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INVESTIGAÇÃO SOBRE MÉTODOS DE LUTA CONTRA AS GEADAS EM

PORTUGAL
António Castro Ribeiro*
José Paulo Mourão de Melo-Abreu**
Dionísio Afonso Gonçalves*
*Escola Superior Agrária de Braganga, Campus de Sta Apolónia, Apt172, 5300-855 Braganga
**Instituto Superior de Agronomia, Tapada da Ajuda, Apt 3381, 1301Lisboa Codex

ABSTRACT
Frost damage in orchards and vineyards is a constant problem in Portugal, especially in the Trás-os-
-Montes region, which sometimes has affected crop production in a catastrophic way.
During three years experiments with two systems were conducted in an apple orchard: a wind machine
and a machine which consists of a gas burner and a turbine that creates two jets of warm air laterally.
During spring season radiation frosts are very common. Results showed that temperature inversions are
strong enough for wind machines to have a beneficial effect. A wind machine is effective in protecting
the crop from cold damage as long as a temperature inversion exists and warm air above the critical
temperature for the crop, can be mixed downwards into the crop. The results showed an increase of 0,9
to 1,8 ºC in air temperature near the wind machine (30 m), 0,7 to 1,5ºC at 70 meters and 0,2 to 1,2ºC at
110 meters. This increase can be insufficient if the air temperature near the plants reaches –4ºC.
The results obtained with the “gas-heater”, and a theoretical analysis, showed that this system is
inefficient to protect the crops, at least under similar conditions.

RESUMO
A geada em Portugal, e particularmente em Trás-os-Montes, representa uma das principais causas da
quebra de rendimento de culturas importantes como a macieira, cerejeira, amendoeira e vinha.
Durante três anos foram efectuados estudos climáticos e realizadas experiências com dois métodos de
luta contra as geadas: ventilação forçada e aquecimento do ar com uma máquina montada no tractor,
que consiste num queimador de gás e uma turbina que projecta o ar aquecido lateralmente.
As geadas que ocorrem na Primavera são predominantemente geadas de radiação com formação de
inversões térmicas. Este tipo de geadas favorece a implementação de métodos como a ventilação
forçada que tem como princípio de funcionamento a deslocação do ar mais quente, situado nas
camadas superiores, para a superfície provocando um aumento da temperatura junto às plantas.
Os resultados obtidos comprovam a eficiência da ventilação forçada nas condições de ocorrência de
geadas de radiação. Observaram-se aumentos de temperatura que variaram entre 0,9 e 1,8ºC a 30
metros de distância do ventilador, 0,7 e 1,5ºC a 70 metros e 0,2 e 1,2ºC a 110 metros. Estes aumentos,
no entanto, podem ser insuficientes para proteger as culturas em noites em que a temperatura mínima
seja inferior a –4ºC.
O aquecimento directo do ar recorrendo a um sistema recente e inovador provou não ser um método
eficaz nas condições em que foi testado.
I. INTRODUÇÃO
Na região de Trás-os-Montes a frequência e severidade das geadas são muito elevadas provocando, na
maioria dos anos agrícolas, danos graves em algumas culturas da região. As culturas da macieira,
cerejeira, entre outras, embora estejam bem adaptadas à região, onde encontram condições edafo-
climáticas adequadas, e assumem grande importância económica e social, são muito afectadas pela
geada. Os danos provocam uma diminuição da produtividade das culturas o que afecta gravemente o
rendimento dos agricultores e a competitividade do sector.
A protecção das culturas contra a geada pode ser efectuada recorrendo a vários métodos que se podem
dividir em indirectos ou passivos e directos ou activos (Bagdonas et al., 1978; Abreu, 1985).
Os métodos indirectos são de carácter preventivo. Podem-se destacar entre outros a selecção e
melhoramento da cultura, selecção do local de cultura, utilização da espécie/variedade adequada ao
local, modificação da paisagem com o fim de actuar sobre o microclima, modificação dos sistemas de
condução, e actuação sobre o solo e sua cobertura (p. ex., supressão de infestantes).
Os métodos directos são de carácter protector, de implementação temporária, e assentam na previsão
da ocorrência de geada. Podem-se destacar os seguintes métodos: utilização de coberturas sobre as
culturas; utilização de nevoeiros artificiais; aquecimento directo do ar; mistura do ar aumentando a
temperatura das camadas superficiais à custa de ar suprajacente mais quente (ventiladores); métodos
que se baseiam na libertação do calor latente de fusão de água (rega de lima e rega por aspersão).
A implementação de alguns métodos indirectos é muito importante e fundamental para evitar ou
minimizar os prejuízos causados pelas geadas. No entanto, os métodos directos são indispensáveis, em
muitas condições existentes na região, para proteger eficazmente as culturas das geadas mais severas.
No caso concreto das culturas mais importantes da região, os métodos directos de protecção que
economicamente poderão ter mais interesse são a rega por aspersão e a ventilação forçada. A rega por
aspersão apresenta alguns inconvenientes, como sejam a escassez de água e o encharcamento a que
estariam submetidas as plantas durante um período assinalável de tempo. Desta forma, a ventilação
forçada apresenta-se, frequentemente, como o método mais adequado às circunstâncias específicas da
cultura, do solo e do clima.
A utilização de ventiladores na protecção das culturas contra as geadas está indicada para situações em
que se verifica a ocorrência de geadas de radiação, ou seja, quando durante a noite o céu está limpo, ou
pouco nublado, e o vento é fraco. Nestas condições o ar que está mais afastado da superfície tem
temperatura mais elevada (o que é precisamente o oposto do que acontece durante o dia), dizendo-se
que existe uma inversão térmica. A generalidade das geadas que ocorrem em Portugal, e em Trás-os-
Montes em particular, são geadas de radiação.
Investigações realizadas por diversos autores (Doesken et al., 1989) sobre a utilização de ventiladores
na protecção contra as geadas apontam para a necessidade de estudos microclimáticos feitos
localmente. Em Portugal a investigação nesta área era praticamente inexistente até ao momento em que
se iniciaram estas investigações, embora noutros países (Inglaterra, França, Itália, Estados Unidos e
Nova Zelândia, entre outros), no seguimento de estudos aí realizados, a ventilação forçada seja
bastante utilizada pelos agricultores como método de luta contra as geadas
Recentemente têm surgido novos dispositivos de luta contra as geadas na sua maioria originários da
América do Sul. Em 1999 realizamos experiências com um sistema de protecção que se baseia no
aquecimento directo do ar, com gás propano, através de uma máquina montada, acoplada à tomada de
força do tractor. Actualmente existem centenas de agricultores, especialmente Chilenos, que utilizam
este método no combate à geada. Nos Estados Unidos e na Europa, embora existam ainda poucos
agricultores a utilizar este sistema, pensamos que a sua maior ou menor aceitação dependerá dos
resultados das experiências a realizar e que, até ao momento, são praticamente inexistentes.
Os trabalhos de investigação realizados tinham como objectivos: a) estudo do microclima, em noites
de geada, com o objectivo de caracterizar e tipificar as geadas mais frequentes que ocorrem na
Primavera; b) medição de variáveis climáticas que caracterizam o ambiente físico com o objectivo de
avaliar o desempenho de dois métodos de protecção contra as geadas (ventilador e aquecimento directo
do ar); c) avaliação dos danos causados pelas geadas, com e sem protecção do ventilador, em três
variedades de macieira com grande expressão na região.
Os resultados obtidos indicam que a ventilação forçada é um método eficaz em condições de geada de
radiação com uma forte inversão térmica. O aquecimento directo do ar, recorrendo ao dispositivo
testado e nas condições em que decorreu a ensaio, é ineficaz na protecção das culturas.

II. MATERIAL E MÉTODOS


Localização e caracterização do local
O dispositivo experimental foi instalado num pomar de macieiras no Nordeste Transmontano
(Carrazeda de Ansiães: latitude: 41º 48’N, longitude: 6º 44’W e altitude 690 m). O pomar foi instalado
em 1989 e tem uma área de 9,8 ha, onde estão implantadas quatro variedades de macieiras (Hi Early,
Jonagolden, Erovan e Belgolden), enxertadas no porta-enxerto MM106. A altura média das árvores é
de 3,5 metros, sendo a forma de condução em eixo vertical com um compasso de 1,7 x 4,75 metros. O
solo tem uma textura franco-arenosa e 1,5% de matéria orgânica.

Medições microclimáticas
Foram instaladas duas torres com 24 metros de altura, uma com 10 metros e 10 mastros com 3 metros
de altura para suportar os sensores que permitiram efectuar medições da temperatura, humidade, vento
e radiação em vários pontos do pomar (Fig. 1). A localização dos instrumentos de medição em relação
à posição do ventilador e altura ou profundidade de medição estão indicados na Tabela I.

Fig. 1 Localização relativa dos locais de medição das diferentes variáveis climáticas.
Tabela I Localização dos instrumentos de medição em relação à posição do ventilador e altura ou
profundidade de medição.
Orientação NE SE NW SW
Distância (m) do
30 70 110 30 70 110 30 70 110 30 70 110 160
ventilador
Temperatura 0,05 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5 0,05 1,5 0,05
do ar 0,1 0,1 0,1
0,3 0,3 0,3
0,6 0,6 0,6
1,0 1,0 1,0
1,5 1,5 1,5
3 3 3
5 5 5
10 10 10
15 15
24 24
Temperatura 0,6 0,6 0,6
da flor 1,5 1,5 1,5
3 3 3
Velocidade 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3
do vento 5 5
15
Direcção do vento 3 5
Humidade 1,5 1,5
5* 5
15 15
Radiação 6 3 3 6
Temperatura 0,05 0,05 0,05
do solo na 0,1 0,1 0,1
entrelinha 0,2 0,2 0,2
0,5 0,5 0,5
0,75
1
Temperatura 0,05
do solo na 0,1
linha 0,2
0,5
0,75
1
Fluxo de calor
0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02
no solo

A temperatura do ar foi medida com termopares tipo T (cobre-constantan) de 0,2 mm protegidos da


radiação por um pequeno abrigo de alumínio pintado de branco (Wilson et al., 1998).
A velocidade do vento na área de influência do ventilador foi medida utilizando doze anemómetros
(seis anemómetros de copos (modelo A100R, Vector Instruments, Clwyd, UK), dois anemómetros de
copos (modelo 4.3515.30.000, Thies Clima, Gottingen, Germany), três anemómetro de copos (modelo
12302, Young Company, Traverse City, MI, U.S.A) e um anemómetro tridimensional (modelo 2071-
B, Qualimetrics,Inc., Sacramento, CA, USA)). Fora da influência a velocidade do vento foi medida por
um anemómetro (modelo 05103 wind monitor, R.M,Young Company, Traverse City, MI, U.S.A) A
direcção do vento foi medida dentro da influência do ventilador com o anemómetro tridimensional
(modelo 2071-B, Qualimetrics, Inc., Sacramento, CA, USA) e 3 cataventos (modelo WD1,
R.M,Young Company, Traverse City, MI, U.S.A.) e fora da influência (modelo 05103 wind monitor,
R.M,Young Company, Traverse City, MI, U.S.A.).
Os fluxos radiantes foram medidos com um pirradiómetro (modelo CNR-1, Kipp & Zonen B.V, Delf,
Holland). Este instrumento é constituído por dois piranómetros, voltados para a superfície e para a
atmosfera, e dois pirgeómetros, igualmente voltados para a superfície e para a atmosfera, que medem
as radiações de pequeno e de grande comprimento de onda. Fora da influência do ventilador a radiação
líquida foi medida com um pirradiómetro de balanço (modelo 8110, Philipp Schenk, Wien, Austria). A
radiação solar global foi medida por um piranómetro (modelo CM 6B, Kipp & Zonen B.V., Delft,
Holland).
A humidade do ar foi medida com psicrómetros de aspiração (modelo H301, Vector Instruments,
Clwyd, UK) colocados a 1,5 e 5 metros de altura. A humidade relativa (%) foi medida com quatro
sensores de humidade relativa (modelo RHA1, DeltaT Devices LTD, Cambridge, England) colocados
a 15 metros nas duas torres e a 1,5 e 3 metros na torre fora da influência.
O fluxo de calor do solo foi medido com placas de fluxo auto-construídas e posteriormente calibradas.
A temperatura do solo foi medida com termopares tipo T (cobre-constantan) de 0,5 mm isolados contra
a humidade.
A precipitação foi registada por um udómetro (modelo 52203, Young Company, Traverse City, MI,
U.S.A).
Os sensores foram ligados a seis dataloggers (três dataloggers DL2 (Delta-T Devices LTD, Cambridge,
England) e três dataloggers CR10X (Campbell Scientific, Inc., Logan, Utah, U.S.A.)), dois
multiplexers AM25T (Campbell Scientific, Inc., Logan, Utah, U.S.A.) e um multiplexer AM416
(Campbell Scientific, Inc., Logan, Utah, U.S.A.). As medições da variáveis meteorológicas eram
efectuadas em períodos de 10 minutos e de 1 minuto (durante o período de funcionamento do
ventilador).

Breve descrição dos sistemas de protecção


O ventilador é constituído por uma torre em aço galvanizado de 51 cm de diâmetro e 10,5 metros de
altura. As hélices, construídas em fibra de carbono com um comprimento de 5,4 metros, são
accionadas por um motor a gasóleo de 170 CV localizado junto à base da torre. Para permitir uma
melhor deslocação do ar, desde as camadas superiores, para junto das plantas, as hélices giram em
torno de um eixo que tem uma inclinação de 7º com a horizontal. As hélices, além do movimento de
rotação em torno deste eixo (570 rpm) possuem um movimento de rotação de 360º em torno da própria
torre que se realiza em 4 minutos e 15 segundos.
O sistema utilizado para o aquecimento directo do ar funciona ligado à tomada de força do tractor e
consiste fundamentalmente num ventilador centrífugo com duas saídas de ar (a 0,4 e 1,3 metros de
altura) e um queimador que funciona a gás propano. Durante o processo de protecção contra a geada o
tractor transporta (ligada aos três pontos de apoio) a máquina efectuando um percurso pelo pomar que
não deverá exceder os 15 minutos segundo o inventor deste sistema. A área a proteger deve ser de
aproximadamente 10 ha.

III. RESULTADOS E DISCUSSÃO


Classificação das geadas ocorridas durante o período de ensaio
Na Tabela II podemos observar, para os dias de geada, as temperaturas máxima e mínima registadas
fora da influência do ventilador, assim como a intensidade de inversão (diferença entre a temperatura a
15 e 1,5 metros de altura à hora da temperatura mínima).
Tabela II Temperaturas máximas e mínimas e intensidade de inversão térmica à hora de ocorrência da
temperatura mínima.
Data Temperatura máxima(1) Temperatura mínima (ºC) Intensidade de inversão
(ºC) (ºC)
14/04/99 18,6 -0,9 2,4
18/04/99 13,5 -2,4 1,2
19/04/99 17,9 -0,6 3,3
24/04/99 16,2 0,3 2,4
26/03/00 11,3 -1,7 2,1
28/03/00 13,4 -2,7 1,9
29/03/00 14,5 -3,5 3,0
30/03/00 14,6 -2,2 2,9
01/04/00 13,4 -1,5 1,3
05/04/00 8,4 -3,3 1,7
06/04/00 11,1 -2,5 3,2
(1) No dia anterior.

Em todos os casos de geada a temperatura do ar atingiu a temperatura do ponto de orvalho ocorrendo a


formação de gelo na superfície do solo e das plantas, fenómeno que foi observado localmente. Durante
o arrefecimento nocturno a velocidade do vento foi fraca contribuindo desta forma para a formação de
inversões térmicas. As geadas ocorridas em 1999 e 2000 foram predominantemente de radiação,
embora algumas se possam classificar como de advecção-radiação, ou seja, ocorreram na sequência da
invasão de uma massa de ar frio e posterior arrefecimento por radiação resultando uma inversão
térmica menos intensa do que a que é de esperar numa geada de radiação típica (Abreu, 1985).

Influência do ventilador na modificação da temperatura do ar à superfície


A influência do ventilador na modificação da temperatura do ar à superfície (1,5 m) é mais acentuada
nas zonas próximas do ventilador diminuindo com o aumento da distância (Figs. 2 e 3).

5
5 3 0 m d o ventilad o r
3 0 m d o ventilad o r
7 0 m d o ventilad o r 4 7 0 m d o ventilad o r
4 1 1 0 m d o vent ilad o r
1 1 0 m d o vent ilad o r
3
3 2
Temperauta (ºC)
Temperatura (ºC)

Ventilador
2 1
Ventilador
0
1
-1
0
-2
-1 -3

-2 -4
0 1 2 3 4 5 6 7 0 1 2 3 4 5 6 7
Hora Hora

Fig. 2 Evolução da temperatura do ar a 1,5 metros de altura e à Fig. 3 Evolução da temperatura do ar a 1,5 metros de altura e
distância de 30, 70 e 110 metros do ventilador em 26 de à distância de 30, 70 e 110 metros do ventilador em
Março de 2000 28 de Março de 2000

O aumento da temperatura na área de influência do ventilador está relacionado com a intensidade de


inversão. Menores intensidades de inversão térmica traduzem-se num menor aumento da temperatura
com consequente diminuição da área protegida (Tabela III).
Tabela III Intensidade de inversão térmica e aumento da temperatura média* para diferentes distâncias
relativamente ao ventilador.
Data Intensidade de inversão Aumento da temperatura para diferentes distâncias
(ºC) relativamente ao ventilador (ºC)
30 metros 70 metros 110 metros
14/04/99 2,4 1,6 1,5 1,2
18/04/99 1,2 1,2 1,1 0,7
19/04/99 3,3 1,6 1,4 1,0
24/04/99 2,4 1,4 1,3 1,0
26/03/00 2,1 1,4 1,2 0,5
28/03/00 1,9 0,9 0,7 0,4
29/03/00 3,0 1,3 1,0 0,7
30/03/00 2,9 1,8 1,5 1,0
01/04/00 1,3 1,4 1,2 0,7
05/04/00 1,7 0,9 0,8 0,2
06/04/00 3,2 1,7 1,4 0,8
* média da temperatura durante o período de funcionamento do ventilador

A velocidade e direcção do vento durante o funcionamento do ventilador influenciam o padrão de


distribuição da temperatura do ar. Para ilustrar esta influência podemos observar o padrão de
distribuição das temperaturas em duas noites em que a velocidade do vento foi diferente. Na noite de
26 de Março (Figs. 4, 5, 6 e 7) em que a velocidade do vento foi inferior a 0,2 m/s, a influência no
padrão de distribuição é muito pequena sendo este aproximadamente circular. Pelo contrário, na noite
de 28 de Março (Figs. 8, 9, 10 e 11) em que a velocidade do vento foi superior a 1 m/s, diminuindo
apenas antes do nascer do sol, nota-se uma distorção no padrão de distribuição verificando-se um
deslocamento desse padrão na direcção do vento. Este fenómeno, já verificado por vários autores
(Schultz et al., 1961; Gerber & Busby, 1962; Georg, 1958), é muito importante para a escolha do local
mais apropriado para a colocação do ventilador.

Fig. 4 Temperatura do ar antes do início de funcionamento do Fig. 5 Temperatura do ar depois do início de funcionamento
ventilador (3h10) em 26 de Março de 2000. do ventilador (média de 30min) em 26 de Março de
2000.
Fig. 6 Temperatura do ar observada antes do nascer do sol Fig. 7 Aumento da temperatura do ar (média de 30min) antes
(média de 30min) com o ventilador em funcionamento do nascer do sol causado pela acção do ventilador em
em 26 Março de 2000. 26 Março de 2000

Fig. 8 Temperatura do ar antes do início de funcionamento do Fig. 9 Temperatura do ar depois do início de funcionamento do
ventilador (5h00) em 28 de Março de 2000 ventilador (média de 30min) no dia 28 de Março de
2000
Fig. 10 Temperatura do ar observada antes do nascer do sol Fig. 11 Aumento da temperatura do ar (média de 30min) antes
(média de 30min) com o ventilador em funciona- do nascer do sol causado pela acção do ventilador em
mento em 28 Março de 2000. 28 Março de 2000.

Influência do ventilador no perfil da temperatura


As Fig. 12 e 14 representam o perfil da temperatura do ar imediatamente antes do início de
funcionamento do ventilador e o perfil nos minutos seguintes após o início de funcionamento nas
noites de 26 e 28 de Março de 2000. Verifica-se um efeito positivo do ventilador na diminuição da
inversão térmica que se verificava antes da acção do ventilador.

24 24
Antes d o vent ilad o r Ant es d o ventilad o r
22 1 min d ep o is 22 Dep o is d o vent ilad o r
2 min d ep o is Ant es d o nas cer d o s o l
3 min d ep o is
20 4 min d ep o is
20
5 min d ep o is
18 18

16 16

14 14
Altura (m)

Altura (m)

12 12

10 10

8 8

6 6

4 4

2 2

0 0
-1 0 1 2 3 -1 0 1 2 3
T emperatura (ºC) T emperatura (ºC)

Fig. 12 Perfis da temperatura do ar observados antes (3h20) e nos Fig. 13 Perfis da temperatura do ar observados antes (3h20), após o início
minutos seguintes após o início de funcionamento do de funcionamento do ventilador (média de 30 min) e antes do
ventilador (26 de Março de 2000). nascer do sol (26 de Março de 2000).
Como se pode observar, verifica-se um aumento significativo da temperatura do ar até aos 10 metros
de altura e uma ligeira diminuição acima dessa altura. Estas variações da temperatura resultam do
deslocamento do ar mais quente que se situava nas camadas superiores para as camadas inferiores
provocando uma “mistura” das camadas de ar e, consequentemente, um aumento da temperatura junto
às plantas.
Nos primeiros minutos após o início de funcionamento do ventilador a temperatura junto às plantas
aumenta para valores próximos dos que se verificavam a 10 m de altura. Isto foi verificado na
generalidade dos casos de geada observados. Como a recuperação da temperatura para valores
próximos dos que se verificam a 10 m acontece rapidamente, o accionamento do ventilador deve, por
isso, ser feito quando a temperatura do ar junto às plantas estiver suficientemente próxima do valor
crítico para o estado de desenvolvimento em que se encontram, fazendo o desconto ao tempo
necessário para que o ventilador comece a funcionar em pleno.
As Figs. 13 e 15 ilustram os perfis da temperatura antes do ventilador e os perfis médios após o início
de funcionamento e antes do nascer do sol (média de 30 minutos). A inversão térmica parece não ser
totalmente “destruída” verificando-se, durante o funcionamento do ventilador, um arrefecimento
idêntico em todo o perfil até 24 metros.
A ocorrência predominante de geadas de radiação com formação de inversões térmicas tornam o
método da ventilação forçada, dado o seu princípio de funcionamento, como o método de eleição no
combate às geadas.

24 24
Antes d o vent ilad o r Ant es d o ventilad o r
22 1 min d ep o is 22 Dep o is d o vent ilad o r
2 min d ep o is Ant es d o nas cer d o s o l
3 min d ep o is
20 20
4 min d ep o is
5 min d ep o is
18 18

16 16

14 14
Height (m)

Altura (m)

12 12
10 10
8 8
6 6
4 4
2 2
0 0
-1 0 1 2 -3 -2 -1 0 1 2
T emperatura (ºC) T emperatura (ºC)

Fig. 14 Perfis da temperatura do ar observados antes (5h00) e nos Fig. 15 Perfis da temperatura do ar observados antes (5h00), após o início
minutos seguintes após o início de funcionamento do de funcionamento do ventilador (média de 30 min) e antes do
ventilador (28 de Março de 2000). nascer do sol (28 de Março de 2000).

Efeito do aquecimento na modificação da temperatura do ar


Este sistema foi testado em duas noites de geada (27 e 28 de Abril de 2000). Como se pode observar
através das Figs. 16 e 17 o padrão da distribuição superficial da temperatura não se altera ao longo da
noite. As temperaturas mínimas registadas no pomar antes no nascer do sol foram idênticas à registada
num pomar com as mesmas características situado a 500 metros do local de ensaio (Fig. 18).

Fig. 16 Temperatura do ar antes do início de funcionamento da Fig. 17 Temperatura do ar depois do início de funcionamento da
máquina (1h50) em 28 de Abril de 2000 máquina (média de 30min) no dia 28 de Abril de 2000

Fig. 18 Temperatura do ar observada antes do nascer do sol Fig.19 Aumento da temperatura do ar (média de 30min) antes
(média de 30min), com a máquina em funciona- do nascer do sol causado pela acção da máquina em 28
mento, em 28 Abril de 2000. Abril de 2000.

Influência no perfil da temperatura


Apesar do aumento da temperatura aquando da passagem da máquina próximo do local de medição da
temperatura, pode observar-se, através da Fig. 20, que 4 minutos depois da passagem da máquina o
perfil volta à sua forma inicial. Ao longo da noite o processo de arrefecimento à superfície não é
atenuado nem se verifica uma destruição da inversão térmica (Fig. 21).
24 Ant es
24
1 min d ep o is da máq uina Antes d a máq uina
22 2 min d ep o is da máq uina 22 1 5 min d ep o is
3 min d ep o is da máq uina Antes d o nas cer d o s o l
20 4 min d ep o is da máq uina 20
5 min d ep o is da máq uina
18 18

16 16

14 14
Altura (m)

Altura (m)
12 12

10 10

8 8
6 6

4 4

2 2
0 0
-1 0 1 2 3 -2 -1 0 1 2 3
T emperatura (ºC) T emperatura (ºC)

Fig. 20 Perfis da temperatura do ar observados antes (1h50) e nos Fig. 21 Perfis da temperatura do ar observados antes (1h50), após a
minutos seguintes após a passagem da máquina pelo local passagem da máquina pelo local de medição (média de 30
de medição (28 de Abril de 2000). min) e antes do nascer do sol (28 de Abril de 2000).

Efectuando algumas simplificações e admitindo alguns pressupostos como: i) considerar que a


máquina é 100% eficiente transferindo toda a energia obtida na combustão do gás para parar o
arrefecimento da superfície, ii) as perdas por radiação de grande comprimento de onda não são
alteradas pela introdução de calor no sistema, iii) a convecção de calor não aumenta e a condução de
calor não se altera, foi calculada a quantidade de gás necessária para impedir que a temperatura desça
abaixo de de –1 ºC durante uma geada de radiação. Os passos envolvidos nestes cálculos consistiram
na medição da radiação líquida e do fluxo de calor no solo e no cálculo da quantidade de gás necessária
para parar o arrefecimento radiante baseado no calor de combustão do gás propano (46,4 MJ/kg).
Para evitar que um ha de um pomar de macieiras atinja temperaturas inferiores a –1ºC, uma máquina
nas condições acima expostas nunca poderá gastar menos que 254,5 kg de gás. Apesar deste valor ser
elevado, é ainda muito inferior aos valores referidos na bibliografia necessários para a protecção com
aquecedores (Gerber, 1969; Martsolf, 1992).

Danos provocados pelas geadas


Após a ocorrência das geadas efectuaram-se amostragens de gomos florais e/ou flores para avaliar os
danos causados pelas geadas nestes órgãos. A observação à lupa das flores permitiu observar os danos
ao nível do ovário e do estilete. A destruição dos tecidos era visível pelo seu aspecto enegrecido (Fig.
22). Em 1999, apesar das geadas terem sido menos severas, os prejuízos foram superiores aos
verificados em 2000. Isto deve-se facto das últimas geadas, em 1999, terem ocorrido no fim de Abril
quando o estado de desenvolvimento dos gomos estava mais avançado (plena floração: F2*) e,
consequentemente, mais sensíveis às baixas temperaturas. Em 2000, as geadas ocorreram no final de
Março princípio de Abril quando o estado de desenvolvimento estava mais atrasado (botão rosa: E*).
No entanto, em ambos os anos, pode verificar-se o efeito protector do ventilador na diminuição dos
prejuízos dentro da sua área de influência (Fig. 23). A redução da percentagem de flores afectadas foi
de 54% em 1999 e 45% em 2000.
Fig. 22 Corte transversal de uma flor onde se pode observar os ovários enegrecidos.

100 Den tro da in fluên cia do ven tilador


90 Fora da in fluên cia do ven tilador
80
% de flores afectadas

70
60
50
40
30
20
10
0
1999 2000

Fig. 23 Percentagem de flores afectadas dentro e fora da influência do ventilador em 1999 e 2000.

IV. CONCLUSÕES
Os resultados obtidos permitem retirar algumas conclusões que vão ao encontro dos objectivos
inicialmente propostos:
As geadas de radiação, com consequente formação de uma inversão térmica, são o tipo de geadas mais
frequentes na Primavera, na região de Trás-os-Montes, o que torna o método da ventilação forçada,
dado o seu princípio de funcionamento, como o método de eleição no combate às geadas.
Nos casos de geada observados em que o ventilador esteve em funcionamento, verificou-se um
aumento médio da temperatura do ar que variou entre 0,9 e 1,8ºC a 30 metros do ventilador, 0,7 e
1,5ºC a 70 metros e 0,2 e 1,2ºC a 110 metros.
Para fracas intensidades de inversão verificou-se uma diminuição do alcance do ventilador que se
traduziu num aumento da temperatura do ar pouco significativo nas zonas mais afastadas (110 m) do
ventilador.
Em situações como a que ocorreu no dia 29 de Março de 2000, em que a temperatura mínima em
alguns pontos do pomar se aproximou dos –4ºC, este sistema por si só não garante uma protecção
adequada sendo necessário suplementá-lo com outros métodos, nomeadamente o aquecimento, à
semelhança do que acontece noutros países.
A eficiência da ventilação forçada ficou também demonstrada na minimização dos prejuízos
verificados (54% em 1999 e 45% em 2000).
Muitos dos resultados obtidos são inéditos. Um dos pontos dado como assente era o de que os
ventiladores deveriam ser ligados o mais cedo possível uma vez que supostamente à medida que
aumentava a estratificação da atmosfera se tornava muito mais difícil a posterior mistura do ar. Os
nossos resultados mostram claramente que isso não é verdade.
Devem ser feitos esforços para encontrar métodos que complementem este método de luta contra as
geadas, quando as temperaturas do ar são muito baixas e as inversões fracas. Alguns estudos
preliminares estão a ser feitos por outros investigadores nesta área, utilizando o aquecimento como
complemento sendo veículo de transferência desse calor o ar ou a água.
Em relação ao sistema que se baseia no aquecimento directo do ar os resultados obtidos levam-nos a
concluir que, para as condições em que foi testado, não pode constituir uma solução de protecção
contra as geadas.

REFERÊNCIAS
Abreu, J. P. de Melo e 1985. As Geadas. Conceitos, Génese, Danos e Métodos de Protecção. Instituto
Superior de Agronomia. Lisboa.
Bagdonas, A.; Georg, J.C.; Gerber, J.F., 1978. Techniques of frost prediction and methods of frost and
cold protection. Tech Note 157. World Meteorological Organization, Geneva.
Doesken, N. J., McKee, T. B. and Renquist, A. R., 1989. A climatological assessment of the utility of
wind machines for freeze protection in Mountain Valleys. J. Applied Meteor., 28:194-205.
Georg, J. H., 1958. Wind machines for frost protection in Florida. Citrus Industry, 39 (11); 7, 9.
Gerber, J.F., 1969. Methods of determining the nocturnal heat requirements of citrus orchards. Proc.
1st International Citrus symposium. University of California. Riverside, Vol 2 pp. 545-550.
Gerber, J. F. & Busby, J.N., 1962. Field trials with a wind machine. Proceedings of the Florida State
Horticultural Society, 75: 13-18.
Martsolf, J.D., 1992. Energy requirements for frost protection of horticultural crops. In: Energy in
Farm Production. Martsolf, J.D. & Fluck, R.C. (eds.). Elsevier, Amesterdam.
Schultz, H. B.; Brooks, F. A.; Leonard, A. S. Crawford, T. V., 1961. Frost protection by wind
machines and heaters. Amer. Soc. Agr. Eng., 4: 192-198, 202.
Wilson, T. B.; Bland, W. L.; Norman, J. M., 1999. Measurement and simulation of dew accumulation
and drying in a potato canopy. Agricultural and Forest Meteorology, 93: 111-119.

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