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Aula 14 - Histórico do ensino de ballet - Parte III 22

Século XIX

Os princípios técnicos teorizados por


Pierre Beauchamps no século XVII
seguiram com outros maîtres que formaram
bailarinos cujo preparo técnico atingiu alto
nível no século XIX. Um dos grandes
méritos da Academia foi preservar a
terminologia, sempre em francês, que
permanece até os dias de hoje. Entretanto,
a passagem desses conhecimentos de
geração a geração se deu, primordialmente,
por transmissão oral. Os signos dos quais
dispomos para grafar uma coreografia, uma
seqüência de movimentos, nunca foi do
inteiro agrado de
professores, coreógrafos, ensaiadores. Carlo Blasis

Em 1797 nasceu Carlo Blasis, natural de Nápoles que, retirando-se cedo dos palcos
passou a dedicar-se ao primeiro tratado de dança, lançado em 1820. Pode-se admitir que
todos os preceitos de um método moderno de ensino estão contidos no seu Traité
élémentaire, théorique et pratique de l’art de danse, desde o porte e a coordenação dos
braços até os allegros mais virtuosos. Blasis considerou todas as teorias de seus
antecessores desde o século XVI e, em 1828, complementou seu tratado com o Code de
Terpsicore, no qual propôs modificações nas regras acadêmicas e ângulos mais estéticos,
enfatizou o épaulement e introduziu a barra como elemento auxiliar nos exercícios
preliminares da aula.

Carlo Blasis teorizou sobre o sapato de ponta, transformando-se, segundo vários


autores, no principal pedagogo do Romantismo, já que a necessidade de elevação, tão
ansiosamente buscada na época, passava a ser atendida pelo padrão de beleza estético
das bailarinas que usavam o novo acessório. A partir
daí a sapatilha reforçada na ponta passou a fazer 23
parte da dança acadêmica feminina. A Blasis é
creditado criar a pose attitude, inspirada na estátua de
Mercúrio, de Jean Bologna.

Em 1832, foi criado o marco dos ballets


românticos: La Sylphide, apresentando Marie Taglioni no
papel título da criatura sobrenatural que é amada por um
mortal. A coreografia, criada por seu pai, Filippo Taglioni,
explorou o uso do sapato de ponta para enfatizar a
leveza etérea e sobrenatural da personagem.

Entretanto, os ballets românticos não tratavam


apenas de assuntos sobrenaturais. A bailarina Fanny Estátua de Mercúrio, de Jean Bologna,
Florença- Itália

Elssler popularizou um caráter mais terreno e sensual ao se apresentar em 1836, em Le


Diable Boiteaux, tocando castanholas. E, se no século anterior o ballet era privilégio dos
homens, as mulheres dominaram o ballet romântico e mitos como Taglioni, Elssler, Carlotta
Grisi e Fanny Cerrito foram as musas da época.

A partir daí o ballet se espalhou pelo


mundo. Na Dinamarca, entre 1760 e 1879,
Antoine e Auguste Bournonville,
respectivamente pai e filho, dotaram de
peculiaridades não só o método de ensino,
como a base do repertório do Real Ballet
Dinamarquês, e, mantido até hoje, seu método
dá especial atenção à técnica masculina.

Marie Taglioni em La Sylphide, 1832


24

As estrelas do Romantismo:María Taglione, Carlotta


Grisi, Lucille Grahn e Fanny Cerrito em Pas de
Quatre, 1845.

Fanny Elssler na Cachucha, Biblioteca


Pública de Nova York, EUA.

Histórico do ensino do ballet


Século XX
Inglaterra

Londres, que iniciou sua tradição de ballet em 1700, com John Weaver, apenas em
1920 criou a Royal Academy of Dancing, inicialmente chamada de Association of Operatic
Dancing of Great Britain, fundada por um grupo de bailarinos famosos. Em 1916, uma
publicação no Dancing Times, intitulada “What every teacher of Operatic Dancing ought to
know and be able to teach”, de Edouward Espinosa, constituiu o primeiro impulso para a
criação de um método de ensino inglês. Tais instruções apenas reforçaram conceitos
colhidos de antigos mestres como Pécour, Vestris, Dauberval, Perrot, Taglioni, Petipa,
alicerçando as tradicionais bases do ballet no método da “Royal Academy of Dancing”.

Curiosamente, operatic era o nome dado ao ballet nessa época – apenas na


Inglaterra – significando “clássico(a)”: para os ingleses, o termo “dança clássica” era usado
para designar a dança da Grécia Clássica (Derek, 1995: 3). Assim, em 1920, foi
criada, por um grupo de bailarinos, amantes da dança e personalidades expressivas
ligadas à arte, a Association of Teachers of Operatic Dancing of Great Britain. 25

A normatização de seu método, The Syllabus, aprovada em 31 de dezembro do


mesmo ano, teve como objetivo padronizar o ensino da técnica do ballet praticada naquele
país, para que todos os professores adotassem procedimentos semelhantes, pois seriam
membros da associação apenas aqueles reconhecidos pelo comitê.

Histórico do ensino do ballet


Rússia

O ballet chegou mais tarde à Rússia do que ao resto da Europa. A Escola de Ballet
de São Petersgurgo, hoje Academia Vaganova de Dança, foi fundada em 1738 pela
imperatriz Anna Ivanovna e, segundo Caminada, a chegada de Enrico Cecchetti à Rússia,
em 1877, foi de grande importância à criação de um método no país, pois Marius Petipa 6
percebeu a necessidade de incorporar o estilo do mestre italiano para não correr o risco de
ser preterido pelo recém-chegado. Com isso, enriqueceu ainda mais suas criações.

Enrico Cecchetti (1850-1928) Marius Petipa (1818-1910)

6
Apesar de ter nascido em 11 de março de 1822, em Marselha, Petipa não pode ser dissociado do século XX,
não apenas por sua longa carreira mas pelo importante papel que sua obra representa ainda hoje, para as grandes
companhias. Os principais livros sobre a história da dança mencionam “a era Petipa”, tal sua importância. “A influência de
Petipa traduziu-se em primeiro lugar pela introdução de solos e pas de deux nos conjuntos que, antes dele, constituíam a
parte essencial das obras. Com Petipa a dança pura prevalesceu, assim como o virtuosismo dos principais protagonistas.
(...) Foi inegável criador de passos. Muitos das suas variações – modelares no gênero – conservam ainda, atualmente, a
preferência dos bailarinos e do público” (Salazar, 1962:321).
Petipa tornou-se o principal coreógrafo do Ballet Imperial e foi imortalizado com
criações como A Bela Adormecida e O Lago dos Cisnes, sendo este coreografado em 26
parceria com Lev Ivanov. Ambos os ballets apresentaram músicas compostas
exclusivamente para eles por Peter Ilich Tchaikovsky. Nota-se também que, nesta
ocasião, a dança masculina recebeu melhor tratamento do que no período romântico.

Foi Cecchetti então, quem ajudou a construir as bases


da escola russa que posteriormente seria codificada e
aperfeiçoada or Agrippina Vaganova, em 1934.

Passado o tempo, surgiu a companhia Ballets Russes,


dirigida por Serge Diaghilev, cuja estréia em Paris, em 1909,
destacou o elenco masculino, dentre eles, Vaslav Nijinsky.
Sinônimo de inovação e qualidade, a companhia
Argippina Vaganova em
permaneceu por vinte anos, contando com artistas como Esmeralda, St.
Petersburg,1899
Pablo Picasso e Maurice Ravel, que uniram-se a

coreógrafos como Nijinsky, Bronislava Nijinska, Leonide Massine, George Balanchine e


Serge Lifar.

As estrelas do Ballets Russes revitalizaram o


ballet no mundo inteiro. Dela surgiu também Anna
Pavlova, que formou sua própria companhia e saiu
em tournées pelo mundo. Fokine trabalhou em várias
companhias, dentre elas o American Ballet Theatre.
Massine ajudou a formar o Ballet Russe de Monte
Carlo após a morte de Diaghilev. Balanchine foi
convidado a trabalhar nos Estados Unidos, enquanto
Lifar dedicou-se à Ópera de Paris e Ninette de Valois
foi uma das fundadoras do ballet britânico.

Anna Pavlova (1881-1931)


Histórico do ensino do ballet 27
Estados Unidos

A dança moderna começou a se desenvolver nos


Estados Unidos nos anos vinte do século XX. Martha
Graham, Doris Hunphrey e Mary Wigman quebram as
tradições e criam seus próprios movimentos. As formas de
danças populares também começam a enriquecer o ballet.
Mas a idéia de dança pura também cresce em popularidade
e, nos anos trinta, os ballets sinfônicos apontam esta
tendência marcante na obra de Balanchine, dançarino russo
radicado nos Estados Unidos.

George Balanchine (1904-198) Em 1944 o americano Jerome Robbins cria Fancy


Free, no estilo de uma comédia musical, baseada no jazz.
Nos anos quarenta foram fundadas duas importantes companhias americanas, o American
Ballet Theatre e o New York City Ballet e, a partir daí, surgiram companhias em todo mundo,
com destaque para os russos Bolshoi e Kirov.

Em 1948 Alicia Alonso, fundava, em Cuba, sua própria


companhia e, posteriormente, engajada na revolução cubana de
1959, viria a dirigir o Ballet Nacional de Cuba, ao lado do marido,
Fernando Alonso. Responsável pela formação de grandes
bailarinos, Alicia criou um método de ensino, codificado por volta
dos anos sessenta.

Longo caminho
Alicia Alonso (1921)

Muita coisa caberia declarar mas enfocamos apenas os principais colaboradores


na codificação dos termos e movimentos do ballet, criadores de métodos de ensino,
pioneiros em cujos ensinamentos as bases do ballet, mesmo que tenham evoluído ao
longo dos anos, se fundamentam até os dias de hoje. 28

Desses tratados até o completo sistema elaborado por Rudolf Laban, o Labanotation,
seguido pela notação chamada Coreologia, de Rudolf e Joan Benesh, até Stepanov, criador
de um método também de notação utilizado na Rússia, a dança acadêmica vem
percorrendo um longo caminho.

A complexidade dos princípios que a regem tornaram-na, sempre, uma arte de difícil
registro por signos, sinais e outros recursos. Até nossos dias, coreógrafos, ensaiadores,
professores, ainda que não desprezem nem ignorem a coreologia, conforme mencionamos,
privilegiam a transmissão oral pelos próprios bailarinos para a continuidade e permanência
de suas obras7.

Histórico do ensino do ballet


As cinco posições

Desde sua criação, como já observamos, tratadistas de dança deram início ao


processo de sistematização da dança cortesã. Com Isaac D’orleans e depois com Thoinot
Arbeau, a França passou a integrar a estirpe de maestros de dança: foi na era do minueto
que surgiu o espírito sistemático do ensino do baile.

Nesse sistema está contido o método básico de um esquema de posições invariáveis


da cabeça, do tronco, dos braços e das pernas como princípio e fim de cada movimento.
Também são descritas as cinco posições básicas nas quais estão compreendidos todos os
passos, denominados simplesmente as cinco posições. Nelas estão contidas todas as
possibilidades de combinar os passos para trás, para frente e para os lados, sem perda do
equilíbrio.

7
Nas grandes companhias de ballet, a utilização do vídeo não é prática rotineira para a remontagem de clássicos
de repertório, podendo ser utilizado como recurso adicional, para esclarecer uma ou outra dúvida, mas não substituindo
a figura do remontador, o profissional capaz de zelar pela manutenção do estilo da obra.
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1ª Posição De Pés 2ª Posição De Pés 3ª Posição De Pés

4ª Posição De Pés 5ª Posição De Pés

Da terminologia do século XV os termos referentes aos movimentos e passos


utilizados nos bailes estão imbricados aos termos que, hoje, pertencem à terminologia
universal do ballet. Os tratados mencionam o branle, por exemplo, passo utilizado em dança
do mesmo nome, cuja utilização refere-se apenas à dança cortesã, enquanto,
simultaneamente, classifica o capriole, hoje cabriole.
A Itália, assim como a França, continuaram, até o final do século XIX, a fornecer
grandes maestros de dança, exercendo notável influência em todas as demais escolas 30
que as seguiram: francesa, dinamarquesa, russa, inglesa, norte-americana e cubana, esta
última, uma síntese das escolas russa e norte-americana.

A partir desta aula, utilizaremos fotos para ilustrar algumas posições do ballet referidas no
texto. Agradecemos os dois dançarinos que, gentilmente, posaram para as fotos. Disponibilizamos
os seus currículos:

Carolina Neves - carioca, 15 anos, aluna do curso profissionalizante do Centro de Dança


Rio, RJ,já conquistou vários prêmios, entre eles: classificada entre os 6 finalistas do YAGP
- Youth American Grand Prix, NY (2005) recebendo bolsa para o Royal Ballet e para o Kirov
Ballet / 1º lugar no Festival de Joinville - melhor bailarina / 1º lugar na seletiva brasileira do
YAGP para 2007, quando estará, mais uma vez, representando o Brasil no exterior.

Irlan Santos - carioca, 16 anos, aluno do curso profissionalizante do Centro de Dança Rio -
RJ. Entre seus inúmeros prêmios estão: 1º lugar no YAGP - Youth American Grand Prix em
NY, ganhando bolsa de estudos para o Royal Ballet e para o Harid Conservatory (2005) / 1º
lugar e Melhor bailarino no Festival de Dança de Joinville (2006) / pertenceu ao elenco da
extinta Companhia Jovem do Rio de Janeiro.
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