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CURSO DE TEOLOGIA

Resumo do Texto de Giuseppe Alberigo

O CONCÍLIO VATICANO II (1962 – 1965)

Quando da suspensão do concílio Vaticano, em 1870, esperava-se ou a


conclusão dos trabalhos ou o sepultamento para sempre do hábito de se realizar
concílios. A postura defensiva da Igreja católica era muito consolidada, centralizada em
Roma e contrastava com as ideias e métodos democráticos e as instituições
parlamentares. Com o advento da primeira guerra mundial, do marxismo e sua posição
anticristã, o ecumenismo fomentado pelas outras Igrejas nascidas da Reforma
protestante e as Igrejas orientais da Ortodoxia.

Se por um lado a cúpula eclesiástica romana e a escola teológica simétrica a ela


pareciam convencidas de que a exacerbação hierárquica e o imobilismo doutrinário
garantiriam a integridade de fé e da Igreja, o que se via, sobretudo na Europa centro-
ocidental, era uma fermentação pró-renovação, o aparecimento de novas experiências
pastorais, eclesiais e leigas que geravam expectativas de renovação.

Em 25 de janeiro de 1959, concluindo a semana de preces pela união dos


cristãos, João XXIII anunciou sua decisão de convocar um novo concílio.
Diferentemente dos cardeais, esta decisão foi muito bem acolhida pela opinião pública,
no catolicismo e junto às outras Igrejas cristãs como uma promessa de renovação há
muito tempo esperada. A repercussão foi muito ampla e muitos viram nesta decisão um
sinal, uma poderosa causa, um estímulo a se olhar com mais confiança para o futuro
num período de tensão vivida pela “guerra fria”.

Em 17 de maio de 1959 o papa JoãoXXIII constituiu a comissão que presidiria o


trabalho ante preparatório do concílio. A comissão tinha a função de recolher opiniões e
sugestões dos bispos, universidades e faculdades católicas, dos organismos das
cúrias, demonstrando uma abertura pública dos trabalhos, ao contrário do que ocorreu
com o Vaticano I e com os projetos predecessores.

Aos destinatários foram enviadas solicitações de pontos de vista sobre os


problemas que o futuro concílio deveria tratar. Após a classificação deste material, em
05 de junho de 1960, o papa publicou o moto-próprio Superno Dei nutu, com o qual
abria a preparação propriamente dita do concílio. Em 14 de junho de 1960 comunicou
que o concílio se chamaria “Vaticano II”, portanto, um novo concílio e não a
continuidade do de1870. João XXII se dedicou com afinco a delinear os objetivos deste
novo concílio.

Ao contrário de concílios anteriores a composição da estrutura envolveu bispos


do mundo todo e teólogos de escolas diferentes da romana.

Os três traços principais da fisionomia do concílio: a) não se trataria de um


concílio “de união” entre as tradições cristãs divididas; b) pastoralidade; c) efetiva
liberdade do concílio onde os bispos deveriam ser os verdadeiros protagonistas.

Diferentemente dos anteriores, o Vaticano II previa a presença nas sessões


solenes e nas congregações geais de observadores dos “cristãos separados”.

A abertura foi realizada a 11 de outubro de 1962 quando João XXIII pronunciou


a alocução inaugural. A primeira parte foi dedicada à natureza, convocação e
preparação do concílio, ao Cristo, à Igreja e à história; A segunda parte é dedicada a
alguns pontos essenciais: relação entre o reino de Deus e sociedade humana, estilo de
misericórdia em lugar da severidade, busca da unidade entre os cristãos e até de todo
gênero humano. De 22/10 – 13/11 discutiu-se a reforma litúrgica; A adoção do
vernáculo era uma maneira de reestabelecer o contato com o povo; Importância dada à
liturgia da palavra. Em 14/11 começou o debate dedicado às “Fontes da Revelação”
quando se confrontaram mentalidades, formações culturais e orientações teológicas
bastantes diferentes. Houve muitas críticas ao se colocar no mesmo nível a Palavra de
Deus e a tradição. Outra novidade do concílio foi a entrega a uma comissão mista e do
secretariado para a unidade a reelaboração de textos rejeitados, desmanchando a
hegemonia curial sobre os trabalhos conciliares.

O debate sobre a Igreja foi muito intenso e graves objeções foram levantadas
em relação ao esquema De ecclesia, à sua redação e à linha eclesiológica. Parecia
pouco sintonizado com a elaboração teológica mais recente e ainda ligado demais aos
aspectos institucionais da Igreja, em prejuízo dos aspectos mistéricos; pouco sensível
às questões ecumênicas; também o tema do episcopado era apresentado numa
perspectiva subalterna em relação às prerrogativas do oficio papal.

Alguns pontos de vista foram colocados, por exemplo, o mistério da relação vital
de Cristo com sua Igreja, mediante a qual comunica aos homens a salvação; a
exigência da pobreza da Igreja não como condição moral, mas como sinal da
encarnação nu,m mundo que rejeita a pobreza da Igreja; pedia-se atenção à natureza
da Igreja como povo de Deus e à sua missão em relação à humanidade.

Se o primeiro período não tinha levado a decisões conclusivas, acumulara uma


grande quantidade de material para as comissões selecionar e avaliar. Ao fechar o
trabalho conciliar, João XXIII tivera o cuidado de afirmar que a sessão solene de
8/12/63 não significava a parada total dos trabalhos, mas que o concílio continuaria
funcionando nos nove meses de suspensão das assembleias ecumênicas. Já estava
claro que o tema característico do Vaticano II devia ser a Igreja. Para isso circulavam-
se vários projetos (belga, alemão, francês e o chileno, que revelou ao concílio o frescor
e o compromisso de uma Igreja latino-americana). Um documento com 4 capítulos foi
preparado e dedicados da seguinte forma: Cap. I – Igreja como mistério da salvação,
colocando em segundo plano sua dimensão social e jurídica; Cap. II - Relação
papado-episcopado para superar o isolamento do oficio papal; Cap. III – Esclareceu-se
o conceito fundamental de povo de Deus, que valorizava a igualdade fundamental de
todos os cristãos, por força do batismo; Cap. IV – Dedicado à vocação à santidade de
todos os cristãos, e não só à vida “religiosa”.

Após a morte de João XXIII em 03/06/1963 e a eleição de Paulo VI, este deu
continuidade ao concílio. Neste inicio, Paulo VI constituiu um restrito colégio de
“moderadores”, que formariam o elo de ligação entre o Papa e a assembleia e também
criou uma categoria de “ouvintes” do concílio.

No segundo período a partir de 29/09/63 houve grandes discussões sobre a


questão da colegialidade episcopal, a autoridade dos bispos e um possível
enfraquecimento do poder papal. Também se discutiu a restauração do diaconato
como grau autônomo do sacramento da ordem e não apenas como passagem para o
presbiterato. Em 29/10 decidiu-se, também, que o esquema sobre a Virgem Maria
fosse incluído no De ecclesia como último capítulo, colocando-a numa convincente
perspectiva teológica, ela que é a figura da Igreja.

Superada a crise do De ecclesia o concílio começou a discussão dos esquemas


relativos ao ofício e aos poderes dos bispos e do ecumenismo. Paulo VI decidiu pela
constituição do sínodo dos bispos como representação do episcopado. O papel das
conferências episcopais também foi discutido, dando-se a essas conferências um
verdadeiro estatuto eclesial, diminuindo o centralismo romano. Quanto ao ecumenismo
buscou-se superar a intransigência secular, assentada na estéril esperança de um
“retorno” a Roma dos cismáticos e hereges. Quanto aos temas referentes ao
reconhecimento do significado salvífico do povo hebraico e da liberdade religiosa
sofreu muitas resistências de setores do concílio quer por problemas teológicos ou
políticos.

Ao fim o segundo período, na sessão de 04/12/63, foi aprovado os textos da


constituição sobre a liturgia (Sacrosanctum concilium) dentro do projeto de realizar uma
participação plena e ativa de todo o povo na liturgia e, por isso, na vida da Igreja e, por
fim, o decreto sobre os meios de comunicação social (Inter mirifica).

O terceiro período de trabalhos iniciou-se em 14/09/64 com a presença dos


delegados do patriarcado de Constantinopla (e também de outras Igrejas ortodoxas e
“nestorianas”). O novo secretário-adjunto G. Philips aprontou um texto de 8 capítulos
dado que aos 4 originais (mistério da Igreja, povo de Deus, estrutura hierárquica,
leigos) foram acrescentados outros 4:sobre a vocação universal à santidade, sobre os
religiosos, sobre o horizonte escatológico da Igreja e sobre a Virgem Maria.

A liberdade religiosa foi fortemente defendida por dom C. Colombo e K. Wojtyla.


O primeiro dizia que a verdade do evangelho com a ajuda da graça divina se impõe a
todos os homens por força própria, florescendo justamente num clima de liberdade.

Este último via na afirmação da liberdade religiosa uma significativa contradição


à opressão do regime comunista.

O projeto da declaração sobre os hebreus sofreu diversas pressões quer por


grupos sionistas, dos países árabes etc. O cardeal Lercaro empenhou-se para
fundamentar os laços religiosos existentes entre cristãos e hebreus.

Os meses de outubro e novembro de 1964 foram muitos convulsionados. Havia


inicialmente sintomas de enfraquecimento da sintonia entre o Papa e o concílio. O
esquema sobre o ecumenismo e o apostolado dos leigos suscitou grande atenção, pois
foram alvos de muitas críticas. Os padres queriam reconhece ao povo de Deus uma
efetiva liberdade de expressão e de escolhas de formas e dos modos de associação,
dadas as diferentes conjunturas históricas e os específicos contextos culturais. Em
13/10 o primeiro leigo num concilio pediu justamente uma ligação maior entre a
impostação teológica do De ecclesia e o esquema sobre o apostolado dos leigos,
apelando ao concílio para que não aprisionasse em prescrições muito detalhadas as
variedades das formas do apostolado leigo. Neste período também foi enviada para
revisão o texto sobre ecumenismo, principalmente por um mal estar gerado com as
Igrejas Orientais.

Um dos assuntos mais esquema XIII que tratava da relação entra a Igreja e o
mundo. A contribuição seguramente mais eficaz que o concílio podia dar a um
autêntico diálogo entre a Igreja e o mundo consistia em desenvolver coerentemente a
renovação da Igreja mesma. Uma igreja mais livre dos condicionamentos mundanos,
que reencontrasse sua natureza profunda de povo de Deus em peregrinação pela
história, reunido em torno da Palavra e da eucaristia. Também era crucial a atitude do
concílio a propósito da guerra e do sistema de dissuasão nuclear, que dominava
naquele tempo as relações entre os blocos político-militares contrapostas.

Sobre a pobreza cultural da Igreja deveria aceitar a sua pobreza e renunciar a


propor o evangelho revestido de uma determinada formulação cultural, não essencial
em relação à mensagem mesma, mas às vezes causa de incompreensão, como já
ocorrera com bastante frequência.

No dia 6 de novembro de 1964 foi introduzido o esquema sobre o trabalho


missionário que resultou em insucesso e abriu caminho para a apresentação de outro
esquema, sobre a renovação da vida religiosa, depois em 17-19 de novembro sobre a
educação cristã. Em 14 de novembro os padres receberam um fascículo que continha
o texto do Cap. III do esquema De ecclesia, sobre a estrutura hierárquica, ao qual se
juntara – “por ordem da Autoridade Superior” – uma Nota explicativa prévia, preparar
em segredo. A nota apresentava-se como uma interpretação do próprio capítulo,
proposta aos padres pela comissão teológica antes que se passasse às votações das
emendas. Esta nota articulava-se em quatro pontos que abordavam questões jurídicas
e hierárquicas à margem do concílio tendo, com isso, um acolhimento desfavorável por
parte da assembleia. Se essa nota havia criado um clima ruim, este esquentou ainda
mais quando o card. Tisserant comunicou que a declaração sobre a liberdade religiosa
não podia ser submetida aos padres para ulteriores votações, pois exigia exames
aprofundados.

No dia 21 de novembro foram aprovados a constituição dogmática sobre a Igreja


(Lumen gentium), o decreto sobre o ecumenismo (Unitatis redintegratio) e o decreto
sobre as Igrejas orientais (Orientaliun ecclesiarum).
A constituição eclesiológica tem seus pontos fortes nos três primeiros capítulos
onde o concílio apresenta a Igreja como “sacramento em Cristo, luz dos povos”, como
momento crucial do desígnio de salvação do Pai, que tem como meta o reino, o qual,
por isso mesmo, é distinto da Igreja. A comunidade eclesial vive na sociedade humana
e vive de sua aventura, mas, porque “católica” e missionária, não se identifica com
nenhuma condição em particular: social, cultural, racial. A Igreja de Cristo se realiza na
Igreja católica, presidida pelo pontífice romano, mas não se esgota nela.

No conjunto, a constituição Lumen gentium representava um passo adiante em


relação às decisões do concílio Vaticano I e a algumas posições rígidas do magistério
papal dos decênios seguintes.

Por sua vez o decreto Unitatis redintegratio fazia o catolicismo sair de sua
secular esquivança em relação ao compromisso com a reconstituição da unidade
cristã; o que em várias ocasiões, manifestou-se como incompreensão e hostilidade
para com os esforços ecumênicos de outros cristãos, aos quais se negava a fé
autêntica e, mais ainda, de serem membros de comunidades eclesiais. O decreto
indicava os princípios católicos sobre o ecumenismo, estimulava os fiéis à ação
promotora da unidade cristã e, enfim, dirigia-se às Igrejas orientais de tradição ortodoxa
e às comunidades que nasceram da Reforma para incitá-las a uma convergência em
todos os níveis da vida cristã. Era particularmente significativa a definição de um
modelo de unidade fundado não na uniformidade e na absorção, mas na variedade dos
carismas e na complementaridade das tradições.

No dia 15 de setembro de 1965 a assembleia volta a trabalhar ocupando-se do


esquema de declaração sobre a liberdade religiosa. Foram confessados erros que em
nome da Igreja tinham sido cometidos. Beran sublinhou que a violência usada em favor
da fé prejudica e humilha a própria fé. Alçava-se, assim, ao primeiro plano o dever de
condenar a violência e a coação no campo das opiniões religiosas, venha de onde vier
e tenha a forma que tiver. Ia ficando cada vez mais claro que se tratava de afirmar a
liberdade religiosa como enunciado no plano da convivência social e política, o que não
impede que a Igreja católica continue a se considerar a realização autêntica da
verdadeira religião.

A nova redação do esquema XIII recebeu numerosas críticas; muitos rejeitaram


a identificação entre progresso científica/técnico e realização da redenção, que parevia
perpassar muitas páginas do esquema; outras dificuldades referiam-se à linguagem: de
fato, a Igreja queria falar aos homens de maneira nova e não com a habitual forma
autoritária e de condenação. Os temas mais debatidos foram novamente os relativos à
família e à paz. A guerra era condenada porque contrária ao espírito do evangelho e
não só pelas terríveis consequências que acarretaria, e a condenação deveria ser total,
sem nenhuma exceção.

Enquanto se concluía o debate sobre o esquema XIII, o concílio aprovou o texto


do decreto sobre os bispos e os governos das dioceses, começando depois o exame
do texto sobre o trabalho missionário. O esquema da atividade missionária era
apresentado como uma função própria da hierarquia, deformando-se assim a visão da
Igreja como comunhão. Sobre o ecumenismo afirmou-se que deveria existir uma
colaboração com os irmãos cristãos não só no nível individual, mas também entre as
comunidades eclesiais.

O decreto sobre os bispos, Christus dominus, tinha como objetivo desenvolver


em sentido prático os princípios da teologia do episcopado contidos na Lumen gentium.
Reconhecia-se a importância da Igreja local como autêntica realização da Igreja;
previa-se a introdução de um limite de idade para os bispos; obtinham um importante
impulso as conferências episcopais. O decreto sobre a formação sacerdotal, Optatam
totius estaria entre os menos adequados às exigências efetivas da Igreja, não só
porque não aprofundou o nó do celibato sacerdotal, mas sobretudo porque faltou ao
concílio uma percepção lúcida da grave crise de identidade que há decênios vinha
ameaçando a formação sacerdotal e a própria condição do padre.

Sobre a revelação ficou mais bem determinada a infalibilidade da Escritura, e a


respeito da relação entre a própria Escritura e a tradição afirmava-se que a “Igreja
chega à certeza sobre todas as verdades reveladas não só a partir da Escritura”.

Com relação a reforma da disciplina das indulgências a discussão levantou logo


a questão do fundamento teológico das indulgências, que desde o séc. XVI constituía
um nó da divisão cristã. Observou-se que os problemas relativos à pena e à culpa não
podem ser resolvidos com meros conceitos canonistas, e menos ainda com critérios
quantitativos.

No dia 18 de novembro realizou-se uma nova sessão solene, dedicada à


aprovação de dois outros atos, a constituição dogmática sobre a revelação, Dei
Verbum, e o decreto sobre o apostolado dos leigos, Apostolicam actuositatem.. Paulo
VI comunicou também a decisão de reestruturar a congregação mais discutida, a do S.
Ofício, que mudaria de nome e receberia um novo estatuto.

A constituição Dei Verbum tinha um alcance teológico e pastoral excepcional.


Articulada em seis capítulos, ela girava em torno da importância central para a vida
cristã da Palavra de Deus contida essencialmente na Bíblia. Com o Vaticano II a Igreja
romana voltava a encontrar a correta consciência da própria subordinação à Palavra de
Deus.

O decreto Apostolicam actuositatem constituía, por sua vez, o ponto de chegada


do importante movimento de promoção do laicato, que penetrou o catolicismo
contemporâneo e o estimulou em tantos aspectos. Articulado em seis capítulos, o
decreto começa evocando os fundamentos teológicos da participação dos leigos na
missão da Igreja, indica também os objetivos do apostolado leigo, enfatizando a
“animação do temporal” , descreve os vários campos desse empenho apostólico e as
formas que ele pode assumir, renova a subordinação dos leigos à hierarquia e a
necessidade de sua formação para o apostolado.

Com a IX sessão solene de 7 de dezembro de 1965, o Vaticano II concluía os


trabalhos, aprovando a declaração sobre a liberdade religiosa, Dignitatis humanae,o
decreto sobre a atividade missionaria da Igreja, Ad gentes, o decreto sobre a vida e o
ministério sacerdotal, Presbyterorum ordinis, e, enfim, a constituição pastoral sobre a
Igreja no mundo de hoje, Gaudium et spes.

A propósito da liberdade religiosa, a declaração Dignitatis humanae, depois de


tantas tensões e incertezas, inovava profundamente a atitude católica moderna, ao
reconhecer a validade da plena liberdade de consciência (pessoal e coletiva0,
superando tanto a habitual e exclusiva reivindicação da “libertas ecclesiae”, e a
correlativa distinção entre hipótese (liberdade para os católicos quando são minoria) e
tese (intransigência dos católicos quando são maioria), quando a pretensão de
defender a verdade do erro punindo a pessoa que erra.

O decreto Ad gentes expunha em seis capítulos critérios para uma radical


renovação do espírito e da ação missionária da Igreja inteira. Embora de modo pouco
evidente, os episcopados do Terceiro Mundo tinham dado uma contribuição
determinante para o predomínio dessa renovação espiritual, abrindo perceptivas que
aindahá poucos anos eram consideradas patrimônio de algum grupo de vanguarda.
O concílio concluía-se com a Gaudium et spes, que constava de nove capítulos
e dois proêmios, uma introdução e uma conclusão. O cruzamento em, às vezes, a
confusão entre considerações teológicas e argumentos sociológicos, entre otimismo
evangélico e ingênua confiança no progresso, não haviam superados como expressão
dos diferentes espíritos presentes não só no concílio, mas no seio da própria maioria. A
identificação lúcida e previdente dos nós cruciais das sociedades contemporâneas e do
testemunho cristão entre os homens (dignidade humana, família, cultura, vida
econômica, paz) teria sido, talvez, mais incisiva, se fosse acompanhada de breves
evocações evangélicas, ao invés de longas e contingentes considerações de filosofia
social.

A 8 de dezembro celebrou-se o encerramento formal, solene e festivo do


concílio, com a publicação de uma série de mensagens do Vaticano II à humanidade.
O Vaticano II, fiel à impostação “pastoral” recebida de João XXIII, não impunha à Igreja
normas rígidas, comportamentos uniformes, nem previa sanções disciplinares; ele
exortava o catolicismo a se renovar num confronto sincero com o evangelho, à luz da
fé e sob o impulso dos sinais dos tempos; com o pós concilio abria-se o longo período
da recepção por parte das Igrejas.

Referência bibliográfica

ALBERIGO, Giuseppe, O Concílio Vaticano II in ALBERIGO, G. (org.), História


dos Concílios Ecumênicos. São Paulo: Paulus, 1995, pp. 394-440.

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