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PRÁTICA EM CONJUNTO: Utilizando copos como instrumentos musicais

Miguel Allende Moraes


Orientador: Carlo Pianta

RESUMO

Neste artigo referente ao estágio curricular obrigatório no ensino médio do


curso de música do IPA. Relato minha experiência de docente durante o estágio,
mostrando todo o processo da prática em sala de aula no contexto de estágio
curricular.
Nele descrevo a escolha da metodologia, o desenvolvimento das atividades e
as considerações finais. O trabalho foi desenvolvido com objetivo de transmitir
conhecimentos rítmicos através da utilização de copos como instrumentos musicais.
Palavras – chave: Ensino médio, ritmo com copos, prática musical em conjunto.

INTRODUÇÃO

O seguinte artigo é resultado da experiência de estágio curricular obrigatório II


no ensino médio. Do curso de licenciatura em música pelo Centro Universitário
Metodista – IPA. O curso de licenciatura em música do IPA possui três estágios
obrigatórios, são feitos no ensino fundamental, ensino médio e em espaços não
escolares, possuem carga horária de 16h de observação e 16h de regência. Foi
desenvolvido no colégio estadual Almirante Bacelar situasse na cidade de Porto
Alegre Av. Protásio Alves, 13097 - Passo Dornelles.
O estágio curricular propõe que os alunos tenham prática em sala de aula antes
de se formar. Assim o estágio torna-se o único momento em que os licenciandos tem
a oportunidade de vivenciar à docência antes de se formarem e assim compreender
os diversos desafios da prática. Segundo Mateiro o estágio possibilita vivenciar a
profissão na prática:

O estágio, por tanto, é considerado como um espaço que possibilita ao


estudante, futuro professor, observar, analisar, atuar e refletir sobre as tarefas
características de sua profissão. Essas ações estão inseridas, assim, no que
denominamos de prática de campo e em campo que permitirá ao licenciando
experimentar a prática de ensinar e se comprometer com a profissão de ser
professor. (Mateiro, 2009, p. 17)

Sendo o estágio uma preparação para a profissão de professor, encarei esse


projeto como a possibilidade de por em prática a teoria que havia estudado até o
momento, unindo toda teoria que possuía para desenvolver a prática.
O estágio foi realizado na escola estadual Almirante Bacelar no primeiro
segundo e terceiro ano do ensino médio nos períodos de Artes e Ensino Religioso,
pois o colégio não possui aulas de música. Durante a regência segui com o propósito
de trabalhar ritmo e prática em conjunto utilizando copos como instrumentos de
percussão. Nesse artigo relato o desenvolvimento do estágio.

JUSTIFICATIVA

A ideia de usar copos como instrumentos musicais nasceu após um trabalho


feito no sétimo semestre da disciplina de Prática em Conjunto do curso de licenciatura
em música do IPA. Foi criado entre três colegas um arranjo de uma música composta
por um dos integrantes do grupo onde copos foram incluídos como instrumentos de
percussão.
Durante as observações nas aulas de artes descobri que muitos alunos
tocavam instrumentos na banda marcial da escola. Além da prática na banda, outros
alunos já haviam estudado instrumentos. A partir do conhecimento de que alguns
alunos já tinham contato formal com a música e que o restante ainda não havia tido
aulas de música, a ideia de trabalhar com copos se mostrou produtiva para o contexto
dos alunos.
Assim que decidi usar os copos, decidi utilizar o mesmo arranjo que havia sido
feito para a disciplina da faculdade. Além de trabalhar o ritmo dos copos haveria o
canto e na prática em conjunto poderiam ser inseridos instrumentos que os alunos
tocassem. Além de trabalhar as habilidades de ritmo dos alunos já instrumentistas, o
aprendizado da música seria inserido para aqueles que ainda não haviam tido contato
com a educação musical.
O ritmo pode ser trabalhado em sala de aula de inúmeras formas, sem
necessidade de muitos materiais específicos. Durante meu primeiro estágio no ensino
fundamental utilizei a prática de ritmos corporais com foco na metodologia
Barbatuques. Esse próximo trabalho será desenvolvido com semelhante objetivo,
levar a educação musical de forma simples e lúdica, porém efetiva.
A música não precisa ser ensinada de forma teórica formal. O estudo pode
iniciar de maneira orgânica, a partir de brincadeiras, jogos e interpretações que
busquem desenvolver habilidades musicais de forma que o aluno cresça em sua
performance. De acordo com Simão, um dos integrantes do núcleo Barbatuques que
busca desenvolver metodologias voltadas para percussão corporal a prática deve
anteceder a teoria:
A pedagogia Barbatuques valoriza o fazer musical como ponto fundamental, que antecede
o aprendizado da teoria musical, iniciando seu trabalho pela vivência corporal da música. O
processo de ensino da percussão corporal proposto pelo grupo, por ser uma forma vivencial
de fazer música, afasta-se da lógica do desenvolvimento da técnica virtuosística, racional e
instrumental. (SIMÃO, 2013, p. 66)
Assim a música deixa de ser específica para aqueles que estão inseridos em
um contexto que favoreça esse desenvolvimento e passe a ser propriedade de todos
que tenham interesse. Questão que anteriormente já havia sido levantada por
Dalcroze e atualmente é defendida por diversos educadores, como observou
Madureira em sua tese:
Dalcroze observou com bastante cuidado os processos de aprendizagem
musical de seu tempo, que consideravam somente o aspecto intelectual da
linguagem musical que, por consequência, impediam a criança de construir
uma relação mais íntima e orgânica com o fazer musical. (Madureira, 2012,
p.4)

Dalcroze priorizava que a música fosse vivenciada para depois ser aprendida,
o aluno não precisaria saber que estava estudando música durante as atividades, no
entanto no momento em que começasse a aprender teoria a relação seria muito mais
clara. Ele questiona o ensino de música priorizando a teoria: ''Não seria estranho
ensinar uma criança a escrever antes que ela soubesse falar?'' (Dalcroze apud
Madureira, 2012, p.4).
Essa relação também foi feita pela professora Viviane Beineke em seu livro
Jogos de Mãos e Copos. O fato de serem utilizados copos de forma lúdica e divertida
não faz com que a presença do professor deixe de ser necessária. Os processos de
aprendizagem envolvendo brincadeiras e atividades que sejam criativas e lúdicas
ainda assim são métodos de educação que visam um objetivo. Viviane Beineke
esclarece isso e explica a necessidade de um condutor para essas atividades:

Por isso, é fundamental que os educadores reconheçam o seu papel


como mediadores do brincar na educação. As crianças não precisam saber
por que brincam e o que estão aprendendo em suas brincadeiras, mas os
professores precisam compreender como o brincar pode fazer do seu
trabalho.(Beineke, 2011, p.11)

Para a criação do plano de ensino foi tido como base pesquisas que
mostrassem a eficácia de atividades que utilizem instrumentos alternativos, no caso
os copos. Durante minhas pesquisas, percebi que a maioria dos relatos de atividades
com copos eram feitos voltados para crianças, no entanto como o estágio seria no
ensino médio pensei em uma forma de tirar a imagem de brincadeira e demonstrar os
copos como instrumentos dentro de uma música.
Além de trabalhar com ritmo haveria a prática em conjunto que poderia ser
transformada em uma apresentação, o que estimularia os jovens. Práticas musicais
em conjunto são fundamentais para o trabalho em sala de aula, pois insere a turma
diretamente a prática musical e favorece a relação entre os colegas. Em seu artigo
sobre a performance musical para jovens de baixa renda Rose Hikiji destaca o
benefício da prática musical em grupo: “A prática em conjunto favorece a criação de
vínculos afetivos entre os participantes e acentua redes de sociabilidade.” (HIKIJI,
2005)

PLANO DE ENSINO

Ao desenvolver este projeto foquei em três pontos: ritmo, prática em conjunto


e utilização de instrumentos não convencionais (copos). A partir disso iniciei a criação
do plano de ensino.
Optei por não utilizar partituras analógicas, pois o ritmo seria apenas um e os
símbolos teriam de ser memorizados para que fizesse sentido utilizar a partitura e isso
levaria mais tempo. Então organizei o arranjo que havia escolhido de forma que
pudesse aplicá-lo em aula.
A música escolhida foi “Joana e Simões” de autoria de Adrielle Gauer
professora de música que compôs essa música com o objetivo de desenvolver prática
em conjunto com seus alunos utilizando violão e flauta doce. Juntamente com outro
colega do curso de música do IPA, Adrielle e eu criamos o arranjo adicionando copos
como percussão. (anexo A)
Os alunos do colégio Almirante Bacelar não possuem aula de educação
musical no currículo escolar, apenas a banda marcial extracurricular. Então poucos
tocavam instrumentos melódicos, logo precisei remover a flauta do arranjo, mas deixei
aberta a possibilidade de algum aluno tocar a melodia em outro instrumento.
A prática iria abordar o canto e o ritmo com os copos. Os ritmos seriam feitos
utilizando movimentos com os copos, explorando sons com as mãos e diversos
timbres possíveis.

Foram escolhidos três ritmos que seriam unidos com o canto.


Primeiro ritmo:
No primeiro ritmo além do som dos copos seria utilizado palmas e batidas com
as mãos.

Segundo ritmo:
O segundo ritmo também utiliza palmas e movimentos com os copos.

Terceiro ritmo:
O terceiro ritmo iria apenas marcar o pulso da música com batimentos dos
copos na classe.
Como alguns alunos já tocavam instrumentos e outros participavam da banda
da escola, decidi tentar incluir a performance de algum ao arranjo, caso alguém
quisesse.

REGÊNCIAS

As regências foram feitas em quatro aulas, para quatro turmas. A primeira aula
foi escolhida para apresentar os copos e os ritmos que seriam trabalhados. Dividi cada
ritmo em duas partes. Demonstrei em frente a turma os movimentos que deveriam ser
feitos e depois pedi que repetissem. Alguns alunos tinham mais dificuldade e outros
menos, quando necessário eram prestadas ajudas individuais. O segundo ritmo por
envolver movimentos mais complicados foi executado apenas por alguns alunos.
As turmas se dividiram entre mais participativas, menos participativas e mais
agitadas. Mas a maioria dos alunos participou e muitos se divertiram com de fazer
música com os copos.
Na segunda aula foi apresentada a música, levei meu violão e toquei e cantei
a música, depois dividi em duas partes e as ensinei para as turmas, porém em todas
as turmas os alunos se negavam a cantar com uma projeção audível, muitos cantavam
baixo por receio de serem julgados, mas após alguns pedidos eles começaram a
cantar mais.
A terceira aula foi planejada para juntar a música e os copos. Relembrei os
ritmos trabalhados, o segundo ainda não havia sido aprendido, então prossegui e o
substituí pela repetição do primeiro. Devido a dificuldade em manejar o copo e ao
mesmo tempo cantar, dividi a turma em dois grupos. O primeiro deveria cantar, o
segundo tocar os copos e depois as funções seriam trocadas. O andamento
acelerava, alguns alunos conseguiam manter o ritmo e outros acabavam se perdendo,
mas houve participação e um bom desempenho em relação a primeira aula em que
muitos alunos acreditavam que não iriam conseguir fazer os movimentos.
Durante as regências houveram problemas e a professora não pode
comparecer em uma das aulas em que eu iria tentar juntar os instrumentos da banda
marcial com a prática da música, mas como o arranjo dos copos com o canto já estava
bastante complexo não houve prejuízo e segui aprimorando a prática da música.
Na última aula unimos tudo que havia sido estudado e juntamos em uma prática
em grupo. Muitos alunos gostaram das atividades, em algumas turmas haviam alunos
que tocavam violão, então eles participaram da música tocando, nas outras turmas
toquei a música no violão enquanto a turma cantava e tocava os copos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante o estágio tive diversas percepções sobre a prática de um professor no


ensino médio. A importância da metodologia e a meta para o estágio foram
extremamente relevantes, pois guiaram o trabalho e me deram um caminho para
seguir.
A metodologia aplicada foi cuidadosamente escolhida, estudada e modificada
conforme fosse preciso, pois cabe ao professor saber quando deve modificar algo na
prática da docência. O planejamento é necessário para guiar o professor, mas precisa
ser reavaliado conforme seu desenvolvimento e o estagiário precisa estar atento para
perceber quando isso for necessário. Durante as aulas no colégio percebi que o
grande desafio da docência não está em executar as aulas, mas em mediar o
conhecimento de forma que ele possa ser compreendido pelo aluno. As observações
serviram para estudar o contexto de cada turma e refletir sobre a forma que deveria
lecionar.
Cada turma teve um desenvolvimento e aprendizado diferentes, algumas eram
mais agitadas e isso dificultava manter atenção dos alunos, alguns alunos se negavam
a participar das atividades. Outras turmas participavam mais e se empolgavam,
algumas cansavam e era necessário trocar o roteiro da aula para não perder atenção
deles.
Em meio as diferenças de desempenho das turmas, o objetivo geral em
desenvolver habilidades percussivas trabalhando ritmos com copos e prática em
conjunto foi obtido. Mesmo que as apresentações finais não tenham ocorrido com os
copos sendo movimentados seguindo o mesmo andamento e os alunos tivessem
dificuldade em sincronizar os movimentos para que o ritmo ficasse homogêneo, as
turmas conseguiram desenvolver diversas habilidades, pois da primeira aula até a
última houve uma grande diferença rítmica.
Conforme as aulas passavam o desempenho dos alunos melhorava, alguns
alunos que tinham dificuldades em movimentar os copos na primeira aula, passaram
a executar o ritmo. No inicio do processo muitos tiveram dificuldade em entender como
o ritmo com copos poderia se tornar música, mas ao final todos perceberam o pulso
da percussão, o que fazia com que notassem quando algum colega errava. Ao
chamarem atenção dos colegas que estavam errando, mostravam perceber que
haviam aprendido.
Não atribuo o sucesso do trabalho ao fato de os alunos terem praticado e
reproduzido com perfeição no andamento certo e sincronizados, pois isso não ocorreu. A
prática em sala de aula não acontece da mesma forma que na teoria, pois o trabalho é
feito com pessoas diferentes em contextos diferentes e isso deve ser celebrado e utilizado
da melhor forma. Utilizando instrumentos não convencionais pude levar prática musical
para os alunos e incentivar o interesse pela disciplina, pois muitos alunos passaram a
pesquisar sobre os copos, pois vinham me dizer que haviam assistido a vídeos na internet,
tentando utilizar os ritmos em outras músicas ou criando novos ritmos.
Tenho grande satisfação em dizer que os processos de estágio foram muito
gratificantes em minha vida acadêmica, pois além de me mostrarem a prática do que havia
sido estudado durante o curso, pude compreender a grandeza desta profissão que se
trata de muito mais do que ensinar, mas sim estabelecer relações humanas que
incentivem a evolução individual de cada aluno.
Referências
BEINEKE, Viviane. Música, jogo e poesia na educação musical escolar. Artigo, revista
ABEM, 2011.
BEINEKE, Viviane. Lenga la lenga: Jogos de mãos e copos. Livro: ciranda cultural, 2006.
HIKIJI, Rose. Etnografia da performance musical – identidade, alteridade e
transformação.
MADUREIRA, José. Rítmica Dalcroze e a formação de crianças musicistas: uma
experiência no Conservatório Lobo de Mesquita. Artigo, Universidade Federal dos Vales do
Jequitinhonha e Mucuri - UFVJM. 2012.
ROMANELLI, Geraldo. Planejamento de aulas de estágio. In: Práticas de ensinar a
música. SOUZA, J. e MATEIRO, T. Org. Porto Alegre: Sulina, 2008, p. 131.
SIMÃO, João Paulo. Música Corporal e o corpo do som: um estudo dos processos
de ensino da percussão corporal do Barbatuques. Dissertação (Mestrado em
Educação), Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2013.
ANEXOS
Anexo A – Partitura Joana e Simões

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