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Caso “Gente Como a Gente”

O presente trabalho apresentará uma visão a partir do psicodrama a respeito do caso


clínico baseado no filme “Gente como a gente”. Conrad Jarett é um rapaz adolescente que
passou por uma situação traumática em que perdeu precocemente seu irmão em um acidente
de barco. Após a situação traumática que passou o jovem tenta se suicidar com giletes, sem
sucesso, por isso é internado durante 4 meses em uma instituição psiquiátrica. Após o período
internado Conrad percebe que ainda não está bem com toda situação e começa a ter pesadelos
com a noite do ocorrido e por isso acaba procurando a ajuda de psiquiatra.

A relação de Conrad com seu pai parece ser não conflituosa, já que o pai é sempre
solícito e preocupado com sua saúde mental, já a relação com a mãe é completamente
diferente. Pode-se perceber que a mãe preteria Bucky, o irmão de Conrad, mas com a morte
deste tenta agir superficialmente para que a unidade familiar não seja quebrada. A relação
mãe e filho fica em evidência no decorrer do filme demonstrada como fria e distante.

Logo no início do filme Conrad busca ajuda sozinho de um profissional de saúde


mental, pois compreende que precisa de ajuda para obter “controle” de seus sentimentos.
Dias (1987) coloca que quando há uma fase de acomodação psicológica e inicia-se uma fase
desestabilizante o indivíduo sente a necessidade da busca de completar seu desenvolvimento.

Vários são os fatores que contribuem para fases desestabilizadoras, que serão
abordadas no decorrer do trabalho, porém é interessante perceber que eles produzem uma
necessidade imediata de busca no indivíduo. O indivíduo procura na fase desestabilizadora
um tipo de acelerador do desenvolvimento psicológico para que assim consiga voltar a fase
de acomodação. Essa procura pode ser vários processos como religião, política ou o processo
de psicoterapia. (DIAS,1987)

No caso do Conor o processo de acelerador de desenvolvimento foi a busca da


psicoterapia, para Dias (1987) o processo psicoterápico para que seja bem sucedido é
necessário que o paciente assimile dois conceitos. O primeiro é de que o paciente precisa
reconhecer que há alguma disfunção na esfera psicológica e o segundo é que precisa
reconhecer que não consegue lidar com essa dificuldade sozinha. Conor consegue se
enquadrar nos dois conceitos citados à cima, pois saber compreende que há algo em sua
esfera psicológica que é disfuncional em sua vida e também busca a ajuda demonstrando que
não consegue enfrentar sozinho seus obstáculos internos.

As sessões de Conrad e Berger segundo o psicodrama podem ser consideradas como


psicodrama bipessoal, pois não utiliza egos auxiliares e é focalizado no atendimento de
apenas uma pessoa por vez, ou seja, uma relação bipessoal. (CUKIER, 1992). Dias (1987)
afirma que a psicoterapia é uma relação entre cliente e terapeuta que oriente o processo de
busca da aceleração do desenvolvimento psicológico, o clima estabelecido em sessão é de
extrema importância. A partir do clima estabelecido em sessão, a relação com o terapeuta
precisa gerar no cliente 3 elementos, sendo eles aceitação, proteção e continência.

Um conceito de muita importância para a abordagem do psicodrama é espontaneidade


que pode ser definida, segundo Dias (1977) apud como elemento essencial no processo do
psicodrama e de uma vida saudável, é uma resposta adequada já existente ou não
correspondente a cada situação. É interessante perceber que ela não precisa ser bem sucedida
para ser considerada espontânea , ou seja, é estar receptivo às coisas que acontecem ao redor
do sujeito no momento presente. Pode-se perceber a espontaneidade em Conrad ao buscar a
ajuda terapêutica, pois deu uma nova resposta à situação que estava vivendo naquele
momento.

Dias (1977) coloca que a psicologia relacional busca estudar o homem a partir de suas
relações, pois esse nasce em uma rede relacional que é chamado de matriz identidade. No
caso de Conrad, sua rede relacional primária era sua mãe, seu pai e também seu irmão e
dentro dessas relações foi construindo sua identidade. Fonseca (sem ano) descreve as fases
que ocorrem durante a construção da matriz identidade, são elas: indiferenciação, simbiose,
reconhecimento do eu, reconhecimento do tu, relação corredor, pré-inversão, triangulação,
circularização, inversão de papéis e encontro.

No caso do Conrad a fase do reconhecimento do eu fica explícita quando busca


terapia, pois para Foseca (sem ano) nela ocorre uma busca de conhecimento de si. Essa fase é
muito importante, mas ocorre também em outras partes da vida como adolescência e durante
a fase senil, portanto o autoconhecimento se faz muito importante durante todas as fases da
vida e durante o filme percebemos que Conrad está buscando se conhecer melhor ao tentar ter
mais controle sobre si no processo terapêutico. Na fase do reconhecimento do tu, connor está
compreendendo que o outro é diferente dele, principalmente sua mãe que age, pensa e fala de
uma maneira dessemelhante a dele.
Fonseca (sem ano) afirma que nas relações corredor o sujeito crê que o TU é dele em
totalidade e quando o outro não se reconhece dele gera uma alta frustração. Conrad está em
uma relação corredor com Beth, sua mãe, pois ele se frustra ao se deparar com a realidade de
sua mãe não é dele e por isso não consegue se conectar com ela porque ela não se conhece
dele. A circularização é compreendida como uma fase em que há o desejo da inclusão social,
em que novas pessoas podem entrar em seu sistema relacional. Conrad possui uma
dificuldade visível no início do filme em não desejar estar incluso no meio social de seus
amigos, inclusive na cena que o seu amigo o questionou sobre a saída da equipe de natação e
ele não tinha recursos relacionais para lidar com essa afronta.

Ainda em referência aos conceitos de matriz de identidade de Fonseca (sem ano), a


fase de inversão de papéis é exercida de maneira correta por Conrad quando sua amiga que
havia ficado internada com ele no hospital psiquiátrico comete suícidio. O personagem
demonstrou empatia ao se colocar no lugar e levou em consideração o amadurecimento do
processo terapêutico que estava passando.

O conceito de Tele pode ser aplicado no aspecto social de Conrad, pois segundo
Moreno (1975) é a capacidade perceptual das situações que o indivíduo tem sobre as
situações e o que ocorre entre as pessoas. Este fator influencia diretamente a comunicação,
pois ela é feita a partir da percepção, ou seja, pode ser compreendida como empatia que
ocorre entre duas pessoas. Conrad possui uma Tele bem desenvolvida relacionada à sua mãe,
pois consegue compreender a dinâmica relacional de sua mãe para com ele. No passar do
filme sua Tele se desenvolve ainda mais, quando sua amiga acaba por falecer de maneira
trágica.

Em referências ao conceito de Clusters postulado por Bustos (1990), que diz


respeito ao conjunto de papéis com uma dinâmica relacional própria que interage com
experiências vividas pelo sujeito. Existem três clusters: materno, paterno e o fraterno, os três
grupos de papéis possuem coisas positivas e negativas. Os dois primeiros clusters são
compostos por vinculações assimétricas, nestes há uma hierarquia e um senso de dependência
de um menor para um maior, já o terceiro cluster é simétrico focado em uma dinâmica de
papéis de igualdade, por isso do nome fraterno. Durante o filme é possível perceber que
Conrad apresenta falhas em todos os clusters.

O cluster materno segundo Bustos (1990) diz respeito a experiência de cuidado


exercida pela mãe ou qualquer pessoa que desempenhe essa função, é responsável pelas
aprendizagens de sim, de receber, depender, da passividade, da ternura, relações de
intimidade, porém possui seus lados negativos sendo eles visíveis de forma clara em Conrad
como inveja e auto-estima baixa. O personagem sentia inveja da relação de seu irmão com
sua mãe, na cena do flashback que mostrou a forma como Beth era íntima e próxima de
Bucky, diferentemente da relação que ela tinha Conrad gerando nele uma falha nesse papel.

Segundo o mesmo autor, o cluster paterno é responsável pela independência e


autonomia do sujeito. Outras aprendizagens se dão nesse papel, como não, o de dar, as
capacidades, habilidades, relações de poder e também a auto afirmação, em contrapartida é
responsável pelo ciúmes. Assim como a Conrad tinha inveja da relação de Bucky com a mãe
deles, também desenvolveu ciúmes, demonstrando uma evolução insatisfatória desse cluster.
O último cluster é o fraterno é o cluster fraterno, responsável pelo aprendizado de
compartilhar, competir e rivalizar de maneira saudável tendo em vista relações simétricas.
Conrad apresenta falha nesse cluster também, pois ele não rivaliza de forma saudável com
Bucky.

O processo de luto que Conrad passou vale ser mencionado, pois perdeu seu irmão
precocemente e rapidamente. Bustos (1990) apud Fomiga coloca que a partir da forma como
o sujeito enfrenta a situação do luto é possível compreender qual o tipo de cluster principal.
Cada cluster possui uma característica específica que aparece e se é possível identificar sua
predominância como choro, negação, luta, introversão dentre outros sintomas. É importante
ressaltar que a predominância de um cluster não anula o outro, mas coloca um em evidência.

No início do filme não é possível identificar um tipo de cluster predominante, pois

Conor parece indiferente e com um movimento centrípeto de olhar para si. Durante o

processo terapêutico é possível visualizar algumas cenas específicas em que demonstra seu

enfrentamento, a cena mais marcante é a que o personagem realiza a dramatização dentro de

sessão.

A partir do caso apresentado, foi possível realizar uma análise de acordo com a

abordagem do psicodrama. Sendo possível compreender conceitos em prática, a Tele de

conrad era correta para algumas situações e sua espontaneidade também. A relação

terapêutica foi o assunto central, pois foi a partir do processo terapêutico que Conor começou

a apresentar melhoras e viver de forma mais saudável suas relações.


Referências

Cukier, Rosa. Psicodrama bipessoal: sua técnica, seu terapeuta e seu paciente. São Paulo:
Ágora, 1992.

DIAS, Victor da Silva. Psicodrama: teoria e prática. Editora Agora, 1987.


Dias, Victor da Silva, Núcleo do Eu. São Paulo, Edição dos Autores, 1977

FONSECA, José. Psicoterapia da relação: um psicodrama minimalista.

GAZZIERO, Mônica Cristina; DANIELSKI, Wladinéia Campos. Sociodrama e


conjugalidade: um estudo com um grupo de mulheres. Rev. bras. psicodrama, São Paulo ,
v. 21, n. 2, p. 133-140, 2013 .
GULASSA, Daniel C. R.; ZYLBERSTAIN, Cecília; MASSONI, Cristine G. e NONOYA,
Denise Silva. Considerações sobre o processo de orientação de monografia em
Psicodrama. Rev. bras. psicodrama [online]. 2013, vol.21, n.1, pp.81-94.

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