DISCIPLINA
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO
FÍSICA
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................. 03
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INTRODUÇÃO
Este curso é composto por quatro apostilas sendo que esta primeira apostila
contempla assuntos que julgamos iniciais para desenvolver uma melhor capacitação
do professor. Trazemos questões sobre a história da Educação Física, possibilitando
um amplo conhecimento a respeito da matéria. Tratamos da Educação Física e a
Filosofia, que permite uma visão mais ampla e mais aprofundada, propiciando que o
professor possa levantar novas questões acerca do ensinar Educação Física.
Elaboramos um conteúdo sobre a historiografia com aspectos da Nova História
frente aos períodos históricos da Educação Física e tratamos de questões acerca do
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Segundo Moraes (2009, s/p) tudo começou quando o homem primitivo sentiu
a necessidade de lutar, fugir ou caçar para sobreviver. Assim o homem à luz da
ciência executa os seus movimentos corporais mais básicos e naturais desde que se
colocou de pé: corre, salta, arremessa, empurra, puxa, etc. Na China como
Educação Física as origens mais remotas da história falam de 3000 a. C. Um certo
imperador guerreiro, Hoang Ti, pensando no progresso do seu povo pregava os
exercícios físicos com finalidades higiênicas e terapêuticas além do caráter
guerreiro. Na Índia no começo do primeiro milênio, os exercícios físicos eram tidos
como uma doutrina por causa das leis de Manu, uma espécie de código civil,
político, social e religioso. Eram indispensáveis às necessidades militares além do
caráter fisiológico. Buda atribuía aos exercícios o caminho da energia física, pureza
dos sentimentos, bondade e conhecimento das ciências para a suprema felicidade
do Nirvana, (no budismo, estado de ausência total de sofrimento). O Yoga tem suas
origens na mesma época retratando os exercícios ginásticos no livro Yajur Veda que
além de um aprofundamento da medicina, ensinava manobras massoterápicas e
técnicas de respirar.
Segundo Moraes (2009, s/p) sem dúvida nenhuma a civilização que marcou e
desenvolveu a Educação Física foi a grega através da sua cultura. Nomes como
Sócrates, Platão, Aristóteles, e Hipócrates contribuíram e muito para a Educação
Física e a Pedagogia atribuindo conceitos até hoje aceitos na ligação corpo e alma
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Perante esta situação, a Idade Média caracterizou-se por disputas entre três
poderes que objetivavam o controle da Europa: o poder militar, representado pela
força dos bárbaros; o poder civil, representado pelas organizações municipais e
provinciais estabelecidas pelo Direito Romano, costumes e famílias; e o paganismo,
substituído pelo Cristianismo, que, cultuado de forma exacerbada, preconizava total
importância à salvação da alma e à conquista de uma vida celestial. Resulta deste
abstracionismo, o desprezo pelo culto ao corpo, tornando a atividade física
inexpressiva, passando a ser somente utilizada para a preparação militar. Os
cavaleiros deveriam ser treinados para as grandes Cruzadas e as Guerras Santas,
organizadas pela Igreja, em substituição às antigas festas populares, às vezes
atingindo até as raias do absurdo, como ocorreu com a instituição da Santa
Inquisição. (...) (CAPINUSSÚ, 2005, p. 54)
Para Jean Jacques Rousseau, segundo Lúcio (s/d, s/p) “a natureza é boa, a
civilização é má”, conceito que condensa, em última análise, a filosofia de
Rousseau. Até Goethe, conservador por excelência, reconheceu o caráter
revolucionário e as consequências sociais do novo modo de vida imaginado por
esse grande pensador na sua obra Emilio ou da Educação.
Segundo Moraes (s/d, s/p) a educação física voltada para a nossa ginástica
localizada começa a se desenvolver na Idade Contemporânea e quatro grandes
escolas foram as responsáveis por isso: a alemã, a nórdica, a francesa, e a inglesa.
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estado de alegria que deve imperar uma aula. Claro, isso depende do astral e o
carisma do profissional. Um dos seguidores de Ling, o major Josef G. Thulin introduz
novamente o ritmo musical à ginástica e cria os testes individuais e coletivos para
verificação das performances. (MORAES, s/d, s/p)
Continuando Moraes (s/d, s/p) aponta que a escola francesa teve como
elemento principal o espanhol naturalizado Francisco Amorós Y Ondeano (1770-
1848). Inspirado em Rabelais, Guts, Jahn e Pestalozzi, dividiram sua ginástica em:
Civil e Industrial, Militar, Médica e Cênica. Outro nome francês importante foi G.
Dêmey (1850-1917) que organizou congressos, cursos (inclusive o Superior de
Educação Física), redigiu o Manual do Exército e também era adepto à ginástica
lenta, gradual, progressiva, pedagógica, interessante e motivadora. O método
natural foi defendido por Georges Herbert (1875-1957): correr, nadar, saltar,
empurrar, puxar e etc. A escola inglesa baseava-se nos jogos e nos esportes, tendo
como principal defensor Thomas Arnold (1795-1842) embora não fosse o criador.
Essa escola também ainda teve a influência de Phoktion Heinrich Clias (1782-1854)
no treinamento militar.
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Afirma Santin (1987, p. 28, apud Schreiber, et al, 2005, s/p) que: (...) a
Educação Física terá maior identidade e maior autonomia quando se aproximar mais
do homem e menos das antropologias; quando deixar de ser instrumento ou função
para ser arte; quando se afastar da técnica e da mecânica e se desenvolver
criticamente. A Educação Física deve ser gesto criador. Por intermédio de um maior
comprometimento com a Filosofia, o professor em suas reflexões poderá reformular
conceitos que podem orientar a conduta do seu aluno e interpretar melhor o que ele
faz do seu corpo, de seus movimentos e das suas relações com o mundo (SANTIN,
1987). Consciente da importância da valorização do ser como um todo, respeitando
os seus limites o professor poderá tornar a sua ação pedagógica mais humanizada e
assumir a postura de quem está ciente do seu verdadeiro papel e função na
sociedade.
De acordo com Schreiber, et al (2005, s/p) (...) é provável que por meio desta
conscientização, o professor possa transformar sua ação pedagógica, buscando a
valorização do ser, bem como conscientizar sobre a necessidade de acrescentar à
sua formação disciplinas de conhecimento pedagógico-filosófico. (...) A variedade de
abordagens sobre a Educação Física depõe contra o estabelecimento dos seus
objetivos. O que a distingue das demais disciplinas é o movimento humano,
característica essencial da Educação Física. “Enquanto processo individual a
Educação Física desenvolve potencialidades humanas. Enquanto fenômeno social
ajuda este homem a estabelecer relações com o grupo a que pertence” (OLIVEIRA,
1986, p.105). Segundo este mesmo autor “(...) a colocação da disciplina nos centros
de saúde subverteu os seus objetivos. Educação Física é educação, portanto seu
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Para Oliveira (1994, p. 105), “a Educação Física no Brasil foi durante muito
tempo considerada uma prática neutra, sem conotação ideológica. Restringia-se a
uma atividade física cujo movimento era apreendido pela pedagogia do consenso
em seus aspectos eminentemente biomecânicos”. Não se pode esquecer que o
corpo humano não se move, age; não se pode confundir, pois, pedagogia do
movimento humano com pedagogia do deslocamento humano. (FERREIRA, 1990)
Segundo Oliveira (1994, p. 105), “o panorama educacional brasileiro dos anos 1980
parece que desmistificou esse estereótipo. Apesar de educação e política terem
suas especificidades, todo ato político pressupõe uma dimensão pedagógica, da
mesma forma que toda pedagogia deixa transparecer uma dimensão política”.
Ainda de acordo com Schreiber, et al (2005, s/p) na constante busca por uma
identificação e servindo as ideologias dominantes, a Educação Física já assumiu
diversos papéis na sociedade. Considerada como cultura do físico, como parte da
medicina, como criadora de sofisticadas técnicas esportivas dentre outras
atribuições, esta área acabou por possuir diversos papéis que geraram conflitos
quanto à sua identificação. Apesar da falta de reflexão teórica e de atitude científica
que caracterizou a Educação Física como um todo até poucos anos, houve avanços
consideráveis na área de influência biomédica e na área técnico-desportiva, mas os
avanços neste campo tendem a apresentar o professor como um formador de
atletas, com tendências elitistas. Deve-se considerar que precisamos evoluir de
forma mais conjunta, sendo capazes de formar mentes críticas e conscientes
(OLIVEIRA, 1986). Neste sentido, estaremos nos direcionando a conquista quanto a
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Percebe-se nesta prática, que muitos profissionais que não possuem acesso
a esse pensamento acadêmico, e quanto tem não o vê como possibilidade de
mudanças em suas práticas docentes e, no entanto, desenvolvem o seu trabalho de
forma dinâmica, criativa, atingindo objetivos formadores reais, atendendo
plenamente o trabalho que a sociedade espera da Educação Física na escola. De
acordo com Pereira (1998, p. 170) “aos olhos dos professores, a teoria não é um
problema, mas a relação teoria-prática é que se constitui um problema prático”. Esta
citação explica a preocupação do estreito relacionamento entre a teoria e a prática
da Educação Física Escolar, porém o que temos percebido é o distanciamento e o
caminhar independente da teoria e da prática. (...) É fato comum observarmos na
prática a deficiência apresentada por diversos representantes da Educação Física
ao serem questionados em relação às ideias e objetivos mais concretos com relação
à disciplina em evidência. O mesmo desacerto se faz presente ao perceber que
existe um grande distanciamento entre as disciplinas curriculares oferecidas na
graduação e o que realmente necessitamos para um bom desenvolvimento do
trabalho pedagógico. Grande parte dos currículos atuais encontra-se fragmentado e
desarticulado das ideias sócio político-pedagógico. Nas faculdades de Educação
Física o currículo deveria dar subsídios básicos ao futuro professor, tornando-o
capaz de acompanhar as transformações da sociedade e do conhecimento científico
pedagógico (OLIVEIRA, 1986, apud SCHREIBER, ET AL, 2005, s/p).
raciocínio e a presteza mental, sem esquecer que a ela cabe também o estudo da
fisiologia, a anatomia, das técnicas, da história, etc. Enfim, ela compõe o conjunto
das disciplinas escolares e cumprirá o seu papel quanto mais conseguir tornar-se
Educação Física Escolar. Segundo Escobar (apud Tavares, Morais 1997, p. 36), as
avaliações do atual o currículo de formação evidencia um processo de ensino-
aprendizagem desarticulado sequencialmente e incoerente, o qual não solicita que o
aluno utilize as informações recebidas ou retidas e proceda a análises, trabalhe com
opiniões pessoais e se posicione criticamente. Parte desta defasagem se dá em
função dos desencontrados currículos oferecidos na grade curricular do curso de
Educação Física. A valorização de disciplinas técnicas e a insignificância ou até
mesmo nenhuma importância voltada às disciplinas de caráter reflexivo/filosófico
resultam em desarticulação com a realidade. Por não haver neutralidade no ato
educativo, o próprio currículo traz explicitamente o aspecto político, demonstrando o
comprometimento com o interesse de outra classe social (MORAIS, TAVARES,
1997, p. 32, apud SCHREIBER, ET AL, 2005, s/p).
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Essa via de mão dupla, conforme Gancz (2006, p. 1980) já ensaiada desde
Aristóteles (1952) ao propor que não somente é necessário chegar até o plano das
ideias, mas, retornar ao sensível, é de expressiva utilidade para todo estudioso de
qualquer área do conhecimento. Sendo assim, é muito importante que o ensino da
história possa ser feito de forma a contribuir com a maior quantidade de ferramentas
possíveis para o estudante. Então, quando pensamos dentro do âmbito da educação
física, inevitavelmente surge uma questão: Como vem sendo trabalhado o ensino da
história da educação física? (...) Nessa perspectiva resolvemos buscar os livros que
abordem o assunto do desenvolvimento histórico da educação física. O critério para
a escolha dos livros deveu-se seja por suas contínuas aparições nas bibliografias
dos concursos, seja pela sua leitura ainda recomendada pelos professores. Temos
consciência que esta lista não é totalmente inclusiva, nem mesmo sendo o nosso
objetivo. Queremos apenas, com essa análise, verificar através de uma amostra
significativa como a perspectiva do desenvolvimento histórico da educação física é
trabalhada. Podemos perceber que na maioria da literatura pesquisada existe uma
visão essencial sobre o desenvolvimento da história da educação física. (MAZZEI,
TEIXEIRA, 1967, GHIRALDELLI JÚNIOR, 1989, entre outros)
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Educação Física Pedagogicista (1945-1964): com uma visão que pode ser
traçada ao liberalismo, a vertente pedagogicista propunha a educação física
como um meio de formação do indivíduo. “A educação física, acima das
“querelas políticas”, é capaz de cumprir o velho anseio da educação liberal:
formar o cidadão.” (GHIRALDELLI JÚNIOR, 1989, p.29)
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2. Não foram todos os lugares que sofreram impactos e, nem mesmo, os impactos
foram iguais. Muitas vezes, os reflexos só começam a aparecer anos depois da
mudança no âmbito da conduta. Por exemplo, aqueles que ingressaram no ensino
básico no estado do Rio de Janeiro no final da década de 1980, início da de 1990,
provavelmente tiveram uma educação física de caráter mais competitivista.
3. Esses movimentos não foram homogêneos entre si. Por exemplo, apesar de
promessas e até mesmo de investimentos na área do desporto durante o período de
1964 até 1985, nunca houve uma política real de preparação ou de seleção de
talentos.
6. Como pode ser observado na Coleção Educação Física Escolar (1976) e no livro
Educação Física (1982), editado pelo Ministério da Educação e Cultura, existia uma
ênfase maior em atividades que estimulam mais a “inteligência cinestésico-
corpórea”, na acepção dada por Howard Gardner (1993), do que propriamente um
competitivismo. Isso corrobora com o que falou uma professora, já aposentada, que
dava aula no período: (...) “Realmente tinham muitos professores que davam ênfase
ao esporte. Mas não eram todos. Até porque em muitos colégios nem se tinha
condições materiais de fazer times de competição. Muitos de nós (professores)
dávamos aulas com objetivo de trabalhar a coordenação, os movimentos, essas
coisas, sabe? O mais engraçado era dentro das universidades. Alguns professores
realmente nos exigiam um desempenho atlético. Muitos alunos questionavam até
que ponto tudo isso era necessário. Embora que também tivessem professores que
trabalhavam de maneira diferente (...)” (GANCZ, 2006, p. 1983)
Mais uma vez Gancz (2006, p. 1983) lembra que não pretendemos que esses
pontos sejam a totalidade das discrepâncias no tocante à história da educação
física, mas, sim, serem meros exemplos que podem encorajar estudos de maior
profundidade, além de corroborar com a hipótese do nosso trabalho. (...) Devemos,
em primeiro lugar, situarmos a importância da história da educação física. Faremos
isso a analisando como disciplina e, de acordo com a pentadialéctica e a
decadialéctica, como nos mostra Ferreira dos Santos.
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relações e tensões intrínsecas, para que o aluno possa utilizar esse conhecimento
de forma reflexiva, ponderando e relacionando seus atos. Como série, faz parte do
currículo de formação do aluno de educação física. Assim, esta disciplina deve ser
um componente ativo da formação do novo educador, servindo não só ao propósito
único de ensinar fatos, estabelecer relações e o que mais esteja na ementa, mas
estar articulada com todo o currículo de modo que ela seja, em ato, mais do que a
mera soma de diferentes partes – disciplinas -, atuando sinergisticamente com o
restante do currículo. Como sistema, ela faz parte do movimento historiográfico e,
por isso, sujeita as mesmas situações que a própria historiografia também se sujeita.
Então, quando aparecem visões ou correntes que nos fazem enxergar novas
possibilidades ou caminhos, verificaremos uma adaptação por esta influência tão
sólida, ainda que esta mudança ocorra de forma lenta e/ou gradual. (GANCZ, 2006,
p. 1994)
Por fim, aponta Gancz (2006, 1994) como universo, ela está contida nas
ciências do conhecimento – pensando ciência em lato sensu -, estando, ipso facto,
ligadas a própria noção de conhecimento. Por isso, podemos perceber hoje que
diversas reinterpretações filosóficas, como, por exemplo, a própria ideia pós-
moderna, têm, muitas vezes, criado distintas e profundas alterações no modo de
pensar. (...) A função da universidade é uma função única e exclusiva. Não se trata,
somente, de conservar a experiência humana. O livro também os conserva. Não se
trata, somente, de preparar práticos ou profissionais, de ofícios ou artes. A
aprendizagem direta os prepara, ou, em último caso, escolas muito mais singelas do
que as universidades. Trata-se de manter uma atmosfera de saber pelo saber para
se preparar o homem que o serve e o desenvolve. Trata-se de conservar o saber
vivo e não morto, nos livros ou no empirismo das práticas não intelectualizadas.
Trata-se de formular intelectualmente a experiência humana, sempre renovada, para
que a mesma se torne consciente e progressiva. (TEIXEIRA, 1988, p.17-18)
Quando refletimos sobre o que Anísio nos fala, verificamos o quão longe,
neste caso, estamos. Vemos os apelos dos docentes perante a calamitosa situação.
Vemos uma grande quantidade de alunos desejando através de suas ações um
curso cada vez menos focado no saber. Vemos muitos alunos que sequer gostam
de ler. É imprescindível perguntarmos o porquê. Certamente queremos mudar este
panorama. Só poderemos fazê-lo quando compreendermos a situação atual. Faz-se
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- Higienismo: Conforme Moura (2007, s/p) (...) pensando num processo de deixar a
população mais saudável, se recorre à higiene, acentuando sua importância na
escola. Se higiene e educação caminhassem juntas poderiam transformar a face do
país, promovendo o seu desenvolvimento e viabilizando o seu progresso. Partindo
desta ideia, a higiene e a educação eram encaradas como os melhores remédios
para a cura das doenças tanto do povo quanto do país. Segundo conclusão de Silva
(2002): “a educação imprime no corpo as exigências de uma dada sociedade.
Chegamos a essa conclusão analisando as primeiras sistematizações pedagógicas
para a Educação Física, no século XIX. Neste contexto, a instrução foi eleita como a
única capaz de afirmar um Estado Republicano, esculpir uma conduta social
capitalista e disciplinar um corpo desregrado. Então, para moldar esse corpo “mole”,
a Educação Física, disciplina de moderna sistematização programática, com
respaldo médico higienista, foi escolhida como aquela responsável em educar os
homens através de suas faculdades físicas. Os exercícios, jogos e esportes haviam
de submeter os instintos insubordinados à ordem normativa imposta, era o ideal
pedagógico dessa disciplina. Os hábitos corporais deviam refletir a organização
social”. Nota-se a estreita relação existente entre os discursos pedagógicos e os
discursos médico-higienistas, já que a proposta pedagógica da Educação Física
escolar privilegiava a base anátomo-fisiológica.
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Toda esta influência, de acordo com Moura (2007, s/p) dos médicos na
sociedade já podia ser notada há muito tempo e pode ser percebida pela afirmação
de Foucault (1985) citado por Castellani Filho (1988) “(...) a política médica que se
delineia no século XVIII em todos os países da Europa tem como reflexo a
organização da família (...)” e Foucault (1985) segue em sua linha de pensamento
também citada por Castellani Filho (1988) “(...) é a sua função de higienista, mais
que seus prestígios de terapeuta, que lhe assegura esta posição politicamente
privilegiada no século XVIII, antes de sê-la econômica e socialmente no século XIX
(...)”.
Ainda para Moura (2007, s/p) seguindo o exemplo de Rui Barbosa, Fernando
de Azevedo se tornou outro defensor da implantação da Educação Física
defendendo o método higiênico e não eugênico da raça. Neste sentido Azevedo
(1958) faz a seguinte afirmação: “se, nesse processo em que intervêm forças
biológicas, se não obscuras, certamente incontroláveis, não devemos superestimar o
papel da educação física, não é possível deixar de reconhecê-lo em toda a sua
importância histórica e cientificamente comprovada. É certo que a Educação Física
e, de modo geral, a educação, opera sobre o indivíduo, tal como a natureza o fez,
com seu equipamento hereditário ou o conjunto de suas aptidões inatas; mas não é
menos exato que ela pode influir e influi poderosamente não só no sentido de apurar
e desenvolver as qualidades físicas e mentais de cada um, como também em
orientá-las em direções determinadas. Aquelas constituem os limites da ação
educativa; estes, - a saber, o seu poder de sondagem, de aperfeiçoamento e de
direção, - todo o segredo de sua força. Num país como o nosso cuja população
resulta de uma grande mistura de raças e que abrange etnias diversas, a educação
assume importância capital”.
Dessa forma segundo Moura (2007, s/p) em 1881, a Escola Normal adota a
Educação Física para as crianças oriundas da classe trabalhadora, onde é possível
perceber que a educação do povo através da educação do físico além de aparecer
como antídoto para todos os males, previne e cura doenças, construindo um corpo
robusto e saudável. Com a abertura do Colégio São Pedro em 1882, apresentam-se
as cadeiras de: Ginástica de salão e terreiro, salto, carreira, esgrima e jogo de
forças, natação, equitação, dança e teatro. Com a Proclamação da República em
1889, surge o Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos em abril de
1890. Ainda neste ano é criado o Pedagogium, um centro que nas exposições
escolares apresentava aparelhos de ginástica apropriados à escola brasileira. No
mesmo ano, é redigida a Reforma do ensino primário e secundário, implantada em
1891. De acordo com esta Reforma a prática da atividade física se daria da seguinte
forma: Para as crianças entre 4 e 7 anos a programação de ginástica continha jogos
infantis e exercícios físicos graduados acompanhados de canto. Para as crianças
entre 7 e 9 anos de idade, o programa de ginástica e exercícios militares era o
seguinte, conforme cita Cantarino Filho (1982): “(...) Ginástica – Movimentos
preliminares, alinhamento por altura, numerar-se, tomar distância, cerrar fileiras,
descanso, firmes, meia-volta, à direita e à esquerda, marcha em várias direções.
Exercícios graduados de ginástica: movimentos, flexões de braços, pernas, tronco e
cabeça. Corridas e saltos apropriados à idade. Jogos infantis (...).”
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Nessa época os jogos e os desportos ainda não tinham grande aceitação nos
estabelecimentos de ensino, somente entre 1898 e 1902 é que a Escola Americana
situada em São Paulo introduziu o futebol, dando origem aos clubes colegiais de
futebol desta escola. Antes disto existiam apenas os clubes de remo e natação e os
de esportes atléticos. A partir do Decreto n. º 1.652, de 15 de janeiro de 1894 é
aprovado o Regulamento para o Internato do Ginásio Nacional determinando a
criação do Batalhão do Exército e sua responsabilidade sobre a educação militar,
evidenciando a relação extremamente próxima entre a Educação Física e o Exército,
citado na Dissertação de Mestrado de Cantarino Filho (1982): “(...) as evoluções
militares que faziam parte da Ginástica, passaram a ser componentes da
educação militar, com a criação do “Batalhão do Exército”, constituído de alunos e
orientado por militares do Exército, “no intuito de proporcionar à mocidade
brasileira a educação necessária para o desempenho do dever de defender a
pátria (...).” Além disto, serviria para a melhoria do regime disciplinar nos
estabelecimentos e para o desenvolvimento do patriotismo. No “Batalhão Escolar”,
os alunos eram graduados nos diversos postos, por merecimento, desde cabo de
esquadra até o de comandante, assim como no Exército. Em 1884, surge no Brasil
a primeira escola primária de cunho positivista com o nome de Escola da
Neutralidade. Em 1894, Charles Miller realiza em São Paulo a primeira partida de
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de Educação Física, uma civil e outra militar, propõe também que sejam indicadas
pessoas para estudar o assunto no estrangeiro e trazer este conhecimento para ser
implantado no Brasil e a aquisição de áreas para que os universitários pudessem
praticar jogos ao ar livre e a ginástica sueca, mas seu projeto não foi aprovado.
Percebe-se uma forte influência francesa, na justificativa feita pelo deputado
amazonense no Congresso Nacional, citando como exemplo a França. Segundo
mostra Marinho (1941) citado por Lima (1980) Jorge de Moraes faz a seguinte
afirmação: “(...) é incontestável que ao futuro da Nação Brasileira se prende aquilo
que diz respeito ao desenvolvimento de sua raça e, no entanto, é triste confessar
que a educação física tem sido lamentavelmente descurada nos programas gerais
de ensino, quando a sua inclusão submetida à orientação científica moderna, seria
de absoluta necessidade (...).”
Finalizando Moura (2007, s/p) afirma que (...) depois deste período higienista,
dominado pelos médicos a Educação Física no Brasil passa a ser de
responsabilidade dos militares brasileiros. Com a predominância dos militares a
influência médica diminui mantendo seu domínio principalmente nas questões
ligadas à fisiologia. “Nota-se também que os militares foram os primeiros
profissionais com alguma forma de especialização a ministrar aulas de exercícios
físicos sistematizados”. (MELO, 1996, apud MOURA, 2007, s/p)
- Eugenismo: Para Moreira, Silva (2010, s/p) o termo eugenia foi assumido,
cientificamente, por Francis Galton, em 1883, no livro Inqueires into human
faculty. Influenciado por obras do seu primo, Charles Darwin, Galton defendeu que a
capacidade humana está mais associada à hereditariedade que à educação, e a
eugenia foi, então, descrita como “ciência” que lida com todas as influências que
melhoram as qualidades natas de uma raça. Nas escolas brasileiras as heranças e
concepções de Francis Galton sobre eugenia e higienia foram mais largamente
difundidas nas décadas de 30 e 40, quando os princípios eugênicos colaboraram
para orientar as políticas estruturais de saúde e educação. Esclarecemos que essa
análise de tempo procura situar o recorte metodologicamente traçado: a Educação
Física e a eugenia. Diante disso, necessário se faz considerar os fatos históricos
como elementos não voláteis. Embora o recorte seja das décadas de 20 até 40, por
vezes, recorremos a fatos anteriores e posteriores que se ligam em termos
contextuais.
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inteligência, físicos e psicológicos, que serviam para apartar alunos por turmas,
determinando conceitos de “fracos, fortes, brancos, negros”. A reforma Francisco
Campos (1931) pode ser considerada um marco na elitização do ensino secundário.
Estruturando o ensino em duas etapas: cinco anos para o fundamental e outros dois
anos preparatórios para o ensino superior, com rigidez avaliativa, a reforma tinha
forte impacto na “formação identitária do país”. Por meio da disciplina História,
Campos evidenciava a unidade nacional, destacando a questão étnica e racial e a
busca às origens do povo brasileiro. No contexto exigido pela reforma, o negro era o
“dominado pelo colonizador”, conforme afirma Abud: ele sempre era tratado como
mercadoria, produtor de outras mercadorias. Enquanto ao índio se conferia o
estatuto de contribuição racial, os livros didáticos salientavam a importância do
africano para a vida econômica do país, mas procuravam mostrar que a negritude
estava sendo diluída pela miscigenação. (ABUD, 1998, p. 3)
Sobre a eugenia, no referido período apontam Moreira, Silva (2010, s/p) que é
preciso dimensionar seus efeitos na contemporaneidade: segundo D’Avila (2006, p.
93), “A Ciência da eugenia forneceu uma ponte entre a ideologia racial e a cultura
popular, definindo uma cultura de pobreza”. Reitero o elo da diretriz eugênica nos
anos de declínio da era Vargas, considerada “(...) tão forte que resistiu por mais
tempo do que o apoio oficial à ciência que a orientou”. O autor conclui que, “(...)
embora a eugenia tivesse perdido a legitimação, após o fim da Segunda Guerra
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Ainda de acordo com Moreira, Silva (2010, s/p) a Educação Física brasileira
tem sua origem ligada às instituições militares e à classe médica e essa relação se
assumiu como simbiótica, também, na pedagogia. Pregando a educação do corpo e
tendo como modelo de perfeição um físico saudável e equilibrado, organicamente, a
origem da Educação Física associa-se a médicos higienistas que buscavam
modificar os métodos de higiene da população. Essas diretrizes assumiram
importância vital na construção da matriz racista e na ideologia racial brasileira,
formulada e difundida no século XIX. Sobre esse aspecto, Oliveira (2004), deixa
entender que as passagens históricas mais importantes da Educação Física no
Brasil revelam a estreita relação entre Educação Física, adaptação e pensamento
dominante. Diz-nos este autor que: um dos exemplos mais enfáticos é o da
formação de associações civis destinadas a “prestar culto à pátria”. Soam bem
significativos os modelos do tipo “Juventude Hitlerista”, “Juventude Brasileira”,
“Mocidade Portuguesa”, “Juventude Comunista”, etc., criados na primeira metade do
século. Estas instituições tinham, oficialmente, a finalidade de proporcionar
educação cívica, moral e física aos cidadãos. (OLIVEIRA, 2004, p. 98).
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-Teorias da Cultura Corporal: Para Monteiro, Souza (2008, s/p) segundo Geertz
(1989), é por meio desse mecanismo chamado cultura que o homem adquiriu a
capacidade de ser o construtor de sua própria história, desde a utilização de
ferramentas, passando pelo convívio social, pela linguagem chegando a outras
formas mais complexas de significar o fazer humano. O autor demonstra com isto,
como o convívio entre povos foi tecendo uma teia de significados que foram
ganhando densidade ao longo da história da humanidade, significados estes que,
por sua vez, estão em constante processo de ressignificação.
O conceito de cultura proposto por Geertz (1989, p.15) tem forte influência
das ideias de Max Weber. Uma vez que para este “o homem é um animal amarrado
a teias de significados que ele mesmo teceu.” Geertz ao balizar-se neste conceito,
afirma que para entender o que é cultura, e como ela influencia as ações de um
determinado grupo, é preciso identificar e perceber como as pessoas são, como se
relacionam, como agem e interagem, é, portanto, ir além do visível, é mergulhar, de
fato, no significado das ações desenvolvidas pelos indivíduos em suas sociedades.
Percebe-se a partir dessa visão, que mais do que uma decorrência biológica,
a questão cultural é essencial para o desenvolvimento humano, pois os aspectos
culturais ultrapassam fronteiras e necessitam ser decifrados como teias de
significados que obtêm sentidos próprios. Ainda nessa linha de raciocínio, devemos
lembrar que o ser humano não é visto, na perspectiva de Geertz, de forma
“estratigráfica”, na qual as relações entre os fatores biológico, psicológico social e
cultural da vida humana estariam compostos de níveis superpostos aos inferiores e
reforçando os que estão acima dele. Pelo contrário, o autor propõe uma visão
sintética, na qual todas as relações entre os itens apontados acima estão em
constante sintonia, não sendo possível analisar um sem a influência do outro.
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Ainda para Monteiro, Souza (2008, s/p) o significado atribuído à cultura por
Geertz (1989) é o ponto de partida para as discussões que circulam nesse texto, é
ele que dá subsídios para as discussões sobre as formas de manifestações culturais
que estão relacionadas ao “corpo”. Formas que são absorvidas
ativamente, recebendo um sentido, um significado no próprio processo de recepção
e, portanto, vão adotando significados diferentes em sociedades distintas.
Obviamente que a priori, estas formas e significados não se tornam inteligíveis a
todos os atores que fazem parte desse contexto. Decifrá-las, portanto, é uma das
tarefas a ser cumprida pelos professores, uma vez que o comportamento das
pessoas também é “condicionado”, em grande parte, pelas regras sociais
estabelecidas culturalmente. Regras estas construídas com base num significado
simbólico que toma forma aos poucos.
De acordo com essa ideia, pode-se afirmar que o processo cultural delimita,
em grande parte, como as pessoas escolherão suas formas de manifestarem-se nas
mais diversas situações, inclusive, em relação às questões ligadas ao seu corpo.
Rodrigues (1986) afirma ser inegável a existência de conjuntos de motivações
orgânicas, que conduzem os seres humanos a determinados tipos de
comportamento. Mas o autor alerta que, a cada uma dessas motivações biológicas,
a cultura atribui uma significação especial, em função da qual assumirá
determinadas atitudes e desprezarão outras.
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Nota-se pelas discussões realizadas até o momento, que o corpo não foge as
influências culturais, que ele é o meio de expressão fundamental do ser humano,
sendo assim, não há possibilidade de existência de uma dimensão física isolada da
sua totalidade. Outro autor importante para essa discussão sobre a influência da
cultura no modo como agimos, e, principalmente, como agimos em relação ao nosso
corpo, é o antropólogo francês Marcel Mauss. No texto escrito no início do século
XX, no qual o autor aborda o que chama de técnicas corporais, ele acaba por
considerar a ação humana como sendo também um ato social, que ocorre dentro de
uma configuração dada pelo meio em que o homem vive. Sendo assim, a técnica
que utilizamos para determinadas ações não é influenciada exclusivamente pelo
desenvolvimento biológico, como se pensou durante muito tempo, existe nela toda
uma gama de determinantes culturais, o que nos leva a afirmar que ela é
eminentemente simbólica. Ao falar de cada uma das técnicas o autor procura indicar
as influências culturais que elas sofrem, e como elas podem ser transformadas. Com
essa afirmação inferimos que, se por um lado o desenvolvimento humano pode ser
semelhante em alguns aspectos, por outro, a maneira com que ele se desenvolve
provavelmente será diferente em virtude de vários fatores determinantes, entre eles,
os condicionantes socioculturais. (MONTEIRO, SOUZA, 2008, s/p)
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Observar o trabalho realizado pela área com essa lente nos permite afirmar
que é necessário garantir aos alunos o ensino dos jogos, das lutas, da dança, da
ginástica e outras manifestações culturais do movimento humano de uma forma
contextualizada, possibilitando a eles, a aquisição de um olhar crítico sobre as
informações que lhes são transmitidas. Sendo assim, a compreensão do que
fazemos com o nosso corpo poderá ser resignificada e, percebida dentro de um
contexto que pode ser lido como a cultura o pode. (...) A Educação Física deve ter
uma atuação eminentemente cultural e que para isso ocorrer ela necessita penetrar
no universo das representações sociais. Com isso, estamos reconhecendo que a
Educação Física é uma representação do social, “porque é o produto de uma prática
simbólica que se transforma em outras representações.” (SOUZA, 2008, p.100, apud
MONTEIRO, SOUZA, 2008, s/p)
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Concluindo Monteiro, Souza (2008, s/p) afirmam que após essa breve
discussão, da influência dos aspectos culturais sobre o que fazemos e como
enxergarmos o nosso corpo e a relação disso com as aulas de Educação Física, é
um equívoco continuar a imaginar o ser humano dividido em biológico, social,
cultural, psicológico. Todos esses fatores formam o que Mauss (1974) chama de
“homem total”, pois, para ele, o homem é ao mesmo biológico, social, cultural e
psicológico. Geertz (1979) apresenta visão parecida a de Mauss ao falar de uma
“concepção sintética de ser humano”. Segundo ele, existe uma interação indivisível
entre os aspectos citados acima, fatores esses que ao mesmo tempo em que
influenciam, possibilitam a influência por parte da sociedade onde vivemos,
produzindo, desse modo, uma constante modificação do que chamamos de cultura.
Isso ocorre muitas vezes sem que tenhamos consciência.
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