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Introdução
1
Cf. NASCIMENTO, Isaac de S. A Metafísica da Vontade em Schopenhauer. In: Revista Lampejo, ano
4, nº 8, pg. 2.
2
Cf. DEBONA, Vilmar. Schopenhauer. São Paulo: Ed. Ideias e Letras, 1ª edição, 2019. p. 45.
Todavia, para Kant, de qualquer maneira, todo sistema metafísico, mesmo o imanente,
seria um contrassenso, pois “(...) no tocante às fontes do conhecimento metafísico, elas
não podem ... ser empíricas”3. Segundo ele, nossas intuições a priori só podem
constituir fundamento para a organização do mundo empírico, isto é, são condições de
possibilidade válidas apenas para o conhecimento do mundo fenomênico. Segundo
lentes kantianas, então, a metafísica schopenhaueriana é qualificável como não crítica.
Todavia, Schopenhauer sustenta que uma metafísica pode ser sim fundada na
experiência, mas não em experiências físicas, isso é, experiências que sejam submetidas
ao princípio da razão.
3
KANT, 1988, p. 23-24 Prolegômenos a toda a metafísica futura.
4
SCHOPENHAUER, Arthur. Sobre a Quadrúplice Raiz do Princípio de Razão Suficiente. Tradução de
O. Giacoia e G. Valladão. São Paulo: Unicamp, 2020. p. 319-321.
5
DEBONA, Vilmar. Ibidem, p. 75.
6
Ibidem, p. 99
7
Ibidem, p. 100
Embora os eventos metafísicos citados estejam fora do domínio das ciências naturais,
são completamente compreensíveis metafisicamente. Afirmar a possibilidade metafísica
não é afirmar a possibilidade de conhecimento da coisa-em-si, como já foi mencionado.
As condições para a possibilidade de um conhecimento da coisa-em-si, segundo
Schopenhauer, seriam a desvinculação e a oposição a toda forma de representação, isso
é, a negação da vida.
Por fim, uma nota metodológica acerca deste artigo é a de que, para a sua realização,
utilizou-se, como leitura principal para o desenvolvimento dos pontos colocados, a
dissertação de doutorado de Schopenhauer, Sobre a quádrupla raiz do princípio de
razão suficiente, além de sua obra O mundo como Vontade e representação (volumes I
e II), também os livros Schopenhauer do professor Vilmar Debona e Sobre o
fundamento da Moral de Schopenhauer e outras leituras secundárias, inclusas na
bibliografia.
1. Somos livres?
8
SCHOPENHAUER, Arthur. O mundo como vontade e como representação. Tradução: Jair Barboza.
São Paulo: UNESP, 2005, p. 46.
9
Ibidem, p. 55.
uma disputa por dominação, a matéria se transformasse e houvesse uma sucessão de
estados. Assim, os fenômenos naturais se sucederiam segundo a lei de causalidade.
10
SCHOPENHAUER, Arthur. Sobre a Quadrúplice Raiz do Princípio de Razão Suficiente. Tradução de
O. Giacoia e G. Valladão. São Paulo: Unicamp, 2020. p. 123-125.
11
Cf. Ibidem. p. 311.
12
Cf. Ibidem. p. 313
“(...) o sujeito conhece a si mesmo apenas como
querente, não, porém como cognoscente. Pois o eu
que representa, o sujeito do conhecer, jamais pode
tonar-se, ele próprio, representação ou objeto – uma
vez que, como correlato necessário de todas as
representações, é condição destas (...)”.13
Dessa forma, o filósofo acaba por definir o corpo duplamente: corpo como
representação, objeto mediato, e corpo (Leib) como vontade, objeto imediato. Isto é, o
corpo do sujeito cognoscente é o mesmo do indivíduo volitivo que quer. Isso revela,
portanto, a engrenagem interior do ser, de seu agir, dos seus movimentos: cada
movimento corporal corresponde a um ato volitivo. 14 E é a partir desse conhecimento
duplo do corpo – corpo que tanto participa da efetividade do mundo quanto descobre-se
como essencialmente volitivo – que Schopenhauer faz a analogia com os outros objetos,
os quais, diferentemente do corpo humano, não se dão a nós de modo duplo, mas apenas
como representação. Tais objetos são, assim, julgados analogamente àquele corpo, são
considerados como ele: de um lado representação, de outro vontade. Assim, ao
perceber aquilo que se passa em meu corpo/vontade, estendo-o analogamente para toda
a natureza. Schopenhauer expõe a importância desse ponto ao dizer que “(...) essa
compreensão é a pedra fundamental de minha metafísica inteira.”. 15
A vontade é caracterizada, dessa forma, como base de todo movimento, sendo ele
interior ou exterior, isto é, como princípio de toda natureza. Segundo essa leitura “(...) o
caráter de cada indivíduo humano passará a representar mais um grau de manifestação
da vontade genérica, esta que, nesse sentido, constitui o caráter de todas as outras
espécies animais e vegetais, assim como o caráter de todas as forças orgânicas e
inorgânicas da natureza”16. A vontade aqui, para Schopenhauer, assume o papel de uma
força volitiva, cega, algo sem fundamento (grundlos), de onde surge toda a natureza.
Ela é uma força insaciável, que se afirma nas mais variadas formas da natureza e da
existência em geral.
17
Cf. DEBONA, Vilmar. Ibidem, p. 97
conhecida, constante e imutável. Essa “inalterabilidade de cada individualidade em si” 18
remete àquilo que foi arquitetado pela natureza e constituído enquanto caráter inteligível
de cada indivíduo. Dessa forma, como é expresso em Sobre a Liberdade da Vontade, o
caráter do indivíduo é constante:
Por isso, em cada indivíduo, as ações são estabelecidas por sua índole mais íntima, ou
seja, pelo caráter inteligível de cada indivíduo. O caráter empírico mostra aquilo “que se
é” na medida em que revela o caráter inteligível no tempo e no espaço 20. Dessa maneira,
pelo fato de o caráter empírico ser aquele que é acessível, ao contrário do inteligível, é
através dele que o indivíduo percebe, como ações do corpo, os atos da vontade dentro
de si. As ações do corpo são atos da vontade provocados pelo motivo, e, mesmo eles
sendo intrinsicamente relacionados, são conhecidos de formas diferentes. A vontade,
por exemplo, não está sujeita à causalidade, isto é, não nos é dada de maneira empírica;
já o motivo, é um meio de perceber o ato da vontade se exteriorizando através de
movimentos corporais. O motivo se apresenta como “razão suficiente para, quando
apresentado certo caráter, a ação acontecer”21. Já o caráter/motivação é concebido como
aquilo que é imutável, inalterável. Existem infinitos motivos que podem conduzir o
indivíduo a agir, porém as motivações principais são três: egoísmo, maldade e
compaixão. Destas, respectivamente, resultam três classes de motivos: o bem próprio, o
sofrimento alheio e o bem alheio. Por exemplo, sobre o caráter egoísta, será mais forte
os motivos egoístas. O egoísta, assim, seria levado a praticar uma ação caridosa somente
com intento de que o alívio do sofrimento de alguém cause lhe alguma vantagem em
retorno.
18
DEBONA, Vilmar. Ibidem, p. 60
19
Cf. SCHOPENHAUER, Arthur. Los dos Problemas Fundamentales de La Ética. Espanha: Ed. Siglo, 2ª
edição, 1993.
20
Cf. Ibidem. DEBONA, Vilmar. p. 62
21
Ibidem. DEBONA, Vilmar. p. 85.
O egoísmo é concebido como motivação principal e fundamental22. Esta motivação está
na origem do conflito eterno entre os indivíduos de todas as espécies, além de estar
associada ao que existe de mais profundo da condição natural de seres desejantes. Ela é
oriunda da vontade e se manifesta na pluralidade dos indivíduos. Essa pluralidade dos
indivíduos tem como condição, no espaço e no tempo, o princípio de individuação:
Para Schopenhauer, essa diversidade entre indivíduos, influente nos atos de egoísmo,
acontece exclusivamente na representação, isto é, quando subordinada ao princípio de
razão suficiente. Ao perceber essa diferenciação entre os indivíduos como mero
fenômeno, o indivíduo compreende sua essência verdadeira, revelada pela
autoconsciência. Essência que é estendida a todos os outros indivíduos e que permite
descobrir-se a si próprio no outro. É esse conhecimento, de se reconhecer no outro, que
Schopenhauer nomeia como compaixão, “(...) sobre a qual repousa toda virtude
genuína, isto é, altruísta, e cuja expressão real é toda ação boa”.25.
22
Ibidem. p. 89.
23
Ibidem. p. 97.
24
Ibidem. p. 99.
25
SHOPENHAUER, Arthur. MVR/WWV II 47, p. 686-687
220). É dessa maneira que podemos vir a entender que a moral schopenhaueriana
implica a supressão da diferença entre o eu e outro. A compaixão é, portanto, a única
motivação genuinamente moral, e é considerada um grande mistério do ponto de vista
metafísico26.
26
Ibidem. DEBONA, Vilmar. p. 101.
27
Ibidem. p. 107.
Considerações finais
Através dessa exposição da filosofia de Schopenhauer, fica claro que, para ele, não há
espaço para a felicidade em sua filosofia, pois a vontade, que é sem fundamento e cega,
conduz a uma busca incansável pela satisfação de necessidades, e isso sempre resulta no
sofrimento e na insatisfação. E até mesmo aqueles que se submetem à negação da
vontade, ou seja, até mesmo aqueles que reconhecem que há uma única essência comum
a todos os seres e se tornam indivíduos compassivos, e a partir disso atingem o estado
da ascese (como negação da vontade), reconhecem e sentem que a vida não é nada mais
que sofrimento.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS