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Diplomacia 360o – Módulo Atena – Política Internacional – Aula 06

Prof. Paulo Velasco – 05.09.2018

REGIME INTERNACIONAL DE DIREITOS HUMANOS

HISTÓRICO:

→ Final do Século XVIII


- Direitos humanos no contexto particular das revoluções liberais:
- Revolução Francesa – Legado: Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
- Revolução Americana – Legado: Constituição dos EUA.

→ Garantia dos direitos e liberdades civis.


- Reconhecimento de que determinadas esferas da vida individual devem ficar livres da
interferência do Estado. Um Estado que, até então, podia tudo, inclusive dispor da vida dos
indivíduos. Revoluções são “liberais” porque vão livrar indivíduo das arbitrariedades do Estado.
Obs.: direitos naturais, como o direito à vida.

→ Século XIX: direitos civis e políticos – direitos humanos de 1a geração


*Aqueles que primeiro surgiram e foram garantidos pelas constituições liberais.
*Ainda eram direitos parciais: voto feminino só foi concedido a partir do século XX, no contexto
da luta das sufragistas (Nova Zelândia foi pioneira). Voto de analfabetos só foi garantido, no
Brasil, com a Constituição Federal de 1988.

→ Século XX: direitos econômicos e sociais – direitos humanos de 2a geração


- Constituição Mexicana de 1917 – vanguardista até os dias de hoje.
- Constituição da República de Weimar (Alemanha) de 1918.
- Constituição Brasileira de 1937 (Vargas).

→ Final do século XX / início do século XXI: direitos difusos – direitos humanos de 3a geração
- Direito a um meio ambiente sustentável.
- Direito à Paz.

Obs.: direitos humanos de 1a e de 2a geração estão associados à relação do indivíduo com o


Estado, tanto em relação aos direitos negativos como aos direitos positivos.

Direitos negativos – 1a geração – realizados a partir da inação do Estado.


Direitos positivos – 2a geração – realizados a partir da ação do Estado.

→ 2a Guerra Mundial
- Não se pode deixar os direitos humanos a cargo apenas dos Estados.
- Estado pode ser levado a ações que significam a não proteção de indivíduos ou, inclusive, a
violação dos direitos humanos pelo próprio Estado.
- Como a 2a Guerra criou um clima de pavor, dentro de uma concepção liberal de mundo, a
criação da ONU pretendia a manutenção da paz internacional.
- Estados que promovem a defesa dos direitos humanos seriam menos propensos à guerra.
- Inaugura-se, com a ONU, a base da proteção dos direitos humanos.
1945: criação da ONU.
- Artigo 1o da Carta da ONU: prevê os objetivos da ONU.
- Promoção dos direitos humanos e das liberdades individuais
- Primeiro tratado internacional da história a assumir uma obrigação com a promoção
internacional dos direitos humanos.
- Faltava dizer quais eram os direitos humanos – até então estavam previstos apenas em
constituições nacional, variando de um país para o outro.
- 3 anos depois, no dia 10/12/1948, é aprovada a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
- Esclarece quais são os direitos humanos, apresentados em 30 princípios.
- Ênfase enorme aos direitos de 1a geração –apenas ao final da declaração aparecem alguns
princípios de 2a geração.
- PROBLEMA: documento meramente declaratório, recomendatório, cujo conteúdo não vincula
os Estados. Hoje, porém, a doutrina do direito internacional confere à declaração força
vinculante, por razão de ter se tornado costume internacional.

Era necessário que a ONU fizesse algo mais:

→ 1966: Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos.


→ 1966: Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

Por que DOIS pactos e não apenas UM contemplando todos os direitos humanos?

→ Cenário de Guerra Fria: contexto de bipolaridade não permitia.


EUA: apenas liberdades civis seriam direitos humanos. Indivíduo com seu trabalho conseguirá
custear saúde, educação e cultura. EUA até hoje estão de fora do 2o Pacto.
URSS: direitos humanos são os direitos econômicos e sociais (Estado socialista provê esses
direitos). Não havia liberdades civis e políticas.

Ambos os pactos só entraram em vigor em 1976. Foram necessários 10 anos para conseguir um
número mínimo de ratificações.

Explicação mais técnica e menos política:


- Fato de que o monitoramento desses direitos deve ser feito de maneira diferente.

→ Direitos humanos de 1a geração são reconhecidos como direitos de cobrança imediata.


- São direitos que, uma vez positivados (em lei), podem ser exigidos do Estado.
- Rigor no monitoramento desses direitos é elevado.

→ Direitos humanos de 2a geração são reconhecidos como direitos de realização progressiva –


de cunho programática – não podem ser cobrados (não há justiciability).

Como esse monitoramento só pode ser feito de forma distinta, foi necessária a criação de dois
pactos distintos.

→ COMITÊ DE DIREITOS HUMANOS – apesar de pacto ser vinculante, comitê não tem poder
coercitivo para garantir cumprimento de suas decisões.

→ COMITÊ DE DIREITOS ECONÔMICOS E SOCIAIS (ECOSOC)


Obs.: Carta Internacional de Direitos Humanos
- Não tem sequer data. É mera compilação da declaração de 1948 e dos pactos de 1966.
BRASIL – participa muito ativamente da elaboração da declaração de 1948. Porém, não participa
da discussão relativa aos pactos de 1966. Somente em 1992, Brasil ratifica os pactos de 1966.

ESTRUTURA NORMATIVA DO REGIME INTERNACIONAL DOS DIREITO HUMANOS


- Base: Carta Internacional de Direitos Humanos.
- Também há múltiplas convenções internacional sobre direitos humanos, no âmbito da ONU.
- Convenção de 1965 sobre a eliminação da discriminação racial.
- Convenção de 1979 sobre a eliminação da discriminação contra a Mulher.
- Convenção sobre a eliminação da Tortura.
- Convenção de 1989 sobre a Criança.

ESTRUTURA INSTITUCIONAL DO REGIME INTERNACIONAL DOS DIREITO HUMANOS

→ Base: ONU
- ECOSOC (Conselho Econômico e Social): escolhido para criar uma comissão específica voltada
para a proteção dos direitos humanos.
- Cria-se, em 1946, a Comissão de Direitos Humanos (CDH), que funcionou como uma das várias
comissões temáticas vinculadas ao ECOSOC.

2 momentos da CDH:

1o momento: 1947-1966 – período abstencionista.


- Doutrina 1947: enunciada por Eleanor Roosevelt (a mais importante Primeira Dama dos EUA).
- Escolhida por sua reconhecida capacidade intelectual (1a Presidente da CDH).
- CDH não tem por função investigar violações cometidas dentro dos Estados.
- Papel da CDH seria promover os direitos humanos mundo afora, contribuindo para a
elaboração de normas.
- Pragmaticamente, a preocupação de Eleanor Roosevelt era de não confrontar Estados, dando
a possíveis boicotes desses Estados.
- Nessa época, Estados ainda estavam extremamente apegados à noção de soberania.
- Nos seus primeiros 20 anos, a CDH se absteve de investigar violações aos direitos humanos.

2o momento: 1967-2006 – período intervencionista.


- CDH passa a intervir em questões domésticas, investigando violações e aprovando
condenações aos Estados violadores.

→ Resolução ECOSOC no 1.235/1967


- Explicitamente autoriza CDH a investigar violações.
- Revoga a Doutrina 1947.

→ Resolução ECOSOC no 1.503/1970


- Autoriza a CDH a receber denúncias de indivíduos.
- Qualquer pessoa que se veja violado nos seus direitos humanos poderá enviar denúncia.
- Recursos internos devem ser esgotados.
- No início dos anos 1970, Brasil é um dos países mais denunciados por queixas individuais.
- Contexto do governo Médici – violento – LINHA DURA.
- Adoção de mecanismos investigativos – em 1975, são criados os relatores geográficos
(investigam todo tipo de violação, mas em apenas um Estado).
Ex.: 1975 – Chile. Brasil de Geisel fica assustado.
→ Diplomacia brasileira do governo Geisel candidata-se, em 1977, a um assento na CDH,
pensando pragmaticamente em impedir a criação de relator contra o Brasil. CDH aprova a
candidatura do Brasil. Brasil entra na CDH em bases defensivas e acautelatórias.

→ Criação de relatores temáticos (investigam um tipo de violação, mas em qualquer Estado):


1980: relator temático para investigar os desaparecimentos forçados.

2 principais fragilidades da CDH:

→ Seletividade: CDH agia prontamente em alguns casos, mas em outros não agia da mesma
forma, mesmo em casos igualmente graves. Era órgão que dava prevalência a critérios políticos,
em detrimento de critérios técnicos.

Ex.: China e sua influência política evitava ser investigada e condenada.

→ Presença de Estados violadores: desmoralizou largamente o trabalho da CDH ao longo do


tempo.

Ex.: Líbia de Kadafi chegou a presidir a CDH. Cuba, Iêmen e Arábia Saudita já foram membros.

2006: EXTINÇÃO DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS


→ CRIAÇÃO DO CONSELHO DOS DIREITOS HUMANOS.

Obs.: Comitê de DH não se confunde – é mecanismo convencional, ligado ao Pacto de 1966,


podendo atuar apenas sobre Estados que são parte desse pacto.

Conselho de Direitos Humanos alcança qualquer Estado-membro da ONU. Mecanismo


extraconvencional. Carta da ONU foi assinada por todos os membros.

Novidades:

→ 47 membros (diminuição em relação à Comissão, que tinha 53 membros).

→Novos membros passam a ser eleitos por maioria simples no plenário da AGNU.
- No contexto da Comissão, apenas os países da mesma região votavam.

→ Possibilidade de suspensão de membros, caso estejam violando sistematicamente os DH.


Ex.: Líbia foi suspensa pela AGNU em 2011 – contexto da Primavera Árabe.

→ Proposta do Brasil – aprovada pela AGNU – mecanismo de revisão periódica universal – todos
os membros da ONU devem enviar relatórios de DH a cada 5 anos – prestação de contas a fim
de impedir seletividade. Brasil deu exemplo, apresentando relatórios em 2008, 2012 e 2017.
- Em 2017, houve críticas do Conselho ao Brasil: violência policial, sistema prisional (ocorrência
de massacres em presídios) e políticas de austeridade fiscal.
-Elogios ao Brasil: Lei Maria da Penha e Lei do Feminicídio.

→ Conselho não se vincula mais ao ECOSOC.


- Denominação como conselho confere mais prestígio a esse órgão.
CONFERÊNCIAS DA ONU SOBRE DIREITOS HUMANOS

1) 1968: Conferência de Teerã.


- Grande fracasso, por conta das posições soberanistas dos Estados, a fim de escapar das
condenações.
- Relativismo cultural: alguns Estados alegam que direitos humanos são instrumentos de
imperialismo cultural do Ocidente.

2) 1993: Conferência de Viena.


- Uma das mais importantes conferências da década de 1990.
- Clima pós-Guerra Fria.

→ Reconhecimento do Universalismo dos Direitos Humanos, embora tenha origem ocidental


- Artigo 5o da declaração final de Viena trata dessa questão. Diz que devem ser levadas em
consideração as particularidades históricas, linguísticas e culturais de cada Estado (ONU não
busca padronização cultural), mas não podem servir de base para violações de direitos humanos.

→ Indivisibilidade e interdependência dos Direitos Humano


- Em termos de implementação de políticas públicas não se permite uma divisão perniciosa pelos
Estados, priorizando certos direitos em detrimento de outros. Direito à vida (de 1a geração) não
pode ser garantido sem a proteção ao direito à Saúde (de 2a geração).

→ Direitos Humanos como tema global (tema de livro do Embaixador Lindgren Alves)
- Nenhum Estado pode alegar que DH são um tema de soberania.
- Impede que Estados mantenham posturas soberanistas sobre DH.

→ Reconhecimento do desenvolvimento com um direito humano.


- Há mais de uma década o desenvolvimento tem o indivíduo como elemento central.
- Segurança e desenvolvimento humano precisam estar de mãos dadas.
- Durante a guerra contra o terror, por exemplo, direitos humanos foram violados em nome da
segurança.

BRASIL
A partir da redemocratização, Brasil abandonou a postura soberanista do passado para
privilegiar uma postura cooperativa.

- Sarney: assina e ratifica a Convenção sobre a Tortura e inicia a ratificação dos Pactos de 1966.
- Collor: termina a ratificação dos Pactos de 1966.
- Itamar: participação protagônica, atuante e convergente do Brasil no Congresso de Viena.
- FHC: reconheceu a jurisdição obrigatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
- Lula: apoio à criação do Conselho de Direitos Humanos.
- Dilma: avanços relativos à defesa dos direitos da mulher – Lei do Feminicídio.
- Temer: não se pode falar de retrocesso, mas há, definitivamente, uma postura menos atuante.

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