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Jairzinho Rabelo
Luzineth Rodrigues Martins
Organizadores
EDUFRR
Boa Vista - RR
2019
Copyright © 2019
Editora da Universidade Federal de Roraima
Todos os direitos reservados ao autor, na forma da Lei.
A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui
violação dos direitos autorais (Lei n. 9.610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184
do Código Penal.
Projeto: A Educação do Campo e suas Metodologias de Ensino,
referente ao processo 405586/ 2012-4; Chamada CNPq/MDA-
INCRA N°. 26/ 2012 - do Programa de Ciência e Tecnologia para o
Agronegócio - Residência Agrária
Revisão Ortográfica
Luzineth Rodrigues Martins
Coordenação de Curso
Evando Ghedin
Projeto Gráfico
Alessandra Peternella
Aline dos Santos Rodrigues
Osvaldo Piedade
Valdemar Vilhena
Diagramação
Miquéias Ambrósio
Naiara Cardoso da Silva
Inclui bibliografias.
ISBN: 978-85-8288-085-2
CDU - 373.3(1-22)
PREFÁCIO........................................................................................7
Evandro Ghedin
INTRODUÇÃO.............................................................................11
Considerações Finais...................................................195
PREFÁCIO
7
realidade. Fazemos representações dos fatos e a represen-
tação é um modelo da realidade e o que a representação
deve ter em comum com a realidade para poder represen-
tá-la é a forma de representação.
A primeira vista não parece que a proposição seja
representação da realidade de que trata. Mas a notação
musical também não parece, à primeira vista, representa-
ção da música, assim como a nossa escritura fonética (ou
letras) também não parece uma representação da nossa
linguagem falada. No entanto, esses símbolos se revelam
representações daquilo que representam. Todas essas
relações estão naquela relação interior representativa que
se estabelece entre língua e mundo. O que é comum a to-
das essas coisas é a estrutura lógica.
Deste modo, o pensamento ou proposição represen-
ta ou espelha projetivamente a realidade. A cada elemento
constitutivo do real corresponde outro elemento no pen-
samento. A realidade consta de fatos que se resumem em
fatos atômicos, compostos por seu turno de objetos sim-
ples. Analogamente, a linguagem é formada de proposi-
ções complexas, que podem ser divididas em proposições
simples ou atômicas (elementares) não ulteriormente
divisíveis em outras proposições. Essas proposições ele-
mentares constituem o correspondente dos fatos atômicos.
São combinações de nomes, correspondentes aos objetos:
o nome significa o objeto. O objeto é o seu significado.
Portanto, não há significado descolado dos objetos
que lhe são correspondentes. Esse constitui um dos critérios
mais significativos para avaliar um programa científico.
8
Nesse sentido, desenvolve-se uma epistemologia da
correspondência entre linguagem, objeto e pensamento. O
real é concreto e pensado. Pensado porque concreto, con-
creto porque pensado. Assim há correspondência entre re-
alidade e abstração e esta não existe sem aquela.
O pensamento é constitutivo do real na mesma pro-
porção em que esta corresponde ao próprio pensamento.
Por essa razão, há a necessidade de dominar a Língua. Ter
domínio da Língua significa tomar posse de si. Ação que
não é possível sem a apropriação do mundo, que não se dá
sem propriedade de pensamento.
O conhecimento plano da Língua significa a posse
do mundo, o poder sobre ele. Não um poder de domínio
e de posse como queiram os modernos, especialmente os
cartesianos. Mas uma relação de conhecimento do mundo
como condição de interpretação compreensiva de nossa
condição de sujeitos que pertencem ao mundo. O mundo
que temos é o mundo que criamos pela linguagem e pela
Língua. Sem língua e linguagem não há mundo. O nosso
mundo depende da existência da língua e da linguagem
como condição de nosso ser.
É nesse sentido que se justifica o esforço que fazem
os autores para expressar a Metodologia do ensino da Língua
Portuguesa na Educação do Campo. Seu conteúdo expres-
sa profundo conhecimento desta nossa condição ontoló-
gica mediada pela Língua e pela Linguagem, condições
de nossa existência. Sem a língua para expressar nossos
sentimentos, emoções, medos, bravura, coragem, virtude,
verdade, amor não há nada disso em nosso mundo. O que
9
as tornam visíveis é a Língua. Nela encontra-se nossa con-
dição, nosso limite e toda nossa potencia. Esse é o sentido
mais profundo deste trabalho, pois faz existir o ser onde
antes havia o NADA. Isso parece matéria de alquimistas.
Parece mágico. Mas essa é justamente a magia de tudo
isso: onde havia o nada a Língua cria o SER.
O ser só existe em sua expressão. Ele só pode expri-
mir-se por meio da Língua e da linguagem. Portanto to-
mar posse delas é tomar posse de si, condição sem a qual
não existe autonomia e essa como condição para a cidada-
nia e a vida social.
Assim sendo, este é um trabalho da mais alta rele-
vância para a população do campo, pois à medida que lhe
dá posse da Língua, lhe permite a expressão de seu ser, de
sua voz, de seu grito. Rompe o silencio da opressão para
em seu lugar fazer emergir o ser da libertação.
Evandro Ghedin
10
INTRODUÇÃO
11
do conhecimento escolar mas, sobretudo, que reconheçam
as competências linguísticas que já possuem e entendam
a necessidade de ampliá-las. Para tanto, utiliza-se funda-
mentos, metodologias e atividades que podem ser ade-
quadas à educação do campo, conforme a necessidade e
realidade de cada professor.
Nessa direção, esperamos dar aos alunos da disci-
plina Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa na
Educação do Campo condições de eles reconhecerem as
competências já desenvolvidas por seus alunos, em seu
convívio cotidiano, mas de reconhecerem, especialmente,
sua capacidade de mediação nas atividades de ensino pro-
postas aos alunos. Além disso, serem capazes de refletir
sobre suas práticas e, ao mesmo tempo, registrar essas re-
flexões em forma de trabalhos acadêmicos que possam ser
socializados com os colegas e demais professores.
A exemplo de uma situação de ensino nesse contexto,
reportamo-nos ao fato da existência de grande variação linguís-
tica produzida pelos sujeitos do campo, que devem chegar a
escola como possibilidade de reflexão e análise linguística do
valor social de determinados usos da língua. Lembramos o caso
do sujeito que produz a variação “mio” no lugar da palavra
milho, assim dicionarizada na língua portuguesa. O papel do
professor neste contexto é conhecer a teoria da variação linguís-
tica, acolher a fala do sujeito, discutir a produtividade dela no
convívio diário do aluno, e apresentar a ele a variante de maior
prestígio social, como aquela que se espera ser produzida por
um sujeito em contexto de escolarização. Com essa postura, o
professor cumpre o papel de mediador da aprendizagem do
aluno, ajudando-o a ampliar a sua capacidade comunicativa.
12
Sendo assim, a língua portuguesa ensinada na escola
deve ser aquela em uso nas mais diversas situações e con-
textos, em que os sujeitos a reconheçam como instrumento
de mediação do homem com o seu meio e, por isso mes-
mo, modifica-se de acordo com a situação de uso.
Imbuídos destes pressupostos, este livro está assim
organizado: no primeiro capítulo, com o título A história
do ensino da língua portuguesa e seus desafios na atualidade,
traz-se a discussão da história do ensino de língua por-
tuguesa, percorre-se um caminho de complexidade, por-
que a prática de ensino está imbricada no contexto social
em que o País se encontra. Nesse percurso, faz-se neces-
sária a reflexão sobre quem aprende, quem ensina, o que
se aprende, o que se ensina, como se aprende a ensinar e
como se ensina. Essa discussão conduz, portanto, a uma
análise dos sujeitos do ensinar e do aprender, e do contex-
to sociocultural em que estes estão submetidos.
Com o título Novos olhares sobre o processo de compreensão
leitora, o capítulo dois traz à baila discussões de forma que a
escola reconheça a prática da leitura e saiba de sua impor-
tância para a inserção social do sujeito. A escola ainda tem
encontrado dificuldades em assumir a leitura como uma ati-
vidade sistêmica, visto que essa prática exige do professor
não somente atuação mais eficaz em sala de aula, mas conhe-
cimento sistematizado de um conjunto de fundamentos que
constituem a prática pedagógica do ensino da leitura, isto é,
procedimentos didáticos e metodológicos que se harmoni-
zem em prol do desenvolvimento da leitura, delimitando, as-
sim, o papel do professor como o de mediador dessa prática.
13
Já o terceiro capítulo, O processo de mediação da escrita:
da leitura à produção de texto, apresenta um relato de expe-
riência com a mediação da escrita ocorrida durante o Está-
gio Supervisionado na Regência do Ensino Fundamental,
disciplina obrigatória do Curso de Letras da Universidade
Estadual de Roraima, realizado em uma turma do 8.º ano
do Ensino Fundamental, de uma escola da rede pública
estadual, da cidade de Boa Vista, capital de Roraima, sob
a supervisão da professora Luzineth Rodrigues Martins.
Uma proposta de compreensão da pesquisa pela prática.
Em Possibilidades de uso da variação linguística em ati-
vidades de sala de aula da educação do campo, o quarto capí-
tulo, faz-se um breve estudo sobre a variação linguística
visando ao entendimento das motivações para essa varia-
ção. Ao mesmo tempo propõe uma orientação de como
podemos entender a variação linguística produzida em
contextos de não monitoramento. Na sequência, faz-se
uma abordagem sociolinguística educacional sobre a va-
riação linguística no ensino, com a finalidade de mostrar
aos professores como podem eles assumir uma postura de
esclarecimento sobre as variações ocorridas nas falas dos
trabalhadores rurais ou dos filhos destes, com o fim de eli-
minar o preconceito linguístico.
Já no quinto capítulo, com o título Pesquisa na forma-
ção e na prática do professor, apresenta-se a relação intrínse-
ca entre ensino e pesquisa. Para tanto, defende-se a pes-
quisa como via de construção do letramento acadêmico,
em seguida, apresentam-se vivências com a pesquisa em
diversos momentos da formação de professor, com o pro-
14
pósito de mostrar como se torna esta aliada na produção
do conhecimento, na análise e no enfrentamento de ques-
tões da prática pedagógica.
O sexto capítulo, Material didático: uso e reflexão na cons-
trução do conhecimento discute o dilema do material didá-
tico de forma a compreender como e quando utilizarmos.
Além disso, faz reflexão sobre o professor e as possibilida-
des de uso de materiais diversificados no ensino de língua
portuguesa em busca de compreender o papel docente na
formação dos alunos. Como também, discute o uso crítico
do material didático e avalia seu uso e construção. Fecha-
-se com a apresentação da produção de material didático e
apresenta-se relato de construção de alguns deles.
Para fechar a discussão, trazemos no capítulo Meto-
dologia e planejamento: a sequência didática no ensino da língua
portuguesa a discussão sobre o ensino da língua materna
não como uma tarefa simples, pois ensinar envolve uma
série de questões, como quem ensina, quem aprende, o
que se ensina, o que se aprende, como se ensina, como se
aprende e tantas outras que se queira acrescentar.
Esperamos que a leitura desta obra seja significati-
va para a formação continuada dos alunos do Curso de
Especialização em Educação do Campo e suas metodolo-
gias de ensino e para os demais professores que sentirem
a necessidade de conhecer os fundamentos teóricos-meto-
dológicos do ensino de Língua Portuguesa na atualidade,
uma vez que a obra discute esses fundamentos e os situa
no ensino de modo geral, convocando os professores a in-
teragirem em seu contexto de ensino.
15
1 A História do Ensino da Língua Portuguesa
e seus desafios na Atualidade
Luzineth Rodrigues Martins
Jairzinho Rabelo
Introdução
17
1.1 Um pouco da história do ensino de língua portuguesa
18
1860 Desde os primeiros registros sobre o ensino da língua, a escrita
é vista independentemente da leitura e como uma habilidade
motora, que demanda treino e cópia do formato da letra por parte
do aprendiz
19
Ensinar e aprender são duas questões com relações
intrínsecas permeadas por uma concepção ampla de sujei-
to, de papel das escolas e dos sujeitos que nela se encon-
tram, pois o que se faz no ato de ensinar é reflexo do modo
como se concebe a relação língua, ensino e sociedade. Os
Quadros 2, 3 e 4 detalham um pouco essa relação nas dé-
cadas de 1970, 1980 e 1990.
20
Quadro 2 – Panorama histórico do ensino de Língua Portuguesa
no Brasil na década de 1970
Concepção de Língua Diretriz de Ensino Foco do Ensino
Expressão ou tradução Chegada dos docu- Os estudos gramaticais – a par
do pensamento, isto é, a mentos escolares e dos estudos retóricos – são
capacidade do indivíduo de alguns manuais e aqueles que desenvolverão a
de organizar o seu pensa- livros didáticos, das técnica para falar e escrever
mento. Desse modo, usar ideias da linguística, bem e certo, estabelecendo
a língua portuguesa era o misturando concei- um íntimo diálogo com a vi-
mesmo que pensar e pen- tos estruturalistas e são positivista de mundo. As
sar certo. Seria utilizar a pós-estruturalistas regras no estudo escolar são
linguagem de modo cor- vistas como o modo de orga-
reto, seguir regras univer- Surgem as áreas de nizar o mundo, por meio da
sais (divisão, classificação comunicação e ex- obtenção da ordem, pode-se
e organização) pressão, englobando caminhar para o progresso
Língua Portuguesa,
A dicotomia saussureana Educação Física, A gramática escolar incide,
langue/parole ganha for- Arte, e Língua Es- principalmente, em exercí-
ça dos estudos linguísticos trangeira Moderna, cios estruturais de morfos-
na formação dos professo- sem, contudo, con- sintaxe frasal, na busca da
Década de 1970
res, mas nas escolas, como seguir, de fato, uma internalização inconsciente
na universidade, estuda- aproximação entre da norma culta (tomada
-se sobretudo, a langue, ou esses componentes como variedade de prestí-
seja, sistema estruturado curriculares gio e aquela que promove-
de signos, não a parole, a rá o cidadão)
manifestação individual Na prática, contudo,
da língua foram os vestibula- As regras possibilitam in-
res que se encarre- ternalizar um modo de fa-
Influenciada pelos ideais garam deorganizar zer (aplicação das regras)
de Jakobson, a escola irá o currículo. que será desenvolvido em
valorizar as funções da lin- circunstâncias sociais fora
guagem, preocupando-se Além disso, a for- do ambiente escolar, ou
em categorizar, estruturar mação do professor seja, o como e quando o
o para que o indivíduo começa a priorizar a falante faz uso das regras
utiliza a linguagem de quantidade forma- que aprende na escola não
acordo com quem a uti- da, e não a qualidade é preocupação da discipli-
liza, onde, quando, com docente. O salário da na Língua Portuguesa
quem, a fim de comunicar categoria docente co-
algo meçam a se achatar e Ler e escrever bem são as
as fórmulas prontas consequências do pensar, e
soam preferíveis a as propostas dos professo-
quaisquer escolhas res se baseavam na discus-
consciente dos pro- são sobre as características
fessores normativas da língua.
21
Quadro 3 – Panorama histórico do ensino de Língua Portuguesa
no Brasil na década de 1980
Concepção de Língua Diretriz de Ensino Foco do
Ensino
Surgimento dos Parâ- Teoricamente o estudo gramatical dá A década de
metros curriculares Na- vez à análise linguística – processo re- 1980, no que
cionais. Esse documento flexivo dos movimentos dos recursos diz respeito
definirá linguagem como lexical e gramaticais e da construção à documen-
espaço psicossocial em composicional de textos, considerando tação oficial,
que os indivíduos atuam, seu gênero discursivo, suporte, meio/ continua va-
constituem outros e se época de circulação e de interlocução lorizando a
constituem, ou seja, tra- (contexto) e relaciona-se com as ativida- autonomia
balho coletivo (discurso) des (ações) de leitura e escrita (reescrita) do professor
orientado para uma fina- e começa a
lidade em situação de uso O que se deseja é que o conhecimen- dar um es-
to e a reflexão das regras visem à ati- paço maior
O conceito é complexo, vidade (reais e contextualizadas) de ao texto
não imediatamente absor- recepção e produção
vido pelos professores, o A formação
que trouxe uma série de A área de Comunicação e Expressão docente con-
incompreensões e a oposi- é substituída pela área de Lingua- tinua prio-
ção “tradicional/ constru- gem, Códigos e suas Tecnologias, rizando a
Década de 1980
22
Quadro 4 – Panorama histórico do ensino de Língua Portuguesa
no Brasil na década de 1990
Concepção de Língua Diretriz de Ensino Foco do Ensino
As correntes acadêmicas avan- O ensino não é O foco é a análise dos
çaram e a proposta de Mikhail mais visto como textos, e não o ensino
Bakhtin (1895- 1975) chegou à uma sucessão de da gramática.
educação etapas, e sim um
processo contínuo. As situações didáti-
Bakhtin apresentou uma nova Desse modo, de- cas essenciais para o
concepção de linguagem, a senvolve compe- Ensino Fundamental
enunciativo-discursiva, que tências e habilida- passaram a ser: ler e
Década de 1990
23
1.2 A formação recebida pelo professor torna legítimo o
trabalho com o gênero na sala de aula?
24
problema já estaria solucionado, considerando que há na
literatura obras destinadas a esse enfoque metodológico
em formatos diversos.
A questão é compreender que o trabalho com os gê-
neros não é simplesmente uma opção de metodologia de
ensino, mas o resultado da concepção de língua como uma
prática social, e entendê-la assim é entender que as diver-
sas situações discursivas realizadas pelos sujeitos são or-
ganizadas em forma de gênero, que representa o modo
como esses sujeitos interagem, ou seja, um modo de ex-
pressão do dizer que se materializa pelo texto. Neste caso,
a metodologia de ensino de gêneros é reflexo da concep-
ção de língua, e não uma mera opção de ensino.
Durante anos, a educação concentrou-se em como
ensinar e deixou em segundo plano o aprender. Com in-
fluência dos estudos interacionistas, fica clara a necessi-
dade de a escola, por conseguinte, o professor, olhar para
o processo pedagógico de outra maneira. É importante
entender como os alunos desenvolvem sua aprendizagem
para propor um ensino que possa promovê-la.
É necessária a compreensão de que o conhecimento
não é concebido como uma cópia do real, incorporado dire-
tamente pelo sujeito; pressupõe uma atividade que ocorre
à medida que o indivíduo recebe os conhecimentos, orga-
niza-os e os integra aos já existentes. O aprendiz só se tor-
na sujeito protagonista de seu processo de aprendizagem
quando transforma as informações que recebeu em conhe-
cimento próprio e passa por um processo de reorganização
desse conhecimento. Desse modo, para que a aprendiza-
25
gem ocorra, é necessário um sujeito ativo, que dê sentido
às informações disponíveis, acionando os diversos conheci-
mentos em busca de recursos suficientes para avançar.
Em se tratando de conhecimento sobre a língua, Co-
roa (2003) destaca três formas de entendê-la: 1) concepção
de língua como estrutura, cuja ênfase dá-se na estrutu-
ra morfológica e sintática; 2) concepção de língua como
comunicação, com ênfase na mensagem constituída pela
sentença; 3) concepção de língua como interação ou atua-
ção social, cuja evidência dá-se na unidade do texto.
Nessa última perspectiva, o professor precisa enten-
dê-la como uma atividade interacional eminentemente
humana, que ocorre em contextos sociais reais, de forma
colaborativa, em que o indivíduo atua e se constrói na re-
lação com o outro. Tal concepção reconhece como sujeito
ativo aquele que, nas suas relações interacionais, realiza
um trabalho resultado da exploração dos recursos da lín-
gua postos à sua disposição como falante.
Essa concepção de língua deve atender ao propósi-
to de possibilitar a construção dos discursos sociais, como
instrumento de ação da sociedade, portanto mecanismo
social para atender aos mais diversos propósitos dos sujei-
tos, a depender da necessidade e do contexto de interação.
Sendo assim, o papel do professor é de extrema responsa-
bilidade, pois ele deverá criar situações que permitam ao
aluno vivenciar os usos sociais da linguagem, de acordo
com os diferentes contextos discursivos.
Desse modo, a inclusão de uma abordagem mais
atualizada sobre os estudos linguísticos, especialmente
26
nos cursos de Letras, tem sido defendida por muitos espe-
cialistas, considerando o avanço significativo dessas abor-
dagens nos estudos da linguagem nas últimas décadas.
Ilari (1997, p. 16-17) defende a difusão dos estudos
da linguística moderna nos cursos de formação por várias
razões, entre elas, está a de que ela traz aos professores
que lidam com o ensino de língua portuguesa um suporte
teórico que os ajudará na compreensão do fenômeno glo-
bal da linguagem, e não somente em uma única face da
língua. O autor considera que a linguística:
1. introduz na formação do professor um elemento
formativo porque o ajuda a avaliar as potenciali-
dades e as limitações que caracterizam a expres-
são e a comunicação dos seus alunos;
2. ajuda-o a fixar os objetivos viáveis e possibilitar o
exame crítico dos recursos didáticos que a indús-
tria editorial proporciona;
3. ajuda também a desautomatizar a visão corren-
te dos fatos da língua, bem como proporciona a
oportunidade de método da investigação próprio
das ciências naturais.
4. suscita a todo momento contraste entre cultura
dominante e culturas relegadas entre o material
didático e o “didatizado”.
27
sam essa visão para um olhar sobre o texto na observância
da materialidade linguística e textual, e dos processos dis-
cursivos envolvidos.
As abordagens das teorias do texto e dos discursos
para o ensino da língua materna revelam a compreen-
são do que ocorre no processamento textual, mostrando
a linguagem como a capacidade humana de simbolizar
e de realizar ações também simbólicas, que é própria do
arcabouço teórico das abordagens sociointeracionistas da
aprendizagem e do desenvolvimento da psicologia vi-
gotskyana (MATÊNCIO, 2001). Essas abordagens ajuda-
rão o professor a compreender a dinamicidade da língua
e a assumi-la como prática social interativa, e subsidia a
formação do professor de língua materna tanto do ponto
de vista dos aspectos psicológicos quanto dos aspectos te-
óricos e metodológicos do ensino.
Também a formação sociolinguística do professor o
ajuda a compreender as condições em que as ações de lin-
guagem são produzidas pelos falantes. Mollica (2009, p. 32)
destaca a emergência desses conhecimentos na formação
do professor, como fundamentos para a compreensão “de
traços sociolinguísticos na leitura, na escrita de gêneros e
nos estilos formais”. Não é por acaso, pois, que a inclusão
de abordagens mais atualizadas sobre os estudos linguísti-
cos nos cursos de Letras tem sido defendida por muitos es-
pecialistas. Vejamos o que diz Coroa (2002) a esse respeito:
28
discurso – como caminho; deve se instaurar
na dialética entre a formação técnica e a
formação ideológica, pois não basta ao
condutor do processo pedagógico conhecer
as bases teóricas de uma abordagem
discursiva, é necessário, sobretudo, querer
e saber se situar como um dos sujeitos dos
discursos que constituem e são constituídos
no espaço escolar. (COROA, 2002, p. 5,
grifos da autora).
29
dos diferentes modos de apropriação da
realidade, que atualizados nas formas de
interação desse grupo, pela internalização
de recursos linguísticos e mobilização
de estratégias igualmente linguísticas,
produzem a tessitura de seus textos. É
nesse sentido, pois, que se pode dizer que
uma língua nacional se constitui pelos usos
linguísticos que constituem uma realidade
e se materializa pelos usos linguísticos
que constituem os textos e os discursos
produzidos em diferentes instituições.
(MATÊNCIO, 2001, p. 5).
30
do de suas condições. Um trabalho de compreensão do
texto implica uma ação complexa, porque muitos pontos
de vista podem ser lançados a ele, de modo a atender aos
vários objetivos que se deseja. Uma ação necessária, no en-
tanto, é a observação da linguagem e do conteúdo comuni-
cativo do texto. Assim, discutir a função social do gênero
e as ações de linguagem nele produzidas, em atendimento
à situação discursiva em que o sujeito está envolvido, é a
condição para que o texto seja compreendido.
Em termos metodológicos, o professor precisa apon-
tar o universo de referência (ANTUNES, 2010) para a aná-
lise que deseja fazer com seus alunos, pois eles precisarão
ter a consciência de quais dimensões serão abordadas no
trabalho de análise. O professor pode selecionar a dimen-
são discursiva do texto, aquela que responde à pertinên-
cia em razão da situação comunicativa e sua eficácia no
contexto discursivo, e a dimensão de construção do texto,
onde residem as escolhas do sistema linguístico-discursi-
vo. Pode ainda selecionar a dimensão informacional, que
responde à análise do nível comunicativo do texto.
Essa ação analítica torna-se um grande subsídio à
produção escrita do aluno, porque direciona o olhar para
o fazer interacional por meio da linguagem. Esse trabalho
é fundamental para que o discente adquira subsídios ne-
cessários à produção textual.
Para exemplificar as dificuldades que ainda perduram
no ensino com o texto, Martins (2012) apresenta um proto-
colo verbal de sala de aula, produzido para a tese de dou-
torado, cujo tema aproxima-se com o que se discute aqui.
Vejamos como o texto é trabalhado nesse evento.
31
Fragmento 04 – Protocolo 072
Evento: Leitura de texto
2
Cf. MARTINS, 2012, p. 55.
32
(21) A3: Fala de novo que eu num entendi não, professo-
ra. (22) P: Ele teve a gentil ideia de plantar os morangos
depois que a enterraram no jardim. (23) A3: Ah tá, mata-
ram a mulher, enterraram ela no jardim e plantaram os
morangos em cima da catacumba.
(24) P: Aí os morangos nasceram, só que não podia co-
mer porque a mulher tava enterrada lá.
(25) A3: Com o adubo da mulher.
(26) P: Só que não diz se ele matou, não diz se ela morreu
de morte matada ou morrida, não diz nada. Diz que ela
morreu e foi enterrada lá. Agora, subentende-se que ele
a matou.
(27) A3: Ele pagou alguém pra matar ela.
(28) P: Como se o salário dela era pouco?
(29) A3: Mas ele a matou.
Os alunos falam ao mesmo tempo.
(30) P: Bora ao que interessa.
(31) A3:Bora.
(32) P: Na frase, [...] a palavra seu é um pronome posses-
sivo, certo?
(33) TA: Certo
(34) P: Aponte uma frase do texto em que o seu tenha
sido usado como um pronome de tratamento
[...]
(42) P: Retire do texto uma frase em que esse pronome de
tra tamento para apareça na sua forma culta.
(43) A5: Senhor ( ?)
[....]
(50) P: Como que eu vou colocar o seu na forma culta
de pronome de tratamento? Quais são os pronomes de
tratamento?
33
Duas questões relativas a esse momento merecem
reflexão. A primeira delas é o fato de que a cópia do texto
durou o tempo de uma aula inteira, tempo didático que
poderia ser melhor aproveitado com discussões sobre con-
textos e usos da língua no texto. Poderia ser utilizado para
o estudo do texto, considerando que, conforme vimos no
Fragmento 04, Protocolo 07, a professora não dispensou
tempo suficiente para alguns alunos entenderem a infor-
mação implícita do texto: a morte da suposta esposa do
personagem que dialogava com a vizinha.
A segunda questão refere-se à habilidade leitora
do aluno. O sujeito leitor revelou pouca desenvoltura na
leitura, pela dificuldade de pronunciar corretamente al-
gumas palavras do texto, necessitando assim da colabo-
ração de seus colegas e da professora. Expôs seu baixo ní-
vel de leitura quando, ao terminar de ler o texto, afirmou
não tê-lo entendido.
Sabemos que os alunos com baixa proficiência de lei-
tura têm mais dificuldades de compreensão textual por-
que acabam dispensando grande esforço cognitivo no pri-
meiro momento da leitura, fato que compromete a etapa
seguinte, a da compreensão. Eles dispensam muito de sua
concentração ao processo de pronúncia do léxico do texto,
de percepção da organização sintático-estrutural das ora-
ções e da organização discursiva, marcada pela pontuação
do texto, restando pouca energia e capacidade cognitiva
para a compreensão leitora, mas não podemos aqui alon-
gar esse tema, remetemos à leitura de Moura e Martins
(2012). As autoras destacam a necessidade de o professor
34
considerar a leitura uma fonte de interação e de produção
de conhecimentos, centrada em uma metodologia de me-
diação que visa a desenvolver no aluno habilidades cog-
nitivas e metacognitivas, proporcionando, assim, o desen-
volvimento da competência discursiva.
No que tange à mediação da leitura, o estudo do
texto, por meio da análise da situação discursiva que o
suscitou, é um recurso didático favorável à construção da
competência discursiva, uma vez que essa ação permite ao
aluno ir aprendendo, com a leitura do texto, os modos de
agir pela linguagem. Ação que será complementada quan-
do ele tiver a oportunidade de tornar-se também leitor crí-
tico do seu texto.
A respeito da seleção de aspectos para a análise tex-
tual, Antunes (2010, p. 45) diz que precisamos considerar
que as dificuldades apresentadas na análise de texto são
naturais “porque a tarefa de ‘analisar’ implica ‘separar os
elementos’ de um conjunto, e, em um texto, nada é total-
mente separável”. Lembra ainda:
Grosso modo, podemos dizer que tudo
pode ser analisado em textos. De fato, neles
toda a língua, em suas múltiplas dimensões
pode estar presente. Evidentemente, um
determinado texto não abarca todos os fatos
linguísticos e todos os aspectos responsáveis
por sua funcionalidade sociointerativa.
Contudo – repito – os textos são o campo
natural para a análise de todos os fenômenos
da comunicação humana. Neles é que os
aspectos da produção e da recepção de
nossas atuações verbais se tornam acessíveis
à observação. (ANTUNES, 2010 p. 55).
35
A ação da professora, descrita no fragmento anterior,
ficou distante dessa perspectiva, pois o texto foi utilizado
como pretexto para o trabalho gramatical. A ação ocorrida
durante a leitura limitou-se a comentários da professora
sobre algumas ações dos personagens, e quando os alunos
tentaram compreender o homicídio citado no texto, ela
iniciou o exercício de gramática, não permitindo nenhum
diálogo sobre a questão. Apenas explicitou o motivo dos
morangos não poderem ser consumidos.
Nas falas: “Retire do texto uma frase em que esse
pronome de tratamento agora apareça na sua forma cul-
ta” e “Como que eu vou colocar o seu na forma culta de
pronome de tratamento?”, a professora não considerou as
condições de interação em que o pronome seu apresentou-
-se no texto. Assumiu como foco da aula apenas o aspecto
morfossintático da língua. No primeiro enunciado “O se-
nhor não colhe, seu Agenor? Estão no ponto”, o pronome
seu já havia sido usado, no início da oração, na forma de
pronome de tratamento mais formal. Assim, a escolha fei-
ta pelo sujeito produtor do texto pode indicar o uso de
uma variante de mesmo valor, como estratégia de não re-
petição de item lexical; mas o foco do evento não permitiu
uma discussão a esse respeito.
O evento parece revelar também uma compreensão
equivocada sobre o uso do texto na sala de aula, pois ele é
levado à sala para iniciar o trabalho com a gramática, mas-
carando, assim, sua finalidade como produto de uma ação
social de uso da língua. Também destaca que a concepção
de ensino assumida pela professora é de transmissão/co-
36
municação de conhecimentos gramaticais, e não de uma
atividade de mediação da aprendizagem dos alunos que
tem na interação a via de promoção dessa aprendizagem.
37
Considerando a necessidade de incorporação desses
conhecimentos no ensino da língua materna, Neves (2010)
discute a necessidade de o professor transformar a aula de
gramática em espaço de observação da funcionalidade da
língua, por meio de atividades que visem ao estudo da lín-
gua e da linguagem empregada pelos sujeitos nas diversas
situações de uso.
Também autores como Antunes (2007), Bagno (2001,
2004, 2011) e Silva (2003) têm discutido a necessidade de o
professor ultrapassar a visão restrita da língua, que se faz
pelo ensino da gramática, seja ela normativa, seja descritiva.
Antunes (2007) orienta o ensino da língua por meio
de uma perspectiva que vá além da gramática, conside-
rando que esta representa apenas as normas da língua. A
autora nos complementa pela discussão que faz em seu
livro Muito além da gramática. Entre outros esclarecimen-
tos, ela lembra que ensinar a língua materna vai além do
ensino da gramática, pois esta é somente um dos aspectos
da língua, além do léxico, da composição do texto e da si-
tuação discursiva que promove o uso da língua.
Em complementação a esse ponto de vista, Bagno
(2001) tem orientado o ensino da norma-padrão em um mo-
delo comparativo entre o que prevê a gramática tradicional
e o que é contemplado na fala dos brasileiros. Afirma:
[...] ensinar a norma-padrão não quer dizer
simplesmente levar o aluno a conhecer
todas as regras, a familiarizar-se com elas,
a fazer ele saber aplicá-las com precisão e
adequação. É muito mais do que isso, na
minha proposta. Defendo um ensino crítico
da norma-padrão. E para empreender essa
38
crítica, é necessário despejar sobre o pano
de fundo homogêneo do cânon linguístico
da heterogeneidade da língua realmente
usada. Para tanto, a escola deve dar
espaço ao máximo possível de manifestações
linguísticas, concretizadas no maior número
possível de gêneros textuais e de variedades
de línguas: rurais, urbanas, orais, escritas,
formais, informais, cultas, não-cultas etc.
Proponho como Matos e Silva (1995:37)
‘uma pedagogia voltada para o todo da
língua e não para algumas de suas formas’.
(BAGNO, 2001, p. 156-157, grifos do autor).
39
utilizar com proficiência a variedade padrão do português
quando necessário e, ao mesmo tempo, permita ao pro-
fessor assumir um ensino efetivamente mais próximo da
realidade linguística brasileira.
Essas posturas e orientações didáticas para o ensino
da língua materna convergem para o entendimento de que
as normas gramaticais da língua não podem ser isoladas
da situação discursiva que suscitou o seu uso.
Em sua pesquisa de doutorado, Martins (2012) ana-
lisou em um grupo focal, a compreensão dos professores
a respeito do ensino com o gênero. A esse respeito, os
professores acreditam que é necessário mudar o foco do
ensino da gramática para o gênero, mas revelam suas li-
mitações, mesmo quem disse já ter alguma experiência de
ensino com o gênero, caso citado a seguir.
40
que o gênero não é entendido como um modo de agir pela
linguagem, que congrega questões de natureza diversa.
Outro aspecto igualmente preocupante para os pro-
fessores é a seleção e a progressão dos gêneros, nas vá-
rias etapas da escolarização básica, questão abordada pela
mesma professora.
4
Cf. MARTINS, 2012, p. 141
41
Esta é uma questão bastante inquietante nos estudos
dos gêneros, apesar de encontrarmos na literatura contri-
buições a esse respeito. Antunes (2009) apresenta um es-
boço de proposta para o ensino com os gêneros nas sé-
ries iniciais do Ensino Fundamental, e Schneuwly e Dolz
(2010) sistematizam metodologicamente uma proposta
provisória de gêneros partindo de cinco agrupamentos
que abrangem os domínios sociais de comunicação, os as-
pectos tipológicos e as capacidades de linguagem domi-
nantes, com os respectivos exemplos.
-O -A nota
42
-A
-Como -Exposição apresentação
Transmitir funciona? -O artigo escrita à nota de
conhecimentos Apresentação ciclopédico de síntese documentos
deum -A entrevista -A exposição -O relatório
brinquedo radiofônica oral científico
e de seu -A exposição
funcionamento oral à
Entrevista
radiofônica
43
zam a ação do professor: a legitimidade do ensino, a
pertinência e a solidificação dos saberes escolares na
sua relação com o contexto sociodiscursivo dos alunos
(SCHNEUWLY; DOLZ, 2010).
Diante do exposto, estamos cientes de que outros
aspectos podem e devem ser acrescentados, assim como
temos consciência também de que a prática cotidiana des-
sa perspectiva de trabalho docente precisa ser construída
em processos de formação, e assumidos na sala de aula.
Também parece ser questão fulcral incluir o trabalho de
mediação na proposta escolar para que a ação do profes-
sor seja mais viável.
44
Na educação do campo, o ensino deve partir das prá-
ticas de letramento vivenciadas pela comunidade escolar
e ir até aquelas que, de modo geral, são mais utilizadas
na sociedade moderna, como um recurso de ampliação da
competência comunicativa dos alunos, em cumprimento
ao papel social da escola.
45
Referências
46
FIGUEIREDO D. C, BONINI, A. Práticas discursivas e ensino
do texto Acadêmico: concepções de alunos de mestrado sobre
a escrita. Linguagem em (Dis)curso, Tubarão, v. 6, n. 3, p. 413-
446, set.-dez. 2006.
47
MORTATTI, Rosário Longo. Os sentidos da alfabetização: São
Paulo 1876-1994. São Paulo: Unesp, 2000.
48
2 Novos Olhares Sobre o Processo de
Compreensão Leitora
Luzineth Rodrigues Martins
Ana Aparecida Vieira de Moura5
Introdução
49
isto é, procedimentos didáticos e metodológicos que se ar-
ticulem em prol do ensino da leitura, desenvolvimento e
formação de leitores, delimitando, assim, o papel do pro-
fessor como o de mediador dessa prática.
Em conformidade com os Novos Estudos do Letra-
mento (STREET, 2001), as práticas sociais da leitura devem
atender às necessidades dos sujeitos nelas envolvidos, rela-
cionam-se com as práticas sociais de letramentos de deter-
minada realidade e comunidade. Além de considerar que
os sujeitos devem formar-se protagonistas das transforma-
ções inerente à própria realidade, a educação deve ponde-
rar e reconhecer quem são os sujeitos que ali frequentam.
É no sentido de colaborar para uma mediação de lei-
tura mais coerente com as práticas sociais dos sujeitos que
adaptamos este trabalho, resultado da pesquisa do Projeto
Leitura e Mediação Pedagógica, coordenado pela professora
Stella Maris Bortoni-Ricardo (2012), pesquisadora da UnB/
CNPq, e que traz ideias desenvolvidas em dois textos an-
teriores: A sequência didática aplicada à leitura: os explícitos, os
implícitos e a mediação do professor, de autoria de Moura, Mar-
tins e Caxangá (2010) e A mediação da leitura: “fritando o peixe
e olhando pro gato” de Martins e Moura (2010).6
O texto, entre outras coisas, enfatiza que todo profes-
sor deve atuar como mediador de leitura, visando a desen-
volver nos alunos habilidades discursivas e cognitivas no
sentido de tornarem-se autônomos e críticos no ato de ler
6
Os textos referidos foram apresentados no III Congresso Latino
Americano de Compreensão Leitora –COMLEI, Brasília. E como
resultam de projeto do Projeto de Leitura e Medicação Pedagógica
Coordenado pela Professora Stella Maris Bortoni-Ricardo estão
disponíveis no site <www.stellabortini.com.br>.
50
para aprender. Para essa proposição, argumentamos que
a mediação do professor precisa ocorrer de maneira siste-
mática, contextualizada e seguir alguns parâmetros, como
por exemplo o da interação aluno-professor, no momento
da leitura, pois essa abordagem possibilitará ao aluno en-
tender não só o que está na superfície do texto, mas tam-
bém o implícito.
Dessa forma, organizamos o texto dando destaque
à relação entre leitura e compreensão leitora; bem como
os fundamentos teóricos e metodológicos da compreensão
leitora; o processo de organização didática para mediação
pedagógica; Dimensões da compreensão leitora e conside-
rações finais
51
mais importância ao texto; enfatiza o texto e os dados con-
tidos como ponto de partida para a compreensão; provém
de uma visão estruturalista e mecanicista da linguagem. A
segunda dá importância ao leitor; vê o leitor como a fon-
te única de sentido, de forma que o sentido seria apenas
como confirmador de hipóteses.
A partir de Kato (1985), é possível definir o perfil do
leitor em conformidade com os modelos de leitura ado-
tados e, para essa autora, o leitor maduro é aquele que
utiliza das duas formas de processamento de informações.
Os estudos do letramento, na década seguinte, pas-
saram a subsidiar a pesquisa sobre a leitura, nesse cená-
rio, iniciaram-se trabalhos a partir do conceito de leitura
como prática social com o pressuposto de que o desen-
volvimento de capacidades no leitor o possibilitaria in-
teragir com diferentes gêneros textuais, contínuos e não
contínuos, pertencentes a múltiplos domínios discursi-
vos, e o tornaria capaz de usar a leitura como instrumen-
to para continuar aprendendo.
Segundo Koch e Elias (2008), a leitura é uma ativi-
dade altamente complexa de produção de sentidos que
se realiza com base em elementos textuais e requer a mo-
bilização de um vasto conjunto de saberes. Considera-se,
portanto, um modelo interativo de leitura que conside-
ra o leitor situado historicamente em um contexto social
complexo e dialético, caso dos educandos da Educação do
Campo. Dessa forma, a leitura passou de uma atividade
meramente de decodificação, ou centrada unicamente no
leitor, para uma atividade de compreensão, envolvendo
texto, autor, leitor.
52
As estratégias que o sujeito mobiliza, segundo Koch
e Elias (2008), no ato da leitura, para realização do proces-
samento textual, envolvem três grandes sistemas de co-
nhecimentos: o linguístico, o enciclopédico e o interacio-
nal. O conhecimento enciclopédico corresponde ao capital
cultural do sujeito, ao conhecimento prévio do leitor sobre
o que lê, enquanto o conhecimento linguístico refere-se ao
que se conhece sobre a gramática, o léxico, os meios coesi-
vos que são importantes para o entendimento do texto. Já
o conhecimento interacional envolve as formas como esse
sujeito interage por meio da linguagem. Diz respeito ao
seu conhecimento sobre as diversas formas de interação
mediadas pela linguagem.
A leitura, comprovadamente, não é uma das ope-
rações cognitivas mais simples de fazer, pois o ato de ler
consiste, segundo González Fernández (1992), em um con-
junto de habilidades que vão desde a motora mais simples
como a ação ocular até as ações cognitivas mais comple-
xas, como o domínio do léxico, das estruturas sintáticas
gerais da língua e, principalmente, dos objetivos de leitura
a serem alcançados, entre outras.
A ação de leitura do texto e das relações que o permeiam
é ao mesmo tempo uma ação de leitura do mundo pelo texto,
porque na produção textual estão embutidas as marcas do
sujeito produtor e de sua relação com o mundo, por isso há a
negação de que a leitura seja uma ação individual, e sim uma
tríade autor-texto-leitor (KOCH; ELIAS, 2008).
53
2.2 Fundamentos teóricos e metodológicos da
compreensão leitora
54
tante que a escola se responsabilize pelo desenvolvimen-
to de ações cognitivas, levando os alunos, no processo de
construção dos seus conhecimentos, a comparar, classifi-
car, analisar, discutir, opinar e julgar. Além disso, a fazer
generalizações, analogias, diagnósticos de tal forma que
solidifiquem sua criticidade.
Discutir o tema sobre leitura no contexto da Educa-
ção do Campo é de extrema relevância, haja vista vir ao
encontro das necessidades dos povos campesinos, já que
essa população se encontrou durante muito tempo à mar-
gem do processo de uma educação de qualidade. Assim,
para considerar a melhoria do quadro de superação das
dificuldades há que se pensar que o processo formativo
seja visto de forma contextualizada.
A mediação do professor é fundamental para que
ocorra a leitura compreensiva. Kleiman traz a visão de
Vygotsky, ao dizer que: a aprendizagem é construída na
interação de sujeitos cooperativos que têm objetivos co-
muns, (contextualizamos aqui na Educação do Campo).
Como, no caso, trata-se de aprender a ler no sentido cabal
da palavra (em que ler não é o equivalente a decifrar ou
decodificar), a aprendizagem que se dará nessa interação
consiste na leitura com compreensão. Isso implica que é
na interação, isto é, na prática comunicativa em pequenos
grupos, com o professor ou com seus pares, que é criado
o contexto para aquele sujeito que não entendeu o texto,
entenda. (KLEIMAN, 1998, p. 10.)
Com efeito, para que a prática pedagógica não per-
maneça estática, é preciso estabelecer diálogos entre sujei-
55
tos da comunidade, educandos e professores das diferen-
tes áreas do conhecimento. Considerando a falta de acesso
aos bens materiais e imateriais, o interesse pelos livros não
é algo que aparece de repente, para que isso aconteça é
preciso ajudar ao aluno a descobrir o que eles [os livros]
podem oferecer, a descobrir que cada livro pode trazer no-
vas ideias, dessa forma aos poucos o aluno ganha intimi-
dade com o objeto/livro.
Com isso, observamos que há a necessidade de o profes-
sor ter embasamento que norteie sua prática de mediação de
leitura. Para tanto, apresentamos alguns desses fundamentos.
56
O texto não é visto como um produto, mas como um
processo, como um trabalho que deve ser explorado,
valorizado e vinculado aos usos sociais, isto é, segundo
Mascuschi (2008), como um evento comunicativo em
que convergem ações linguísticas, sociais e cognitivas.
57
II. A mediação do professor
Inicialmente, o termo mediação adveio da Psicologia
de Vygotsky (1998) sobre a zona de desenvolvimento real e
proximal, tendo nos signos o principal mediador para o de-
senvolvimento das funções superiores. Oliveira, Almeida e;
Arnoni (2007, p. 101) atribuem “à mediação o dever ou a
possibilidade de eliminar ou minimizar a diferença entre os
termos ensino e aprendizagem, conhecimento sistemático e
experiência cotidiana entre o professor e seus alunos”.
Didaticamente abordado por Pimentel (2007), esse
processo de fornecimento de ajuda objetiva contribuir
para a reestruturação das funções psíquicas que consti-
tuem o processo de aprendizagem, favorecendo o acesso a
um nível superior de desenvolvimento cognitivo.
O papel do professor é ser um interlocutor, encaran-
do o aluno como sujeito de seu discurso, questionando,
sugerindo, provocando reações, exigindo explicações so-
bre as informações ausentes no texto, refutando, polemi-
zando, concordando e negociando sentidos mediante as
pistas deixadas no texto, para que ele alcance o efeito de
sentido proposto pelo autor.
Em se tratando da ação do professor na promoção do
desenvolvimento da leitura, Bortoni-Ricardo, Machado e
Castanheira (2010) referem-se a um tipo de leitura tutorial
como aquela em que o professor assume a condição de me-
diador fazendo as intervenções necessárias para que o alu-
no atinja a compreensão leitora. Seja como for, é consenso
na posição desses autores o fato de que a ação do profes-
sor é indispensável na promoção do desenvolvimento da
58
compreensão leitora. Ele [o professor] se insere como mais
um elemento do processo de leitura, representado assim:
autor-texto-mediador-leitor. Embora, para efeito didático,
os elementos estejam organizados dessa forma, não pres-
supõe uma interação linear.
Uma postura mais ativa do professor em relação
ao ensino da leitura exige conhecimentos e procedimen-
tos didáticos que se harmonizem em prol do desenvolvi-
mento da leitura, delimitando, assim, seu papel como o
de mediador dessa prática. Essa mediação exige grande
interação com o aluno e o texto. Como consequência, os
resultados positivos aparecerão no caminho da formação
do aluno e no crescimento profissional do professor.
O professor, na verdade, precisa compreender as
possibilidades e os caminhos de diferentes métodos e ma-
teriais, conhecer o leitor em desenvolvimento, o que já foi
superado e o que necessita superar, além de compreender
como o leitor deve aprender a ler, caso contrário, ele não
poderá tomar decisões sobre os métodos ou as estratégias
que deve usar.
Além da interação do professor com o aluno e o tex-
to, a medição requer também postura de conhecedor dos
processos interativos que ocorrem em sala de aula e no ato
de leitura. Exige a compreensão do seu papel social, o que
implica a responsabilidade por uma formação continua-
da e a percepção da necessidade de realizar a mediação.
Pressupõe estratégias didáticas consonantes à perspectiva
teórica adotada pelo professor, pois no cotidiano da sala
de aula, surgem as mais diversas situações que possibili-
tam o desenvolvimento de um diálogo pedagógico com a
59
finalidade de ensinar e aprender (FREIRE, 1996); e o pro-
fessor deve ter consciência de suas escolhas pedagógicas,
visando a facilitar a articulação dos conhecimentos citados
anteriormente para a construção do conhecimento.
60
objetivos, entre outros, que são estratégias de metacogni-
ção indispensáveis para tornar o aluno autônomo.
Além disso, e não menos importante, é primordial
observar que as estratégias de mediação adotadas pelo
professor consistem em ajudar o aluno a estabelecer as re-
lações entre o texto e seu conhecimento de mundo; a reco-
nhecer os elementos linguísticos; a perceber a progressão
temática, por meio de elementos sequenciadores, a desen-
volver a metacognição, ou seja, controle sobre as informa-
ções já obtidas com a leitura do texto, sinalizando, quando
necessário, pontos de inferências.
Essa ação ajuda o aluno a buscar, em seu conhecimen-
to de mundo, referências que permitam estabelecer a co-
nexão entre o que é dito e o que ele já conhece sobre o que
foi dito. Um pouco mais além, a percepção da intertextuali-
dade: o diálogo do texto com outros textos, que pode estar
claro ou nas entrelinhas. A compreensão do aluno mantém
relação estreita com a capacidade de perceber esses outros
textos; para tanto, a medição do professor é fundamen-
tal, pois “quanto mais conhecimento textual o leitor tiver,
quanto maior a sua exposição a todo tipo de texto, mais fácil
será sua compreensão” (KLEIMAN, 2004, p. 20).
Habilidades Cognitivas permitem desenvolver as fun-
ções psíquicas superiores como a atenção, análise, síntese,
generalização e abstração (Vigotsky, 1998).
Para tornar mais claro como se processa a mediação
de leitura, organizamos em dois grupos algumas habilida-
des cognitivas e metacognitivas a serem trabalhadas com
os alunos. Dentre elas, podemos citar:
61
Habilidades cognitivas:
1. Acionar os conhecimentos prévios, podendo ser:
enciclopédicos, linguístico e cultural, por meio de
perguntas direcionadas, estabelecendo previsões
sobre o texto; explorando o tema e a área abran-
gente. Essa abordagem ajuda o aluno a estabele-
cer relações e a confrontar os conhecimentos pré-
vios com os que virão; ajuda os alunos a prestar
atenção a determinados aspectos do texto que
podem ativar seu conhecimento prévio; ajuda os
alunos a expor o que já sabem sobre o tema.
2. Construir a linearidade do texto, percebendo a
progressão das informações do texto, na conti-
nuidade temática.
3. Fazer inferências sobre o texto, acionando os co-
nhecimentos culturais para que ele perceba a di-
ferença entre real e ficcional, e relacione o conteú-
do do texto com sua realidade.
4. Desenvolver determinadas habilidades necessá-
rias à compreensão leitora, dentre elas: a relação,
a analogia, a síntese, a classificação, a ordenação
hierárquica, a descoberta da coerência global do
texto, a comparação e a avaliação.
5. Estabelecer uma relação de sentidos entre o texto
e a experiência (universo comunicacional do alu-
no) procurando torná-lo mais real possível
Seguem algumas das estratégias metacogni-
tivas utilizadas.
1. Reconhecer a estrutura do texto, para que ele
aprenda a perceber o objetivo da leitura.
62
2. Identificar o objetivo da leitura e persegui-lo ao
longo do texto.
3. Retomar as aprendizagens construídas por meio
da leitura do texto de modo a ampliar sua visão
de mundo.
4. Retomar de forma sintética as informações con-
tidas no texto, para que o aluno o reelabore sem
que se sinta incapaz de fazê-lo.
5. Identificar as informações novas aprendidas com
a leitura do texto.
63
compreensão leitora. Assim, o professor tem o papel de
intervir no processo, na relação entre o aluno, como leitor,
e o texto como objeto a ser desvendado.
De acordo com Marcuschi (2008), em uma análise da
atividade de compreensão, três questões são importantes:
a noção de língua, a noção de texto e o conceito de infe-
rência, como o da própria compreensão leitora. A compre-
ensão de língua como fenômeno cultural, histórico, social
e cognitivo – que varia ao longo dos tempos e de acordo
com os falantes e com o contexto em que ela ocorre – é
um elemento indicativo para o trabalho de compreensão
leitora. Em se tratando da noção de texto como evento co-
municativo deve levar em conta que “o sentido do texto
não está no leitor, nem no texto, nem no autor, mas se dá
como efeito das relações entre eles e das atividades de-
senvolvidas”. Já “as inferências na compreensão de texto
são processos cognitivos nos quais os falantes ou ouvintes,
partindo da informação textual e considerando o respecti-
vo contexto constroem uma nova representação semânti-
ca” (MARCUSCHI, 2008, p. 242, 249).
Diante disso, vimos que a noção de texto, contexto e
inferência é fundamental para a compreensão leitora; a ela
associamos a noção de intertexto como uma possibilidade
de diálogo com textos diversos. Ao mesmo tempo, obser-
vamos que há necessidade de referências para a efetivação
do trabalho do professor com a compreensão leitora. De
tal forma, apresentamos a seguir as dimensões da compre-
ensão leitora e os indicativos para questionamentos que
podem orientar o trabalho do professor para uma media-
ção, partindo dessa relação multidimensional do texto.
64
2.4 Dimensões da compreensão leitora
65
do grupo de pesquisa em Didática da Língua da Universi-
dade de Genebra e que se refere ao procedimento sequência
didática (SD) sugeridos por Schneuwly e Dolz, (2010).
Para a mediação da leitura, acreditamos que deve-
mos reconhecer algumas dimensões da compreensão lei-
tora, visto que isso colaborará nas atividades de leitura em
sala de aula e na atuação social dos alunos. Assim, eles te-
rão outros olhares, farão leituras diferenciadas, desenvol-
verão a prática do questionamento, em busca de respostas
a determinado texto ou contexto dado.
Ao pensar na leitura no contexto escolar e nas pos-
sibilidades de desenvolvimento das habilidades consti-
tuintes da compreensão leitora, é necessário que a escola
mude o foco atual referente ao ato de ler. Assumir a leitura
como uma atividade em que alunos e professores passam
a ser sujeitos ativos e colaborativos implica novos proce-
dimentos e comportamentos realizados por esses sujeitos.
Como procedimento de mediação da leitura desse
gênero, o professor necessitará fazer a exploração das di-
mensões presentes no texto: o cotexto, o contexto, o infra-
texto e o intertexto.
O cotexto compreende os elementos linguísticos e a
estrutura que definem a materialidade do próprio texto.
É essa dimensão que caracteriza as escolhas gramaticais e
lexicais que remete o leitor à compreensão das intenções
do autor. O contexto, segundo Koch e Elias (2008, p. 64),
“é um conjunto de suposições, baseadas nos saberes dos
interlocutores, mobilizadas para a interpretação de um
texto”. Para que haja compreensão do texto, é necessário
66
que autor e leitor compartilhem, pelos menos parcialmen-
te, conhecimentos, tais como enciclopédico, sociointera-
cional, textual, entre outros. Já o infratexto, diz respeito
ao processo de inferência, que, segundo Marcuschi (2008),
corresponde à geração semântica de novas informações
por meio daquelas que já possuímos em um dado contex-
to. A noção de inferência é fundamental na compreensão
leitora, considerando que ela permite ao leitor ampliar seu
conhecimento sobre o objeto de leitura de que trata o tex-
to. O intertexto corresponde ao pressuposto de que todo
texto é resultado de confluência de outros textos.
Dentro de cada dimensão, há um conjunto de orien-
tações que podem transformar-se em questionamentos
aplicados a cada texto a ser trabalhado pelo professor. A
proposta é que ele seja um mediador entre o leitor, o texto
e o evento comunicativo que resultou na produção do tex-
to. Dessa forma, as orientações a seguir ajudarão o profes-
sor a ampliar a compreensão leitora do aluno.
67
Sequência Didática Aplicada à Leitura
Antes de iniciar a leitura do texto, é importante que o professor
oriente o aluno a fazer uma leitura silenciosa para avaliar o
nível de dificuldade do texto. Em seguida, discuta a técnica de
leitura adequada ao objetivo do texto: sublinhar as informações
importantes, anotar as palavras desconhecidas.
Ajudar o aluno a:
-Reconhecer o gênero do texto, a organização estrutural do
texto, para que ele aprenda a perceber o objetivo da leitura
-Identificar o objetivo da leitura e persegui-lo ao longo do texto
-Acionar os conhecimentos prévios: enciclopédicos, linguístico e
interacional, por meio de perguntas direcionadas estabelecendo
previsões sobre o texto; explorando o tema e a área abrangente
-Localizar informações explícitas no texto e inferir o sentido de
uma palavra ou expressão
-Expor o que já sabe sobre o tema
-Prestar atenção a determinados aspectos do texto que podem
ativar seu conhecimento prévio
-Levantar hipóteses sobre alguns aspectos do texto
-Perceber as relações de hierarquia das informações nos
Cotexto
68
Ajudar o aluno a:
-Perceber a função social do texto
-Reconhecer autor, a intenção, o interlocutor, o suporte, a
situação de produção (época, local, fatos relacionados)
-Estabelecer uma relação de sentidos entre o texto e a experiência
Contexto
Ajudar o aluno a:
-Perceber o implícito no texto, acionando os conhecimentos
Infratexto
Ajudar o aluno a:
Intertextoo
Ajudar o aluno a:
-Retomar as aprendizagens construídas a partir da leitura do
texto de modo a ampliar sua visão de mundo
Registro da leitura
69
2.5 Considerações finais
70
necessárias de mediação e dar oportunidade ao aluno de
conhecer todas as dimensões da leitura. O diálogo do alu-
no com o texto deve ser mediado pelo professor. Desse
modo, ele atinge os objetivos da construção do conheci-
mento e contribui para que os novos olhares aconteçam no
processo de compreensão leitora e sejam postos em práti-
ca em suas atividades cotidianas.
71
Referências
72
MOURA, Ana Aparecida Vieira de; MARTINS, Luzineth
Rodrigues; CAXANGÁ, Maria do Rosário Rocha. A sequência
didática aplicada à leitura: os explícitos, os implícitos e a mediação
do professor. 2010. Disponível em: <a sequência didtica aplicada
leitura.pdf - Stella Bortoni>. Acesso em: 19 jul. 2014.
73
3 O processo de Mediação da Escrita: Da
Leitura à Produção de Texto
Luzineth Rodrigues Martins
Luciana dos Reis da Silva7
Introdução
75
pontaneísta e improvisado; a correção inócua de trabalhos
escolares sem discussão (feedback) nem refacção posterio-
res; e a pouca ênfase no reforço de habilidades letradas,
supostamente previstas apenas para séries anteriores”
(BORTONI-RICARDO, 2011, p. 5).
Para apresentar essa experiência, na primeira seção, ex-
plicitamos o processo de planejamento do estágio; na segun-
da, registramos o processo de mediação da escrita; e na ter-
ceira, evidenciamos os resultados alcançados e as dificuldades
encontradas na realização do trabalho. Com isso, a discussão
que se propõe pode e deve ser levada ao contexto da educação
do campo, pois nesta realidade a escrita é menos utilizada, de-
mandando ao professor uma mediação mais intensa.
76
tenha êxito em sua função, pois como disse Paulo Freire, é
necessário ao professor “saber que ensinar não é transferir
conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua pró-
pria produção ou a sua construção” (FREIRE, 1996, p. 47).
Com a tarefa de realizar o estágio supervisionado
do Curso de Letras, instituímos o planejamento como a
primeira ação a ser realizada, e não mais fácil do que a
regência. Ensinar por meio de gêneros era uma novidade,
exigiu muito tempo de estudo e de transposição do co-
nhecimento adquirido para o planejamento solicitado na
disciplina de Estágio.
Também exigiu que ancorássemos a proposta de tra-
balho em dois eixos: um teórico e outro metodológico. Na
dimensão teórica, o planejamento foi norteado pela con-
cepção interacionista da linguagem, isto é, aquela que con-
cebe a ação de linguagem como resultado da apropriação,
pelo homem, das propriedades da atividade social.
Segundo Vygotsky (1998), o sujeito age sobre a reali-
dade e interage com ela, construindo seus conhecimentos
por meio das relações inter e intrapessoais, internalizando
conhecimentos, papéis e funções sociais. Nesse entendi-
mento, as práticas sociais de uso da linguagem tornam-se
as práticas discursivas que chegarão à escola mediante o
gênero, sendo este o objeto primordial do ensino, especial-
mente quando se trata do desenvolvimento da escrita.
No campo da didática do ensino, a ênfase recai nas
relações entre a linguagem e a atividade na sala de aula.
Nessa concepção, a relação ensino-aprendizagem está
constituída nos pressupostos da Psicologia vigostkiana,
77
sendo a ação do professor centrada na mediação da escri-
ta, visando possibilitar ao aluno o contato com diversos
contextos de uso da linguagem, para ele aprenda a adap-
tá-la às diversas situações vividas em seu cotidiano.
Assumir a interação como o princípio norteador da ativi-
dade docente (ANTUNES, 2003) e o texto como a unidade de
ensino (GERALDI, 2002), traz implicações teóricas e práticas.
A primeira mudança é a ação de “priorizar o texto como uni-
dade de ensino, além de reorientar os objetos (ou conteúdos)
de trabalho”, e a segunda requer recolocar “sob novo foco as
relações de ensino-aprendizagem” (COROA, 2002, p. 4).
O uso do texto na sala de aula demanda para o professor
um trabalho que não se reduz somente a abordagem gramatical,
indo além dessa perspectiva no sentido de discutir e analisar os
usos linguísticos presentes no texto e as condições de interação
que suscitaram o contexto de sua produção. Isso significa que o
professor necessita realizar junto com seus alunos um trabalho
analítico e pragmático da situação de interação textual.
O trabalho com texto na perspectiva apontada anterior-
mente, o professor e o aluno são sujeitos que interagem de
forma ativa na tentativa de construção do sentido do texto.
Todavia, isto requer diálogos, aceitação do outro e mediação
do professor, validada por uma proposta institucional.
Partindo desses pressupostos, o planejamento do
estágio seguiu a metodologia conhecida por Sequência
Didática (SD) que, segundo Dolz, Noverraz e Schneuwly
(2010, p. 89), trata-se de “um conjunto de atividades es-
colares organizadas, de maneira sistemática, em torno de
um gênero textual oral ou escrito”.
78
Esclarecemos que a escolha do gênero foi feita pela
professora titular da turma e, por uma questão de limita-
ção de espaço e tempo, destacaremos, neste trabalho, so-
mente a mediação da escrita.
79
Protocolo n.º 01: Exploração do texto
[...]
(P): Vocês gostaram do texto?
(A1): Sim.
(P): Vou fazer uma leitura aí com vocês, tá?
[...]
(P): O que vocês puderam entender com esse texto? Vamos começar
pelo título. O que vocês entendem como “avarento”?
(P): Alguém já conhecia essa palavra?
(A1): Não.
(P): Mas assim, pelo contexto, pelo enredo da estória, vocês conse-
guem entender o que é avarento?
(A2): Miserável.
(P): O que vocês puderam entender dessa estória? O que aconteceu?
(A2): Ele perdeu o ouro dele!
(P): Ele guardou tanto ouro pra no final ele ser.
(A3): Roubado!
(P): Ele tinha um ouro, mas ele não fez uso desse ouro. Alguém foi lá
e pegou...Então...vocês conseguem fazer essa relação do título com
o texto?
(A2): Não!
(P): Não conseguem visualizar isso?
(A4): Não.
(P): Uma pessoa avarenta ou um homem avarento, no caso o que tá
sendo colocado aqui no texto, é uma pessoa que tem posses, ele tem
dinheiro, e não utiliza. Por isso que o título do texto é “O Avarento”
(A5): O Avarento
(P): Mostra justamente isso, né?
(A5): Ei professora, isso aí é conhecido como miserável!
(P): Também pode ser utilizado como uma pessoa miserável, mas
não é perfeitamente esse o significado. Mas pode ir por esse sentido
aí. Ele foi tão ruim consigo mesmo que ele acabou perdendo o bem
que ele tinha sem desfrutar.
(P): O que mais vocês acharam de interessante nesse texto? Vocês
conseguem visualizar que tipo de texto é esse?
(A6): Uma fábula!
(P): Uma fábula! Por que que é uma fábula?
(A6): Porque ela tem uma moral.
[..]
80
Sabemos que a compreensão leitora exige uma ação sis-
temática do professor para que o aluno atinja esse fim, por
isso, faz-se necessário esclarecermos que, nesse protocolo, fi-
zemos apenas um recorte do processo de mediação da leitu-
ra, mas a interação com os alunos foi muito mais abrangente.
A respeito do modo como se processa a interação na
sala de aula, Cox e Assis-Peterson (2003, p. 128) declaram:
Uma pessoa, investida da função de
professor, adquire poder de determinar
ações aos alunos. Estes, por sua vez,
legitimam esse poder [...] Embora o professor
seja gente de controle social na sala de aula,
a interação se dá de forma compartilhada,
produzida também pelos alunos: melhor,
produzida na relação professor/alunos,
alunos/alunos.
81
• Você obteve uma nova informação, com a leitura
desse texto. Qual?
Os questionamentos ajudaram a explorar o texto de
modo detalhado. Direcionou-se 8as perguntas sobre o tex-
to, visando relacioná-lo com o cotidiano dos alunos, as-
pecto importante para a compreensão leitora. Também
explorou-se o gênero do texto, o que possibilitou aos alu-
nos o contato com a fábula, ponto imprescindível à com-
preensão do texto, do conteúdo, da composição e do estilo
do texto (BAKHTIN,1979).
Como atividade, solicitou-se aos alunos que marcas-
sem, no texto, as partes que julgassem mais interessantes.
Também pediu-se que retirassem do texto as palavras des-
conhecidas e as reescrevessem em seu caderno. Assim, foi
possível também ampliar o vocabulário, com a utilização do
dicionário e estudo dos sinônimos, um dos objetivos alme-
jados com a realização desse trabalho. Após esse momento,
partiu-se para a exploração da organização do texto a fim
de fornecer aos alunos o entendimento necessário à produ-
ção. Nessa etapa, mostrou-se como o texto foi construído
e quais suas características, conforme o protocolo a seguir.
8
A mudança de pessoa do discurso, observada deste ponto em diante,
marca a ação da aluna no seu Estágio.
82
(P) Temos aqui uma narração! Estão sendo narrados fatos,
acontecimentos acerca de um certo personagem. As persona-
gens são em geral animais e a história encerra de modo explí-
cito.
(P) Neste texto, a moral está escrita aqui bem embaixo, mas
existem fábulas que você precisa ler e compreender pra você
poder entender esse fundo moral.
(P) Aqui, nesse primeiro parágrafo, há uma apresentação, no
início do texto. Exemplo: “Um avarento tinha enterrado seu
pote de ouro no lugar secreto do seu jardim”. Aqui já está
sendo feita uma apresentação do que o personagem estava
fazendo.
(P) Prestem atenção, porque estou mostrando como o texto
deve ser construído, como vocês devem construir o de vocês.
(A1) É em grupo?
(P) Não! Cada um vai fazer a sua, mas não é agora. Por isso,
prestem atenção no que estou explicando, ok?
(P) Então nós tivemos aí a apresentação que é o início do tex-
to. A história ocorreu no jardim do avarento que é o persona-
gem da fábula, ok?
(P) Temos também a narração dos fatos. Essa narração nós po-
demos chamar de enredo. Temos aqui “e todos os dias antes
de dormir ele ia até o ponto”. Temos uma narração dos fatos,
pois não está sendo contada uma história? O que é narração?
(A2) É contar uma história que não aconteceu com a pessoa...
(A3) Claro que é contar, mas é resumir uma história que acon-
teceu no texto.
(A4) É um fato ou acontecimento
(P) É um fato ou acontecimento! Aqui nós temos esse trecho
da fábula [...] Vocês podem ver que a história vai sendo cons-
truída, vai sendo narrada. Já pensou se fossem algumas pa-
lavras soltas, sem nexo nenhum. Não teria um enredo né?
O enredo é justamente essa questão do desenvolvimento da
história.
83
(P) Temos o ambiente que é o local onde ocorreu a história
“um avarento tinha enterrado seu pote de ouro no lugar se-
creto do seu jardim”. A gente pode ver aqui o local onde
aconteceu essa história?
(A5) Jardim!
(P) No jardim! Muito bem! Então vocês visualizem isso.
(P) Temos o tempo em que a história vai se desenvolvendo.
Temos “ele fez tantas viagens ao local que um ladrão que já o
observava há bastante tempo curioso para saber o que o Ava-
rento estava escondendo veio uma noite e sorrateiramente
desenterrou o tesouro levando-o consigo”. Nós temos aqui o
que está sendo narrado e em que tempo. Está se referindo ao
passado ou ao presente?
(A6) Passado!
(P) É uma história que está sendo narrada no passado. Mas
vejam aqui: “Quando o Avarento descobriu sua grande perda
foi tomado de aflição e desespero”. Onde está o personagem
aqui?
(A7) O Avarento!
(P) Vocês estão vendo que a gente está fazendo uma expla-
nação do que é uma estrutura da fábula. É importante vocês
entenderem porque vocês vão produzir uma fábula, por isso
estou explicando toda essa estrutura pra vocês entenderem
como é construído, tá bom?
(P) Temos ainda o Clímax? Vocês já ouviram falar no Clímax?
(A8) É o maior ponto de tensão da narrativa!
(P) Ou seja, é aquele momento que você diz: “e agora?” Nós
temos “comprar! Exclamou furioso o Avarento! Você não
sabe o que diz! Ora eu jamais usaria aquele ouro!”
(P) O personagem do texto é canguinhas, ele era apegado ao
bem material dele, no caso, o ouro, que não quis gastar. Então,
o clímax está nesse momento aqui. É o momento que o escri-
tor expõe a maior tensão. Qual o sentido de ter dinheiro e não
gastar? De acordo com o texto, alguém que viu o desespero
dele, disse:
84
- “Por que você não gastou? Porque não deixou na sua casa
onde você teria um acesso fácil pra poder gastar?” Aí ele ficou
espantado: “Gastar!” É isso que a gente espera de um avaren-
to. Então, esse aqui é o clímax da história.
(P) Temos também o desfecho. O desfecho já está dizendo é
final da história, é o resultado final da fábula. Temos aí a...
(A9) A moral!
(P) Moral: “Uma coisa ou posse só tem valor quando dela fa-
zemos uso”.
[...]
(P) Agora que vocês conseguiram entender como foi organi-
zado o texto, vocês vão produzir uma fábula, certo? Vão esco-
lher se vão pegar animais, objetos ou seja, fazer diálogos... e
vão desenvolver uma fábula.
85
quando eles conhecem melhor o gênero, torna-se mais fá-
cil o processo de escrita.
Após o término dessa fase, os alunos iniciaram, de
fato, o processo de produção do texto. Deu-se orientações
quanto à estrutura e características do gênero solicitado,
organizadas em estratégias metacognitivas a serem obser-
vadas durante a produção do texto, para que fizessem as
correções do seu texto, quando os terminassem.
86
Protocolo n.º 03: Primeira versão da escrita
[...]
(P) Gente! Prestem atenção! Essas perguntas entregues pra
vocês vão direcionar a correção do texto de vocês!
(P) Vocês vão verificar se o texto de vocês possui todas essas
informações. Elas são para orientar a correção dos textos de
vocês. Você vai verificar se seu texto tem um título, se possui
diálogo, se realmente é uma fábula. Vai ver se ele está todo
alinhado, se possui margem, tudo isso tá?
(P) Olhem só, temos aí a primeira pergunta: Sua fábula possui
um título? Se tiver, ótimo! Há diálogos entre os personagens?
Há presença de seres humanos ou animais? Você utilizou
a criatividade na produção do texto? Seu texto possui uma
moral? Sua letra é legível? Ou seja, dá pra entender o que você
escreveu? É importante, gente! Caprichem na letra porque
fica ruim pra gente entender o que vocês escreveram. Você
respeita as margens na hora da produção? Você mantém o
espaçamento entre os parágrafos? Seu texto tem pontuação
adequada? No lugar do ponto de exclamação alguns colocam
interrogação, às vezes colocam vírgula quando é um ponto
final, ou ponto contínuo. Seu texto possui sequência e sentido?
Ou seja, precisa ter lógica, nexos entre os diálogos, tá? Possui
concordância verbal, nominal? Você utilizou sinônimos?
Vejam que nós estudamos os sinônimos também, que é um
dos recursos para evitar repetição de termos, repetição de
palavras. Você procurou escrever corretamente as palavras?
[...]
87
Quadro 1: Primeira versão do texto
A cobra Invejosa
88
Protocolo n.º 04: Segunda versão da escrita
(P) Agora nós vamos pegar um texto que eu selecionei pra
gente trabalhar a correção, e depois vocês vão trabalhar da
mesma forma no texto de vocês, certo?
(P) Agora, nós vamos partir para a correção!
(P) “Era uma vez a Cobra invejosa ela tinha muita inveja da
onça”. Se já está dizendo que ela é invejosa, precisa repetir
inveja de novo?
(A1) Não!
(A2) “Era uma vez a Cobra invejosa que não gostava da Onça,
pois a Onça, além de ser bonita, era muito respeitada por todos”
(A3) Aí, depois de bonita deveria ter uma vírgula também!
(P) Isso! Muito bem! Aqui também “era muito respeitada por
todos”. E aqui, é uma vírgula? Prestem atenção na leitura do tex-
to “Era uma vez uma Cobra invejosa que não gostava da Onça,
pois a Onça, além de ser bonita, era muito respeitada por todos”
(A4) É um ponto!
(P) Vamos apagar a vírgula e colocar um ponto. “Já a Cobra
não tinha nada nem ninguém” e aí?
(A4) Vírgula!
(P) Onde é a vírgula?
(A4) Nem ninguém!
(A5) Depois de “ninguém” também tem.
(P) “Não tinha nada, nem ninguém, pois a sua arrogância e
ignorância [...]”
(A5) Acento circunflexo em arrogância e ignorância.
(P) Isso mesmo.
(P) “Faz com que todos se afastem dela”. Vocês viram que
nós já mudamos o sentido desse primeiro parágrafo. Vocês
perceberam aí que nós já mudamos um pouco o texto. Ele já
ganhou uma nova aparência.
(P) Só dá uma atenção aí ao tempo, não tá contando ali “era
uma vez?” e era uma vez não é no passado? Leia aí pra mim.
(A6) “Era uma vez a Cobra invejosa que não gostava da Onça,
pois a Onça , além de ser bonita, era muito respeitada por
todos”
(P) Pois é, já no próximo parágrafo.
(A7) “Já a Cobra não tinha nada, nem ninguém, pois a sua
arrogância e ignorância faz com que todos se afastem dela”
89
(P) Esse “faz” é “fazia” ...
(A8) “Com que todos se afastassem dela”
(P) Muito bem!
(P ) “Um certo dia a Cobra chegou perto da Onça e perguntou
porque ela era tão respeitada, aí ela respondeu” Como a gente
pode melhorar esse trecho?
(A9) “Um certo dia a Cobra chegou perto da Onça e pergun-
tou”. Aí coloca dois pontos, e na outra linha travessão.
(P) Muito bem! “Um certo dia a Cobra chegou perto da Onça e
perguntou “ porque ela era tão respeitada”. Temos uma pergunta.
(A10) Interrogação!
(P) O que mais a gente pode melhorar aqui, nesta frase?
(A11) É “P” maiúsculo.
(P) “Um certo dia a Cobra chegou perto da Onça e perguntou
porque ela era tão respeitada”
(A12) Esse “por que” não tem acento não, professora?
(P) “Por que” para início de perguntas, o que nós vimos?
(A) “Por que” separado e sem acento.
(A13) Professora, “Aí ela respondeu [...]” Coloca “Então ela
respondeu”
(P) Muito bem! Vamos colocar esse diálogo de uma forma
mais direta? Quando a gente quer perguntar alguma coisa pra
pessoa, a gente não fala mais direto? Exemplo: “ Por que o I.....
está com boné em sala de aula? Então vamos colocar essa per-
gunta de maneira mais direta, como se estivesse se dirigindo
diretamente à Onça!
(A14) “Por que você é tão respeitada?”
(P) Muito bem! “Então ela respondeu:”
(A15) Esse “ela” nem tá identificando quem é.
(P) Quem foi que falou isso aqui? Quem é ela?
(A15) Onça!
(P) Vamos colocar aqui “Então a onça respondeu:” A Onça aqui
pessoal, escreve-se com letra maiúscula, por ser personagem. A
Cobra também. Ok! “Então a Onça respondeu:” “E por que eu
tenho amor no coração e respeito às pessoas com quem eu falo.
(A16) Professora, é “ porque”, com acento, e tem travessão!
(P) Travessão! Muito bem!
(A16) Aí tem aspas? Tem que tirar!
(P) Tira as aspas?
90
(A17) Tira!
(P) “É por que eu tenho amor no coração”. Esse “por que”
separado como resposta, tá correto?
(A17) Não!
(A18) É “porquê” com acento e junto.
(P) “Porquê” junto e com acento é utilizado quando pode ser
substituído por “motivo”. Está substituído por motivo?
(A19) Não!
(P) Então é um “porque” junto e sem acento, utilizado para
respostas. E a Onça não está respondendo? Então vamos colo-
car “É porque eu tenho amor no coração e respeito às pessoas
com quem eu falo”. E aí, como a gente pode melhorar aqui?
(A20) Professora, “É porque eu tenho amor no coração e respeito
ás pessoas com quem eu falo”. Tira o “eu” e fica “com quem falo”.
(P) “É porque eu tenho amor no coração e respeito às pessoas
com quem falo”. Muito bem! O que mais? “E as que eu conhe-
ço”. E aí?
(A21) Professora! Aí tá “as pessoas com quem eu falo e conhe-
ço”. As pessoas que ela fala, é claro que ela conhece, então tira
“as que eu conheço”.
(P) Tira aqui? “É porque eu tenho amor no coração e respeito
às pessoas com quem falo”. Pronto!
(P) Prestem atenção. Que pontuação eu poderia colocar pra
chamar mais a atenção no texto?
(A22) Exclamação!
(P) “ É porque eu tenho amor no coração e respeito às pessoas
com quem falo!” Dá uma ênfase na fala da personagem. São
recursos que você pode utilizar pra melhorar o seu texto, certo?
(P) E aqui nós temos “então depois que a Onça falo”
(A23) Falou!
(P) Isso mesmo!
(P) Esse “então” está correto, nessa colocação?
(A24) Não!
(P) O que nós temos que fazer com ele aí?
(A25) Tirar!
(P) Não.
(A25) Espaço.
(P) Espaço! Muito bem, então vamos dar um espaço nele. Essa
questão de espaçamento dentro do texto é importante para não
91
não deixar o texto todo bagunçado. “Então...” Aqui depois de
“então” temos uma vírgula não é? “Então, depois que a Onça
falo aquilo”
(A26) Falou
(P) “Falou!” Quando vocês estiverem escrevendo um texto
fiquem atentos a essa questão da oralidade, ou seja, a fala de
vocês dentro do texto. A situação aqui foi essa: a pessoa escre-
veu do jeito que ela costuma falar.
(A27) E esse “aquilo”?
(P) “Aquilo” o quê? Está sem sentido, a gente pode substituir
por qual situação?
(A28) “ Então, depois que a Onça falou o motivo de ser res-
peitada..” vírgula!
(P) A Cobra pensou e tentou mudar no primeiro dia. E aí?
(A29) Esse “pensou e tentou mudar no primeiro dia” é uma
afirmação professora!
(P) Isso, é uma afirmação! Prestem atenção “Então depois que a
Onça falou o motivo de ser respeitada, a Cobra pensou e tentou
mudar no primeiro dia”. Pronto! Finalizou. Não finalizou?
(A30) Ponto parágrafo!
(P) Nós não vamos finalizar aí com um ponto parágrafo. Va-
mos dar continuidade, porque aqui um parágrafo só com
duas linhas não faz muito sentido, tá? Vamos continuar.
(A31) Puxa o “depois” pra cima com letra maiúscula.
(P) “Depois que ela mudou”. Vamos corrigir aí! “Depois que
ela mudou...”
(A32) Vírgula.
(P) “Depois que a Cobra mudou, ela ganhou mais respeito
com as pessoas”. Pessoas?
(A33) Animais!
(P) Olha só, outra correção aí. Ela ganhou mais respeito dos
animais ou com os animais?
(A34) Dos animais!
(P) Olhem só, lembrem-se de que ela passou a ter respeito e
obter respeito também. Então tem que colocar duas informa-
ções. Pensem aí como vai ser
(A35) Ela ganhou mais respeito dos animais.
(P) E também passou a...
(A36) Respeitá-los!
92
(P) Olhem só! Vejam bem! Vocês lembram que esse pará-
grafo estava todo desestruturado, não tinha virgula, não
tinha ponto. Era um trecho que não dava pra entender.
Agora olhem como ficou.
(P) “Então, depois que a Onça falou o motivo de ser res-
peitada, a Cobra pensou e tentou mudar no primeiro
dia. Depois que a Cobra mudou, ela ganhou mais respei-
to dos animais e também passou a respeitá-los.”
(P) Vamos para a moral “Nunca seja ignorante com al-
guém, pois você não gostaria de ser tratado com igno-
rância”.
(P) Tem a ver essa moral?
(A37) Não tem nada a ver com o texto, pode apagar tudo.
(A38) Professora, fica assim: “Se você quiser obter res-
peito, não seja ignorante ou arrogante com ninguém”.
(P) Muito bem!
[...]
93
Quadro n.º 2: Segunda versão do texto
A Cobra invejosa
94
temas traversais que corroboram na formação do aluno,
na compreensão do assunto e na interação dos conheci-
mentos partilhados.
95
Embora tenha sido um processo cansativo, a propos-
ta de refacção coletiva do texto proporcionou aos alunos
a participação na aula e os ajudou a conhecer as possibili-
dades para melhorar seus textos. O resultado que se foi a
participação significativa dos alunos no processo de análi-
se e refacção coletiva do gênero.
Percebemos que o ensino planejado produz diferen-
ça na aprendizagem do aluno, e essa ação só existe verda-
deiramente quando, de fato, alunos e professores partici-
pam e comungam da mesma intenção: a interação com o
fim de gerar aprendizagem.
96
sequência didática, para a eficiência do processo de pro-
dução textual dos alunos.
Precisamos alimentar a esperança que nutrem Borto-
ni-Ricardo e Machado (2013) de uma guerra santa no ensi-
no da língua, para a resolução dos problemas que afetam
tanto alunos quanto professores. Realizamos este trabalho
com a intenção de responder a esse chamado, que, a prin-
cípio, parece-nos um grande desafio, mas, sobretudo, uma
tarefa possível e satisfatória. Vimos que ações didáticas
planejadas e realizadas com paciência e disposição, na sala
de aula, podem ajudar a realizar os trabalhos de Hércules
apontados por Bortoni-Ricardo e Machado (2013), e tornar
o ensino brasileiro uma ação efetiva de cidadania.
No contexto da educação do campo a mediação da
escrita deve ser constante e significativa para que os alu-
nos assumam essa prática como um instrumento de inser-
ção social e de luta pelos seus direitos. Assim, os conhe-
cimentos servirão tanto para a formação continuada do
professor como para a ampliação do conhecimento intera-
cional dos alunos.
97
4. Em quais das fases da escrita a mediação do pro-
fessor é mais significativa?
5. A situação apresentada no texto pode ser aplica-
da no contexto da sua sala de aula. Como você
faria isso?
Referências
98
escrita: Apresentação de um procedimento. In: SCHNEUWLY,
B; DOLZ, J. Gêneros
99
4 Possibilidades de Uso da VariaçãoLinguística
em Atividades de Sala de Aula da Educação
do Campo
Jairzinho Rabelo
Luzineth Rodrigues Martins
Introdução
101
essa variação. Em seguida, propomos uma orientação de
como podemos entender a variação linguística produzi-
da em contextos de não monitoramento. Na seção seguin-
te, fazemos uma abordagem sociolinguística educacional
sobre a variação linguística, com a finalidade de mostrar
aos professores como eles podem assumir uma postura de
esclarecimento sobre as variações ocorridas nas falas dos
trabalhadores rurais ou dos filhos destes, com o fim de eli-
minar o preconceito linguístico.
102
Ter consciência da variação linguística ajuda-nos a
encarar com tranquilidade as variações produzidas por
qualquer sujeito, mesmo aquelas que nos parecem mais
estranhas possíveis. Isso acontece porque, no Brasil, a lín-
gua portuguesa utilizada não é uniforme, pelo contrário,
como afirma Bagno (2007, p. 27, 37), é constituída de:
103
O acesso maior ou menor à educação
formal, e com ele, à cultura letrada,
à prática da leitura e aos usos da
3. Grau de escolarização escrita é um fator muito importante na
configuração dos usos linguísticos dos
diferentes indivíduos
104
ação se aplica aos demais fatores, a origem, o sexo e o
status socioeconômico.
Além desses fatores citados por Bagno, encontram-
-se na literatura outras denominações atribuídas às causas
das variações linguísticas. Segundo Bagno (2007), há cinco
tipos de variação linguística: diacrônica, diatópica, diafá-
sica, diamésica e diastrática. A seguir destacaremos cada
uma delas.
Variação diacrônica – trata-se das mudanças inter-
nas e externas que ocorrem na língua. No primeiro caso,
ocorrem em decorrência da mudança em sua gramática,
isto é, na morfologia, na fonologia, na sintaxe e no léxico.
Já a mudança externa, diz respeito à evolução que a língua
vai passando ao longo dos tempos em suas funções, em
suas relações sociais e em suas relações com determinada
comunidade linguística.
Variação diatópica – é aquela que se verifica na com-
paração entre os modos de falar de diferentes lugares.
Variação diafásica – é a variação estilística, isto é,
o uso diferenciado que cada indivíduo faz da língua de
acordo com o grau de monitoramento que ele confere ao
seu comportamento verbal.
Variação diamésica – é o uso diferenciado que se faz
entre a língua oral e escrita. Está ligada à situação de produ-
ção de interação social.
Variação diastrática – é aquela que se verifica na com-
paração entre os modos de falar das diferentes classes sociais.
As variedades que a língua apresenta são classifi-
cadas como dialeto para caracterizar uma linguagem de
105
determinado lugar; socioleto para designar a linguagem
própria de um grupo; cronoleto para designar a língua fa-
lada em determinada faixa etária; e idioleto para denomi-
nar a linguagem própria de um indivíduo.
Essas possibilidades diversas de adequação da língua
ao contexto de uso garante a variabilidade e faz com que ela
seja adequada à comunidade que a utiliza. Pois são justa-
mente as situações e os contextos diversos de uso da língua
que ocasionam, sob o olhar de algumas pessoas, o precon-
ceito linguístico. Tal preconceito ocorre porque o modo de
falar de uma pessoa relaciona-se com sua condição social,
assim as pessoas que possuem renda muito baixa tornam-
-se alvo de preconceitos por causa do seu modo de falar.
Segundo Bagno (1999, p. 13), “o preconceito linguís-
tico fica bastante claro numa série de afirmações que fa-
zem parte da imagem negativa que o brasileiro tem de
si mesmo e da língua falada por aqui”. Os sujeitos que
possuem renda maior e que tiveram os melhores estudos
são os mais valorizados pela sociedade, por isso recebem
o mérito de que falam melhor o português.
A esse respeito, Bortoni-Ricardo (2005, p. 29), explica
que “no Brasil, a língua padrão é associada ao grupo so-
cial que goza de melhor status”. Assim é comum ver que
a televisão, o rádio e outras mídias dão maior prestígio
a variante padrão e passam a ideia de inferioridade aos
sujeitos que não dominam aquela forma de falar prestigia-
da por eles. Bagno (2004, p. 24) discorda dos julgamentos
postos pela sociedade dizendo: “A língua falada é a ver-
dadeira língua natural, a língua que cada pessoa aprende
106
com sua mãe, seu pai, seus irmãos, sua tribo, seus grupos
sociais etc.” Ninguém tem o direito de julgar os outros por
ter tido pouca educação, pelo contrário, as pessoas devem
ser respeitadas. Bagno complementa que, de acordo com
os estudos da linguística, não existem erros na língua, o
único erro refere-se ao que possa comprometer a comuni-
cação das pessoas.
Bagno (2014) orienta o uso de um modelo com três
tipos de nomenclatura para o tratamento linguístico, des-
crito a seguir, a fim de evitar o preconceito linguístico.
107
escola tem um papel imprescindível na orientação de de-
terminados usos linguísticos adequados ao contexto de in-
teração social, no qual o sujeito está inserido.
108
Miiu, 4.ª série
C. P. M Macaxera do ens. 63 Masculino Maranhão
fundamental
fêjão, 4.ª série
J. A. A. S mii do ens. 42 Masculino Maranhão
macaxera fundamental
Milho, 4.ª série
R. P. S fêjão do ens. 74 Masculino Piauí
macaxera fundamental
Fonte: Adaptado de Rabelo (2013). 12
109
Vejamos o entendimento sobre as variações produzi-
das pelos sujeitos entrevistados:
110
Quadro 3 – Algumas regras variáveis do português brasileiro
TRAÇOS GRADUAIS
Aférese ou supressão de um ou está > tá; estava > tava; você > cê
mais fonemas iniciais
Síncope ou supressão de um para > pra; xícara > xicra
fonema no interior da palavra
Apócope ou supressão de um correr > corrê; almoçar > almoçá;
fonema final, como o /r/ senhor > senhô
Epêntese ou adição de um ritmo > ritimo; decepção >
fonema no interior da palavra decepição
Ditongação das vogais “a” e “e”, Goiás > Goais; faz > faiz; vez >
seguidas do fonema /s/ veiz
Elevação da vogal /e/ para /i/ azeite > azeiti; leite > leiti
Elevação da vogal /o/ para /u/ comeu > cumeu; quando >
quando
Monotongação de ditongos orais ouro > oro; beijo > bejo; caixa >
decrescentes caxa
TRAÇOS DESCONTÍNUOS
Prótese ou adição de um fonema levantar > alevantar
no início da palavra
Epêntese ou adição de um bandeja > bandeija; caranguejo >
fonema no interior da palavra ou carangueijo
hipercorreção
Síncope ou supressão de um número > numru; lâmpada >
fonema no interior da palavra lãpda; porque > puque
111
Metátese ou troca de posição estupro > estrupo; muçulmano >
de um fonema para melhor mulçumano
acomodação fônica
Vocalização da consoante lateral mulher > muié; velho > véio; galho
palatal /lh/ ou despalatalização > gaio
Fonte: Pereira (2006, p. 124).
112
processo linguístico de fala dos brasileiros, e que são moti-
vadas por fatores que vão além da questão linguística.
113
Assenta-se na compreensão, pelo professor,
do caráter sociossimbólico das regras variáveis
2.º da língua. Essa compreensão rejeita a visão do
Princípio preconceito linguístico e permite a análise da ação
linguística situada em um contexto sociolinguístico
do falante, ao tempo em que reconhece a valoração
social de determinadas estruturas linguísticas.
Refere-se à compreensão da mediação do professor
focado em uma pedagogia culturalmente sensível,
capaz de acolher a variante estigmatizada
3.º socialmente produzida pelo aluno, como o resultado
Princípio de sua inserção em determinada comunidade
linguística, mas também reconhece a importância
de uma ação efetiva do professor na promoção
de oportunidades de uso da variante de prestígio,
como resultado da aprendizagem escolar.
Considera a necessidade de percepção do sujeito
sobre a adequação das escolhas linguísticas em
razão do contexto em que são produzidas. A ação
4.º de monitoramento da língua deve ocorrer quando se
Princípio tratar de eventos que exijam o seu uso formal, assim
o erro de português passa a ter outro sentido na
assunção de uma prática de linguagem monitorada,
em situações de formalidade de uso da língua, e não
monitorada, nas cotidianas informais.
Postula que a variação não pode ser dissociada da
análise etnográfica e interpretativa do uso da variação,
5.º considerando que a língua é produzida em contextos
Princípio de interação e que, portanto, qualquer análise a esse
respeito deve considerar os significados que as escolhas
linguísticas produzidas adquirem no contexto.
Refere-se à contribuição das pesquisas linguísticas na
capacidade de produzir o empoderamento do sujeito.
Considera que as pesquisas transpostas didaticamente
6.º para a sala de aula tornam-se instrumentos de
Princípio autorreflexão e análise crítica das ações de linguagem
produzidas pelos sujeitos. Elas devem possibilitar a
professores e alunos uma conscientização crítica sobre a
variação e a desigualdade social que ela produz.
Fonte: Martins (2012, p. 27 apud Bortoni-Ricardo, 2005, pp 130,133)
114
Tais princípios orientam a ação pedagógica visando
fornecer ao professor a compreensão de uma pedagogia da
variação linguística que vise dar condições para a inserção
social dos alunos, por meio de escolhas linguísticas que se-
jam valorizadas socialmente, sem, no entanto, inferiorizar as
demais variantes e as situações em que elas são produzidas.
É preciso que o professor entenda seu papel no ensino
da variação linguística, que assuma a pedagogia cultural-
mente sensível e trabalhe no sentido de rejeitar o precon-
ceito linguístico, e no sentido de ajudar o aluno a ampliar
sua competência comunicativa. É necessário o entendimen-
to de que as escolhas linguísticas realizadas pelos sujeitos
associam-se ao contexto social em que estes se inserem e
que elas podem ser analisadas de modo reflexivo visando
promover a conscientização dos sujeitos das relações de po-
der presentes nas escolhas linguísticas que fazem.
115
pelos alunos e por seus familiares e apresentar como con-
teúdo a ser ensinado.
Para facilitar a compreensão dessa metodologia, Pe-
drosa (2014) também orienta, a seguir, o trabalho do pro-
fessor com a variação linguística.
Análise de erros
Elaboração de
material didático
116
a ortografia oficial para cada caso. Nesse sentido, o pro-
fessor deve explicar a norma ortográfica brasileira como
recurso político para a homogeneidade da escrita.
É nesse momento que o professor deverá discutir o
papel do letramento na sociedade atual e conscientizar o
aluno de que a escola é um ambiente institucional que tem
por finalidade promover a melhor inserção social dos alu-
nos. Para isso, deve discutir com os alunos a necessidade de
monitoramento da fala considerando a situação de produ-
ção discursiva em que se encontra o sujeito. O termo moni-
toramento é utilizado para indicar a ação de cuidado com
o uso adequado da língua que deve ter o sujeito em razão
da situação de interação. Por exemplo, uma situação de fala
cotidiana com um colega de classe admite uma linguagem
mais informal, mas se a situação de uso de fala for um semi-
nário, o sujeito deve utilizar uma linguagem mais formal,
sob a pena de ser mal avaliado por seus interagentes.
Tomar consciência do modo adequado de uso da
língua no contexto de interação, tanto na fala quanto na
escrita, e fazer o monitoramento estilístico, isto é observar
a adequação da língua para receber valoração positiva dos
sujeitos da interação, é a melhor maneira de não cometer
inadequações no uso da língua.
Discutindo essa questão, Bortoni-Ricardo (2014)
orienta os professores a ficarem atentos ao modo de falar
dos alunos para que possam intervir de maneira positi-
va, para poder ajudar o aluno a ampliar sua competência
comunicativa, que diz respeito ao aprendizado adquirido
na escola com o fim de alcançar a melhor inserção social.
117
A autora faz um alerta de que o professor, ao não intervir
de forma positiva para adequação de uso da língua pelo
aluno, deixa-os sujeitos a críticas e estigma social.
118
alunos? De que modo é possível inserir a varia-
ção linguística nas aulas de língua materna?
2. Que variações são mais frequentes na sua comu-
nidade e/ou sala de aula? De que forma é pos-
sível aproveitar a presença delas para ensinar a
língua materna?
3. Quais procedimentos o professor pode adotar
para a prática de uma pedagogia culturalmente
sensível no tratamento da variação produzida
por seus alunos?
4. Como é possível ajudar o aluno a fazer o monitora-
mento estilístico em contexto de uso formal da língua?
Referências
119
______; MACHADO, Veruska Ribeiro (Org.) Os doze trabalhos
de Hércules: do oral para o escrito. São Paulo: Parábola, 2013.
120
5 Pesquisa na Formação e na Prática do
Professor
Luzineth Rodrigues Martins
Introdução
121
Para propor uma discussão a esse respeito, este capí-
tulo está assim organizado: primeiro apresentamos a rela-
ção intrínseca entre ensino e pesquisa; em seguida defen-
demos a pesquisa como via de construção do letramento
acadêmico, para, em seguida, apresentar vivências com a
pesquisa em diversos momentos da formação de profes-
sor, com o propósito de mostrar como esta se torna aliada
na produção do conhecimento, na análise e no enfrenta-
mento de questões da prática pedagógica.
122
mentos podem e devem ser realizados pelo prisma da pes-
quisa, que desenvolve no professor a atitude vigilante e
indagativa e o leva a tomar decisões sobre o que fazer e
como fazer nas situações de ensino.
Pesquisar a prática significa planejar, observar, agir
e refletir de maneira mais consciente, mais sistemática e
mais rigorosa o que fazemos na nossa experiência diária.
A pesquisa da prática provoca o esclarecimento de uma
situação para uma tomada de posição de consciência pelos
próprios pesquisadores, dos seus problemas e das condi-
ções que os geram, a fim de elaborar os meios e estratégias
de resolvê-lo.
Essa ação, além de nos trazer grande conhecimento
do tema tratado, cumpre um princípio metodológico in-
dispensável à atuação docente, que é ação-reflexão-ação,
uma vez que todo fazer implica uma reflexão e toda refle-
xão implica um fazer, ainda que nem sempre este se ma-
terialize. No processo de construção de sua autonomia, o
professor, além de saber e de saber fazer, deve compreen-
der o que faz. Esses fundamentos reafirmam os objetivos
e as finalidades da proposta de pesquisa sobre a temática
do professor reflexivo, investigador e/ou pesquisador da
sua ação, como defendido por Ghedin (2015), Pimenta e
Ghedin (2002) e Freire (1996)
São muitos os autores que defendem a pesquisa
como ação de fundamental importância na formação, por-
que provoca consciência crítica questionadora e, sobretu-
do, atitude política emancipatória, postura defendida por
Demo (2001). Em atendimento ao seu papel social, o pro-
123
fessor pesquisador assume a pesquisa como ação capaz
de dar ao ensino um corpo estruturado de conhecimen-
to, tornando-se produtor desse conhecimento e agente de
transformação da realidade na sua sala de aula.
Freire (1996) vê a pesquisa e o ensino como ações in-
dissociáveis, quando afirma que não há ensino sem pes-
quisa e pesquisa sem ensino. Comungamos dessa visão,
pois entendemos que, ao deparar com as dificuldades
inerentes à docência, o professor precisará encontrar alter-
nativas para solucioná-las e não poderá fazê-la de modo
assistemático. Ou seja, os benefícios da pesquisa sobre o
processo de ensino-aprendizagem só surgirão quando o
professor souber relacionar objetivos e meios adequados
às necessidades de sala de aula, ação que deve ser constru-
ída conscientemente.
A pesquisa na formação inicial do professor só terá
sentido se produzir melhorias na sala de aula, como afir-
ma Perrenoud (1993). Esse autor cita três dessas melhorias
provocadas pela experiência da investigação: 1. a possibi-
lidade de confrontar-se com dúvidas e incertezas de um
determinado campo de conhecimento e de ser iniciado nos
métodos e na epistemologia da investigação; 2. a promo-
ção de algumas habilidades e atitudes que a investigação
promove; 3. oportunidade de aprender a olhar e escutar
com mais atenção, ou seja, de tornar-se mais observador e
crítico de suas ações e das ações dos outros.
Nessa mesma direção, tem-se defendido na literatu-
ra vigente que a pesquisa na formação do professor é im-
portante não somente porque dá acesso ao conhecimento,
124
mas porque na vivência dela o professor aprende a apren-
der os processos de produção de conhecimento em sua
área específica.
O professor pesquisador, agente de mudança e pro-
dutor de conhecimento, necessita de três condições míni-
mas para efetivar sua ação investigativa: a primeira delas
é a disposição pessoal para investigar sua prática, pois a
pesquisa não se impõe, assume-se. Nesse aspecto, o fator
tempo disponível à atividade de pesquisa é fundamental; a
outra condição é a formação adequada para formular pro-
blemas, selecionar métodos e instrumentos de observação e
de análise, ou seja, o professor precisa ter domínio dos co-
nhecimentos inerentes à sua área e conhecer os problemas
que a afetam, para que possa conduzir determinada pes-
quisa; a outra condição é que o ambiente institucional seja
favorável à constituição de grupos de estudos e que tenha
bom suporte para a realização da pesquisa, tais como acesso
a materiais, fontes de consulta e bibliografia especializada.
Entendemos que a falta de algumas condições afeta
a realização da pesquisa, mas não a elimina. Das condi-
ções apresentadas, as duas primeiras relacionam-se com
decisão pessoal do professor, se ele dá prioridade à busca
de superação. A formação inicial voltada para a pesquisa
é importante em nosso contexto atual, porém a atuação
investigativa na prática pedagógica poderá ser a resposta
para os problemas que aparecem no cotidiano escolar.
125
5.2 O papel da pesquisa na construção do letramento
científico do acadêmico
126
informações e sistematizá-las em uma perspectiva dialó-
gica” (GHEDIN, 2010, p. 49).
Galiazzi (2002, p. 301-302 apud GHEDIN, 2010, p.
50) diz que
A proposta de pesquisa como princípio
didático [...] assume a escrita e a leitura como
dois princípios articuladores do ensino e
da aprendizagem [...] a sala de aula com
pesquisa que propomos [...] considera que o
conhecimento e o poder são compartilhados
e surgem do compromisso mútuo entre
professores e alunos. A aprendizagem é
entendida como um processo de construção
que é resultado das interações entre o que
cada um conhece com a nova informação,
criando uma rede mais complexa de
significados. Com esse entendimento, o
processo de aprender a ler e a escrever
nunca se finaliza, vai se tornando mais
complexo com a escolaridade.
127
Em atendimento às diretrizes de formação de profes-
sores, o Curso Normal Superior foi organizado de modo a
possibilitar aos alunos uma vivência de pesquisa, partin-
do das necessidades enfrentadas por eles na sua prática de
sala de aula. A disciplina Seminário do Desenvolvimento
da Prática Profissional distribuída ao longo do curso teve
o papel de agregar professores e alunos no estudo siste-
mático de um determinado problema pedagógico.
Nesse percurso os alunos tinham o perfil de profes-
sor atuante nas séries iniciais do ensino fundamental, e
logo no primeiro semestre foram orientados a identificar
um problema pedagógico relevante em sua prática peda-
gógica. Dada a identificação desse problema, eles foram
organizados em grupos com interesses afins, e sob a orien-
tação de um professor, realizaram estudos teóricos relati-
vos ao tema. A cada semestre, uma etapa do processo de
investigação da prática pedagógica foi sistematizada, de
modo a encontrar, dentre os tipos de pesquisas, aquele que
respondesse ao problema pedagógico, como foi chamado
no currículo. Essa definição, na prática, deu-se a partir da
análise do objeto de estudo e definiu o tipo de pesquisa a
ser abordada pelos alunos. Esse processo transcorreu nos
oito semestres de formação do aluno-professor.
Como referência para esse processo, há vasta lite-
ratura para subsidiar as pesquisas de cunho pedagógi-
co: André (2003), Brandão (1999), Demo (2001), Fazenda
(2000), Lüdke e André (1986), Thiollent (2003), entre ou-
tros. A exemplo, apresentamos as vivências a seguir.
Vivência 1. A pesquisa colaborativa (interventiva)
128
Como professora formadora do Instituto Superior
de Educação de Roraima, no período 2001-2005, tive, por
meio dos objetivos traçados nos grupos de Desenvolvi-
mento Profissional, como chamávamos os grupos de es-
tudos, a possibilidade de realizar pesquisas etnográficas,
pesquisa-ação e estudo de caso. O que nos possibilitou a
experiência construtiva em relação à formação do perfil do
professor investigador com intuito de refletir sua prática,
construir e/ou reconstruir seus conceitos e transformar
sua ação pedagógica. Passo a descrever essa experiência e
seus resultados.
No caso da pesquisa colaborativa, no primeiro mo-
mento, foi conveniente em razão do tipo comum de proble-
ma pedagógico apresentado pelos alunos. Na maioria dos
casos, muitos problemas foram apontados, por exemplo,
“problemas de aprendizagem”. O grupo em questão ado-
tou o procedimento de realização coletiva de diagnósticos
sobre os problemas apontados pelos professores; análise
quantitativa e qualitativa dos dados obtidos visando co-
nhecer as reais dificuldades dos alunos; estudos teóricos
sobre os determinados temas, discussão sobre a relação
entre os fundamentos teóricos e o diagnóstico elaborado.
Descobrimos, na verdade, que o entendimento que
os alunos de graduação [professores] tinham em relação
a “problemas de aprendizagem” configurava-se em “difi-
culdades de aprendizagem”, “procedimentos metodológi-
cos adotados pelo professor”, “formação do professor em
relação ao conteúdo trabalhado” e “a relação harmoniosa
do professor com a leitura”, entre outros.
129
Evidenciamos uma nova configuração em relação
aos encaminhamentos para responder às necessidades dos
professores, tais como a elaboração de materiais a serem
utilizados em sala de aula para trabalhar as dificuldades
encontradas e aplicação de um projeto de intervenção na
realidade detectada. Conforme a execução dos projetos de
intervenção, como professora orientadora, fazia visitas às
salas de aulas, nas escolas que chamamos de escolas-cam-
po, para acompanhamento das atividades programadas.
Por sua vez, conforme orientação, os alunos organizaram
um portfólio com todos os dados coletados, como uma das
formas de registro sobre a prática realizada, além da ela-
boração de relatório de pesquisa.
As dificuldades em construir um perfil de professor
pesquisador tornaram-se um grande desafio para os pro-
fessores orientadores dos grupos de estudo, mas também
foi um momento ímpar na construção do entendimento da
pesquisa como atividade inerente à docência. Além disso,
foi fundamental investir na formação de um professor que
vivenciasse experiência de trabalho coletivo, fosse forma-
do na perspectiva de ser reflexivo em sua prática, e que se
orientasse pelas demandas de sua escola e de seus alunos.
130
com deficiência auditiva, que cursavam as primeiras sé-
ries do Ensino Fundamental na rede pública estadual.
Um dos primeiros desafios de quem trabalha com
essa realidade é a necessidade de conhecer como os alunos
aprendem, já que a ausência da audição gera dificuldades
na compreensão e no uso da escrita.
O trabalho realizou-se com um aluno de 18 anos,
estudante do 4.º ano, com deficiência auditiva, com um
quadro de baixa estima, histórico de inúmeras repetências
a ponto de cursar cada série em dois anos, um comporta-
mento muito hostil com todos que dele se aproximavam e
se sentia alheio ao que era proposto pelos professores.
Nesse contexto, a professora teria de alfabetizá-lo,
pois não conhecia a relação que a língua portuguesa tem
com a realidade. O aluno conversava, compreendia e res-
pondia a todas as atividades exclusivamente na Língua
Brasileira de Sinais (LIBRAS), mas como demonstrava
aversão e resistia a todas as propostas de trabalho que uti-
lizassem a língua portuguesa, foi necessário sensibilizá-lo
e estimulá-lo a novas possibilidades de leitura e escrita.
Foi necessário criar uma “cartilha” que estimulasse o
gosto pela leitura e o significado da escrita para o aluno. Essa
proposta necessitou observação do que ele gostava e como
agia em diversos momentos sociais; também foi necessária
a realização de um mapeamento sobre o que era importante
para ele. Por meio desses dados, foram elaborados textos que
tivessem significados pare ele e o desafiasse a avançar.
Com a implementação desse trabalho, o aluno passou
a interessar-se pelas aulas, a não faltar e a não ter vergonha
131
de falar perto de seus colegas. Todo dia chegava com pa-
lavras ou frases que coletava em comerciais e/ou cartazes.
Os resultados foram visíveis e satisfatórios, tanto
para o aluno quanto para a professora. Para o aluno, hou-
ve mudanças na escola e no ambiente familiar de forma
que, no fim do período, estava motivado, lendo, compre-
endendo e produzindo textos orais e escritos. Por outro
lado, para a professora, o trabalho lhe proporcionou redi-
mensionar sua prática em uma perspectiva que atendesse
à necessidade do aluno, tornando-a reflexiva em relação
aos encaminhamentos de textos significativos.
Vivência 3. A pesquisa-ação
132
O objetivo da pesquisa é estudar o ensino da Língua
Portuguesa em Roraima envolvendo professores das áreas
de Letras da Universidade Estadual de Roraima, em uma
metodologia de pesquisa-ação. A escolha dessa metodologia
é proposital por experimentar uma possibilidade concreta de
articulação do Ensino Superior com a Educação Básica, o que
possibilitará novos trabalhos nas escolas públicas.
A investigação assumida caracteriza-se pela metodolo-
gia de pesquisa-ação por requerer que os sujeitos pesquisa-
dores se percebam como parte integrante da pesquisa e, as-
sim, intrinsecamente envolvidos em seu problema-objeto. As
etapas do processo de pesquisa constam de mobilização para
pesquisa, diagnóstico e análise do problema, plano de ação
para discutir os resultados da pesquisa e busca de alternati-
vas que visem à resolução dos problemas encontrados. Nesse
processo vivenciamos a construção de conhecimento partindo
de uma perspectiva dialética do problema, que permita aos
sujeitos envolvidos a análise de questões relacionadas com o
ensino de Língua Portuguesa em suas múltiplas relações.
Pesquisar os problemas enfrentados pela sociedade
roraimense e dispor de respostas científicas para tais ques-
tões foi o desafio dos profissionais envolvidos no projeto.
Os resultados da pesquisa suscitaram discussões e
encaminhamentos práticos como um curso de extensão vi-
sando à apresentação de propostas teórico-metodológicas
que respondessem aos problemas detectados. Esse curso
já foi desenvolvido em uma turma de professores com o
perfil da pesquisa e será realizado em outras turmas, com
o fim de alcançar o maior número possível de professores.
133
Vivência 4. A etnografia
134
Quadro – Resumo das pesquisas realizadas pelos alunos das disciplinas citadas(continua)
Título Problema Objetivo Asserção Procedi-mentos de coleta
de dados
Uma análise Os alunos que Avaliar o nível de Os alunos não apresentam 1. Entrevista com a professora
etnográfica terminam o ensino leitura dos alunos do um nível desejável de para conhecer o modo como
do processo fundamental e 9.° ano “A” do ensino leitura porque esse ensina a leitura
de leitura e médio, na maioria, fundamental e o processo não ocorre de 2. Observação direta em sala
m e d i a ç ã o não são capazes de processo de mediação modo sistemático na de aula
pedagógica na ler, interpretar ou pedagógica da Escola escola 3. Teste para avaliar o nível da
escola Estadual compreender de Estadual Desembar- leitura dos alunos
Dembargador maneira satisfatória, gador Sadoc Pereira
Sadoc Pereira textos mais complexos
O lugar da Muitos alunos Analisar os fatores A capacidade oral 1. Observação direta durante
oralidade na a p r e s e n t a m e as dificuldades dos alunos do 8.° ano a aula para conhecer como
sala de aula dificuldade na que causam o mau pode ser dificultada ocorre o processo de oralidade
oralidade e a escola desempenho na por causa do próprio 2. Entrevista com as
oralidade dos alunos sistema escolar que dá professoras do 8° ano para
tem demonstrado
do 8.° ano da Escola pouca ênfase à oralidade saber os meios que elas
pouco interesse
Estadual e também porque utilizam para trabalhar a
em discutir este os professores dão oralidade
Desembar-gador
problema. Sadoc Pereira prioridade à escrita, e 3. Exercícios sobre oralidade
não à oralidade para avaliar o nível dos alunos
A produtivida- O tempo utilizado Investigar a produtivi- Se o professor gastasse 1. Entrevista com professores,
de do nsino da nas aulas de Língua dade do tempo utilizado menos tempo com alunos e coorde-
Língua Portu- Portuguesa não é nas aulas de Língua atividades de gestão nadores
guesa: uma ná- suficiente Portuguesa na turma da sala de aula, teria 2. Obser-
lise do tempo e para a de 8.º ano do Ensino mais oportu-nidade vação e filmagem de algumas
das atividades aprendi- Funda- de realizar atividades aulas para
de língua zagem qualitativa mental da Escola produtivas em sala de realização de um mapa de
portuguesa Estadual Desembar- aula eventos
135
gador Sadoc Pereira
Quadro – Resumo das pesquisas realizadas pelos alunos das disciplinas citadas(conclusão)
136
Título Problema Objetivo Hipótese Metodologia
As variações A variação Analisar o tratamento Uma abordagem 1. Observação em sala de aula
linguísticas na linguística não tem que o professor de adequada da 2. Entrevista com a professora
Escola Estadual espaço merecido Língua Portuguesa variação linguística 3. Teste sobre variação linguística
Desembargador na agenda atribui à variação no ensino da Língua
Sadoc Pereira na do professor Portuguesa está
de Língua
linguística na Escola relacionada com
turma do 9.º ano Estadual Desem-
Portuguesa a formação do
bargador Sadoc professor.
Pereira, nas turmas do
9.º ano, no muni-cípio
de Alto Alegre
Práticas de Os professores Investigar as práticas O ensino da 1. Observação direta na sala de
ensino de Língua de Língua de ensino de Língua Língua Portuguesa aula
Portuguesa e Portuguesa e Portuguesa e Literatura e Literatura não 2. Gravação em áudio e vídeo de
Literatura Literatura ainda adotados pelos tem alcançado os algumas aulas
c o n t i n u a m professores da Escola índices satisfa- 3. Diário de bordo
u t i l i z a n d o Desem-bargador Sadoc tórios porque os 4. Entrevista com as professoras
metodologia Pereira, por meio professores, quase das turmas pesquisadas.
de ensino, das meto-dologias e sempre, recorrem às
que, segundo conteúdos adotados práticas tradicionais
alguns autores, é pelos professores do 9.º e desatuali-zadas,
arbitrária e insufi- ano do ensino funda- em virtude de
ciente para desen- mental e 3.ª série do falta de formação
volver nos alunos ensino médio continuada que dê
compe-tência de subsídio ao desen-
leitura e produção volvimento de
de textos práticas contem-
porâneas do ensino
da língua materna
Fonte: a autora.
A experiência com a produção de conhecimento por
meio da pesquisa é significativa para os alunos em forma-
ção que veem nos procedimentos de pesquisa os instru-
mentos para o estudo e análise de determinado problema
pedagógico. Especialmente esse tipo de ação cumpre o
propósito de buscar alternativas para a melhoria da quali-
dade do ensino.
137
Questões para reflexão
Referências
138
FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. Interdisciplinaridade:
história, teoria e pesquisa. 5. ed. São Paulo: Papirus, 2000.
139
6 Material Didático: Uso e Reflexão na
Construção do Conhecimento
Jairzinho Rabelo
Introdução
141
é premente, para dinamizar e potencializar o trabalho do
professor, e servir de referência na formação dos alunos.
Diante desse panorama, surge uma gama de ques-
tões, mas a principal é: Como elaborar e/ou utilizar o ma-
terial didático? Quando estávamos na graduação sempre
ouvíamos que o professor deve ser criativo e construir seu
próprio material de trabalho, mas a criatividade tem limi-
tes e a sobrecarga de trabalho faz com que o professor fi-
que limitado ao uso do material que está disponível.
Dessa forma, discutiremos o dilema do material didá-
tico, de forma a compreender como e quando utilizarmos.
Além disso, refletiremos sobre o professor e as possibilida-
des de uso de materiais diversificados no ensino de Língua
Portuguesa, em busca de compreender o papel do docente
na formação dos alunos. Mais adiante trataremos acerca do
material didático, em uma perspectiva de instrumento de
ensino e de aprendizagem, discutindo seu uso crítico e ava-
liando seu uso e construção. Finalmente, refletiremos sobre
a participação dos alunos na produção de material didático
e apresentaremos relato de construção de alguns materiais:
a) livros artesanais; b) vídeos; c) histórias por meio de ma-
pas; d) jogos de letras; e) registros fotográficos.
142
isso, existem os instrumentos de planejamento, sejam eles
anuais, bimestrais ou diários. No processo de elaboração
desses planejamentos, surgem dúvidas de quando e como
utilizar o material didático.
Segundo Garcia (2011), o material didático é media-
dor entre professor, alunos e os conhecimentos. Ainda
precisa ser alvo de mais pesquisas, principalmente como
elemento da formação dos professores. É necessário que
compreendamos e discutamos a presença de material di-
dático na aula e na formação dos nossos alunos; no en-
tanto, será que nossos professores estão preparados para
utilizá-lo e/ou produzi-lo?
Dentre os diversos materiais, observamos que o com-
putador tem ganhado bastante espaço no contexto escolar.
Segundo Ripper (1996, p. 66), na construção do conheci-
mento, o computador tem uma importância essencial.
143
o uso do computador como um instrumento de construção
dos conhecimentos. Diante disso, perguntamos se nossos
professores estão preparados adequadamente para o uso
das tecnologias em favor da formação dos alunos.
Os questionamentos listados anteriormente nos le-
vam a reflexão de como o material didático está sendo
utilizado no espaço escolar, visto que a maioria dos pro-
fessores não tem e/ou não utilizam seus conhecimentos
para colaborar com seu trabalho. Diante disso, colocamos
em discussão as formas como o professor lida com o com-
putador na escola, o que remete às novas modalidades do
uso do computador na educação, visto que apontam para
uma nova direção: o uso dessa tecnologia não como má-
quina de ensinar, mas como ferramenta educacional, de
complementação, de aperfeiçoamento e de possível mu-
dança na qualidade do ensino, enriquecendo ambientes
de aprendizagem.
Não é somente o computador, no entanto, que deve
ser considerado como veremos mais adiante, outros re-
cursos serão propostos, visto que “recurso didático é todo
material utilizado como auxílio no ensino-aprendizagem
do conteúdo proposto para ser aplicado pelo professor a
seus alunos” conforme define Souza (2007, p. 111).
Em alguns casos, o computador pode ser um cola-
borador, por exemplo, para construção de uma linha do
tempo contando a história de uma comunidade de traba-
lhadores rurais. No caso do ensino de Língua Portuguesa
em escolas do campo, as possibilidades de ensino e apren-
dizagem são ampliadas, visto que é possível um trabalho
144
interdisciplinar, de maneira mais facilitada, com todas as
áreas. Como veremos adiante, essas possibilidades têm
não somente o professor como agente na construção do
conhecimento, mas o aluno tem seu papel de ampliar suas
formas de apreender.
145
isso é que na relação aluno-professor, mediada pelo material
didático, aquele não deve sobrepor a esse e vice-versa.
Para isso, é importante que as formações inicial e con-
tinuada dos professores sejam repensadas, visto que devem
considerar não somente o ideário pedagógico existente so-
bre essa utilização do material didático como também os
saberes e experiências vividas por esses profissionais na es-
cola. Assim, ao considerarmos importantes os saberes dos
professores sobre o material didático, abriremos mais um
espaço para vermos esses profissionais como sujeitos de
sua prática, portanto capazes de refletir e colaborar com a
construção do material didático na sala de aula.
Consideramos que o conjunto de saberes, valores e
significados construídos em torno de um objeto é que o
faz tornar-se útil ao processo de ensino-aprendizagem,
transformando-o em um material didático, e que esses sa-
beres criam “regimes de verdade” dominantes, capazes de
orientar nossa visão e pensamento sobre “como” ensinar.
Assim, em torno do material didático, tem-se construído,
ao longo da história da educação brasileira, um discurso
que legitima sua utilização em sala de aula, salientando
suas potencialidades rumo a um ensino moderno, renova-
dor, eficiente e eficaz.
Somente a presença do material didático na sala de
aula não é capaz de transformar positivamente o proces-
so de ensino-aprendizagem. Cabe ao professor saber de
maneira adequada incorporá-lo à sua prática cotidiana, de
acordo com as condições estruturais de sua escola e as ne-
cessidades de seus alunos.
146
6.3 O papel do material didático como instrumento de
ensino e aprendizagem
147
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) dizem
que “o material didático é um instrumento de trabalho na sala
de aula, informa, cria, induz à reflexão, desperta outros inte-
resses, motiva, sintetiza conhecimentos e propicia vivências
culturais” (BRASIL, 1998). Com isso, podemos dizer que o ma-
terial didático se constitui elemento mediador da relação entre
professor, alunos e o conhecimento a ser ensinado e aprendi-
do. Se for assim entendido, não é difícil compreender que um
dos elementos fundamentais da relação que estabelecemos
com esse material está na intencionalidade que guia a escolha
e a utilização dele, em diferentes situações e com diferentes
finalidades. Dessa forma, é fundamental que o professor saiba
selecionar e utilizar de maneira adequada os materiais.
O material didático, ao ser utilizado de forma diver-
sificada e contínua, demonstra a capacidade de renovação
pedagógica do professor. Com isso, ele se sente ator das
mudanças necessárias na educação, e sua prática docente
revela-se inovadora e para além das expectativas. Com o
intuito de tornar o processo de ensino-aprendizagem mais
concreto, menos verbalístico, mais eficaz e eficiente, é que
o uso de material didático em sala de aula tomou grande
importância. Assim, os professores ganharam o papel de
efetivadores da utilização desse material, de maneira a con-
seguir bons resultados na aprendizagem de seus alunos.
O uso do material de didático de forma adequada
por professores e alunos faz com se criem oportunidades
de maior participação dos alunos e os torne ativos nas au-
las. É necessário que seja quebrado o excesso de verbalis-
mo do professor, com intenção de prender a atenção dos
alunos, mas causa cansaço tanto a ele quanto ao aluno.
148
Em razão disso, um dos propósitos de uso do material di-
dático é facilitar a aprendizagem do aluno e colaborar na
organização do planejamento do professor, visto que con-
cretiza os assuntos a serem trabalhados. Com isso, torna a
aula mais interessante e prazerosa para ambos.
149
materiais que podem ser – e são – usados em diferentes dis-
ciplinas, como os filmes, por exemplo, mas a forma como o
professor organiza o trabalho deve privilegiar a especifici-
dade do conhecimento que deseja ensinar/aprender, por
exemplo, o conhecimento linguístico, artístico ou o histó-
rico, para lembrar três áreas de conhecimento nas quais o
uso desse material é altamente indicado.
150
rizam uma necessidade de recolocar a tarefa da docência
na efetiva prática docente. Ele precisa construir e refletir
sobre essa construção por meio de uma criteriosa avalia-
ção em que busque compreender os avanços atingidos na
formação dos docentes e desafios a serem enfrentados.
151
de Mediadores de Leitura, com vistas a atuarem nas Bi-
bliotecas Comunitárias distribuídas pela EVL.
Aprendemos nesses eventos a importância da for-
mação de leitores, mas principalmente de nos tornarmos
pessoas comprometidas com a nossa realidade. Em razão
disso, os livros artesanais produzidos versam sobre a rea-
lidade em que cada participante está envolvido.
Roda de História – primeiramente os participantes
foram divididos em grupos. Cada um dos grupos escolheu
uma pessoa da comunidade para fazer uma entrevista. A
ideia era que eles obtivessem diversas informações sobre a
comunidade e juntassem o máximo de histórias interessan-
tes que pudessem ser relatadas em um livro. Em geral, as
pessoas escolhidas eram as mais experientes da comunidade.
Produção do Livro Artesanal – os participantes es-
colheram uma das histórias e foram desafiados a produzir
um livro. Eles optaram por escrever em duas línguas, a
portuguesa e a língua da sua etnia; no caso da comuni-
dade em questão, são Makuxi, Wapichana e Taurepang.
Escreveram as histórias e fizeram as ilustrações em papel
ofício, juntaram as páginas e amarraram com fita ou palha.
Apresentação e uso do Livro Artesanal – no final da
oficina, todos os livros produzidos foram lidos para os par-
ticipantes e a comunidade. Logo em seguida, foram doados
para serem utilizados como material didático nas escolas.
6.6.2 Vídeos
152
por alunos é um exemplo claro disso. Em vez de lutar-
mos para que os alunos não utilizem esses equipamentos,
propomos aqui sua utilização como um recurso didático
para a produção de material na construção do conheci-
mento. Os próprios alunos podem produzir vídeo-aulas
retratando a sua realidade, aliadas aos conceitos tratados
em sala de aula que podem servir como estímulo a maior
participação em sala, como também servirão como ele-
mento motivador da formação deles. Exemplos desse tipo
de atividade foram desenvolvidos por professores e aca-
dêmicos dos cursos de Filosofia e Língua Portuguesa da
UERR, quando da participação em atividades do Progra-
ma Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid)
da Universidade Estadual de Roraima (UERR) na Escola
Estadual Gonçalves Dias entre os anos de 2010 e 2013.
153
querendo saber do que se tratava. Aproveitei essa empol-
gação para envolvê-los na atividade. Com isso, reforça-se
a importância da participação dos alunos em todas as eta-
pas de construção de qualquer atividade.
Na segunda etapa, os alunos foram orientados a esco-
lher um livro infantil para que lessem – fizessem a media-
ção – para transeuntes de uma rua próxima à escola. Eles
foram, fizeram as leituras e voltaram empolgados com a
reação das pessoas ao serem abordadas e solicitadas que
ouvissem a história e espontaneamente falassem sobre o
que ouviram. Tudo foi gravado em vídeo nos celulares ou
em câmeras fotográficas digitais.
Já a terceira etapa, começou com a organização dos víde-
os para apresentação em sala. Em seguida, cada grupo de alu-
nos foi orientado a preparar uma apresentação demonstrando
as reações das pessoas, que eram as ouvintes, e dos alunos que
serviram de ponte entre os livros e os leitores. Eles, em conti-
nuidade, elaboraram pequenos textos com as impressões acer-
ca da atividade. Desse modo, os vídeos produzidos serviram
de material didático que foi trabalhado em outras turmas.
154
mapa de seu bairro e daqueles próximos à escola. Além
disso, eles foram instigados a registrar por meio de textos
narrativos, relatando todo o processo de aprendizagem no
qual foram envolvidos, como também a história do bairro
onde viviam, utilizando-se os dados oficiais e os relatos
dos moradores mais antigos. Dessa forma, construíram
mapas, textos, maquetes e efetuaram cálculos matemáti-
cos, baseados na realidade local. Com isso, os mapas e tex-
tos produzidos serviram de material didático que foram
aproveitados em diversas disciplinas e turmas.
155
tados foram surpreendentes, pois além de apreenderem
os conteúdos, os alunos se sentiam parte da construção do
conhecimento trabalhado.
156
escassez, é um grande desafio para todos que fazem parte
da formação do aluno. Ao professor, no entanto, cabe a ta-
refa de conduzir todo o processo de reflexão, elaboração e
avaliação da construção de material didático. Essa avaliação
é fundamental para a continuidade das atividades desen-
volvidas com os alunos. Reconhecer os avanços e corrigir
as possíveis falhas trará ganhos imensuráveis na formação
dos alunos e na prática cotidiana dos professores.
Referências
157
GARCIA, Tânia B. Tânia Braga Garcia (UFPR): materiais didáticos
são mediadores entre professor, alunos e o conhecimento.
Jornal do Professor, 2011, Edição 56. Entrevista. Disponível em:
<http://portaldoprofessor.mec.gov.br/noticias.html?idEdicao=
59&idCategoria=8>. Acesso em: 21 jul. 2013.
158
7 Metodologia e Planejamento: A Sequência
Didàtica no Ensino da Língua Portuguesa
Jairzinho Rabelo
Luzineth Rodrigues Martins
Introdução
159
mos. Estamos a todo o momento planejando nossas ações.
O planejamento está situado então no nível dos nos-
sos desejos e intenções. Nesse sentido, Libâneo (1994, p.
222) diz que o planejamento docente é “um processo de ra-
cionalização, organização e coordenação da ação docente”.
No planejamento, antecipamos nossas ações de me-
diação, assim podemos analisar se elas serão as melhores
escolhas diante do contexto de ensino em que a aula ocor-
rerá, pois, como afirma Bortoni-Ricardo (2012, p. 92):
160
ações efetivas que o professor realizará na sala de aula,
por meio de objetivos, conteúdos, métodos e formas orga-
nizativas do ensino.
O autor ainda esclarece que o planejamento é um
guia de orientação do trabalho docente, visando:
161
• Facilitar a preparação das aulas: selecionar o mate-
rial didático em tempo hábil, saber as tarefas que o
professor e os alunos devem executar, replanejar o
trabalho diante das novas situações que aparecem
no decorrer das aulas (LIBÂNEO, 1994).
162
atender aos mais diversos propósitos dos sujeitos, a depen-
der da sua necessidade discursiva, reconhecendo, assim, as
relações entre ações humanas e ações de linguagem.
No campo pedagógico, essa corrente teórica projeta-
-se desta maneira:
Uma teoria social do ensino-aprendizagem
que enfoca as influências sociais a que os
alunos estão submetidos, ao mesmo tempo
em que leva em conta as características do
lugar social no qual as aprendizagens se
realizam: a escola. Ela leva em consideração
as necessidades e as finalidades que
fazem com que os diferentes participantes
busquem uma forma de interação na qual
os modelos retidos dependem de sua
valorização social. Ela analisa as intervenções
intencionais dos professores em função
de um projeto distinto da esfera cotidiana
de experiência do aluno, e estuda não só
os ajustes retrospectivos para assegurar
a continuidade das aprendizagens, mas,
sobretudo, o efeito dos ajustes prospectivos,
em função do modelo buscado, das
novidades introduzidas e do pré-enquadre
proposto. As antecipações predispõem a
uma atenção seletiva que consiste em trazer
certos componentes do modelo buscado e
ignorar outros. As interações são reguladas
pelos professores, que são responsáveis por
ajudar o aluno a assimilar as novidades
(DOLZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 40-41).
163
dática, que atende à finalidade do agir pedagógico, pautado
por princípios que sistematizam a ação do professor, isto é,
a legitimidade do ensino, a pertinência e a solidificação dos
saberes escolares na sua relação com o contexto sociodiscur-
sivo dos alunos (DOLZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 27).
Ancorado em um interacionismo instrumental, isto é,
uma posição que enfoca “as relações ensino aprendizagem
sobre os diferentes instrumentos que podem ser construídos
para permitir a transformação dos comportamentos” (DOLZ;
SCHNEUWLY, 2010, p. 40), os autores propõem um ensino
da língua materna para instrumentalizar o aluno para que
ele possa “descobrir as determinações sociais das situações
de comunicação assim como o valor das unidades linguís-
ticas no quadro de seu uso efetivo” (DOLZ; SCHNEUWLY,
2010, p. 40) pela intervenção sistemática do professor.
O papel do professor é fazer a mediação da linguagem
na produção textual, seja ela oral, seja escrita, para que o aluno
construa as diversas capacidades – adaptação de sua produ-
ção às características do contexto e do referente, (capacidade
de ação); mobilização dos modelos discursivos (capacidades
discursivas); do domínio das operações psicolinguísticas e das
unidades linguísticas (capacidades linguístico-discursivas).
Visando à construção dessas capacidades, a mediação
do professor precisa centrar-se em três princípios do traba-
lho didático: 1. o princípio da legitimidade, que se refere aos
saberes teóricos elaborados por especialistas; 2. o princípio
da pertinência, que trata das capacidades a serem adquiridas
pelos alunos, das finalidades e dos objetivos da escola e dos
processos de ensino-aprendizagem; 3. o princípio de solidi-
164
ficação, que significa tornar coerentes os saberes em função
dos objetivos visados. Segundo Dolz e Schneuwly (2010, p.
70), tais princípios devem ser aplicados concomitantemente,
com o objetivo prático de orientar a intervenção do professor.
No tocante à proposta de ensino de gênero, os auto-
res defendem a organização didática de um programa por
meio de agrupamentos de gêneros, conduzido em forma
de progressão e ensinado por uma sistematização meto-
dológica denominada sequência didática. Os agrupamen-
tos devem atender a três critérios que:
165
se utiliza de textos de efetiva circulação social e
de diferentes esferas e práticas sociais.
3. a concretização de uma perspectiva enunciativa
para as aulas de Língua Portuguesa, uma perspec-
tiva que leve em conta o conhecimento situado, a
linguagem efetivamente em uso, o trabalho com
textos e práticas didáticas plurais e multimodais;
4. a abordagem tanto de noções discursivas quanto
das noções eminentemente estruturais ou linguís-
ticas/enunciativas, todas elas necessárias para o
letramento do sujeito e para a correta compreen-
são do próprio gênero;
5. o subsídio para (re)pensarmos novas formas de or-
ganização curricular. Uma proposta de ensino com
foco no desenvolvimento da linguagem dos alunos
ultrapassa o domínio gramatical, como vimos nas
explicações anteriores. Abrange, pois, a língua em
seu caráter de interioridade e exterioridade e a ação
humana que se faz pelo uso da linguagem.
15
Expressão comumente utilizada pelos habitantes de Roraima com
Significado de negação, de espanto e novidade.
166
As orientações para o planejamento seguiam o refe-
rencial teórico utilizado na disciplina, cujas ideias princi-
pais são:
1. a interação como princípio da ação docente (AN-
TUNES, 2003);
2. a mediação pedagógica como ação intencional de
promoção da competência comunicativa do alu-
no (BORTONI-RICARDO, 2012);
3. o texto como unidade de ensino (GERALDI, 2002);
4. a integração das práticas de leitura oralidade e es-
crita (PCN, 1998).
Inicialmente os alunos foram orientados a escolher
um texto que possibilitasse a aplicação dos fundamentos
discutidos em sala de aula. O planejamento conteve os
seus elementos básicos, isto é, objetivos, conteúdos, meto-
dologia e avaliação.
Apresentamos a seguir um dos planejamentos reali-
zado pelos alunos.
Manteve-se a estrutura do trabalho acadêmico e do planejamento para que não houvesse a
quebra do gênero textual.
167
Universidade Estadual de Roraima
Curso: Letras Habilitação em Literatura
Disciplina: Prática Profissional II
Professora: Luzineth Rodrigues Martins
Escola Estadual Dom Pedro II
Antonio José dos Santos Filho
Janeci Sales Lima
Jenivan Ferrais Sousa
Objetivos
169
a relação entre a linguagem e o contexto de fala.
• Reconhecer a importância da pontuação e da gra-
fia para representar a fala dos personagens.
• Inferir o significado de expressões representadas
em linguagem não verbal.
• Compreender a função e a importância das ono-
matopeias nas HQS.
• Produzir texto utilizando as convenções sociais da escrita
e adequando a informação ao gênero solicitado (HQ).
• Utilizar as imagens e a linguagem verbal para
construir o sentido do texto.
• Transpor o gênero relato para o gênero história em
quadrinhos, considerando suas características.
• Conhecer a função e as circunstâncias que expri-
mem os advérbios.
É importante destacar o esforço dos alunos na construção de uma proposta que tenha o texto
como o objeto de ensino, integrando às práticas de leitura, oralidade e escrita. Percebe-se, no
entanto, ainda a necessidade de superar a abordagem estruturalista do texto.
Conteúdos
170
• Advérbio.
Procedimentos Metodológicos
171
HQ relato da criação de Iracema).
Disponível em http://turmadamonica.uol.com.br/quadrinhos/
172
Qual é o gênero deste texto?
Como é a estrutura de uma história em quadrinhos? O que acontece
no 1.º quadrinho?
Tem alguma palavra nessa história que você não conseguiu
compreender o sentido?
A linguagem do texto é adequada ao gênero e ao público destinado?
COTEXTO
Você se recorda de outra história que aborda o mesmo tema que este?
INTERTEXTO
173
É importante que o professor especifique o objetivo dos textos que
são levados para a sala de aula. Todo texto, tem um propósito para
o qual foi produzido e veiculado socialmente, e é esse propósito
que deve ser o objetivo da leitura, não somente a própria leitura,
ela é a ação didática para a obtenção do objetivo.
TEXTO 2
174
Era um lugar de mata virgem, que vivia uma varie-
dade de animais, aves e belos lagos e igarapés com mui-
tos peixes. Próximo a esse lugar, já moravam algumas
pessoas em lotes, à beira da BR 174.
Certo dia, chegou a esse lugar um senhor chamado
Militão Pereira Costa, vindo do nordeste do Brasil e, gos-
tando do lugar, resolveu comprar um pedaço de terra. Ele
retornou ao estado do maranhão e trouxe outras famílias
para morar no lugarejo. Essas pessoas foram chegando e
fazendo seus roçados, construindo suas casas de taipa, co-
bertas de palhas, às margens da BR 174; nessa época a es-
trada era apenas de piçarra.
O início do povoado se deu com a chegada de
Agustinho Machado, Natanael Machado, Agustinho
“Careca”, Chico Pimenta, Raimundo “Bacurau” e Os-
mar, que vieram acompanhando seu Militão e sua espo-
sa dona Iracema para morar nesse lugar.
Essa localidade ficou conhecida como Vila Nova
ou Vila dos maranhenses.
No início tudo foi muito difícil, pois havia muito pium
(uma espécie de mosquito, muito miúdo e que causa muito
incômodo, comum na região amazônica), dava muita malária,
mas as pessoas procuravam viver em comunidade: cozinha-
vam em fogão a lenha, à noite, para iluminação, usavam lam-
parina a querosene ou óleo diesel, passavam roupa com ferro
de brasa, pilavam arroz no pilão e consumiam água de poço.
Era um lugar de difícil acesso, o transporte era difí-
cil, por isso os colonos que tinham lotes distantes tinham
que carregar sua safra até a estrada nas próprias costas.
175
A primeira escola funcionou num barracão de madeira...
O tempo foi passando e até ao final da década de
1970 a população da pequena vila já era aproximada-
mente 150 pessoas, mais ou menos 30 famílias – gerou o
interesse dos políticos em financiar passagens para que
os habitantes do lugar mandassem buscar mais parentes
e amigos no Maranhão – que vinham de barco até Ma-
naus e de lá para cá eram transportados em caminhões.
Numa dessas viagens, no ano de 1982, morre Dona
Iracema, vítima de um trágico acidente rodoviário.
Um ano depois, em 1983, a câmara de vereadores
do município de Mucajaí, aprovou um projeto que deu o
nome oficial ao povoado que passou a se chamar Vila Ira-
cema. Quase dez anos depois, em 1994, após um plebis-
cito, foi sancionada a lei n.º 083, que eleva a Vila Iracema
a categoria de Município, passando a se chamar Iracema,
tendo como primeiro prefeito o Sr. Joaquim de Freitas
Ruiz, em 1.º de Janeiro de 1997. A partir daí, o crescimento
econômico e social do município se desenvolveu bastante.
Hoje, em Iracema, temos escolas de ensino infantil, fun-
damental médio e superior, hospital, prefeitura, Câmara, Vila
Olímpica, Ginásio poliesportivo, rodoviária, posto policial,
sede da CAER, sede CER., postos de gasolina, hotéis, restau-
rantes, lanchonetes, panificadoras, supermercados, açougues,
ruas asfaltadas, energia elétrica, água encanada, etc.
Todos os anos, no dia 4 de novembro comemora-
mos o aniversário do Município de Iracema, por isso
buscou-se aqui não somente contar a trajetória de um
desenvolvimento local, mais dizer: parabéns Município
176
de Iracema! Sua história é bonita e poderá ser mais bo-
nita ainda se todos que aqui vivem e os que chegarem
tiverem cuidado e responsabilidade social com você
Texto elaborado pelas professoras Janeci Sales Lima e Rosa Maria Silva
de Oliveira, tendo como embasamento um artigo denominado Iracema: Mi-
gração e voto de Dimar Freitas Mesquita, UFRR: Boa Vista, 1998.
Compreensão leitora do texto
177
Por que esse texto tem o compromisso com a verdade dos fatos
INFRATEXTO apresentados?
O nome das pessoas é fictício ou real?
A que conclusões podemos chegar ao conhecer as informações
contidas nesse texto?
O que você descobriu lendo esse texto?
178
• São, em geral, publicadas no formato de revistas,
livros ou em tiras publicadas em revistas e jornais.
• São conhecidos como comics nos Estados Unidos,
bande dessinée na França, fumetti na Itália, tebeos
na Espanha, historietas na Argentina, muñequitos
em Cuba, mangá no Japão.
• Há diversos tipos de balões. São usados de acordo
com o contexto da história. O contorno dos balões va-
ria conforme o desenhista; no entanto, alguns são co-
muns, como os que apresentam linha contínua (fala
pronunciada em tom normal); linhas interrompidas
(fala sussurrada); ziguezague (um grito, uma fala de
personagem falando alto, ou som de rádio ou televi-
são); em forma de nuvem (pensamento).
179
Quadro ou vinheta é como são chamados também
os quadrinhos. É o espaço no qual ocorre uma ou mais
ações. Geralmente de forma retangular ou quadrangu-
lar, funciona como moldura de um momento de ação.
Tem a função de delimitar, separar, indicar o espaço en-
tre as diferentes imagens. A disposição dos quadros na
página pode facilitar ou dificultar a leitura. Além disso,
a disposição dos quadros cumpre a função de dar dina-
mismo às sequências.
180
Disponível em http//portaldoprofessor.mec.br/storage/discour-
se/discovirtual/galeria/imagens
181
a) O professor propõe que, coletivamente, façam um
levantamento das histórias trazidas pelos alunos.
b) Em seguida, solicita que cada grupo escolha uma
das histórias para ser lida e trabalhada. Nesse mo
mento o professor preenche o quadro abaixo:
1.
2.
3.
4.
Disponível em http/4bp.blogspot.com/imagens.bpm
182
c) A expressão “quebrar o galho” ganhou duplo sig
nificado no texto. O que significou a expressão para
Mônica e o que significou para Cebolinha?
d) O problema de Cebolinha foi resolvido?
e) Mônica percebeu o engano que cometeu?
f) O que significam as estrelas e a fumaça na cabeça
de Cebolinha?
183
No terceiro quadrinho, na fala dos personagens há
uma palavra que caracteriza negação. Que palavra será
essa? Vamos ler juntos a frase? “Não é bonito falar essas
coisas na frente dos outros.” Se retirássemos o não, muda-
ria o sentido da informação?
Há um grupo de palavras que confere diversas cir-
cunstâncias, mas o que significa a palavra circunstância?
Alguém sabe?
Podemos consultar um dicionário para entendermos
melhor o seu significado?
Esse grupo de palavras, do qual falávamos, é chama-
do advérbio (o prefixo ad significa junto, próximo) porque,
de modo geral, modifica o sentido do verbo, mas modifica
também o adjetivo ou do próprio advérbio.
Observe que essa ação do professor, de explorar o conhecimento
linguístico do texto, difere daquela em que o professor usa o texto
como pretexto para trabalhar a gramática. A ação que ele realizou aqui
foi a de exploração do significado das expressões e da função que as
palavras têm no texto e que ajudam a produzir o seu sentido. Somente,
em um segundo momento, quando necessário, o professor apresentou
o nome do conteúdo para uma abordagem do livro didático.
Os conteúdos relacionados com a ortografia e a pontuação não são
apresentados pelo professor, surgem a partir da primeira produção
dos alunos. Nessa fase o professor deve listar os casos de ortografia
e pontuação para estudo coletivo em sala e depois passa para análise
em grupo, como proposto nesta SD.
184
Vamos ampliar nosso conhecimento com mais infor-
mações do livro didático sobre o conteúdo destacado.
Nesse momento, é importante que o professor evite uma abordagem
que privilegie puramente a metalinguagem. É importante continuar
explorando a compreensão sobre a língua, comparando as situações
de uso diversos do tema em questão.
www.saladeatividades.com/omunddodaleloca
185
4º Momento – Escrita do Gênero – Transposição do
Gênero Relato para História em Quadrinho
186
tem ou diminuam os quadrinhos. Lembrem-se de que
os fatos escolhidos devem ser os mais importantes e que
é necessário que apresentam uma sequência lógica.
g) Pensem nos tipos de balões que serão emprega
dos. Eles podem ser bem variados e de acordo com a
intenção das falas dos personagens.
h) O último quadro deve apresentar o desfecho da histó
ria e causar algum impacto: humor, surpresa, reflexão, etc.
Os acadêmicos não vislumbraram uma possibilidade de
apresentação de uma visão crítica acerca do tema da leitura. Tal
situação é importante para a formação dos estudantes, visto que
assim buscarão as estruturas profundas do texto e a sua relação com
o contexto de cada um. Talvez isso tenha acontecido como reflexo
da formação deles na Educação Básica.
Destacar a importância da visão crítica a ser trabalhada no texto a
ser produzido pelos alunos é essencial, pois é nesse momento que
eles consolidam seus conhecimentos. Para atender a esse aspecto,
o professor poderia orientar seus alunos a apresentar uma visão
crítica a respeito do assunto, visto que o gênero é propício.
2) Produzindo o texto
187
e) Empreguem fonte e letras expressivas, de acordo
com os balões e a entonação das falas. Se necessário
utilizem também onomatopeias.
f) Incluam legendas a fim de contextualizar as ações
ou acrescentar informações à história.
g) Lembre-se de dar um título à HQ e no último qua
drinho colocar “fim” na parte inferior direita dele.
h) Com a orientação da professora, verifiquem os as
pectos gramaticais, ortográficos e pontuação do texto.
i) Após terminar a primeira versão da HQ, avaliem
-na para verificar se vocês seguiram todas as instruções.
188
Em seguida, faz-se a impressão da HQ para apresen-
tação aos demais colegas de sala.
Para finalizar a atividade, outras cópias da história,
devem ser colocadas à disposição da comunidade escolar
para leitura na biblioteca e sala de leitura da escola.
4) Avaliação
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A criticidade do aluno é um aspecto que precisaria ter sido
considerado nessa avaliação. Ela deveria ter sido apontada na letra
a, visto que na aprendizagem ela é um dos requisitos essenciais.
Desenvolver o senso crítico do aluno é um dos principais objetivos
do ensino, mas essa ação precisa ser contínua em todas as fases da
mediação (na leitura, na análise linguística e na produção textual,)
pois somente assim ele poderá ser tomado como critério para
avaliação do aluno.
190
linguísticos que constituem uma realidade
e se materializa pelos usos linguísticos
que constituem os textos e os discursos
produzidos em diferentes instituições.
191
Nessa proposição, o trabalho que se apresentou
cumpriu o objetivo em permitir ao professor a experiência
com o planejamento de sequência didática e seus funda-
mentos, de modo a prepará-lo para uma prática docente
possível nessa realidade.
192
Questões para reflexão
Referências
193
BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Leitura e mediação
pedagógica. São Paulo: Parábola, 2012.
194
NASCIMENTO, Elvira Lopes. Gêneros textuais: da didática
das línguas aos objetos de ensino. São Carlos, SP: Claraluz, 2009.
CONSIDERAÇOES FINAIS
195
Esperamos que as informações e reflexões apresen-
tadas na disciplina metodologia do ensino de língua por-
tuguesa na educação do campo e nesse livro subsidiem a
prática do professor da escola do campo e tenham apre-
sentado um corpo teórico-metodológico que responda às
perguntas, “Com quais perspectivas teórico-epistemológi-
cas opera-se o ensino de Língua Portuguesa na educação
do campo, e como os valores linguísticos da população do
campo são considerados e valorizados neste ensino?”, que
foram motivadoras da realização da referida disciplina.
Em todos os capítulos apresentados é possível en-
contrar respostas a estas perguntas de pesquisa. No caso
da última pergunta, o capitulo 04 “Possibilidades de uso
da variação linguística em atividades de sala de aula da
educação do campo”, visou a subsidiar o trabalho com a
língua, na educação do campo, e a dar fundamentos para
que o professor reconheça a variação linguística produzi-
da pelos sujeitos do campo, como uma ação natural e legí-
tima, produzida em um determinado contexto de uso da
língua. Também visou a apresentar uma possibilidade de
uso da variação produzida pelos campesinos, como o pon-
to de partida para a ampliação da competência discursiva
dos sujeitos do campo, isto, e, partir do usos da língua que
eles já fazem, para dar-lhes novas possibilidades de uso da
língua em contextos de monitoramento, em atendimento
ao papel social do professor de língua portuguesa.
Também esperamos que esse livro tenha alcançado o
objetivo de promover uma reflexão sobre as possibilidades
de ensino na educação do campo que sejam produtivas
196
para os alunos, no sentido de que estes se identifiquem e
se reconheçam como sujeitos que estão na escola com a fi-
nalidade de compreender a importância do conhecimento
escolar mas, sobretudo, que reconheçam as competências
linguísticas que já possuem e entendam a necessidade de
ampliá-las, pois a escola é lugar de excelência para a pro-
moção de conhecimentos linguísticos com o fim de am-
pliação da competência discursiva dos alunos
E cientes da realidade multifacetada do processo de
ensino, isto é, dos variados fatores sociais que estão impli-
cados na prática do professor, também tem-se consciência
do esforço e da dedicação dos professores da educação do
campo para atuar neste contexto, superando as dificulda-
des existentes na sua prática pedagógica.
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