Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
org
ISSN 2177-3548
[1] Universidade Federal de São Carlos, Paradigma Centro de Ciências e Tecnologia do Comportamento [2] Paradigma Centro de Ciências e Tecnologia do
Comportamento | Título abreviado: TAC e Transtornos de Personalidade | Endereço para correspondência: | Email: fernandac.calixto@gmail.com | doi: 10-18761/
PAC.TAC.2019.010
Investigar os fatores que nos tornam seres únicos, observáveis, possíveis de mensuração, apenas como
assim como os responsáveis pelas características uma mera expressão de um corpo físico afetado por
que compartilhamos, é um tema de extremo inte- uma mente saudável ou não saudável. Vale mencio-
resse em diferentes áreas da psicologia (Alchieri, nar ainda que a personalidade, na visão psicodinâ-
Cervo & Núñez, 2005; Caballo, 2008; Fadiman & mica, é compreendida como extremamente estável,
Frager, 2002). O interesse pelas nossas singulari- desta forma, uma vez constituída, pouco se poderia
dades e semelhanças é demonstrado tanto pelas fazer no sentido de alterá-la. Por exemplo, alguém
investigações conceituais e experimentais do que de personalidade histriônica manifestaria determi-
entendemos por um Eu, quanto nos testes e quizzes nadas características diagnósticas (em menor ou
que respondemos – sem qualquer comprovação maior grau) ao longo de toda vida.
científica- que afirmam desvendar nossas caracte- A compreensão da personalidade, enquan-
rísticas pessoais. to entidade explicativa do comportamento ma-
Usualmente o conjunto de características sin- nifesto, não é presente apenas nas obras de
gulares de um indivíduo, regulares ao longo de Freud e Jung. No livro Hilgard's Introduction to
sua vida, é entendido como uma expressão de sua Psychology, a personalidade é definida como “os
personalidade (Alchieri et al, 2005). Outro fato co- padrões distintos e característicos de pensamen-
mum consiste em agrupar diversas características e to, emoção e comportamento que definem um
as considerar definidoras de um tipo de personali- estilo pessoal de interação de uma pessoa com
dade particular. Alguém que, em diversas situações, o ambiente físico e social” (Atkinson, Atkinson,
emite respostas entendida pela nossa comunidade Smith, Bem & Nolen-Heoksema, 2002, p.457).
verbal como de timidez, por exemplo, é tido como Definições semelhantes são encontradas nos li-
uma pessoa de personalidade tímida. Do mesmo vros introdutórios de psicologia que assumem a
modo, alguém que se comporta de forma agressiva personalidade enquanto entidade explicativa e
em diversas situações, passa a ser visto como al- definidora do comportamento.
guém de personalidade agressiva, opositora ou até A compreensão da personalidade e sua rela-
mesmo antissocial. Desta forma, a personalidade é ção com os diferentes padrões comportamentais
entendida como uma instância imaterial explicati- apresentados, impulsionou um vasto campo de in-
va, responsável pelo comportamento manifesto e vestigações psicométricas, no qual testes, escalas e
intimamente relacionada à nossa compreensão de inventários são utilizados para auxiliar no diagnós-
individualidade. tico de possíveis transtornos (Bell-Pringle, Pate &
Autores de abordagens psicodinâmicas, como Brown, 1997; Fadiman & Frager, 2002; Raine, 1991).
Freud e Jung, em suas obras deram destaque espe- Nos campos da Psiquiatria e da Psicopatologia, en-
cial as experiências e relações da primeira infân- quadradas no modelo biomédico de saúde mental,
cia na constituição da personalidade e seus tipos o enfoque de atuação principal em relação a te-
(Carver & Scheier, 2000; Ethegoyen, 2004). De mática personalidade é a sua definição e posterior
modo extremamente geral, as diversas vivências diagnóstico dos seus transtornos. De acordo com o
e afetos com os cuidadores - cabendo ao papel da DSM-V (2013), o Manual Diagnóstico e Estatístico
mãe um destaque especial - afetaria diretamen- de Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica
te a formação da personalidade de um indivíduo. Americana, o transtorno de personalidade é:
Os comportamentos tidos como inapropriados ou
desviantes seriam sintomas e manifestações de uma Um padrão persistente de vivência íntima ou
personalidade patologizada como produto das vi- comportamento que se desvia acentuadamen-
vências da primeira infância. Nesta perspectiva, te das expectativas da cultura do indivíduo, é
a dualidade entre mente e corpo, tão comum em invasivo e inflexível, tem seu início na adoles-
algumas ciências psicológicas, é notável na com- cência ou começo da idade adulta, é estável ao
preensão do fenômeno, relacionando a personali- longo do tempo e provoca sofrimento ou pre-
dade ao conceito de mente (manifestação dos meus juízo (p. 685).
pensamentos e o meu verdadeiro eu) e os sintomas
diferentes personalidades, e ao mesmo tempo, de- nality) argumenta que a depender da sensibilidade
vido a uma equivalência funcional entre respostas, que os organismos apresentem a determinados es-
um Eu constante (no qual, podemos prever como tímulos, diferentes padrões de respostas são selecio-
alguém irá se comportar) é possibilitado. Além de nados. Um fato comprovado é que os organismos
explicar conceitualmente o que entendemos por são sensíveis às consequências imediatas de suas
personalidade, encontramos na obra de Skinner - ações, ou seja, o responder aumenta ou diminui de
e de autores analítico-comportamentais (Lundin, frequência após o contato com determinados even-
1974; Banaco, Vermes, Zamignani, Martone & tos. A ênfase, nesta abordagem é especificamente
Kovac, 2012; Nelson-Gray & Farmer, 1999) - a des- na sensibilidade diferencial do organismo perante
crição da formação do fenômeno por meio da inte- eventos do mundo. A compreensão do que se enten-
ração do indivíduo com seu meio. de por sensibilidade nesta perspectiva é a resposta à
Skinner (1974), expõe de maneira clara que os seguinte pergunta: Com que intensidade um evento
princípios de seleção por consequências responsá- afeta o comportamento de um organismo? Quanto
veis pela determinação do comportamento também maior o efeito no responder mais sensível podemos
são responsáveis pela formação e manutenção do dizer que um organismo é a aquele evento.
que entendemos por personalidade. A determi- Sabemos que devido a uma seleção filogené-
nação dos comportamentos ocorre em três níveis, tica, alguns componentes de alimentos, como sal,
filogenético, ontogenético e cultural que atuam de açúcar e gordura, são particularmente preferidos
modo complementar. Iremos destacar o primeiro para a maior parte dos indivíduos, e deste modo,
e segundo nível de seleção no presente artigo. Para a busca por tais alimentos ocorrerá com maior fre-
uma análise do papel do terceiro nível de seleção na quência. Entretanto, encontramos diferenças entre
formação da personalidade recomenda-se a leitura indivíduos em relação a essa preferência. Para um
de Andery (1997), Banaco et al. (2012), De Rose indivíduo altamente sensível, a presença de alimen-
(1997) e Tourinho (2009). tos ricos em açúcar, gordura ou sal poderia ser o
Na seleção filogenética – o primeiro nível de bastante para um aumento de frequência dos com-
seleção- encontramos aspectos inatos responsáveis portamentos que garantissem o contato com esses
pela determinação dos padrões estáveis de compor- alimentos. De modo semelhante à sensibilidade aos
tamento. Todos os organismos apresentam padrões alimentos, diferenças de sensibilidade entre indiví-
fixos de reações a eventos ambientais. Tais padrões duos também são encontradas em relação aos de-
são denominados reflexos incondicionados e garan- mais sentidos. A sensibilidade maior a diferentes
tem que os organismos respondam diferencialmen- tipos de estímulos auditivos, por exemplo, estaria
te – evitando eventos que possam ser prejudiciais à relacionada a uma maior percepção musical e po-
sobrevivência e se aproximando de eventos poten- deria aumentar a probabilidade de o indivíduo se
cialmente benéficos. Outra capacidade fundamental engajar em atividades musicais.
à vida de um organismo em um ambiente em cons- Outra possibilidade é uma sensibilidade dife-
tante mudança é a sensibilidade aos efeitos das suas rencial perante eventos potencialmente aversivos.
ações sobre o mundo (Skinner, 2003; Catania, 1999). É comum por exemplo, que crianças pequenas
A depender das consequências de nossas ações, chorem, paralisem e apresentem contração mus-
nosso comportamento é diferencialmente afetado. cular perante ruídos intensos. No entanto, para
Apesar da sensibilidade às consequências ser fator cada criança, a intensidade de tais ruídos pode
comum a diversos organismos (desde abelhas a hu- precisar ser maior ou menor para desencadear as
manos) a intensidade com que cada evento afeta um respostas tidas como de medo. Um indivíduo al-
organismo, ou em outras palavras, a sensibilidade do tamente sensível a eventos potencialmente aver-
organismo a esses eventos é uma característica di- sivos - como o ruído, neste caso - poderia apre-
ferencial entre os membros de uma mesma espécie. sentar ao longo da vida, com maior frequência,
Corr (2004, 2008), representante da teoria da padrões de esquiva próximos aos apresentados
personalidade de sensibilidade do reforço (original- por indivíduos diagnosticados com o Transtorno
mente, the reinforcement sensitivity theory of perso da Personalidade Esquiva.
Em relação ao segundo nível de seleção, a ên- nalidade. Comportamentos tidos como sinônimo
fase de análise se dá nas contingências responsá- de determinação e autocontrole, por exemplo, es-
veis por selecionar determinadas classes de res- tariam relacionados a uma história de reforço em
postas ao longo da vida de um indivíduo. Para razão fixa, na qual, o reforço é liberado apenas após
Skinner (2003) o que entendemos por personali- alta frequência de respostas. História de reforço em
dade deve ser compreendido como um “sistema intervalo variável, na qual o reforço é liberado con-
de respostas funcionalmente unificado”. Os traços tingente à emissão de respostas após um período
de personalidade, deste modo, estáveis ao longo variado, por exemplo, selecionariam o responder
da vida do indivíduo e apresentados em múltiplos estável entendido como persistente. Vale salientar
contextos, são respostas funcionalmente equiva- que ao longo de nossas vidas somos expostos a di-
lentes e o papel do analista do comportamento é versos esquemas de reforço muitas vezes entrela-
identificar nas interações do indivíduo com seu çados. Lundin, abordou tal aspecto na seleção de
ambiente as determinações dos padrões caracte- classes de respostas, assim como os efeitos da extin-
rísticos de uma personalidade específica. Em uma ção sobre o responder a depender de cada história
perspectiva analítico-comportamental, portanto, de reforço.
ao analisarmos os fatores responsáveis por alguém Ludin (1997) e Skinner (1952, 1974) abordam
apresentar comportamentos agressivos (e por esse em suas obras variáveis ambientais relacionadas a
motivo ser tido como alguém de personalidade seleção de respostas comuns nas diversas perso-
agressiva), focamos nossa análise na descrição das nalidades descritas na literatura psicológica, en-
contingências reforçadoras históricas e presentes tretanto, os transtornos da personalidade não são
responsáveis por sua seleção. A agressividade dei- protagonistas em suas análises. Compreender a
xa de ser entendida como um traço de persona- personalidade de uma perspectiva selecionista afe-
lidade e passa a ser entendida como uma classe ta diretamente nosso modo de analisar e investigar
de respostas - uma vez que respostas agressivas transtornos. Obras recentes da literatura analítico-
ocorrem em diversas condições ambientais fun- -comportamental apresentaram possibilidades de
cionalmente equivalentes entre si. análise do fenômeno (Nelson-Gray et al., 2009).
Na seleção e manutenção dos padrões compor-
tamentais regulares ao longo da vida de um indi-
víduo, processos respondentes e operantes estão Análise funcional de classes de
implicados. Lundin (1977) na obra Personalidade: respostas como modelo avaliativo
Uma Análise do Comportamento, ao apresentar o dos transtornos de personalidade
clássico caso do pequeno Albert, destaca o papel do
pareamento entre estímulos na determinação de pa- No lugar de um modelo biomédico, que envolve a
drões comportamentais ao longo da vida. No caso de descrição topográfica dos transtornos, Nelson-Gray
Albert, o pareamento de um estímulo inicialmente e colaboradores (2009), em um artigo publicado no
neutro (rato) com um evento aversivo (forte ruído), periódico The Behavior Analyst Today, apontam
foi suficiente para evocar respostas de esquiva peran- que intervenções analítico-comportamentais em
te estímulos similares ao condicionado, mesmo após casos de transtornos de personalidade devem se
a finalização do estudo. Ao analisarmos os determi- pautar primeiramente na identificação das classes
nantes de padrões de esquiva, o analista do com- de respostas comuns aos transtornos e posterior
portamento investigará se, na história do indivíduo, análise funcional. As classes de respostas identifi-
processos respondentes selecionaram tal padrão - se- cadas seriam definidas como comportamentos-alvo
melhante com o apresentado por Albert. de avaliação e intervenção no processo terapêutico.
Em relação aos processos operantes, Lundin Analisar funcionalmente um comportamen-
(1977), ainda na mesma obra, compara os efeitos to, com o objetivo de identificar suas variáveis de
comportamentais produzidos pela história com di- controle previamente à definição de intervenções
ferentes esquemas de reforçamento, observado em constitui prática do analista do comportamento - a
laboratório, na seleção de alguns traços de perso- despeito de diagnósticos - e possui larga evidência
de eficácia na mudança comportamental (Cooper, tal para identificar o cenário provável no qual o
Heron & Heward, 1990; Iwata, 2008). De acordo comportamento em análise ocorre e a dos eventos
com Nelson-Gray e colaboradores (2009), os sinto- consequentes para identificar suas possíveis rela-
mas de cada transtorno, por serem descrições topo- ções contingentes (e.g., familiares reforçando ne-
gráficas de respostas, podem ser o ponto inicial de gativamente a autolesão ao cessar uma discussão
nossa análise. Por exemplo, se uma pessoa descreve ou retirar uma demanda). As variáveis organís-
que evita situações sociais por causa da ansiedade micas revelam causas históricas e características
com uma possível desaprovação social, comum em biológicas do organismo (e.g., alta sensibilidade a
transtorno de personalidade esquiva, o analista do eventos aversivos, por exemplo) potencialmente
comportamento deve analisar funcionalmente os relacionadas a seleção e manutenção das respos-
comportamentos emitidos pelo cliente, identifi- tas de autolesão.
cando processos respondentes e operantes respon- Nelson-Gray e colaboradores (2009) mostram
sáveis pela sua seleção e manutenção. algumas classes de respostas comumente apresen-
Haynes, Nelson, Thacher e Kaholokula (2002) tadas nos transtornos de personalidade e propõem
sumarizam que as seguintes técnicas auxiliam na que as pesquisas aplicadas que analisaram funcio-
seleção e análise funcional de classes de respostas: nalmente e interviram em tais classes sejam utili-
Observação em contexto natural, entrevistas, ques- zadas como guia na intervenção analítico-compor-
tionários, automonitoramento, e medidas psicofi- tamental. Dentre as classes de respostas apontadas
siológicas. Um ponto extremamente relevante de pelos autores se encontram: (a) Raiva e hostilidade
ser mencionado é que frequentemente os indivídu- em contexto de rejeição, comuns em Transtorno de
os emitem múltiplos comportamentos passíveis de Personalidades Paranoide, antissocial, borderline,
análise e intervenção, e deste modo, o analista não narcisista (Deffenbacher & McKay, 2000; McCann &
deve de modo algum limitar sua análise as classes Biaggio, 1989); (b) Comportamentos sociais inade-
de respostas apontadas como fator diagnóstico. quados, comuns em Transtornos de Personalidade
Follette, Naugher e Linnerooth (2000) no Paranoide, Esquizoide e Esquizotípica (Pratt &
trabalho intitulado Alternativas Funcionais a Mueser, 2002); (c) Dificuldade em tomar de-
Avaliação e Diagnóstico Tradicional, descrevem cisões, comum em transtorno de personalida-
o modelo SORC (sigla em inglês de Estímulo, de Borderline, histriônica e Dependente (Davis,
Organismo, Respostas e Consequência) de análi- Eshelman & McKay, 2000) e (d) Ideação para-
se funcional. Na análise funcional das classes de noide, comuns em Transtornos de Personalidade
respostas, as variáveis ambientais antecedentes Paranoide, Esquizoide e Esquizotípica (Zinbarg,
(i.e., estímulos discriminativos e operações esta- Craske & Barlow, 1993).
belecedoras), as consequentes (i.e., reforçadoras Conforme anteriormente mencionados, além
e punitivas) e as organísmicas (i.e., história de das classes de respostas específicas citadas acima,
aprendizagem e variáveis biológicas) devem ser existem critérios gerais de diagnósticos, aponta-
elucidadas. Tais componentes de análise provêm dos no DSM. Este é o caso dos padrões estáveis
um sólido modelo de avaliação comportamental do comportamento, que geralmente se iniciam na
dos transtornos de personalidade por implicar adolescência e perduram ao longo da vida adulta;
a identificação de variáveis presentes, históricas da inabilidade social, com respostas emocionais e
e biológicas do indivíduo. Em Transtornos de interações socias que desviam do esperado social-
Personalidade Borderline, por exemplo, com- mente e da impulsividade, demonstrada muitas
portamentos autolesivos são comumente apre- vezes em reações rápidas e inesperadas que geram
sentados. Ao considerarmos a autolesão como prejuízos em longo prazo. A seguir alguns modelos
comportamento-alvo, devemos descrever minu- experimentais que investigam classes de respostas
ciosamente respostas motoras apresentadas (e.g., relacionadas aos critérios gerais diagnosticados se-
cortes com estilete ao longo do antebraço) e as rão apresentados.
respostas fisiológicas (e.g., tensão, taquicardia).
A análise dos eventos antecedentes é fundamen-
Outras variáveis foram apontadas como respon- contextos. No entanto, conforme relatado anterior-
sáveis pela diminuição da resistência às mudanças. mente, os achados obtidos com o modelo podem
Estudos apontam que o atraso do reforço não si- apontar variáveis relacionadas com a persistência
nalizado aumenta a probabilidade de alterações no de padrões comportamentais considerados social-
responder. Bell (1999), por exemplo, expos pombos mente inadequados ou patológicos que aparente-
a um esquema múltiplo de três componentes. Nos mente não garantem acesso a reforçadores.
dois primeiros componentes um VI 120 estava em Em relação às inabilidades nas relações sociais,
vigor e o reforço era disponibilizado com um atraso o paradigma naturalístico de mãe abusiva nos au-
de 3 ou 8 segundos. No primeiro componente não xilia a compreender variáveis históricas responsá-
havia sinalização do atraso e no segundo a sinaliza- veis por selecionar interações sociais e respostas
ção ocorria pela alteração na cor do disco. O tercei- emocionais que desviam da norma. Em tal modelo
ro componente era um VI 123 ou VI128 a depender experimental, o apego “mãe e filhote” em espécies
do atraso programado nos componentes anteriores. altriciais é investigado mensurando respostas de
A operação disruptiva programada foi a apresenta- cuidados parentais e de interação da roedora com
ção do alimento entre os componentes e a extinção. seu filhote a depender das condições ambientais
Os resultados demonstraram que a diminuição da arranjadas. O apego é foco de análise no modelo
taxa de resposta foi mais evidente no componente experimental, uma vez que, de acordo com estudos
sem a sinalização do atraso do reforço indicando embasados na teoria do apego, a qualidade de in-
menor resistência a mudanças em tal componente. terações do sujeito com o seu cuidador é apontado
Os resultados da área de momentum comporta como base imprenscindível para o desenvolvimen-
mental, apesar de terem sido obtidos em contexto to sócio-emocional inicial e um elemento preditor
de pesquisa básica, podem nos auxiliar a elucidar da qualidade das interações sociais ao longo da
as variáveis que selecionaram classes de respostas vida (Asolp-Shields & Mohay, 2001; Bowlby, 1984;
persistentes mesmo quando, aparentemente garan- Hofer, 2006; Petrovich & Gewirtz, 1991).
tem prejuízos a qualidade de vida de um indivíduo. Em relação aos humanos podemos descrever
De acordo com os resultados de Harper e McLean que os comportamentos indicativos do apego do
(1992), por exemplo, podemos investigar se histó- bebê com o cuidador seriam as respostas de manter
rias de reforço de alta magnitude são responsáveis contato visual, se aproximar,contato físico, seguir,
pela manutenção de classes de respostas tidas como agarrar, sorrir, chorar e chamar entre outros. Um
desviantes da cultura vigente ou prejudiciais as suas pouco mais tarde no seu desenvolvimento seriam
interações sociais. No Transtorno de Personalidade respostas de se aproximar e ir em direção aocui-
Esquizotípica, por exemplo, é comum a emissão de dador. Tais respostas acontecem no início da vida
classes de respostas identificadas como fanatismo controladas em sua maioria por estados de privação
religioso. O analista do comportamento deve ana- (e.g., fome, sede) e ao longo da interação o controle
lisar se existe uma história de reforço de alta mag- por reforço social toma papel de destaque. Outro
nitude que selecionou este responder (e.g., reforço fator que aumenta a probabilidade de respostas de
social na infância e adolescência por emitir res- apego, ou a busca pelo cuidador, seria a presença
postas verbais consideradas por sua comunidade de eventos potencialmente aversivos. Em espécies
verbal como de cunho extremamente religioso) e como a nossa, incapazes de se autoprotegerem des-
que o mantém mesmo que não garanta mais acesso de o nascimento, a sobrevivência inicial depende
aos mesmos reforçadores (e.g., amigos se afastam fundamentalmente da qualidade da interação, ou
por causa do seu fanatismo e intolerância religio- do apego, da prole com seu cuidador. É provável,
sa). É necessário ressaltar que Momentum é uma portanto que para sobreviver os infantes tenham
análise usada para descrever o responder persis- uma preferência natural pelo cuidador, responsá-
tente em face de disrupções em um contexto e re- vel por prover os reforçadores disponíveis necessá-
corte temporal específicos (Mace, 1992), enquanto rios, mesmo que essa interação seja aversiva, sele-
que o termo Personalidade se refere ao responder cionada (Petrovich & Gewirtz, 1991; Bijou & Baer,
persistente estendido temporalmente em múltiplos 1961/1976; Skinner, 1953).
texto natural (e.g., consumo de tabaco, álcool, co- do ambiente selecionador e nas possibilidades de
mer excessivo e sexo sem proteção). intervenção.
Padrões impulsivos de respostas são comuns Os modelos experimentais descritos anterior-
nos Transtornos de Personalidade Borderline e mente (momentum comportamental, paradigma
Antissocial. As respostas sob o controle de consequ- naturalístico de mãe abusiva e impulsividade), são
ências imediatas, a despeito dos prejuízos em longo exemplos de pesquisas básicas que podem nos au-
prazo, são apresentadas em múltiplas topografias, xiliam no processo de construção de intervenções
como o comer compulsivo, nos gastos em excesso, baseadas em evidências científicas nos transtornos
nas compras compulsivas e no uso de substâncias de personalidade. Os modelos experimentais, fo-
psicoativas. Apesar de não terem sido conduzidas cados em comportamentos comuns nas psicopato-
em participantes diagnosticados com transtorno de logias nos fornecem dados significativos e fomen-
personalidade, as pesquisas que investigam variáveis tam a transposição de seus achados para pesquisas
que afetam a tomada de decisão e as variáveis que translacionais e aplicadas interessadas nos mesmos
diminuem a probabilidade de respostas impulsi- fenômenos (Lattal, 2006).
vas podem nos auxiliar a delinear intervenções nos Mesmo considerando as limitações próprias de
transtornos nos quais a impulsividade está inserida um modelo experimental na investigação de um
no quadro. Procedimentos reconhecidos experimen- conceito tão complexo quanto o de Personalidade,
talmente como eficazes no aumento de escolhas sob os três modelos citados possibilitam análises interes-
o controle de consequências atrasadas, como a pos- santes. O estudo do momentum comportamental, por
sibilidade de emissão de respostas de compromisso, exemplo, nos auxilia a compreender padrões com-
o aumento gradual do atraso do reforço e a possibi- portamentais inalteráveis mesmos frente a disrup-
lidade de emitir respostas alternativas ao longo do ções, tão comuns nos transtornos de personalidade.
atraso da consequência, portanto, podem fomentar O modelo de mãe abusiva, contido na Teoria do ape-
pesquisas aplicadas e o delineamento de procedi- go, demonstra que compreender a interação inicial
mentos de intervenção em indivíduos com alta pro- entre cuidador-criança é fundamental para o estudo
babilidade de emitirem respostas impulsivas. da formação do que entendemos por personalidade
e pode oferecer respostas às questões investigadas re-
ferentes ao desenvolvimento humano e aos padrões
Considerações Finais de comportamento sociais estáveis de um indivíduo
ao longo da vida. Estudos focados na investigação
A análise do comportamento é um campo cien- de respostas impulsivas, podem identificar variáveis
tífico com rica produção na identificação das que aumentem a probabilidade de o comportamento
variáveis históricas e atuais responsáveis por se- ser controlado por consequências em longo prazo e,
lecionar e manter as mais diversas classes de res- desta maneira, garantir o acesso a reforçadores indi-
postas. Adicionalmente, determina que a atuação viduais e sociais poderosos, que se observam escas-
do analista do comportamento deve ser pautada sos na vida de pessoas tidas como imediatistas.
na análise funcional dos comportamentos elenca- A compreensão de personalidade na perspec-
dos como alvo (Cooper et al., 1990) nos diversos tiva analítico-comportamental, por se embasar
estudos experimentais. Tais estudos são a base in- em um modelo de seleção por consequências, nos
terpretativa para que o analista do comportamen- possibilita compreender o fenômeno como algo
to possa extrair a análise das contingências em em constante construção e passível de modifica-
operação nas situações de aplicação (Malavazzi, ção, uma vez que é determinado, em partes, pelas
2018). Estudos interessados nos transtornos de contingências históricas e, em partes, pelas vigentes
personalidade ainda são escassos na literatura (Banaco et al, 2012; Skinner, 1974). A possibilida-
analítico-comportamental, no entanto, os estudos de de intervenção e modificação, também é trans-
que investigaram as classes de respostas comuns posta para os casos que recebem o diagnóstico de
aos transtornos (Nelson-Gray et al., 2009) lan- Transtorno de Personalidade. Conforme aponta-
çam luz e são de grande auxílio na compreensão ram Simonsen e Widiger (2006), muitos indivídu-
os alcançam critério para mais de um transtorno, o à psicologia de Hilgard. Porto Alegre: Artmed.
que seria um complicador no diagnóstico e estabe- Banaco, R. A., Vermes, J. S., Zamignani, D.
lecimento de intervenções de acordo com o modelo R., Martone, R. C., & Kovac, R. (2012).
biomédico vigente. Compreender a personalidade e Personalidade. In M. M. C. Hubner & M. B.
seus transtornos, na perspectiva analítico-compor- Moreira (Orgs.), Fundamentos de Psicologia:
tamental é fundamental nesses casos, pois as classes Temas clássicos em psicologia sob a ótica da aná
de respostas emitidas nos mais diversos ambientes lise do comportamento. Rio de Janeiro: Koogan.
– assim como nos que se encontram em constante Bell, M. C. (1999). Pavlovian contingencies and
modificação - são alvo de análise funcional. resistance to change in a multiple schedule.
Apesar de apresentar uma visão do fenôme- Journal of the Experimental Analysis of Behavior,
no, altamente diversa do encontrado em modelos 72, 81-96. doi: 10.1901/jeab.1999.72-81
diagnósticos e apresentar a análise funcional como Bell-Pringle, V. J., Pate, J. L., & Brown, R. C. (1997).
prática avaliativa fundamental nos transtornos de Assessment of borderline personality disor-
personalidade, não é objetivo dos autores do pre- derusing the MMPI-2 and the Personality
sente trabalho, sugerir que a classificação diagnós- Assessment Inventory. Assessment, 4, 131-139.
tica deveria ser abandonada. Descrever um quadro doi:10.1177/107319119700400203
clínico topograficamente, como acontece no DSM, Benedick, H., & Dixon, M. R. (2009). Instructional
possibilita o diálogo entre múltiplas áreas cientificas Control of Self-Control in Adults with Co-
e entre profissionais atuantes no contexto de saúde Morbid Developmental Disabilities and Mental
mental. Nossa proposta é que, para além do mode- Illness. Journal of Developmental and Physical
lo diagnóstico realizado tradicionalmente, a análise Disabilities, 21(6), 457–471. doi:10.1007/
funcional das interações ambientais seja um cami- s10882-009-9166-4
nho norteador das intervenções a serem adotadas. Bickel, W. K., Odum, A. L., & Madden, G. J. (1999).
Impulsivity and cigarette smoking: Delay dis-
counting in current, never, and ex-smokers.
Referências doi: 10.1007/PL00005490
Bijou, S. W., & Baer, D. M. (1976). Psicología del
Andery, M. A. (1997b). O modelo de seleção por desarrollo infantil: teoría empírica y sistemática
consequências e a subjetividade. Em R. Banaco. de la conducta. México: Editorial Trillas. (Obra
(Org.), Sobre comportamento e cognição: Vol. 1. originalmente publicada em 1961).
Aspectos teóricos, metodológicos e de formação Bowlby, J. (1984). Apego (Vol. 1, Trilogia Apego e
em análise do comportamento e terapia cogniti Perda). São Paulo: Martins Fontes. (Obra origi-
vista (pp. 199-208). Santo André, SP: ARBytes. nalmente publicada em 1969).
American Psychiatry Association (2013). Caballo, V. E. (2008). Manual de transtornos da per
Diagnostic and Statistical Manual of Mental di sonalidade: Descrição, avaliação e tratamento.
sorders - DSM-5. 5th.ed. Washington: American São Paulo: Santos.
Psychiatric Association. Carver, Charles S. & Scheier, Michael F. (2000).
Alchieri, C.A.; Cervo, C.S. & Núñez, J.C. (2005). Perspectives on personality. Boston: Allyn and
Avaliação de estilos de personalidade segundo Bacon.
a proposta de Theodore Millon. PSICO, 36(2), Catania, A. C. (1999). Aprendizagem: Comporta
175-179. mento, linguagem e cognição. Porto Alegre, RS:
Alsop‐Shields, L., & Mohay, H. (2001). John Bowlby Artmed.
and James Robertson: theorists, scientists and Chapman JP, Chapman LJ, Kwapil TR. (1995). Scales
crusaders for improvements in the care of chil- for the measurement of schizotypy. In: Raine A,
dren in hospital. Journal of Advanced Nursing, Lencz T, Mednick SA, editors. Schizotypal per-
35(1), 50-58. doi:10.1111/jan.13031 sonality. New York: Cambridge University Press.
Atkinson, R. L., Atkinson, R. C., Smith, E. E., Bem, Corr, P. J. (2004). Reinforcement sensitivity theory
D. J., & Nolen-Hoeksema, S. (2002). Introdução and personality. Neuroscience and Biobehavioral
Reviews, 28, 317-332. doi: 016/j.neubio- R., Boggs, J., Holman, C. J. & Sullivan, R. M.
rev.2004.01.005 (2015). Paradoxical neurobehavioral rescue by
Corr, P. J. (2008). The Reinforcement Sensitivity The memories of early-life abuse: the safety signal
ory of Personality. Cambridge: Cambridge Uni- value of odors learned during abusive attach-
versity Press. doi:10.1017/CBO9780511819384 ment. Neuropsychopharmacology, 40(4), 906-
Cooper, J. O., Heron, T. E., & Heward, W. L. (2007). 914.doi:10.1038/npp.2014.266
Applied behavior analysis (2nd ed.). Upper Ramires, V. R. R., & Schneider, M. S. (2010).
Saddle River, NJ: Pearson Prentice Hall Revisitando alguns conceitos da teoria do
Davis, M., Eshelman, E. R., & McKay, M. (2000). apego: comportamento versus representação?
The relaxation and stress reduction work Psicologia: Teoria e Pesquisa, 26(1), 25-33.
book (5thed.). Oakland, CA: New Harbinger Haynes, S. N., Nelson, K. G., Thacher, I., &
Publications, Inc. Kaholokula, J. K. (2002). Outpatient behavio
Deffenbacher, J.L., & McKay, M. (2000). Overcoming ral assessment and treatment target selection. In
situational and general anger: A protocol for the M. Hersen & L. K. Porzelius (Eds.), Diagnosis,
treatment of anger based on relaxation, cogni conceptualization, and treatment planning
tive restructuring, and coping skills training. for adults: A step-by-step guide (pp. 35-70).
Oakland, CA: New Harbinger Publications, Inc. Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum.
De Rose, J.C. (1997). O relato verbal segundo a pers Harper, D. N. (1996). Response-independent food
pectiva da análise do comportamento: contri delivery and behavioral resistance to change.
buições conceituais e experimentais. In Banaco, Journal of the Experimental Analysis of Behavior,
R. (Org). Sobre Comportamento e Cognição: 65, 549-560. doi: 10.1901/jeab.1996.65-549
aspectos teóricos, metodológicos e de forma- Hofer, M. (2006). Psychobiological roots of early
ção em Análise do comportamento e Terapia attachment. Current Directions in Psychological
Cognitivista. (V.1, pp.148-173. ) Science,15, 84–88. doi: 10.1111/j.0963-
Dixon, M. R., & Falcomata, T. S. (2004). Preference -7214.2006.00412.x
for progressive delays and concurrent physical Iwata, B. A., & Dozier, C. L. (2008). Clinical
therapy exercise in an adult with acquired brain Application of Functional Analysis
injury. Journal of Applied Behavior Analysis, Methodology. Behavior Analysis in Practice,
37(1), 101–5. doi:10.1901/jaba.2004.37-101 1(1), 3–9. http://doi.org/10.1007/BF03391714
dos Santos, C. V. (2005). Momento comportamen- Lundin, R. W. (1977). Personalidade: Uma análise
tal. In R. M. R. R. J. A. (Orgs.), Análise do com do comportamento (R. R. Kerbauy, Trad.). São
portamento: Pesquisa, teoria e aplicação (Vol. 1, Paulo, SP: EPU. (Original publicado em 1969).
pp. 63-80). Porto Alegre: Artmed. Malavazzi, M. D. (2018). Interpretação: Objetivo
Ethegoyen, R. Horacio (2004). Fundamentos da e método de ciência em B. F. Skinner (Tese de
Técnica Psicanalítica 2ª Ed. Porto Alegre-RS: doutorado, Pontifícia Universidade Católica de
Artmed. ISBN 85-363-0206-2 São Paulo).
Fadiman, J., & Frager, R. (2002). Teorias da perso McCann, J. T., & Biaggio, M. K. (1989). Narcissistic
nalidade. São Paulo: HARBRA. personality features and self-reported anger.
Follette, W. C., Naugle, A. E., & Linnerooth, P. J. Psychological Reports, 64, 55-58. doi: 10.2466/
N. (2000). Functional alternatives to traditio- pr0.1989.64.1.55
nal assessment and diagnosis. In M. J. Dougher Myerson, J., & Green, L. (1995). Discounting of
(Ed.), Clinical behavior analysis (pp. 99-125). delayed rewards: Models of individual choice.
Reno, NV: Context Press. . Journal of the Experimental Analysis of Behavior,
Lattal, K. A. (2006). O lado humano do compor- 64(3), 263–276. doi:10.1901/jeab.1995.64-263
tamento animal. Revista Brasileira de Análise Neef, N. a, Bicard, D. F., & Endo, S. (2001).
do Comportamento, 2(1), 1-19. doi: 10.18542/ Assessment of impulsivity and the develop-
rebac.v2i1.798 ment of self-control in students with attention
Raineki, C., Sarro, E., Rincón-Cortés, M., Perry, deficit hyperactivity disorder. Journal of Applied