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Caracterização aprofundada de duas estratégias de investigação TEMA 3

Estudo de caso e Estudos extensivos (descritivos) Surveys

Estudo de Caso

Objectivos

O Estudo de Caso “(…) consiste na observação detalhada de um contexto ou indivíduos, de uma


única fonte de documentos ou de um acontecimento específico.” (Bogdan e Biklen, 1994: 89). Matos
e Carreira (1994) defendem ainda que o estudo de caso não tem características de intervenção,
exigindo mesmo um certo distanciamento em relação ao objecto em análise. O tipo de questão de
pesquisa é da forma “como” e “por quê?”; quando o controle que o investigador tem sobre os
eventos é muito reduzido; ou quando o foco temporal está em fenómenos contemporâneos dentro
do contexto de vida real.
Merriam caracteriza os estudos de caso que se incluem na metodologia qualitativa como
“particularistas”, “descritivos” e, ainda, “heurísticos”. São “particularistas” pois, segundo a autora,
focam a atenção numa situação, acontecimento ou fenómeno particular, sendo relevante o que é
divulgado sobre esse fenómeno e sobre o que ele representa. São “descritivos” uma vez que o que
se pretende é uma descrição completa e rica do fenómeno estudado. São “heurísticos” pois visam
proporcionar a compreensão do fenómeno em estudo, não só para o investigador, mas também
para o(s) leitor(es), podendo apenas comprovar o que já se conhece e/ou trazer novas pistas e
novos significados (Merriam, 1998: 29-30).

Aplicabilidade

Segundo Yin (1989), esta estratégia apresenta quatro aplicações:


 Explicar ligações causais em intervenções ou situações da vida real que são muito complexas
para tratamento através de estratégias experimentais ou de levantamento de dados;
 Descrever um contexto de vida real no qual uma intervenção ocorreu;
 Avaliar, ainda que de forma descritiva, a intervenção realizada;
 Explorar aquelas situações nas quais as intervenções avaliadas não possuam resultados claros
e específicos.

É ainda considerado como o mais “ indicado para investigadores isolados, dado que proporciona
uma oportunidade para estudar, de uma forma mais ou menos aprofundada, um determinado
aspecto do problema em pouco tempo (…)” (Bell, 1997: 22).

Técnicas de recolha de dados

Segundo Lessard-Hébert et al., 1994 existem três modos principais de recolha de dados: inquérito
sob a forma de entrevista semi-estruturada ou questionário, a observação (directa ou participante),
análise de documentos, artefactos físicos e culturais.
O ideal é que possam ser recolhidos dados e evidências de duas ou mais fontes, que poderão
convergir e dar suporte às descobertas da investigação.

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Estudo de caso e Estudos extensivos (descritivos) Surveys

Técnicas de tratamento e análise de dados recolhidos

A análise dos dados depende fortemente do poder de integração do investigador. Os múltiplos


métodos de recolha de dados oferecem a oportunidade de triangulação, e contribuem para maior
suporte das conclusões do investigador. Naturalmente, a redacção dos resultados também é
importante. A riqueza dos dados e do contexto deve ser apresentada, as razões no estabelecimento
de causas e efeitos ou na formulação de hipóteses.
Em geral, a análise de dados possui quatro fases:
 Desenvolvimento de Categorias: devido a sua riqueza, qualquer conjunto de notas pode ser
analisado sob uma variedade de perspectivas. No entanto, o primeiro passo é desenvolver
categorias para classificar os dados. Uma alternativa é construir uma tipologia de episódios e
procedimentos (tendem a ser repetitivos). Outras são os tipos de interação e dias típicos;
 Identificação de Padrões e Scripts: após classificar as notas e organizar incidentes dentro de
cada categoria em ordem cronológica, o próximo passo é examinar os dados, procurando por
padrões ou scripts (comportamentos recorrentes que definem, em termos observáveis, a
essência dos papéis e acções que caracterizam uma interação em particular);
 Agrupamento de Dados: com um sistema de categorias em mente, o investigador lê e relê o
corpo inteiro de notas, classificando-as e ordenando-as;
 Comparação de Scripts Sincrónica e Diacronicamente: o último passo exige um corte
quantitativo. Para a análise sincrónica, o autor combina cada ocorrência de scripts através de
diferentes tecnologias. A análise diacrónica é executada com a combinação de cada frequência
de scripts durante as fases específicas de cada evolução da mesma tecnologia.

Estudo descritivos Surveys


Objectivos

Os objectivos gerais dos Surveys são de observar, registar, analisar, classificar e interpretar os
factos ou fenómenos (variáveis), sem a interferência ou manipulação do investigador, utilizando
para tal o método quantitativo. O seu objectivo fundamental é, assim, a descrição das
características de determinada população e/ou fenómeno ou o estabelecimento de relações entre
variáveis, i.e, aquelas que visam estudar as características de um grupo: a sua distribuição por
sexo, idade, naturalidade, nível de escolaridade, estado de saúde física e mental (entre outros).
Procura verificar, com a precisão possível, a frequência com que um fenómeno ocorre, a sua
natureza, as suas características e a sua relação com os outros.

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Estudo de caso e Estudos extensivos (descritivos) Surveys

Aplicabilidade

O foco é a produção de descrições quantitativas de uma população e responde às questões do tipo


“o quê?”, “por quê?”, “como?” e “quanto?”, ou seja, quando o foco de interesse é sobre “o que
está a acontecer” ou “como e por que isso está a acontecer”.
Pinsonneault & Kraemer (1993) classificam a pesquisa survey quanto ao seu próposito em:
 Explanatória - testar uma teoria e as relações causais;
 Exploratória - familiarizar-se com um tema ou identificar os conceitos iniciais, dar ênfase na
determinação de quais conceitos devem ser medidos e como devem ser medidos, descobrir
novas possibilidades e dimensões da população de interesse;
 Descritiva - quais situações, eventos, atitudes ou opiniões que estão manifestadas numa
população; descreve a distribuição de algum fenómeno na população ou entre os subgrupos da
população ou, ainda, faz uma comparação entre essas distribuições.

Técnicas de recolha de dados

Quanto ao número de momentos ou pontos no tempo em que os dados são recolhidos, a


investigação survey pode ser (Sampieri apud Freitas et al, 2000):
 Longitudinal - a recolha dos dados ocorre ao longo do tempo em períodos ou pontos
especificados;
 Corte-transversal (cross-sectional) - a recolha dos dados ocorre num só momento.
Existem dois tipos de amostras:
 amostra probabilística - todos os elementos da população têm a mesma possibilidade de ser
escolhidos, resultando numa amostra representativa da população. Isso implica utilizar a
seleção aleatória dos respondentes, eliminando a subjectividade da amostra;
 amostra não probabilística - é obtida a partir de algum tipo de critério, e nem todos os
elementos da população têm a mesma possibilidade de ser selecionados, o que torna os
resultados não generalizáveis. Por sua vez, existem seis tipos de amostra não probabilística:
o por conveniência (convenience) - os participantes são escolhidos por estarem
disponíveis;
o mais similares ou mais diferentes (most similar/dissimilar cases) – os participantes
são escolhidos por julgar-se que representam uma situação similar ou, o inverso, uma
situação muito diferente;
o por quotas (quota) – os participantes são escolhidos proporcionalmente a determinado
critério; a amostra é composta por subgrupos;
o bola de neve (snowball) – os participantes iniciais indicam novos participantes;
o casos críticos (critical cases) – os participantes são escolhidos em virtude de
representarem casos essenciais ou chave para o foco da investigação;
o casos típicos (typical cases) – os participantes são escolhidos por representarem a
situação típica, não incluindo extremos.

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Estudo de caso e Estudos extensivos (descritivos) Surveys

Um dos instrumentos que pode ser utilizado para a realização do survey é o questionário, tendo
como estratégia de aplicação a entrevista pessoal, o envio pelo correio, etc.. Na escolha da
estratégia de aplicação deve-se atender-se ao custo, o tempo e, para a forma que venha a garantir
uma taxa de resposta aceitável para o estudo. Na sequência, deve-se realizar o pré-teste do
instrumento que tem como objectivo refinar o instrumento, visando a garantia de que ele realmente
irá medir aquilo a que se propõe (Pinsonneault & Kraemer, 1993).
A validade e a confiabilidade ou fidedignidade (reliability) são requisitos essenciais para uma
medição. Para que uma medida tenha validade, ela necessita ter confiabilidade; contudo, uma
medida confiável poderá ou não ser válida.

Técnicas de tratamento e análise de dados recolhidos

A análise a ser realizada é quantitativa de observações objectivas e directas, dependendo do tipo de


variável utilizada, que podem ser:
 Variável nominal - variável mais simples; os elementos do conjunto original são agrupados
em classes ou categorias: por exemplo, sexo (masculino, feminino);
 Variável ordinal - resulta da operação de ordenar por postos. Assim, além de classificar-se
os elementos de um conjunto, estabelece-se uma ordem hierárquica entre as categorias: por
exemplo, classe económica (nível alto, médio, baixo);
 Variável intervalar - possuí características das escalas nominais e ordinais e, além disso,
apresentam distâncias iguais entre os intervalos que se estabelecem sobre a propriedade
medida. Nas variáveis desse tipo, pode-se comparar as diferenças numéricas que existem
entre uma e outra categoria;
 Variável de razão - quando uma escala tem todas as características de uma escala de
intervalos e, além disso, tem um verdadeiro ponto zero como origem, é chamada de variável
de razão. São variáveis que reúnem todas as propriedades dos números naturais, como
classificação, ordem, distância e origem: por exemplo, número de habitantes de uma cidade.

Considerações gerais sobre as estratégias de investigação

A metodologia adoptada numa pesquisa depende directamente do objecto em estudo, da sua


natureza e amplitude e dos objectivos que o pesquisador almeja atingir. Segundo Ludke e André
(2007:41), a intenção dos investigadores em Ciências Sociais não é só descrever, mas também
compreender os fenómenos e, para isso, torna-se necessário recolher dados que denotem o
fenómeno de forma inteligível.
Tanto os surveys, como o estudo de caso são estudos descritivos.
Os estudos descritivos partem da premissa que por meio de observação (objectiva e directa) e
descrição se pode resolver problemas e melhorar situações concretas. Frisa-se que este tipo de

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Estudo de caso e Estudos extensivos (descritivos) Surveys

estudo “não envolve uma hipótese de que uma das variáveis provoque outra ou a esta
conduza"(Andrade, 1995: 75, 76.).
Os surveys apresentam uma abordagem quantitativa, a natureza dos dados recolhidos é
quantitativa, enquanto o estudo de caso (baseando-se fortemente no trabalho de campo) apresenta
uma abordagem (tendencialmente) qualitativa, sendo que a natureza dos dados recolhidos tanto
1
pode ser de âmbito quantitativo como qualitativo, apesar deste último prevalecer. Neste tipo de
investigação, os métodos qualitativo e quantitativo não se excluem mutuamente, i.e., não guardam
uma posição de oposição (Pope & Mays, 1995: 42). Pelo contrário, complementam-se. Assim, seria
mais coerente a inclusão do estudo de caso nas pesquisas de tipo misto.

Referências Bibliográficas

Andrade, Maria Margarida de, Como preparar trabalhos para cursos de pós-graduação: noções
práticas. São Paulo: Atlas, 1995.
Bell, J. (1997), Como Realizar um Projecto de Investigação, Lisboa, Gradiva.
Bogdan, R.; Biklen, S. (1994), Investigação qualitativa em educação. Uma introdução à teoria e
aos métodos, Porto, Porto Editora.
Freitas, H., Oliveira, M., Saccol, A.Z. & Moscarola, J. (2000), O Método de Pesquisa Survey.
Revista de Administração da USP, RAUSP: 35(3):105-112. São Paulo.
Ludke, M.; André, M. E. D. A. (2007). Pesquisa em Educação: Abordagens Qualitativas. São
Paulo: Editora Pedagógica e Universitária LTDA.
Merriam, Sharan B. (1988), Case Study Research in Education, San Francisco, Jossey-Bass
Publishers.
Pinsonneault, A. & Kraemer, K.L. (1993), Survey Research in Management Information Systems: An
Assessment. Journal of Management Information System.
Pope, C.; Mays, N. (1995) Reaching the parts other methods cannot reach: an introduction to
qualitative methods in health and in health service research. In British Medical Journal, nº 311, pp.
42-45.
Ventura, M.M. (2007), O Estudo de Caso como Modalidade de Pesquisa. Rev SOCERJ. 20(5):383-
386.
Yin, R. K. (1989). Case Study Research - Design and Methods. Newbury Park, CA: Sage
Publications Inc.

Débora Nandja
Dulce Oliveira
José Nunes

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Podem incluir dados de surveys.

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