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RESUMO
Tendo como referência a discussão sobre a formação socioespacial, é importante a apreensão do espaço geográfico
não como palco ou mero reflexo de outras forças estruturantes, mas como instância social, possuindo uma inércia
dinâmica, conforme as proposições da teoria de Milton Santos. Como recurso de análise para a compreensão da
propagação da COVID-19 no Brasil, a representação cartográfica deve não apenas conter a localização dos casos, mas
sim atrelar-se ao entendimento das dinâmicas espaciais, propondo assim uma geografia da saúde. Dessa maneira,
apresentamos uma discussão sobre dois recentes artigos, que utilizam o recurso cartográfico para a análise da
pandemia no território brasileiro. Com propósitos distintos, estes dois trabalhos consideram o espaço geográfico de
maneira dinâmica. Para além, propomos que essas cartografias sejam apreendidas através do conceito de formação
socioespacial. A formação socioespacial brasileira enseja uma distribuição específica da doença no território,
enfatizando suas desigualdades. 1
Introdução
O objetivo desta proposta de ensaio é propor uma análise da distribuição desigual da pandemia de
COVID-19 no território brasileiro, à luz da teoria de Milton Santos do conceito de formação socioespacial,
tendo em vista o espaço como instância da sociedade (SANTOS, 1977; SANTOS, 2012). O modo de produção
capitalista engendra um processo de desenvolvimento desigual em diferentes escalas (SANTOS, 2012).
Essas desigualdades, portanto, não podem ser concebidas como a-históricas e naturais. A relação deste
modo de produção e o território ensejou a formação típica da sociedade brasileira. O mercado capitalista
aproveita-se de estruturas coloniais pretéritas presentes neste território, intensificando os privilégios e a
exclusão da maioria, permitindo, em um paradoxo, o crescimento e desenvolvimento capitalista, ao lado
de uma extrema desigualdade presente nesta sociedade (FERNANDES, 1975). Como o espaço é a história a
um só tempo – convergindo passado, presente e futuro -, o modo de produção vigente expressa-se na
combinação desses diferentes tempos no espaço, sendo a formação socioespacial, portanto, a concretude
necessária ao modo de produção em diferentes territórios (SANTOS, 1977; SANTOS, 2012).
Cartografia e COVID-19
As técnicas cartográficas são de grande valia para compreensão dos padrões de distribuição, mas
ao assumirmos o espaço como instância da sociedade, o estrito procedimento metodológico de
mapeamento não consegue, sozinho, apreender os conteúdos do espaço geográfico. A escala cartográfica
pode representar a relação entre objetos e áreas, mas não expressa, por si só, a escala geográfica, a qual
contempla um recorte da realidade (ROJAS, 2006). Portanto, as contribuições do campo da Geografia da
Saúde nos auxiliam a analisar os mapas elaborados dentro da escala geográfica proposta e do conceito da
formação socioespacial brasileira. 2
Conforme proposto, trazemos como elementos desta cartografia atrelada à Geografia da Saúde, os
dois exemplos de BARROZO ET AL (2020) e GUIMARÃES ET AL (2020). BARROZO ET AL (2020) realiza um
mapeamento de clusters de casos de COVID-19, com o objetivo de identificar áreas de alto risco de
transmissão da doença, devido a seu agrupamento. Esse mapeamento, conforme BARROZO ET AL (2020)
tem o potencial de auxiliar as tomadas de decisão para contenção e elaboração de políticas relacionadas à
COVID-19.
Considerações Finais
Revista Políticas Públicas e Cidades – ISSN: 2359-1552
Volume 1, Número 1, 2020.
I Seminário Nacional – Urbanismo, Espaço e Tempo
Temática: Cidade, Pandemia e Cotidiano
Esta proposta de ensaio não pretende encerrar as possibilidades de estudo da COVID-19 e suas
representações cartográficas. Sinteticamente, abordamos dois propósitos cartográficos que refletiam a
preocupação com o espaço geográfico e suas dinâmicas. No entanto, a presente análise possui lacunas a
serem ainda exploradas. Não foram realizados detalhamentos das técnicas utilizadas para a construção das
cartografias dos referidos artigos, bem como a discussão de concepções clássicas de geógrafos, que
iluminam e perpassam as construções cartográficas, como ressaltado por BORGES ET AL (2020).
O que propomos é que, a partir do conceito de espaço como instância social e da formação
socioespacial (SANTOS, 1977; SANTOS, 2012), o presente estudo busca o debate sobre a possibilidade de
uma cartografia não apenas direcionada aos estudos sobre a distribuição dos padrões de morbidade e
mortalidade de COVID-19. Para além dessa abordagem, sugere-se uma geografia da saúde também
imbuída na análise do processo socioespacial de desigualdades já instaladas, que permeiam a
compreensão destes padrões.
Referência bibliográficas
BARROZO, Ligia Vizeu; SERAFIM, Mirela Barros; MORAES, Sara Lopes; MANSUR, Giselle. Monitoramento espaço- 4
temporal das áreas de alto risco de COVID-19. Hygeia - Revista Brasileira de Geografia Médica e da Saúde, p. 417 - 425, 25 jun.
2020.
FERNANDES, Florestan. Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1975.
GUIMARAES, Raul Borges; CATÃO, Rafael de Castro; MARTINUCI, Oséias da Silva; PUGLIESI, Edmur Azevedo;
MATSUMOTO, Patricia Sayuri Silvestre. O raciocínio geográfico e as chaves de leitura da Covid-19 no território brasileiro. Estud.
av., São Paulo, v. 34, n. 99, p. 119-140, agosto 2020.
ROJAS, Luisa Iniguez. Salud y bienestar humano en la gaografía de América Latina. In: ARROYO, M.; GERAIGES LEMOS,
A; SILVEIRA, M.L. Questões territoriais na América Latina. São Paulo, USP, 2006.
SANTOS, Milton. Sociedade e espaço: a formação social como categoria e como método Boletim Paulista de Geografia,
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SANTOS, Milton. A natureza do Espaço. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2012.
SMITH, Neil. Uneven development: nature, capital and the production of space. 3ª ed. Athens: The University of
Georgia Press, 2008.