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Política Externa Brasileira: democracia e
contemporaneidade
Prof. Dezemone
Bloco 4: A Era FHC (1995-2003): controle da inflação e diplomacia liberal
ALBUQUERQUE, José Augusto Guilhon. A Política Externa do Governo Fernando Henrique Cardoso. In:
ALBUQUERQUE, José Augusto Guilhon; SEITENFUS, Ricardo; CASTRO, Sergio Henrique Nabuco de. Sessenta
Anos de Política Externa. Crescimento, Modernização e Política Externa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2006.
ALBUQUERQUE, José Augusto Guilhon. A Alca na Política Externa Brasileira. In: ALBUQUERQUE, José
Augusto Guilhon; SEITENFUS, Ricardo; CASTRO, Sergio Henrique Nabuco de. Sessenta Anos de Política
Externa. Crescimento, Modernização e Política Externa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.
FHC: política externa liberal e democrática – autonomia pela participação e integração
CARDOSO, Fernando Henrique; FERREIRA, Aloysio Nunes; AMORIM, Celso; LAFER, Celso; REZEK, Francisco;
SERRA, José; RICUPERO, Rubens e KALOUT, Hussein. A reconstrução da política externa brasileira. Folha de
S. Paulo. 08/05/2020. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/05/a-reconstrucao-da-
politica-externa-brasileira.shtml Ernesto chama FHC e Ricupero de paladinos da hipocrisia em reação a
artigo. Folha de S. Paulo.
08/05/2020. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/05/ernesto-chama-fhc-e-
ricupero-de-paladinos-da-hipocrisia-em-reacao-a-artigo.shtml
Apesar de nossas distintas trajetórias e opiniões políticas, nós, que exercemos altas responsabilidades na esfera das
relações internacionais em diversos governos da Nova República, manifestamos nossa preocupação com a sistemática
violação pela atual política externa dos princípios orientadores das relações internacionais do Brasil definidos no Artigo 4º
da Constituição de 1988.
Inovadora nesse sentido, a Constituição determina que o Brasil “rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes
princípios: I- independência nacional; II- prevalência dos direitos humanos; III- autodeterminação dos povos; IV- não-
intervenção; V- igualdade entre os Estados; VI- defesa da paz; VII- solução pacífica dos conflitos; VIII- repúdio ao
terrorismo e ao racismo; IX- cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X- concessão de asilo político”.
“Parágrafo único. ARepública Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da
América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.”
É suficiente cotejar os ditames da Constituição com as ações da política externa para verificar que a diplomacia atual
contraria esses princípios na letra e no espírito.
Não se pode conciliar independência nacional com a subordinação a um governo estrangeiro cujo confessado programa
político é a promoção do seu interesse acima de qualquer outra consideração.
Aliena a independência governo que se declara aliado desse país, assumindo como própria uma agenda que ameaça
arrastar o Brasil a conflitos com nações com as quais mantemos relações de amizade e mútuo interesse.
Afasta-se, ademais, da vocação universalista da política externa brasileira e de sua capacidade de dialogar e estender
pontes com diferentes países, desenvolvidos e em desenvolvimento, em benefício de nossos interesses.
Outros exemplos de contradição com os dispositivos da Constituição consistem no apoio a medidas
coercitivas em países vizinhos, violando os princípios de autodeterminação e não-intervenção; o voto na
ONU pela aplicação de embargo unilateral em desrespeito às normas do direito internacional, à igualdade
dos Estados e à solução pacífica dos conflitos; o endosso ao uso da força contra Estados soberanos sem
autorização do Conselho de Segurança da ONU; a aprovação oficial de assassinato político e o voto contra
resoluções no Conselho de Direitos Humanos em Genebra de condenação de violação desses direitos; a
defesa da política de negação aos povos autóctones dos direitos que lhes são garantidos na Constituição, o
desapreço por questões como a discriminação por motivo de raça e de gênero.
Além de transgredir a Constituição Federal, a atual orientação impõe ao país custos de difícil reparação,
como o desmoronamento da credibilidade externa, perdas de mercados e fuga de investimentos.
Admirado na área ambiental, desde a Rio-92, como líder incontornável no tema do desenvolvimento
sustentável, o Brasil aparece agora como ameaça a si mesmo e aos demais na destruição da Amazônia e no
agravamento do aquecimento global.
A diplomacia brasileira, reconhecida como força de moderação e equilíbrio a serviço da construção de
consensos, converteu-se em coadjuvante subalterna do mais agressivo unilateralismo.
Na América Latina, de indutores do processo de integração, passamos a apoiar aventuras intervencionistas,
cedendo terreno a potências extrarregionais.
Abrimos mão da capacidade de defender nossos interesses, ao colaborarmos para a deportação dos Estados
Unidos em condições desumanas de trabalhadores brasileiros ou ao decidir por razões ideológicas a retirada
da Venezuela, país limítrofe, de todo o pessoal diplomático e consular brasileiro, deixando ao desamparo
nossos nacionais que lá residem.
Na Europa ocidental, antagonizamos gratuitamente parceiros relevantes em todos os domínios como França
e Alemanha. A anti-diplomacia atual afasta o país de seus objetivos estratégicos, ao hostilizar nações
essenciais para a própria implementação da agenda econômica do governo.
A gravíssima crise de saúde da Covid-19 revelou a irrelevância do Ministério das Relações Exteriores e seu
papel contraproducente em ajudar o Brasil a obter acesso a produtos e equipamentos médico-hospitalares.
O sectarismo dos ataques inexplicáveis à China e à Organização Mundial de Saúde, somado ao desrespeito à
ciência e a insensibilidade às vidas humanas demonstradas pelo presidente da República, tornaram o governo
objeto de escárnio e repulsa internacional.
Criaram, ao mesmo tempo, obstáculos aos esforços dos governadores para importar produtos
desesperadamente necessários para salvar a vida de milhares de brasileiros.
O resgate da política exterior do Brasil exige o retorno à obediência aos princípios constitucionais, à
racionalidade, ao pragmatismo, ao senso de equilíbrio, moderação e realismo construtivo.
Nessa reconstrução, é preciso que o Judiciário, guardião da Constituição, e o Congresso Nacional,
representante da vontade do povo, cumpram o papel que lhes cabe no controle da constitucionalidade das
ações diplomáticas.
A fim de corresponder aos anseios do nosso povo e corresponder às necessidades reais do Brasil, a política
externa precisa contar com amplo respaldo na opinião pública, e a colaboração na sua concepção de todos os
setores da sociedade.
Requer também o engajamento do nosso corpo de diplomatas: uma política de Estado e não uma ação
facciosa voltada para excitar os ânimos e exacerbar os preconceitos de uma minoria obscurantista e
reacionária.
Nossa solidariedade e decidido apoio aos diplomatas humilhados e constrangidos por posições que se chocam
com as melhores tradições do Itamaraty.
A reconstrução da política exterior brasileira é urgente e indispensável. Deixando para trás essa página
vergonhosa de subserviência e irracionalidade, voltemos a colocar no centro da ação diplomática a defesa da
independência, soberania, da dignidade e dos interesses nacionais, de todos aqueles valores, como a
solidariedade e a busca do diálogo, que a diplomacia ajudou a construir como patrimônio e motivo de orgulho
do povo brasileiro.
Temer: a busca da legitimidade em meio a desconfiança
Marcus Dezemone
• dezemone@gmail.com