidoras, e também ridículas opções emprestados por embaixadas e consulados,
para os cineclubes. Filmes nacionais, nem
pensar – se não rendem em 35mm, imaginem sempre na bitola 16mm.”
em 16mm. Graças a essa extraordinária visão
empresarial das distribuidoras, que também é Mesmo sendo gratuita, e muito bem
responsável pelo péssimo estado de algumas organizada, em contraposição as distribuidoras
cópias e o mau estado da maioria, pelos preços comerciais dessa bitola, as filmotecas de
flutuantes e absurdos, pelos ‘furos’ na reserva legações estrangeiras tem o interesse em
A VIII Jornada Nacional de Cineclubes foi realizada em Curitiba, e marca a retomada desta prática no meio cineclubista.
1
divulgar filmes que em geral veiculam parte de seu acervo em 16mm, para os
propaganda dos países de origem, ou em cineclubes. A idéia inicial era criar essa
divulgar institucionalmente o país onde o filme
é produzido (VIII JORNADA NACIONAL DE distribuidora possivelmente com base nesta
CINECLUBES, 1974, p. 3). Cinemateca. No entanto, de 1975 para 1976
a FCB deixou o movimento, cedendo seu
O que, muitas vezes, acaba por fazer do acervo em 16mm para a Federação Paulista
cineclube um instrumento de propaganda de Cineclubes. Por ter esse acervo em mãos,
estrangeira. Muitos dos consulados que a Federação Paulista ficou encarregada
desempenham este papel tem em suas de montar a sede da distribuidora (FILME
filmotecas produções de “real interesse CULTURA, maio 1983, p. 54). No mesmo
fílmico” mas, no todo, essas produções são ano ela começou a funcionar em caráter
uma parcela mínima dos filmes. experimental, somente em São Paulo, e no
Por estes motivos, desde a retomada dos resto do país até o final do mesmo.
encontros nacionais de cineclubes se pensou Os objetivos da distribuidora seriam,
em criar uma distribuidora independe e principalmente, “garantir o acesso dos
centralizada para o movimento. Apontava- cineclubes aos filmes em escala nacional,
se para isso em documento (item 2 – e livre de injunções de caráter comercial e
Distribuidora Nacional de Filmes em 16mm) da censura.” Além, claro, de se caracterizar
produzido no mesmo encontro: como um canal “alternativo de distribuição de
filmes.” (FILME CULTURA, maio 1983, p. 54).
Os participantes da 9º Jornada Nacional O curta-metragem seria, também, uma
de Cineclubes concordam unanimemente
grande preocupação da Dinafilme. Pois sendo
que sejam reunidos os esforços para o
estabelecimento de uma distribuidora de este um produto cultural quase sempre
filmes predominantemente brasileiros, ligada independente e fora dos círculos oficiais,
ao Conselho Nacional de Cineclubes, como encontraria nos cineclubes um circuito para
medida inadiável para que surjam uma opção
concreta para os cineclubes, principalmente sua divulgação. Ou seja, transformar o
aqueles localizados fora dos centros de cineclube em mercado consumidor de curtas,
distribuição e produção (VIII JORNADA de modo a fazer com que este processo se
NACIONAL DE CINECLUBES, 1974, p. 3).
auto-gerisse. Algo que não se concretizou por
uma série de motivos, além de gerar polêmica
Sendo que, segundo o documento, esta
e protestos por parte de alguns, o que
distribuidora não poderia ter características
veremos mais detalhadamente na sequência.
‘amadoras’, nem um ‘espírito paternalista’
O filme curto caracteriza-se como um
que, desta forma, frustraria a tentativa dos
espaço de invenção, de aprendizado, de
cineclubes brasileiros em sanar seu principal
autoria, que por estes motivos ganha fácil do
problema: a falta de filmes.
grande cinema no que diz respeito à pesquisa
Então, na X Jornada Nacional de
de linguagem e ao impacto de seus temas.
Cineclubes, em 1976, foi ratificada a criação
Todavia, fica relegado a um gueto cultural,
da Dinafilme, distribuidora do movimento.
tanto pela falta de incentivo das entidades
Nesse mesmo contexto, em São Paulo, havia
privadas, quanto pelos órgãos oficiais. No
a Fundação Cinemateca Brasileira (FCB),
final da década de 1960 e durante a década
que na época era um pólo importante do
de 1970, leis e incentivos foram criados, mas
movimento cineclubista, e que já distribuía
não o suficiente para que o curta-metragem
se desenvolvesse ao nível esperado por seus edição, com duas realizações: Dom Orione –
realizadores. Uma pequena Obra e Ô Xente, Pois não, deu
Havia por parte do Estado, em seu discurso as seguintes declarações, na ocasião:
pelo menos, uma política de incentivo a
produção desse tipo de filmes, o que podemos Quanto ao problema do curta-metragem,
especificamente, acho que ele não existe,
observar no pronunciamento do presidente do na prática, no Brasil. Ou melhor, existe pelo
INC (Instituto Nacional de Cinema), (Carlos esforço das pessoas que fazem filmes curtos,
Guimarães de Matos Júnior), por ocasião do mas como fenômeno cultural e social não
existe. Curta metragem, oficialmente, é uma
I Congresso da Indústria Cinematográfica
ficção. Há leis que o protegem, discussões,
Brasileira, realizado em 1972: comunicados de que vai ser feito aquilo, mas de
fato, esta proteção até hoje não foi efetivada.
No setor de curta-metragem importante [...] Como cineasta de curta-metragem sinto-
sob o prisma cultural, o INC atua sobretudo me inteiramente marginalizado, apesar de ter
através da obrigatoriedade de exibição dos ganho um prêmio e ter conseguido mostrar
filmes merecedores do Certificado Especial[2]. meus filmes[...] (ASSIS, mar. 1974, p. 45)
Atenta aos problemas que persistem na
produção de curtos, a Autarquia constituiu
recentemente um Grupo de Trabalho com a
O que podemos observar na declaração
missão de estudar tanto o aperfeiçoamento é a forma pela qual o realizador de curtas-
dos estímulos já existentes, quanto a criação metragens encarava a situação deste tipo de
de novos incentivos. O INC tem adquirido
produção. Falando da falta de distribuição e
para seu acervo as mais expressivas produções
de curta-metragem e tem contribuído com da falta de um apoio mais contundente por
prêmios em dinheiro para a premiação dos parte do Estado, deixa claro sua indignação.
melhores realizadores de curtos em festivais. As reivindicações que nos chamam mais a
(FILME CULTURA, dez. 1973, p. 10)
atenção são as com relação à criação de um
mercado para o curta, evocando a Embrafilme
No início dos anos 70, um dos únicos
para a distribuição dos filmes. Além disso, o
festivais dedicados ao formato era o Festival
apontamento da reunião dos realizadores
Brasileiro de Curta Metragem, no Rio de
em torno de associações, como a Associação
Janeiro, uma realização do Jornal do Brasil,
Brasileira de Documentaristas, e do próprio
com premiação oferecida pelo INC, que
cineclubismo são muito elucidativas.
vigorou durante boa parte da década,
Já em 1975 foi criado pelo INC uma nova
começando em 1971. No entanto, se
lei, a lei nº 6.281, que determinava a exibição
ouvirmos os depoimentos de alguns dos
compulsória para o filme curto brasileiro de
realizadores que ganharam prêmios no III
cunho cultural. A chamada ‘lei do curta’ que,
Festival, realizado em 1973, poderemos
no entanto, só foi regulamentada após o
constatar seus descontentamentos em
desmantelamento do Instituto Nacional de
relação ao filme curto, e seus incentivos
Cinema e suas funções passadas ao novo
oficiais. Depoimentos, estes, dados à revista
órgão regulador, o CONCINE. Este, por sua
da Embrafilme, Filme Cultura.
vez, aprovou a resolução nº 18 em 24 de
Joaquim Assis, curtametragista que
agosto de 1977 que, entre outras coisas,
conquistou o primeiro lugar do Festival, nesta
estabeleceu:
RESOLUÇÃO INC Nº 04, de 12 de maio de 1967. (MELLO, Alcino Teixeira de; Legislação do Cinema Brasileiro: atualizada e
2
comentada: Resoluções do INC, Convênios, Acordos[...] Vol. II – Embrafilme, Rio de Janeiro, 1978. Pg. 309) Obrigatoriedade de
exibição em salas de cinema comerciais.
a) que o curta-metragem teria a duração ocorre é que por suas diversas falhas, e pela
superior a cinco e inferior a 30 minutos; falta de fiscalização dos órgãos competentes,
b) criou o CPB (Certificado de Produto
Brasileiro) que, entre outras coisas, seria os exibidores descobriram formas do não
restrito a filmes de natureza técnica, científica cumprimento da lei. Pois, como Sergio
ou cultural, sem poder apresentar matéria Santeiro, realizador e presidente da ABD em
publicitária de qualquer natureza;
1983, disse:
c) que o curta-metragem nacional seria
exibido acompanhando todo e qualquer longa
estrangeiro, e a ele caberia 5% da renda bruta O descaminho da lei do curta permitiu a
arrecada; florecência de uma área predatória de produção
d) que durante um ano, esta exibição seria que causou um xeque-mate à produção
restrita aos estados do Rio de Janeiro e São cultural e realizadores independentes. [...]
Paulo (mais de 2/3 do mercado total), salvo nos com a precária distribuição do curta cultural,
cinemas que exibissem em programa duplo um os exibidores passaram não só a determinar o
longa brasileiro ao lado do longa estrangeiro. mercado, como em pouco tempo descobriram
Findo este período, a obrigatoriedade se como burlar a lei de duas maneiras. Uma,
ampliaria para todo território nacional; não respeitando [...], a distribuição eqüitativa
e) que o filme vendido a preço fixo teria da receita por todos os filmes habilitados ao
cassado o CPB; mercado; outra, comprando filmes diretamente
f) que cada produtora não poderia receber aos produtores com recibos ‘frios’ e passando
CPBs relativos a mais de cinco curtas- diretamente a produzir filmes para cumprir a
metragens. (CURTA-METRAGEM, maio lei (SANTEIRO , maio 1983, p. 42).
1983, p. 37)
Além destas questões, outra constatação
Após sua regulação, e ter sido posta em importante, em relação a esta nova legislação
prática, a ‘lei do curta’ passou por diversas a respeito da produção mais alternativa, fora
modificações, como, por exemplo: a isenção do ‘ mercado’ ligados ao curta-metragem
dos cinemas em 16mm da obrigatoriedade, – encontrada na revista Cine Olho, (que
restringindo a concessão dos CPBs somente demonstrava um caráter contestador, feita por
a filmes em 35mm (o que foi uma enorme alunos de cinema da PUC do Rio de Janeiro):
contradição, pois a bitola 16mm sempre foi
muito utilizada para produções de curtas); [...] o CONCINE não reconheceu o filme
curta-metragem produzido pelo autor fora
as várias modificações dos membros da
dos esquemas tradicionais de produção, na
comissão fornecedora dos CPBs, visando um base do ‘fulano descola uma camera, outro
aprimoramento maior dos critérios de seleção tem o negativo e entre trancos, barrancos,
(fenômeno que só ocorreu pela enorme e dívidas, vamos lá’, apesar deste esquema
ser muito comum no Brasil. Isso obriga a que
quantidade de filme curtos de má qualidade o autor independente, que deseje atingir o
que receberam os CPBs) etc. Todavia, uma mercado tradicional e alternativo produza os
das falhas que nem se procurou solucionar seus filmes em esquemas não usuais, transe
com uma produtora para a obtenção do
foi a exibição de curtos somente com
Certificado, o que pode gerar alguma distorção
longas estrangeiros, isentando as produções ou picaretagem (SANTOS, jun. 1977, p. 7).
brasileiras.
Esta lei criou uma reserva de mercado Em relação ao mercado alternativo
para o filme curto que teria, em tese, sua para o curta-metragem, que seria a rede de
distribuição e uma remuneração garantida. cineclubes ligados ao Conselho Nacional de
Isto geraria uma auto-manutenção deste Cineclubes com a distribuição da Dinafime,
mesmo circuito. Mas, na verdade, o que podemos verificar que o que acontecia
não era muito diferente. Na verdade, o que Embrafilme e sua orientação comercial, com
ocorria era uma situação em que havia a um relação ao dito ‘mercado paralelo’:
público ávido por produções e uma rede
interligada de cineclubes, mas que funcionava [ . . . ] a c e n s u ra b re c o u b r u s c a m e n t e
os descaminhos do filme ‘Assuntina das
em condições precárias por não ter recursos Américas’, [...], um alívio para a Embrafilme,
suficientes. No entanto, havia a consciência que não se manifestou na ocasião[...] Aliás isto
de que este esquema poderia dar certo. vem deixar cada vez mais claro a conivência
de uma área cultural pátria com a cesura.
Em entrevista dada na mesma revista acima
Afinal o filme de Rosemberg, [...], abre
citada, Cacá Diegues – figura importante na um debate na área da produção cultural
discussão do cinema na época – inquirido cinematográfica, que é exatamente um
a respeito do ‘circuito paralelo para o filme incomodo para os cinemanovistas que se
apossaram da Embrafilme. [Pois] No segmento
16mm’, se pronunciou da seguinte maneira final do filme o que está em questão é a
(falando somente do ambiente universitário) : relação do cinema empresarial e a Embrafilme.
[...] Assuntina descansava nas prateleiras da
[...] acho que o circuito universitário brasileiro Embrafilme há 2 anos, sem ter distribuição
está maduro para um circuito cinematográfico. nem ampliação. Foi feito num momento em
Existem universidades, cine-clubes suficientes que a Embrafilme começava. Nessa época
pelo Brasil afora que comportam já a existência falava-se muito de um mercado paralelo para
dessa rêde. Acho que as pessoas interessadas o 16mm nas Universidades e cineclubes. O
por isso tem que exigir o cumprimento deste copião do filme 16mm estava pronto, mas
programa. Como você vai fazer um circuito faltava montar e sonorizar. A Embrafilme
universitário num país grande como esse, se autorizou a verba ficar com os direitos de
você não tem nenhuma colaboração do poder distribuição. Nessa mesma época completou
oficial, ou de um poder qualquer, de alguém a filmagem de 3 outros 16mm, [...] Chegou-se
que tenha dinheiro que pague suas viagens, a pensar seriamente que o mercado paralelo
que compre suas cópias? Cinema não é poesia. daria certo. Mas a coisa parou aí. Ela ficou com
Cinema custa dinheiro (DIEGUES, jun. 1977, os direitos de distribuição e guardou os filmes
p. 13). na prateleira. Ao invés de incentivar a produção
de 16mm, passou a produzir os filmes de
35mm de diretores cinemanovistas, que não
Além disso, ele incitava a cobrança, por tinham rendido no mercado, e a distribui-los
parte dos interessados, junto aos órgãos para cineclubes. Ao mesmo tempo passou a
estatais, dizendo que: “[...] a primeira coisa investir em caras e bem cuidadas produções
em 35mm (ANTOUN, dez. 1977, p. 10).
que precisa é ter meios para efetivar este
circuito paralelo. E quem tem meios para que
Além destas discussões entre os
isso aconteça é a Embrafilme.” (DIEGUES, jun.
realizares e os órgãos estatais, encontramos
1977, p. 13).
divergências entre os próprios grupos
No número seguinte desta mesma revista
cineclubistas, estes, também, interessados
há o relato de um episódio de censura a filmes
na criação do circuito paralelo para filmes
ocorrido no Festival de Brasília de 1977.
alternativos. A revista Cine Olho, em edição
É interessante, para nós, prestar atenção à
especial dedicada à cobertura da XI Jornada
censura de um filme, mais especificamente o
Nacional de Cineclubes3, da qual tiramos as
de Luiz Rosemberg, ‘Assuntina das Américas’,
últimas citações, narra o ponto de vista do
muito elucidativo no que diz respeito à
3
XI JORNADA NACIONAL DE CINECLUBES, realizada em 1977 na cidade Campina Grande, no Estado da Paraíba.
Por isso nunca chega a ser um mercado . resultados concretos na bitola de 16mm
[Mas] [...] se não existe um mercado, como e não parece inviável uma variante em
a Dinafilme sobrevive? Sobrevive porque ela Super 8, levadas em consideração todas as
não é uma empresa comum, porque ela paga características e restrições desta bitola. Em face
mal às pessoas, por que quem trabalha na da necessidade de transmitir o conhecimento
Dinafilme são militantes cineclubistas, quer básico de cinema, no que tange à expressão
dizer, trabalham por idealismo [...]. Por isso é através de sua linguagem e aos aspectos
que ela sobrevive: não tem condição realista técnicos e econômicos da sua realização,
de sobrevivência (FILME CULTURA, maio os cineclubes podem e devem atuar como
1983, p. 54). núcleos geradores, desse conhecimento. Se
efetivadas essas possibilidades de distribuição,
nada poderá impedir que os cineclubes possam
Paralelamente à distribuição de filmes exercer também uma função de realização,
existe, também, desde a retomada do ajudando a transformar o Super 8 de simples
movimento cineclubista em meados do início aparato tecnológico em instrumento a serviço
da comunicação e expressão humanas. A
da década de 1970, a idéia de incentivo
Jornada recomenda aos cineclubes que
à produção dos próprios cineclubes. Isto encarem a possibilidade de substituir os cursos
se deu, muito, por causa da entrada no tradicionais de cinema por formas ativas de
mercado de artigos cinematográficos de transmissão de conhecimento, que incorporam
a utilização do Super 8 [...]. (IX JORNADA
uma nova tecnologia: a bitola Super-8. Esta NACIONAL DE CINECLUBES, 1975)
bitola, entre outras coisas, barateava o custo
da produção em conseqüência dos preços Como podemos constatar, os cineclubistas
de seus equipamentos como câmeras, já estavam interessados em implantar a
projetores, filmes, etc., em relação a outros tecnologia e as possibilidades da bitola às
suportes de cinema (16mm, 35mm). Isto fez práticas dos cineclubes, tendo em vista, até
com que um número bem maior de pessoas sua incorporação, em tese, ao pretendido
tivesse acesso à produção cinematográfica. ‘mercado alternativo’ de filmes, juntamente
Podemos detectar as perspectivas que à bitola 16mm.
esta bitola proporcionou ao movimento No item dois, “A função do Cineclubismo”,
cineclubista em documento da IX Jornada do documento “Avançar com o trabalho
Nacional de Cineclubes, de 1975, em Cineclubista” da XII Jornada Nacional de
Campinas (São Paulo): Cineclubes (Caxias do Sul – RS), datado
de 1978, podemos averiguar os mesmos
Hoje deparamos com uma perspectiva inédita:
a difusão do cinema amador, resultante apontamentos, nestes seguintes artigos:
da larga aceitação do Super 8, ocorre num
momento em que o cineclubismo é retomado 6 – Incentivo à produção cinematográfica dos
como proposta de ação em prol da cultura cineclubes através da organização de centros
cinematográfica e em defesa do cinema de produção, junto às federações, procurando
brasileiro em particular, o que permite entrever reunir equipamento a ser utilizado pelos
uma conjugação fértil das duas manifestações. cineclubes.
Se, por um lado, as oportunidades de veiculação 7 – Lutar por meios que permitam a
assim mesmo restrita do Super 8 estiveram, obtenção de financiamento para a produção
até agora, inevitavelmente condicionadas cinematográfica dos cineclubes, realizada de
às mostras e festivais esporádicos, por outro forma independente pelos cineclubistas.
já se presencia a articulação, em escala 8 – Promover a circulação da produção em
nacional, dos cineclubes como mercado filmes Super 8, tanto no âmbito regional de
alternativo para filmes marginalizados pelas funcionamento da Dinafilme, como também
vias tradicionais de exibição. O Mercado em nível nacional (XII JORNADA NACIONAL
Paralelo, como foi denominado, já obtém DE CINECLUBES, 1978).
mostra deste impulso; da tentativa de um MELLO, Alcino Teixeira de; Legislação do Cinema
‘mercado paralelo’ também é, e a produção Brasileiro: atualizada e comentada: Resoluções do
INC, Convênios, Acordos[...] Vol. II, Rio de Janeiro
em Super – 8 é mais um fator que traz novas – RJ: Embrafilme, 1978.
possibilidades e também desavenças dentro
RESOLUÇÃO INC Nº 04, de 12 de maio de 1967.
desse processo. (MELLO, Alcino Teixeira de; Legislação do Cinema
Brasileiro: atualizada e comentada: Resoluções do
Referências bibliográficas INC, Convênios, Acordos[...] Vol. II – Embrafilme,
Rio de Janeiro, 1978. Pg. 309) Obrigatoriedade
de exibição em salas de cinema comerciais.
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