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Prof. Dr. Rodrigo Silva

INTRODUÇÃO À BÍBLIA

1ª Edição
2017

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Sumário
Palavra do Professor autor
Sobre o autor
Ambientação à disciplina
Trocando ideias com os autores
Problematizando

UNIDADE I – ESTRUTURA DA BÍBLIA

Peculiaridades de um Livro
Nomes para a Palavra de Deus
Organização do Livro Sagrado
Antigo testamento
Pentateuco ou Torá
Livros Históricos
Livros Poéticos
Livros Proféticos
Novo Testamento
Geografia dos eventos bíblicos
Uma coletânea de Histórias
Um livro perigoso
Inspiração e revelação

UNIDADE II - O CÂNON BÍBLICO


Como foram escolhidos os livro da Bíblia?
O Cânon do Novo Testamento
Cânon do Antigo Testamento
Período Intertestamentário
A Septuaginta
Apócrifos, pseudoepígrafos e Deuterocanônicos
Línguas Originais da Bíblia

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Hebraico e Aramaico
Grego

UNIDADE III: A TRANSMISSÃO DO TEXTO BÍBLICO

Períodos Bíblicos
Período de reduplicação
Período da unificação textual
O Período das impressões
Período de crítica e de revisão
A Crítica Textual
O Trabalho da Crítica Textual

UNIDADE IV- TRADUÇÕES E VERSÕES DA BÍBLIA


As principais traduções da Bíblia
Antigo testamento
Novo Testamento
Versões modernas
Versões em português
A Bíblia no Brasil - Traduções parciais
Traduções completas

Explicando melhor a pesquisa


Leitura Obrigatória
Pesquisando na internet
Saiba Mais
Vendo com os olhos de ver
Revisando
Autoavaliação
Bibliografia
Bibliografia da Web
Vídeos

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Palavra do professor

Ao dar início a tarefa de cursar Teologia tem-se em mira vários objetivos,


mas sem dúvida o maior de todos é conhecer a revelação de Deus para o homem.
A Teologia cristã parte do pressuposto que Deus existe e que ele se revelou de
várias maneiras. Entretando a Biblia consitui a revelação especial de Deus para o
homem. Seu principal objetivo é revelar ao homem o plano da salvação. Por meio
dessa revelação o homem passa a compreender que o Deus único é composto por
três pessoas divinas, o Pai, o Filho e o Espírito Santo, e que as Pessoas Divinas
planejaram a criação do homem bem como o plano para resgatá-lo do pecado e da
sua natureza caída.

Mas nesse momento nos voltamos para os aspectos formais do livro


sagrado. Quando foi escrito? Quem são seus escritores? Como o livro foi
organizado? Podemos confiar nas traduções modernas?Nao teria a Bíblia sido
alterada ao longo dos séculos? Essa e outras questões serão respondidas nessa
disciplina.

Seja bem vindo (a)!

O autor.

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Sobre o autor

Rodrigo Pereira da Silva é filosofo e Pós-doutor com


concentração em Arqueologia Bíblica pela Andrews
University, EUA. Doutor em Arqueologia Clássica pela
Universidade de São Paulo com bolsa da Capes a partir de
novembro de (2010 a março de 2011). Doutorado em
Teologia Bíblica pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S.
Assunção - atualmente vinculada à PUC SP (2001).
Especialização em Arqueologia pela Universidade Hebraica de Jerusalém (1998).
Mestrado em Teologia Histórica pelo Centro de Estudos Superiores da Companhia
de Jesus - atual Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia - FAJE (1996).
Graduado em Filosofia pelo Centro Universitário Assunção (1999), possui também
graduação em Teologia pelo Instituto Adventista de Ensino do Nordeste (1992). É
professor de Teologia e Arqueologia do Centro Universitário Adventista de São
Paulo - Campus Engenheiro Coelho, SP (UNASP-ec), curador do Museu Paulo
Bork de Arqueologia do Oriente Médio.

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Ambientação

A Bíblia é, sem dúvida, o livro mais impresso e divulgado no mundo inteiro.


Seria também o mais estudado? Difícil dizer. Mas o fato é que uma pesquisa das
Sociedades Bíblicas Unidas (UBS) concluiu que cerca de 2,5 bilhões de cópias
tinham sido impressas e distribuídas entre 1815 e 1975. Porém, mais
recentemente, o Guiness publicou que este número superaria mais de 5 bilhões de
exemplares distribuídos em 349 idiomas (algumas fontes dizem 6 bilhões). Se
considerarmos ainda aqueles que têm pelo menos partes da Bíblia em seu
vernáculo natal, esse número saltaria para mais de 2.400 idiomas ao redor do
mundo que possuem a Bíblia traduzida no todo ou em parte.

Somente os Gideões Internacionais distribuem por dia mais de 170 mil


exemplares da Bíblia em todo mundo. Isso significa que a cada minuto ou o tempo
em que você levar para ler toda essa página, 120 novas bíblias foram entregues a
alguém em diferentes cantos do planeta (BEAL 2011).

O segundo livro no ranking de mais publicado e distribuído do mundo seria o


famoso Livro Vermelho do Comunista Mao Tsé-Tung que trazia citações do ditador
chinês compilados por Lin Piao, seu ministro da defesa. Diferente da Bíblia, esta
era uma distribuição e leitura obrigatórias, impostas pelo governo. Mesmo assim, o
que se tem aqui é um distante segundo lugar, pois de acordo com as fontes oficiais
o livro vermelho estaria disponível em menos de 40 idiomas com uma tiragem de
pouco mais de 1 bilhão de cópias distribuídas pela China e restante do mundo
(LEESE, 2011).

Que contraste não é mesmo? E as diferenças não param por ai. O conteúdo
de ambos os livros é assombrosamente diferente. De acordo com o Livro Vermelho
de Mão, “devemos apoiar tudo o que o inimigo combate e combater tudo o que o
inimigo apoia” e mais: “a revolução é uma insurreição, um ato de violência pelo
qual uma classe derruba a outra.”

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Já na contramão desta cultura temos os ensinos de Cristo que diz: “tudo o
que quereis que os homens vos façam, fazei a eles vós também” (Mateus 7:12).
Além disso temos o conselho de Paulo: “Não deixeis vencer do mal, mas vence o
mal com o bem” (ROMANOS 12:21).

O livro vermelho tornou-se uma espécie de Bíblia para a juventude chinesa


dos anos 60 e 70 e foi peça chave do maior fervor ou fanatismo revolucionário do
século 20, a chamada Revolução Cultural que ceifou a vida de muitas pessoas e
tornou a China um dos países mais isolados do mundo inteiro.

Alguns podem argumentar que a Bíblia também provocou muitas mortes nos
tempos da inquisição, mas isso não é verdade. Foi a autoridade eclesiástica de
então que mandou matar em nome da fé. A leitura da Bíblia, além de proibida para
a população em geral, era um dos motivos da pena capital, pois muitos foram
mortos apenas por possuir em casa um exemplar do livro sagrado ou tentar lê-lo
por conta própria sem autorização da Igreja. Autoridade eclesiástica e
ensinamentos bíblicos não são necessariamente sinônimos perfeitos. A história,
portanto, das Escrituras Sagradas está bem distante daquela relacionada ao Livro
Vermelho da China Comunista.

Bons estudos!

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Trocando ideias com os autores
WAYNE GRUDEM , C. JOHN COLLINS , THOMAS R. SCHREINER

Origem, confiabilidade e significado da Bíblia. Vida Nova, 2013.

Indicamos este livro para leitura. Ele discute temas como:


A Bíblia é mesmo digna de confiança? A Arqueologia
confirma as declarações da Bíblia? Como podemos
interpretar a Bíblia?

“A Bíblia é o livro mais importante do mundo. No entanto,


mesmo sendo uma obra tão respeitada, questões como
as que vemos acima ainda hoje intrigam tanto cristãos
quanto não cristãos. Organizadores e acadêmicos da
perícia de Wayne Grudem, C. John Collins e Thomas Schreiner reconhecem o
desafio que todos enfrentamos e nos presenteiam com Origem, confiabilidade e
significado da Bíblia. O objetivo da obra é nos ajudar na compreensão correta das
Sagradas Escrituras.

Ela aborda uma grande variedade de temas de fundamental importância, entre os


quais a maneira correta de ler a Bíblia e as razões para confiarmos nela, esta
compilação de 19 artigos examina assuntos específicos, como as religiões
mundiais, o cânon e a arqueologia. Colaboraram para esta obra pesquisadores
notáveis, como James I. Packer, John Piper, Daniel. B. Wallace, Vern Poythress e
outros”.

HARRIS, R. Laird. Introdução à Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 2005.

Outra maravilhosa leitura essencial voltada para aqueles


que estão em busca de um conhecimento maior da Palavra
de Deus, bem como estudantes de seminário, é o livro
Merece Confiança o Antigo Testamento? Esta obra trata-
se de uma leitura crítica, com ela você poderá levantar
excelentes discussões. A escolha do autor vincula-se a um

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ponto de vista mais conservador, sob uma perspectiva ortodoxa. No entanto são
apresentadas, de forma imparcial, teorias distintas – liberal ou neo-ortodoxa.

ARCHER JUNIOR, Gleason L.; CHOWN, Gordon (Trad.). Merece confiança o


Antigo Testamento? 3. ed. São Paulo: Vida Nova, 2005.

Guia de Estudo: Após a leitura das obras, realize uma comparação entre as ideias
dos autores, em seguida faça um texto dissertativo-argumentativo sobre o que mais
lhe chamou atenção.

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Problematizando

A Biblia vem composta pelo Antigo e Novo Testamento, é aceita pelo


Cristianismo em geral como a Palavra de Deus. Segundo a tradição, os primeiros
livros foram escritos cerca de 1500 a.C aproximadamente. Seu último livro a ser
escrito foi em 95 d.C, ou seja, estamos distante do último livro a ser escrito cerca
de 2000 anos. Totalizando a nossa distância no tempo dos primeiros escritos cerca
de 3500 anos. A Biblia foi escrita dentro de uma cosmovisão do povo hebreu, tem
sem dúvida seu contexto histórico e cultural próprio, bem como sóciopolítico.

Sendo assim faz-se pertinente a seguinte pergunta: um livro assim, tão


distante de nós e de nossa cultura tem algo relevante a nos falar? Não teria a
Biblia sido modificada ao longo dos séculos por uma elite no afã de se perpertuar
no poder e usá-la para seus objetivos egoístas? No processo de escrita e de copias
dos originais não teriam os monges copistas cometidos erros graves ao ponto de
comprometer a fidelidade das Escrituras? Como podemos saber?

Guia de Estudo: Após a leitura acima, reflita sobre os questionamentos e


responda, disponibilizando na sala virtual compartilhando com seus colegas.

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ESTRUTURA DA BÍBLIA

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CONHECIMENTO

Conhecer os aspectos relevantes da Introdução à Bíblia com ênfase na


organização da Bíblia e suas divisões, bem como no conceito de inspiração e
revelação.

HABILIDADE

Ser capaz de compreender e interpretar textos sobre o tema bem como ser
capaz de fazer exposição escrita, pública em eventos, palestras, seminário em
ambiente acadêmico e eclesiástico acerca do tema.

ATITUDE

Buscar desenvolver e exercitar capacidade reflexiva crítica acerca do objeto


estudado e incorporá-la na sua práxis.

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Peculiaridades de um Livro

Além da grande tiragem existente, há muitos outros detalhes que fazem da


Bíblia um livro incomum, ou, mais propriamente, um livro sem igual.

Vejamos algumas:

1) A Bíblia foi o primeiro livro impresso no ocidente por Johnnes Gutenberg


entre 1450 e 1455. Ela também foi o primeiro livro impresso em português,
no ano de 1487 na região do Algarve, Portugal.

2) Foi também o livro mais proibido, perseguido e que sofreu tentativas de


destruição em toda a história. Só à guisa de ilustração, em 303 d.C.,
Diocleciano decretou que cada cópia da Bíblia Cristã fosse queimada.
Presume-se que centenas, senão milhares de cópias tenham se perdido.
Por pouco não teríamos o Novo Testamento. Muitos foram mortos apenas
por possuir uma cópia parcial da Bíblia em seus lares.

3) Até mesmo a igreja foi contrária à divulgação bíblica. Em 1199 o papa


Inocêncio III proibiu a tradução da Bíblia para o vernáculo francês e decretou
que seria um perigo se a Bíblia fosse lida por pessoas simples do povo.
Quem fosse apanhado lendo ou ensinando a Bíblia na França seria morto.
Várias Bíblias foram queimadas a mando da Igreja.

4) Apesar de tantas destruições textuais, a Bíblia é o livro da antiguidade com a


maior quantidade de cópias manuscritas que se tem notícia. Enquanto a
Ilíada de Homero (o clássico com maior número de cópias preservadas)
conta com apenas 643 manuscritos, a Bíblia tem mais de 40 mil cópias se
incluirmos os textos em grego e hebraico, as traduções antigas e porções
preservadas antes da invenção da imprensa.

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5) A Bíblia é, sem dúvida, o livro mais controverso da história. Nomes de peso
como Emanuel Kant (1724-1804), Abraão Lincoln (1809-1865), Isaac
Newton (1643-1727) o amam e recomendam sem qualquer hesitação. Por
outro lado, nomes igualmente de peso o rejeitam e desprezam sua leitura.
Voltaire (1694-1778), Nietzsche (1844-1900) e Sartre (1905-1980) são
alguns deles. Seja como for, percebe-se que não é um livro
necessariamente dos menos intelectuais, pois embora haja mentes
brilhantes que o rejeitem, há outras que o amam profundamente.

6) Curiosamente o texto bíblico não se setoriza em apenas um grupo de


pessoas. Ele desperta o interesse e atende às necessidades de jovens,
adultos, crianças, cultos, iletrados, ricos, pobres. É a obra mais
ecleticamente social de toda a história – tanto do ocidente quanto do oriente.

7) Embora existam muitos livros de autoajuda ou reflexivos que tenham


mudado a mente de várias pessoas, nenhuma produção literária da história
modificou tantas vidas como a Bíblia Sagrada. Bêbados, traficantes,
prisioneiros, depressivos, suicidas potenciais, assassinos são apenas alguns
dos milhões e milhões ao longo da história que tiveram vida transformada
pelo contato com esse livro em particular.

Bruce Metzger (1987), eminente teólogo especialista em crítica textual do


Novo Testamento comenta que certa vez ouviu falar que a Bíblia poderia ser
comparada a uma piscina cheia de água. Uma piscina com uma parte tão rasa que
as crianças poderiam ficar em pé e outra tão profunda que um elefante poderia
nadar nela sem qualquer dificuldade. Pois bem, a Bíblia é um maravilhoso resumo
que contêm passagens em alguns casos bem densas e profundas. Mas, no geral,
se apresenta como um conteúdo simples o bastante para que qualquer um possa
por conta própria lê-la e entender os desígnios de Deus para cada pessoa.

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Nomes para a Palavra de Deus

Não encontramos nas Escrituras o nome “Bíblia”. Esse título foi usado pela
primeira vez em relação à Palavra de Deus, por João Crisóstomo, um patriarca e
reformador de Constantinopla (354-407 d.C.). O nome Biblia deriva de Byblos que
é o nome de uma importante cidade portuária da região dos fenícios que hoje fica
no Líbano. Foram os gregos que deram esse nome ao lugar, devido à sua
importância no comércio de papiro – um tipo de papel importado do Egito. Aliás
Byblos também era o nome que os gregos davam ao papel que os egípcios
preferiam chamar de “wadj”.

Pois bem, com a diferença de apenas uma letra, Byblos virou Biblos e
passou a significar “livro”. O diminutivo de livro em grego é Biblion que quer dizer
livrinho e o plural é Biblia que quer dizer “livrinhos”. Foi justamente por ser uma
coleção de pequenos livros que a Escritura Sagrada passou a ser chamada de
Bíblia, nome este que ficou até os dias de hoje.

Tudo indica que foi Crisóstomo, um autor cristão do IV século, que usou
pela primeira vez o nome Bíblia para se referir ao Antigo e Novo Testamento
(BRUCE, 1988). Contudo, há indícios de que já em 223 d.C., o título era vez ou
outra usado por seguidores do cristianismo para referirem-se aos escritos dos
apóstolos e, antes deles, judeus helenistas que viviam em Alexandria valiam-se da
expressão “ta bíblia” (os livrinhos) para indicar uma tradução grega do Antigo
Testamento normalmente conhecida como Septuaginta. Mais à frente você
conhecerá a história dessa tradução.

No contexto do judaísmo, a palavra Escritura Sagrada é preferível à


palavra Bíblia que eles têm como um apelido cristão. Eles também se valem muito
do termo Tanak que seria uma abreviatura de três palavras hebraicas, a saber:
Torá (lei), Neviim (profetas) e Ketuvim (escritos). Estas, por sua vez, representam
as três maiores divisões da Escritura, embora também seja comum referirem-se a

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ela como apenas a Torá ou a Lei e os Profetas. Esta divisão, aliás, já era
conhecida nos tempos do Novo Testamento, pelo que Jesus fez uso dela em
diversos momentos de seu ministério (cf. por ex. Mateus 7: 12; 11: 13; 22: 40;
Lucas 10:26; 16: 16, 17; 24:44; João 1: 45; 10:34).

A Bíblia está dividida em Antigo e Novo Testamento. Essa é uma


nomenclatura que não pode ser confundida, pois com o advento de uma cultura
tecnológica repleta de updates e novas versões, a expressão “antigo” ou “velho”
Testamento pode indicar algo obsoleto, sem valor para atualidade, fora de moda.
Contudo, não deve ser compreendido nesse sentido, pois toda a Palavra de Deus é
inspirada por Deus e útil para ensinar todos aqueles que creem.

O nome Antigo Testamento foi criado por Melito de Sardis em cerca de 170
d.C. para referir-se aos livros sagrados escritos antes da vinda de Jesus Cristo a
esse mundo e Novo Testamento, para os que foram escritos depois de sua vinda.
A primeira parte, portanto, seria uma espécie de prenúncio do Messias que haveria
de vir e a segunda um anúncio do Messias que veio e que voltará. A primeira conta
a história da criação e queda do mundo, mas se concentra na cidade de Israel, e
da aliança de Deus com Israel. Já a segunda concentra-se no ministério de Jesus e
na história da Igreja Cristã primitiva, e na aliança de Deus com a humanidade por
meio de Cristo.

Por que Antigo e Novo Testamento e não Antiga e Nova Escritura? É bem
verdade que, algumas das antigas versões gregas preferiam chamar essas
porções de Antiga e Nova Aliança. Mas, ao que tudo indica, os teólogos
consideraram que sendo a aliança ou o acordo de Deus com os homens algo que
demanda muito mais a ação divina que a ação humana, preferiram traduzir o termo
por testamentum que quer dizer justamente isso, um testamento que Deus em
pessoa deixou para nós. Uma herança em forma de livro (VOS 1915).

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Organização do Livro Sagrado

Como você pode ver na seção acima, não se trata na verdade de um livro,
mas de uma coleção de pequenos livros que juntos formam a famosa Bíblia
Sagrada. Eles foram escritos por aproximadamente 40 autores num período de
aproximadamente 1600 anos que vai do século XV a.C. ao final século I d.C.

Esses livros são normalmente referidos como o cânon bíblico ou o cânon


das Escrituras. Por esse nome (cânon) entenda a lista dos livros considerados
sagrados pela comunidade religiosa. E mais uma vez precisamos recorrer ao grego
para entender isso. É que cânon vem de “kanoni” que quer dizer “regra” ou “vara de
medir”. O termo foi então escolhido pelos cristãos para diferenciar livros sagrados
(ou canônicos) de livros comuns, mas alguns dizem que a ideia já vinha dos judeus
(ULRICH 2002).

O Cânon Hebraico contém 24 livros. Cada um era disposto num rolo de


pergaminho conforme o costume mais antigo. Já o Antigo Testamento, conforme
adotado pelo cristianismo, tem muito mais que isso e as razões não são difíceis de
entender. Primeiro porque os cristãos dividiram alguns dos livros que na versão
hebraica aparecem como um só volume. Por exemplo, Samuel, Reis e Crônicas
agora aparecem como I e II Samuel, I e II Reis e I e II Crônicas. O mesmo se dá
com Esdras e Neemias – originalmente um só livro – mas que hoje aparecem como
dois diferentes compêndios. E assim por diante.

Os nomes com os quais estamos mais acostumados a nomear os livros do


AT vêm do grego, através da titulação que aparece na Septuaginta, uma antiga
versão grega das Escrituras que será apresentada mais à frente. Já os judeus
costumavam chamar os cinco primeiros livros de Moisés a partir das duas primeiras
palavras que apareciam no texto. Assim, seus títulos hebraicos seriam:

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 Torá
Bereshit (No princípio...) (Gênesis)
Shemot (Os nomes...) (Êxodo)
Vayikra (E Ele chamou...) (Levítico)
Bamidbar (No deserto...) (Números)
Devarim (As palavras...) (Deuteronômio)

 NEVIIM (Profetas):
Yehoshua (Josué)
Shoftim (Juízes)
Shmuel (I & II Samuel)
Melakhim (I & II Reis)
Yeshayah (Isaias)
Yirmyah (Jeremias)
Yechezqel (Ezekiel)

 Os Doze (tratados como um livro)


Hoshea (Hosea)
Yoel (Joel)
Amos
Ovadiá (Obvadia)
Yoná (Jonas)
Mikhá (Micah)
Nachum
Chavakuk (Chabacuque)
Tzefanyá (Zephanias)
Chagai
Zecharia (Zacarias)
Malachi

 KETUVIM (Escritos):
Tehilim (Salmos)

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Mishlei (Provérbios)
Iov (Jó)
Shir Ha-Shirim (Cântico dos cânticos)
Ruth
Eichá (Lamentações)
Kohelet (nome do autor) (Eclesiastes)
Esther
Daniel
Ezra & Nechemyah (Nehemia) (tratado como um livro)
Divrei Ha-Yamim (As palavras dos diasdays) (Crônicas)

Além disso, existe uma discussão (mais à frente falaremos dela)


concernente aos chamados livros apócrifo ou deuterocanônicos. Trata-se de uma
coleção de livros que não faziam parte do cânon original da Bíblia Hebraica (e por
isso foram rejeitados pelos protestantes), mas que terminaram aceitos e incluídos
pelas igrejas Ortodoxa, Etíope e Católica.

Se colocássemos os livros da Bíblia numa estante de biblioteca eles


estariam assim organizados segundo a forma cristã:

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Figura 1

Como você pode ver pelo desenho acima, os cinco primeiros livros
(coloridos de marrom) foram escritos por Moisés e recebem o nome de Pentateuco.
Eles trazem a história do mundo desde a criação até à primeira parte da história do
povo hebreu e seu período de peregrinação no deserto, quando ainda não eram
uma nação propriamente dita. Isso vai desde as origens da humanidade até por
volta do século XIV a.C.

A seguir temos mais três livros (também em tom marrom) que narram
episódios ocorridos no tempo em que Israel se assentava na terra prometida e vivia
governado por Juízes e Sacerdotes. Já a coleção seguinte (em tom verde) dá
sequência à história contando uma nova fase administrativa em que Israel agora
era governado por reis. Essa fase foi interrompida pela tragédia do cativeiro da

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Babilônia que pôs fim à monarquia de Israel. Ambas as coleções são classificadas
como Livros Históricos e cobrem um período de aproximadamente 700 anos que
vai desde o século XIV até ao século VI a.C. (Ver figura 1)

Os três livros em cor bege (Esdras, Neemias e Ester) narram episódios


ocorridos após o cativeiro Babilônico, quando o povo já não tinha mais um rei e
lutava para reconstruir sua identidade nacional. Eles também fazem parte dos
Livros Históricos e podem ser situados no século V a.C.

A próxima coleção de cor vermelha poderia ser chamada de um parêntese


na cronologia dos fatos, pois traz uma coleção de músicas, poesias, drama e ditos
populares que narram a sabedoria do povo de Israel. Tanto é que os especialistas
costumam chamar essa coleção de Livros Poéticos ou Sabedoria. Um destaque
especial é a história de Jó, o homem que representa o sofrimento de todos os que
se sentem abandonados por Deus. (Ver figura 1).

Então a história dá um recuo para apresentar um conjunto especial de


livros chamados Proféticos. Trata-se da coleção de oráculos e episódios históricos
envolvendo homens que tiveram o dom de profecia e exortaram Israel e outros
povos a voltarem-se para Deus especialmente nos tempos da monarquia e no
período pós-cativeiro. Note que eles estão divididos em dois grupos identificados
por dois tons de azul. ( Conferir figura 1)

Os primeiros quatro livros (Isaías, Jeremias, Lamentações e Ezequiel) são


– devido ao seu volume de conteúdo literário – chamados profetas maiores e os
demais (que na bíblia hebraica aparecem como um só livro), profetas menores. O
livro de Daniel – que aqui aparece no grupo dos profetas menores – é um caso à
parte. Os cristãos o reconhecem como profeta, mas no meio judaico ele é
reconhecido apenas como um homem sábio, não como um profeta. Embora, a bem
da verdade, os sábios do Talmude eram divididos quanto a isso e Jesus chamou a
Daniel de profeta (MATEUS 24:15).

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O Talmude é uma coleção de 63 tratados judaicos envolvendo assuntos religiosos,
legais, éticos e históricos compilados por antigos rabinos. Ele foi publicado no V
século d.C. na Babilônia onde viviam muitos judeus. É a mais importante coleção
de leis e interpretações do judaísmo seguida até hoje pelos judeus ortodoxos.
Veja Halachot Gedolot Capítulo 76; Seder Olam Rabbah, capítulo 20; Comentário
do Rabino Shlomo Ytizchaki Rashi ao Megillah, ibid.

Eis a seguir um esquema cronológico dos livros do AT em relação à


história que eles relatam.

Figura 2

Observando essa seção de estudos temos então as coleções que formam


o Novo Testamento. Os quatro primeiros livros em amarelo são os evangelhos que
narram a vida e o ministério de Jesus Cristo. A seguir temos, isolado dos demais, o
livro de Atos que conta a história da Igreja Cristã primitiva com destaque para o
ministério do apóstolo Paulo. (Ver figura 1)

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A longa coleção como mostra a (Figura 1) – dividida em dois tons de verde
– são as cartas ou epístolas cristãs. As treze primeiras são atribuídas à autoria de
Paulo e, por isso, chamadas Epístolas Paulinas. As demais são conhecidas como
epístolas universais e foram escritas por outros autores.

Epístola vem do grego antigo e significa uma espécie de carta especial enviada a
um amigo ou a uma comunidade em particular, tratando de assuntos políticos,
filosóficos, morais ou teológicos.

Um caso especial é quanto a Hebreus. Os autores ainda estão divididos


quanto à sua autoria, se ela pertence ou não à pena do apóstolo Paulo. Há quem
diga que ela nem pode ser considerada uma epístola, mas que seria antes um
sermão ou tratado teológico baseado nos ensinamentos de Paulo. Seja como for,
ainda que a autoria não seja diretamente paulina, o conteúdo certamente é.

Finalmente, o último livro em roxo é o Apocalipse, cujo conteúdo traz


revelações dadas por Deus ao apóstolo João para mostrar os eventos que
ocorreriam no mundo e na história da igreja desde os dias apostólicos até à
segunda vinda de Cristo e a restauração de todas as coisas no paraíso restaurado
por Deus. (Ver fiura 1)

Livro por Livro

A Bíblia demorou muitos anos para atingir a forma e o conteúdo que hoje
conhecemos. Ela começou a ser escrita no século XV a.C. e terminou no final do I
século d.C. Logo foram mais de 1.400 anos de produção efetuada por certa de 40
diferentes autores.

O AT foi escrito na região de Israel, na Babilônia (onde o povo judeu ficou


exilado), no Egito e na Pérsia. Já o NT foi escrito em Israel, Síria, Ásia Menor,

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Roma (Itália) e partes da moderna Grécia e Turquia (que faziam parte do antigo
Império Romano).

A maior parte dos Livros do AT foi escritos em Hebraico, com algumas


poucas sessões em Aramaico e o NT foi todo escrito em grego koiné – uma versão
popular do grego clássico falado na antiga Grécia.

Uma vez apresentada a organização da Bíblia em livros e a lógica por


detrás desta listagem, seria interessante conhecer um pouco de cada livro, sua
origem, seus propósitos, possível data e autoria e o significado de seus títulos.
Algumas autorias e datas serão hipotéticas, pois se baseiam na tradição judaica.
Outros já são mais seguros de serem classificados. Igualmente as datas são
aproximadas e remontam a quando o livro começou a ser redigido. Alguns, no
entanto, demoraram décadas para assumir a forma que estão hoje. É o caso de
Isaías e Daniel que começaram a ser escritos quando os respectivos profetas ainda
eram jovens e terminaram quando já eram avançados em anos.

Antigo Testamento

 Pentateuco ou Torá – Torá, como já foi dito, significa Lei e refere-se,


normalmente, aos cinco primeiros livros escritos por Moisés. Pentateuco é o
nome grego da mesma coleção e quer dizer “cinco rolos” ou “cinco livros”.

Livro Significado Conteúdo Data e Autoria


Gênesis Origem Este livro mostra Moisés – ca.
a história desde a 1450 a.C.
criação e queda
do ser humano
até a entrada dos
filhos de Jacó
para viverem no
Egito.
Êxodo Saída Como Deus livrou Moisés – ca.
os hebreus da 1450 a.C.
escravidão no
Egito e fez uma
aliança com eles.
Levítico Nome de uma Leis e Moisés – ca.

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das tribos de regulamentos 1450 a.C.
Israel acerca do oficio
no santuário.
Números Relativo so censo Censo do povo Moisés – ca.
do povo hebreu hebreu 1450 a.C.
promovido
durante sua
caminhada pelo
deserto
Deuteronômio Repetição das Moisés pronuncia Moisés – ca.
leis três discursos de 1450 a.C.
despedida antes
de morrer. Neles
recapitulou com o
povo as leis
dadas por Deus

 Livros históricos

Josué Nomeado Viória dos Josué (24.26) e


segundo o autor israelitas sobre outros autores
principal seus inimigos (24.29-33). Ca.
cananeus. 1350 a.C.
Distribuição das
tribos na terra
prometida.
Juízes Juízes Os istaelitas Samuel (?) ca.
tomam atitudes 930 a.C.
que quebram seu
pacto com Deus.
O Senhor, então,
manda juízes
para livra-los de
povos inimigos
Rute Nomeado Narra a história Samuel (?) ca.
segundo a dos ancestrais do 960 a.C.
personagem rei Davi.
principal
Samuel I e II Nomeado Começos da
Samuel; Natã e
segundo autor Monarquia em
Gade ( 1 Cr
principal Israel 29.29) ca. 900
a.C.
Reis I e II Reis História da Jeremias
monarquia unida (segundo a
e dividida de tradição e o
Israel Talmude) Esd
1:1; 2 Cr
36:22 ca. 600

27
a.C.
Crônicas I e II Relatos História da Esdras (segundo
Monarquia de a tradição) 450
Saul à chegada a.C.
de
Nabucodonosor
Esdras Nomeado Restauração de Esdras (porque
segundo o autor Judá na terra de muito se fala dele
Canaã na primeira
pessoa) ca. 450
a.C.
Nemias Nomeado Recnstrução de Neemias
segundo o Jerusalém (segundo a
personagem tradição) ca. 450
principal a.C.
Ester Nomeado Uma história de Mardoquel (?)
sengundo a heroísmo e cerca de 500 a.C.
personagem libertação dos
principal judeus durante o
governo da
Pérsia

 Livros Poéticos

Jó Nomeado Uma das mais Moisés (segundo


segundo o antigas a tradição) ca.
personagem teodiceias 1450 a.C.
principal lidando com o
problema do mal
e do sofrimento
humano.
Salmos Derivado de Coletânia de Vários
Psalterion um hinos do povo
instrumento judeu.
musical de
cordas
Provérbios Provérbios Coletânea de Salomão
ditados de (segundo a
sabedoria tradição) (1 Rs
4.29-34; 10.24), Pv
1.1, Mais poemas de
Agur (cap. 30),
Lemuel (cap. 31).
Foram compilados
pelos escribas de
Ezequias (25.1).960
a.C.
Eclesiastes Pregador Meditação sobre Salomão
o significado da (segundo a
contingência tradição) ca. 960
desta vida. a.C.
Cantares Cânticos Este poema Salomão

28
descreve o gozo e (segundo a
o êxtase do amor. tradição) 960 a.C.
Simbolicamente
tem sido aplicado
ao amor de Deus
por Israel

Livros Proféticos

 Profetas maiores – Os profetas maiores são a coletânea de profecias mais


extensas. Assim o termo “maior” efere-se ao tamanho ou ao tempo em que
tais profetas permaneceram profetizando.

Isaías Segundo o O profeta Isaías trouxe a Isaías ca. 700


autor mensagem do juízo de a.C.
deus às nações, anunciou
um rei futuro, à
semelhança de davi, e
prometeu uma era de paz
e tranquilidade.
Jeremias Segundo o Muito antes da destruição Jeremias ca.
autor de Judá pela 587 a.C.
Babilônia, Jeremias
predisse o justo juízo de
deus. Embora sua
mensagem seja
majoritariamente de
destruição, Jeremias
também falou do novo
pacto com Deus.

Lamentações Segundo o Tal qual Jeremias havia Lamentações


autor predito, Jerusalém caiu ca. 600 a.C.
cativa da Babilônia. Este
livro registra cinco
"lamentos" pela cidade
caída.
Ezequiel Segundo o A mensagem de Ezequiel Ezequiel ca.
autor foi dada aso judeus 700 a.C.
cativos da
Babilônia. Ezequiel usou
histórias e parábolas para
falar do juízo, da
esperança e da
restauração de Israel.
Daniel Segundo o Daniel se manteve fiel a Daniel ca. 600
autor Deus, mesmo a.C.

29
enfrentando muita
pressões quando cativo
na Babilônia. Este livro
inclui as visões proféticas
de Daniel.

 Profetas menores – São os doze últimos livros do AT, assim conhecidos


por seu pequeno volume literário.

Oseas Segundo o Oséias se vale de sua Oseas 750


autor experiência conjugal, em a.C.
que ele era dedicado à
sua esposa, mesmo
sabendo que ela era infiel,
para ilustrar o adultério
que Israel tinha comentido
contra Deus e para
mostrar como o fiél amor
de Deus pelo seu povo
nunca muda.
Joel Segundo o Depois de uma praga de Joel 800 a.C.
autor gafanhotos, Joel
admoesta o povo para
que se arrependa.
Amós Segundo o Durante um tempo de Amós 760
autor properidade, este profeta a.C.
de Judá pregou aos ricos
líderes de Israel sobre o
Juízo de Deus; insistia em
que pensassem nos
pobres e oprimidos, antes
de pensarem em sua
própria satisfação.
Obadias Segundo o Obadias profetizou o juízo Obadias 586
autor sobre Edom, um país a.C.
vizinho de Israel.
Jonas Segundo o Jonas não queria pregar Jonas 760
autor para a gente de Nínive, a.C.
que era inimiga de seu
próprio país. Quando,
finalmente levou a
mensagem enviada por
Deus, seus habitantes se
arrependeram.

Miqueias Segundo o A mensagem de Miquéias Miqueias ca.


autor para Judá era de juízo, 700 a.C.
invés de perdão,
esperança e

30
restauração. Especialme
nte notável é um versículo
em que resume o que
Deus requer de nós (6:8).
Naum Segundo o Naum anunciou que Deus Naum 612.C.
autor destruiria o povo de
Nínive por sua crueldade
na guerra.
Habacuque Segundo o Este livro apresenta um Habacuque
autor diálogo entre Deus e 600 a.C.
Habacuque sobre a
justiça e o sofrimento.
Sofonias Segundo o Este profeta anunciou o Sofonias 630
autor dia do Senhor, que trazia a.C.
juízo a Judá e às nações
vizinhas. Esse dia, que
haveria de vir seria de
destruição para muitos,
mas um peueno
remanescente, sempre fiel
a Deus, sobreviveria para
abençoar o mundo inteiro.
Ageu Segundo o Depois que o povo voltou Ageu 520 a.C.
autor do exílio, Ageu o
admoestou para que
dessem prioridade a Deus
e reconstruíssem em
primeiro lugar o templo,
mesmo antes de
reconstruírem suas casas.
Zacarias Segundo o Como Ageu, Zacarias Zacarias 520
autor instou o povo a a.C.
reconstruir o templo,
assegurando-lhes ajuda e
benção de Deus. Suas
visões apontavam para
um futuro brilhante.
Malaquias Segundo o Após o retorno do exílio, o Malaquias
autor pov voltou a descuidar de 450 a.C.
sua vida
religiosa. Malaquias
passou a inspirá-los
novamente, falalndo-lhes
do "Dia do Senhor".

Novo Testamento

 Evangelhos – Os Evangelhos são ainda divididos em duas partes: primeiro


vêm os chamados “Evangelhos Sinóticos”, isto é, evangelhos oriundos de

31
uma só ótica. Depois, em separado, vem o Evangelho de João que segue
um estilo e fontes próprias.

Mateus Segundo o autor Este evangelho cita Mateus ca. 60


muitos textos do d.C.
velho
Testamento. Ele se
destinava
primordialmente ao
público como o
Messias prometido
nas Escrituras do
Velho
Testamento. Mateus
narra a história de
Jesus desde seu
nascimento até sua
ressureição e põe
ênfase especial nos
ensinamentos do
Mestre.
Marcos Segundo o autor Marcos escreveu um Marcos ca. 50
Evangelho curto, d.C.
conciso e cheio de
ação. Seu objetivo
era aprofundar a fé e
a dedicação da
comunidade para a
qual ele escrevia.
Lucas Segundo o autor Neste Evangelho é Lucas ca. 60 d.C.
enfatizado como a
salvação em Jesus
está ao alcance de
todos. O evangelista
mostra como Jesus
estava em contato
com as pessoas
pobres, com os
necessitados e com
os são desprezados
pela sociedade.
João Segundo o autor O Evangelho de João Ca. 96 d.C.
João, pela sua
forma, se coloca à
parte dos outros
três. João organiza
sua mensagem
enfocando sete
sinais que apontam
para Jesus como

32
Filho de Deus. Seu
estilo literário é
reflexivo e cheio de
imagens e figuras.

 Atos – esse é o único livro do gênero no Novo Testamento. Ele conta a


história original do inicio da Igreja Cristã com ênfase no trabalho de Paulo.

Atos Segundo o Um relato dos Lucas ca. 65 d.C.


conteúdo eventos da
história e da
ação da igreja
Cristã primitiva,
mostrando
como a fé se
propagou no
mundo
mediterraneo de
então.

 Cartas de Paulo – a coleção de cartas ou epístolas chamadas paulinas


compreende um total de treze correspondências que Paulo teria enviado às
igrejas por ele fundadas na Ásia Menor. A ordem que se encontram no NT
não correspondem à data em que foram escritas. Elas foram organizadas
não cronologicamente, mas de acordo com sua extensão.

Teólogos liberais têm colocado em dúvida a autoria paulina de várias


cartas atribuídas ao apóstolo. Com base nesta compreensão, eles dividem assim
essa parte do Novo Testamento:

1 – Cartas proto-paulinas: são as cartas que seguramente teriam sido


escritas por Paulo. São elas: Romanos, I e II Coríntios, Gálatas, Filipenses,
I Tessalonicenses e Filemon.

2 – Cartas deutero-paulinas: são aquelas cuja não é segura ou é negada


por certo número de teólogos. A saber: Efésios, Colossenses e II
Tessalonicenses.

33
3 – Cartas trito-paulinas: epístolas que, segundo alguns comentaristas,
dificilmente seriam do apóstolo Paulo, pois usam uma linguagem diversa e
tratam de problemas que existiam nas comunidades no final do I Século.

Hebreus ainda é um caso à parte. Alguns exegetas chegam a dizer de


maneira bem humorada que a epístola de Paulo aos hebreus não é epístola, não é
de Paulo e não é aos hebreus. Contudo, ainda que assim seja, seu conteúdo e sua
teologia são profundamente paulinas pelo que podemos, sem cometer um grande
equívoco, situá-la entre o chamado corpus paulinum.

Outro aspecto interessante é o de que as cartas não foram escritas do


próprio punho do apóstolo. Ele as ditava (cf. Rom 16:22) e às vezes assinava (cf.
Gal 6:11). Talvez a carta a Filemon tenha sido o único escrito com sua própria mão.

Neste módulo adotamos a apresentação mais conservadora que aceita


como autênticas as cartas tradicionalmente atribuídas a Paulo – acrescida da carta
aos hebreus. As datas são igualmente hipotéticas. Sendo assim, esta é a divisão
que propomos:

1 – Cartas maiores: Romanos, I e II Coríntios, Gálatas e I e II


Tessalonicenses.

2 – Cartas da prisão (escritas quando Paulo estava preso em Roma):


Efésios, Filipenses, Colossenses e Filemon.

3 – Cartas pastorais: I e II Timóteo e Tito.

Romanos Segundo o Paulo escreve Paulo, 58


destinatário aos romanos d.C.
sobre a vida no
Espírito, que é
dada pela fé aos
que crrêm em
Cristo. O
apóstolo
reafirma a
grande bondade
de Deus e
declara que,
atavés de Jesus
Cristo, Deus nos

34
aceita e nos
liberta de
nossos pecados
I e II Coríntios Segundo o Uma análise Paulo, 57
destinatário dos problemas d.C.
enfrentados
pela igreja de
Corinto.
Discenção,
imoralidade,
problemas
quanto a forma
da adoração
pública e
confusão sobre
os dons do
Espírito. Paulo
escreve sobre
as dificuldades
que alguns
falsos profetas
haviam trazido
ao seu
ministério.
Gálatas Segundo o A liberdade da Paulo, 57
destinatário pessoa que crê d.C.
em Cristo com
respeito à
Lei. Paulo
declara que é
somente pela fé
que as pessoas
são
reconciliadas
com Deus.
Efésios Segundo o O tema central Paulo, 63
destinatário desta carta é o d.C.
propósito eterno
de Deus: Jesus
Cristo é a
cabeça da
igreja, que é
formada a partir
de muitas
nações e raças.
Filipenses Segundo o A enfase desta Paulo 64
destinatário carta está no d.C.
gozo que o
crente em Cristo
encontra em
todas as

35
circunstâncias
da vida.
Colossenses Segundo o o apóstolo Paulo 63
destinatário Paulo conclama d.C.
aos cristão de
Colossos que
abandonem
suas
superstições e
tomem a Cristo
como o centro
de sua vida.
I e II Segundo o O apóstolo Paulo 49 e
Tessalonicenses destinatário Paulo dá 52 d.C.
orientações aos
cristãos de
Tessalonica a
respeito do
estado dos
mortos e da
segunda vinda
de Cristo.
I e II Timótes Segundo o Estas cartas Paulo, 63
destinatário serviram de d.C.
orientação a
Timóteo, um
jovem líder da
igreja
primitiva. O
apóstolo Paulo
lhe dá
conselhos sobre
a adoração, o
ministério e os
relacionamentos
dentro da igreja.
Tito Segundo o Tito era ministro Paulo 64
destinatário em d.C.
Creta. Nesta
carta Paulo o
orienta sobre
como ajudar os
novos cristãos.
Filemon Segundo o Filemon é Paulo 63
destinatário instado a d.C.
perdoar seu
escravo
Onésimo que
havia
fugido. Filemon
deveria aceitá-lo

36
de volta como a
um amigo em
Cristo.
Hebreus Segundo o Nesta carta, o ?, 62 d.C.
destinatário autor exorta os
novos cristãos a
não observarem
mais os ritos
cerimoniais do
judaismo, pois,
em Cristo, eles
já foram todos
cumpridos.

 Epístolas universais – Tratam-se de cartas inspiradas, mas que não foram


escritas por Paulo. Elas são chamadas de universais, gerais ou católicas
por que são dirigidas às comunidades cristãs como um todo. Cada uma foi
nomeada de acordo com seu autor.

Tiago Segundo o autor Irmão do Senhor Tiago ca. 49 d.C.


Jesus, este Tiago
foi apedrejado
até a morte,
pastor da igreja
em Jerusalém.
Sua carta é para
encorajar os
crentes que
punham sua fé à
prova exortar e
instruí-los
concernentes ao
resultado da fé,
na vida de
retidão e boas
obrasTiago
aconselha os
cristãos a
viverem na
prática sua fé e,
além disso,
oferece idéias
sobre como isso
pode ser feito.
I e II Pedro Segundo o autor Estas cartas Pedro ca. 60 d.C.
foram escritas
para confortar os
cristãos da igreja
primitiva que

37
estavam sendo
perseguidos por
causa de sua fé.
Nelas, Pedro
adverte os
cristãos sobre os
falsos mestres e
os estimula a
continuarem
leiais a Deus.
I, II e III João Segundo o autor A primeira carta João ca. 90 d.C.
explica deste
corpus traz
verdades básicas
sobre a vida
cristã com enfase
no mandamento
de amarem uns
aos outros. A
seguir, temos
outra carta
dirigida à
"senhora eleita e
aos seus filhos".
Nela o autor
adverte os
cristãos quanto
aos falsos
profetas.
Finalmente, em
contraste com
sua segunda
carta, esta fala da
necessidade de
receber os que
pregam a Cristo.
Judas Segundo o autor Judas (que não é Judas ca. 65 d.C.
o apostolo que
traiu o senhor),
possivelmente
outro irmão de
Jesus e de Tiago.
Ele adverte seus
leitores sobre a
má influência de
pessoas alheias
à irmandade dos
cristãos.

38
Apocalípse – este é outro escrito de característica única na coleção de textos do
NT. Ele segue as características de um tipo de literatura chamada apocalíptica,
relativamente comum entre os judeus. É uma forma distinta de fazer profecias.

Apocalipse Nomeado Foi escrito para João 90 d.C.


segundo o estilo. encorajar os
cristãos que
estavam sendo
perseguidos e
para firmá-los na
confiança de que
deus cuidará
deles. Usando
símbolos e
visões, o escritor
ilustra o triunfo do
bem sobre o mal
e a criação de
uma nova terra e
um novo céu

A palavra “católica” embora hoje designe o nome do maior ramo eclesiástico do


cristianismo, tinha outro sentido no passado. Ela vem do grego katholikos com o
sentido de “geral” ou “universal”. É esse o sentido usado em relação às epístolas
não paulinas do NT.

Geografia dos Eventos Bíblicos

No mapa abaixo temos a abrangência geográfica dos eventos


mencionados na Bíblia, indicando a localidade onde os mesmos tiveram lugar.
Como você pode ver, embora Deus tenha escolhido os judeus para revelar sua
Palavra profética, a revelação não ficou restrita aos limites de Israel.

<arte>

39
Figura 3

Uma coletânea de histórias

É muito interessante observar que a Bíblia é antes de tudo um livro de


histórias e também um livro histórico. Ou seja, não se trata de uma coleção de
lendas como as mitologias gregas ou as fábulas de Isopo e La Fontaine. Os
episódios descritos são reais e tiveram seu lugar na história.

Ao invés de inspirar os profetas a escreverem um tratado filosófico sobre a


divindade, a Providência preferiu dar aos homens um livro que narra a história de
Deus em meio à história da humanidade. Por isso, não seria errado chamar a Bíblia
de “uma história de Deus”, embora, é claro, sendo um ser eterno, o Altíssimo não
possa ser confinado aos limites de uma biografia.

Existem cinco vantagens básicas em se descrever a Deus através de uma


história de suas ações:

40
1- Todos geralmente gostam de histórias. Adultos, crianças, iletrados ou
eruditos e todos têm facilidade para reproduzir pelo menos a essência de
seu conteúdo. Assim fica mais fácil, às gerações que se seguem, transmitir o
conteúdo da revelação divina.

2- Histórias dão um fundamento racional e evidenciável para a mensagem que


se pretende transmitir. Ou seja, se a história que a Bíblia apresenta for
verdadeira ela será verificável e a Teologia que se assenta nesta história
também o será. Logo, é possível verificar sua legitimidade. Mesmo, é claro,
que jamais possamos provar ou explicar com critérios humanos eventos
como, por exemplo, a ressurreição de Cristo dentre os mortos.

3- Histórias reais costumam deixar traços em todas as culturas que


testemunharam seu acontecimento. Logo, pressupondo que as bases
históricas da Bíblia (a criação, a queda humana, o dilúvio etc) sejam eventos
de repercussão universal, é de se esperar que outras culturas fora da Bíblia
também façam menção deles e isso permite que mesmo povos que não
tiveram contato direto com a revelação escriturística possam ter algum
acesso, por mínimo que seja, às verdades ali apresentadas.

4- Quando uma história é boa, as pessoas tendem naturalmente a transmiti-la


para outros. É como uma boa piada que mesmo quem não é muito
engraçado arrisca repeti-la na esperança de que outros riam também.

5- Finalmente, recontar uma história passada traz consigo a vantagem de


repetir emocionalmente o evento como se o mesmo estivesse mais uma vez
acontecendo diante dos nossos olhos. Isso ajuda na preservação do fato e
da mensagem que ele contém.

41
Um livro perigoso

A Bíblia traz sobre si uma reinvindicação muito séria que, se for verdadeira,
faz dela o livro mais importante de todos os tempos e se for mentirosa o mais
terrível que a humanidade já produziu. Ela diz que é de origem divina: “Toda a
Escritura é inspirada por Deus e proveitosa para o ensino, para a repreensão, para
a correção e para a instrução na justiça” (II Tim. 3:16). Por isso o escritor George
Bernard Shaw estava de certo modo correto quando chamou a Bíblia de “o livro
mais perigoso do mundo”.

Afinal de contas, um livro que se declara vindo de Deus só pode ser


creditado a dois fatores: histerismo ou inspiração. Seja qual for a alternativa
adotada, é impossível ficar neutro em relação a ele, principalmente nós que
vivemos no ocidente. Ou ela é inteiramente absoluta ou incrivelmente obsoleta.

Imagine agora que a Bíblia nunca houvesse sido escrita? Ou preservada


até nossos dias? O que teria acontecido? Uma resposta precisa é difícil de ser
dada, mas James Kennedy e Jerry Newcombe lançaram-se ao desafio de
encontrar uma resposta. Eles escreveram juntos o livro What If the Bible Had never
Been Written? (E Se a Bíblia nunca houvesse sido escrita?) e concluíram que
praticamente todos os grandes exploradores, cientistas, escritores, artistas,
políticos e educadores do ocidente foram tão influenciados por este livro que sem
ele esses homens jamais teriam feito as contribuições que fizeram.

Exagero? Difícil dizer. Mas pelo menos uma coisa pode ser dita e que
calaria muitos que consideram a Bíblia um livro sem significado positivo. Dizem que
certa vez um antropólogo descrente da Bíblia estava entrevistando o missionário
Kata Ragoso, da nova Guiné. Em uma de suas perguntas ele insinuou o que o
nativo achava de ter sua cultura terrivelmente modificada pelos hábitos trazidos por
esse livro de brancos. Era realmente um motivo de agradecimento?

42
Se é motivo para eu agradecer, não sei – respondeu Ragoso – mas para
você deveria ser, caso contrário eu o estaria agora cozinhando para o meu almoço
conforme o costume de meus ancestrais que praticavam canibalismo!

Imagine agora os milhares, milhões de pessoas, que tiveram sua vida


mudada para melhor por causa da leitura deste livro chamado Biblia Sagrada! É
claro que houve muitos outros clássicos que trouxeram benefícios para a
humanidade, mas nenhum deles transformou diretamente tantas multidões de
diferentes níveis sociais e culturais. Tome por exemplo um livro como O Capital de
Karl Marx. Ele realmente influenciou muito os rumos da economia moderna, mas
quantos presidiários poderiam ser citados que deixaram o mundo do crime por
terem lido os escritos de Marx? Quantos assassinos se arrependeram de seus
crimes e mudaram de vida por terem lido os pensamentos do marxismo? Quantas
pessoas tiveram uma morte mais tranquila porque em seu leito um amigo leu
trechos sobre a dialética e a luta de classes?

Isso mostra que o mundo pode estar repleto de bons e excelentes livros,
mas só a Bíblia pode se dizer inspirada. E o que significa essa palavra
“inspiração”?

De um modo bastante simplificado podemos dizer que inspiração significa


“que vem diretamente de Deus”, isto é, que tem origem divina. Em latim, esse
termo significa “soprar para dentro”, assim como um adulto faz ao insuflar um balão
de ar. Seria também essa a imagem figurativa de Deus soprando o Espírito na
mente de uma pessoa. Em seu correspondente grego, esse termo só aparece uma
vez no Novo Testamento nesta passagem de II Timóteo 3:16.

Ali, ele vem da junção de duas palavras gregas Theos (que quer dizer
Deus) e Pneustos (que quer dizer sopro, espírito). Logo, algo que foi soprado por
Deus, ou simplesmente “inspirado” por ele – o mesmo sentido da versão latina.

43
Inspiração e revelação

Quando Paulo diz que toda Escritura é inspirada por Deus, está
evidentemente fazendo referência à já mencionada coleção de livros sagrados que
ele conhecia em sua época, a saber: a Lei, os Profetas e os Salmos conforme
vimos em Lucas 24:44. Todos vieram de Deus e para os cristãos ambos (Antigo e
Novo Testamentos) são considerados Escrituras (I Cor. 2:10-13; I Timóteo 5:18; II
Pedro 3:15-16).

Isso nos leva a entender que a inspiração envolve, via de regra, um agente
humano usado por Deus. É, noutras palavras, a operação divina que toma conta do
autor sagrado, esclarecendo-o, guiando-o, assistindo-o na execução de sua tarefa.
Foi isso que o autor de Hebreus quis dizer ao afirmar que Deus falou nos tempos
antigos aos pais pelos profetas (Heb 1:1). Mas como se dava esse processo?

Veja essa declaração de Davi em 2ª Samuel 23:2: “O Espírito do Senhor


fala por meu intermédio”. Somando o que foi dito com essa declaração de Davi,
podemos concluir que a Bíblia é um livro divino, mas não caiu pronto do Céu. Ela
foi se formando ao longo do tempo, admitiu rascunhos, contextos, pequenas
edições. Para que a Bíblia se concretizasse, o Espírito Santo Se serviu de
instrumentos que eram humanos e que conservavam a respectiva personalidade, o
caráter, talento e gênio, os hábitos intelectuais e poderes de estilo típicos de sua
época. Deus não violentou nem destruiu as faculdades daqueles que escolheu para
transmitir sua mensagem. O autor continuava sendo um ser humano com suas
pecualiaridades e seu próprio modo de pensar. É claro que Deus não permitiria à
humanidade do profeta intervir de modo a prejudicar o conteúdo da revelação. Não
obstante, é notório, por exemplo, que homens simples como Pedro e João
escreveram de modo simples, com vocabulário reduzido e expressões mais
simplórias, bem diferente de Salomão ou Paulo com toda a erudição que lhes dizia
respeito. Por isso a carta aos Romanos é muito mais primorosa e repleta de figuras
literárias que o discurso de Pedro expresso no livro de Atos capítulo 3.

44
De acordo com o que a própria Bíblia nos dá a entender, com a história de
Gênesis capítulos 1 a 3, não era plano original de Deus usar um livro para se
comunicar com os seres humanos. Ao que tudo indica, Adão e Eva tinham franca
comunhão com seu Criador e, possivelmente, outros agentes celestiais.

Mas a entrada do pecado causou uma ruptura entre criatura e Criador (Isa.
59:2). O Senhor agora tinha de usar outros meios de se comunicar com o ser
humano e a revelação nos indica alguns deles:

 1 – anjos vindos em forma humana (Zac. 1:9; Luc. 1:11, 18, 19).
 2 – visões (Daniel 7:2; Apoc. 1:19)
 3 – sonhos (Números 12:6; Gênesis 37:5 e 9).
 4 – a impressão do Espírito Santo (II Pedro 1:21; II Sam. 23:11 e 12).
 5 – as obras da natureza (Romanos 1:20; Col. 1:13-18)
 6 – revelações especiais feitas até por quem não é profeta (Mateus 27:19)

Algumas destas formas de comunicação divina podem ocorrer ainda em


nossos dias. Mas a providência não as considerou o canal mais seguro para
garantir a preservação dos oráculos celestiais, por isso o Senhor resolveu escolher
alguns em especial para que fossem usados como escritores inspirados por ele
para produzirem o seu livro especial – inspirado e autenticado pelo próprio Espírito
de Deus. Esse livro conteria a revelação especial de Deus dada aos homens.

A Bíblia diz que os que foram eleitos para a tarefa de produzir a Bíblia eram
“movidos pelo Espírito Santo de Deus” (II Pedro 1:21), logo, as palavras,
expressões, concatenação das ideias poderiam até ser humanas mas a autoria em
última instância pertencia a Deus. O teólogo alemão Karl Rahner (1961) encontrou
um modo interessante de explicar esse fenômeno. Ele percebeu que o termo latino
“autor” para designar Deus como autor das escrituras poderia ser um tanto dúbio,
então, ele se lembrou que em alemão você pode falar de alguém como autor
literário (Verfasser) ou como como originador de um livro (Urheber). Assim,
segundo Rahner, Deus originou os livros sagrados, isto é, propiciou que fossem
produzidos, mas não os escreveu no sentido de que ditou suas palavras ou utilizou-

45
se do profeta como se fosse uma máquina de escrever ou um teclado de
computador ele inspirou os pensamentos e ensinos na mente de seus servos, mas
a linguagem e as imagens usadas eram do próprio profeta em meio à cultura e
cosmovisão em que ele estava.

Os agentes humanos poderiam, portanto, se valer de pesquisa,


depoimento de testemunhas, descrição de eventos e até material que não fosse
inspirado (Lucas 1:1-4). Todos esses métodos, no entanto, tinham a direção do
Espirito Santo a fim de que o lado humano não afetasse a essência daquilo que
Deus intentava transmitir (João 16:13 cf. Apoc. 22:19).

É interessante definir a palavra profeta que vem originalmente do mundo


grego para referir-se ao que fala algo em lugar de uma autoridade espefialmente
divina ou sobrenatural. Por isso ele pode em algumas vezes dar uma advertência,
revelar uma situação ou ainda antever acontecimentos futuros.

Varios povos, além dos judeus, diziam possuir mensageiros com dom
profético, entre eles estavam os mulçumanos, os sibilinos e os gregos, dentre
outros. No caso bíblico, a orientação é checar se um profeta vem ou não de Deus
pois assim como há verdadeiros profetas também há falsos líderes dizendo-se
inspirados por Deus quando na verdade não receberam nenhuma mensagem do
Altíssimo (cf Deut 18:20-22; Mat 7:15-20; Rom 16:17-18; I Tes. 5:20-21)

REFLETINDO: Como podemos reconhecer um falso profeta? Estudando a Bíblia.


Se alguém prega algo que vai contra a Bíblia, é falso profeta. Também é importante
ver se a profecia se cumpre. Se não acontecer, é porque veio da imaginação da
pessoa, não de Deus.

Por isso, é possível dizer que a Escritura também tem característica


autoritativa. Ela não pode ser desrespeitada (João 10:35), nem violada sem

46
consequências (Mateus 5:17-20). Ela vem de Deus (Mateus 22:31; II Pe 1:18-20).
Foi revelada e inspirada por ele.

Os termos “inspiração” e “revelação” são muitas vezes empregados


indistintamente, por exprimirem apenas aspectos diferentes da mesma verdade
grandiosa.

As Escrituras podem, em resumo, ser definidas como uma produção


literária feita por escritores inspirados, contendo uma série de revelações de Deus
feitas ao ser humano.

Revelação bíblica é Deus tornar conhecido Seus pensamentos, Suas


intenções, Seus desígnios, Seus mistérios (Isa 55:8-9; Rom 11:33-34; Apoc 1:1).

Considerando que existe um Deus que transcende o universo, é razoável


supor que esse mesmo Deus se revele às suas criaturas numa linguagem que elas
possam compreender. Caso contrário, ficaria sem sentido a comunicação
divino/humana o conhecimento do altíssimo permaneceria uma utopia. A Bíblia é a
mensagem de Deus posta em palavras humanas, porque ele resolveu revelar-se à
humanidade para que essa mesma humanidade compreenda suas verdades. A
Escritura, pois, tem que ver mais com o conteúdo desta revelação.

A Bíblia está repleta de expressões como: “e falou o Senhor”, “eis o que diz
o Senhor”, “veio a mim a palavra do Senhor”. Daí estar corretíssimo referir-se a
esse conjunto de revelações como sendo a “Palavra de Deus”. A propriedade de
denominarmos o conjunto destas revelações de “A Palavra de Deus”.
Etimologicamente, revelação vem do latim “revelo”, que significa descobrir,
desvendar, levantar o véu. Revelação significa, portanto, descobrimento,
manifestação de algo que está escondido. A palavra grega correspondente à latina
“revelação” é “apocalipse”.

47
Por isso é importante ao se falar de “inspiração” bíblica, ter bem claro
também o que ela não é:

 1 – Não é uma inspiração humana natural. Muitos pensam que os autores


da Bíblia eram apenas gênios literários como Carlos Drummond de Andrade
ou Cora Coralina. A Escritura é muito clara em dizer que a genialidade de
sua mensagem não vinha da capacidade natural deles. Deus falava através
deles (2Sm 23.2 c/c At 1.16; Jr 1.9 c/c Ed 1.1; Ez 3.16-17; At 28.25).

 2 – Não é uma inspiração emocional ou até mesmo espiritual como a que


sentimos hoje diante de uma música inspiradora ou oração fervorosa. A
emoção de um culto inspirador pode até conter graus de elevação espiritual,
momentos em que nos sentimentos mais cheios de poder ou mais emotivos.
Isso não dava com o profeta de Deus, ou ele era plenamente inspirado por
Deus ou não era. Não havia graus de inspiração. Além disso, sensação
comum da presença de Deus pode ser algo permanente (I Joao 2:27), ao
passo que a manifestação profética era algo ocorrido num dado momento
em que o vidente mal esperava (Dan. 10:4 e 5).

 3 – A inspiração não admite hierarquias proféticas. Ou seja, um profeta não


é mais ou menos inspirado que outro. Uns podem ter tido visões
historicamente mais relevantes, outros podem ter recebido apenas a
mensagem audível e nada mais, porém, uma vez reconhecidos como
legítimos nenhum deles foi mais ou menos inspirado que o outro. O profeta
simplesmente é ou não é inspirado não existe graus de inspiração profética.
 4 – Inspiração não é onisciência. Ou seja, o projeta muitas vezes se limitava
a reproduzir aquilo que via, conforme o Senhor lhe mostrava. Ele mesmo,
muitas vezes, não entendia plenamente todas as nuanças daquilo que o
Senhor comunicava nem discernia os detalhes do futuro cumprimento de

48
suas profecias. Daniel é um caso clássico. A Bíblia diz que ele chegou a
adoecer por não compreender perfeitamente tudo o que vira em visão e, ao
que tudo indica, mesmo por ocasião de sua morte ainda guardava muitas
incógnitas em seu coração. Muitos que vierem depois dele, entenderiam
suas profecias melhor do que ele mesmo (Daniel 12:4 e 9).

 5 – A inspiração não se prende às intenções do profeta. Foi por perceber


esta realidade que os exegetas usaram uma expressão latina “sensus
plenior” cuja tradução literal seria “um sentido mais amplo”. Isto quer dizer
que o texto pode nos dizer mais do que o profeta intentava transmitir, pois as
intenções de Deus podem ser mais profundas e abrangentes que o contexto
imediato do autor bíblico (BROWN, 1955). Por exemplo, Isaías 7:14 ao
profetizar que uma virgem daria a luz a um menino especial provavelmente
estaria pensando num príncipe de seus dias que nasceria da casa de Acaz.
Ele nunca imaginaria a figura de uma virgem de Nazaré carregando um
recém-nascido numa manjedoura da cidade de Belém. É importante, porém,
que se diga que esse conhecimento mais profundo do texto só pode ser
descoberto pela iluminação que o Espirito Santo concede à medida que a
igreja vai se aprofundando no entendimento da revelação dada por Deus.

 6 – A inspiração também não é um ditado de Deus ao profeta. Existe uma


ideia popular de origem desconhecida, segundo a qual Deus teria feitio um
ditado verbal ao ouvido do escritor bíblico, de modo que não haja espaço
para a atividade pessoal nem para o estilo do escritor inspirado. Isso não é
verdade. Lucas, por exemplo, fez cuidadosa investigação de fatos
conhecidos (Lucas 1:4) e Pedro reconhecia que o estilo de Paulo era difícil
às vezes de ser entendido (II Pedro 3:16). Essa teoria do ditado faz dos
escritores bíblicos verdadeiros gravadores de áudio sem nenhum tipo de
noção ou raciocínio. Pelo contrário, eles eram serem pensantes que
interagiam com a mensagem que recebiam de Deus.

49
 7 – A inspiração não é uma mera reflexão. Essa ideia, hoje pouco em voga,
fez sucesso nos anos 1920 quando foi pela primeira vez exposta no livro “Eu
e TU” escrito pelo filósofo existencialista Martin Buber. Ele a chamou de
Teologia do Encontro. Na sua opinião, Deus e o profeta se encontravam
misticamente, mas Deus não falava nada. Apenas deixava-se sentir. Então,
depois de um tempo, o profeta escreve uma reflexão pessoal de seu
encontro com Deus e os homens a canonizam. Um dos grandes
divulgadores desta teoria para os arraiais do cristianismo foi Emil Brunner.

A declaração de que a Escritura é inspirada por Deus é feita de várias


formas ao longo da Bíblia. No Novo Testamento encontramos referências aos
profetas mais antigos como “Homens que falaram da parte de Deus” e “que foram
movidos pelo Espírito Santo”, “o Espírito de Cristo que estava neles testificou”.

Existem, portanto, cinco textos principais que você deveria aprender para
entender essa ideia de revelação e inspiração bíblica.

Observe abaixo:

1 – 2Timóteo 3:16 – “Toda a Escritura divinamente inspirada é proveitosa para


ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em justiça”.

2 – 2Pedro 1:20-21 – “Sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia da


Escritura é de particular interpretação. Porque a profecia nunca foi produzida por
vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo
Espírito Santo”.

3 – Mateus 5:17-18 – “Não cuideis que vim destruir a Lei ou os profetas: não vim
ab-rogar, mas cumprir. Porque em verdade vos digo, que até que o Céu e a Terra
passem, nem um jota ou til se omitirá da Lei, sem que tudo seja cumprido”.

4. João 10:35 – “A Escritura não pode ser anulada”.

5. João 17:17 – ‘A tua Palavra é a verdade’.

50
A Inspiração é uma operação do Espírito Santo, atuando nos homens, de
acordo com as leis da constituição humana; que não é neutralizada pela influência
divina, mas aproveitada como um veículo para a expressão completa da
mensagem de Deus. A Inspiração está geralmente combinada com o progresso
moral e espiritual do Doutrinador, de maneira que há no todo uma conformidade
moral entre o Profeta e a sua doutrina. (WESTCOTT Apud APOLINÁRIO 1989)

O bispo Ellicott, em seu livro “Aids to Faith”, escreveu:

A Escritura é a revelação através de meios humanos da inteligência infinita


de Deus para a mente finita do homem, e reconhecendo nós na palavra
escrita não só o elemento divino, mas também o elemento humano,
cremos verdadeiramente que o Espírito Santo penetrou tanto a mente do
escritor, iluminou a sua alma, e apoderou-se dos seus pensamentos que
ele, sem lhe ser tirada a sua individualidade, recebeu tudo quanto era
necessário para o habilitar a expor a Verdade divina em toda a sua
plenitude. (ELLICOTT Apud APOLINÁRIO 1989, p.411).

Em suma, as verdades contidas na Bíblia são divinas, mas o modo de


expressá-las é humano. Noutras palavras, este é um livro onde Deus fala com
sotaque humano. Mas isso envolve outra pergunta-chave que tem a ver com a
indagação inicial deste tópico. Como saber que livros são ou não inspirados por
Deus para acrescentá-los ou removê-los do cânon sagrado?

51
O CÂNON BÍBLICO

2
CONHECIMENTO

Conhecer os aspectos relevantes da Introdução à Bíblia com ênfase no


processo seletivo dos livros que compõem a coleção do Velho e do Novo
Testamento.

HABILIDADE

Ser capaz de compreender e interpretar textos sobre o tema bem como


fazer exposição escrita, pública em eventos, palestras, seminários em ambiente
acadêmicos e religiosos acerca do tema.

ATITUDE

Buscar desenvolver e exercitar capacidade reflexiva crítica acerca do objeto


estudado e incorporá-la na sua práxis acadêmica e religiosa.

52
Como foram escolhidos os livros da Bíblia?

A Bíblia Sagrada hoje é composta de 66 livros (na versão protestante) que


são reconhecidos tanto por católicos quanto protestantes, evangélicos e cristãos
ortodoxos. Os católicos e ortodoxos, é claro, acrescentam alguns livros à coleção
que ainda serão estudados nesta disciplina. Eles são chamados de
deuterocanônicos ou apócrifos, dependendo do autor que se lê.

Seja como for, o que nos interessa por ora é descobrir por que estes e não
outros livros foram incorporados no cânon das Escrituras. A resposta é simples:
porque estes foram inspirados por Deus para esse fim. Mas como saber quais
foram inspirados?

Existe uma acusação muito conhecida de que os livros da Bíblia foram


decididos por questões políticas, desenvolvidas especialmente em convocações
eclesiásticas como o famoso concílio de Niceia realizado no ano 325 d.C.

Basta uma pesquisa na Internet e você verá uma quantidade enorme de


sites dizendo que este concílio, convocado pelo imperador Constantino, foi o
primeiro encontro de todos os bispos da Igreja Cristã, e que nele inventaram ou
editaram o Novo Testamento removendo, por exemplo, textos que narravam um
casamento entre Jesus e Maria Madalena ou que negavam a divindade de Jesus.

Ainda segundo essa teoria, foi ali que queimaram ou proibiram a leitura de
muitos outros evangelhos que continuam verdades históricas sobre Jesus que não
foram aprovadas pela igreja. Esses evangelhos foram considerados apócrifos e
banidos do cristianismo oficial.

Estas afirmações, no entanto, não são precisas e não coincidem com a


verdade dos fatos. Basta para isso pesquisar as atas que mostram o que foi

53
discutido no concílio e o que os mais antigos historiadores falaram a respeito dele.
O imperador Constantino, por exemplo, que convocou o encontro, não tinha
nenhuma cultura formal ou teológica para decidir nada.

Embora ele fosse realmente um líder político, sua intenção não era tomar
partido de um ou outro lado, mas fazer com que a igreja que ele estava apoiando
eliminasse divisões internas que poderiam prejudicar o processo. Estas divisões
eram em concernentes à relação divina entre Jesus e Deus Pai; a construão da
primeira parte de um credo da igreja, a fixação da data da páscoa e a promulgação
de do chamado direito canônico que seria um conjunto de leis e regulamentos
adotados pelos líderes da igreja para a organização do cristianismo em Roma.

Quanto aos anais do encontro, os 318 bispos reunidos expediram um credo


(symbolum), 20 cânones e uma carta à Igreja de Alexandria. As atas, é claro,
chegaram até nós de forma fragmentária mas em nenhuma delas, nem mesmo no
registro dos historiadores que descreveram o encontro, há qualquer indício que
afirme que no Concílio de Niceia discutiu-se quais os evangelhos fariam ou não
parte do Novo Testamento. Não há menção a esse assunto em nenhuma das
pautas, muito menos em relação ao estabelecimento de uma lista oficial de livros
que comporiam a Bíblia Sagrada.

Um cânone ou cânon é um termo que deriva da palavra grega kanon, que designa
uma vara utilizada como instrumento de medida, e que normalmente se caracteriza
como um conjunto de regras (ou, frequentemente, como um conjunto de modelos)
sobre um determinado assunto.

A evidência, aliás, aponta no sentido contrário. Embora houvesse por


algum tempo certa disputa quanto aos livros de Hebreus, Tiago, II Pedro, II João,
Judas e Apocalipse, os cristãos primitivos já tinham em mente que livros eram ou
não inspirados por Deus para compor as Escrituras cristãs.

54
O cânon Muratoriano escrito 150 anos antes do concílio já mencionava os
evangelhos que fariam parte da Bíblia. Esse mesmo cânon, juntamente com
Origenes (outro escritor antigo do cristianismo) possivelmente já utilizavam os 27
livos que temos hoje no Novo Testamento. Igualmente, outros autores que viveram
bem antes do concílio – como por exemplo, Papias, Justino e Ireneu de Lion -
também já abordavam a questão dos evangelhos e dos livros neotestamentários
que seriam ou não inspirados por Deus (ACKROYD e EVANS, 1970).

Tatiano foi outro autor convertido ao cristianismo pela pregação de Justino,


o Martir, em torno de 150 d.C. .Após longos estudos de doutrinação ele retornou à
Síria e organizou uma composição dos quatro evangelhos com o fim de harmonizá-
los em todas as suas narrativas. Essa composição recebeu o nome de
“Diatessaron” que quer dizer “harmonia através dos quatro”. Em pouco tempo essa
obra serviu de texto litúrgico para a igreja siríaca centralizada em Edessa.

Mesmo entre os autores controversos, reconhecidos como hereges pela


igreja do II século, encontramos pistas de um cânon formalizado pela maioria da
igreja Cristã. Marcião de Sinope é um exemplo clássico. Atuando ainda como
bispo na Ásia menor, ele propôs uma cisão teológica entre o que ele chamou de
“Deus do Novo Testamento” e “Deus do Antigo Testamento”.

O primeiro seria um Deus bom, caridoso e cheio de misericórdia para com


os homens. Já o segundo seria um Deus legalista, condenador, pronto para
condenar a quem cometesse o menor deslize. Em virtude deste raciocínio, Marcião
rejeitou praticamente todo o Antigo Testamento e só aceitou partes do Novo. Seu
cânon constava apenas das epístolas de Paulo (menos as epístolas pastorais) e do
evangelho de Lucas, com exceção dos textos que ligavam Jesus ao Antigo
Testamento.

Embora alguns acadêmicos reputem o cânon de Marcião como original ou


como evidência de que não havia ainda uma lista oficial de livros inspirados dentro

55
do cristianismo, é possível ver aqui outra hipótese: de que já havia um cânon quase
totalmente sistematizado. Caso contrário, a tarefa de Marcião se limitaria a criar um
cânon e não rejeitar uma lista já existente.

Em favor desta ideia é possível citar uma passagem de Tertuliano que


diz:

“Desde que Marcião separou o Novo Testamento do Antigo, ele segue


necessariamente aquilo que ele mesmo separou, ao passo que foi apenas por sua
própria autoridade que ele separou o que antes estava unificado. Sendo, pois, algo
unificado antes de sua separação, o fato desta subsequente separação prova o
fato de que foi um homem que efetuou essa separação”. (De praescriptione
haereticorum 30).

Portanto, embora pudesse haver ainda uma ou outra disputa acerca de


alguns livros, pode-se dizer que grande parte do Novo Testamento já era
reconhecida como tal na metade do segundo século d.C. ou até antes disso.

Numa carta escrita no ano 367 d.C. Atanásio, bispo de Alexandria,


apresentou uma lista dos livros que comporiam os 27 que temos hoje no Novo
Testamento. Ele foi o primeiro a usar a palavra “canonizados” para se referir a eles
(BRAKKE, 1994).

Assim, percebe-se que os membros da Igreja de longa data reconheciam


os autores que eram inspirados por Deus e esses próprios autores já sabiam que
estavam escrevendo um livro especial. Isso, aliás, já vem desde os tempos do
Antigo Testamento quando um profeta iniciava sua mensagem dizendo “Veio a mim
a Palavra do Senhor dizendo...” ou “Assim diz o Senhor”.

Estas expressões indicam que eles sabiam de antemão que estavam


escrevendo uma Escritura Sagrada e que sua mensagem era de procedência

56
divina. A questão era confirmar se sua “consciência profética” era verdadeira ou
charlatã e havia critérios para isso. Afinal, embora houvesse a advertência dada
pelo próprio Deus para não se desprezassem as profecias (I Tes 5:20) e que
cressem nos profetas a fim de prosperar e estar seguros (II Cron. 20:20), o povo
também era orientado a não acreditar rapidamente em qualquer um que se dizia
mensageiro do Senhor. "Amados, não deis crédito a qualquer espírito; antes, provai
os espíritos se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo
mundo fora." I JOÃO 4:1 (veja também Mateus 7:15).

Em primeiro lugar, o verdadeiro profeta deveria promover a obediência a


Deus (Deut.13:1-4). Suas profecias, quando não fossem claramente condicionais
deveriam se cumprir para que o povo soubesse que o Senhor realmente falou por
intermédio dele (Jer. 28:9). O verdadeiro profeta sempre discursará em harmonia
com a Lei de Deus e as outras revelações anteriormente dadas (ISA. 8:19 E 20).

Finalmente, as obras desse profeta, isto é, os frutos de sua vida, revelariam


ou não suas credenciais divinas (Mateus 7:25). E o principal de seus frutos seria,
para os cristãos do I século, o enaltecimento da pessoa de Jesus Cristo (I JOÃO
4:1-3).

Os apóstolos receberam a promessa de que o Espírito Santo lhes faria


lembrar todas as coisas que o Cristo havia dito (João 14:26). Este mesmo Espírito
os conduziria a toda verdade (João 16:13). Eventos fenomenais ocorridos por
ocasião do Pentecostes e testemunhados por milhares de pessoas em Jerusalém
confirmavam que sua mensagem não era fruto de uma histeria ou alucinação
(ATOS 2:4).

O canon do novo testamento

O mesmo se pode dizer da inesperada e espantosa conversão de Paulo,


um dos principais inimigos do cristianismo. Sendo ele mesmo autor de boa parte do
Novo Testamento, a Igreja com o tempo reconheceu suas credenciais proféticas e
recebeu suas cartas como Palavra de Deus (I Tes. 2:13). Estas mesmas cartas ou
cópias delas circulavam pelas igrejas ainda durante o período apostólico (Col. 4:16)

57
e o próprio apóstolo Pedro reconheceu-as como inspiradas por Deus equivalentes
às demais Escrituras Sagradas (II Pedro 3:15-16). Paulo, por sua vez, citou uma
expressão de Cristo possivelmente retirada de Lucas 10:7 e a introduziu com a
expressão “Pois assim declara a Escritura” (I TIM. 5:18).

A Igreja Cristã foi definida em Efésios 2:20 como uma casa “fundamentada
nos apóstolos e profetas”. Ora, tal expressão indica que eles já trabalhavam com
escritos tanto de um grupo quanto de outro. Logo, essa larga aceitação de livros
ainda nos tempos apostólicos em contraste com umas poucas disputas ocorridas
posteriormente indicam que eles já tinham bem amadurecida a ideia de possuírem
uma coleção de escritos inspirados.

Embora possam ter havido outros escritos circulando no meio cristão, até
mesmo escritos por apóstolos, aprouve ao Espírito Santo conservar aquelas lívros
inspirados. Em I Coríntios 5:9 Paulo fala de uma carta anterior, de modo que a que
chamamos Primeira Coríntios na verdade não foi a primeira. Já em II Coríntios 2:4
ele diz que escreveu anteriormente aos membros em meio a muita tribulação e
angústia, mas os estudiosos não conseguem ligar com o conteúdo de Primeira
Coríntios de modo que são grandes as possibilidades de haver outra(s) cartas
perdidas de Paulo.

E temos ainda uma referência em Colossenses 4:16 a uma carta enviada


aos cristãos de Laodiceia, cujo conteúdo ninguém atualmente conhece. De igual
modo, alguns estudiosos pensam que a Carta aos Filipenses seria, na verdade,
uma coleção de vários bilhetes.

Mas, por que algumas cartas se perderam? Por que não foram
preservadas? Uma possível resposta é que se tratava de uma literatura devocional
edificante, mas que poderia conter ideias particulares que não serviam aos
propósitos divinos. Em outras palavras não foram inspirados. Caso fossem Deus
teria cuidado da sua palavra. O que se pode dizer com certeza é que Deus cuida
da sua palavra e o que temos é suficiente para a nossa salvação e não é fruto de
decisões conciliares posteriores.

58
Veja que curioso o exemplo de Clemente de Roma: por volta do final do I
século d.C., ele estava atuando como presbítero da igreja cristã e, estando em
Roma, enviou cartas para a igreja em Corinto. Ele também se demonstrou
familiarizado com as cartas de Paulo e as tratou como palavra de Deus. Alguns
pensam que esse Clemente seria o mesmo mencionado por Paulo em Filipenses
4:3 (veja Eusébio de Cesareia, Ecclesiastical History, III. 38, 4) .

Clemente também faz menções ocasionais a certas “palavras de Jesus” e,


embora elas fossem autoritativas para ele, não são tratadas como “evangelhos”
muito menos como escritos inspirados. Ao que tudo indica eram sentenças que ele
tinha de memória, possivelmente transmitidas de maneira oral, mas que não foram
preservadas de forma escrita como no caso dos evangelhos. Noutras palavras,
diferente das epístolas de Paulo, esses ditos de Cristo, conquanto fossem
significativos para o autor, não eram reputados como Escritura Sagrada do
cristianismo (METZGER, 1987).

Se levarmos em conta o fenômeno da inspiração profética, podemos dizer


que Deus determinou o cânon e a igreja apenas o reconheceu e aceitou. Não foi
ela quem o criou.

A Palavra de Deus era reconhecidamente inspirada e tinha autoridade


religiosa desde sua concepção. Sua origem era celestial como diz o Salmo 119:89:
“Para sempre, ó Senhor, está firmada a tua palavra no céu.”

Que critérios, portanto, teria a Igreja cristã primitiva para reconhecer os livros
que eram inspirados por Deus?

Por evidências indiretas e citações de vários autores antigos, eis algumas


perguntas básicas que eles provavelmente fariam:

59
1 – Este livro fora escrito por um profeta ou seguidor direto de Cristo de quem as
pessoas davam bom testemunho?

2 - Os apóstolos ainda vivos aprovavam seu conteúdo ou eram seus autores


diretos?

3 – O escritor tinha episódios miraculosos ou sobrenaturais que confirmavam sua


vida, sua obra e sua mensagem?

4 – O livro que ele escrevera era doutrináriamente harmônico com a inspiração


prévia encontrada em outros autores reconhecidamente inspirados?

5 – Os demais profetas vivos reconheciam sua autenticidade?

6 – Sua mensagem edificava a igreja e atraia pessoas para Cristo?

7 – Sua mensagem evidenciava a capacidade divina de transformar vidas?

8 – A igreja, a quem a mensagem era dirigida, sentia inspiração divina em seu


conteúdo assim que o recebia?

Lembre-se que esses critérios tinham um sentido especial aplicado a uma época
em que havia testemunhas oculares ainda vivas, que presenciaram os
acontecimentos ocorridos no período apostólico, especialmente relacionados ao
tempo em que Jesus andou pela terra.

Cânon do Antigo Testamento

Existe uma história na tradição judaica, segundo a qual Esdras, na


qualidade de escriba e sacerdote, havia presidido um conselho de 120 anciãos
chamado Grande Sinagoga e ali determinaram quais livros fariam ou não parte da
lista de escritos sagrados. O Talmude também faz referência a esse suposto
encontro que envolveu nomes importantes como Neemias, Ageu, Zacarias,
Malaquias, Daniel (não o profeta) e Simão, o justo. Isso teria acontecido por volta
do ano 450 a.C.

60
O Talmude é uma coleção de 63 tratados judaicos envolvendo assuntos religiosos,
legais, éticos e históricos compilados por antigos rabinos. Ele foi publicado no V
século d.C. na Babilônia onde viviam muitos judeus. É a mais importante coleção
de leis e interpretações do judaísmo seguida até hoje pelos judeus ortodoxos.

Contudo, persistem sérias dúvidas quanto à historicidade deste evento e


muitos acadêmicos não acreditam em sua ocorrência. A. Kuenen (apud
LEUCHTER, 2011) foi o mais acirrado crítico desta tradição. Ele argumenta
principalmente que ela é fruto de uma interpretação legendária de Neemias
capítulos 8 a 10, e, de fato, não existe nada ali que indique que eles tomaram
qualquer decisão formal de estabelecer um cânon fechado do Antigo Testamento.
O texto bíblico fala de uma reforma religiosa que se voltou para livros que já eram
sagrados na tradição do povo judeu.

O bem da verdade deve ser dito que o livro de II Macabeus – que não faz
parte do cânon judaico, mas é histórico – afirma que Neemias “fundou uma
biblioteca, recolheu os livros sobre os reis e profetas e os escritos de Davi e as
cartas dos reis sobre ofertas voluntárias” (2:13-15). Isso está em harmonia com o
relato já mencionado de Neemias 8 e 9, segundo o qual o sacerdote e escriba
Esdras havia trazido a Lei (ou uma cópia dela) de volta da Babilônia para
Jerusalém. Tudo isso por volta do mesmo período em torno do ano 450 a.C.

Tanto I quanto II Macabeus sugerem ainda que Judas Macabeus – aí já


estaríamos no ano 167 a.C. – também coletou livros sagrados do judaísmo e os
trouxe ao povo. Mas nenhuma destas passagens afirma ou sugere que o cânon
hebraico foi fixado neste tempo graças a uma decisão tomada por uma reunião
envolvendo políticos e líderes religiosos do povo judeu.

Por fim, existe uma teoria mais recente proposta por Heinrich Graetz em
1871, segundo a qual teria havido um concilio de rabinos em Jamnia por volta do
ano 90 d.C. e ali foi estabelecido o cânon das Escrituras segundo o judaísmo. Mas

61
essa conclusão hoje também caiu em descrédito e praticamente nenhum
especialista valida sua argumentação (BROWN, 1990; LEWIS 1992).

Na verdade não existe ainda um consenso claro que permita afirmar


quando, como e por que o cânon Hebraico foi criado. Nem o achado dos
manuscritos de Massada ou do mar Morto lançou qualquer luz adicional a esse
respeito. Aliás, autores conceituados como Jacob Neusner (2001) chegam a supor
que até ao segundo século, e mesmo mais tarde, nenhum Cânon nunca foi
formalmente criado pelos judeus e que, ao contrário, o conceito de Torá (Lei) teria
sido ampliado para incluir também a Mishná, a Toseftá, o Talmude e o Midrashin,
todos os documentos e comentários legais sobre religião escritos pelos rabinos do
judaísmo tardio.

O que se pode dizer, novamente, é que, assim como aconteceu em relação


a Niceia e o Novo Testamento, não existem bases para afirmar que foi um concílio
judaico que estabeleceu o cânon hebreu das Escrituras. Embora não tenhamos
elementos históricos de todos os detalhes de sua formação, é possível dizer, à
semelhança dos livros Cristãos, a formação do cânon do Antigo Testamento não se
deveu à influência de um homem ou de uma única geração. Antes, foi um processo
gradual, cumulativo e que durou séculos para ser concluído.

Ao que tudo indica no período patriarcal que vai de Abraão até ao período
da escravidão no Egito, o povo hebreu não possuía nenhum escrito sagrado. Sua
tradição teológica era passada oralmente de pai para filho. As comunicações
divinas eram feitas a certos “videntes” (profetas, no caso) por meio de sonhos,
visões ou vozes – prática essa ainda existente mesmo nos tempos da monarquia
(cf. I Samuel 28:6).

Com Moisés, no entanto, esse “silêncio escriturístico” será quebrado e ele


começa a produzir os primeiros livros que desde o início foram reconhecidos pelo
povo como sendo de procedência divina. A própria preocupação dos antigos em

62
preservar com cuidado esses manuscritos indica que eram textos muito especiais
(Êxo. 40:20; Deut. 17:18; 31:24 – 26; Josué 24:26; I Samuel 10:25; II Reis 22:8).

Referências posteriores à Lei (Isaias 1:10; 2:3; Oseias 4:6; 8:1; Amós 2:4;
Miqueias 4:2) indicam que o povo tinha um conjunto de textos legais e religiosos
aos quais deveriam prestar a atenção. Passagens como Jeremias 18:18; Zacarias
3:4 e Ageu 2:11aumentam a hipótese de que era obrigadção dos sacerdotes
preservar o conteúdo destes escritos e ensiná-los ao povo.

Foi, no entanto, no reinado de Josias que encontramos a evidência mais


direta de um conjunto de livros sagrados que foram apresentados e reconhecidos
oficialmente pelo povo. A narrativa conta da redescoberta do livro da Lei dentro de
algum lugar secreto localizado no templo de Jerusalém (II Reis 22:8-10 e II Cron
34:14-18). Tal achado provocou uma reforma religiosa sem precendentes. Mas,
como o próprio texto indica, não se trata da preparação de algo inédito mas do
achado de um texto sagrado antigo, já previamente conhecido, mas que por
alguma razão caira em esquecimento pelo povo.

Então veio o exílio da Babilônia e novamente os livros sagrados precisaram


ser preservados e reapresentados diante do povo na Reforma religiosa promovida
por Esdras e Neemias após os anos de cativeiro.

Embora em nenhum desses momentos haja evidência da criação inédita de


livros sagrados falsamente atribuídos a autores do passado com o fim de legitimar
seu conteúdo, não é inverossímil admitir a presença de alguns trabalhos editoriais
a fim de tornar o texto mais claro ou dar sequência a narrativas que originalmente
haviam sido escritas de modo esparço.

Mas isso é diferente do que diz a Alta Crítica (ainda falaremos sobre ela)
segundo a qual a Bíblia seria uma colcha de retalhos autorais que foram sendo
colecionados ao longo do tempo e costurados por um editor final na forma que hoje
os conhecemos. As anotações editoriais e os arranjos que nos referimos são

63
limitados. Por exemplo, no livro de Daniel 7 e 8 toda a visão do profeta aparece na
primeira pessoa do singular – o que indica um relato pessoal das visões escrito
pelo próprio profeta. Contudo, no começo do capítulo há uma anotação da data e
uma referência ao autor da visão dada em terceira pessoa que parece indicar a
presença de um editor final que fez a compilação das visões de Daniel (que
possivelmente estivessem separadas) e as organizou por ordem cronológica.

O mesmo se pode dizer de passagens como Gênesis 11:31 que diz: “Harã
morreu na presença de seu pai Terá, em sua terra natal, chamada de Ur dos
caldeus. Gênesis”. Ora, pela cronologia Bíblica isso teria ocorido no segundo
milênio a.C. e fora escrito por Moisés em torno do século XV a.C. Ocorre, no
entanto, que não há registro da presença dos caldeus no sudeste da Mesopotâmia
antes do I milênio a.C. e eles só começaram a governar cidades locais por volta do
XI século a.C. Logo, “Us dos Caldeus” só pode ser ser uma anotação feita por
alguém muito tempo depois de Moisés.

Mas não se trata de um engodo e sim de uma anotação editorial com o fim
de tornar o texto mais compreensível. Seria como se um historiador moderno ao
descrever a descoberta do nosso país escrevesse: “Em 21 de Abril de 1500, Pedro
Alvares Cabral descobriu o Brasil.” Contudo, não existia Brasil em 1500. Esse país
e esse nome só vieram a existir mais tarde. A referência, no entanto seria um
ajuste acadêmico com o fim de atualizar o texto perante o leitor, facilitando sua
compreensão. Seria como se o historiador dissesse: “Em 21 de abrail de 1500,
Pedro Álvares Cabral descobriu as terras que posteriormente seriam chamadas de
Brasil.” O mesmo ocorreu com o texto bíblico.

Uma nota final se faz necessária na explanação deste assunto. Embora


não tenhamos nenhuma evidência direta sobre o encerramento do cânon no tempo
de Esdras e Neemias, algumas coisas são notórias:

64
Jesus certa vez afirmou que aqueles, dentre Israel, que rejeitassem a
mensagem de Deus seriam responsabilizados “desde o sangue de Abel até ao
sangue de Zacarias, que foi morto entre o altar e o santuário” (Luc 11:51). Ora,
muitos especialistas entendem que aqui Jesus estava fazendo referência ao cânon
do Antigo Testamento que já estaria fechado em seus dias. Abel, representando o
Gênesis, seria o primeiro livro da coleção e Zacarias o último (BRUCE, 1988). A
dificuldade está em saber se esse Zacarias seria o filho de Baraquias (Mat. 23:35;
Zac 1:1; Esdras 5:1) que teria escrito o último livro do cânon hebraico ou Zacarias,
filho de Joiada mencionado em II Crônicas 24:20-21.

Seja como for, uma das mais antigas listas dos livros hebraicos das
Escrituras menciona II Crônicas como o último livro do Cânon. Ali é dito: “Nossos
rabinos disseram: a ordem dos profetas é esta: Josué, Juizes, Samuel, Jeremias,
Ezequiel, Isaias e os doze. A ordem dos Escritos é Rute, o livro dos Salmos, Jó,
Provérbios, Eclesiastes, Cantares, Lamentações, Daniel, o rolo de Ester, Esdras e
Crônicas” (Talmude Babilônico, tratado Baba Bathra 14b).

Sobre a ordem dos livros, considerando que Malaquias seria o último autor
nas edições modernas da Bíblia, isso não deve nos preocupar, pois em outras
versões hebraicas mudam a ordem dos livros. O Codex de Leningrado (datado de
1009 d.C.) e três das oito listas mais antigas do cânon judaico trazem Crônicas
como o primeiro e não o último livro da coleção de escritos (Encyclopaedia Judaica
vol. 4: 829-830).

Ainda, segundo a tradição judaica, é dito que o espírito de profecia cessou


com a última parte da exortação de Malaquias (tratado Sanhedrin 11ª). Isto em
razão do fato de que nenhum livro escriturístico deveria ser acrescentado à lista
dos livros inspirados de Israel.

Por volta do ano 90 d.C. o historiador judeu Flávio Josefo também declarou
que o cânon hebraico estava fechado e que “desde Artaxerxes, a sucessão de

65
profetas chegou ao seu fim”. Isto ele escreveu em argumentação contra Ápio,
demonstrando que em seu tempo a coleção de livos inspirados já estava decidida.

De acordo com Gerald Larue (1968), os critérios utilizados na seleção dos


livros sagrados para serem incluídos no cânon judaico não foram estabelecidos em
qualquer "delineação clara", mas parecem ter incluído os seguintes itens:

 1. O escrito tinha que ser composto em hebraico. As únicas exceções, que


foram escritos em aramaico, foram Daniel 2-7, escritos atribuídos a Esdras
(Esdras 4:8-6:18; 7:12-26), que foi reconhecido como o fundador do
judaísmo pós-exílico, e Jeremias 10:11. O hebraico era a língua da Sagrada
Escritura, e o aramaico era a língua da fala comum.
 2. O escrito tinha que ser sancionado pelo uso da comunidade judaica. O
uso de Ester em Purim tornou possível para que ele fosse incluído no cânon.
O livro de Judite, sem esse apoio, não era aceitável.
 3. Os escritos tinham que conter um dos grandes temas religiosos do
judaísmo, como a eleição ou a aliança. Reclassificando a Canção dos
Cânticos (ou Cantares de Salomão) como uma alegoria, foi possível ver
neste livro uma expressão do amor de aliança.
 4. O escrito tinha de ser composto antes da época de Esdras, pois era
popularmente acreditado que a inspiração havia cessado depois. Jonas foi
aceito porque ele usou o nome de um profeta primitivo, e tratava com os
eventos antes da destruição de Nínive, que ocorreu em 612 a.C.. O Livro de
Daniel teve a sua localização (não sua composição) no exílio e, portanto, foi
aceito como um documento exílico.

Barber (2006) e Sanders (2002) sugerem que o status canônico dos livros
do Antigo Testamento foi decidido, pelo menos em parte, em razão da data de
composição de cada um deles. Nenhum livro se acreditava ter sido escrito mais
tarde do que o período de Esdras foi incluído. Isto foi baseado, em grande parte, na
tese farisaica de que a inspiração profética terminou depois de Esdras e Neemias.

66
Barber (2006) ressalta que essa tese é um "critério problemático para os
cristãos que afirmam que o Espírito Santo inspirou os livros do Novo Testamento".
Ele também aponta que ele também é "problemático para alguns estudiosos que
acreditam que vários livros canônicos, como por exemplo, Daniel, Ester, Cântico
dos Cânticos, Provérbios, os livros de Crônicas, datam de um período muito
posterior”. Segundo alguns autores liberais, Daniel seria composto bem depois de
alguns livros "apócrifos".

REFLETINDO: Mas o que seria esse período de silêncio profético de Deus?


Quanto tempo ele durou? Que livros foram produzidos nele?

Período Intertestamentário

Poucos que leem a Bíblia Sagrada se dão conta de que entre o último
verso de Malaquias e o começo do Evangelho de Mateus, teriam se passado
quatro séculos, aproximadamente. Esse período de cerca de 400 anos que vai
desde os tempos de Neemias até ao nascimento de Cristo é normalmente
chamado de período intertestamentário por grande parte dos estudiosos,
especialmente os de tradição protestante. Ele marca o hiato entre o final da parte
hebraica e o início da parte cristã da Bíblia Sagrada.

Em termos cronológicos, estamos falando de um intervalo entre o final do


período persa (IV séclo a.C.) e o começo do império Romano, quando nasce Jesus
de Nazaré. Muitas coisas importantes aconteceram neste meio tempo ao povo
judeu, mas para efeitos de história do texto bíblico, duas devem ser destacadas: a
tradução das Escrituras hebraicas para a língua grega e o chamado “silêncio
profético de Deus”, segundo o qual não houve nenhuma revelação divina ao povo
por pelo menos quatro séculos.

Uma vez que o primeiro imperador, César Augusto, sempre recusou ser
reconhecido como tall, é difícil determinar exatamente quando o Império Romano

67
começou. Alguns historiadores, por consenso, pensam que seria no fim da
república em 27 a.C., data em que Augusto recebe esse título de César e começa
oficialmente a governar sem nenhum “vice”. Mas há outros que pensam que o
correto seria o ano 14 d.C. quando Tibério, o segundo imperador de Roma, aceita
oficialmente ser tratado como tal. De qualquer modo, o nascimento de Cristo
ocorrido entre 6 e 4 a.C. estaria nos começos do império romano.

Segundo a compreensão de muitos, esse período começa com a predição


de Malaquias acerca do retorno de Elias (Mal 5:5-6) em cerca de 430 a.C. e
termina com a predição mencionada por Lucas 1:5-23 da vinda de João Batista que
pregaria no mesmo poder e espírito de Elias.

Começando por essa última informação, alguns tomam esse silêncio


profético como uma espécie de “fechamento” do cânon hebraico da Bíblia Sagrada.
E de onde vem essa dedução?

De acordo com o historiador judeu Flávio Josefo que viveu no I século d.C.,
“desde os dias de Artaxexes a sucessão de profetas foi interrompida”. Isso ele
escreveu num livro chamado Contra Apio 1:8. No mesmo parágrafo Josefo ainda
diz: “Pois nós [judeus] não temos uma inumerável multiplicidade de livros
discondantes e contraditórios um em relação ao outro, como no caso dos gregos,
mas apenas 22 livros que contêm o relato de todos os tepos passados, que são
exatamente cridos como sendo divinos. Deles, cinco pertencem a Moisés e contêm
as leis e as tradições do início da humanidade até o seu fim.

Esse intervalo de tempo cobre aproximadamente 3 mil anos. Da morte de


Moisés até à morte de Artaxerxes, que reinou depois de Xerxes. Os profetas que
vieram depois de Moisés escreveram o que fizeram em treze livros. Os demais
quatro livros contêm hinos e preceitos para a condução da vida humana. É verdade
que nossa história continua sendo escrita desde Artaxerxes mas não com a mesma
autoridade dos primeiros pais, pois não temos mais uma sucessão de profetas
desde então”.
68
Embora se trate de um documento bem posterior, compensa citar também
o que diz o Talmude em concordância com o testemunho de Flávio Josefo. Uma
parte foi escrita entre 350 e 425 em Jerusalém e a outra por volta de 500 na
Babilônia. Por isso costuma-se falar de Talmude Babilônico e Talmude de
Jerusalém (ou Talmude Hierosolomita).

No tratado Seder Olam Rabba 30 é dito: “Até então [o texto se refere à


vinda de Alexande, o Grande e o fim do império Persa], os profetas profetizaram
através do Espírito Santo. Desde então, inclinaram seus ouvidos e passaram a
ouvir [apenas] as palavras dos sábios”.

Noutras passagens (Tos. Sotah 13:2 baraita in Bab. Yoma 9b, Bab. Sotah
48b e Bab. Sanhedrin 11ª, repete-se a informação: “Com a morte de Ageu,
Zacarias e Malaquias, os últimos profetas, o Espírito Santo cessou de falar a
Israel”.

Isso nos leva a crer que na tradição judaica o espírito de profecia cessou
no meio do povo com as palavras de encerramento do profeta Malaquias 4:5 e 6.
As causas desse “silêncio de Deus” seriam, segundo se supõe, os constantes
desvios do povo em relação aos caminhos ordenados por Deus.

Isso não significa, contudo, que nenhuma obra literária foi preparada pelos
judeus durante esse tempo. Além dos livros chamados apócrifos (que a seguir
comentaremos), temos ainda os chamados pseudoepígrafos nomeados de acordo
com antigos heróis do judaísmo embora não tenham sido estes os verdadeiros
autores destes textos.

A lista é grande, mas estes são os principais: Livros dos Jubileus, Vida de
Adão e Eva, Ascenção de Moisés, Testamento dos Doze Patriarcas, Salmos de

69
Salomão, Ode de Salomão, Livro de Enoque, Apocalipse de Elias, Apocalipse de
Ezequiel e outros.

É importante, no entanto notar que, embora seja verdade que a revelação


dada por profetas teve uma pausa, esse era o período que antecedia a vinda do
Messias e que abre a inauguração do Segundo Templo de Jerusalém que
substituiu aquele feito por Salomão e destruído por Nabucodonosor.

Graças a um decreto expedito por Ciro (457 a.C.) os judeus remanescentes


que assim desejassem poderiam voltar do exílio e reestabelecer residência na
região da judeia, além de reconstruir sua cidade sagrada, Jerusalém.

Um pouco depois disso, Alexandre, o Grande, conquista a Pérsia e toma


posse da Judeia em 332 a.C. Apesar de Alexandre ter sido recebido pacificamente
pelos habitantes de Jerusalém, os anos que seguiram à sua morte foram de grande
tribulação para os judeus que padeceram nas mãos de gregos inimigos como por
exemplo Antíoco IV Epifânio que em 167 a.C. queria converter o judaísmo num
ramo do helenismo extinguindo as tradições judaicas e dessacralizando seu templo
com ídolos pagãos e até o sacrifício de um porco no altar de holocausto.

A vitória miraculosa dos judeus só veio com a insurreição judaica liderada


pelos macabeus em 164 a.C. e que até hoje celebrada como data festiva pela
comunidade judaica do mudo inteiro.

A Septuaginta

A Septuaginta (às vezes abreviada como LXX) é o nome comumente dado


no Ocidente a uma antiga tradução para o grego koiné das Escrituras judaicas.
Elas foram traduzidas em etapas desde o terceiro até ao segundo século a.C. em
Alexandria, no Egito.

70
O que levou os judeus a trazudirem seu livro sagrado para outra língua ao
invés de mater o original hebraico? Dois fatores podem ter concorrido para isso. O
primeiro seria o fato de que muitos judeus que moravam fora de Israel começaram
a perder a fluência da língua hebraica e adotado o grego como idioma corrente.
Estima-se, por exemplo, que perto de 1 milhão de judeus viviam em Alexandria
durante o III século a.C. Esse elevado número de judeus alexandrinos estavam por
gerações afastados da cultura hebraica de seus pais. Logo, eles estariam mais
familiarizados com o grego e não podiam compreender o texto hebraico original.

Em segundo lugar, a helenização do ocidente trouxe uma nova


oportunidade criada pela fundação da Biblioteca de Alexandria que reunia livros do
mundo inteiro. Ter entre o acervo uma ou mais cópias em grego das Escrituras
hebraicas poderia facilitar que estrangeiros de mente helenizada tivessem acesso
às crenças do judaísmo.

Em relação a isso, uma antiga lenda apareceu na Carta de Aristeas escrita


no II século a.C.. Segundo ela, o nome Septuaginta se deveu ao fato de que 70 ou
72 sábios judeus haviam sido comissionados por Ptolomeu Filadelfo para traduzir
de uma só vez todo o texto do Antigo Testamento.

Embora muitos duvidem da historicidade deste fato, existe um consenso de


que a versão da LXX influenciou bastante o judaísmo intertestamentário. Os
antigos escritores judeus Filon de Alexandria e Josefo (ambos associados com o
Judaísmo Helenístico primeiro século) afirmavam que os tradutores da LXX foram
inspirados por Deus. Embora essa afirmação seja passiva de questionamento,
pode-se dizer que assim como o judaísmo, as origens do cristianismo foram bem
influenciadas por esta versão grega das Escrituras. Hoje é sabido que muitas
citações do Novo Testamento vêm diretamente da LXX. Muitos seguidores do
cristianismo não falavam hebraico pelo que dependiam desta tradução para
estudar os fundamentos bíblicos do movimento de Jesus. Até hoje muitas

71
traduções modernas da Bíblia se valem tanto do texto hebraico, quanto desta
antiga e preciosa versão.

A LXX contém os 39 livros do AT, comumente aceitos por protestantes e


católicos, acrescidos de certos livros não reconhecidos como inspirados na versão
hebraica original. São eles: Judite, Tobias, Baruque, Sirácida (ou Eclesiástico),
Sabedoria de Salomão, Primeiro e Segundo Macabeus, Primeiro e Segundo
Esdras, além de acréscimos aos livros de Ester, Daniel e a prece de Manassés.

Estes livros (reconhecidos no catolicismo como deuterocanônicos) são


comumente chamados de apócrifos ou apócrifa. Este é um termo cunhado no V
século por Jerônimo que quer dizer secretos, escondidos. Ele se refere a textos do
Antigo Testamento cuja inspiração era severamente questionada. Mesmo o
catolicismo que os considera inspirados (com exceção dos livros de Estras e a
Oração de Manassés) só oficializou esse pensamento em 8 de abril de 1546, por
ocasião do concilio de Trento que discutia as diferenças entre a Igreja Católica e o
protestantismo. As igrejas ortodoxas também incluem esses livros em sua versão
da Bíblia Sagrada.

Apócrifos, pseudoepígrafos e Deuterocanônicos

O termo “pseudepigrafos” (ou pseudepigrapha) não é muito conhecido em


alguns meios do cristianismo. Contudo é um título-chave para a definição de vários
livros atribuídos a personagens do Antigo e Novo Testamento, mas que, na
verdade, foram escritos por outros autores anônimos, séculos depois da morte do
autor bíblico. Pseudepígrafo é a junção de duas palavras gregas: pseudo que quer
dizer “falso” + “grafos” que quer dizer “título” ou “nome”. Portanto, pseudepigrafo
refere-se a livros falsamente intitulados ou falsamente atribuídos a alguém.

72
O apóstolo Paulo dá um testemunho que indica que já no seu tempo o
cristianismo tinha de lidar com textos falsamente atribuídos à autoria apostólica.
Dirigindo-se aos cristãos da cidade de Tessalônica ele orientou aos mesmos que
não se deixassem levar por cartas supostamente escritas por ele, mas que na
verdade eram falsas (II Tes. 2:2). Por essa razão, Paulo tomou o cuidado de
escrever em algumas de suas epístolas uma nota que dizia: “Eu, Paulo, escrevo
esta saudação de próprio punho, a qual é um sinal em todas as minhas cartas. É
dessa forma que assino” (veja também I Cor 16:21; Gál 6:11 e Col. 4:18).

Dentre os pseudoescritos que chegaram até nós, encontramos textos


atribuídos a Adão, Noé, Enoque, Moisés, Elias e também a personagens do Novo
Testamento como Tomé, Pedro, João e até Judas. Mas, repetimos, não foram
escritos por eles. No entanto, existe a possibilidade que alguns contenham alguma
informação que seja legítima, baseada numa fonte oral ou em outros manuscritos
hoje desaparecidos. A epístola de Judas, por exemplo, pertencente ao cânon do
Novo Testamento, reputa como verdadeira uma profecia atribuída a Enoque e que
consta no Apócrito de Enoque que diz:

Quanto a estes foi que também profetizou Enoque, o sétimo depois de


Adão, dizendo: Eis que veio o Senhor entre suas santas miríades, para
exercer juízo contra todos e para fazer convictos todos os ímpios, acerca
de todas as obras ímpias que impiamente praticaram e acerca de todas as
palavras insolentes que ímpios pecadores proferiram contra ele. (JUDAS
Cp. 14 e v. 15)

Estes manuscritos foram produzidos entre aproximadamente de 300 a.C


até 300 d.C. e se espalharam pelo mundo greco-romano. Contudo, eles jamais
foram incluídos nas Escrituras Hebraicas nem na literatura rabínica tradicional.
Entretanto, essas coleções de antigos textos judaicos têm despertado o interesse
de acadêmicos do mundo inteiro por revelar importantes aspectos do judaísmo que
existiu nos tempos antigos, especialmente no princípio do cristianismo. Fragmentos
destes livros foram também encontrados entre os manuscritos do Mar Morto.

Quanto aos apócritos, como você pode ver na definição acima, trata-se de
livros cuja inspiração e canonicidade é disputada entre os cristãos. Na verdade,

73
diferentes tradições cristãs possuem diferentes apócrifos. Mas as diferenças mais
conhecidas no ocidente são aquelas que marcam as Bíblias publicadas por
protestantes e aquelas publicadas por editoras católicas.

São sete livros ao todo, cuja canonicidade é disputada: Judite, Tobias,


Baruch, I Macabeus e II Macabeus, Sabedoria de Salomão e Eclesiastico. Além
disso temos alguns acréscimos aos livros de Ester e Daniel. Os protestantes, no
entanto, embora não reconheçam a inspiração profética dessa coleção admitem o
estudo dos mesmos como meio de conhecer melhor o judaísmo dos tempos
antigos. Os católicos, por considerarem esse material como Escritura Inspirada por
Deus, evitam chamar-lhes de apócrifos, mas sim de deuteroncanônicos ou seja,
canonizados numa segunda vez.

Quais seriam, portanto os argumentos a favor e contra a inclusão desses


manuscritos no cânon das Escrituras?

Argumentos católicos Resposta protestante Argumentos para a


para inclusão exclusão
Inclusão na LXX – É disputável se esses Até mesmo antigos
esses livros foram livros realmente faziam autores católicos foram
incluídos na tradução parte do cânon original contrários à inclusão de
grega do AT como livros da LXX – as mais alguns ou de todos os
canônicos antigas cópias que livros da coleção dos
temos em grande deuterocanônicos. Por
extenção da LXX são exemplo: Jerônimo;
cópias feitas por Papa Gregório, o
copistas cristãos, de grande; o Venerável
modo que não podemos Bede; Hugo de São
dizer que as cópias Victor; Nicholas de Lyra;
judaicas originais os William de Ockham.
continham. Essas A Glossa ordinária, um
cópias cristãs datam do comentário católico da
IV século em diante e, o Idade Média, trouxe o

74
mais importante, as três seguinte comentário
cópias mais extensas sobre os apócritos (ou
não estão de acordo deuterocanônicos),
quanto ao cânon dos demonstrando que a
apócrifos (ou aceitação dos mesmos
deuterocanônicos), pois não era um consenso
trazem diferentes listas. entre os teólogos da
E nelas está incluído o época: “Os livros
salmo 151 que as canônicossão fruto do
versões católicas não ditado do Espírito
reconhecem como Santo. Não sabemos,
inspirado. Filo, um no entanto, em que
antigo autor Judeu de tempo ou por quais
Alexandria que usou autores os não
extensivamente a LXX canônicos ou apócrifos
não faz qualquer foram produzidos.
menção aos livros Desde, porém, que eles
deuterocanônicos sejam proveitosos e
incluídos nas Bíblias uteis e não contenham
católicas, o que seria qualquer contradição
estranho caso ele os com os demais livros
tivesse incluídos em sua canônicos, é permitido à
lista escriturística. Igreja lê-los para sua
devoção e edificação.
Sua autoridade,
contudo, não é
considerada adequada
naqueles assuntos que
ainda são dúbios, nem
servem para confirmar a
autoridade eclesiástica
de um dogma, como o
bem aventurado
Jerônimo declara em

75
seu prólogo ao livro de
Judite e também aos
livros de Salomão. Po
outro lado, os livros
canônicos possuem tal
autoridade que tudo que
está contido neles é
para ser considerado
uma firme verdade e um
assunto indiscutível”. O
Cardeal Cajetan (Apud
WICKS, 1978) foi um
dos mais importantes
opositores de Lutero,
comissionado pela
Igreja para refutar os
ensinos do
protestantismo. Ele
escreveu um
comentário dedicado ao
papa no qual exprime
sua opinião de que os
apócrifos (ou
deuterocanônicos) não
eram inspirados, muito
menos canônicos num
“stricto senso”, de modo
que os mesmos não
foram incluídos em seu
comentário do AT.
Inclusão nos Muitos Textos O NT não reconhece
Manuscritos do Mar encontrados nos tais livros como
Morto – fragmentos manuscritos do Mar inspirados por Deus -
desses textos são Morto não são Os autores do NT

76
encontrados na canônicos – Os textos jamais fazem menção
Biblioteca do Mar Morto encontrados no mar direta de qualquer
o que indica que eram Morto não trazem destes livros
respeitados por nenhuma lista canônica introduzindo a fórmula:
determinado segmento de quais seriam os “está escrito” ou “como
do judaismo livros inspirados ou não declarou o profeta X”. O
inspirados. Ademais, a máximo que se pode
maioria absoluta dos encontrar (mas não
materiais ali para além de qualquer
encontrados não são questionamento) seria
escrituristicos, uma hipotética alusão
protocanônicos ou indireta que demonstra
deuterocanônicos. apenas que o autor
Assim, a presença de bíblico conhecia tais
qualquer texto ali pouco livros, mas não que os
concorre para a considerasse palavra de
confirmação de sua Deus. Ainda que tal
natureza escrituristica. citação realmente
exista, isso pouco
contribui para a
conclusão de que se
tratam de livros
inspirados pois obras
seculares também são
citadas no NT, como por
exemplo Atos 17:28 em
que Paulo cita um
trecho do Phaenomena
escrito por Arato. Nem
por isso poderíamos
argumentar que este
poeta grego seria
inspirado por Deus.
Uso no Cristianismo Os mais antigos autores Mesmo os

77
primitivo – Antigos cristãos parecem ter deuterocanônicos
autores cristãos citavam rejeitado os atestam que no seu
passagens dos deuterocanônicos – tempo a inspiração
deuterocanônicos. Embora seja possível havia cessado – I
Dentre eles temos, por encontrar uma ou outra Macabeus 9:27 declara:
exemplo, Clemente de citação dos “Então houve grande
Alexadria citando deuterocanônicos, isso tumulto em Israel, tal
Tobias, Eclesiastico e não é evidência de que como nunca havia tido
Ireneu de Lion citando os mesmos eram desde o tempo em que
Sabedoria de Salomão. reconhecidos como os profetas cessaram
Escritura Sagrada. Foi de aparecer no meio do
apenas quando a igreja povo”.
cristã iniciou seu
rompimento com o
judaísmo que essa
questão se tornou um
ponto a ser discutido. A
mais antiga lista de
livros Cristãos do AT foi
composta por Melito de
Sardes em 170 d.C.não
menciona nenhum
destes textos
controversos.
Aceitação por antigos Os concílios A Igreja Católica não
concílios eclesiásticos – mencionados não eram oficializou os apócrifos
Muitos concílios como concílios universais do como parte do Cânon
os de Roma (382), cristianismo, mas senão tardiamente, no
Cartago (393), Hipona sínodos locais, apenas Concílio de Trento
(397) aceitaram esses de expressão regional – reunido em 1546 – Além
livros. Esses concílios Hipona, Roma e do que já foi dito acerta
são citados por Cartago não tinham dos concílios anteriores
protestantes para autoridade para propor a Trento não serem de
sustentar o cânon do um entendimento caráter ecumênico,

78
NT mas se esquecem universal do muito menos universal,
que os mesmos cristianismo e todos é possível acrescentar
também validaram os eles tinham sido que até mesmo
deuterocanônicos. influenciados pelo renomados autores
mesmo teólogo, Santo católicos admitem essa
Agostinho, pelo que realidade. Yves Congar
possivelmente ecoaram (1966) concorda: “...
o mesmo pensamento uma lista oficial e
devido a serem dirigidos definitiva dos escritos
por um mesmo mentor. inspirados não existiu
na Igreja Católica senão
no Concílio de Trento”.
Do mesmo modo, H. J.
Schroeder (1978),
tradutor inglês dos anais
do Concílio, declarou:
“A lista tridentina ou
decreto foi a primeira
declaração infalível
promulgada sobre o
cânon da Sagrada
Escritura”. Por fim, até
mesmo a The New
Catholic Encyclopaedia
também declara que o
cânon não foi
oficialmente
estabelecido pela Igreja
senão no concílio de
Trento. Tudo isso
demonstra uma inclusão
bastante tardia desses
livros na relação de
documentos inspirados

79
por Deus.

Línguas originais da Bíblia

Como você sabe a Bíblia não foi originalmente escrita em nosso idioma. O
que temos é uma tradução muitas vezes complexa de traduzir. Primeiro porque
alguns elementos em nosso idioma constam com apenas um vocábulo para
representá-lo, em outra língua contam com dois ou três. Por exemplo, enquanto
nos referimos à morada de Deus e ao ambiente estelar pelo simples nome de céu,
as pessoas de língua inglesa separam em dois diferentes termos heaven e sky.

Além disso, há palavras que simplesmente não possuem um equivalente


em outra língua, é o caso de saudade que em inglês tem de ser traduzida por um
verbo (I miss you) porque não existe um substantivo que lhe seja equivalente.

Por fim, existe também o problema de que a língua é um organismo vivo e


as palavras sofrem transformação. Isso é chamado de semântica. Veja esse caso:
você quando entorna um líquido no chão costuma dizer que o líquido derramou,
não é mesmo? Pois bem, no tempo de seus ancestrais, derramar era cortar as
ramas de uma parreira de uvas. De modo que quando os antigos diziam vou
derramar aquela parreira, não estão dizendo que vão entorná-la algum lugar.

É por estas e outras dificuldades que o trabalho dos tradutores é uma arte
difícil e sempre sujeita a críticas (algumas injustas). Os italianos costumavam dizer
traduttore traditore - o tradutor é um traidor. Triste adágio para um trabalho tão
importante!

Pois bem, lembrando que a Bíblia foi escrita em hebraico, aramaico e


grego seria interessante conhecer um pouco algumas características destes três
idiomas para que você esteja mais familiarizado com eles.

80
Hebraico e Aramaico

A maior parte da Bíblia foi escrita em hebraico, com poucos trechos em


aramaico. O aramaico era um grupo de línguas e dialetos aparentado à mesma
origem da língua hebraica. Ambas são, portanto, muito aparecidas. O aramaico era
falado não apenas em Israel, mas em vários outros povos dos tempos bíblicos (II
Reis 18:26). Na Bíblia ele aparece às vezes com o nome de siríaco ou caldeu (cf.
Daniel 2:4).

Os poucos trechos do Antigo Testamento escritos em aramaico são Esdras


4:8 – 6:18; 7:12 – 26 e Daniel 2:4 – 7: 28. Todo o restante do Antigo Testamento,
com exceção de uma palavra ou outra, foi escrito originalmente em hebraico (cf.
Gên 31:47 e Jer. 10:11). O Novo Testamento foi todo escrito em grego, mas
algumas expressões de Jesus aparecem em aramaico (cf. Marcos 5:41; 7:34 e
15:34) e sobre Paulo é dito que o mesmo optou pelo aramaico para proferir um
discurso a uma multidão de judeus (Atos 21:40 e 22:2). O hebraico também
aparece em certas passagens do Novo Testamento tais como João 5:2; 19:13, 17,
20; 20:16; Apocalipse 9:11; 16:16.

REFLETINDO: Mas, de onde surgiram esses idiomas? Qual sua história, suas
características? Quais são suas similaridades e diferenças?

Você certamente se lembra da história bíblica de Noé e sua família como


sobreviventes do grande dilúvio que inundou toda a terra. Pois bem, de acordo com
o Gênesis, Noé tinha três filhos: Cão, Sem e Jafé. Esses três filhos por sua vez se
tornaram os ancestrais de todos os povos que existem no mundo.

Os descendentes de Sem são comumente conhecidos como semitas e os


que falavam em hebraico e Aramaico originaram-se deste tronco étnico. Mas note
81
que essas duas línguas são apenas uma amostra dentre muitas outras que vieram
do tronco semítico. Outros idiomas derivados da mesma raiz seriam o canaanita, o
fenício, o ugarítico, o acadiano etc.

Mas nem sempre foi assim. Ainda de acordo com as Escrituras, houve um
tempo em que todos os povos da terra falavam um só idioma (Gên. 11:1). Até que
a desafiadora construção de uma torre chamada Babel produziu a confusão de
línguas espalhando os homens por diferentes lugares formando diferentes nações
(Gên. 11:7,8).

Foi mais ou menos por esse tempo que os sumérios (moradores da região
de Sumer, conhecida na Bíblia como Sinar – Gên. 10:10) e que falavam uma língua
não semítica surgiram no sudoeste da Mesopotâmia (PACKER; TENNEY; WHITE.
1995). Eles eram originalmente descendentes de Jafé e haviam provavelmente
vindos das regiões do mar Cáspio e Mar Negro entre a Europa e a Ásia.

Aproximadamente por essa mesma época, surgiam no norte da África outro


grupo hoje conhecidos como os egípcios que também falavam uma língua Camita,
pois eram descendentes de Cão.

E quanto aos semitas? Bem, a região exata de origem dos descendentes


de Sem ainda é um mistério. Alguns teóricos supõem que surgiram no Oriente
Médio mais propriamente na região da moderna Síria e Líbano por volta do quarto
milênio a.C. e dali partiram para povoar o que hoje conhecemos como o Sudoeste
da Arábia até ao chifre da África (Etiópia). Outros acrescentam a esta hipótese uma
introdução dos semitas (ou até mesmo sua origem) na Mesopotâmia, onde
conviveram com seus irmãos jafetitas (KITCHEN et al., 2009).

82
Figura 4

Então em algum momento concomitante ou depois do incidente em Babel,


eles desenvolveram uma espécie de idioma protossemítico que posteriormente se
tornou semítico e perpetrou para vários outros idiomas conforme relacionados
acima.

Ao que tudo indica a mais antiga língua semítica de que temos notícia seria
o acadiano falado pelos povos de Kish que migraram e dominaram a região
mesopotâmica antes governada por sumérios não semitas (que, é claro, falavam
um idioma isolado). Aliás, é importante desacar que a Mesopotâmia tornou-se o
centro geográfico de muitos impérios dominantes do Oriente Medio e outras terras
além. Entre estes inclue-se o império acadiano (2335-2154 a.C.), o neo-sumeriano
(2119-2004 a.C.), o antigo império assírio (2035-1750 a.C.), o império babilînico
(1792-1740 a.C.), o médio império assírio (1365-1020 a.C.), o neo-império assírio
(911-605 a.C.) e, finalmente, o neo-império babilônico (605-538 a.C.).

Voltando ao ano 2700 a.C., durante esse período, outro povo de fala
semita, os eblaítas apareceram no relato histórico originários do norte da Síria
fundando o reino de Ebla cuja língua era correlata ao acadiano da Mesopotâmia.

83
Note que os acadianos, assírios e eblaítas foram os primeiros povos
semitas a utilizar a escrita, utilizando-se dos caracteres cuneiformes desenvolvidos
pelos sumérios há um bom tempo. Aliás, não somente a escrita, mas a roda, a
agricultura e a cidade foram todas invenções dos sumérios antes mesmo do
nascimento de Abraão, o pai do povo hebreu.Veja abaixo a evolução da escrita na
Mesopotâmia.

Figura 5

E o hebraico? Como ele surge nesta trajetória? Esse é o ponto. Embora


existam várias teorias, o fato é que não sabemos ao certo se Abraão e seu clã
84
trouxeram essa língua desde sua terra natal, Ur, ou se a adotaram depois de se
instalarem na região de Canaã.

Embora na Idade Média muitos eruditos judeus defendessem que o


hebraico era a língua original falada no Éden e que Abraão já a conhecia por
revelação divina. Hoje a maioria dos linguístas não pensa mais assim. Ao que tudo
indica, Abraão falava aramaico, pois a Bíblia o conecta com Haran e Jacó foi até
designado como Arameu em Deuteronômio 26:5. Uns poucos linguístas, no
entanto, sugerem que Abraão falava árabe ou um dialeto arábico.

Considerando ainda que Israel era um conglomerado de doze diferentes


tribos, era de se esperar que sua fala encontrasse diferenças dialéticas como, de
fato, vemos no episódio de Juízes 12:6 em que os efraimitas não podiam
pronunciar bem a letra ‫( ש‬shin).

Os indicadores atuais mostram que o hebraico deveria ser algum dialeto


desenvolvido aos poucos depois do Êxodo, por ocasião do assentamento dos
hebreus na terra de Canaã. Os mais antigos textos semitas que temos escritos em
hebraico datam do segundo milênio a.C..

Assim, o hebraico é classificado nesta fase original como uma língua


semítico-cananita juntamente com o feníncio. Para alguns, ela teria se
desenvolvido como língua independente apenas por volta de 1050 a.C., nos
tempos do reino unificado de Israel (HOFFMAN, 2006). Esta afirmação se baseia
na mais antiga inscrição hebraica não bíblica de que se tm notícia – um pedaço de
cerâmica encontrado em Khirbet Qeiyafa, contendo algumas letras que os
especialistas dizem ser uma forma primitiva do idioma hebraico.

Não obstante, contrário a essa teoria, temos o fato de que num diálogo
citado no Gênesis, Labão parece se expressar em siríaco ou aramaico e Jacó
responde em hebraico (Gên 31:47). Seria algo literal ou um editor posterior a
Moisés havia atualizado o texto? Difícil saber. De qualquer modo, é notório que

85
ainda que o hebraico escrito tenha se desenvolvido apenas nesta época não era
incomum nos tempos antigos que um idioma primeiro fosse por gerações
transmitido apenas de forma oral, antecipando assim, em muito séculos sua
existência em relação à forma escrita que hoje conhecemos.

Nesta época, é claro, o alfabeto já havia sido inventado. Ao que tudo indica
ele fora desenvolvido por trabalhadores braçais de origem semítica que viviam no
Egito (coincidentemente os hebreus se encaixam com essa descrição). Então os
fenícios – outro povo de origem semita – espalhou uma forma evoluída do alfabeto
através de sua cultura marítima e comercial. Em pouco tempo o alfabeto se tornou
mais prático que a forma silábica dos idiomas mesopotâmicos. O hebraico escrito
surge desta evolução linguística.

86
Figura 5

O hebraico escrito e falado pode também ter sido a forma literária de um


dialeto muito conservador usado em Jerusalém por volta do ano 900 a.C.. E, seja
como for, ele mostrou poucas mudanças até à vinda do exílio na Babilônia durante
o VI século a.C..Porém, depois deste episódio, as coisas parecem ter mudado.

Uma vez levados ao cativeiro da Babilônia, os hebreus (agora chamados


apenas de “judeus”) perderam a fluência do hebraico como língua falada no dia a
dia. Em seu lugar começaram a utilizar-se do aramaico que era uma das principais
línguas da Babilônia e a língua franca usada no comércio e nas relações

87
internacionais.Em II Reis 18:26 é dito: “Então Eliaquim, filho de Hilquias, Chebna e
Joá, disseram ao oficial assírio: ‘fala-nos em aramaico, porque nós
compreendemos. Não nos fale em hebraico, porque os que estão por cima da
muralha podem ouvir-nos” (CF. ISAIAS 36:11).

Já em Neemias 13:24, escrito depois do cativeiro babilônico, temos a


demonstração de outra realidade: “A metade dos seus filhos falava a língua de
Asdode ou de outro povo e eles não sabiam falar a língua judaica”. Isso foi 430
anos a.C..

Ainda no livro de Neemias 8:7 – 12 temos a leitura pública da lei de Deus


interpretada ou traduzida por alguns levitas (certamente para o aramaico), de modo
que o povo agora podia entender o seu sentido.

Assim, o hebraico ficou restrito maiormente às cerimônias religiosas do


templo e à sinagoga por ser considerado a língua sagrada dos judeus. Mas no dia
a dia, o aramaico era a língua comum usada pelo povo, inclusive nos tempos de
Jesus.

O aramaico havia sido a língua fomal do império babilônico nos tempos do


exílio judeu. Seu nome deiva de Aram-Naharayim que quer dizer Síria ou “terras
altas” (Aram) dos dois rios (Naharayim). Os persas a adotaram como língua oficial
e os exilados judeus acabaram assimilando-a também.

Assim, após o retorno do cativeiro da Babilônia em 457 a.C., os judeus, já


não mais familiarizados com a língua hebraica, demandavam que suas Escrituras
Sagradas fossem traduzidas e interpretadas pelo idioma que eles mais usavam.
Então alguns escribas escreveram algumas traduções e paráfrases do texto bíblico
em aramaico que receberam o nome de targuns (ou targumim, conforme o pluram
em hebraico). Esses targuns eram originalmente transmitidos de forma oral e
somente depois se tornaram textos escritos. Alguns deles sobreviveram até nossos
dias.

88
Embora ambos, o aramaico e o hebraico, possuam suas diferenças, elas
eram línguas cognatas. Ambas possuíam um alfabeto de 22 consoantes. Elas não
tinham originalmente vogais, estas foram acrescentadas muito tempo depois.
Assim, as raízes dos verbos (geralmente formadas por três letras) eram deduzidas
pelo contexto. Por exemplo o verbo “escrever” era formado pelas consoantes k, t, b
que permaneciam invariáveis em sua flexão. Mas o sentido poderia ser Katab – ter
escrito; koteb – escrevendo (gerúndio); katub – está escrito; katob – escrever;
ketob – escreva ou escreve (imperativo). O contexto definirá o tempo verbal
apropriado.

Quando, após a destruição do segundo templo, os judeus foram


novamente espalhados pelo mundo, eles sentiram que o hebraico estava se
tornando ainda mais esquecido por causa do seu uso cada vez mais raro. Então na
Idade Média copistas judeus chamados de massoretas criaram um sistema de
pontos e sinais abaixo das consoantes hebraicas que funcionariam como vogais.
Esse sistema de vocalização do hebraico ficou conhecido como texto massorético
e as partes em aramaico também receberam os mesmos sinais vocálicos.

Figura 6

Tanto o aramaico como o hebraico é escritos da direita para a esquerda e


utilizam o mesmo alfabeto. Alguns acadêmicos pensam que o hebraico seria mais
antigo que o aramaico em aproximadamente 200 anos, embora ambas sejam
línguas semíticas. A base do hebraico seria algum dialeto canaanita falado,
sobretudo, nas cercanias da cidade de Salem (que mais tarde viraria Jerusalém).

89
Já o aramaico teria sua origem na Síria, mais propriamente em Damasco e seria
mais tarde usado por povos estrangeiros como os assírios e persas na sua
ocupação daquela terra. Isso fez com que o aramaico se tornasse uma língua
universal por muitos anos até ser suplantada pelo grego no IV século a.C.

O aramaico, além de ter a mesma forma de escrita que o hebraico, possui


similaridade com ele em suas flexões verbais, nominais e pronominais. Os verbos
possuem dois estados, o imperfeito (indicando ação incompleta) e o perfeito
(significando ação completada). O aramaico emprega substantivos no singular, no
dual e no plural, e possui dois gêneros, o masculino e o feminino. Difere das outras
línguas semíticas por demonstrar preferência pelo som vocálico a, e, de outros
modos, inclusive certas preferências consonantais, tais como d para z, e t para sh.

De acorcom com a New Strong’s Exaustive Concordance (1990) a Bíblia


hebraica conta com aproximadamente 8 mil diferentes palavras derivadas de 1,5
mil diferentes raízes. Embora isso não signifique que estas seriam as únicas
palavas do hebraico bíblico, é possível afirmar que que se trata de um idioma pobre
em termos de vocabulário. Só para você ter uma noção, o dicionário Aurélio Online
traz um catálogo de 435 mil palavras!

Contudo, é uma língua rica em termos de definição de assuntos teológicos.


As descrições de Deus, do paraíso e da história da humanidade na perspectiva da
salvação são bastante belas e esclarecedoras. Sua simplicidade gramatical, neste
sentido, vem para facilitar a compreensão de sua mensagem.

O hebraico quase não possui adjetivos ou pronomes pessoais, porém é


rica em advérbios. Igualmente é um idioma que praticamente não trabalha com
conceitos abstratos. Diferente do português, seus pronomes pessoais são ligados
às formas verbais como se fossem sufixos ou prefixos e, com raras exceções, não
faz uso de palavras compostas.

90
Grego

Conforme visto anteriormente, o grego foi a língua utilizada pelos autores


do Novo Testamento para transmitirem a mensagem que Deus lhe revelara.
Durante muito tempo, alguns linguistas imaginavam que o Evangelho de Mateus e
provavelmente o de João haviam sido originalmente escritos em hebraico e, então,
traduzidos para o grego. Mas hoje praticamente nenhum especialista adota essa
teoria.

De igual modo, nos séculos XVII e XVIII, vários acadêmicos tentaram


provar que o tipo de grego usado no NT seria uma espécie de “grego bíblico” sem
paralelo com outras formas do grego utilizado pelos filósofos, poetas e escritores
de origem helênica.

O gramático A.T. Robertson (1919) afirma que, naquela época, o grego do


Novo Testamento chegou a ser considerado o “idioma do Espírito Santo”,
moldando uma língua conhecida para se tornar única e nova. Uma maneira divina
de formatar conceitos e expressões já existentes com o fim de dar-lhes um
significado próprio, em acordo com a revelação cristã.

Isso em parte é verdade. Algumas palavras gregas que aparecem no NT


são conceituadas de um modo bem diferente daquele usado originalmente no
grego de Alexandria ou Atenas. Também é verdade que o grego da LXX e o
hebraico do AT influenciaram bastante o texto neotestamentário.

Uma prova disso é a presença de hebraísmos e aramaismos no texto do Novo


Testamento. Ou seja, vocabulários e expressões idiomáticas não gregas mas
hebraicas e aramaicas que se encontram no texto do NT.

91
Substantivos comuns como “Manon” (Mat 6:24; Luc. 16:9), “abba” (Marcos
14:36) e “corban” (Mat 7:11) aparecem algumas vezes nos Evangelhos. O mesmo
se pode dizer de nomes próprios como “Getsemane” (Mat 26:36; Marcos 14:32) e
“Tabita” (Atos 9:36, 40) que são tanto hebraicos quanto aramaicos. A palavra
raboni (Marcos 10:51), corretamente chamada de “hebraica” em João 20:16
(KUTSCHER, 1977).

Do mesmo modo, palavras definitivamente aramaicas podem ser vistas em


expressões como: “talitha koum” (Marcos 5:41); “Eloi Eloi, lema sabactani” (Marcos
15:34); “maran atha” (I COR 16:22).

No que diz respeito a expressões idiomáticas do hebraico ou aramaico que


são usadas no texto grego do NT, temos alguns casos interessantes. Por questão
de espaço e propósito desta lição, vamos lidar com apenas um deles. Lucas 15:18-
22 diz:

18 Levantar-me-ei, irei ter com meu pai e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o
céu e diante de ti;
19 já não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus
empregados.
20 Levantou-se, pois, e foi para seu pai. Estando ele ainda longe, seu pai
o viu, encheu-se de compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o
beijou.
21 Disse-lhe o filho: Pai, pequei conta o céu e diante de ti; já não sou
digno de ser chamado teu filho.
22 Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa, e
vesti-lha, e ponde-lhe um anel no dedo e alparcas nos pés;

Em seu desespero o filho pródigo pensa consigo de ir ter com seu pai. Sua
expressão “pequei contra o céu e diante de ti” é inteiramente hebraica. Não fazia
sentido na mentalidade grega alguém pecar contra o céu. Neste caso, “céu” seria
um eufemismo para “Deus”. “Enche-se de compaixão” também é um hebraísmo
considerando que a compaixão não seria algo abstrato, como era para os gregos,
mas um sentimento “concreto” capaz de preencher o corpo de uma pessoa.

92
Do mesmo modo, diferente do que está na tradução em português, não é
dito no original que o pai ordenou colocarem um anel no “dedo” do filho, mas sim
“na sua mão”. Ora era em hebraico (e não no grego comum) que se dizia colocar
um anel na mão ao invés de colocá-lo no dedo de uma pessoa (Cf. Gên 41:42).

Em termos de conceitos ou redefinição de significados, Mateus 10:28, por


exemplo, traz as seguintes palavras de Jesus acerca da alma humana: “E não
temais os que matam o corpo, e não podem matar a alma; temei antes aquele
que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo”. Aparentemente
Jesus estaria fazendo eco à ideia de alma imortal que não é partilhada no
pensamento hebraico, pois ele descreve uma situação pós-morte em que a alma é
condenada. Na visão do AT a alma deixa de existir quando o corpo desaparece.
Não existe a ideia de uma alma queimando no fogo do inferno – isso é uma criação
dos gregos inspirados em certos conceitos do mundo persa.

Contudo, se olharmos atentamente o texto, observamos que Jesus não


está endossando o pensamento grego, mas questionando-o ao apresentar um
conceito mais próximo do pensamento hebraico. Ele fala de uma alma que
juntamente com o corpo pode perecer. No pensamento grego a alma nunca
perece, ela vive eternamente no paraíso dos campos elísios ou no sofrimento do
inferno chamado aqui de tártaros. Mateus captou bem o sentido que Jesus queria
dar, considerando que o Mestre estaria falando em aramaico ou hebraico. Mas ao
traduzir as palavras do Senhor para o grego, o evangelista modificou o sentido
original da palavra “alma” no mundo helênico, dando-lhe uma conotação mais em
harmonia com a doutrina do AT.

Apesar disso, não se pode dizer que o grego do Novo Testamento seja
inteiramente uma espécie de “grego bíblico” como pensavam muitos autores do
passado. Hoje se sabe que o grego do NT era um dialeto do grego clássico
conhecido como Koiné, isto é, o grego “comum”.

93
Essa variação do grego surgiu dentro dos exércitos de Alexandre o
Grande, à medida que seus soldados entravam em contato com outras culturas,
especialmente do Egito e da Mesopotâmia (ANDREOTIS, 1995).

Em termos gerais é possível dizer que as diferenças básicas entre o koiné


e outras formas da língua grega é que ele seria um idioma mais prático que
acadêmico, colocando mais ênfase na claridade que na eloquência. Sua gramática
era mais simplificada com poucas exceções em comparação ao clássico e ao ático.
A construção de sentenças, as inflexões e as desinências eram simplificadas de
modo que o grego koiné pudesse se tornar uma linguagem do povo, um idioma de
vida e não de livros complexos (ROBERTSON, 1919).

94
A TRANSMISSÃO DO
TEXTO
BÍBLICO

3
CONHECIMENTO

Conhecer os aspectos relevantes da Introdução à Bíblia com ênfase no


estudo da Transmissão do Texto Biblico.

HABILIDADE

Ser capaz de compreender e interpretar textos sobre o tema bem como,


fazer exposição escrita, pública em eventos, palestras, seminários em ambiente
acadêmico e religioso acerca do tema.

ATITUDE

Buscar desenvolver e exercitar capacidade reflexiva crítica acerca do objeto


estudado e incorporá-la na sua práxis acadêmica e religiosa.

95
Períodos Bíblicos

A história da preservação manuscrita do texto Bíblico pode ser dividida em


etapas para facilitar a compreensão desta trajetória desde os tempos em que o
texto foi produzido até os nossos dias. Em suma podemos apontar os seguintes
períodos de desenvolvimento histórico da crítica textual, com destaque para o NT:

1) Reduplicação (até 325)

2) Padronização (325-1500)

3) Cristalização (1500-1648)

4) Crítica e revisão (1648 até o presente).

Período de reduplicação (até 325)

Após a morte de Alexandre, o Grande, em 323 d.C., a cidade de Alexandria


se tornou um grande centro de estudos e conhecimento intelectual. Sua biblioteca
era a maior do mundo antigo e sua cultura rivalizava-se com a de Atenas.

Sendo assim, os intelectuais alexandrinos se dispuseram a colecionar ali


todos os livros produzidos no mundo inteiro e seria importante que os mesmos
estivessem escritos em grego para que todos os letrados pudessem ler. O grego,
lembramos, era a língua universal neste período. Foi neste contexto que abriu-se a
oportunidade para que judeus moradores da cidade produzissem a versão grega
das Escituras chamada Septuaginta (LXX) e que você já conheceu. Ela foi
produzida entre 280 e 150 a.C.

Ao que tudo indica o fato de os cristãos usarem largamente a LXX, fez com
que os judeus se empenhassem na elaboração de outras traduções gregas do AT.
Hoje conhecemos pelo menos três delas que poderiam ser traduções diretas ou
reelaborações de outras traduções já existentes, que remontam a este período:

96
Áquila de Sinope (ca. 130 d.C.) – foi estudante do Rabino Áquiba e
desenvolveu uma tradução bastante literal do texto hebraico que muitas vezes se
tornava ininteligível aos falantes da língua grega. Acredita-se que esta versão de
Áquila foi muito usada nas sinagogas em lugar da LXX. Os cristãos, contudo, não a
apreciavam muito, embora Jerônimo e Origens falassem muito bem dela.

Símaco, o Ebionita (ca. 170 d.C.) – este fez uma tradução bastante fiel do
AT, mas num grego elegantíssimo. Apesar do título de “ebionita” dado por Eusébio,
acredita-se que, na verdade, ele seria um samaritano convertido ao judaísmo.

Teodocião (ca. 180 d.C.) – um prosélito convertido ao judaísmo que


conseguiu produzir uma versão apreciada tanto por judeus, como por cristãos. Há
quem pense que ele empenhou-se numa revisão da LXX tomando por base o texto
hebraico.

De todas essas obras apenas fragmentos e citações sobreviveram até os


nossos dias. Por essa razão, muitos acadêmicos apostam na existência de outras
versões, das quais nem tomamos conhecimento.

Ao mesmo tempo em que estas várias traduções eram feitas, os estudiosos


de Alexandria tentavam restaurar antigos textos de poetas e pensadores gregos
que corriam o risco de se perderem. Assim nasceu com eles o primeiro trabalho de
crítica textual de que temos notícia. Munidos de várias cópias era sua intenção
restaurar os textos originais como saíram das mãos de autores tais como Sócrates,
Platão e Aristóteles. A destruição da Biblioteca com seus 700 mil volumes, ocorrida
no século VII d.C., trouxe um tremendo prejuízo intelectual para a humanidade.

Com o passar dos anos, Alexandria também se tornou um reduto de


cristãos convertidos do judaísmo helenista, posição que conservou até à chegada
dos conquistadores mulçumanos no século VII d.C.. Assim, é possível que

97
Alexandria tenha se tornado também o centro da atividade intelectual cristã, na
tentativa de preservar o texto bíblico antes de 325 d.C., embora, não encontremos
nenhuma crítica textual do NT durante esse tempo. O período foi mais de
reduplicação dos manuscritos que avaliação de textos.

Enquanto isso, judeus que moravam na Galileia de 70-100 d.C. efetuaram


diligente trabalho textual no AT. De igual modo, copistas cristãos, próximos ao ano
100 d.C., mui provavelmente, fizeram cópias de manuscritos do NT que queriam
que fossem preservados. Provavelmente o texto original (chamado de autógrafo)
serviu como fonte desta duplicação.

Até o presente momento, nenhuma destas cópias chegou até nós, de modo
que sua existência, embora provável, ainda é hipotética. A qualidade de uma cópia,
é claro, dependia da competência e profissionalismo do escriba que a produziu. Um
trabalho dessa natureza não saia barato.

A partir de 150 até 325 d.C., a chance de um copista cristão usar um texto
original como padrão diminuiu acentuadamente. Então as cópias de autógrafos
deram lugar a cópias de outras cópias.

Mas não pense que era um período calmo para a igreja. Além de
enfrentarem oposições esporádicas e mais localizadas, os cristãos amargaram
duas grandes perseguições durante o reinado de Décio e Diocleciano. Possuir uma
cópia da Bíblia ou do Novo Testamento tornou-se um crime punido com a morte.
Centenas de cópias foram confiscadas e destruídas pelos romanos de modo que,
por pouco, nenhum exemplar da Bíblia teria sobrevivido até os nossos dias.

Como consequência desta condição hostil, alguns cistãos se viram


obrigados a copiar as Escrituras de modo apressado usando quaisquer
manuscritos que possuíam. Muitos deles eram copistas amadores, pois os

98
profissionais, além de cobrarem caro, não queriam correr o risco de serem mortos
por ordem imperial. Numa situação como esta, ficava mais fácil surgirem erros nos
manuscritos que eram copiados.

Enquanto isso, os cristãos de Alexandria, seguindo o exemplo de outros


copistas da cidade, iniciaram entre 200 e 250 dC., um trabalho pioneiro de
comparação textual entre os manuscritos. O exemplo foi seguido em outras partes
do Império, de modo que se criou um trabalho básico de crítica textual, quando,
então, se deu a perseguição do imperador Décio (249-251).

Um destaque deste período foi a obra de Orígenes (185-284 d.C.) em


Alexandria. Ele escreveu cerca de 50 volumes da chamada Hexapla, que devido à
enorme quantidade de páginas, jamais viesse a ser publicada integralmente. A
Hexapla (sentido “sexto”) foi uma edição do Antigo Testamento em seis diferentes
versões alinhadas lado a lado.

Seu objetivo esta estabelecer o conteúdo bíblico do AT de um modo


minimamente científico (dentro do que podia se considerar ciência na época). Ela
consistia do texto hebraico do Antigo Testamento, da sua transliteração em letras
gregas e as quatro versões gregas que circulavam naquela época: a de Áquila, a
de Símaco, a Septuaginta e a tradução de Teódocião.

Além da Hexapla, Origenes escreveu vários comentários sobre o Novo


Testamento que fizeram dele uma espécie de crítico textual. Sua obra teve
signigicativa influência no texto do AT e em diversos manuscritos importantes como
o códice Sinaítico. Mas hoje temos apenas fragmentos do que originalmente
contava com mais de 6 mil páginas.

99
Período da Unificação Textual (325-1500)

Com a suposta conversão do imperador Constantino para o cristianismo, a


Igreja entrou numa nova fase de conforto social, desfrutando o fim das
perseguições. Tal situação influenciou em certa medida o processo de cópia dos
manuscritos bíblicos.

Uma das primeiras atitudes do imperador romano foi solicitar ao teólogo e


historiador Eusébio de Cesareia que providenciasse a cópia de 50 exemplares da
Bíblia, possivelmente para compensar a lacuna deixada pela perseguição de
Diocleciano que destruiu centenas de manuscritos bíblicos.

Este foi um período de padronização textual onde, especialmente o Novo


Testamento começou a ser copiado por escribas profissionais financiados pelo
império. O trabalho era feito com cuidado e fidelidade a partir de manuscritos que
sobreviveram à destruição ordenada por Diocleciano.

O texto de uma região era copiado por escribas dessa região. Assim,
podemos perceber uma gradual integração dos textos, resultante da comparação
entre diferentes manuscritos e a efetiva obtenção de um tipo textual que não
tivesse tantas variantes. Os textos locais foram, aos poucos, cedendo lugar a um
texto único.

Quando Constantino transferiu a sede do Império para a cidade que levou


seu próprio nome (Constantinopla), seria bem razoável supor que tal cidade
haveria de dominar o mundo de fala grega, e que seus textos escriturísticos
haveriam de tornar-se os textos predominantes para a igreja. Foi o que ocorreu,
sobretudo tendo em mente o patrocínio do imperador, que mandou produzir cópias
cuidadosas do texto do Novo Testamento.

100
Em decorrência do precedente aberto por Constantino, aumentou-se cada
vez mais o número de manuscritos copiados de modo mais profissional e
cuidadoso. Todavia, revisões oficiais, planejadas com o máximo cuidado, eram
relativamente raras de modo que não procede afirmar que houve manipulação
textual por parte do império ou mesmo da cúpula da igreja. Prova disso reside no
fato de que grandes ensinos eclesiásticos da época jamais tiveram apoio
escriturístico para suas alegações, como por exemplo, a assunção de Maria, a
intercessão dos santos ou o celibato dos sacerdotes.

As revisões ou recensões textuais podem ser definidas, pelo menos


genericamente, como a apreciação crítica de uma obra literária ou de um texto. No
caso dos manuscritos bíblicos é a alteração consciente e sistemática de uma cópia
em grego ou latim seguindo princípios precisos e com um objetivo bem definido –
corrigir imperfeições. Pode-se, por exemplo, planejar a adaptação de um texto
grego existente para torna-lo mais semelhante ao original hebraico ou numa versão
em que o estilo foi adaptado para torna-lo mais moderado e adaptado às
características linguísticas de uma determinada época ou região.

Visto que assim se desenvolveu a padronização do texto, houve pouca


necessidade de classificar, avaliar e criticar os primeiros manuscritos do Novo
Testamento. O resultado foi que o texto bíblico permaneceu relativamente intocado
por todo o período. Mais ou menos no fim dessa época, tornou-se possível a total
padronização do texto, havendo ilimitado número de exemplares mais ou menos
idênticos, mediante a introdução de papel barato e da imprensa. Os exemplares da
Bíblia impressos em papel tornaram-se mais abundantes depois do século XII. Por
volta de 1454, Johann Gutenberg desenvolveu o sistema de tipos móveis para a
imprensa, e assim abriu a porta para os esforços favoráveis a uma crítica mais
cuidadosa do texto, durante a era da Reforma Protestante.

101
O período das Impressões (1500-1648)

No período da Reforma, após a invenção da imprensa, o texto bíblico


entrou num período de formatação gráfica, assumindo a forma impressa em lugar
da manuscrita. Envidaram-se esforços no sentido de se publicarem textos
impressos da Bíblia com a maior precisão possível. Com frequência esses textos
eram publicados em vários idiomas, ao mesmo tempo, incluindo edições bilíngues
como a “Poliglota complutense” (1514-17), a “Poliglota de Antuérpia” (1569-72), a
“Poliglota de Paris” (1629-45) e a “Poliglota de Londres” (1657-69). Publicou-se
também nesse período (ca. 1525) uma edição modelo do Texto massorético, sob a
direção editorial de um certo judeu chamado Jacob ben Chayyim, que se
convertera ao cristianismo. O texto se baseava em manuscritos que datavam do
século XIV. Assim surgiram cópias da Bíblia hebraica, tanto em forma manuscrita
como impressa.

O cardeal Francisco Ximenes (1437-1517), da Espanha, intentou lançar


uma primeira edição impressa do Novo Testamento grego, que haveria de sair do
prelo em 1502. Conquanto fosse o primeiro Novo Testamento impresso, não foi o
primeiro a ser colocado no mercado. O papa Leão X não emitiu o imprimatur senão
em março de 1520, o que causou um atraso no lançamento.

Neste ínterim, surgiu na Europa em 1516 o chamado Textus Receptus (ou


Texto Recebido), uma conhecida versão grega do Novo Testamento que, como o
próprio nome diz, arvorava ter sido uma dádiva de Deus aos homens.

A denominação “Textus Receptus” tem sua origem no prefácio da edição


de 1633 (dos irmãos Bonnaventura e Abraão Elzevir) que diz em latim: Textum
ergo habes nunc ab omnibus receptum, in quo nihil immutatum aut corruptum
damus (Tens, portanto, o texto agora recebido por todos, no qual nada oferecemos
de alterado ou corrupto).

O Textus Receptus trata, na verdade de uma série de impressões,


em grego, do Novo Testamento, que serviu de base para diversas traduções dos
séculos XVI ao XIX, como a Bíblia de Lutero, a Bíblia Rei James e para a maioria
das traduções do Novo Testamento da Reforma Protestante, inclusive a
tradução portuguesa de João Ferreira de Almeida.

102
A primeira compilação deste texto foi executada pelo filósofo e
humanista holandês Erasmo de Roterdã que em 1514 já havia combinado o
impressor Johann Froben, da Basileia, fazer um lançamento deste livro. Ele então
viajou no ano seguinte, a fim de procurar manuscritos gregos que pudessem ficar
em paralelo com uma tradução latina feita por ele mesmo.

Embora os manuscritos que Erasmo encontrou precisassem de revisão,


isso não o impediu de prosseguir em seu trabalho. Em tempo recorde, sua primeira
edição foi publicada em março de 1516. Mas a pressa resultou em que a obra
continha numerosos erros, tanto de natureza tipográfica como mecânica. Além
disso, os textos nos quais Erasmo se baseou não haviam passado por uma revisão
crítica, de modo que não eram muito confiáveis. A própria receptividade dada à
edição de Erasmo do Novo Testamento em grego teve natureza mista (METZGER,
1968).

Por causa disso, em apenas três anos após a primeira tiragem foi
necessário publicar uma nova edição. E depois dela, várias outras publicadas tanto
pelo próprio Erasmo, como por Beza, Estienne, e outros. Deve-se ressaltar, no
entanto, que, apesar de todas as pesquisas e revisões dos textos gregos nas
diversas edições do Textus Receptus, entre a primeira edição de Erasmo em 1516
e a edição dos Elzevirs em 1633, é possível encontrar uma diferença de menos de
300 palavras em 140.000 que compõem o Novo Testamento, ou seja, apenas
0,002% do total.

Roberto Estéfano, impressor da corte real em Paris, publicou o Novo


Testamento grego em 1546, em 1549, em 1550 e em 1551. A terceira edição
(1550) foi a primeira edição que continha um aparato crítico, ainda que fossem
meros quinze manuscritos. Essa edição baseou-se na quarta edição de Erasmo, e
foi a base do Textus receptus. Sendo publicada, essa terceira edição haveria de
tornar-se o principal texto da Inglaterra. Em sua quarta edição, Estéfano divulgou
sua conversão ao protestantismo e implantou a divisão do texto em versículos.

103
O período de crítica e de revisão (1648 até o presente)

No encerramento da era da Reforma, a Bíblia passou por um período de


críticas e revisões textuais, procurando ao máximo a apresentação impressa do
texto bíblico conforme saiu das mãos de seus autores.

De 1648 a 1831, temos uma reunião e classificação de manuscritos


bíblicos seguindo padrões acadêmicos de identificação textual. Brian Walton (1600-
1661) editou a Poliglota de Londres, incluindo os textos paralelos da edição de
Estéfano, de 1550. Essa obra poliglota continha o Novo Testamento em grego, em
latim, em sírio, em etíope, em árabe e em persa (os evangelhos). Nas anotações
apareceram os vários textos paralelos então recentemente descobertos como o
Códice alexandrino (A) e um aparato crítico feito pelo arcebispo Usher.

Em 1675 John Fell (1625-1686) publicou uma edição anônima do Novo


Testamento grego em Oxford que trazia evidências, pela primeira vez, das Versões
gótica e boaírica. Então, em 1707, John Mill (1645-1707) reimprimiu o texto de
Estéfano, de 1550, e acrescentou cerca de 30 000 variantos tiradas de quase cem
outros manuscritos. Essa obra foi uma contribuição monumental para os estudiosos
subsequentes, porque lhes proporcionou uma base ampla de evidências textuais
confiáveis.

Uma importante contribuição veio do trabalho editorial de Johann Jakob


Griesbach (1745-1812). Ele classificou os manuscritos do Novo Testamento em
três grupos (alexandrinos, ocidentais e bizantinos), e lançou os alicerces de todo o
trabalho subsequente do Novo Testamento grego. Em sua obra, Griesbach
estabeleceu quinze cânones de crítica textual. Em seguida ao lançamento da
primeira edição do seu Novo Testamento (1775-1777), vários outros estudiosos
publicaram comparações entre diferentes manuscritos que aumentaram
enormemente a disponibilidade de evidências textuais oriundas dos pais da igreja,
das primeiras versões e do texto grego.

Dois estudiosos de Cambridge, Brooke Foss Westcott (1825-1901) e


Fenton John Anthony Hort (1828-1892), também se destacam por suas

104
contribuições ao estudo do texto do Novo Testamento. Juntos, eles publicaram em
1881 e 1882 a obra The New Testament in the Original Greek, em dois volumes.

O texto dessa obra ficou à disposição de uma comissão de revisão que


produziu o English revised New Testament em 1881. O emprego de seu texto na
versão inglesa revisada aumentou a aceitação de seu texto crítico. No entanto,
alguns estudiosos defensores do Textus Receptus de Erasmo não pouparam
esforços na argumentação contra o texto de Westcott e de Hort.

Uma famosa hipótese textual chamada "teoria genealógica" foi


apresentada por Westcott e de Hort á comunidade acadêmica. Eles propunham
dividir os manuscritos bíblicos em quatro tipos: siríacos, ocidentais, neutros e
alexandrinos. O tipo siríaco de texto inclui os textos siríacos propriamente ditos, os
antioquinos e os bizantinos, como A, E, F, G, H, s, v, z e a maior parte dos
minúsculos. O tipo ocidental de texto para Westcott e para Hort tinha raízes na
igreja síria, mas havia sido levado mais longe, na direção do Ocidente. De acordo
com Westcott e Hort, houve um ancestral comum (‫ )א‬na raiz do texto neutro e do
alexandrino, que teria sido primitivo e muito puro.

Hoje, as mais recentes comparações dos diferentes manuscritos do NT


estão disponíveis nas obras de Eberhard Nestle, Novum Testamentum Graece e no
The Greek New Testament, da United Bible Societies, editada por K. Alamd e
outros. Em geral essas obras fazem uma classificação minunciosa dos manuscritos
e questiona a autoridade do Textus Receptus.

O Novo Testamento Grego, normalmente, traz uma folha com o chamado


Aparato Crítico que constitui um conjunto de sinais específicos, indicando as
mudanças que copistas, algumas vezes intencionalmente, porém, muitas outras
despercebidamente introduziram no texto que estavam copiando. É papel
primordial da Crítica Textual, detectar estas variantes textuais, “purificando” o texto
das omissões, mudanças ou acréscimos que por acaso tenham aparecido.

105
Quanto ao Antigo Testamento, o estudo crítico do texto hebraico das
Escrituras começou no final do século XVIII. Benjamin Kennicott publicou em
Oxford (em 1776-1780) o texto de mais de 600 manuscritos hebraicos,
massoréticos, e o perito italiano Giambernardo de Rossi publicou em Parma as
comparações de 731 manuscritos, entre 1784 e 1798. Textos padrões das
Escrituras Hebraicas foram também produzidos pelo perito alemão Baer, e, mais
posteriormente, por C. D. Ginsburg.

Rudolf Kittel, hebraísta, lançou em 1906 a primeira edição da sua Biblia


Hebraica, fornecendo nela um estudo textual por meio de notas de rodapé, que
comparam muitos manuscritos hebraicos do texto massorético. O texto básico
usado por ele foi o texto de Ben Chayyim. Mas, quando os mais antigos e
superiores textos massoréticos de Ben Asher se tornaram disponíveis, Kittel
empreendeu a produção de uma terceira edição, inteiramente nova, que após a
sua morte foi completada por seus colegas.

Ainda sobre o Antigo Testamento e sua transmissão, não podemos concluir


essa parte sem apresentar, de modo suscinto a impotante descoberta dos
Manuscritos do Mar Morto. Esse achado foi talvez o maior acontecimento
arqueológico do século 20.

Embora o Antigo Testamento, assim como o Novo, contasse com uma


enorme quantidade de manuscritos gregos e hebraicos em favor de sua
econstrução, havia um problema que parecia insolúvel até à vista dos acadêmicos
mais otimistas: com exceção de um fragmento do papiro Nash datado do I século
a.C., as cópias hebraicas que possuíamos datavam do século X d.C..

Assim sendo, havia um hiato de cerca de 1400 anos entre a última


produção do AT e a cópia hebraica mais antiga que tínhamos dele. Se falarmos do
início da produção bíblica, o distanciamento sobe para 2.400 anos!

106
Até que em 1947 um garoto beduíno encontrou por acidente jarros que
estavam guardados há quase dois mil anos numas grutas de Wadi Qumran, ao
noroeste do Mar Morto. Eram ao todo cerca de 800 manuscritos produzidos por
escribas judeus da seita dos essênios e, pelo menos 200 destes manuscritos, eram
bíblicos.

Entre os arqueólogos que contribuíram para a identificação e publicação


destes textos temos L. E. Sukenik, G. Lankester Harding, Roland de Vaux, Ygael
Yadin e William F. Albright.

Os manuscritos encontrados continham cópias (algumas bem


fragmentadas) de todos os livros do Antigo Testamento, com exceção de Ester.
Para se ter uma noção, uma das cópias de Isaias encontradas no local foi datada
em 270 anos a.C.. Ou seja, 1.200 anos mais velha que a cópia que tínhamos
produzida pelos massoretas. O que se descobriu foi algo fantástico: as cópias ali
encontradas confirmavam em mais de 90% o texto hebraico massorético. As
discordâncias estão em questões perífericas como troca de letras ou acréscimo de
uma ou outra palavra.

Se houvesse uma grande modificação intencional no texto por razões


teológicas, políticas ou administrativas da cúpula da igreja, essas mudanças
apareceriam na comparação entres os textos. Por exemplo, das 166 palavras
presentes em Isaías 53, apenas 17 letras estão diferentes da cópia encontrada no
Mar Morto e nenhuma delas oferece prejuído ao conteúdo bíblico. A Palavra de
Deus demonstrou ter sido bem preservada pela providência divina.

Todo esse trabalho, bastante técnico e até um tanto complexo de


comparação textual, demonstra o esforço acadêmico e “científico” de redescoberta
do texto bíblico como seria em seu estado original. A isso damos o nome de crítica
textual.

107
A Crítica Textual

Conforme dito anteriormente, Deus utilizou-se na história de vários meios


para revelar sua presença e suas verdades à humanidade. Sonhos, visões,
intervenção de anjos etc. Estes foram meios didáticos para que a verdade
chegasse a todos os homens. Contudo, a produção de um livro tornava mais
segura a preservação da verdade, de modo que Deus capacitou e inspirou homens
de diferentes épocas para que escrevessem sua revelação na forma de uma
Escritura Sagrada.

Antes de se tornar comum a impressão com tipos móveis (a partir do


século XV d.C.), os escritos originais da Bíblia e também suas cópias eram feitos a
mão. Por isso são chamados de manuscritos (do latim: manu scriptus, "escritos a
mão"). O manuscrito bíblico é, portanto, uma cópia das Escrituras, inteiras ou em
parte, feita a mão, distinta de uma cópia impressa. Os manuscritos bíblicos foram
preparados principalmente na forma de rolos e de códices.

Pois bem, com isso em mente, seria interessante gastar um tempo


estudando como o texto bíblico foi mantido e preservado até nós. Diga-se de
passagem, não existe hoje preservado nenhum manuscrito original escrito pelas
mãos de um autor bíblico (autografo). Ou seja, a carta de Paulo aos Romanos, o
livro de Isaias, o Apocalipse de João ou o Gênesis de Moisés são apenas cópias
de cópias que temos.

Foi somente em 1455, com a invenção da imprensa por Johannes


Guttenberg, que as cópias manuscritas deixaram de ser produzidas. Até então,
todos os livros da humanidade, inclusive a Bíblia Sagrada, deveriam ser copiados a
mão e isso, é claro, poderia gerar algum tipo de incompatibilidade entre o texto
original e as cópias disponíveis ao leitor.

108
Imagine, por exemplo, que um leitor estivesse ditando um texto para um
copista que está cansado. Ele poderia dizer “Zeca Roceiro” e o copista anotar “Zé
Carroceiro”. Pecebeu a diferença? Considerando que a cópia feita poderia se
tornar o texto chave para outra cópia posterior, o erro iria aos poucos se
perpetuando nas cópias seguintes. Imagine agora que centenas de copistas
pudessem cometer erros como este. O número de contradições ou variantes
textuais ir aumentar exponencialmente. Se tivéssemos os originais do livro copiado,
era fácil resolver o problema. Bastaria comparar o original com a cópia, verificar
onde houve a discrepância e corrigi-la. Mas se tudo que temos são cópias e mais
cópias, a tarefa se torna um pouco mais difícil de ser executada.

Logo, surge em meio a esta realidade a seguinte pergunta: como podemos


ter a certeza de que esses livros foram bem preservados se não temos mais o seu
original? Como certificar de que as cópias foram fidedignas e que os copistas não
alteraram tragicamente o conteúdo dado por Deus ao autor inspirado? Veja que se
houve um erro crasso, aparentemente ficaria difícil corrigi-lo se não temos os
originais para fazer uma comparação. Como então trabalham os especialistas
neste sentido?

Existe uma especialização muito importante para o estudo desta parte que
é a chamada crítica textual. O que você verá aqui, portanto, é apenas uma
introdução com o fim de familiarizá-lo com o assunto. Mas, em suma, o que
significa Crítica Textual?

Em primeiro lugar, é importante esclarecer que a palavra “crítica” ou


“criticismo”, usada neste contexto não possui um senso de negatividade ou de
acusações contra a Palavra de Deus. Tecnicamente, o criticismo bíblico seria uma
referência simples ao trabalho de acadêmicos que procuram se aproximar do texto
bíblico, avaliando criticamente seus aspectos literários com o fim de compreender
melhor seu significado e descobrir seu texto original.

A crítica textual é um ramo da filologia, cuja finalidade é a de se aproximar


o máximo possível da forma inicial de um texto cujos manuscritos originais se
perderam. Ela procura, portanto, através de rigorosas e minunciosas técnicas

109
restituir o que seria sua forma original, ou seja, aquela que saiu das mãos do autor
principal (autógrafo).

Filologia é o estudo rigoroso dos antigos documentos escritos e de sua


transmissão, com o fim de recuperar, estabelecer, interpretar e editar esses textos
na forma original como saiu das mãos de seu autor primário.

Ela também é chamada de baixa crítica ou crítica documental, pois estuda


igualmente a preservação ou alteração de antigos textos ao longo dos anos. Tudo
isso, repetimos, visando recuperar os originais com base na documentação atual,
ou seja, nas cópias disponíveis. Já a alta crítica tem como objetivo não apenas a
recuperação do texto em si, mas também outros aspectos como descobrir a autoria
ou o contexto no qual ele foi produzido.

Pois bem, uma tremenda vantagem do texto Bíblico é a quantidade imensa


de cópias que ele possui se comparado a outros clássicos da antiguidade. Só para
você ter uma noção, temos apenas dez cópias das Guerras Gaulesas de Júlio
César (58-50 a.C.), sendo que a cópia mais antiga data de 1.000 anos depois da
obra original. Vinte cópias da História Romana de Tito Lívio (59 a.C. a 17 d.C.),
com 800 anos depois de sua morte. Sete cópias das Histórias de Plínio, o moço
(61-113 d.C.) com mais de 750 anos depois dele e apenas duas cópias de Histórias
e Crônicas de Tácito (55-120 d.C.) também datadas de séculos depois do original.
A obra clássica antiga mais bem documentada é a Ilíada de Ômero que possui 643
cópias. Mesmo assim 764 linhas de texto são dúbias, ou seja, não se tem certeza
de que fizeram mesmo parte do original.

Agora veja a diferença: somente o Novo Testamento grego possui mais de


5.500 cópias feitas entre o II e o XVI século, sendo que o fragmento mais antigo (o
Papiro 52 contendo um trecho de João) fora copiado apenas 30 anos após a morte
do autor inspirado. Atualmente o especialista em Crítica Textual, Daniel Wallace,

110
afirma ter encontrado uma cópia manuscrita do Novo Testamento que seria ainda
mais antiga que o Papiro 52, hoje disposto na Biblioteca de John Rylands.

Tais números tornam-se ainda mais espantosos se incluirmos as quase


900 mil citações bíblicas feitas pelos Pais da Igreja e as versões antigas em latin,
siríaco, cópta e outras línguas mediterrâneas que juntas somam entre 20 e 25 mil
cópias manuscritas do Novo Testamento. Isto significa que somente o Novo
Testamento possui vinte mil vezes mais manuscritos que a média dos autores da
Antiguidade Clássica. Foi por isso que Isaac Newton declarou já em seu tempo:
“Há mais marcas indeléveis de autenticidade na Bíblia que em qualquer história
profana” (NEWTON apud HUTCHINSON, 2012).

Grudem, Collins e Schreiner (2013) afirmam que atualmente existem mais


de 3 mil manuscritos hebraicos do Antigo Testamento (alguns falam de 6 mil [TOV,
1992]), cerca de 8 mil manuscritos da Vulgata Latina, mais de 1,5 mil da LXX e
mais 65 mil da Siríaca Peshita. O mais antigo e extenso documento seria um rolo
de Isaias datado de 270 a.C. e encontrado entre os manuscritos do Mar Morto.

Outro antigo manuscrito contendo uma passagem bíblica é o Papiro Nash,


encontrado no Egito e preservado em Cambridge, na Inglaterra. Ele deveria ser
originalmente parte de uma coleção de admoestações, escritas no segundo ou
primeiro século a.C.. São quatro fragmentos de 24 linhas pertencentes a um texto
pré-massorético dos Dez Mandamentos e de alguns versículos de Deuteronômio,
capítulos 5 e 6.

Hoje sabemos que os massoretas da Idade Média foram meticulosos em


seu trabalho de copiar as Escrituras Judaicas. Eles se esforçavam para garantir a
confiabilidade do texto. Por isso eram altamente treinados e minuciosamente
observados, copiando cada letra, parágrafo e frase para então compará-los com o
original. Um único erro exigiria a destruição imediata do texto.

111
O Trabalho da Crítica Textual

Normalmente os especialistas costumam dividir os manuscritos bíblicos


existentes em grupos de famílias. Noutras palavras, pelo tipo, procedência e estilo
é possível dizer se um texto foi copiado na Europa, na Ásia ou no Norte da África.
A finalidade desta classificação foi descobrir a possível origem de algumas
variantes e detectar quais seriam os manuscritos mais antigos, pois estes teriam,
teoricamente, maior semelhança com os originais. Embora nem sempre o fato de
ser mais antigo indique que tal manuscrito seria melhor. Deste modo, são quatro as
principais famílias de manuscritos:

a) Bizantina com sede em Antioquia;


b) Ocidental com sede em Roma;
c) Alexandrina cam sede em Alexandria;
d) Cesareense com sede em Cesaréia.

Este procedimento técnico e o incrível número de manuscritos existentes


facilitam bastante o trabalho dos críticos textuais em busca da forma original das
Escrituras Sagradas. Seu método investigativo, semelhante ao de um detetive
policial, consiste em selecionar e comparar pacientemente as diversas versões,
famílias ou cópias existentes anotando os erros, as modificações acidentais ou
involuntárias dos copistas que poderiam eventualmente comprometer o conteúdo
do texto bíblico.

Contudo, em anos recentes um especialista chamado Bart Ehrman, famoso


professor na Universidade de Chapel Hill, tem posto em dúvida a confiabilidade da
transmissão do NT afirmando que o número de discrepância dos manuscritos seria
de 400.000. Este númeo, comparado às 135.000 palavras do texto grego do NT faz
o autor desafiar a veracidade textual da Bíblia dizendo que temos mais variantes
textuais (isto é contradições entre os manuscritos) que texto propriamente dito.

112
Mas espere um pouco, chamar as variantes textuais de contradições não é
uma equiparação precisa entre dois termos. O que Barth não menciona é que a
maioria absoluta destas variantes são elementos redacionais pequenos e sem
nenhum comprometimento com o conteúdo original. São erros de troca de letras,
ordem de palavras, a substituição de um nome próprio por um pronome pessoal,
coisas desta natureza.

Atualmente, boa parte dos especialistas em crítica Textual do Novo


Testamento admitem que 95-99% do texto original pode ser recuperado a partir da
comparação entre os antigos textos. Enquanto a já citada Iliada de Ômero tem 764
linhas de texto ainda disputadas, o Novo Testamento – a despeito do montante
tremendamente maior de cópias – conta com apenas 40 linhas dúbias. Mesmo
assim nenhuma destas traz qualquer comprometimento a uma doutrina ensinada
pelo cristianismo (GEILER; NIX, 1986).

Outro elemento menos técnico que poderíamos mencionar em favor da


transmissão fidedigna do texto bíblico seriam as pequenas incongruências
históricas que o texto apresenta. Novamente são elementos periféricos, mas que
compensa serem exemplificados. João 20:1 diz que Maria Madalena
(aparentemente sozinha) foi ao sepulcro de Jesus. Já Mateus 28:1 diz que Maria
Madalena estava acompanhada de outra mulher também chamada Maria, em
Marcos 16:1 – 2 diz que eram Maria, mãe de Jesus, Maria Madalena e Salomé as
mulheres que foram para ungir o corpo de Cristo.

Outro exemplo seria o da cura de Bartimeu. Jesus curou dois ou um cego


em Jericó? A primeira vista parece que existe uma confusão entre as narrativas,
pois os evangelistas Mateus e Marcos citam a cura de dois cegos e Lucas cita a
cura de um cego. Outras dúvidas existem no texto: afinal esta cura foi quando
Jesus entrou em Jericó ou saiu de lá? (cf. Mateus 20,29-34; Marcos 10,46-52 e
Lucas 18,35-43).

113
O ponto que nos interessa neste momento não é predicar sobre tais
incongruências, mas toma-las como argumento a favor da transmissão do texto
sagrado. Afinal, considerando que a acusação de muitos céticos é de que o texto
bíblico foi “editado” com o passar do tempo distanciando-se cada vez mais de seu
original, era de se esperar que assim sendo, essas discordâncias textuais fossem
“corrigidas” pelos copistas com o fim de fazer o texto soar menos problemático. Ou
seja, elas tenderiam a desaparecer com o tempo pois a igreja Medieval censuraria
as cópias discordantes fazendo um texto oficial – o que na verdade nunca existiu.
Portanto, é possível – desde o ponto de vista da crítica textual – tomar a versão
Bíblica e saber que temos um texto 90% igual ao que saiu das mãos do autor
inspirado e que nenhuma das incongruências são determinantes para colocar em
dúvida a legitimidade do texto transmitido.

Antes que a Bíblia fosse iniciada, os hebreus contavam com uma tradição
oral passada de pai para filho. Contudo, mesmo com o advento da Revelação
escrita dada aos profetas, a tradição oral permaneceu em uso no judaísmo e isso
perdurou até aos tempos de Cristo.

O problema estava em que a tradição oral não era uma fonte


inquestionável de verdades reveladas, pois ela estava mais sujeita à distorção que
o texto escrito. E distorções poderiam ocorrer mesmo num povo acostumado a
repassar verdades orais de geração em geração. Ademais, com o fim do cativeiro
Babilônico, tradições desnecessárias e até contraditórias ao texto bíblico
permearam a religião dos judeus através de grupos como os escribas e fariseus.

Os rabinos citavam a tradição como autoridade para interpretar a lei. Em


contraste com isso, Jesus falou por sua autoridade como legislador. A expressão
“eu, porém, vos digo” foi usada pelo Mestre várias vezes (cf. Mat. 5:21-44).

Certa feita, ele disse aos guias do judaísmo de seu tempo: “Negligenciando
o mandamento de Deus, guardais a tradição dos homens. E disse-lhes ainda:

114
Jeitosamente rejeitais o preceito de Deus para guardardes a vossa própria tradição.
Pois Moisés disse: Honra a teu pai e a tua mãe; e: Quem maldisser a seu pai ou a
sua mãe seja punido de morte. Vós, porém, dizeis: Se um homem disser a seu pai
ou a sua mãe: Aquilo que podereis aproveitar de mim é Corbã, isto é, oferta para o
Senhor, então, o dispensais de fazer qualquer coisa em favor de seu pai ou de sua
mãe, invalidando a palavra de Deus pela vossa própria tradição, que vós mesmos
transmitistes; e fazeis muitas outras coisas semelhantes” (Mc 7.8-13, cf. Mat. 15:1-
9).

Assim, nos dias de Cristo, havia uma tensão entre a autoridade da tradição
oral e a Escritura Revelada por Deus. A aristocracia sacerdotal formada pelos
saduceus controlava o acesso à biblioteca do Templo e aos escritos sagrados. Eles
eram, contudo, liberais em muitos aspectos e sua autoridade era a mais ameaçada
pela tradição oral. Por outro lado, grupos como dos fariseus eram majoritariamente
compostos por classes mais simples do povo – esses, sim, investiam na tradição
oral como meio de dominarem e determinarem o comportamento das massas.

Com o passar do tempo a ideologia da tradição oral continou persistindo no


judaísmo rabínico mesmo depois da destruição do Templo e de Jerusalém no ano
70 d.C. pelas milícias romanas. Mas seu comportamento era um tanto contraditório
pois eles diziam reconhecer a autoridade da palavra Escrita de Deus. Contudo, a
voz de um rabino vivo tinha valor igual ou superior aos textos proféticos do AT.

O cristianismo, coincidentemente, também emergiu das classes sociais


mais simples de Israel – justamente aquelas dominadas pelos rabinos e fariseus.
Seus seguidores, no entanto, por alguma razão foram motivados a valorizar mais a
Palavra Escrita e, em virtude disso, resolveram os textos que hoje chamamos de
Novo Testamento.

Sua produção literária, porém, contou com um fator novo: eles rapidamente
adotaram o códex (ou códice) – uma forma de livro diferente do rolo usado pelos

115
judeus e que se assemelha muito aos cadernos que usamos em nossos dias.
Códices com folhas retangulares costuradas ao meio começaram, então, a surgir
no I século d.C. e se tornaram muito comuns em meados do IV século.

A vantagem do códice, além da facilidade de transporte, é que ele poderia


comportar mais os escritos que o rolo de pergaminho. Além disso, era mais fácil
descobrir uma passagem folheando o texto que desenrolando-o até achar a citação
desejada.

No ato de conter uma coleção de rolos num só caderno, o códex também


definiu a organização e a ordem de um conjunto de livros que mais tarde formariam
o cânon. Assim, a Bíblia tornou-se aos poucos o livro que hoje conhecemos e
admiramos.

Um importante códice Bíblico é o manuscrito denominado Codex Sinaiticus


datado de meados do IV d.C. Ele foi encontrado por Constantin Tischendorf em
1844 no monastério de Santa Catarina, aos pés do monte Sinai (daí o nome pelo
qual veio a ser conhecido). Tischendorf era um dedicado biblista e pesquisador que
vivia à caça de antigos manuscritos bíblicos. Este em especial foi descoberto por
acidente, quando um monge por pouco não o lança ao fogo para aquecer a lareira
do monastério.

Originalmente o caderno tinha 1400 páginas, das quais restaram apenas


800 – a totalidade do Novo Testamento e a metade do Antigo – todos escritos em
grego. O manuscrito hoje está na Biblioteca Britânica (embora algumas seções
estejam no Egito, Rússia e Alemanha).

Ver o texto original fotografado em alta resolução e disponibilizado na Internet:


http://www.codexsinaiticus.org.

116
Outro importante documento datado da mesma época que o Codex
Sinaiticus é o Codex Vaticanus (ou 1209) – outro dos mais antigos manuscritos
existentes da Bíblia Grega (Antigo e Novo Testamento). Ele está guardado na
Biblioteca do Vaticano desde, pelo menos, o século XV e ficou conhecido por
estudiosos ocidentais por causa da correspondência entre Erasmo de Roterdam e
os prefeitos da Biblioteca do Vaticano. A erudição atual considera este um dos
melhores manuscritos bíblicos ao lado do Codex Sinaiticus.

O judaísmo, por sua vez, demorou muito em adotar os códices para


transcrever seus textos sagrados. Os mais antigos que temos em hebraico datam
do século X d.C. Mas ainda hoje o rolo de pergaminho é preferível nas leituras
litúrgicas usadas nas sinagogas.

Em resumo, é possível dizer que a enorme quantidade de manuscritos


bíblicos que hoje possuímos é o resultado do trabalho bem feito de copistas que
durante séculos foram fazendo cópias dos textos sagrados, de modo a transmitirem
seu conteúdo às gerações seguintes.

Foi um trabalho pefeito? É claro que não. Uma transmissão via cópias
manuscritas está sujeita a erros e modificações, voluntárias ou involuntárias, que
geral a coexistência de diferentes versões para um mesmo trecho bíblico. Contudo,
como foi acentuado, não se trata de alterações que afetem o conteúdo central do
texto ou que impossibilitem descobrir qual seria sua forma original.

O trabalho da crítica textual, desenvolvido por especialistas, se ocupa de


comparar minunciosamente texto com texto, oferecendo aos leitores um texto-
padrão que pode ser encontrado em grandes livrarias e bibliotecas do mundo
inteiro.

117
A principal fonte hebraica do AT é o texto copiado pelos massoretas na
Idade Média. Os massoretas eram copistas judeus da Idade Média que
substituíram os antigos escribas (sopherins) por volta do ano 500 até ao ano 1000.
Seu trabalho consistia em preservar, cuidar e copiar as Escrituras Sagradas que
hoje constituem o Antigo Testamento.

O nome massoretas vem do hebraico Masorah (ou Mesora) que quer dizer
transmissão de uma ideia religiosa ou de qualquer tradição por escrito. Por isso, os
manuscritos por eles produzidos são corretamente chamados, textos massoréticos.

Estes copistas judeus também realizaram a grande tarefa de vocalizar as


palavras em hebraico que não tinha originalmente vogais e, por isso, ao tornar-se
língua morta, necessitou desta indicação para poder ser lida. Além disso, eles
foram meticulosos na transmissão escrita do texto inspirado. Contudo, seu trabalho
não está isento de deficiências. Assim, outras versões do AT se fizeram
importantes para suprir certas carências do texto massorético. É o caso do
Pentateuco Samaritano (os samaritamos eram uma comunidade étnica e religiosa
separada dos judeus que só aceitavam o Pentateuco como Escritura Sagrada), da
LXX e dos Manuscritos do Mar Morto.

A partir do final do século XIX, com publicação do texto de manuscritos


mais antigos do Novo Testamento, a maioria das traduções bíblicas usa os
chamados textos críticos, isto é, estabelecidos através da crítica textual, não sem
controvérsia daqueles que ainda preferem o Textus Receptus. O Textus Receptus
guarda grande semelhança ao Texto Bizantino (ou Texto Majoritário), por isso às
vezes são chamados como se fossem o mesmo texto.

118
TRADUÇÕES E VERSÕES
DA BÍBLIA

4
CONHECIMENTO

Conhecer os aspectos relevantes da Introdução à Bíblia com ênfase no


estudo das Traduções e versões da Bíbia.

HABILIDADE

Ser capaz de compreender e interpretar textos sobre o tema bem como de


fazer exposição escrita, pública em eventos, palestras, seminários em ambiente
acadêmico e religioso acerca do tema.

ATITUDE

Buscar desenvolver e exercitar capacidade reflexiva crítica acerca do objeto


estudado e incorporá-la na sua práxis acadêmica e religiosa.

119
Principais traduções da Bíblia

O trabalho de reconstrução do texto bíblico e de acompanhamento de sua


transmissão ao longo dos séculos é enriquecido pelas antigas versões que
sobreviveram até nossos dias.

A tradução grega da Septuaginta já foi bem explanada, de modo que você


já possui agora uma compreensão clara de sua importância. Mas há outras versões
igualmente importantes.

Uma delas é a vulgata latina, uma tradução da Bíblia do grego para o latim.
Vulgata quer dizer “vulgar”, mas não se trata de uma linguagem baixa e sim da
língua comum falada no império romano ocidental por volta do IV século d.C. O
nome vem da expressão vulgata versio, isto é "versão de divulgação para o povo",
e foi escrita em um latim cotidiano, usado na distinção consciente ao latim elegante
do escritor romano Cícero. Em grande parte devemos a Jerônimo o trabalho de
traduzir a Bíblia para o latim.

A princípio, em 383, Jerônimo, fez uma revisão das traduções latinas já


existentes em seu tempo, a saber, a Vetus Latina e a Itálica. Contudo, ele não ficou
contente com o trabalho e resolveu fazer sua própria tradução entre 390 e 406. Ele
foi para a cidade de Belém, se fixou num mosteiro e com a ajuda de um judeu
traduziu o Antigo Testamento diretamente de manuscritos hebraicos e o Novo
Testamento de manuscritos gregos. A vulgata tornou-se, então, a tradução oficial
da igreja latina.

Mas, além da Vulgata e da LXX, existem outras traduções antigas da Bíblia


que merecem ser destacadas:

120
Antigo Testamento

SIRÍACO PESHITTA - Foi traduzida do hebraico, no II século d. C. e era o


texto padrão dos cristãos sírios. Posteriormente houve uma revisão, pela LXX. A
versão da Peshitta do AT era uma tradução independente, baseada na maior parte
em um texto similar ao massorético. Também mostra um número de similaridades
com o targum aramaico, mas atualmente acredita-se que não se origina dele.

HEXAPLA SIRÍACA - Foi traduzida pelo bispo de Tela, em 617 d.C, com
base na LXX e na quinta coluna da hexapla de Origenes. Este manuscrito foi
bastante estudado no exame da LXX, em virtude de ter preservado as notas
críticas do original grego de Orígines.

COPTA (egípcio) - São quatro as versões do Antigo Testamento nesta


língua. A saídica ou tebaica foi preparada no século II d. C., no sul do Egito, com
base na LXX. No século IV d. C., no norte do Egito, foi preparada a versão boárica
ou menfítica. Com poucos fragmentos, conhece-se também as versões fayúmica e
akhmímica.

VERSÕES MENORES - Foram traduzidas para o gótico, etíope e o


armênio, no século IV d. C.

Novo Testamento

DIATESSARON - Preparada em grego cerca de 160 d.C. e traduzida para


o siríaco. Trata-se de uma harmonia dos evangelhos de autoria de Taciano.

GÓTICA – Esta versão já estava em uso por volta de 330 – 20 anos antes
do Vaticanus e o Sinaíticos serem copiados. A tradução foi feita por Ulfilas,

121
provavelmente no ano 250 d.C. É extremamente literal, a ponto de usar a ordem
das palavras e grego, mesmo contra a lógica do idioma gótico.

SIRÍACO ANTIGO - Traz este nome para não ser confundida com a versão
Peshitta posterior, que era a versão popular em siríaco. Essa versão existe nos
manuscritos sinaítico e curetoniano.

PESHITTA - É uma tradução para o siríaco, do fim do século IV d.C. Seu


cânon é composto por apenas 22 livros, não trazendo II Pedro, e III João, Judas e
Apocalipse.

COPTA - São conhecidas cinco versões do Novo Testamento em copta ou


egípcio. A versão saídica é a mais antiga e apareceu no sul do Egito no século II
d.C. Do norte do Egito veio a versão boárica e tornou-se a versão dominante, pois
é representada por um número maior de manuscritos. As outras versões são a
fayúmica, a akhmímica e a do Egito Médio.

ARMÊNIA - É do final do século V d.C. e tem sua base numa fonte cujo
texto tinha similaridade com os manuscritos gregos Theta, 565 e 700. Afasta-se
muito dos melhores manuscritos gregos, aproximando-se do Textus Receptus. Há
1.244 cópias dessa versão.

GEÓRGIA - Seu manuscrito mais antigo é o Adysh, de 897 d.C. É possível


que essa tradução tenha sua origem do texto armênio. Era a Bíblia da Geórgia.

VERSÕES SECUNDÁRIAS - Destacamos, etíope, eslavônica, árabe e


persa.

122
Versões modernas

Mesmo antes da Reforma Protestante houve muitas traduções da Bíblia


para as diversas línguas faladas. Em 1382, com John Wycliff, teve início a Bíblia
inglesa, com base na Vulgata Latina; por isso inclui também os livros apócrifos. Em
1280 e 1400 surgiram porções da Bíblia em português. Mas somente com a
Reforma protestante é que a Bíblia começou a ser traduzida para o inglês, alemão,
francês, italiano, espanhol, português e outras línguas européias.

Para obter-se uma obra, para que não fosse volumosa, então mais cara, os
tradutores procuravam produzir o texto com economia de palavras, perdendo em
muito o significado das línguas originais. Isso foi corrigido em tempo e começaram
a surgir traduções mais fieis ao texto original, sem preocupação com economia de
palavras. Destas novas traduções destacam-se a Amplified New Testament; The
New Testament de Charles B. Williams e The New Testament, an Expanded
Translation, de Kenneth S. Wuest.

Merece destaque neste contexto a Bíblia de Lutero que foi uma tradução
alemã das Escrituras feita por Martinho Lutero e impressa pela primeira vez em
1534. Essa tradução é considerada como sendo em grande parte responsável pela
evolução moderna da língua alemã.

Outras traduções tornaram-se importantes: A Bíblia de Tyndale, traduzida


em 1525 diretamente do hebraico e grego. A Versão do Rei Tiago (King James
Version), baseada na Bíblia de Tyndale, sob a encomenda do Rei Tiago, surgiu em
1611 e popularizou-se entre os países de língua inglesa. The American Standard
Revised Bible, lançada por ingleses e americanos em 1901, sendo uma espécie de
revisão da versão do Rei Tiago. A partir de 1804, com a British and Foreign Bible
Society surgiram as modernas Sociedades Bíblicas que muito vêm contribuindo
para a divulgação da Bíblia.

123
Versões em português

Traduções parciais

D. Diniz (1279-1325), rei de Portugal, traduziu da Vulgata os primeiros vinte


capítulos do livro de Gênesis. O rei D. João I (1385-1433) ordenou que houvesse
uma tradução para o português. Alguns padres católicos, a partir da Vulgata,
traduziram os evangelhos, Atos e as epístolas de Paulo. O próprio rei traduziu o
livro de Salmos.

Com esses livros prontos, publicaram a obra. Mais tarde foram preparadas
mais traduções de outras porções bíblicas: os evangelhos, que a infanta Dona
Filipa, neta do rei D. João I, traduziu do francês; o evangelho de Mateus e porções
dos outros evangelhos, da Vulgata, pelo frei Bernardo de Alcobaça; os evangelhos
e as epístolas, pelo jurista Gonçalo Garcia de Santa Maria; uma harmonia dos
evangelhos, por Valentim Fernandes, em 1495; em 1505, por ordem da rainha
Leonora, foram publicados o livro de Atos e as epístolas gerais.

Outras traduções realizadas em Portugal foram: os quatro evangelhos,


traduzidos pelo padre jesuíta Luiz Brandão; e, no início do século XIX, os
evangelhos de Mateus e Marcos, pelo padre Antonio Ribeiro dos Santos. Salienta-
se que a dificuldade em se traduzir para os diversos idiomas era a oposição da
Igreja Católica Romana que, ao longo dos séculos, fez implacável perseguição a
estas obras, amaldiçoando quem conservasse traduções da Bíblia em "idioma
vulgar", como diziam. Por isso, também de muitas traduções escaparam somente
uns dois exemplares.

Traduções completas

Tradução por João Ferreira de Almeida. Por conhecer o hebraico e o


grego, usou os MMS (mamuscritos) dessas línguas para sua tradução. Quanto

124
iniciou o empreendimento era pastor protestante. Almeida utilizou-se do Textus
Receptus, que representa os mss. do grupo bizantino, possivelmente o mais fraco
entre os MSS. gregos. Primeiramente traduziu e editou o N.T. publicado em 1681,
em Amsterdã, Holanda.

Essa tradução apresentava muitos erros. Almeida mesmo fez uma lista de
dois mil erros. Muitos desses erros foram feitos pela comissão holandesa, que
procurou harmonizar a tradução de Almeida com a versão holandesa de 1637. A
dificuldade de Almeida é que não havia papiro algum e os unciais (mss em letras
maiúsculas) eram poucos. Esta a razão porque teve que lançar mão de fontes
inferiores.

Ele utilizou-se da edição de Elzevir do Textus Receptus, de 1633. As


edições mais modernas muito progrediram na tradução. Com base nesta tradução
foram lançadas a Revista e Atualizada, A Edição Revista e Atualizada e a Versão
Revisada de acordo com os melhores textos em Hebraico e Grego, a versão que
apresentamos neste programa, como a mais indicada para estudos.

Tradução de Antônio Pereira de Figueiredo. Teve como base a Vulgata


Latina. Em 1896 fez sua primeira tradução em colunas paralelas da Vulgata e de
sua tradução para o português. Essa tradução foi usada pela Igreja de Roma. Por
ter sido utilizada a Vulgata como base, tem a desvantagem de não representar o
melhor texto do N.T. que conhecemos pelos mss. unciais mais antigos e pelos
papiros.

A Bíblia de Rahmeyer - Manuscrito do comerciante hamburguês Pedro Rahmeyer,


que residiu em Lisboa, e traduziu em meados do século XVIII. Este manuscrito se
encontra na Biblioteca do Senado de Hamburgo, Alemanha.

Traduções parciais da Bíblia no Brasil

No Brasil, a primeira tradução, somente do Novo Testamento, foi feita por


frei Joaquim de Nossa Senhora de Nazaré, traduzida da Vulgata e somente do N.T.
Foi publicada em São Luiz do Maranhão. Esta obra teve forte impacto por trazer

125
em seu prefácio acusações contra as "bíblias protestantes", que estariam
"falsificadas" e falavam "contra Jesus Cristo e contra tudo quanto há de bom."

Primeira Edição Brasileira do Novo Testamento de Almeida. Esta edição foi


revista por José Manoel Garcia, pelo pastor M.P.B. de Carvalhosa e pelo pastor
Alexandre Blackford, agente da Sociedade Bíblica Americana no Brasil. Esta obra
foi lançada em 1879 pela Sociedade de Literatura Religiosa e Moral do Rio de
Janeiro.

Harpa de Israel, título dado à tradução do Livro dos Salmos, em 1898, por
F.R. dos Santos Saraiva. O Evangelho de Mateus, traduzida do grego em 1909
pelo padre Santana. O Livro de Jó, publicado em 1912 por Basílio Teles.

O Novo Testamento, traduzido da Vulgata Latina por J. L. Assunção, em


1917. O Livro de Amós, traduzido do idioma etíope por Esteves Pereira, em 1917.
O Novo Testamento e o Livro dos Salmos, baseados na Vulgata, em 1923, por J.
Basílio Pereira. Lei de Moisés (O Pentateuco) preparada em hebraico e português,
pelo rabino Meir Masiah Melamed. Não há indicação de data.

Tradução do Padre Humberto Rodhen. Foi o primeiro católico a fazer uma


tradução diretamente do grego. Traduziu o N.T. que foi publicado pela Cruzada de
Boa Imprensa em 1930. Tal como Almeida utilizou-se de textos inferiores, por isso,
sofreu severas críticas.

Nova Versão Internacional. Lançada em 1993 pela Sociedade Bíblica


Internacional.

Traduções completas no Brasil.

Iniciada em 1902 e concluída em 1917, sob a direção do Dr. H. C. Tucker.


A comissão tradutora utilizou-se de mss. melhores do que os de Almeida.
Entretanto, nunca foi muito popular.

126
Tradução do Padre Matos Soares - Foi baseada na Vulgata. É de 1930, e
em 1932 recebeu apoio papal. É muito popular entre os católicos.

Revisão da tradução de Almeida (Edição Revista e Atualizada) - O trabalho


de revisão iniciou-se em 1945, por uma Comissão formada pela Sociedade Bíblica
do Brasil. A linguagem foi muito melhorada, até porque foram usados mss. gregos
dos melhores.

Tradução pelos monges Meredsous (1959) (Bélgica) - Editada pela Editora


Ave Maria e traduzida do hebraico e grego para o francês e em seguida para o
português por uma equipe do Centro Bíblico de São Paulo sob a supervisão do Frei
João José Pedreira de Castro.

Revisão da tradução de Almeida (Imprensa Bíblica Brasileira) - Foi


publicada em 1967. Esta revisão segue os melhores manuscritos e, por isso, foi
bem acolhida pelos estudiosos da Bíblia. É também a tradução que apresentamos
nesta obra.

A Bíblia de Jerusalém editada no Brasil em 1981 por Edições Paulinas -


traduzida pelos padres dominicanos da Escola Bíblica de Jerusalém, incluindo
alguns exegetas protestantes. A edição brasileira foi feita sob a coordenação de
Ludovico Garmus e editada pela Editora Vozes e pelo Círculo do Livro.

Tradução Ecumênica da Bíblia - Trata-se de uma obra realizada, primeiro


de tudo, em francês e em seguida traduzida para o português e publicada em 1994
pela Loyola (O Novo Testamento foi publicado em 1987). Essa edição é conhecida
como TEB (em francês: TOB). Existe também uma edição digital, produzida em
colaboração com a PUC do Rio de Janeiro, realizada em 1997, que, além do texto

127
e as notas, traz outros materiais de estudo, como dicionários, mapas e imagens
bíblicas.

A Bíblia na Linguagem de Hoje (Novo Testamento). Publicada em 1988


pela United Bible Societies, através de seu ramo brasileiro e baseia-se na segunda
edição do texto grego dessa sociedade. A intenção da United Bible Societies foi de
publicar em vários idiomas, Novos Testamentos em conformidade com a linguagem
comum e corrente.

Edição Contemporânea da Tradução de Almeida foi editada em 1990 pela


Editora Vida. Essa edição eliminou arcaísmos do texto de Almeida.

Explicando melhor com a pesquisa

Sugerimos a você à leitura do artigo sobre: Teologia e Literatura Bíblica -


Introdução a uma Nova Teologia Bíblica. Este artigo foi produzido para
estudantes de teologia que começam a compreender seu papel como cientistas
cujos pressupostos de fé são determinantes para sua atividade.

Guia de estudo:
Após a leitura do artigo, faça uma resenha crítica, apontando suas ideias e
comparando com o que leu.

128
Leitura Obrigatória

“A origem da Bíblia” é um guia completo para entendermos


tudo sobre: a autoridade e inspiração da Bíblia; O cânon da
Bíblia; A Bíblia como texto literário; Textos e manuscritos da
Bíblia; Traduções da Bíblia. Uma fascinante visão geral de
como a Bíblia foi inspirada, canonizada, lida como literatura
sagrada, copiada em antigos manuscritos hebraicos e gregos
e, finalmente traduzida para línguas do mundo inteiro. Uma
excelente fonte de pesquisa para pastores, seminaristas, professores, estudantes
da Bíblia e crentes desejosos de um melhor aprofundamento bíblico.

COMFORT, Philip Wesley (Edit.). A origem da Bíblia. 6. ed. Rio de Janeiro: Casa
Publicadora das Assembleias de Deus, 2006.

GUIA DE ESTUDO: Após a leitura do livro, faça uma autoanálise crítica sobre
o material e em seguida poste no ambiente virtual.

Pesquisando com a Internet

A partir da leitura realizada do material, realize uma pesquisa sobre o


seguinte tema: Inspiração e inerrância das Esrituras.

Guia de estudo: Após a pesquisa faça uma síntese do que entendeu e


disponibilize no ambiente virtual.

129
Saiba mais

Para ampliar seus conhecimentos sugiro que leia a entrevista com Padre
Johan Konings. Por ocasião da XIII Semana Teológica Padre Johan Konings
proferiu uma palestra sobre O lugar da Bíblia na transmissão da fé hoje. Em sua
fala destacou que a Transmissão da Fé pressupõe um sempre renovado encontro
pessoal com Deus, em Jesus de Nazaré.

Guia de estudo: Após a leitura elabore um pequeno comentário sobre o que


compreendeu em seguida poste no ambiente virtual através do fórum de
debates.

Vendo com os olhos de ver

Para ampliar seus conhecimentos sugiro que assista a entrevista com Dr.
Rodrigo Silva. Posso confiar na Bíblia?

Sugiro também que assista ao vídeo EVIDÊNCIAS - Quem escreveu a


Bíblia? Com o Dr. Rodrigo Silva.

130
Guia de estudo: Após assistir ao vídeo, faça uma resenha sobre o que
compreendeu em seguida poste no ambiente virtual.

Revisando

A Bíblia tem sido aceita pela corrente tradicional ou fundamentalista como a


palavra de Deus. Ela não somente contem a palavra de Deus, mas ela é a Palavra
de Deus, o que é diferente. Segundo correntes liberias a Bibia não é a palavra de
Deus, fruto da inspiração divina, mas produto da intelectualidade humana. Os
liberais assumem posição comum de negarem o sobrenatural das Escrituras, o que
equivale a dizer que eles não aceitam a doutrina da inspiração divina para os textos
sagrados. Eis a lihna divisória que separa conservadores dos libérias, a doutrina da
inspiração.

O que determina a canonicidde de um livro é sua inspiração divina e não o


fato de ter sido escolhido pela Igreja. Os livros foram escolhidos porque eram
canónicos. O papel da Igreja foi de descobri e acolher tais Escritos ispirados. È
importante conhecer o processo histórico afinal a Biblia não caiu do céu. Não
podemos negar o processo histórico, o elemento humano envolvido, mas acima de
tudo isso estava a obra do Espírito Santo movendo a Igreja a reconhecer os
autênticos Escritos inspirados.

131
Embora exista uma crítica que procura mais desacreditar na Biblia do que
afirmá-la como palavra de Deus, estamos falando da alta crítica, por outro lado
existe a critica textual, ou baixa crítica, que procura estudar a história do texto
sagrado procurando estabelecer o texto original mais próximo dos autógrafos. Não
podemos subestimar a importância desse trabalho realizado por eruditos que
dominam as línguas originais

Autoavaliação

1. Sobre a doutrina da inspiração faça uma análise das teorias apresentadas, e


aponte aquela que segundo seu ponto de vista mais se aproxima daquilo
que a Bilia retrata. Não deixe de considerar a teoria plenária.

2. Sabemos que o processo de canonização dos livros do NT levou bastante


tempo. Destaque a importância do trabalho do Espiriro Santo e o papel da
Igreja Cristã.

3. Apresente os principais argumentos da critica textual que nos dão garantias


que o texto bíblico nas línguas originais é confiável.

4. Analisando as traduções em português aponte aquela que parece estar mais


em conformidade com os originas hebraico e grego.

132
Bibliografia

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Research (3rd ed.; London: Hodder and Stoughton, 1919).

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LIMA Oliveira Anderson de. Revista Theos – Revista de Reflexão Teológica da


Faculdade Teológica Batista de Campinas. Campinas: 8ª Edição, V.7 – Nº 01 –
Julho de 2012. ISSN: 1980-0215. Teologia e Literatura Bíblica - Introdução a
uma Nova Teologia Bíblica. Disponível em
http://www.revistatheos.com.br/Artigos/ANDERSON%20-
136
%20TEOLOGIA%20E%20LITERATURA%20B%C3%8DBLICA%20-
%20Corrigido.pdf. Acesso em 17/04/2017.

Vídeos

Vídeo 1: EVIDÊNCIAS - Quem escreveu a Bíblia? 2013. Com Dr. Rodrigo Silva.
Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=UYT2IbpF9CU

Vídeo 2: Posso Confiar na Bíblia - Dr. Rodrigo Silva - by Sermões Inteligentes.


Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=wCgGWjqYM8k

137
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Você também pode gostar