Explorar E-books
Categorias
Explorar Audiolivros
Categorias
Explorar Revistas
Categorias
Explorar Documentos
Categorias
DINÂ MICAS
13. Abandono do Espaço Agrícola na “Beira Transmontana”
A ideia partiu do ensaísta Eduardo Lourenço
14. Educação – Reconfiguração e Limites das Suas Fronteiras
15. Escola – Problemas e Desafios na sessão solene comemorativa do Oitavo
16. As Novas Geografias dos Países de Língua Portuguesa – Centenário do Foral da Guarda, em 1999,
Paisagens, Territórios, Políticas no Brasil e em Portugal
SOCIO ECONÓMICAS
17. Interioridade / Insularidade – Despovoamento / Desertificação tendo em vista a criação de um Centro de
18. Efeito Barreira e Cooperação Transfronteiriça na Raia Ibérica Estudos que contribuísse para um renovado
19. Patrimónios, Territórios e Turismo Cultural
20. A Cidade e os Novos Desafios Urbanos conhecimento das diversas culturas da
21. Vida Partilhada – Eduardo Lourenço, o CEI e a Cooperação Península e para o estudo da Civilização
Cultural
22. Falar Sempre de Outra Coisa – Ensaios Sobre Eduardo Lourenço EM DIFERENTES CONTEXTOS TERRITORIAIS Ibérica como um todo.
23. Metafísica da Revolução – Poética e Política no Ensaísmo de
Eduardo Lourenço
24. Paisagens, Patrimónios e Turismo Cultural Criado formalmente em Maio de 2001, o
25. Condições de Vida, Coesão Social e Cooperação Territorial CEI tem vindo a afirmar-se como pólo privi-
26. Paisagens e Dinâmicas Territoriais em Portugal e no Brasil –
As Novas Geografias dos Países de Língua Portuguesa COORDENAÇÃO DE legiado de encontro, reflexão, estudo e
27. Espaços de Fronteira, Territórios de Esperança – Das RUI JACINTO divulgação de temas comuns e afins a
Vulnerabilidades às Dinâmicas de Desenvolvimento
28. Paisagens, Patrimónios, Turismos Portugal e Espanha, com especial incidência
29. Educação e Cultura Mediática – Análise de Implicações na região transfronteiriça.
Deseducativas
30. Espaços de Fronteira, Territórios de Esperança – Paisagens e
Patrimónios, Permanências e Mobilidades
31. Diálogos (Trans)fronteiriços – Patrimónios, Territórios, Culturas
32. Outras Fronteiras, Novas Geografias - Intercâmbios e Diálogos
Territoriais
33. Lugares e Territórios – Património, Turismo Sustentável, Coesão
Territorial
34. Andanças e Reflexões Transfronteiriças – Roteiro Miguel de
Unamuno – Eduardo Lourenço
35. Novas Fronteiras, Outros Diálogos – Paisagens, Patrimónios, Cultura
36. Novas Fronteiras, Outros diálogos: Cooperação e
Desenvolvimento Territorial
37. Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
38. As Novas Geografias dos Países de Língua Portuguesa:
Cooperação e Desenvolvimento
39. Geografias e Poéticas da Fronteira - Leituras do Território
Coordenação:
Rui Jacinto
40
IBEROGRAFIAS
Coleção Iberografias
Volume 40
Âncora Editora
Avenida Infante Santo, 52 – 3.º Esq.
1350-179 Lisboa
geral@ancora-editora.pt
www.ancora-editora.pt
www.facebook.com/ancoraeditora
O Centro de Estudos Ibéricos respeita os originais dos textos, não se responsabilizando pelos conteúdos, forma e opiniões neles expressas.
A opção ou não pelas regras do novo acordo ortográfico é da responsabilidade dos autores.
Apoios:
Patrimónios e paisagens
Defesa e Religião no período colonial em Cabo Frio: memória, patrimônio histórico 455
e história local
André Luiz Garrido Barbosa
Políticas públicas e a gestão de cidades climaticamente sustentáveis no contexto 473
das mudanças ambientais globais: considerações sobre as cidades brasileiras
Aline Pascoalino
Cidade, arte e literatura: fragmentos sobre Fortaleza 495
José Borzacchiello da Silva
Rui Jacinto
Centro de Estudos Ibéricos (CEI)
Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT)
recebe diversos atributos que revelam não ser possível confinar o conceito a um estr(e)
ito limite geopolítico, pois, enquanto realidade polissémica remete necessariamente para
problemáticas mais abrangentes.
1
Ao longo da última década os temas gerais dos Cursos de Verão foram: Novas fronteiras, outros diálo-
gos: cooperação e desenvolvimento (2020, 2019); Novas fronteiras, outros diálogos: património cultural,
cooperação e desenvolvimento territorial (2018); Lugares e territórios: novas fronteiras, outros diálogos
(2017); Espaços de fronteira em tempos de incerteza: pensamentos globais, ações locais (2016); Iberismo
e Lusofonia: paisagens, territórios e diálogos transfronteiriços (2015); Espaços de Fronteira, Territórios de
Esperança: velhos problemas, novas soluções (2014); Espaços de Fronteira, Territórios de Esperança (2013);
Fronteiras e Coesão Territorial (2012); Diálogos Ibéricos e Cooperação: terras, gentes, culturas (2011);
Patrimónios e Territórios Culturais: recursos, estratégias e práticas (2010).
10 //
2
O CEI publicou neste âmbito os seguintes títulos: Paisagens, Patrimónios e Turismo Cultural (Coleção
Iberografias, Nº 24; 2012); Condições de vida, Coesão social e Cooperação Territorial (Nº 25; 2012);
Paisagens, Patrimónios, Turismos (Nº 28; 2014); Diálogos (Trans)fronteiriços – Património, Territórios,
Culturas (Nº 31; 2014); Outras Fronteiras, Novas Geografias: Intercâmbios e Diálogos Territoriais (Nº 32;
2016); Lugares e territórios: património, turismo sustentável, coesão territorial (Nº 33; 2017); Novas
Fronteiras, Outros Diálogos: Paisagens, Patrimónios, Cultura (Nº 35; 2017); Novas Fronteiras, Outros
Diálogos: Cooperação e Desenvolvimento Territorial (Nº 36; 2018); As Novas Geografias dos Países de
Língua Portuguesa: Cooperação e Desenvolvimento (Nº 38; 2019)
12 //
Rui Jacinto
Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT)
Introdução
Na constituição deste texto, toma-se como referência a toponímia relativa aos nomes
das cidades, que compõem o estado do Rio Grande do Sul (RS), Brasil, com o objetivo
de resgatar, pela nominação local, a história socioespacial da relação com a natureza, no
processo de ocupação deste estado.
Neste texto, não será feita uma análise no campo da linguística; trata-se de, a partir da
toponímia, refletir sobre a formação do espaço geográfico, enfatizando a designação dos
lugares e a intrínseca relação deste processo com as características naturais e com a ocupação
populacional. Para realizar este ensaio, o procedimento inicial foi, com base no conjunto dos
Sentia que estava a gostar do seu trabalho mais do que nunca, graças
a ele pudera penetrar na intimidade de tantas pessoas famosas, saber, por
exemplo, coisas que algumas faziam para ocultar, como serem filhas de pai
ou de mãe incógnitos, ou incógnitos ambos, que era o caso de uma dessas, ou
dizerem que eram naturais da sede de um concelho ou da sede de um distrito
16 //
(...) parte da onomástica que estuda os nomes próprios de lugares; lista, relação
de topônimos; estudo etimológico e/ou histórico sobre os topônimos. (Compreende
diversas subdivisões, como corônimos, limnônimos, eremônimos, potamônimos;
livro (ou outro suporte) que contém tal relação ou estudo.
Para Dick, a toponímia pode ser entendida como “um imenso complexo línguo-cultural,
em que os dados das demais ciências se interseccionam necessariamente e, não, exclusi-
vamente” (Dick, 1990, p. 16). Constitui um caminho de análise, que permite uma cons-
trução interdisciplinar, que vem sendo resgatado, com o advento das análises culturais,
no terreno da Geografia, para uma compreensão do significado dos lugares e de suas
correspondentes nominações, dentro do contexto histórico.
Com este enunciado, fica evidenciada a possível interconexão entre Geografia (o
lugar), História (o período e o contexto de nominação) e Linguagem. Nesse sentido, con-
siderando o interesse deste estudo, que busca analisar a toponímia das cidades do estado
do Rio Grande do Sul, Brasil, pode-se, a partir de uma leitura prévia, informar que, para
um português, a denominação dos lugares, e a atitude dos brasileiros, em relação aos esses
17 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
nomes, é semelhante à que manifestam com a língua, em geral, e com o nome das pessoas,
em particular: uma expressão de criatividade, que parece ir além da gramática e doutros
cânones, que impõem normas e padrões mais restritos.
Sob outra forma de constituir uma concepção de toponímia, poderíamos dizer que, no
campo da Geografia, a legenda de um mapa, enquanto registro da denominação de lugares,
é o produto toponímico por excelência. Essa representação pode ser entendida, como o
nome, como uma tatuagem no corpo da terra, uma marca profunda e perene. Sendo assim,
o mapa expressa a distribuição dos lugares no território, uma vez que cada nome atribuído
tem um significado histórico e linguístico. Assim, num estudo desta natureza, a legenda
(denominação das cidades) constitui o tema, que permite construir a narrativa.
ligações de nomes a outros povos, que habitaram tais territórios (suevos, romanos, árabes
etc.). A similitude do caso brasileiro prende-se, fundamentalmente, à permanência, ou à
sobrevivência, de nomes indígenas. A este propósito, Jean-René Trichet observa:
A análise toponímica, baseada nos nomes dos municípios do estado do Rio Grande
do Sul, mostra uma grande dispersão de topônimos, que nos levou, em primeiro lugar,
a tentar promover uma sistematização, que melhor os organizasse, considerando seus
significados díspares. Deixando de lado aqueles, para os quais não se conseguiu encon-
trar um significado plausível ou para os quais foi difícil fazê-lo, procurou-se promover
uma sistematização em grupos fundamentais, donde, com naturalidade, se destacaram
alguns subgrupos:
Igreja, através da prevalência dos nomes da região das Missões e a frequência com
que foram atribuídos nomes de santos aos lugares.
Com base nestes pressupostos, foi lançado um primeiro olhar sobre o nome das cidades
do estado do Rio Grande do Sul, em que foram privilegiadas três coordenadas principais:
1. Toponímia e matriz identitária, que inclui os nomes dos lugares, que remetem a
uma matriz primordial, inicial, ou a certos qualificativos identitários;
2. Rotas do povoamento primordial, que engloba os nomes dos lugares, que, de certa
forma, revelam a génese do povoamento e o processo de colonização, através do
nome de pessoas, de santos, de lugares portugueses ou datas históricas;
20 //
Cabe observar que no presente trabalho, especificamente, serão analisados dados par-
ciais de um projeto em andamento, referentes aos itens Toponímia e matriz identitária e
Rotas do povoamento primordial. O item Condições naturais, particularidades e especificidades
locais terá uma análise mais específica e constituirá outro texto analítico.
Procedimentos cartográficos
Após a classificação das toponímias dos municípios do Rio Grande do Sul, Brasil,
construída, a partir de pesquisa bibliográfica minuciosa, vinculou-se os resultados das clas-
sificações à base vetorial dos municípios do Rio Grande do Sul (IBGE, 2018), possibilitando
a segmentação das toponímias, conforme sua origem e classificação.
A vetorização dos mapas foi realizada com o auxílio do software ArcGis para as bases
cartográficas não encontradas, durante as etapas de pesquisa e de aquisição de dados
Para a composição dos mapas, foi utilizado o software Quantum Gis (QGis), com
quatro sobreposições:
– Mesorregiões (IBGE, 2018);
– Base adaptada/vetorizada de regiões fisiográficas (UFMS/SEMA-RS, 2001);
– Base adaptada/vetorizada das unidades geomorfológicas (CEPSRM/UFRGS, 2001);
– Base adaptada/vetorizada de vegetação original (Secretária da Agricultura – SA/DGC, 1983).
A panóplia de nomes de lugares, com que nos deparamos, sem deixar de levar em
consideração os pressupostos enunciados, obrigou a uma análise mais fina e à definição
duma grelha mais apertada, para se proceder à análise. Este minucioso trabalho conduziu
à criação da forma de análise utilizada neste trabalho e que se passa a apresentar.
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Nomes indí-
Tipologias (incluindo subgrupos) Sul (49)
genas (94)
1. Toponímia e matriz identitária
1.1. Nome Indígena 6
1.2. Missão
2. Rotas do povoamento primordial
2.1. Elementos fundamentais do povoamento primordial: 1 8
2.2. O paraíso na terra: em demanda da terra da redenção 9
2.3. Antroponimia: nome de pessoas 1 8
2.4. Nome de santos 15 5
2.5. Nome de lugar portugueses 1
2.6. Imigração 3
2.7. Nome de data histórica 2
3. Condições naturais locais
3.1. Biogeografia: animais 16
3.2. Biogeografia: plantas 2 21
3.3. Condições biogeográficas locais: mato 4
grupos definidos, para enquadrar a generalidade dos nomes das cidades das diferentes
mesorregiões administrativas do Rio Grande do Sul. Cada tipologia, individualmente ou
com outras, que lhe sejam afins, originaram mapas, que nos permitem analisar a dispersão
geográfica dos nomes das cidades.
Importa salientar, desde já, que há uma maior concentração de referências no Norte do
estado, devido aos processos de ocupação e de dimensionamento das propriedades: de maior
extensão, ao Sul (área de ocupação portuguesa, dividida em sesmarias, após o encerramento
dos conflitos com a coroa espanhola) e de pequenas propriedades, ao Norte, tendo recebido
os camponeses, provenientes das colonizações alemã (1825) e italiana (1875). Tais processos
geraram menor concentração de população, ao Sul, e maior concentração, ao Norte, e, con-
sequentemente, uma significativa concentração de cidades, na porção setentrional do estado.
26 //
O primeiro grupo foi constituído, relacionando nomes, que nos remetam à matriz
identitária do estado. Neste grupo foram incluídos os lugares com nomes indígenas e os
lugares com nomes compostos, que trazem missões ou Sul, associados a um nome principal
(Salvador das Missões ou S. Pedro do Sul, etc.).
Entre os topônimos que remetem à matriz primordial, que podemos considerar qua-
lificativos identitários, acabam por destacar, desde logo, três dimensões: a cultural (nomes
indígenas), a histórica (Missões) e a geográfica (Sul). Neste grupo, foram privilegiados os
nomes de lugares, que fazem referências identitárias, de cariz diferente, quais sejam: nomes
indígenas ‒ implicando uma reflexão, a respeito de como tais designações sobreviveram,
até à atualidade ‒, Missões e Sul.
Nomes indígenas
Muitos nomes índigenas foram substituídos por nomes portugueses, uma dentre várias medidas implementadas 27 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
1
nas sucessivas reformas administrativas impostas à colônia da América, de que se podem destacar: a transfe-
rência da sede do Governo Geral do Estado do Brasil, de Salvador para o Rio de Janeiro (1763); a extinção do
estado do Grão-Pará e Maranhão e sua incorporação ao Brasil (1772); e a incorporação das antigas capitanias
de Ilhéus, de Porto Seguro e de Espírito Santo à da Bahia (1750). Anos mais tarde, em 30 de abril de 1763, o
Marquês de Pombal havia de elaborar um documento, composto de 18 instruções, que continha as diretrizes
fundamentais, para a criação e para a gestão do território colonial. A instrução de número 17 tratava da necessi-
dade de transformar as aldeias em vilas e, também, de estimular o descimento de novos contingentes de índios
dos sertões, para a fundação de novas vilas, que deveriam adotar nomes de cidades e de vilas de Portugal: “17.
Ordena também S. Magestade que assim naquellas povoaçoens chamadas Aldeyas que já estão domesticadas,
como nas que de novo se estabelecerem com índios descidos; logo que estes se descerem no competente nu-
mero, se vão estabelecendo novas Villas e se vão abolindo nellas os bárbaros e antigos nomes que tiverem; e se
lhes vão impondo alguns outros novos de cidades e villas deste Reino” (RIGHB, 1916, p. 63). Como resultado
deste expediente, foram criadas outras seis vilas de índios, em Porto Seguro: Belmonte (1764), São Mateus
(1764), Prado (1765), Viçosa (1768), Porto Alegre (1769) e Alcobaça (1772).
pelos territórios do Prata, e pelo menor contingente, em relação à população dos outros
dois grupos, não tenha favorecido à criação de grande número de núcleos populacionais,
comparativamente às regiões centro, norte e litoral, nas quais os grupos Jê e Tupi-Guarani
predominavam, em termos populacionais. Estes viviam em aldeias familiares, portanto,
gerando lugares de moradia, que constituíram pontos iniciais de ocupação.
Importa relembrar que, se olharmos o território com maior detalhamento espacial (na
microescala), a presença de topônimos indígenas é significativa, em toda a sua extensão.
Morros, serras, rios, espécies vegetais e animais têm vínculo muito forte com a população
indígena, seja no RS, seja em território brasileiro.
Cabe fazer referência, como um constituinte fundamental dessa condição indígena,
o aldeamento, em especial, dos indivíduos do grupo Tupi-Guarani, nas missões jesuíticas
28 //
Missões
Esta classe, embora integre um número relativamente reduzido de lugares, foi criada,
pelo seu significado histórico e pelas repercussões, dentro do processo de ocupação do ter-
ritório do RS. A classe integra o nome de lugares, como: Salvador das Missões, São Paulo
das Missões, Santo Antônio das Missões, São Miguel das Missões, São José das Missões,
São Pedro das Missões, Palmeira das Missões, Dois Irmãos das Missões.
Sul
destaca-se a denominação das mesorregiões administrativas, que constituem uma das bases
regionais de análise desta classificação. As denominações revelam a origem toponímica,
vinculada ao nome do estado e à posição geográfica. São elas: Nordeste Rio-Grandense,
Noroeste Rio-Grandense, Sudoeste Rio-Grandense, Sudeste Rio-Grandense, Centro
Ocidental Rio-Grandense, Centro Oriental Rio-Grandense. A toponímia Campanha,
provavelmente, foi introduzida pelos espanhóis, para designar extensas áreas de campo e de
relevo relativamente pouco acidentado. São exemplos: Campanha Ocidental, Campanha
Central, Campanha Meridional.
30 //
Fonte: elaborado por Borges Neto (2020), com base em CDC e IBGE
A Campanha compreende grandes extensões, ao sul do Rio Grande do Sul, com domí-
nio dos campos e das terras baixas, espaços de ocupação primordialmente indígena ‒ pam-
pianos. Estes eram identificados, mais especificamente, em dois grupos: o dos Charruas,
que habitava os campos dos atuais territórios do Uruguai, do nordeste da Argentina (es- 31 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
pecialmente, na Província de Entre Rios) e do sul do Rio Grande do Sul, no Brasil; e o
grupo dos Minuanos, que habitava os campos do sul do estado do Rio Grande do Sul,
bem como o Uruguai. Esta etnia empresta o nome ao forte vento Sudoeste, dominante
na Campanha do RS. Trata-se de um vento muito frio, que sopra do Sul do continente e
atinge o Rio Grande do Sul, após passagem de frentes frias ou em períodos chuvosos do
inverno ‒ Vento Minuano.
-do-sul-rio-grande-do-norte-e-rio-de-janeiro/.
32 //
3
Tão grande e tão bonita, que parece um mar. Assim é a Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul, a maior lagoa da
América do Sul, com quase 300 quilômetros de comprimento. As águas, ora doces, ora salgadas, formam lindas
praias, enfeitadas por coqueiros e por figueiras centenárias – um cenário paradisíaco, ainda pouco conhecido do
grande público e, talvez por isso, preservado. O curioso é constatar que o Mar de Dentro, como é conhecida a lagoa, 33 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
não tem patos e, na verdade, nem é uma lagoa, como explica Álvaro Machado, biólogo e técnico da Divisão de
Planejamento da Secretaria de Turismo do Rio Grande do Sul: “O nome da região é herança de uma tribo indígena
que habitava o Rio Grande do Sul no início da colonização da Brasil, e que se chamava ‘patos’. E a lagoa é, na reali-
dade, uma laguna, sistema que se caracteriza pela ligação com o mar, por meio de estuários. O que induz a entrada
de água na lagoa não é o jogo das marés, e, sim, a quantidade de chuva e o vento, que empurra a água vinda do
mar para dentro”. Dados obtidos do sítio: http://redeglobo.globo.com/globoecologia/noticia/2012/02/lagoa-dos-
-patos-paraiso-das-aguas-escondido-no-rio-grande-do-sul.html.
4
São exemplos: Santo Expedito do Sul, São Valério do Sul, Santa Cecília do Sul, São Domingos do Sul,
Santa Bárbara do Sul, Santa Clara do Sul, Encruzilhada do Sul, , São Valentim do Sul, São Valério do Sul,
São Vicente do Sul, Santa Margarida do Sul. Mas, há, também, indicações de Sul com outros topônimos, as-
sociados às diferentes classificações deste texto. São exemplos: Encruzilhada do Sul, Paraíso do Sul, Palmares
do Sul, Morrinhos do Sul, Monte Belo do Sul, Lavras do Sul, Itatiba do Sul, Ipiranga do Sul, Caçapava do
Sul, Cachoeira do Sul, Campina do Sul, Bom Retiro do Sul, Ametista do Sul, Benjamin Constant do Sul,
Almirante Tamandaré do Sul, Benjamin Constant do Sul.
5
Dados obtidos do sítio: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/dtbs/riograndedosul/cruzeirodosul.pdf
6
É isto que nos faz lembrar os nomes de lugares como: (i) Capela de Santana, Igrejinha; (ii) Caseiros, Sede Nova,
Fazenda Vilanova, Inhacorá (grande fazenda), Pouso Novo, Portão, Estância Velha; (iii) Engenho Velho,
Barracão, Sobradinho, Vacaria, Rodeio Bonito, Charqueadas, Viadutos, Estação, Linha Nova, Ponte Preta,
Esteio, Ronda Alta, Paverama, Tapes, Estrela Velha, Vila Flores, Formigueiro, Charrua, Canoas, Fortaleza
dos Valos, Canudos do Vale, Quatro Irmãos, Tapera, Guarani das Missões, Aceguá, Caiçara.
34 //
7
Dados obtidos dos sítios: http://www.linhanova.rs.gov.br/web/historia e https://pt.wikipedia.org/wiki/Linha_Nova.
Muitos imigrantes partiam para o Brasil com expetativas positivas, normalmente associa-
das à possibilidade de virem a possuir terras e, assim, obterem a autossuficiência da família.
Assim, quando alguém migra, em especial, no caso dos migrantes alemães e italianos
chegados ao Rio Grande do Sul, no século XIX, em busca de melhores condições de vida,
em relação à vida sob crise, vivida em seus países de origem, a nominação dos lugares
ocupados expressa um sentimento afetivo. Este sentimento foi devidamente analisado na
obra Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. Um objetivo
central dessa obra é estudar os sentimentos de apego das pessoas ao ambiente natural ou
construído, pois topus é uma palavra grega, que significa lugar, enquanto filo significa
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
8
Dados obtidos do sítio: https://igrejinha.portaldacidade.com/historia-de-igrejinha-rs.
36 //
Fonte: elaborado por Borges Neto (2020), com base em CDC e IBGE
Embora as expetativas quase nunca tenham sido plenamente alcançadas, o desejo inicial
era enorme. Não se sabe se é certo ou se existe uma relação inequívoca entre a ansiedade
dos imigrantes e os nomes que encontramos, em muitos lugares do Rio Grande do Sul.
Contudo, não deixa de ser expressivo o número relativamente elevado de lugares, cujos
nomes apelam a um notório sentimento de felicidade9. O mapa da Figura 3 revela a distri- 37 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
buição desses lugares. Frise-se que sempre há uma concentração maior desses topônimos,
ao Norte, em relação ao Sul, pelo maior número de cidades.
No entanto, caberia levantar outras possíveis interpretações, comparativamente, em rela-
ção ao sul. É ao norte do estado que os topônimos representativos de sentimentos de prazer,
em relação ao lugar, estão presentes, associados, em parte, às cidades de origem das migrações
9
Alegria, Feliz, Progresso ou Vitória são alguns dos lugares, que denunciam sentimentos positivos: (i) Alegria,
Alegrete, Feliz, Soledade, Harmonia, Alvorada, Nova Esperança do Sul, Esperança do Sul; (ii), Eldorado do
Sul, Paraíso do Sul, Progresso, Triunfo, Bom Retiro do Sul, Bom Princípio, Bom Progresso, Nova Petrópolis,
Vila Nova do Sul, Nova Alvorada; (iii), Vista Alegre, Boa Vista do Cadeado, Boa Vista do Incra, Nova Boa
Vista, Boa Vista do Sul, Boa Vista das Missões, Horizontina, Boa Vista do Buricá, Pejuçara, Xangri-lá.
Nome de pessoas
muitas, se não a grande maioria, revelam esse processo, em estudos sobre as suas histórias
particulares. Vejamos os exemplos de Osório, de Caxias do Sul e de Frederico Westphalen.
O povoamento do território de Osório teve início, quando alguns casais açorianos, pro-
cedentes de Laguna, se estabeleceram no sopé da Serra do Mar, próximo ao litoral, em terras
pertencentes a Manuel Pereira Franco. O município foi criado, com território desmembra-
do do de Santo Antônio da Patrulha, sob a designação de Conceição do Arroio, pela Lei
Provincial nº 401, de 18 de dezembro de 1857. Em 1934, o município teve o nome mudado
para Osório, em homenagem ao grande vulto da história pátria, nascido na região10.
10
Dados obtidos dos sítios: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/dtbs/riograndedosul/osorio.pdf e
https://caxias.rs.gov.br/cidade.
38 //
11
Dados obtidos do sítio: https://caxias.rs.gov.br/cidade.
12
Cândido Godói, Carlos Gomes, Carlos Barbosa, Constantina, Vicente Dutra, Floriano Peixoto, Marcelino
Ramos, Mariano Moro, Paulo Bento, Severiano de Almeida, Paim Filho, Maximiliano de Almeida,
Machadinho, São Sepé, Novo Cabrais, Ciríaco, Osório.
13
Barão de Cotegipe, Dr. Maurício Cardoso, Getúlio Vargas.
14
Capitão, Almirante, Tamandaré do Sul, Tenente Portela.
15
Alemanha (Selbach, Nova Hartz, Brochier, Frederico Westphalen), Itália (Bozano, Chiapetta, Muliterno,
Vanini) ou outras proveniências (Roque Gonzales, Barros Cassal).
16
Ajuricaba (pessoa amável), Cacequi, Cacique Doble, Marau, Nonoai, Pareci Novo, Miraguaí, Parabé, Bagé.
Fonte: elaborado por Borges Neto (2020), com base em CDC e IBGE
Entre os nomes de cidades, que remetem a um povoamento inicial, nessa lenta sedimenta-
ção histórica e cultural de povos e de culturas, que se foram sobrepondo ou justapondo, ressal-
tamos duas coordenadas de interpretação: nomes de lugares portugueses e nomes da imigração.
41 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
No caso de nomes de lugares análogos aos nomes portugueses, cidades como Porto
Alegre, Braga, São Pedro do Sul e Caxias (do Sul) podem evidenciar sua origem portuguesa, pois
têm correlação direta com lugares do Continente de Portugal. É curioso não aparecerem
vários nomes de lugares, que remetam à região portuguesa dos Açores, pelo importante
17
Santo Ângelo, Santo Augusto, São Luiz Gonzaga, São Nicolau, São Valentim, São José do Ouro, São Jorge,
São Francisco de Paula, São José dos Ausentes, São Francisco de Assis, São Gabriel, São Jorge, São Francisco
de Paula, São José dos Ausentes, São José do Norte, Santiago.
18
Cruz-altense, Cruz Alta, Sagrada Família, Bom Jesus (ligados à migração lusa) e Soledade (originalmente,
Nossa Senhora da Soledade).
19
Dados obtidos do sítio: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rs/santa-cruz-do-sul/historico.
20
Sant’Ana do Livramento, Santana da Boa Vista, Nova Santa Rita, Glorinha, Candelária, Nova Candelária.
Fonte: elaborado por Borges Neto (2020), com base em CDC e IBGE
21
Nova Roma do Sul, Nova Bassano, Nova Pádua, Garibaldi, Nova Bréscia, Sério, Bento Gonçalves, Caxias
do Sul, Farroupilha, Flores da Cunha, Veranópolis.
22
São Leopoldo, Novo Hamburgo, Nova Petrópolis, Gramado, Santa Cruz.
Conclusões
O estudo sobre os topônimos das cidades do estado do Rio Grande do Sul, realizado
através de um ensaio de categorização toponímica, constitui um instrumento singular,
para uma análise da ocupação do sul do território brasileiro.
Através deste estudo, foi possível reconstituir a ocupação do espaço sulino, no contexto
das lutas por território, dos conflitos, da indicação da presença de grupos e de sua distribuição.
Uma análise de síntese permite concluir que é clara e demarcada a regularidade na
distribuição espacial da ocupação original do Rio Grande do Sul, através dos grupos in-
dígenas. Fica também evidenciado, pela toponímia, as diferentes formas de nominação:
enquanto a toponímia indígena expressa, predominantemente, a relação dos povos com a
natureza, na medida em que os topônimos indicam elementos ligados à terra, à água e à
vegetação, ou a espécies singulares, os topônimos espanhóis e/ou portugueses estão asso-
ciados a nomes de santos e/ou de pessoas, ocorrendo o mesmo com as denominações de
cidades dadas pelos migrantes, notadamente, alemães e italianos.
Ausências foram notadas, em relação a nomes de santas, em menor número do que
de santos, bem como são poucos os topônimos açorianos nas cidades por estes originadas,
registrando-se a manutenção da denominação indígena e/ou de origem portuguesa (santos
e elementos primordiais).
Reconhecemos, igualmente, que os topônimos não se mantêm, por razões étnicas, re-
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
ligiosas e/ou de poder, posto que tais valores e contextos sofrem mudanças, ao longo do
tempo. Portanto, este estudo geográfico, a partir de topônimos, é revelador de presenças e de
ausências ou supressões, que poderão ser analisadas, em maior detalhe, na sua continuidade.
Por outro lado, num comparativo com topônimos portugueses, observa-se que há
uma relação estreita entre as categorias de topônimos de uso no Brasil e em Portugal e, sob
alguns aspectos, a exemplo da religiosidade e/ou da política, observou-se a supressão de
nomes indígenas, tanto neste como naquele território.
Percebe-se a validade de um estudo de topônimos, uma vez que, para além das cone-
xões necessárias para seu entendimento de espaço-tempo (memória) e de linguagem, fica
evidente a possibilidade da análise geográfica, através de características que lhe são fundantes:
o local/lugar, a distribuição espacial, as conexões e os contextos.
44 //
Cherini, G. (2007) A origem do nome dos municípios. Porto Alegre: Imprensa Livre.
Claval, P. (1995) La geographie culturelle. Paris: Nathan Université.
Coelho, R. G. Comportamentos de resistência à integração colonial na Amazónia portuguesa (século
XVIII). Recuperado em 14 dezembro, 2019, de https://run.unl.pt/bitstream/10362/15891/1/
AHAM%20X%20(2009).pdf
Cowan, J. (1996). O sonho do cartógrafo (trad. portuguesa, 2000). Lisboa: Rocco.
Dick, M. V. P. A. (1990) A motivação toponímica e a realidade brasileira. São Paulo: Arquivo do
estado.
Dick, M. V. P. A. (1990) Toponímia e Antroponímia do Brasil. Coletânea de Estudos. 2. ed. São
Paulo: FFLCH.
Fernandes, J. A. et al. (2016) Dicionário de Geografia Aplicada, 494-495, Lisboa: Porto Editora.
Fonseca, G. S. (1997) La gente pasa, los nombres quedan... Introduccíon em la toponímia. Lima:
Lengua e Sociedad.
Fremont, A. (1976; 1980) A região, e espaço vivido. Coimbra: Almedina.
Heberle, M., Machado, N. T. G. (2018) As contribuições de Dick para o estudo da toponímia
brasileira. Antares: Letras e Humanidades, Caxias do Sul, 10(21). Recuperado em 21 janeiro,
2020, de http://dx.doi.org/10.18226/19844921.v10.n21.05.
Houaiss, A. (2001) Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva.
IBGE. https://mapas.ibge.gov.br/bases-e-referenciais/bases-cartograficas/malhas-digitais
Nascimento, R. V., Santos Andrade, K. S., Rocha Busch Pereira, C. M. (2018) Toponímia e geografia
cultural: tecendo fios de investigações no âmbito da interdisciplinaridade. Revista de Estudos
da Linguagem, 26(3), 1003-1029.
Ribeiro, O. (1987) A formação de Portugal. Lisboa: ICLP.
Rocha Busch Pereira, C. M., Bastiani, C., Santos Andrade, K. S. (2018) Toponímia e Geografia:
diálogos possíveis no contexto da teoria da interdisciplinaridade. Caminhos de Geografia,
Uberlândia, 19(65), 109-124.
Rostaing, C. (1985) Les noms de lieux. Que Sais-je. Paris: PUF.
Cândido Godói, Carlos Gomes, Carlos Barbosa, Constantina, Vicente Dutra, Floriano
Peixoto, Marcelino Ramos, Mariano Moro, Paulo Bento, Severiano de Almeida, Paim
2.3. Nome de pessoas Filho, Maximiliano de Almeida, Machadinho, São Sepé, Novo Cabrais, Ciríaco, Osório
Selbach, Nova Hartz, Brochier, Frederico Westphalen, Bozano, Chiapetta, Muliterno,
Vanini, Roque Gonzales, Barros Cassal,
Ajuricaba (pessoa Amável), Cacequi, Cacique Doble, Marau, Nonoai, Pareci Novo,
Miraguaí, Parabé, Bagé
Santo Ângelo, Santo Augusto, São Luiz Gonzaga, São Nicolau, São Valentim, São José do Ouro,
São Jorge, São Francisco de Paula, São José dos Ausentes, São Francisco de Assis, São Gabriel,
São Jorge, São Francisco de Paula, São José dos Ausentes, São José do Norte, Santiago
2.4. Nome de santos Sant’Ana do Livramento, Santana da Boa Vista, Nova Santa Rita, Glorinha, Candelária,
Nova Candelária,
Cruz-altense, Cruz Alta, Sagrada Família, Bom Jesus
Soledade (ligado à migração lusa; originalmente, Nossa Senhora da Soledade)
46 //
Nota de fim:
1
Três Passos significa presença de água ou passagem de três rios. Sendo de colonização portuguesa, para garantir a presença
do Império na região, sempre disputada, com a Espanha. Foi criada em 1879.
48 //
1
Licenciada, Bacharel e Mestra em Geografia pela Universidade Federal Fluminense - UFF, Doutora em
Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Pesquisadora no Grupo de Pesquisa
ETHOS: Geografia Política, Ética, Gênero e Sexualidade da Universidade Federal Fluminense - UFF.
Toponímia: um diálogo
Desde Platão, existe a necessidade de adequação do nome dos seres, sabendo não ser
tarefa corriqueira, mas da comunidade. Os relatos bíblicos registram nomes de países,
regiões, reinos, montes, planícies, cidades (FAGGION, MISTURINI, 2014), dando
sentido e significado aos lugares, conforme cada cotidiano e experiência. Posteriormente,
o filósofo Leibniz dedicou-se a distinguir nomes comuns dos próprios. Wittgenstein,
percebe que os discursos entre as pessoas dependem de como são denominados os seres
do mundo real ou as entidades abstratas. Pierre Bourdieu investigou a violência sim-
bólica existente nos atos estatais para tornar legitima a lógica da nomeação dos luga-
res, produzindo representações do mundo social ao custo de remodelar a memória de
classes sociais mais baixas e falantes de línguas clandestinas e de dialetos (FAGGION,
MISTURINI, 2014).
Nas últimas décadas, pesquisadores das Ciências Humanas e Sociais têm concentrado
esforços na compreensão da linguagem com as relações de poder. Procuraram entender
o poder e a relação com os nomes atribuídos às paisagens históricas e contemporâneas.
Observaram que, em muitos casos, esses estudos estão relacionados à nomeação do silen-
ciamento colonial das culturas indígenas e negras, na glorificação dos ideais nacionalistas
através da nomenclatura de cidades e mapas topográficos, na concepção de paisagens ur-
banas neoliberais, na contestação da identidade e do lugar ao nível da nomeação das ruas,
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Após alguns anos, a região do entorno da Gávea Pequena, despontou como endereço
de chácaras e casarões da elite nacional e carioca, o que foi possível após a chegada das
estradas que facilitaram o acesso, entre as décadas de 1940 e 1950.
No interior da casa sede da Gávea Pequena (com acesso restrito), a decoração é sóbria,
porém requintada. Possui algumas obras de arte, como quadro de Di Cavalcanti, na sala
de jantar. Dispõe de uma sala de cinema, sala de jogos, sala de estar com lareira e outros
ambientes internos. Na parte externa da casa, os jardins trazem a assinatura do renomado
paisagista Roberto Burle Marx, que adornam a piscina, capela e demais espaços.
A Gávea Pequena, com o passar dos anos tornou-se reduto do poder político e da
elite nacional. Os jantares e as festas celebraram acordos públicos e privados da elite, em
diferentes momentos históricos.
52 //
Portugal Pequeno
cidades do Rio de Janeiro, Salvador, São Luís etc. Os resquícios da imigração portuguesa
no local podem ser observados na paisagem através de alguns casarios, nos azulejos com
pinturas de santos católicos, que ainda adornam muitas moradias.
Em uma análise territorial do espaço do Portugal Pequeno, observa-se nos dias de
hoje, uma área residencial e um comércio pouco desenvolvido, sendo em sua grande maio-
ria formada por bares e lanchonetes. As casas antigas exibem um ar de abandono e, em
alguns casos, graves processos de deterioração. Nota-se ainda um píer, para ancorar pe-
quenos barcos de pesca e quiosques a beira da Baía de Guanabara, que, de longe lembra o
passado exitoso, composto por vários estaleiros ao qual permitia grande fluxo de pessoas e
constante movimentação diária ao lugar (RODRIGUES, 2013).
56 //
Considerações
Bibliografia
Helena Santana
Universidade de Aveiro
Rosário Santana
Instituto Politécnico da Guarda
Introdução
A paisagem sonora, termo usado por R. Murray Schafer, designa o “ambiente sonoro”,
o conjunto dos sons que nos cercam, e que são detentores, para quem os escuta, de um
significado e significação. Se o som é aquilo que o nosso aparelho auditivo perceciona, e
o nosso cérebro informa, correspondendo a uma vibração periódica regular audível, ele
pode ser gradável ou hostil, forte ou fraco, encontrando-se presente sem que o possamos
ignorar. Estamos rodeados de sons, sendo que, resultando da vibração de elementos físicos
do meio que, pela sua natureza, mudam constantemente, se mostram tanto de natureza
material, como imaterial. Neste sentido, e numa dialética que afere da sua importância e
61 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
relevância para o homem e a sua atividade ritual e artística, o sonoro produzido encontra-se
em constante mutação. Esta mutação surge fruto do desenvolvimento industrial e tecnológico,
mas também organizacional e vivencial, das sociedades contemporâneas.
O património natural e paisagístico modificou-se e, com ele, os sons que se ouvem e
que se geram. Foram-se também alterando as relações que se estabelecem entre o homem e
a natureza e, consequentemente, com o património nela contido. Não podemos esquecer
que os patrimónios, sejam eles materiais ou imateriais, desenham, também eles, as pai-
sagens sonoras. Esta ação faz-se pelas componentes físicas e imagéticas que concedem ao
ouvinte e ao compositor, ao artesão e ao artista, ao intérprete e ao ouvinte, mostrando que,
o que neles nasce, é passível de escuta e utilização, enfoque e criação.
do conceito clássico de paisagem (landscape) (Schafer, 1997). Nessa constituição, não po-
demos perder de vista, ou ouvido para sermos mais precisos, que o elemento produtor
de som, o sino neste caso em particular, se constituiu um instrumento musical. Numa
configuração mais básica, o sino, instrumento portador de uma informação sonora pró-
pria, mostra-se no conjunto das suas possibilidades, tanto de forma individual, como em
conjuntos mais vastos e plenos de possibilidades sonoras, compositivas e interpretativas,
como é o caso do carrilhão.
O som, aquilo que o nosso aparelho auditivo perceciona, corresponde a uma vibração
periódica regular. Agradáveis ou hostis, fortes ou fracos, percetíveis ou não à audição hu-
mana, os sons encontram-se na paisagem sendo que os não podemos ignorar. Elementos
seus, estes sons resultam ainda da vibração de elementos físicos presentes no meio, que
62 //
O meio onde nos produzimos enquanto seres vivos, seres físicos e emocionais revela-
-se constituído por diversos elementos que, de natureza material ou imaterial, comportam
diferentes ritmos. Evidenciam-se o ritmo da vida e o ritmo dos homens, os ritmos que
separam o dia da noite, o nascer do sol do ocaso, o ritmo do aparecimento das diferentes
estações do ano, ritmos que não obedecem ao ritmo imposto pelo homem, pelo relógio,
ou pelos calendários. Constituem os ritmos da natureza que nos concedem a beleza da
vida sem a imposição dos ritmos de uma sociedade industrial e do homem em particular.
Todos estes ritmos têm forte influência nas paisagens, nomeadamente na paisagem sonora
que os define, os forma e enforma continuamente. Existe um tempo, uma forma, um es-
paço e um lugar para todas as coisas: a luz e a escuridão, o trabalho e o descanso, o som e
o silêncio, e todos os ritmos que deles sobressaem e circundam o homem, os espaços e os
seres. Além destes ritmos, nomeadamente aqueles a que nos encontramos sujeitos, existem
ainda outros ritmos, como os biológicos tais que o ritmo regular e contínuo do bater do
coração, o ritmo da respiração, o ritmo das marés que, de natureza cíclica, são constantes,
mas, também, mutáveis. Ao nível da criação artística encontramos um conjunto de outros
ritmos aqueles que enformam esse fazer e que dependem do artista e do meio. Na criação,
mas também na fruição da obra, mormente a musical, não lhes podemos ficar certamente
indiferentes. Estes ritmos, diferenciados, definem tempos de natureza cronológica, psi-
cológica, onírica e musical, que se mostram ainda na literatura e na poesia, na escultura
e na pintura, e, em todas as formas de arte. Nela, a arte, se mostram os ritmos da vida e
dos homens, os ritmos do trabalho e de toda uma série de ações que obedecem a padrões
rítmicos bastante complexos que regem todas as ações da vida, da matéria e do homem
(Brelet, 1949)3.
Se os ritmos circadianos e sazonais são observáveis, não só na natureza como nos
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
meios urbanos, onde a vida pode ser regulada pelas atividades diárias, prenunciamos que
ao longo dos tempos, certas atividades da vida em comunidade nos fornecem um sonoro
que se mostra diferenciado e que delineia paisagens sonoras únicas e irrepetíveis. Neste
dizer, relevamos o toque dos sinos dos campanários das igrejas, as sirenes das fábricas e dos
bombeiros, a agitação sonora que se segue à chamada para o trabalho ou para os rituais,
3
Contudo, denotamos que o homem interfere com este ritmo quando não obedece aos ciclos naturais. Neste
sentido, devemos referir os ritmos que regem por exemplo os calendários agrícolas e o trabalho no campo.
Plantar e colher são ações que ditam os padrões sazonais nas paisagens sonoras dos campos. Ora esta relação
com a paisagem natural desapareceu consequência da urbanização e da movimentação populacional para as
grandes urbes na busca de trabalho nas unidades fabris, consequência da revolução industrial. Nesta revira-
volta social e organizacional aparecem ainda os ruídos provenientes da indústria e dos engenhos mecânicos,
dos quais realçamos o ruído do tráfego automóvel que mascara todos os outros.
64 //
Os sons fundamentais de uma paisagem são os sons que resultam dos elementos ma-
teriais que a compõem nomeadamente a água, o vento, a holografia do terreno, mas tam-
bém dos seres que nela se produzem, sejam eles, vegetais ou animais, como os pássaros, os
insetos, ou mesmo o homem. Estes sons são os que caracterizam uma paisagem e os que a
definem do ponto de vista sonoro. Nela se inserem e são percebidos pelo homem de forma
4
De notar o uso ainda hoje de sinos, campainhas ou chocalhos nas vestes aquando da realização de cer-
tas festas, rituais e ritos, profissões; Encomendação das almas; La Moza de Ánimas (A Moça das Almas);
Entrudo; Paradas militares; Pastorícia; etc.
5
O texto, de autoria do Pe. Thomás Gonçalinho, foi originalmente publicado no ano de 1932, e faz parte dos
Boletins Mensais do governo metropolitano do Exmo. Dom Miguel de Lima Valverde, Arcebispo de Olinda
e Recife entre os anos de 1922 a 1951, foi republicado pelo site “Direto da Sacristia” (http://diretodasacris-
tia.com), e faz parte da coleção de publicações da Biblioteca do Seminário de Olinda/PE.
68 //
As origens da milenar tradição do uso e toque dos sinos nas aldeias, vilas e cidades,
é bastante antiga tendo ligação com o culto cristão e as práticas religiosas ligadas ao
cristianismo. O sino está ligado ao ato de chamar os fiéis para as celebrações litúrgicas, a
marcação dos tempos e dos deveres de oração ao longo do dia, ao anúncio de novas ou
de perigos, e a uma imensa panóplia de situações quotidianas. Nos dias de hoje, temos
ainda presente o toque dos sinos a chamar para ofícios litúrgicos específicos, nomeada-
mente a eucaristia, os funerais, as horas, entre outros. Podemos encontrar uma das suas
formas mais remotas num tipo específico de campainha que os sacerdotes judeus usavam
presas na orla das suas túnicas. Na sua forma mais simples, de pequenas campainhas, re-
monta a uma alta antiguidade9. A literatura e os escritos elaborados desde a antiguidade
mostram-nos que as campainhas eram conhecidas de quase todos os povos. As descober-
tas arqueológicas revelam-nos que escritores como Plutarco, Luciano – entre os gregos,
Plínio, Marcial, Suetônio, Sêneca – entre os latinos, já falavam do uso de campainhas.
O uso de campainhas não se resumia ao uso litúrgico, podendo ser ainda costume usá-
-las no pescoço dos animais (São Paulino de Nola), como forma de afastar os maus espí-
ritos, com a função de amuletos ou talismãs. Este costume, para muitos, supersticioso,
ainda hoje se encontra em determinadas regiões do país, nomeadamente aquele por nós
analisado. Como proteção contra os maus espíritos e o mau olhado, o uso de campai-
nhas e de sinos, é um costume que remonta aos fiéis dos primeiros tempos (São João
Crisóstomo). A este e outros usos profanos, devem-se juntar os usos religiosos10. Mas foi
sobretudo no Cristianismo que as campainhas (e, depois, os sinos) receberam um uso
quase exclusivamente religioso: convocar os fiéis aos atos de culto (Vasconcelos, 2012).
O modo de convocar os fiéis para os ofícios divinos não foi sempre o mesmo. Santo
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Inácio Mártir manda que os fiéis sejam chamados cada um em particular (Carta a
Policarpo). Isto não era difícil num tempo em que os fiéis eram pouco numerosos. Mas,
com o aumento do número de cristãos, este modo de convocação tornava-se praticamente
9
O estudo dos livros sagrados do Antigo Testamento mostra-nos que o uso remoto destas campainhas, foi
ordenado por Deus e remonta ao tempo de Moisés pois que no livro do Êxodo, se faz referência a que
“o senhor mandou que colocasse na orla da túnica de Aarão um certo número de campainhas de ouro
(cf. Êxodo XXVIII, 33-34). No que concerne este hábito, foram encontradas destas campainhas em
sepulturas hoje consideradas como pertencentes à época.
10
Conta Porfírio que havia na Índia uma espécie de religiosos que se reuniam ao toque de uma campainha
para orar. Em Roma, nas festas de maio celebradas pelos Arvales, eram usadas no culto dos lamures, nos fu-
nerais etc. Suetônio conta que Augusto rodeou de campainhas o tímpano do templo de Júpiter. Em antigos
templos pagãos, encontram-se campainhas como ex-votos.
70 //
11
Neste processo, era natural que usassem algum instrumento que, se não era uma campainha, fazia
as suas vezes. Segundo a Regra de São Pacômio, os monges eram convocados ao som da trombeta.
Noutros mosteiros, batia-se à porta da cela de cada religioso com um martelo (Cassiano). No mos-
teiro de Santa Paula, em Belém, as religiosas eram chamadas ao canto do Alleluia (São Jerônimo) 71 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
(Vasconcelos, 2012).
12
Santo Estúrmio (m. 779) ou Sturmius foi um monge beneditino germânico, discípulo de São Bonifácio.
Em 744, sob a direção do mestre, Estúrmio fundou e foi o primeiro abade da Abadia de Fulda, que viria a
ser uma das mais importantes casas monásticas da Idade Média alemã.
13
Hora do Ofício Divino correspondente às 9h.
14
Santo do século VII, da Idade Média.
15
Também conhecida como Abadessa de Whitby, santa falecida em 680.
16
Capitularia de Carlos Magno, elenco de leis da época carolíngia.
17
É muito comum a gravação: “Laudo Deum verum, plebem voco, congrego clerum, defunctos ploro, pestem fugo,
festa decoro”. Outras vezes encontramos a inscrição: “Funera plango, fulmina frango, sabbato pango; Excito len-
tos, dissipo ventos, paco cruentos”; outras ainda: “Convoco, signo, noto, compello, concino, ploro, Arma, dies, horas,
fulgura festa rogos”; ou a gravação no sino do Mosteiro beneditino de Maredsous “Jubilans, sacra festa cano;/
Suplex longo procellas pello:/Plorans alumnis stratis bello/ Amicis, monachis, pacem rogo” (Vasconcelos, 2012).
22
Importa referir que foi na época gótica que, na Europa Ocidental, o badalo se instalou definitivamente no
interior do sino, determinando o tipo esbelto e de perfil estilizado, designado por tulipa ou esquilonado, que
se impôs a partir do século XIV e que caracteriza a esmagadora maioria dos sinos dos templos ocidentais.
fiéis aplaquem “a ira d’Aquele que dá preceitos às tempestades e sem a vontade do qual
nada acontece no Inverno”23.
O Toque Litúrgico representa um toque de chamamento para a missa, integrando os
toques de anúncio dos ofícios religiosos (horas divinas, ave marias, trindades, finados e
defuntos), constituindo um apelo à reunião e participação da comunidade. No contexto
das celebrações litúrgicas, a campainha substitui o toque do sino ou da sineta que antiga-
mente estava suspensa da parede, no interior do templo. O Toque de Oração encontra-se
mencionado num documento próprio. Numa pastoral dada em 3 de dezembro de 1750,
23
Além do toque contra as trovoadas, registavam-se outros toques funcionais: para reunir o gado, para reunir
o conselho da aldeia e para avisar da existência de fogo. Neste caso, o toque de fogo, era um toque a rebate,
do género do também usado em caso de ameaça ou perigo iminente para a comunidade.
74 //
Com o decurso dos tempos, os tocadores de sinos das aldeias deixaram de subir as
íngremes escadas de acesso aos campanários – não raro, velhas estruturas de madeira que
foram apodrecendo, dando lugar a degraus em tubo de ferro galvanizado, nada fáceis
de vencer. Começaram, então, a usar-se cordas e correntes para possibilitar os toques
mais vulgares, realizados a partir do solo (toques fúnebres ou de chamamento para a
24
No Nordeste Transmontano, os sinos estão ainda presentes no toque das horas canónicas designadas: Prima,
Terça, Sexta, Nona, Vésperas e Bíblicas, Completas, Matinas e Laudes.
frente a um património que urge preservar pois, a sua prática, permite que um conheci-
mento não se esvaia e um sonoro se extinga. Enquanto elementos produtores de som, mais
ou menos presentes no espaço de uma região, mostram-se no viés de uma prática que se
quer formada e informada. Esta prática exige um conhecimento dos rituais e ritos, práti-
cas e costumes, mas também uma vontade e uma exigência de si. Quem são os detentores
desse conhecimento e prática? Quem são aqueles que nos podem presentear com um
saber ritualista? Quem são aqueles que se podem dizer veículos de tradição?
Se a evolução permite que, e cada vez mais, se instrumentalize uma prática, não será
destituir o sonoro de uma gestualidade e intenção performativa que lhe advém do gesto, da
racionalidade, mas também da emotividade de quem toca? Não será destituir o sonoro e a
paisagem que ele cria, de uma componente humana, ritual e social de valor? Não será tornar
76 //
Bibliografia
Brelet, Gisèle (1949). Le temps musical: essai d’une esthétique nouvelle de la musique. Paris: Presses
Universitaires de France.
Correia, Mário (2012). Toques de Sinos na Terra de Miranda. Âncora Editora. Fonte: https://www.
apagina.pt/?aba=7&cat=560&doc=14560 acedido a 6 de abril 2020, 14:14.
Jung, Carl Gustav (1964). O homem o seus símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.
Morris, Ernest (1959). Tintinnabula. London: Robert Hale.
Schafer, R. Murray (1997). A afinação do mundo. São Paulo. FEU. UNESP.
Tranchefort, François-René (1980). Les instruments de musique dans le monde 1, Coll. «Points»
(n° Mu 5). Paris: Éditions du Seuil.
Introdução
Samuel Benchimol iniciou sua vida intelectual aos 18 anos, em 1941, quando ingressa
na Faculdade de Direito. O mundo vivia um período conflitante decorrente da segunda
guerra mundial (1939-1945) e, no Brasil, o Estado Novo estava sob o comando do pre-
sidente Getúlio Vargas, que mantinha o poder mediante a hipertrofia do Executivo, após
haver eliminado o Congresso e sobrepujado a ação do judiciário. A turma de Direito de
1941 se encontrava sob o impacto desse quadro político-ideológico. Manaus era uma
cidade pequena, começando a sofrer um processo de revitalização consequente da reativa-
ção dos seringais silvestres e do retorno do movimento imigrante, improvisado e caótico.
Relembro com saudade e emoção que nesse tempo eu era um humilde despa-
chante de bagagens da Panair do Brasil, exercendo funções no flutuante ao lado
do ‘roadway’ da ‘Manaus Harbour’, onde atendia aos passageiros dos hidroaviões da
Panair e da Pan American que transportavam a borracha dos seringais para o supri-
mento das Forças Aliadas na Guerra. (BENCHIMOL, 1977. p. 32,)
Samuel Benchimol apresenta uma vasta obra voltada em grande parte para à
Geografia da Amazônia. Procura abordar aspectos sociais e econômicos, uma vez que
se debruça sobre a análise dos povos que adentraram na Amazônia e que contribuíram
para a construção de sua economia. Deixa, portanto, uma compreensão da Geografia
abrangente e sintonizada com questões importantes da cultura, das dimensões e prá-
ticas sociais, bem como sobre a visão econômica de planejamento da Amazônia. São
Fonte: RAISG, mongahay.com, ONU, OTGA. In: COSTA, Camilla. Amazônia: O que ameaça a floresta 85 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
em cada um de seus 9 países? Londres: BBC News Brasil, 18 fevereiro 2020. Acessado em: 12/03/2021.
Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-51377232.
Para compreender a questão do estudo regional para Benchimol, cabe fazer um paralelo
com a evolução da Ciência Geográfica no Brasil, que naquele momento (início do século
XX), ainda estava se iniciando, considerando que foi na década de 1930 quando os primei-
ros cursos universitários de Geografia surgiram no país. Particularmente na Universidade
de São Paulo e no Rio de Janeiro através da chegada dos franceses Pierre Monbeig, Pierre
Deffontaines, posteriormente de outros nomes como: Leo Waibel, Francis Ruellan e
Emmanuel De Martonne, conforme aponta Ruy Moreira,
Segundo Lencioni (2009 p. 93), repartir um determinado espaço e depois juntar todas
as partes é apresentar uma totalidade. A relação homem e superfície terrestre é objeto de
estudo para Ritter. É nesse momento que a Geografia passa a ser conhecida como ciência
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
idiográfica, ou seja, a ciência que estuda os espaços. Como precursor de estudos regionais,
Ritter procurou desenvolver metodologicamente pesquisas, embasamentos que delimitas-
sem a área estudada, com características próprias, para posterior comparação com outras
áreas do globo terrestre.
Ainda no século XX, a Geografia foi influenciada pelas ideias de Darwin e pela filo-
sofia positivista, marcando-a definitivamente pela construção da teoria do determinismo
geográfico, que tratava da relação homem-meio, em que a natureza determinava ações
humanas. Essas ideias foram, por Lucien Febvre, atribuídas ao determinismo alemão de
Friedrich Ratzel. Seguindo a esta, outra escola surgiu nesse mesmo período, o possibilis-
mo, com Vidal de La Blache, é quando a noção de região foi considerada categoria de
análise para o estudo da Geografia. Esse era o cenário intelectual em que se encontrava
90 //
Ao discorrer sobre a análise da obra de Samuel Benchimol percebe-se que é como uma
construção deixada à mostra, pois descreve os passos e as tomadas para desenvolver suas
pesquisas, como se fosse “tijolo a tijolo”. Suas pesquisas voltadas para Amazônia visavam
mostrar uma análise ambiental e sociológica frente ao processo de planejamento para a
região. Algo que não é tão simples, uma vez que definir, delimitar, caracterizar, conceituar
uma região que ultrapassa os limites do país, em busca de diminuir suas desigualdades é
grande desafio. Acreditava em “uma ocupação inteligente da Amazônia”, contudo, que essa
só teria sucesso se houvesse um equilíbrio econômico, ecológico e social (BENCHIMOL,
1999, p. 9).
Em suma, a problematização geral sobre as condições e as possibilidades do desenvol-
vimento concebem o modo pelo qual entendeu a questão regional em suas articulações
econômicas e políticas com a nação. Deste modo, Samuel Benchimol buscou compreen-
der a Amazônia para formular uma estratégia amazônica, seguido de um equacionamento
dos problemas regionais e, é nesse viés, que são identificadas as noções de região, por conta
do momento em que viveu, e da evolução do pensamento geográfico no Brasil, propiciando
o debate referente a essa categoria.
Considerações finais
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Introdução
Este artigo objetiva fazer uma breve análise da paisagem na área da Bacia Hidrográfica
do Córrego Lagoa, situada no município de Ouvidor, Estado de Goiás, Centro-Oeste do
Brasil. Justifica-se esse estudo no fato de que a Bacia Hidrográfica é a responsável pelo
abastecimento público de água do município de Ouvidor, uma vez que a mesma carece
de estudos que alicercem o planejamento ambiental na área da microbacia. Esse estudo
pauta-se, primeiramente, em levantamentos bibliográficos utilizando-se de autores como
Ab’Sáber (2003), Nimer (1979), Klink e Machado (2005), Freires (2019), entre outros,
que falam sobre o Cerrado e suas produções hídricas; bem como em Bertrand (2004) que
apresenta a paisagem como uma combinação dinâmica de elementos físicos-ambientais, 95 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
1
Aluno do Programa de Pós-Graduação em Geografia/UFG/UFCAT. Membro do Núcleo de Estudos e
Pesquisas Socioambientais – NEPSA-UFCAT/CNPq.
O termo Cerrado é utilizado para designar ambiente ‘fechado’, ou seja, o solo é cober-
to/fechado por gramíneas, constituindo-se em um conjunto de fitofisionomias (Savanas,
Matas, Campos e Matas de Galeria) que ocorrem na região do Brasil Central, sendo o
clima dessa região estacional, com um período chuvoso seguido por um período seco bem
definidos (KLINK; MACHADO, 2005; LIMA, 2011). Assim, de acordo Nimer (1979),
a região Centro-Oeste do Brasil apresenta uniformidade climática da circulação das massas
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
São Marcos e Paranaíba, que são importantes para o lazer e exploração da economia local
(FREIRES, 2019).
Para uma maior percepção gráfica, a Figura 1 mostra a localização de Ouvidor em rela-
ção ao Estado de Goiás e ao Brasil. Percebe-se, também, a rede de drenagem no Município,
notadamente do tipo arborescente. A área urbana de Ouvidor está a Sudoeste da área mu-
nicipal, sendo que, na porção Sudeste, está o Rio Paranaíba, considerando-se que sua bacia
hidrográfica abrange 137 municípios no Estado de Goiás e Minas Gerais.
98 //
Nesse contexto, o ponto de partida para a análise da paisagem local é o Córrego Lagoa,
onde parte do limite urbano de Ouvidor, encontra-se na área da microbacia hidrográfi-
ca. Atualmente, está em processo de efetivação uma APA que abrange a área da bacia do
Córrego Lagoa, situada na porção Noroeste de Ouvidor (GO), com aproximadamente
1.826,10 hectares, sendo que esta área compreende algumas propriedades particulares
(PREFEITURA MUNICIPAL DE OUVIDOR, 2017). 99 // Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
A área proposta para a APA está inserida na bacia hidrográfica do rio Paranaíba e
de acordo com o Plano Estadual de Recursos Hídricos de Goiás (2015), está localiza-
da na Unidade de Planejamento e Gerenciamento dos Recursos Hídricos (UPGRHs)
dos rios Corumbá, Veríssimo e porção Goiana do rio São Marcos. Embora inserida
nesta UPGRH, a área da UC está localizada na micro bacia do Córrego da Lagoa,
inserida na bacia do ribeirão Ouvidor, afluente do rio Paranaíba (PREFEITURA
MUNICIPAL DE OUVIDOR, 2017, p. 14).
Figura 2. Aspectos da Hidrografia na área proposta para Criação da APA – Ouvidor (GO)
A Figura 3 apresenta uma visão quanto aos aspectos da dinâmica hídrica no Município,
com todas as suas microbacias. Em destaque, grafado na cor azul escuro, identifica-se a mi-
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Como consta no projeto de criação da referida APA, estão presentes no local da mi-
crobacia processos mineralógicos registrados pelo Departamento Nacional de Produção
Mineral (DNPM). De acordo com a Figura 4, na área apontada para Unidade de
Conservação (UC) há processos exploratórios de cascalho, Fosfato, Nióbio, entre outros
bens minerais. Entretanto, não existem atividades de exploração acontecendo atual-
mente na área da microbacia do Córrego Lagoa. (PREFEITURA MUNICIPAL DE
OUVIDOR, 2017)
100 //
Materiais e métodos
Esta pesquisa pôde ser realizada por meio de levantamentos bibliográficos, que abor-
dam temas sobre o Cerrado e suas produções hídricas abordadas principalmente por
Ab’Sáber (2003), Nimer (1979), Klink e Machado (2005), Freires (2019), bem como a
apresentação da paisagem como uma combinação dinâmica entre o potencial natural e os
usos socioeconômicos abordado por Bertrand (2004).
Em segundo momento foi feita uma pesquisa documental sobre o Uso da Terra onde
foi consultado a EMBRAPA, IBGE, e Município de Ouvidor na qual foi consultada a
APA referente ao local de estudo, em que foram extraídas informações sobre a cobertura
vegetal que se estende ao logo do corpo hídrico e ainda informações sobre intenções de
extração de minerais mapeados em sua nascente.
Após a consulta bibliográfica e documental, foram realizadas pesquisas sobre o poten-
cial natural para a análise do Uso da Terra, a partir de uma coleta de dados que compre-
endeu visitas de campo na área referente a APA da microbacia em estudo para coletas de
imagens no mês de junho de 2020, que resultou no quadro de Uso da Terra.
Posteriormente, foi possível a concretização de uma analise local pontual, afim de
evidenciar pontos de atenção onde é necessária uma melhor gestão para o Uso da Terra e
programas ambientais para mitigação onde necessário, e comparações para uma possível
ampliação da vegetação natural.
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
102 //
Percebe-se, então, poucas árvores e a vegetação rasteira é a fonte de alimento para o gado
na parte mais alta. Esta paisagem exibe a necessidade constante de “adequar o local” à ne-
cessidade antrópica, como afirma Ab’Saber (2003), o Cerrado suporta de cinco a seis meses
secos, e de seis a sete meses relativamente chuvosos. Com essa predominância de chuvas no
Cerrado, que vai de outubro a março, combinada com a ação antrópica, resulta geralmente
em carreamento elevados de sedimentos para os fundos de vale e, consequentemente, para o
corpo hídrico local, como mostra a Foto 2 (que exibe a zona de escoamento tendo também
a estrada da comunidade como condutora para o fundo de vale nas duas vertentes).
A estrada da comunidade local, que corta a Microbacia e serve como base direcionado-
ra das águas da chuva, depositam no fundo os sedimentos que ao longo do tempo podem
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
vir a assorear o curso d’água, alterando o curso atual, que de acordo com a morfologia local
trás para mais próximo em direção da montante o curso d’água, começando então a inva-
dir a demarcação da propriedade privada mais próxima e que também pode vir a causar a
solapamento e perca da pequena produção rural a margem do local registrado.
Segundo Paz (2004), a necessidade do homem em “adequar o meio” à sua necessidade
tem como consequência a alteração no ciclo hidrológico. Como por exemplo barramento
de rios que altera o escoamento local superficial, e o desmatamento como outro fator de
diminuição de interceptação das águas da chuva, deixando os solos expostos, vulneráveis a
erosão, e direcionando os sedimentos durante o período chuvoso para o talvegue.
Assim sendo, a influência antrópica na dinâmica local da microbacia do Córrego
Lagoa pode resultar na perda de produção hídrica. A variação altimétrica de 50 m nas
108 //
Considerações finais
Bibliografia
Editorial, 2003.
BERTRAND, G. Paisagem e Geografia Física Global. 1972. In: R.RA’E GA, Curitiba, n. 8, p.
141-152, 2004. Editora UFPR. Disponível em: < https://revistas.ufpr.br/raega /article/
view/3389/2718>. Acesso em: Jan. de 2020.
EMBRAPA. Manual de procedimentos de coleta de amostras em áreas agrícolas para análise da qualida-
de ambiental: solo, água e sedimentos. Jaguariúna: Embrapa Meio Ambiente, 2006.
______. Pastos Sujos. S/D. Disponível em: < http://www.segmenta.cnpm.embrapa.br/ p_sujo.html >.
Acesso em: jun. De 2020.
FREIRES, A. S. Transformações Socioambientais das Paisagens no Municipio de Ouvidor (GO)
1960 a 2019. 2019. 186 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação
em Geografia, Regional Catalão. Universidade Federal de Goiás. Catalão, 2019.
IBGE. Censo Agropecuário de 2017. Disponível em: < https://cidades.ibge.gov.br/ brasil/go/ouvi-
dor/pesquisa/24/76693>. Acesso em out. 2019.
110 //
Introdução
Este artigo foi extraído da tese de doutorado homônima, e tem como objetivo central,
realizar um estudo sobre a cobertura vegetal na Raia Divisória São Paulo-Paraná-Mato
Grosso do Sul, analisando os fragmentos florestais, APP e Reservas Legais, associados aos
conflitos de uso e cobertura da terra, bem como às áreas atingidas por reservatórios arti-
ficiais de usinas hidrelétricas nos rios Paraná e Paranapanema, indicando possíveis área
potenciais para a criação de corredores ecológicos, tendo em vista as políticas ambien-
tais prevista na legislação brasileira. A metodologia envolve o estudo da paisagem na
perspectiva geossistêmica a partir do arcabouço teórico-metodológico do modelo GTP
Contemplando o aspecto legal, a partir dos dados de fragmentos florestais extraídos pelo
mapa de uso e cobertura da terra de 2017, confrontamos com as metragens de Áreas de
Preservação Permanente, estabelecidas pela legislação ambiental brasileira elaborando o mapa
de Incompatibilidade Legal, que indica as áreas e o grau de cobertura florestal ou de vegetação
de várzea dentro das APP, notadamente as de cursos d’água e suas respectivas nascentes.
Complementando as análises, utilizamos a proposta de Ramos et al. (1976), que pro-
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Resultados e discussões
As áreas de planalto baixo com até 400 metros de altitude, destacam-se a maior parte
do relevo raiano, com colinas amplas de topos convexos à retilíneo. Os geocomplexos VII
e VIII, correspondem aos terrenos de vegetação savânica (Cerrado Brasileiro), presentes na
porção sul-mato-grossense da Raia em duas faciações, sendo estas: Savana Floresta (Sd) e
Savana Arborizada (Sa).
A unidade IX, representa as áreas de planalto baixo de Floresta Estacional Semidecidual
Submontana (Fs) (Mata Atlântica) tipo de vegetação mais comum na Raia. Ainda no pla-
nalto baixo, temos as unidades X e XI, que correspondem os geocomplexos antropizados,
sendo para áreas urbanas e por mosaicos de agricultura (culturas anuais e perenes e culturas
semi-perenes) e pastagem (pecuária extensiva).
Nas áreas de planalto médio, onde o relevo apresenta o predomínio de colinas
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
médias com topos aplainados e alongados e vertentes com perfis retilíneos a convexo
em altitudes acima de 400 metros, temos as demais unidades de geocomplexo. A uni-
dade XII, diz respeito as áreas de uso consolidado, enquanto as unidades XIII e XIV,
correspondem a distribuição de fragmentos florestais de Mata Atlântica e Cerrado,
neste tipo de relevo.
Finalmente, a unidade XV representa as áreas de relevos residuais formados pela
silicificação dos arenitos da formação Bauru, os quais apresentam os dois monumen-
tos geológicos da Raia Divisória: O Morro do Diabo em Teodoro Sampaio-SP e o
Morro Três Irmãos (Três Morrinhos) em Terra Rica, no qual temos a cobertura vegetal
de Floresta Estacional Semidecidual Submontana e Montana, como podemos visua-
lizar na figura 4:
120 //
A partir do mapa de unidade de gecomplexos (Figura 5), para a definição das áreas
potenciais à criação de corredores ecológicos, definimos os graus de vulnerabilidade para
cada unidade. Esta reclassificação, leva em consideração todos os atributos de cada geo-
complexo, dando ênfase a três elementos principais no que concerne à visão tripolar entre
potencial ecológico, exploração biológica e ação antrópica, sendo estes, respectivamente: a
geomorfologia, a vegetação remanescente e o uso e cobertura da terra.
Unidades Grau de
Tipo Descrição dos principais processos atuantes
Geossistêmica Vulnerabilidade
I, II, III, IV, VII, Geocomplexos em equilíbrio, porém sujeitos a perturbações de acordo
VIII, XI, XIII, Natural Muito Baixa com o grau de antropização e as condições de vulnerabilidade
XIV, XV e V ambientais presente ao seu redor.
Geocomplexos em áreas de deposição aluvial, com relevos planos e
VI Antrópica Baixa predominância de solos hidromórficos. Terrenos com baixa atividade
erosiva, porém sujeito a inundações periódicas.
Geocomplexos em áreas de colinas amplas, com declividade predo-
IX Antrópica Média minantemente suave. Predominância de latossolos e argissolos,
respectivamente. Alta ação erosiva.
Geocomplexos de áreas urbanizadas, com forte ação antrópica e de
áreas de colinas médias, com declividade suave à ondulada. Relevos
X e XII Antrópica Alta
mais dissecados e com maior densidade de drenagem. Predominância
de latossolos e argissolos, respectivamente. Ação erosiva, muito alta
associam-se ao relevo mais rugoso com topografia levemente acidentada, o que influencia
nos padrões de densidade de drenagem, bem como no grau de suscetibilidade à erosão,
especialmente em adensamentos urbanos onde a pressão antrópica é constante.
Posteriormente, complementamos a análise da paisagem na Raia Divisória, conduzimos
um experimento sobre a fragmentação florestal ao longo das últimas décadas, conside-
rando intervalos decenais entre 1985 a 2017. Por esta análise, vemos as mudanças mais
recentes no uso e cobertura da terra da raia, especialmente pelo represamento dos rios
Paranapanema e Paraná para a construção de usinas hidrelétricas (UHE Rosana e UHE
Engenheiro Sérgio Motta, respectivamente).
Como interpretação, lançamos mão da metodologia utilizada pela ecologia da pai-
sagem, de matrizes hexagonais, nas quais subdividimos a paisagem em hexágonos iguais
122 //
do Caiuá;
–– Extremamente Alta: áreas no entorno de unidades de conservação importantes como
o Parque Estadual Morro do Diabo e Estação Ecológica Mico Leão Preto, com
alta fragmentação e baixo índice de percentual de vegetação florestal. Alta vulne-
rabilidade nos geocomplexos presentes, especialmente pela rugosidade e topografia
do relevo.
124 //
Considerações finais
Bibliografia
BRASIL, Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nos 6.938, de 31 de agosto de
1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis
nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória no
2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências - Lei Federal Nº 12. 651; Brasília
–DF, 25 de maio de 2012
BERTRAND, Claude & BERTRAND, Georges. Uma Geografia transversal e de travessias: o meio
ambiente através dos territórios e das temporalidades. Tradução Messias Modesto dos Passos.
Maringá: Ed. Massoni, 2009
BERTRAND, Georges, Paysage et géographie physique globale: esquisse méthodologique. Révue
Géographique des Pyrénées et du Sud-Ouest, Toulouse, v. 39, n. 3, p. 249-272, 1968
INSTITUTO DE PESQUISAS ECOLÓGICAS – Corredores da Mata Atlântica: Pontal do
Paranapanema – Disponível em : https://www.ipe.org.br/projetos/pontal-do-paranapanema/76-
-corredores-da-mata-atlantica. Acesso 02 de abril de 2019.
MMA/PDA-445 MA – Ministério do Meio Ambiente, Projeto Ações de Governança Participativa no
Corredor de Biodiversidade do Rio Paraná, 2012
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
PASSOS, M. M dos - A raia divisória São Paulo - Paraná - Mato Grosso do Sul (Cenas e Cenários) –
1ª edição, São Paulo: Outras Expressões, 2011.
RAMOS, A. et al. Visual landscape evaluation: a grid technique. Landscape Plann., 3: 67-88, 1976
TRICART, Jean. – Ecodinâmica - Rio De Janeiro, IBGE, Diretoria Técnica, SUPREN,1977.
130 //
Introdução
Para Silva (2012) a degradação dos diferentes recursos naturais, a falta e/ou escassez
de pesquisas, planejamento e manejo das diversas técnicas de exploração então disponí-
veis, torna de fundamental importância os diferentes estudos integrados para que sejam
fornecidos diferentes subsídios para a identificação de áreas prioritárias para a conservação
da biodiversidade.
O processo de atualização das áreas prioritárias para a conservação indicou no Brasil
inteiro quais as de maior prioridade para conservação ambiental, assim como seu grau de
urgência governamental e sua importância biológica. O mapa das áreas prioritárias para
conservação visa contextualizar a área alvo e seu entorno imediato na priorização gover-
namental de conservação da biodiversidade (Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade - ICMBio, 2011).
132 //
A bacia hidrográfica do alto curso do rio Paraíba (Figura 1) está localizada na parte su-
doeste do planalto da Borborema, limitando-se, ao Norte, com a sub-bacia do rio Taperoá,
ao sul e a oeste com o estado de Pernambuco e a Leste com a sub-bacia do médio curso do
rio Paraíba. Drena uma área de 6.733 km² e seu perímetro possui 527,29 km, englobando
total ou parcialmente a área de 18 municípios distribuídos nas microrregiões do Cariri
Ocidental e Cariri Oriental do estado da Paraíba, que segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE (2010) vivem 128.865 habitantes, resultando numa densidade
demográfica de 19,14 hab./km².
Possui grande importância ambiental, econômica e social, pois nela está presente a
nascente do rio Paraíba, maior corpo hídrico do estado (aproximadamente 380 km de
extensão) e responsável pelo abastecimento de importantes reservatórios. Além disso, o rio
Paraíba, em suas sub-bacias do médio curso e baixo curso, se estende por mais 22 municí-
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
pios, que estão inseridos nas mesorregiões do Agreste Paraibano e da Mata Paraibana, até
seu deságue no Oceano Atlântico, entre os municípios de Cabedelo e Lucena.
O Cariri paraibano, local onde se insere o alto curso do rio Paraíba, é considerada uma
das regiões mais secas do país, e de acordo com a classificação climática de Koppen (1948),
está inserida no clima Bsh – semiárido quente com chuvas de verão. Este tipo de clima
se caracteriza por ter precipitação anual inferior a 500 mm, evapotranspiração potencial
anual superior à precipitação anual e temperaturas médias mensais acima de 18°C. Essa re-
gião tem temperaturas médias elevadas (aproximadamente 27°C), alto índice de radiação
solar e uma precipitação que tem sua maior concentração entre os meses de janeiro e abril.
Nesse ambiente, onde predominam espécies florísticas de clima seco, destacam-se algu-
mas áreas de vegetação úmida, conhecidas como Brejos de Altitude, e de acordo com
134 //
Para que fosse efetivada uma posterior validação dos dados processados nos softwares
de SIG (Sistema de Informações Geográficas), a fim de se chegar aos resultados esperados
dessa pesquisa, foi imprescindível a realização de expedições na área de estudo, com o ob-
jetivo de coletar dados para a construção desta pesquisa, pois as informações geradas com
o uso das geotecnologias precisam de um confronto com a realidade, para que os produtos
gerados sejam mais confiáveis (TRICART, 1977).
Entre os meses de maio/2016 e maio/2017 foram realizadas seis expedições, que pos-
sibilitaram a coleta de informações em 73 locais, espalhados por todos os 18 municípios
que compõem a bacia hidrográfica, permitindo a observação de diferentes tipologias vege-
tais, pedológicas e de paisagens, além de variados níveis de degradação. Esse intervalo de
tempo permitiu que a obtenção dos dados ocorresse em diferentes meses, contemplando a
coleta tanto no período seco, quanto no chuvoso. Tais coletas foram realizadas com o uso
de câmera fotográfica e aparelho receptor de sistema de posicionamento global (Global
Na metodologia, surge o Google Earth Engine (GEE), plataforma gratuita que armazena
imagens de satélite, organiza e disponibiliza, incluindo em seu acervo, dados com mais de
quarenta anos, além de novas imagens que são coletadas todos os dias. São utilizadas para
realizar análises científicas para que possam ser visualizados conjuntos de dados geoespaciais.
Para a realização do estudo foram utilizadas coleções de imagens dos satélites Landsat
5 e 8, sensores TM e OLI / TIRS, respectivamente, que são acessadas através de um catálo-
go público do Google, que contém uma grande quantidade de imagens georreferenciadas.
A maior parte do catálogo é composta por imagens com observação da Terra, incluindo
todo o arquivo Landsat, bem como arquivos completos do Sentinel-1 e Sentinel-2, mas
também inclui previsões climáticas, dados de cobertura do solo e de aspectos ambientais,
geofísicos e socioeconômicos. O catálogo é continuamente atualizado a uma taxa de quase
6.000 cenas por dia (GORELICK, 2017).
O GEE é uma plataforma de monitoramento de dados ambientais, que incorpora
dados da National Aeronautics and Space Administration (NASA), bem como do programa
Landsat. Após o Instituto de Pesquisa Geológica dos Estados Unidos (USGS - United
States Geological Survey) abrir o acesso aos seus registros de imagens Landsat em 2008, o
Google viu uma oportunidade de usar seus recursos de computação em nuvem para permi-
tir que registros dessas imagens possam ser acessados e processados de seu sistema online.
Essa ferramenta ajuda na redução do tempo de processamento em análises de imagens
Landsat (HANSEN, 2013).
Para o uso do GEE nesta pesquisa, foi utilizada como base a metodologia aplicada por
Ghazaryan (2015), na qual foi realizado um estudo de caso, analisando áreas florestais no
Nordeste da Armênia, entre os anos de 1984 e 2014.
Na metodologia aplicada na presente pesquisa, por meio de linhas de comandos (script
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
- Anexo 1), foi utilizado o intervalo temporal de 1988 a 2017, que englobou todas as pas-
sagens realizadas pelos satélites entre 01 de janeiro e 30 de junho nos anos de 1988, 1999
e 2017, com percentual máximo de cobertura das nuvens com valor de 10%. O uso desses
parâmetros propiciou a utilização de 58 diferentes imagens, sendo 12 do ano de 1988, 24
de 1999 e 22 imagens do ano de 2017. A escolha destes anos se deve ao fato deles possuí-
rem alguns fatores que contribuem em resultados mais precisos, tais como a pluviometria e
a quantidade de imagens disponíveis. As informações das imagens utilizadas na confecção
dos mapeamentos propostos para este estudo, por meio do emprego do índice de vegetação
SAVI são apresentadas no Anexo 2.
138 //
As análises dos produtos gerados por meio do índice de vegetação SAVI, aliados a con-
servação dos fragmentos florestais na temporalidade sugerida nesta pesquisa, além das co-
letas de campo realizadas nos anos de 2016 e 2017, tornaram possível a indicação de locais
com potencial para serem indicados como áreas prioritárias para conservação da Caatinga.
Para atingir o objetivo deste tópico, foram confeccionados três produtos cartográficos,
a fim de analisar o comportamento da vegetação da área de estudo, através do aumento
ou diminuição da biomassa. Os produtos foram criados com o intuito de apresentar e
analisar a cobertura vegetal da bacia e atingir os resultados propostos. Os mapas gerados
para que seja analisada a área de estudo nos anos de 1988, 1999 e 2017 são apresentados
nas Figuras 2, 3 e 4, respectivamente.
Percebe-se nos produtos cartográficos algumas transformações ocorridas na região,
que aconteceram em razão de aspectos socioeconômicos e climáticos. É observado que ao
longo do período estudado, ocorreram alterações na biomassa, em grande parte da área
pesquisada, principalmente entre as décadas de 1980 e 1990.
Outro fator a ser considerado na análise das Figuras 2 e 3, são os dados pluviométricos
na região, pois no intervalo temporal (1988-1999), que compreende as informações apre-
sentadas nos produtos cartográficos supracitados, houve grandes períodos de estiagem,
principalmente na década de 1990, quando ocorreram dois fenômenos El Niño (1990 -
1993; 1997 - 1998), classificados pelo Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos
Figura 5. Áreas com potencial para serem indicadas como prioritárias para
conservação da Caatinga na Bacia Hidrográfica do Alto Curso do Rio Paraíba.
Após a elaboração da Figura 5, foram delimitadas quatro áreas com potencial para
serem incluídas como prioritárias para conservação da Caatinga no semiárido paraibano.
Juntas elas somam 1.529,61 km², o que corresponde a quase o dobro das áreas prioritárias
já existentes na área de estudo. Observa-se também que foram visitados 17 locais dentro
dessas quatro áreas, ajudando assim na validação dos produtos cartográficos gerados.
A área 1 está localizada no município de São João do Tigre, mais precisamente na Área
de Proteção Ambiental das Onças, possuindo 56,28 km², e está inserida em uma unidade de
A área 2 está localizada nas porções sul e sudoeste da bacia e engloba todo o território do
município de São Sebastião do Umbuzeiro e parte de São João do Tigre, possui 619,40 km²,
sendo grande parte deste território coberto por remanescente de vegetação nativa (Figura 7).
Destaca-se o município de São Sebastião do Umbuzeiro, que segundo Figueiredo (2016),
457,88 km² são de cobertura florestal, equivalente a 78% de seu território.
A área 4 possui 622,31 km² e é formada pelos municípios de Amparo, Prata, Ouro
Velho e parte de Sumé e Monteiro, e assim como nos outros locais citados, possui grandes
Definir o tamanho das unidades de conservação é uma tarefa que implica em elevada
complexidade, fato ainda mais acentuado quando se sabe que parte dos estados localiza-
dos ao norte do rio São Francisco (Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará)
possuem levantamentos da vegetação limitados, sendo a situação da Paraíba das menos
conhecidas (ARAÚJO, 2005).
Para se chegar aos resultados desta seção, foi tomado como base as informações ilustradas
na Figura 5, sendo adicionada a hidrografia, para que se tenha uma visão da distribuição dos
corpos hídricos e consequentemente suas APP’s nas áreas mapeadas.
A ideia de gerenciamento de recursos hídricos a partir das bacias hidrográficas está
cada vez mais presente nas políticas públicas, uma vez que a presença da água é um aspec-
to fundamental em se tratando de ambientes semiáridos, tanto no que diz respeito às
questões ligadas a flora e fauna, como a conservação e uso desse recurso natural.
Souza (2003) afirma que na gestão dos usos da água, há uma maior complexidade
quando se trata de um ambiente semiárido sem a presença de um curso d’água perene,
nascentes, ou outra fonte de água naturalmente disponível o ano inteiro, sendo essencial
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Vale salientar que a simples ampliação e/ou criação de unidades de conservação não
conduz essas áreas aos objetivos para as quais foram designadas, sem que haja uma ad-
ministração que cumpra com suas obrigações, problemática existente nas unidades de
conservação da Paraíba, principalmente no que diz respeito a ineficiência em vigilância,
ausência de planos de manejo e zoneamento. Porém, se o gerenciamento ocorrer de ma-
neira adequada, a criação de novas UC’s e o manejo apropriado dessas áreas constituem
significativa contribuição para conservação da biodiversidade.
148 //
AESA - Agência Executiva de Águas do Estado da Paraíba. Precipitação na Paraíba. Disponível em:
< http://www.aesa.pb.gov.br/aesa-website/meteorologia-chuvas/>. Acesso em: 10/01/2018.
Almeida, N. V., Cunha, S. B., Nascimento, F. R. (2012). A cobertura vegetal e sua importância
na análise morfodinâmica da bacia hidrográfica do rio Taperoá – nordeste do Brasil/Paraíba.
Revista Geonorte, Edição Especial, 3(4), 365-378.
Araújo, F. S., Rodal, M. J. N., Barbosa, M. R. V. (2005). Análise das variações da biodiversidade do
bioma Caatinga: suporte a estratégias regionais de conservação. Brasília: Ministério do Meio
Ambiente, 1ª edição, v.1., 446p.
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente (2005). Programa de ação nacional de combate à desertifi-
cação e mitigação dos efeitos da seca: PAN Brasil. Brasília: MMA/SRH, 2005.
BRASIL. (2000). Lei n° 9.985 de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1°, incisos I, II,
III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza e dá outras providências.
CLIMANÁLISE. (1993). Boletim de Monitoramento e Análise Climática.Vol.8.
CPTEC - Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos.
Diegues, A. C. S. (2000). O mito da natureza intocada. São Paulo: Hucitec.
Figueiredo, F. C. F., Lacerda, V. A., Rocha, J. G. (2016). Diagnóstico da cobertura vegetal para cum-
primento de reserva legal em São Sebastião do Umbuzeiro-PB. Anais I Congresso Internacional
da Diversidade Do Semiárido, Campina Grande, Brasil.
Garda, E. C. (1996). Atlas do meio ambiente do Brasil. Editora Terra Viva, Brasília.
Gariglio, M. A., Barcellos, N. D. E. (2010). Manejo Florestal Sustentável Em Assentamentos Rurais
Na Caatinga – Estudo de Caso na Paraíba e Pernambuco. Brasília: Serviço Florestal Brasileiro.
Ghazaryan, G. (2015). Analysis of temporal and spatial variation of forest: A case of study in nor-
theastern Armenia. Dissertação, Science in Geospatial Technologies.
Gorelick, N., Hancher, M., Dixon, M., Ilyushchenko, S., Thau, D., Moore, R. (2017). Google
Earth Engine: Planetary-scale geospatial analysis for everyone. Remote Sensing of Environment,
202, 18-27.
Hansen, M. C., Potapov P. V., Moore, R., Hancher, M., Turubanova, S. A., Tyukavina, A., Thau,
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
D., Stehman, S. V., Goetz, S. J., Loveland, T. R., Kommareddy, A., Egorov, A. Chini, L.,
Justice, O., Townshend, J. R. G. (2013). High-Resolution Global Maps of 21st-Century
Forest Cover Change. Science, 342 (6160), 850-853.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo agropecuário 1970, 1980, 1990 e 2006.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Divisão política do Brasil, 2016.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2010). Censo demográfico 2010.
ICMBio - Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. (2011). Atlas do Corredor
Ecológico da Região do Jalapão.
IUCN - International Union for Conservation of Nature (2019). The IUCN Red List of Threatened
Species. Version 2019-1.
Köppen, W. (1948). Climatologia: com um estúdio de los climas de la tierra. Fondo de Cultura
Economica, México, 478p.
150 //
var STD_NAMES = [‘blue’, ‘green’, ‘red’, ‘nir’, ‘swir1’, ‘temp’,’swir2’]; //Para Renomear
bandas
.and(image.select([5]).gte(incompleteThreshold))
.and(image.select([6]).gte(incompleteThreshold)),10);
return image.mask(image.mask().and(imageWhere.select([1]).eq(10)));
};
in_image = in_image.select([0,1,2,3,4,5,6],STD_NAMES);
in_image = in_image.addBands(in_image.normalizedDifference([‘nir’, ‘red’]).
152 //
};
var VIs = (
ImageCollection
.filterBounds(region)
.filterDate(ee.Date.fromYMD(startYear, 1, 1), ee.Date.fromYMD(endYear, 1, 1).
advance(1, ‘year’))
.filter(ee.Filter.dayOfYear(1,365))
.map(addDateBand).map(addIndices).map(addSAVI)
)
Export.image.toDrive({
image: savi_2017, //substituir pela imagem desejada
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
DATA DE
N° ID DA IMAGEM ANO
PASSAGEM
1 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150651988004CUB00 1988 04/01/1988
2 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150661988004CUB00 1988 04/01/1988
3 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150661988036CUB01 1988 05/02/1988
4 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150651988036CUB01 1988 05/02/1988
5 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150651988052CUB00 1988 21/02/1988
6 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150661988052CUB00 1988 21/02/1988
7 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150651988068CUB01 1988 08/03/1988
8 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150661988068CUB01 1988 08/03/1988
9 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150651988100CUB01 1988 09/04/1988
10 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150661988100CUB01 1988 09/04/1988
11 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52140651988141CUB00 1988 20/05/1988
12 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52140661988141CUB00 1988 20/05/1988
13 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52140661999043CUB00 1999 12/02/1999
14 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150651999050CUB00 1999 19/02/1999
15 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150661999050CUB00 1999 19/02/1999
16 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52140651999059CUB00 1999 28/02/1999
17 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52140661999059CUB00 1999 28/02/1999
18 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150661999082CUB00 1999 23/03/1999
19 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150651999082CUB00 1999 23/03/1999
20 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150651999098CUB00 1999 08/04/1999
21 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52150661999098CUB00 1999 08/04/1999
22 LANDSAT/LT5_L1T_TOA/LT52140651999107CUB00 1999 17/04/1999
Com a realização da primeira eleição direta para Presidente da República, após sucessivos
governos autocráticos, cujo início ocorreu com a ruptura institucional de 1964 liderada
pelas Forças Aramadas, o Brasil passou a experimentar o que é o seu mais longo período
de normalidade institucional e rotina eleitoral. No entanto, o sistema político foi paula-
tinamente afetado por crises e tensões institucionais frente a uma crescente diluição das
principais correntes pró-democráticas que concertaram a transição democrática negociada
e pelo desenho institucional do Estado – na sua condição federativa, republicana e demo-
A chegada da democracia
A saída do regime autoritário trouxe, pela via direta do voto, à frente do poder forças
de oposição ao antigo governo e que se identificavam como oposição ao regime autoritá-
rio, progressista ou de esquerda. Essa ascensão de forma dividida ao poder, como rivais,
protagonizada pelo PSDB e pelo PT, fortaleceu diversos setores que estavam desgastados
por alinhamento ao regime autoritário e a setores emergentes na política, mas cuja base
não é propriamente por identificação política, mas religiosa, corporativa e empresarial.
As amplas alianças construídas pelo PSDB e pelo PT possibilitam uma ampliação des-
ses segmentos e um aumento do custo político das alianças para formação de governo.
Contudo, o mais significativo desse processo foi o desgaste desses sucessivos governos
tendo em vista o ideário desses dois partidos. Eles acabaram canibalizando-se em favor
do crescimento de ideários antipolíticos, anticiência e irracionalismo. Ao invés de emer-
girem novos projetos de ampliação política e democrática, avolumaram-se forças opostas
a isso.
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
A polarização forjada por PSDB e PT não conseguiu pôr em pautas projetos de trans-
formação capazes de romper com esse eixo de “conciliação”. A lógica do Poder não foi
conjugada a uma lógica de aprofundamento democrático para além do rito eleitoral e no
sentido de uma maior partilha do poder.
Ao invés do PSDB e do PT somarem esforços visando uma ampla agenda de reformas,
optaram por fazer alianças que mantivessem o outro na oposição. O desfecho é que ambos
definharam politicamente e deixaram um vazio. Quando o PSDB esteve à frente do poder
o PT conseguia fazer oposição, pois tinha uma verdadeira hegemonia no meio dos parti-
dos de esquerda e nos movimentos sociais. Quando o PT assumiu o governo houve uma
retração da oposição e dos protestos oriundos dos movimentos sociais. Essa retração desses
setores por alinhamento ao governo do PT possibilitou a emergência de novos movimentos,
distintos dos movimentos populares e identificados com o “petismo”.
A ausência de oposição e o congelamento sindical e dos movimentos sociais deram
condições a outros setores começarem a protagonizar protestos e serem agentes aglutina-
dores de reivindicações múltiplas, mas nitidamente marcadas por uma pauta de valores.
Essa pauta de valores pode ser sintetizada em três pontos principais: primeiro, uma postu-
ra contrária a ideais e valores de liberdade, racionalidade e cientificidade, um verdadeiro
surto irracional; segundo, um postura contrária à laicidade do Estado e da política, movi-
dos por um fundamentalismo “religioso” (fé sem razão), que buscava orientar as Políticas
Públicas sob uma perspectiva de dogmas religiosos; terceiro, antipolítica, porque, ao negar
a laicidade (neutralidade do Estado), negou a primazia do Poder político frente ao Poder
religioso; a também o pluralismo a invocar dogmas e negou a diversidade de ideias e,
óbvio, nega liberdade política, que deve ser vista primeiramente como poder de resistir, re-
sistir a um poder maior (SARTORI, 1994). Negou consequentemente todas as condições
A Constituição de 1988, apesar de seus avanços, não pôde e nem pode ser vista como
algo perfeito ou uma peça que não mereça reparos e ajustes, que acompanhe as mudanças
do tempo como bem frisava Maquiavel (2009): “mudança sempre deixa preparado o cami-
nho para a próxima”, para qualificar a dinâmica e a variação dos contextos. A Constituição
foi um elemento chave para o retorno à normalidade democrática (sempre e normal cheia
de riscos) e gerou um forte otimismo, que pode ser batizado jurídico/político. Esse oti-
mismo debandou para um ativismo legalista e uma dramática judicialização das relações
sociais, agudizando o litígio através de um volume enorme de ações sobre quase tudo.
Minaram-se todos os campos de entendimento e conciliação em prol da disputa judicial.
Por outro lado, ao passo que a Justiça foi mais acionada e mais presente sobre os conflitos
e demandas das demais instituições, o próprio judiciário para a desenvolver, no seu siste-
ma um ativismo judiciário, onde a toga preta da serenidade começou a ganhar brilho de
capa de super herói. Esse ativismo tem suas bases ideológicas no direito achado na rua e
no direito alternativo das décadas de 80 e 90 do século XX. No entanto, a fórmula que
parecia, no seu nascedouro, ter mão única em um sentido, passou a ser usada em todos os
sentidos. Trata-se especificamente da ideia de que, para fazer-se a justiça, o magistrado atue
no sentido de, pelo seu livre convencimento fundamentado, complementar a lei para fazer
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Ao passo que o Poder legislativo foi substituindo o debate e o embate na sua própria
arena e, recorrendo ao judiciário, abriu uma via de intervenção do Poder judiciário sobre
o legislativo, acrescendo sua competência em termos de legislar. O STF, atualmente, não
só diz sobre a constitucionalidade ou não, mas define de pronto o que é legalidade nor-
mativamente. Tira da área da representação popular e legitimados pera soberania popular
decisões de ampla repercussão social e que, no mínimo, deveria estar na pauta da opinião
pública e forjada no debate das forças políticas eleita pela vontade popular.
O que parecia ser uma solução, diante do baixo comprometimento do legislativo com
suas próprias competências, virou um problema para o próprio Judiciário que acaba tendo
sua credibilidade sendo posta à corrosão das disputas de facções rivais, destituída de projetos
de natureza pública. Essa brecha tem levado a mais alta corte do país a ataques diversos,
provocando preocupações e temores sobre a condição de existência da democracia no Brasil.
Fica cada vez mais evidente que o designer constitucional do Estado brasileiro, como
um todo, apresenta falhas institucionais. O pacto político, que estabeleceu a configuração
do sistema político brasileiro logo após 1985 (a redemocratização), faliu e abriu um vazio.
Isso pode ser notado na ausência de alternativa política, projetos políticos com respalda-
Considerações Finais
Bibliografia
DEBRUN, Michel. (1983).A conciliação e outras estratégias. São Paulo: editora Brasiliense.
MAQUIAVEL, Nicolau. (2009). O príncipe. São Paulo: Golden Books.
KELSEN, Hans. (1993). A democracia. São Paulo: Martins Fontes.
SANTOS, Wanderley Guilherme dos. (2003). O Cálculo do conflito: estabilidade e crise na política
brasileira. Belo Horizonte: Editora UFMG.
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
SARTORI, Giovanni. (1994). A teoria da democracia revisitada: as questões clássicas, vol II. São
Paulo: Editora Ática.
168 //
Introdução
1
Denomina-se “movimento negro” uma série de movimentos sociais, que buscavam representação e afirmação
da identidade e das demandas da população afro-brasileira, especialmente os surgidos de forma organizada
no século XX.
2
Zumbi dos Palmares foi um dos líderes do Quilombo dos Palmares, uma comunidade de escravos
fugidos, no Nordeste do Brasil, região hoje do estado de Alagoas. Palmares tornou-se uma das mais
importantes resistências formadas por sujeitos antes escravizados, nos tempos coloniais (Silva, 2014).
Hoje, Zumbi representa a resistência contra a escravidão e é um dos personagens do período construído
enquanto Herói.
170 //
Memória e História
Em uma de suas obras, Linda Tahiwai Smith (1999) propõe uma abordagem da his-
tória de forma a repensar algumas noções como, por exemplo, a ideia da história como
detentora de universalidade e totalidade, que segue uma ordem cronológica, que está asso-
ciada sempre à evolução humana e traz uma narrativa coerente e organizada em categorias
binárias. Além disso, ela problematiza a utilidade da história de comunidades indígenas,
em sua versão ocidentalizada, para elas próprias. Por vezes um testemunho oral ou hábito
passado por gerações, não são considerados fontes históricas, mas sim parte de tradições.
Outro ponto é que não se preocupam necessariamente com um “relato oral” ou com a
“nomenclatura genealógica da terra”, o foco é restaurar um mundo fragmentado, tentando
reconstruir sua existência e evitar que sua própria história seja apagada. No final, a história
não é mais do que um conto narrado por uma dominação específica (Smith, 1999). Nesse
sentido, é interessante pensar a história como esse instrumento de controle, que se constrói
e se destrói a todo o tempo, distanciando-se de sua percepção inicial.
Berthold Molden (2016) introduz o conceito das “guerras de memória”, sendo estas
relações competitivas entre narrativas hegemônicas e contra-hegemônicas (Molden,
2016). O autor também apresenta o conceito de “hegemonia mnemônica”, que engloba
tanto essas relações competitivas, quanto o que ele chama de “comunidades de lembrança
passiva”. Portanto, a história política é composta não apenas por narrativas hegemônicas e
contra-hegemônicas, mas também por lembranças passivas. A construção de um passado
é colocada como a verdade universal, a única versão possível dos fatos, e é criada com uma
narrativa hegemônica em mente que serve o propósito de lançar as bases do presente,
servindo a um projeto político específico. No entanto, esse fundamento que sustenta o
deseja manter para se adequar ao seu próprio projeto político, no entanto, um mapa da
lembrança é muito mais complexo do que uma suposição binária de narrativas hegemô-
nicas versus contra-hegemônicas (Molden, 2016). A memória e sua construção devem ser
vistas além dessas narrativas, no entanto. Os líderes invisíveis, os símbolos nunca vistos,
as lutas do dia a dia e as narrativas que não podem se tornar competitivas porque con-
seguem ser esquecidas mesmo dentro de narrativas contra-hegemônicas, entretanto com
mais permeabilidade. Essa é uma das premissas deste artigo, a ideia de que mesmo com o
enriquecimento da visão histórica promovida pelos símbolos contra-hegemônicos, ainda
há camadas a serem desdobradas, e as narrativas contra-hegemônicas às vezes se compor-
tam como hegemônicas de acordo com o contexto.
Se um dos objetivos de Molden é que:
172 //
Então, é válido pensar que uma vez que uma narrativa competitiva que não foi in-
corporada à oficial ganha espaço e promove mudanças, ela também pode desempenhar
o papel de hegemônica naquele novo contexto e aqui a teoria da hegemonia mnemônica
pode nos ajudar a pensar nessas narrativas como apenas uma das possibilidades que ofusca
outros subalternos.
Se existe uma narrativa dominante que é aceita como uma verdade “universal”, como
aponta Molden (2016), é difícil pensar a mudança social em termos de afirmação das
pessoas que são excluídas por causa dessa narrativa. Esse é o caso não só de governos
autoritários, onde não há espaço para questionar o poder hegemônico, mas também,
nos períodos em que encontramos a democracia, quem questiona o discurso nem sempre
consegue trazer suas narrativas contra-hegemônicas para a arena política, por causa da
aceitação geral da dominante. Dessa forma, há pouco espaço para mudança social.
Nesse sentido, a memória é uma construção influenciada pelas relações de poder dos
grupos e a principal característica de uma narrativa quando se discute a memória coletiva
é reunir e moldar períodos específicos que importam para um grupo (Benjamin apud
Fowler, 2007). No entanto, como a memória coletiva é frágil e grupos dominantes podem
anos 1960 e 1980, a abordagem era diferente. Devido ao forte uso da narrativa da democracia
racial, quem não estava de acordo, era automaticamente visto como subversivo. Essa aborda-
gem fazia parte política oficial de governo, tornando vulneráveis, no regime, os que lutassem
contra ela, como era o caso do movimento negro (Pereira, 2013, p. 222).
Um dos aspectos importantes em relação aos movimentos sociais são suas indigna-
ções, aquilo que os faz resistir e persistir. Infelizmente, o foco nessas indignações, não
é suficiente para que os indivíduos se convençam de que existe uma narrativa diferente
176 //
E os “heróis”?
Por muitas décadas a questão racial foi retratada como inexistente pelos poderes
dominantes. Se, como Smith (1999) apontou, a história é, aparentemente, sobre “auto-
atualização do sujeito humano”, então, nesta narrativa hegemônica, essa autoatualização
seria a criação de uma “raça brasileira”, uma categoria que, de acordo com o projeto
político vigente, seria melhor e mais desejada do que uma população mais escura, parte do
projeto de “branqueamento” da população. Além disso, o país era representado como uma
democracia racial, esta seria o equivalente de Smith a uma narrativa “coerente”; o 13 de
maio foi celebrado como o dia em que os escravos se tornaram livres e, como o “brasileiro”
seria símbolo de um novo povo, não haveria espaço para heróis negros. Mais, dentro das
dinâmicas de criação desse novo povo, fruto da miscigenação, ao focar em embranquecer
a população, há um violento apagamento da derme e da cultura negras.
Os movimentos de resistência e a afirmação do movimento negro conseguiram promover
uma mudança nessa linha de pensamento e, mesmo sob intensa perseguição, não deixaram
de denunciar desigualdades e lutar por reconhecimento. Não obstante, o processo de cons-
trução de heróis é bastante interessante e complexo. Por exemplo, Abdias do Nascimento,
um dos fundadores do Teatro Experimental do Negro - TEN, ex-deputado federal, pro-
fessor universitário e líder contemporâneo do movimento negro, em um dos depoimentos
trazidos no livro de Pereira (2013), é apresentado como sujeito negro elitizado, que deixou
o país e se tornou intelectual nos Estados Unidos. Por esse motivo, voltou com uma noção
distorcida do movimento, portanto, não era totalmente aceito, muito menos celebrado
enquanto liderança. Como citado anteriormente, as fontes orais podem nos confundir e a
imagem de Nascimento hoje é muito diferente daquela citada no depoimento e é uma das
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
sar que fossem de fato livres. As relações de poder permaneceram as mesmas, o contexto é
que havia se reconfigurado. Também trouxeram suas próprias referências simbólicas: Zumbi
dos Palmares e o dia de seu assassinato, no dia 20 de novembro como símbolo de resistência
e dia para se pensar uma consciência negra, sendo esta, uma das datas mais importantes a
serem lembradas dentro do calendário do movimento negro. A afirmação de sua cultura, reli-
gião, música, folclore são atos políticos e são formas de desafiar a ordem dominante, abrindo
brechas para resistência e afirmação. O dia 20 de novembro é relembrado em várias partes
do país e, durante esse mês há muitas atividades no que tange o antirracismo e os debates de
inclusão. Nas últimas décadas, muitas leis aprovadas no congresso foram resultado direto de
seus próprios esforços em mudar a narrativa principal. Apesar de ainda ter força, a narrativa
da democracia racial não é tão forte quanto antes e abre espaço para os passados resistentes.
180 //
Considerações finais
Bibliografia
Brasil. (2003). Lei n. 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Brasília: Presidência da República - Casa
Civil - Subchefia para Assuntos Jurídicos. Retrieved from http://www.planalto.gov.br/cciv-
il_03/leis/2003/l10.639.htm
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Brasil. (2012). Lei n. 12.711, de 29 de agosto de 2012. Brasília: Presidência da República - Casa
Civil - Subchefia para Assuntos Jurídicos. Retrieved from http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12711.htm
Crespo, F. N. (2016). LAUDELINA DE CAMPOS MELLO : Histórias de Vida e Demandas do
Presente no Ensino de História. Revista Cantareira, 24(Jan-Jun), 162–177.
Domingues, P. (2007). Frentenegrinas: notas de um capítulo da participação feminina na história
da luta anti-racista no Brasil. Cadernos Pagu - Quereres, (28), 345–374.
Fernandes, F. (1978). Ensaios: A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Editora Ática.
Fowler, B. (2007). Collective Memory (Social Change). The Blackwell Encyclopedia of Sociology.
Blackwell Reference Online 22 March 2007. https://doi.org/10.1002/9781405165518.wbeosc067
Geledés. (2015). Livros e textos de Lélia Gonzalez. Retrieved November 30, 2020, from https://
www.geledes.org.br/livros-e-textos-de-lelia-gonzalez
182 //
Introdução
Alexander Von Humboldt, no século XIX, foi um estudioso importante para a cons-
trução do conhecimento científico da época e para a geografia enquanto ciência, suas obras
englobavam diferentes campos científicos, sendo considerado um dos maiores naturalistas
deste período, despertando o interesse da sociedade.
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
Até então se acreditava que o crescimento econômico não tinha limites e que o
desenvolvimento significava dominar a natureza e os homens. Entretanto, nos anos
60/70 percebeu-se que os recursos naturais são esgotáveis e que o crescimento sem
limites começava a se revelar insustentável. Neste contexto, emerge a necessidade de
se elegerem novos valores e paradigmas capazes de romper a dicotomia sociedade/
/natureza (BERNARDES E FERREIRA, 2003, p. 17).
[...] O que queremos dizer é que a natureza assume importância analítica para
a ciência, isso s deve em grande parte à sua deterioração ou à sua importância na
construção de novos recursos e/ou mercadorias a partir, inclusive, de sua possível
reprodução e laboratório através da biotecnologia, exigindo estas temáticas, mas
recentemente uma concepção diferenciada daquela rotulada de Geografia Física
(SUERTEGARAY; NUNES, 2001, p. 16).
A partir da reflexão desses autores, nota-se que existe a busca de superar a dicotomia da
Geografia. Suertegaray e Nunes (op. cit.) ressaltam que a “Geografia Física versus Geografia
Humana neste momento histórico não pode ser confundido com o abandono do conhe-
cimento da natureza em Geografia”.
Entre as formas de entendimento das questões ambientais, que buscam a superação
da relação dicotômica existente na Geografia, está a concepção marxista. De acordo com
Bernardes e Ferreira (2003), a relação do homem com a natureza é sempre dialética, pois
o homem é um ser socialmente ativo, como nota-se na citação a seguir.
Áreas Urbanas
Salinas Desativadas
O manguezal do rio Ceará, historicamente, foi bastante degradado pelas formas de uso
e ocupação do estuário ao longo dos anos. A princípio, a madeira do mangue era utiliza-
da para a construção de casas, cercas, embarcações e combustível doméstico. A partir da
década de 1930, salinas foram instaladas na região, o que resultou na degradação de áreas
extensas de manguezais (SEMACE, 2005).
Agroextrativismo
Essa colocação de Nurit Bensusan é bastante pertinente para este estudo, pois a
unidade de conservação em questão, está sobreposta ao território indígena Tapeba. O
modelo de gestão implementado na APA do Estuário do Rio Ceará não protege a foz do
rio, e a sua ineficiência compromete os modos de viver desses povos que historicamente
ocupam essas áreas.
A comunidade indígena Tapeba, em especial, a Aldeia da Ponte, tiveram seus modos
de vida alterados ao decorrer do tempo e buscam resgatar através das lutas das pessoas da
comunidade que se reconhecem como indígena, suas características originárias.
198 //
Acredita-se, com base nos depoimentos dos indígenas que habitam a Aldeia da Ponte,
que a Área de Proteção Ambiental é insustentável porque após 20 anos de sua institu-
cionalização a poluição e a contaminação do rio aumentou consideravelmente, causando
alterações na vida das populações e povos originários que dependem, principalmente da
pesca do rio para sobreviver.
No processo de dimensionamento desta unidade de conservação a foz do rio não foi
protegida. A gestão, de responsabilidade do estado do Ceará, e os usos que ocorrem nesta
unidade não estão completamente baseados nos preceitos da sustentabilidade e na legisla-
ção que rege a conservação ambiental, reflete, deste modo, a lógica existente na produção
capitalista do espaço, e ocasiona conflitos ambientais que se configuram no território,
demonstrando, sobretudo, a ineficiência da gestão e das instituições públicas.
Bibliografia
Fonte: Imagem de domínio público, publicada em numerosos sítios e blogues, na internet. 2020.
O efetivo revoltoso foi combatido por forças da nascente República, que eram integra-
das pelos regimentos de Segurança de Santa Catarina e do Paraná; Esquadrões da Guarda
Nacional, divididos em Piquetes de Cavalaria, e grande parte do Exército Brasileiro, que
empregou tropas de infantaria, da cavalaria, da engenharia e da artilharia. A inferioridade
numérica dos militares era compensada pelo melhor aparelhamento bélico, pois utiliza-
Dinâmicas socioeconómicas em diferentes contextos territoriais
vam canhões, metralhadoras, bombas, espadas e fuzis, contra facões de madeira, velhas
espingardas, mosquetões e revólveres dos sertanejos. Os caboclos e as caboclas em guerra
se defendiam como podiam, usavam os recursos advindos da base físico-geográfica regio-
nal, faziam emboscadas, lutavam frente a frente com os legalistas, entre eles, milhares de
mercenários contratados pelos coronéis de fazendas para matá-los, mas, ao final de quatro
anos, sucumbiram ao poder dos canhões e metralhadoras da República, mas não derro-
tados, pois se fizeram heróis de uma guerra desigual e venceram moralmente a República
que chamavam de república do diabo (FRAGA, 2016).
As forças militares que estiveram no Contestado para impor a ordem à lei e afugentar
bandos de fanáticos em tarefa que parecia fácil, defrontaram-se com um verdadeiro exér-
cito rival, disciplinado, formado por gente hábil, destemida, idealista, conhecedora do
208 //
O turismo pode ser definido de várias formas, contudo, todas levam diretamente ao
conjunto de relações e acontecimentos surgidos a partir dos viajantes e de suas estadias por
212 //
Como resistência à mudança de nome Vale do Contestado para Vale dos Imigrantes,
entre os dias 26 e 27 de outubro de 2019, foi apresentada e debatida a proposta de criação de
um consórcio de turismo para a região mais cabocla do Contestado, denominada Encantos
Bibliografia
ATLAS BRASIL. (2019). Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Disponível em: <http://
www.atlasbrasil.org.br/2013/pt/perfil_m/general-carneiro_pr#idh>, acessado em 16 de julho
de 2019.
AMADO, Janaína. (1995). Região, Sertão, Nação. In: Estudos Históricos. Rio de Janeiro, RJ. Vol. 8,
1995, p. 145-151.
CLAVAL, Paul. (2007). A Geografia Cultural. 3. ed. Florianópolis: UFSC.
BRAUDEL, Fernand. (1995). Civilização Material, Economia e Capitalismo: Séculos XV - XVIII.
Editora Martins Fontes. São Paulo. [1979].
218 //
http://desacato.info/vale-do-contestado-uma-morte-anunciada-em-julho-de-2019-pelos-que-
-nao-aceitam-a-existencia-da-cultura-cabocla/>. Acesso em: 27 jul. 2020.
FRAGA, Nilson Cesar. (2020). Território do Contestado - Sul do Brasil: a Civilização Cabocla e a
Guerra do Contestado. 2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=AvWvpdJ
IP1s&feature=youtu.be&fbclid=IwAR0DJaojAi1g206V5BtzNS3aTo7Yut3jYE30HuaXQavV
DE_JTUuw3qLBjAA>. Acesso em: 27 jul. 2020.
FRAGA, Nilson Cesar; HOBAL, Michele Aparecida; FERNANDES, Rafael Carlos Prieto (2006).
Turismo de Guerra – o roteiro turístico como elemento de desenvolvimento local e regional
para o interior na perspectiva de que o “Brasil oferece mais do que praias e carnaval”. Curitiba.
PerCurso: Curitiba em Turismo, Faculdades Integradas Curitiba, a. 5, n. 5, p. 137-186.
FRAGA, Nilson Cesar; GOLÇALVES, Cleverson. (2016). Timbó Grande, o último reduto do
Contestado: um território de muitas batalhas. In: Contestado: cidades, reflexos e coisificações
geográficas. Org. FRAGA, Nilson Cesar. Florianópolis: Editora Insular, 2016.
220 //
Giampietro Mazza
Università degli studi di Sassari
Nicola Fresu
Università degli studi di Sassari