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INTRODUÇÃO
A esta introdução se seguia uma lista dos direitos que deveriam ser
assegurados à pessoa autista. Esta carta foi adoptada sob forma de Declaração
escrita pelo Parlamento Europeu em 9 de Maio de 1996.
Em 2007, a ONU instituiu o dia 2 de abril como o Dia Mundial da
Conscientização do Autismo com a intenção de trazer à tona a relevância da questão
do autismo e promover a divulgação para comunidade em geral de informações
sobre o transtorno, que afeta cerca de 70 milhões de pessoas em todo o mundo,
segundo a OMS. Em 2018, esta data entrou no calendário oficial brasileiro como Dia
Nacional de Conscientização sobre o Autismo.
Em 2012, é promulgada a Lei Berenice Piana (12.764/12), que instituiu a
Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro
Autista. Este marco legal prevê a garantia de acesso a diagnóstico precoce,
tratamento, terapias e medicamento pelo Sistema Único de Saúde; à educação e à
proteção social; ao trabalho e a serviços que propiciem a igualdade de
oportunidades aos portadores de TEA.
Em 2013, O DSM-5 englobou todas as subcategorias do autismo em um
único diagnóstico: o Transtorno do Espectro Autista (TEA) com diferentes níveis de
gravidade. Em 2014, o maior estudo já realizado sobre as causas do autismo revelou
que os fatores ambientais, como as condições do parto, infecções sofridas pela mãe
e o uso de drogas antes e durante a gravidez, são tão importantes quanto a genética
para o desenvolvimento do transtorno.
Em 2015, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (13.145/15)
criou o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que ampliou a proteção aos portadores
de TEA ao enquadrá-los à classificação de pessoa com deficiência como “aquela
que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial”. O Estatuto é um símbolo importante na defesa da igualdade de direitos
dos deficientes, do combate à discriminação e da regulamentação da acessibilidade
e do atendimento prioritário (A&R, 2020).
2.2 - Conceito
Nível 2 Nível 3
Nível 1
(requer apoio (requer apoio muito
(requer apoio)
substancial) substancial)
Déficit grave na
Déficit na comunicação Déficit grave na comunicação
comunicação verbal e não
social, prejuízos nas verbal e não verbal, prejuízos
verbal, prejuízos notáveis e
interações; baixo interesse graves e grandes limitações
limitações de interações
por interações sociais de interações sociais
sociais
Comportamento inflexível;
Comportamento inflexível;
Comportamento inflexível, extrema dificuldade com
dificuldade com mudanças;
dificuldade de troca de mudanças; comportamentos
comportamentos restritos
atividade, dificuldades na restritos e/ou repetitivos;
e/ou repetitivos; interferência
independência acentuada interferência no
na funcionalidade
funcionalidade
Fonte: Adaptado APA (2014, p.52)
Seja pelo atraso científico do país na área ou mesmo pela ignorância que
perpassa as questões das deficiências de todo tipo, o autismo não era considerado
uma deficiência no sentido legal do termo, de modo que o acesso dessas pessoas
aos direitos e garantias legais que analisamos no capítulo anterior era obstaculizado.
Essa situação, aliás, não é um problema que atingia apenas aos autistas, mas
a muitos outros grupos da sociedade que enfrentam algum tipo de deficiência. A
aferição e reconhecimento médico de algum tipo de deficiência ou transtorno do
desenvolvimento não implica, muitas vezes, no enquadramento legal do termo
deficiente.
A consequência disso é a frequente judicialização da questão, uma vez que
não raramente a administração pública se esquiva de sua responsabilidade com
base nessas lacunas e omissões. E, na medida em que o acesso à justiça também é
dificultado pelas desigualdades materiais e sociais, essas pessoas acabavam – e
acabam – impossibilitadas de acessarem os seus direitos mesmo diante da rica
legislação que analisamos.
Foi em razão dessas circunstâncias que as associações passaram a lutar por
avanços legislativos, no sentido do reconhecimento legal do autismo como uma
deficiência e pelo atendimento das suas demandas específicas. O processo de luta
culminou na Lei nº 12.764/12, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos
Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, onde logo no Art. 1º, § 2,
tratou o legislador de considerar o autismo como deficiência: “A pessoa com
transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os
efeitos legais”.
Uma grande inovação da lei é a garantia do direito a acompanhante
especializado nas salas de aula. A importância desse artigo se deve ao fato de que
ele atende a uma demanda específica do aluno autista, não contemplada pela
legislação anterior.
Conforme vimos, o atendimento educacional especializado é um direito
garantido no Art. 208º, III, do texto constitucional. Para regulamentar o dispositivo
constitucional, o Poder Executivo editou o Decreto Nº 7.611, de 17 de novembro de
2011. Essa é, até o momento, principal base legislativa que organiza a educação
especial e o atendimento educacional especializado.
Em síntese, pode-se dizer que o Decreto Nº 7.611 ofereceu diretrizes para o
atendimento educacional especializado, complementando o dispositivo constitucional
supracitado. Exemplo claro disso é o seu Art. 2º, caput:
Art. 2º A educação especial deve garantir os serviços de apoio especializado
voltado a eliminar as barreiras que possam obstruir o processo de
escolarização de estudantes com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.
O caráter genérico do Decreto se explica tanto pela dificuldade em regular a
um só tempo as especificidades dos portadores de deficiência e transtornos de
desenvolvimento, quanto pelo fato de que as instituições de ensino no país não são
vinculadas a um único ente federativo. Se essa generalidade, ao responder a essas
circunstâncias, tem um lado positivo, a falta de detalhes naturalmente cria lacunas
que são aproveitadas pelas instituições de ensino, públicas e privadas, com o
objetivo de se esquivarem de sua responsabilidade.
A Lei nº 12.764/12 pode ser considerada um avanço justamente porque, além
de garantir um vasto rol de direitos específicos ao autista, também é taxativa ao
tratar do tipo de atendimento especial ao qual tem direito o aluno autista, assim:
Art. 3º São direitos da pessoa com transtorno do espectro autista: […]
Parágrafo único. Em casos de comprovada necessidade, a pessoa com
transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino
regular, nos termos do inciso IV do art. 2º, terá direito a acompanhante
especializado.
O acompanhante especializado é fundamental para a integração e
desenvolvimento do portador de transtorno do espectro autista nos casos mais
graves, dada as formas com que o transtorno se expressa, em especial o
comprometimento no comportamento social, na comunicação e na linguagem.
No Brasil, o método de psicologia aplicada mais utilizada no tratamento e
cuidado do portador de transtorno do espectro autista é o ABA (da sigla inglesa
applied behaviour analysis), que consiste na elicitação e reforço sistemático dos
comportamentos sociais, o que requer o acompanhamento intensivo do aluno ou
aluna nas diversas situações escolares. Desnecessário dizer que não há
possibilidade de que tal acompanhamento seja feito pelo professor regular, de modo
que a presença extra um profissional especializado é essencial.
Em que pese o avanço do legislador ao tratar da questão do acompanhante
especializado, a eficácia social da norma encontra todo tipo de resistência, seja de
instituições de ensino privadas ou públicas. Assim, não são raros os casos em que é
necessário buscar o socorro do Poder Judiciário para fazer valer os direitos dos
portadores de transtorno do espectro autista:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - MENOR PORTADOR DE TRANSTORNO
DO ESPECTRO AUTISTA - INCLUSÃO NA REDE REGULAR DE ENSINO -
DEVER CONSTITUCIONAL - ACOMPANHAMENTO POR PROFISSIONAL
ESPECIALIZADO - MEDIDA QUE VISA GARANTIR A MELHORA NO
RENDIMENTO ESCOLAR E PROMOVER A INCLUSÃO SOCIAL -
PREVISÃO NA LEI FEDERAL Nº 12.764/2012 - ACOMPANHAMENTO POR
PROFISSIONAL DE MANEIRA EXCLUSIVA - FORMA DE ORGANIZAÇÃO
E FORNECIMENTO DO SERVIÇO PROFISSIONAL - FACULDADE
CONFERIDA AO MUNICÍPIO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1.
No que tange ao acesso à educação especificamente dos portadores de
deficiência física, o inciso III do art. 208 da CR/88 estabeleceu que é dever
do Estado fornecer atendimento especializado aos portadores de
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. 2. Em relação
especificamente àqueles que apresentam Transtorno do Espectro Autista a
Lei Federal nº 12.764/2012 que instituiu a Política Nacional de Proteção dos
Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, assegurou em seu
art. 3º que nas hipóteses em que, comprovada a necessidade do portador
de Transtorno do Espectro Autista, lhe será assegurado o acompanhamento
especializado visando facilitar o seu acesso à educação. 3. Respeitada a
organização do serviço próprio do Município, não se vê justificativa para que
o serviço solicitado seja exclusivo ao agravante. 4. Recurso parcialmente
provido. (TJ-MG - AI: 10607150054536001 MG, Relator: Sandra Fonseca,
Data de Julgamento: 20/09/2016, Câmaras Cíveis / 6ª CÂMARA CÍVEL,
Data de Publicação: 30/09/2016)
DIREITO CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. REEXAME
NECESSÁRIO. MENOR PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO
AUTISTA. DIREITO A ACOMPANHAMENTO ESPECIALIZADO NO
HORÁRIO ESCOLAR. LEI 12.764/2012. I - O acesso à educação
especificamente dos portadores de deficiência física, o inciso III do art. 208
da CF/88 estabeleceu que é dever do Estado fornecer atendimento
especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede
regular de ensino. II - Dever do Estado de assegurar à pessoa com
transtorno do espectro autista a frequência a sistema educacional inclusivo,
com a presença de mediador, ou seja, será assegurado o acompanhamento
especializado visando facilitar o acesso à educação, na forma do art. 3º,
parágrafo único, da Lei 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de
Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro. III - Sentença
confirmada em sede de reexame necessário. (TJ-AM - Remessa
Necessária: 06023136420188040001 AM 0602313-64.2018.8.04.0001,
Relator: Nélia Caminha Jorge, Data de Julgamento: 06/02/2019, Câmaras
Reunidas, Data de Publicação: 06/02/2019)