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Arnnx Scener
Eorronus
Joáo de Almeida
Joáo Luiz da Silva Almeida
4. Uma ciência social emPírica 70 lo "'I'extura aberta": o direito entre o formalÍsmo e o antiforma-
5. A vigência do "jogo de xadrez" 71. 1isrno."......... 130
6. O "direito" vigente 74 il A regra de reconhecimento diante da "textura aberta".......".". 133
7. Institucionalizaçâo, destinatários das normas e força""' 75 | .t. (jaracterísticas da regra de reconhecimento ............ 135
8. Os fatores da realidade psicofísica do direito"' 79 l.ì Norma fundamental e regra de reconhecimento: diferenças..... 135
L Atos "interessados" e atos "desinteressados""""" 82 l/l lìegra de reconhecimento como constituiçáo?...... 1.37
1,2.4. Duelívas (normas), proposiçÕes ( as serçõe s ) verificáveis e Levando os direitos a sério (apresentaçáo)...............
I 1.48
12.4.L Incerteza Relativa ao Elemento Probatório 95 Modelo das regras e modelo das regras e dos princípios......'... 150
1.2.4.2. Incerteza Relacionada à Atividade Interpretativa " 96 ,1 "Casos difíceis" 155
1"3. Um conhecimento integrado (ciência do Direito e sociologia ju- lr Discricionariedade judicial 1.57
Herbert L.A. Hart (O Conceito de Direito). 103 10.3. Interpretaçáo construtiva, interpretação literária e "hipó-
Introduçáo.... 103 tese estética" ............"... 177
1.. O conceito de 1.04 10.4. Atitude interpÍetativa e cortesia............... 1.79
X
xi
Fundamentos e força do direito
1.1..
Ditados de moda
Leis "por
Honraria lntroduçáo
Leis "impropriamente analogia" [-eis internacionais
ditas''
31
Arlrl;üì j;rtir
Resultado de muitos outïos escritos de Kelsen e, inclusive, de ao A cornpreensão do significado da Teoria Pura do Direito cobra a
menos outra versáo conhecida (versão de 1934), a Teoria pura do "pura";e o entendi-
lrcrt:r,'pçáo de dois pontos básicos: o significado de
Direito é uma das obras mais importantes de todo o século xx. A nrorrlo "a quê" essa "pureza" se refere.
sucessão dos capítulos segue rigorosamente a pretensáo de seu Com respeito ao primeiro ponto, diga-se que "pura", bem como
autor: o desenvolvimento de uma "teoria jurídica consciente da sua "l)rrïeza", é palavra que expressa o que os teóricos do Direito ainda náo
especificidade porque consciente da legalidade específica do seu t;onsequiram obter, mas que cabe, a ele, Kelsen, viabilizar: uma leitura
objeto".t Assim, no Capítulo I, a idéia de norma jurídica é exposta gspecífica da "juridicidade", sem interferências de outros campos do
como um esquema de interpretação objetivo dos fatos relevantes r;onhecimento que não agem na precisa delimitação do direito: a nolma
para o Direito, de modo que temas como a ordem ,,social" e a ordem lrrrídica. isso significa que os aspectos "factuais" (por exemplo, o con-
"jurídica" encontram espaço neste capítulo inaugural. Após explÍcar l,<.,udo da norma), "políticos" (finalidade econômica, religiosa, social
a importância da idéia de sanção, o Direito é apresentado como uma ()t.c.), ,,sociais" (o comportamento dos sujeitos), "psicologicos" (a inten-
prescriçáo), se náo
técnica específica de controle social, o que possibitÍta seja, já no çáo do legislador) e "éticos" (o valor envolvido na
capítulo II, enunciada a distinçáo entre direito e moral. No capítulo ;rqxiliam na descriçáo especificamente "jurídica" das normas, devem
III, I(elsen distingue "normas" e "proposições jurídicas" com a conse- ser afastados de seu campo explicativo.2
qüente delimitaçáo do papel das autoridades normativas em compa- Exatamente por isso, como segundo ponto, a qualificadora "pura"
raçáo ao que cumpre aos juristas ou aos cientistas do Direito fazer. No refere-se à "doutrina" e, não, ao "direito". Porque o "direito", bem sabe
capítulo I\d a mais influente exposição dos conceitos fundamentais I(elsen, é campo da disputa poÌítica e d"a afirmação de valores. ou seja,
do direito até os dias de hoje é exposta; isso, como que pontilhando o papel da ciência jurídica é diverso do da política. Enquanto a política
as observações metodológicas assentadas nos capítulos I, II e III. t.rata da utilidade ou inutilidade de produzirem-se certas normas, ou'
Pode-se considerar este o ponto de partida para qualquer reflexão tÌÌesmo, a bondade ou a maldade de determinadas condutas com o
contemporânea sobre as idéias de "sanção", ,,dever jurídico", ,,direi_ objetivo de protegê-}as ou náo, cumpre à ciência jurídica identificar e
to subjetivo", "capacidade jurídica", "relação jurídica" e ,,sujeito jurí_ clescrever as normas que compóem determinada ordem jurídica.
,,Identificar" paÍa se saber o que se deve descrever; "descrever" para
dico" (individual e coletivo). No capítulo V a teoria da dinâmica jurí-
dica ó desenvolvida; com ela, Kelsen ilustra o que se deve entender se poderem transmitir informaçÓes sobre o que elas, as normas, esta-
por "teoria escalonada da ordem jurídica", "norma fundamental", belecem Como comportamento devido. Poltanto, quando se descreve
"rompimento" da referôncia constitucional e "princípio da eficácia algo, deve-se caracterizar esse "aÌgo"; náo, partir-se de compreensões
que possam obscurecer o caráter informativo do que se examina. Este
global da ordem jurídica". No capítulo vI aplica a metodologia da
Teoria Pura ao Estado. No capítulo vII nosso autor ilustra as relaçóes
o objetivo da teoria pura. Diz l(elsen: 'A despoÌitizaçâo que a teoria
Pura do Direito exige se refere à ciência do Direito, náo ao seu objeto, o
entre Estado e Direito Internacional, bem como expõe a teoria da
direito. O Direito não pode ser separado da política, pois é essencial-
norma fundamental da ordem internacional. No último capítulo,
mente um instrumento da política. Tanto sua criaçáo como sua aplica-
capítulo vIII, Kelsen desenvolve uma idéia toda particular do que por juízos de
seja a "interpretação jurídica" e em que se diferenciam os advogados,
çáo sáo funções políticas, é dizer, funções determinadas
valor. Porém, a ciência do Direito pode e deve ser separada da política,
os juízes e os juristas quando se mantêm adstritos ou náo à moldura
se é que se pretende valer como ciência".3
de possibilidades semânticas das normas.
2 H. KeÌsen (1960), p. 1.
H. I(elsen (1934), preÍácio. 3 H. I(elsen (1953), P. 29.
Arlrrrtrr iirl;rr ( ilrulrrlorr rlr, 'll'nt tit rl
3. Ciência, ciência do Direito, ciência da natureza :ro). Apcrrirs acerÌtua a importância de se saber quando está em ques-
tir() rÌiìo rrrn dever em geral, mas um dever jurídico em particular.
Nesse sentido, "ciência", para Kelsen, é conhecimento que
"explica", que apresenta algum "controle" e que torna possível a ,,pre- 4. Normas em geral e normas jurídicas
diçáo"; portanto, um conhecimento conseqüente cujo mérito é o de
possibilitar afirmações em certo sentido "seguras" com respeito às Tïês aspectos auxiliam a responder essa pergunta: a) a idéia de
ocorrências futuras. :;cr o direito uma técnica social específica; b) coercitiva; e c) diversa da
O modelo que Kelsen tem em mente, como referência, é o modelo orrlem natural.
da "ciência da natureza". o cientista da natureza descreve os "fatos
naturais". os fatos naturais são regidos pelo "princípio da causalida- 4.1,. O Direito como técnica social específica
de". Dessa forma, os cientistas da natureza, através de observaçáo e
testes, formulam "leis" gerais com o objetivo de transmitir o conheci- O Direito é uma técnica de motivaçáo indireta das condutas
mento aprendido.4 A utilização desse conhecimento fornece, por con- Irrrmanas, diz Kelsen. "Indireta" porque o comportamento conforme
seguinte, previsão acerca das possibilidades de certos eventos nova- r'r obtido através do uso de sançóes punitivas socialmente organiza-
mente ocorrerem. rl:rs. Isso náo apenas implica a racionalidade do homem como ser
Pensando-se em um lápis na mão de uma pessoa, sabe-se que o (lue compreende o prejuízo da sanção; mas, também, a função da
lápis apenas fica suspenso em razáo da mão que o ergue. ,,Solto", a r;ançáo de atuar como instrumento de reflexáo entre as opçóes de se
força da gravidade atua no Ìápis, inexoravelmente; forma-se, assim, a rrgir conforme os próprios desejos e estar sujeito à sanção, ou agir
"trajetória de queda". Portanto, o homem náo criou a gravidade; ele, r;onformando-se ao prescrito pelas normas jurídicas e evitar o prejuí-
apenas, conseguiu descrever o fenômeno de sua ocorrência. como se zo que ela estatui.s
pode notar, o teste empregado foi o da experimentação por controle Nesses específicos termos, a conseqüência jurídica de qualquer
empírico. A partir dele, formulou-se a "lei geral da gravidade,', que, regra do Direito resulta de um ato do Estado. Mas isso não significa que
por sua vez, possibilitou a transmissão do conhecimento obtido. Sabe- a condição de toda norma jurídica tenha de ser um ato ilícito, um deli-
se, agora, que, dada a "força" da gravidade, os objetos ,,formam traje_ lo. É plenamente possível que seja um fato natural, como uma epide-
tória de queda" quando soltos no ar; assim, em todo lugar que se man_ rnia que resulte na decretaçáo de quarentena. De qualquer forma,
tiver mesma condiçáo, iguaÌ efeito sucederá. Tem-se, dessa forma, a ainda que seja um "ilícito", longe de ser um ato "antijurídico", é, por
possibilidade de prevê-lo. definiçáo, um "ato jurídico". Sobre o assunto, entende Kelsen, a condu-
Kelsen, com o objetivo de formular uma ,,ciência do Direito", quer ta ilícita náo é um ato "contra" o Direito, mas o "pïessuposto" que
o mesmo para o conhecimento jurídico. ouer formulações que permi- licencia o uso da sançáo.
tamtrazer segurança ao que se diz sobre o Direito, isto é, sobre as nor- Disso decorre que a "paz" produzida pelo Direito apenas pode ser
mas jurídicas. Entretanto, Kelsen se depara com um problema: a norma "relativa". "Relativa" porque, se se entende por paz a "ausência de
jurídica é uma estrutura de dever; estrutura de dever que também está força", como o Direito precisa da força para conter os impulsos agressi-
presente no campo "moral" e no campo "religioso,'. portanto, precisa vos, a paz que promove não é absoluta. O Direito combate a força arbi-
circunscrever o "dever jurídico". Evidentemente que isso não significa trâtia substituindo-a pela força regulada por normas e parafraseada em
seja impossível haver um dever jurídico "moral" (ou consentâneo com pressupostos, requisitos e ritos de aplicaçáo.6
a moral), ou com o dever religioso (ou consentâneo com o dever religio-
34 35
Arlrrirrr liryillri ( il;'llitrlrl; tlr''lì'ttt t;t t I
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Arltitrtr Stlirrlrr (.ll;irritrror tlr'lÌrttt iit tltt I )ltltltt
Loríì clrÌ outro país de cultura distinta. Além disso, náo há pL.rpetuida- rlrrirl, jtrst.agtertte por Ser uma ngrma, posSui o Sentido que o autor pre-
de de normas porque as valorações humanas mudam no tempo. Hoje, t,crrrlc: clar-lhe; para se saber se esse ato (esse sentido) é um aconteci-
tem-se uma determinada conduta como merecedora de proteção; ama- rrrr:rrLo jurídico (váIido), deve-se verificar se o sentido subjetivo mani-
nhã, esta mesma conduta é tida como irrelevante. É nesse sentido que ÍOsf.ado pelo agente concorda com o sentido objetivo da norma, isto é,
a técnica das revogações normativas desempenha papel crucial para o rc esta lhe fornece fundamento.
Direito: ela possibilita a contínua alteração das normas à mercê das seguindo esse ponto de vista, o vocábulo "validade" expressa a
mobilizaçoes valorativas e discussões políticas que as envolvem. ( joÌnpreensáo de que a norma existe e que, por existir, é
juridicamente
Em síntese, há três ingredientes a partir dos quais Kelsen constrói gbrigatória.16 Mas obrigatória em um duplo sentido: de que é obrigató-
sua idóia de "direito": o primeiro ó formal; o segundo é material; e o ter- r ia para os sujeitos normativos e de que é obrigatória
para os órgãos
ceiro é funcional. o "ingrediente formal" consiste na percepção de que lurisdicionais, os quais devem aplicá-Ia coativamente, toda vez que
as normas sáo estruturas de "dever" e que, portanto, o direito é com- t.iver sido descumprida. Portanto, conforme a teoria kelseniana, dizer
posto por "normas", por "prescrições,' para as condutas humanas, (lue uma norma é válida é o mesmo que dizer que existe no conjunto
enfim. o "ingrediente material" respalda-se no entendimento de o con- rrormativo e que, por existir, deve ser obedecida e aplicada juridica-
teúdo das normas jurídicas serem "sanções negativas',, isto é, são, rnente. A questáo, assim, passa a ser qual o critério objetivo de aferi-
sempre, previsões de coação. o terceiro ingrediente, "ingred.iente fun- ção da validade das normas. segundo l(elsen, há dois tipos de deriva-
cional", apóia-se na compreensão de o direito ser uma "específica téc- cáo possíveis: (L) ou bem a derivaçáo é "estática", ou bem (2) a deriva-
nica social". Nesse particular, o papel da ciência jurídica é descrever ção normativa é "dinâmica".17
este objeto, as estruturas de d.ever com essa tríplice composiçâo enun- Em um "sistema normativo estático", a derivação normativa pode
ciada. Entretanto, é imprescindível que isso seja feito de acordo com o ser traduzida como uma seqüência de deduçóes lógicas; por essas deri-
"princípio de imputação", ou seja, a específica percepçáo de serem vações, dá-se a leitura de pertencimento ao conjunto normativo em
esses vínculos de "fato" e "conseqüência" estabelecidos pela vontad.e razão de seu conteúdo. Sua característica é o de as normas já estarem
humana, não decorrência da natureza. "implicitamente" estabelecidas pela norma de origem, pois dela foram
Já se sabe, assim, em que consiste o ,,objeto" da teoria ,,pura" e obtidas mediante uma "operação intelectual de inferências". Para
como este se encontra circunscrito. Mas, L) o que torna o resultado de Kelsen, os sistemas normativos morais sáo exemplos típicos de siste-
um ato humano umâ norma jurídica? 2) por que considerá-lo? Na mas estáticos, porque, a partir de normas consideradas auto-eviden-
seqüência, o ponto 1) será analisado no item (b); e o ponto 2), nos itens tes, é possível se obter outras tantas normas que delas sáo ilaçóes.
(6), (7), (8) e (e). Normas tais como "náo deves mentir", "não deves enganar", "deves
ser fiel à tua promessa" sáo deduzíveis de uma norma geral que pres-
5. Relações de fundamentaçáo. Dinâmica e estática creve a honestidade. Da norma "amarás o teu semelhante", podem-se
deduzir normas tais como "náo deves ferir teu semelhante", "deves
"Fundamentar" o Direito significa responder à interrogação do atudá-lo quando ele estiver necessitado", e assim por diante'18
porquê devem ser acatadas as normas de um ordenamento jurídico Por outro lado, em um "sistema normativo dinâmico", a relaçáo
positivo. Essa relaçáo de fundamentaçáo é necessária para atribuir ao normativa pode ser traduzida por sucessivas autorizações, isto é, as
sentido subjetivo dos atos de vontade (a avaliaçáo individual de seu normas sáo organizadas a partir de outras normas que conferem o
significado) um sentido objetivo, um sentido que auxilie na distinção poder de produção normativa a alguém, pois instituem "autoridades
entïe um acontecimento exterior "relevante" de um acontecimento prod.utoras de normas". com efeito, uma norma será váIida se e somen-
"irreÌevante".para o Direito.ls por outras palavras, uma norma indivi-
16 H. Kelsen (1960), P. 11.
1,7 H. Kelsen (1960), PP. 277-227.
15 H. Kelsen (1960), p. 4 18 H. Kelsen (1945), P. 164.
40 41
Arltirrrr lirtrrrlrj ( ;litrrl{rrr tlo'llrot lrr rI
te se for produzida pela autoridade competente para tanto, atendidos :;c crrl.ender a que regula a criação da inferior-fundada; e, por sua vez,
os procedimentos estabelecidos para o desempenho dessa atividade. E
l)()Ì rìorÌna "inferior-fundada" aquela que foi regulada em sua criaçáo
é exatamente em razáo do uso dessas normas de competência que
l)or uma norma superior-fundante.2O Esse processo peÌo qual se obtém
estes sÍstemas se modificam.
lÌ()rrnas cada vez mais específicas Kelsen chama de "concrelizaçáo" e,
A partir dessas teses, Kelsen conclui que os ordenamentos jurídi- irÍj vezes, de "determinação".
cos possuem composiçáo "dinâmica", porque as derivações normati-
Segundo Kelsen, é exatamente essa sucessiva relaçáo de funda-
vas sáo obtidas mediante sucessivas autorizaçóes iniciadas por uma
rrrentação que diferencia o ato de um salteador de estradas de um ato
norma autorizadora. como é possível ao poder instituído de um orde-
namento nomear outras autoridades, neste caso terá ocorrid.o o fenô- lrrrídico. Conforme exemplo que fornece, o ato de um funcionário da
Írrzenda e o ato de um salteador de estradas têm o mesmo significado
meno da "delegação". com isso, insere a idéia de o Direito náo apenas
"subjetivo" (significado perceptível a todo observador da ocorrência),
ser um conjunto normativo de "índole dinâmica", mas também dotado
pois ambos ordenam que seja entreEue o dinheiro. Todavia, se a ordem
de "cadeias de autorização".
<lo funcionário da fazenda se faz de acordo com uma norma válida (de
Portanto, na leitura de Kelsen, os sistemas jurídicos (todos eles)
são "dinâmicos", porque as normas têm origem em uma complexa rrrodo que não passa, assim, de um ato de concretizaçáo), entáo a ordem
organizaçáo de produção normativa por "competência" e "delegações rlo funcionário apresenta tambóm um significado "objetivo", porquanto
de competência". Já os sistemas estáticos - típicos dos conjuntos ti um ato dotado de significado jurídico atribuído pela norma. A norma
morais - são constituídos mediante operações intelectuais de dedução. :;uperior conferiu-lhe um sentido especial, em que pese o fato ser o
com isso, pode-se notar que, enquanto o campo moral é formado ape- ÌÌìesmo, do ponto de vista empírico. EIa atuou como um "padráo de ava-
nas por "normas de conduta", o campo normativo-jurídico precisa de liaçáo" objetivo diante da subjetividade das opiniõe5.2l
algo mais que as noÍmas de conduta, ele necessita de normas atributi- Com esse apoio argumentativo, I(elsen infere náo apenas que o
vas de "poderes jurídicos", isto é, normas de competência para que Direito regula sua própria criação, mas também que toda criação de
outras noïmas jurídicas sejam produzidas. Direito é, ao mesmo tempo, aplicaçáo do Direito^ Portanto, produzir e
aplicar náo são movimentos separados como "o legislador produz leis"
6. ConstÍtuição, concretizaçáo e o ato do salteador c o "judiciário as aplica". Porque, quando o legislador produz leis, ele
está aplicando a Constituiçáo e, por seu turno, quando o Judiciário
de estradas
aplica leis também está criando outras normas, estas, individuais, as
sentenças (com exceção, evidentemente, das decisÓes que em alguns
T\rdo considerado, sob o enfoque jurídico-positivo, é a constituição
que fixa os critérios a partir dos quais uma norma deve ser considera- sistemas possuem caráter geral). Todavia, deve-se notar ser a consti-
da jurídica. uma vez que de um ser (mundo dos fatos, mundo regido tuiçáo apenas resultado de criação (já que náo há norma jurídico-posi-
pela causalidade e cuja manifestação se observa pelas leis físicas) não tiva que lhe anteceda) e a execuçáo de uma decisáo judicial ser apenas
deriva um dever (mundo das normas, mundo regido pelo princípio da aplicaçáo (pois da execução nenhuma outra norma é produzida).
imputação e que se manifesta nos comandos jurídicos), apenas de uma Observe-se, contudo, que a teoria da produçáo escalonada das nor-
noïma pode advir a validade de outra norma.19 ou seja, a existência de rnas jurídicas não aparece desde logo na obra de Kelsen. De fato, em
um dever somente pode apoiar-se em outro dever superior ordenado e Problemas Fundamentais do Direito Publìco,livro que, como foi pontua-
normativamente fundado. conseqüência disso é o ordenamento juddi- dr:, inicia propriamente o projeto da teoria pura, náo há referência a tal
co se apresentar como uma estrutura de normas superiores-fundantes escalonamento. No quadro teórico de L91L havia, apenas, uma "teoria
e inferiores-fundadas. sendo que por norma "superior-fundante" deve- plana" do Direito. Kelsen identificava o direito à lei sem maior tratamen-
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Árlri;rrr Sr;rrrlrr
( llit:litt'rtti tlrt'llrot tit rlr
to; a totalidade do direito era pensada, tão-somente, como um conjunto Nilo obstante, a pirâmide merkliana ó invertida, comparada à de
de normas legislativas. l(clson, pois, em sua base, encontra-se a Constituição; e, no alto, os
O salto para a teoria "escalonada" é devido a um aluno de I(elsen, ;rl.os clecisórios, provimentos e negócios jurídicos: "Se do plano das
Adolf Julius Merkl; aluno sempre elogiado por seu professor que se tor- rÌornÌas olhamos do alto para baixo, a vista se abre sobre aquela que é
nou, depois, grande administrativista. Ell:razão dessa contribuiçáo, re- ;r base comum a tudo isto que é jurídico, a Constituiçáo. Todavia, para
conhecida no prefácio da segunda ediçáo de "Problemas Fundamen- <:irna da escala do edifício advém um número variado de planos. En-
tais...", ano de 1923, Kelsen abandona sua teoria plana, podendo já ser (;ontramo-nos no setor dos regulamentos, o qual, na seqüência - se-
encontrada tal alteração no livro Teoria Geral do Estado, de 1925, e na tlLrndo a hierarquia de autoridade - se apresenta um articulado de
primeira versão da Teoria Pura do Direito, ano de 1,934.22 Distingue, rrrais graus; e o edifício culmina em um grande número de decisões,
assim, as normas em superiores e inferiores, formando uma "hierarquÍa ltrovimentos, sentenças ou como se possam chamar esses fenômenos
de diferentes tipos de normas".23 Essa a afirmaçáo presente no referi- jurídicos individuais".2T
do prefácio: "O mérito de ter concebido e exposto o ordenamento jurí- Com isso, segundo Merkl, quem observa o ordenamento jurídico
dico como um sistema genético de normas de direito que segue concïe- se vê em franca confrontaçáo com uma multiplicidade de normas as
tizando-se gradualmente desde a Constituição, passando pela lei e o quais, analisadas em seu conjunto, apresentam tanto relaçóes tempo-
decreto e demais fases intermediárias, até os atos jurídicos de execu- rais de precedência e posteridade, como, também, de posicionamento
çáo, deve-se a Adolf Merkl".2a cliferenciado em instâncias superiores e inferiores. E é exatamente essa
Como acenâdo, Adolf Merkl foi aluno de Kelsen. Como aluno, escre- estrutura escalonada que possibilita perquirir sobre o seu fim, ou seja,
veu, no ano de L917, um texto intitulado O Direito do Ponto de Vista de até onde se pode retloceder na ascendência dos escalões. Desse modo,
sua Aplicaçáo e, outro, nomeado ADupla Face do Direito, no ano de 1918. embora a "teoria da construçáo escalonada da ordem jurídica" seja dis-
O campo apreciado em ambos os textos é a análise da dinâmica jurídica, linta da "teoria da norma fundamental", como se verá, ambas estáo
constituindo, como análise, um tateio da concepção escalonada, embora claramente associadas; associadas em virtude da "relaçáo de valida-
mencione claramente no primeiro texto a expressáo "pirâmide" e "vérti- de" presente entre as normas de uma mesma ordem jurídica. Essa a
ce da pirâmide" para descrever o encadeamento normativo.2s Porque afirmação de l(elsen: "Se o Direito é concebido como uma ordem noÍ-
apenas no ano de L93L, com o escrito Prolegômenos de uma Teoria mativa, como um sistema de normas que regulam a conduta dos
Escalonada do DÍreito, é que Merkl assenta com detalhes a sua especu- homens, surge a questáo: O que é que fundamenta a unidade de uma
lação, podendo-se encontrar, no artigo, afirmações como a seguinte: pluralidade de normas, por que é que uma norma determinada perten-
"Entre as normas jurídicas concatenadas náo existe apenas uma priori- ce a uma determinada ordem? E esta questáo está intimamente rela-
dade ou posteridade temporaÌ, mas, em particular, também lógica. cionada com esta outra: Por que é que uma norma vale, o que é que
Enquanto uma norma não pode ser concebida sem uma outra que a pre- constitui o seu fundamento de validade?".28
ceda e deva, pois, a esta, sua validade, esta última pode ser considera-
da superior e aquela que dessa depende inferior (...). Dessa forma, vem 7. Norma fundamental e Pirâmide
definida como superior àquela norma jurídica sem a qual o resultado de
determinados atos náo poderiam ser reconhecidos como normas jurídi- Observada essa descrição de fundamentação e, caso se pergunte
cas existentes e, natuÍaÌmente, este grau de superioridade encontra-se por que razáo nós nos encontramos obrigados a obedecer a uma sen-
calcado por esta mesma relação".26 tença judicial, Kelsen responde remetendo-nos ao código que autoriza
ao juiz a decidir o caso. Se perguntarmos depois "por que o código é
22 H. Ketset (1951), p.99. váIido?" (leis editadas pelo legislador, os contïatos formulados pela
23 H. Kelsen (1998a), p. 181.
24 H. Kelsen (1,997), p.28.
25 A. Merkl (191.7a), p. 102; Id. (1917b), p. 304. 27 A" Merkl (1918), p. 102
26 A. Merkl (1931), pp. 37-38. 28 H. Ketsen (1960), p. 215
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Arlrr,rrr li,l,llri
I (Il.t:,r,I,r:, rI,, lì,rrt lll Iìrr''tIl
autonomia pdvada, ou, noutra apreciaçáo, as reis decorrentes (.iorrl.trclo, a "teoria da norma funclamental" não e uma construção
do criror
to costumeiro), a resposta de Kersen ó: ',o legislador está autorizaclo t()t.iìlÌìÌoÌìte orrginal de l(elsen. De fato, a "teoria da norma fundamen-
pela constituição a editar ieis", "os particulare l.;r1", clada a sua dependência com a teoria escalonada, apenas apare-
s, afazer contratos,,, ou,
ainda, que "a constituição reconhece o costume como (iorr com contornos mais bern definidos em 1920, no livro O Ptoblema da
norma de obriga_
tório cumprimento".2g A vista disso, em ambos os casos, ocorre que Soberania e a Teoria do Direito Internacional. NeIe, pode-se encontrar a
se
está a obedecer à constituição, pois é sob o fundamento seguinte frase: "(...) finalmente se atribui a urrla nolma geral suprema
da constitui_
ção que as leis sáo "postas", isto é, criadas por arguém ,,autorizado,,. cÌe origem logica, estabelecida como hipótese a partir da autoridade
Mas, como a constituição também pertence ao mundo normativo, constituinte" da qual "a Constituição recolhe sua validade jurídica".
tem-se inelutavelmente a questáo da validade da constituição. "somente o clogmatismo acrítico pode pensar que seja possível um sis-
sendo
assim, pode-se perguntar quaÌ é o seu fundamento, tema de direito positivo privado de pressupostos"'31
ou por qual razão a
ela devemos obediência. porque, se uma norma somente o próprio Kelsen reconhece - também no prefácio de Problemas
obtém ta] súa_
üus a partir de uma outra norma, é preciso admitir que Fúndamentais do Direito Publico, segunda ediçáo, ano de L923 -, que
deva haver uma
outra norma que fundamente a constituição. A constituição, quando o livro foi inicialmente publicado não havia desenvolvido o te-
nesse
passo, pode ter sido introduzid,a mediante uma ma da noÍma fundamental: "uma importante modificaçáo realizada no
rei com base na cons-
tituÍção anterior, peÌo que a validade da constituição depende sistema da Teoria Pura do Direito com respeito a sua primeira versáo,
da
constituição anterior, da quar provém. chegando-sã à constituiçáo taì como aparece na presente obra, consiste em que o conhecimento
anterior, todavia, é possível seguir o mesmo processo estático do direito que, em princípio, se sustentou como método exclu-
até a pergunta
sobre a razão de a ohrservarmos. sivo, se vê compÌetado por uma consideraçáo de tipo dinâmico"' 'A
Dessa forma, a validade pode ser rastreada até alcançar_se idéia da norma fundamental como constituiçáo no sentido lógico-jurídi-
a
constituição histórica primeira, a primeira constituição daquera co foi desenvolvid.a principaÌmente por Aifred \lerdross (...) que reco-
ordem
jurídica, normarmente marcada por um ato de nheceu a norma fundamental como uma hipótese relacionada ao mate-
independência de um
Estado frente a outro Estado.30 Mas, neste finat do caminho, poder-se-ia, rial do direito positivo analogamente à hipótese da ciência naturaì.
outra vez, questionar qual o fundamento de vatidade desta uma importante contribuiçáo à questáo da determinaçáo da norma fun-
constitui_
ção histórica primeira, porque, na farta de alguma fundamentaçáo nor- damentaÌ como pressuposto do conhecimento jurídico foi desenvolvida
mativa, todas as demais normas perderiam seus respectivos
suportes por Leônidas Pitamic. (...) Com base nos trabalhos de Merkl e de
de validade. Essa busca sem fim constitui o que se pode Verdross, tenho tratado nos meus sucessivos escritos a teoria dos graus
aqui designar
de "problema da fundamentaçáo normativa". portanto, o prontema como um elernento essencial no sistema da teoria pura do direito".32
da
fundamentação normativa expressa a necessidade de se De todo modo, importa assinalar que mesmo nào tenha sido
encontrar, em
termos últimos, o fundarnento normativo das normas. Kelsen a expor o tema da norma fundamental em termos iniciais, tendo
É exatamente para fornecer ïesposta a esse regresso provocado deta feito usO em seus trabalhos, imprimiu-lhe elaboração pessoal. De
pelo imperativo de se indicar, sempre, a "norma varidàrnente fato, Kelsen, atento aos escritos de Emrnanuel Kant, encontrou na teo-
superior,,
que l(elsen elabora a "teoria da norma fundamentai". ria da noÍma fundamental expressiva relaçáo parental Porque Kant,
segundo Kelsen,
a norma fundamental equivale à postura, necessária, rejeitando explicaçÓes que pudessem apresentar embustes, enfatizou
de se considerar
válida, e, portanto, como ponto de referência juríciico-positivo que enxergamos o mundo através de nossos sentidos, com os nossos
iniciar a
constituição histórica primeira não mais em disputa, pois "óculos" e que nosso alcance náo é a dos "objetos como eles sáo"' Ou
esta é uma
pressuposiçáo imprescindível para poderem-se identificar seja, Kelsen se submete à influência de Kant no específico da com-
as normas
da ordem jurídica. preensão deste de haver, em qualquer ramo do conhecimento, alguma
pressuposiçáo. segundo Kant, o trabalho de se encontrar os elementos (Lcórico-gnoseológica) da Teoria Pura do Direito é: sob a condiçáo
universais do conhecimento não se dá sem alguma pressuposiçâo, <le pressupormos a norma fundamental, devemos conduzir-nos
através da qual todo o resto obtém sentido.33 como a constituição prescreve, quer dizer, de harmonia com o sen-
com efeito, assim destaca Kelsen, já na primeira versão do livro tido subjetivo do ato de vontade constituinte, de harmonia com as
TeorÍa Pura do DireÍto, ano de tg34: 'A Teoria pura do Direito é teoria
do prescriçóes do autor da Constituiçáo" [H. Kelsen' 'IP2' p' 2251'
direito positivo, portanto, da realidade jurídica; ela transpõe o princípio
da lógica transcendental de Kant vendo no dever, no sol/en, uma cate-
tJ. Com os "óculos" de Kant
goria lógica das ciências sociais normativas em geral e da ciência do
Direito em particular" .s4
Basicamente Kelsen sustenta, em um primeiro momento, que a
Na edição francesa de 1953 - versão considerada de transição em
r.coria da norma fundamental desempenha papel similar ao exercido
relaçáo às de 1934 e L960 -, apenas insiste Kelsen no caráter essencial_ pontos
llclas categorias do entendimento de Kant. Nesse sentido' dois
mente formal e dinâmico da norma fundamental do ordenamento païa que consiste a "teoria do conhecimento" de
rlevem ser referido5: em
distingui-la da que corresponde ao ordenamento mora], afirmada como l(ant que l(elsen afirma aplicar "por analogia"; e o que significa "con-
de índole estática: 'A Teoria pura do Direito atrihrui à norma fundamen_
r I içáo lógico-transcend,ental" dessa inteïpretaçáo kantiana'
tal o papel de uma hipótese básica. partindo do suposto d.e que esta Com respeito ao primeiro ponto, "teoria do conhecimento", ao se
norma é válida, também resulta válido o ordenamento jurídico que lhe
Ì)erguntar qual o valor dos nossos conhecimentos e o que se deve
está subordinado".3s cltender por conhecer, Kant se via perplexo diante do marco explicati-
Na segunda ediçáo, ano de 1g60, encontra-se a formuraçáo mais vo. Kant se pergunta o que pode ser conhecido legitimamente e que
bem cuidada da norma fundamentar, ainda que afirme Kersen não t.ipo de conhecimento náo tem fundamento plausível'
dever ser ela considerada "uma exposiçáo em termos definitivos". o objetivo de Kant consistia em supelar as duas possibilidades em
voga à época: o racionalismo, por um lado; e, por outro, o empirismo'
Na medida em que só através da pressuposição da norma fun_ superar o "racionalismo" porque náo considerava adequado o entendi-
damental se torna possíver interpretar o sentido subjetivo do fato lÌÌento segundo o qual "tudo quanto pensamos vem de nós mesmos",
constituinte e dos fatos postos de acordo com a constituição como pois há pontos externos a nós; superar o "empirismo" porque náo con-
seu sentido objetivo, quer dizer, como normas objetivamente váli- siderava Corleto o entendimento de que "tudo o que conhecemos vem
das, pode a norma fundamentar, na sua descrição pela ciência jurí- dos sentidos", como se nada houvesse em nós que participasse do ato
dica - e se é lícito aplicar per anarogiam um conceito da teoria do de conhecer participando da construçáo do objeto. A partir desse ponto,
conhecimento de Kant -, ser designada como a condição rógico- explica ser o conhecimento integrado de matéria e forma' A "matéria"
transcendental desta interpretação. Assim como Kant pergunta: do conhecimento sáo as coisas; a "forma" do conhecimento somos nós.
como é possível uma interpretaçáo, arheia a toda metafísica, d.os o que Kant está a dizer é que se para "conhecer" precisamos da
fatos dados aos nossos sentidos nas Ìeis naturais formuradas pela ,,matéria", ou seja, "das coisas", essa experiência não será nada se
ciência da natureza, a Teoria pura do Direito pergunta: como é pos- náo for organizada por "nossa sensibilidade", isto é, pela "nossa
sível uma interpretação, não reconduzíver a autoridades metajurí- forma". Porque para conhecer precisamos partir do referencial do
dicas, como Deus ou a natureza, do sentido subjetivo de certos ,,tempo" e do ,,espaço", e ambos não existem na realidade externa.
fatos como um sistema de normas jurídicas objetivamente válidas por isso chamá-Ios de "a priori"" o termo "aptiori" signifÍca náo pas-
e descritíveis em proposições jurídicas? A resposta epistemológica sível de falsificação pela experiência. I(ant o empÍega em oposiçáo ao
termo "a posteriori", termo com o qual expressa o conhecimento
JJ E. Kant, CÍítica da razão pura, B XVi; H. Ketscn (1960), p. 22S. adquirido com base na experiência. Defende, portanto, não haver
34 H. Kelsen (1934), p. 60. conhecimento possível sem o uso de certos conceitos básicos " a prio'
2t H. Kelsen (1953), pp. 1,L6-1.77. ri" (aos quais chama de "categorias").
Arlrirrrr 51;irrllr
( :liulr(i(ll tlrt'llttttttr (l() I )llrrllo
50
Arltt;ttt iiryrrrlrr ( jliulrtlol; rll'lïrot ttt rlo I )tti!rl.(r
Ìo sugerido por l(ersen, pode-se perguntar que tipo de juízo kirrrr.iirrr, "leitores" nessa pressuposiçáo quan-
l,lr;r;c o l)orìt.o: o que aproxima os
caracteriza a relaçáo normativo-jurídica em suas reÌaçoes de cÌeriverÇa,. rlo rcirlizarrÌ o ato de conhecimento das normas jurídicas?
(a) "categórico":6 o juizo cujo predÍcado encontra,se sutrorciinado
portanto, !). Eficácia gÌobal da ordem jurídica e revoluçáo
ao sujeito. enfatiza a reração de acordo ou desacordo
entre a representaÇáo-sujeito e a repïesentação-predicado. sua
l-bi dito haver um momento em que se deveria pïessupor a valida-
forma reside nos terfiìos "é" e "não ó". por exempìo: "Janaína
gosta de rer Darío Fo."; "o professor l(ersen é Austríaco". rlc (la norma fundamental que estivesse atrÍbuindo validade à consti-
(b) "Hipotéticos": são os juízos cuja afirmaçáo está suhrordinada a r1iÇáo histórica primeira náo mais em disputa. Mas a partir de quando
rrrrral Constituiçáo pode ser considerada náo mais disputada em sua
uma afirmação. por exernplo: ,,Se Ílzer sol irei à praia,,;
(c) "Disjuntivos": são os juízos que expressam alguma arternativa, ,rÍirrnaçáo de fundamento da ordem jurídica? A isso Kelsen responde:
rlrrirnd.o a ordem jurídica for "globatmente eftcaz". Mas como se pode
ou seja, que se expressa mediante o empïeEo do conectivo
"ou". por exemplo: ,Tosó é professor, ou arguiteto, ou medico,,. irl,t:star essa eficácia global?
Segundo l(elsen, dois sáo os critérios: L) a comprovaçáo de que as
Considerando essas possibilidades, fica claro que o juízo que rìormas estão servindo de parâmetro de obediêncía; e 2), no caso de náo
()starem sendo obedecidas, se é possível se observar que os funcioná-
retrata a relação jurídica de derivaçáo normativa é o juÍzo hipotótico:
se ilos as estáo aplicando. No primeiro teste, a questáo é respondida quan-
JV é válida, Nt, Nz, ffs , ffff sáo válidas, nos
mesmos termos.
Importa acrescentar que expressiva arteração a essas formulações <lo se informa se a norma Nestá servindo de referôncia para as condu-
da parte t.;rs. O segundo teste - importantíssimo para Kelsen - encontla satisfa-
de Kelsen será consignada no livro ,,Teoria Geral das
Norrnas". Nele, I(ersen, depois de ter reduzido consideravelmente (:áo se se responde que os funcionários estáo punindo aqueles que náo
foco sobre a norma fundamentar, rhe presta curta atenção.
o obedeceram à norma JV. Se a resposta for positiva, o ordenamento jurí-
E sob a epí- rÌico é eficaz nesse particular.3g Basta, assim, ampliar tais considera-
grafe "Problemas Lógicos do Fundamento de validade", afirma
tratar_
se de uma "ficção", e náo mais de um "pressuposto rógico-transcen- cões para as outras normas. AIiás, o mesmo raciocínio ocupa o centro da
dental".38 De todo modo, ai'da que como ficçáo, f'ncionairnente r:xplicaçáo sobre as repercussões de um golpe ou de uma revoluçáo.
seu
papeÌ está mantido: o de permitir rearizar a reitura das
norrnas que
resultam dos atos de agentes competentes. Poder Constituinte
Ato de Vontade
cadas em sua seqúência de validações, ó plausível perguntar que
o
impede de se assumir uma norma que valide o comando de um
bando Ato de Vontade
de salteadores de estradas considerando que a noïma fundamentar
ó
uma suposição, em princípio, eleita pelo observador da ordem jurídica. I,
N
52
A.lllrrll fi{,nllrl ( ilitttttltrrtti rl,r'lìrrtt ttt tlt
54
Arlrlnrr ti1;rrrlri
( ;l,rlrlr:(,li tltt'litot tit tlrl I )itotlrr
tica caracteriza-
deduçÕes ou inrerências
de conreúd" p";'"::ttXffÏ1ïij,"r ou seja, t,urit clas possibilidades normativas da ordem jurídica em relaçáo aos
exercício oe competências e rrováveis eventos, dela, decorrentes.
o"
".J;,ãiïi:i:[ïff:":ffïffJï:
1
Introduçáo
AIf Ross é o principal expoente do realismo jurídico escandinavo,
tradiçáo que concebe o Direito como um conjunto de fatos ou fenôme-
nos psicofísicos e cuja origem encontra, em Novecentos, 0 nome de
Hágerstrôm e, depois, os de Lundstedt e olivecrona. como caracterís-
tica básica de seus esforços, Ross manteve a pretensão de forrnular
uma "ciência jurídica" de base empírica.
o livro sobre o Direito e a Justiça, ano 1953, muito conhecido ern sua
versáo ingÌesa de 1,958, é considerado, junto com os livros Teorja Pura da
Direito d.e l(elsen (cf. cap. 2) e O Conceito de Direito de Hart (cf. cap. 4),
urna das obras mais importantes de Teoria do Direito do século XX.
Marcada por expressiva preocupação epistemológica sobre Os fundamen-
tos do conhecimento, possilcilidade do discurso moral e limites do positi-
vismo jurídico, com "Sobre o Direito e a Justiça" nosso autor pretende rea-
Iizar a eliminaçáo da vaiidade jurídica como categoria independente,
reduzindo-a a uma dimensáo da realidade. Assim, empreende esforços no
sentido de continuar orientaçáo já presente em livro que editou em L946,
Para uma Ciência Realista do Direito. Conforme escreve logo no prefácio
do trabalho que será aqui analisado, 'A principal ideia [é] levar no caÏnpo
do direito os princípios do empirismo às suas conclusÓes últimas".