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BIBLIOTECA DE CIENCIAS SOCIAIS FERNANDO HENRIQUE CARDOSO ENZO FALETTO DEPENDENCTA E DESENVOLVIMENTO NA AMERICA LATINA Ensaio de Interpretaco Sociologia Senna epi EDITORA, AF ovenasece Casirozo I INTRODUGAO Ao mamavax a Segunda Guerra Mundial, parecia que al paises da. América Latina estavam em’ condigées de. com. Bletar o proceso de formasio de seu setor indusal © de iniciar, ademais, transformagies econtmicas capazes de al- cangar um desenvolvimento auto-sustentado. Com efeito, de- is de reorganizar a produgio ¢ os mercades, alterados como Sonsaiencia da cise de 102, certes eoonomies Tatnosame. ricanas, que haviam acumulado divisas em quantidades apre- cliveis © que se haviam berieficiado da defesa: automética do mercado intemo provocada pela guerra, pareciam achar-se em condigdes de completar-o ciclo denominado de “substituicao de importagées” ¢ iniciar, sobre uma base firme, a etapa de produgdo de bens de capital, destinada a produzir a diferen- Giagio. dos sistemas produtivos. Nesses paises 0 mercado jntemo parecia bastante amplo para estimular o sistema eco- némico € se contava, além disso, que a transferéneia da mio- de-obra dos setores de baixa produtividade ~ principalmente do campo — para os setores de alte produtividade seria um fator de ampliacdo do mercado. Mais tarde, por volta, de 1955, considerou-se necessério um novo elemento para garan- tir 0 desenvolvimento: a redistribuicio da renda. Esses fa- tores, atuando em conjunto, pareciam suficientes para asse gurar 0 automatismo do crescimento, provocado, a partir de. fim certo momento, pelos simples estimlos do mereado. Esta possibilidade, solidamente apoiada pela conjuntura ecoutmica, foi expressa teoricamente nos trabalhos mais sig- nificativgs sobre 0 desenvolvimento econdmico eserites na Amé- rica Latina, Passava-se assim, tanto na pritica como na teo- ria, de uma fase em que a industrializagao era concebida como tum recurso complementar para um processo de desenvolvi- mento ~ beseado na exportagio de produtos primfrios — e, além disso, como uma espécie de alternativa forgada para os 32 Dimmmiverk'® Desmvorvneenro XA Ansimica Laren itico de suas posigdes, voltando conceptualmente 4 “economia politica”. © pressuposto geral implicito nessa concepedo era que as bases histéricas da situacéo latino-americana apontavam para um tipo de desenvolvimento eminentemente nacional. ‘Tratavase, entio, de fortalecer o mercado interno e de orga nizar os centros nacionais de decisio de tal modo que se tornassem sensiveis aos problemas do. desenvolvimento de seus préprios pafses. Essa_perspectiva otimista vem-se desvanecendo desde fins da década de 1950. Era dificil explicar por que — com tantas condigdes aparentemente favordveis para passar da eta- pa de substituigzo de importagées para outra em que se abri- Tam novos campos de produgio suténoma, orientadas para 0 mercado inteo — nfo se tomaram as| medidas necesirias Para gerantir 2 continuidade do desenvolvimento ou por que as ins tomadas nio aleancaram seus objetivos, Mais ‘em alguns casos 2 taxa de crescimento econdmico, stricto sensu, no foi suficiente para dinamizar os setores mais atra- sados’ da economia e assim tampouco foi possvel absorver @ pressio que significava 0 continuo aumento demogritico. Para tanto contribuiu o tipo de tétnologia adotado ‘nos setores mais modernos, que implicava uma baixa utilizagio de mio- de-obra, Entretanto, como todas essas dificuldades no signi- ficaram abertamente uma depressio,. tampouco chegaram 2 produzit-se as conseqiiéacias que esta poderia acarretar e que sobrigariam a uma revisio das politicas de desenvolvimento adotadas. Em outras palavras, se & verdade que as condigées eco- ndmicas dos paises mais présperos da frea — por exemplo, 4 Argentina — apontavam diretamente para o desenvolvimento até a metade da década de 1950, seria possivel manter hipétese de que faltaram as condicses institucionais socials que haveriam de permitir que as condigdes econdmicas favo- riveis se traduzissem em um movimento capaz de_garantir sma politics de desenvolvimento, ou havia na relidade um ero de perspectiva que permitia orer possivel um tipo de desenvolvimento que era irvealizivel economicamente? Em alguns paises como 0 Brasil, os acontecimentos Jeva- yam a supor, principalmente nos anos 50, que ndo eram in- fundadas as gas as possibilidades de um desenvolvi- mento 2ut fente e auténomo. De fato, 0 processo subs- titutivo de importagdes alcangou a fase de implantagio de emnovugio is bens de capit suas caracteristicas, parecia implicar fisaunplo de'und ctpe uova e de saturn evasive da indastiaizagio brasil, pois o efeto muliplicador da produgio de equipamentos costuma acarretar um a Eirmo econtmnizo. Alémn disso, este tipo de indstria, diferen- temente do que ocorre de forma quando existe apenas 2 produgio de bens de consumo, no permite faciimente a reconversao das indistrias ou sua eliminagao nos periodos de crise. Os fatos, entretanto, tampouco neste caso parecem con- firmar 0 otimisno inicial, pois 20 auge a que se chegou atra- vvés do processo de substituicao de importagdes seguiu, nos anos 60, um de estagnacéo relativa no qual continva submergida a Economia brasileira Dos trés paises que mais avancaram industrialmente, ape- nas um parece haver mantido durante maior tempo uma taxa do, crescimento elevada. £ 0 caso do México, ainda que se deva reconhecer que sua estrutura econdmica — sobretudo a diversidade de seu setor — constitui um elemento que 0 diferencia dos outros paises da América Latina. Tam- bém neste caso, apesar de tudo, a forte desigualdade na dis- ‘tribuigio da renda ea patticipagio crescente de capitais es- 1a economia podem sex consideradas como fares alteram as hipétesés apresentadas pelos economistas no oe se refere as condigdes para o desenvolvimento auto-rus tentado e autGnomo. ‘Em uma primeita aproximagdo fica, pois, a impressio de que o esquema jnterpretativo © as previsées que A luz de fatores puramente econémicos podiam formular-se ao terminar os anos de 1940 no foram suficientes para explicar 0 curso ‘posterior dos acontecimentos. Com efeito, 0 salto que parecia razodvel esperar-se no desenvolvimento da Argentina nfo se deu, nem se produziram as transformagSes qualitativas dese jadas. Ainda que as dificuldades da Economia brasileira udessem ter sido provisoriamente solucionadas'‘no impulso desénvolvimentista da década de 1950, apoiado pelo financia- mento extemno a curto praz0, reabriu-se uma fase de retrocesso ¢ talvez dé estagnagio, quando jé se anunciava a superagdo 4 Ver, neste sentido, “Auge © doclinio do de substituigso de importapses no Brasil", ein Boletin Econémico de Américe Latina, 1964, vel. IX, pags. 1-69, Entretanto, as caracteistioas da. Economia brasteira parecem indicar’ que se trat2, do ingulo econimnico, de um feadmeno ainda relacionado a uma stuacio “de desenvolvimento”. 14 Deeuxixcra # Desewotvnesnro NA Avgésuca Latina definitiva dos obstaculos 20 desenvolvimento.’ Finalmente, a Economia mexicana, depois das dificildades de um periodo de reajustes e transformagdes profundas, orientados por uma politica nacionalista, parecia realizar suas possibilidades de oxo em grande medida, gragas a sua integracio no mer- “mundial através da inversdo externa de capitais e da diversificagso de seu comércio exterior, dentro do qual tem tum papel importante 0 turismo. RS desses fatos, pode generalizar-se a sugestfo ing cita na pergunta sobre 28 causas da insuficiéncia dindenica S Economias nacionais. que apreséntavam. perspectivas tio. favo- sdveis como no caso da Argentina. Até que ponto 0 fato mesmo da Revolugéo mexicana, que rompeu 0 equilibrio das forgas sociais, nfo tera sido o fator fundamental do desenvol- yimento alcancado posterionmente? Nio terdo sido os fatores inscritos na estrutura social brasileira, 0 ego ds forgas poli- ficas e socials que atuaram na década “deseavolvimentista”, bs responsiveis tanto do xesultado fevordvel como da perda do inygalo posterior do processo brasileiro de desenvolvi- mento’ Enfretanto, assinalar 0 curso negativo seguido pelos acon- tecimentos como indicador da insuficiéncia das previsdes eco- némicas anteriores e dele deduzir a necessidade de substituir ‘as explicagdes ‘econdmicas por i ees sociolégicas, se- nia. uma resposta supel No ‘econémico tem sido. je de desenvolvimento 0a ca Latina A continuagéo de perspectivas favordveis para os produtos de 105 ¢ tem, sido precisamente as con- digdes favordveis do coméreio exterior as que an im- pulso “depois do’ boom da Coréia e foram substitufdas. por Conjunturas mitidamente desfavoriveis, que se caracterizam pela continua deterioragio-dos termos de intercimbio. Frente @ essa situagiio, colocou-se como alternativa complementar 2 redefinicgo dos termos da cooperagio interna seja atra- vés de programas diretos de financiamento exterior 20 setor piiblico, seja através de uma politica de sustentagao de pregos; tais solugdes nfo chegaram, entretanto, a concretizar-se de forma satisatéria para’ 0 desenvolvimento. ‘A esses fatos pode atribuir-se, em parte, que 0 proceso de creseimento ecpedmieo hale solid uma Timinugto. de velocidade. A taxa de auments do produto brato alcangou 5 Ver Galo Furtado, Devencoloimente ¢ Subdesenecloimento, Pio de Jancto, Edtora Fundo Ge Calusa, 1961, “Em especial 0 capita 5. smmosugio 18 limites apenas suficientes para promover em alguns paises a reorganizacéo do sistema econémico. Entretanto, néo se reor- ganizaram na diregéo esperada nem o sistema social, nem 0 Sistema politico, Isso levou a pensar que ainda quando a “sociedade tradicional” haja transformado em grande medida sua face eccnozniea, contudo, alguns de seus grupos no per- derain o controle do sistema de poder,’ apesar de terem sido obrigados a estabelecer um sistema complexo de aliangas com ag aves grupos que surgiram. ‘Assim, pois, com a diminuigio ‘do ritmo de crescimento, que se iniciou em fins dos anos 50, ‘eriam reaparecido os antigos problemas do Continente com novos protagonistas sociais ou com os mesmos de sempre, ze- vvestidos agora de aparéncia modema. ‘Ainda que os graus de diferenciagio da estrutura social dos diversos paises da regio condicionem de forma diversa © erescimento econémico, ndo & suficiente substituir 2 inter- pretagio “econdmica” do desenvolvimento por uma canilise ‘sociolgica’. Falta uma andlise integrada que fomega ele- mentos para dar de forma mais ampla e matizada Er quoster gerals sobre as possibldades do. desenvolvimento ‘on estagnagao dos paises latino-americanos, e que zesponda as Gecisivas sobre seu sentido e suas condigdes poli- teas e sociais. 4 Yep yor exemple o etude &4 CEPALy Et Deora Soc! dts América Latina en le Postguore, Solax/Hachette, Buenos Aires, 1963, ‘onde se austents a hipétese da flecbiidade da ‘dominagio eadicionl vin Ieremint 20 Dewoursasno x geramente “sociedad casio” ¢ gue ce cot produsinde SPamage 2 ato Spo de wcedade chamads "rodent Eee poe ee Se, SS eer Seto mn pe 2 em ae ee oatros que ‘areaicos, Invoca-se entiio a nogio. Sele reen “Cath ce Sree Socom Sees stows een sc rm es sy ee een gedaan gee She porate a Ea Se Steg ena es ta Soe oe Semone = Pouce se extubelioem, por esto lado, nas inteligives exte Seep ces, ce ne lees oe Sohn deed ae sims erm oe gore Se eee peer eS ea mee ‘Ampllndo csi considers, cberia i no é oo PMD? Sit, Gaeta ane Spor ce sends 9 dese ano, Patsy Sociedad on une Epos de PRR SPS “Popomton uelst aget gee 2 feéah des Eas come odo ‘rae Toros Zhe Seid Ste, “Th Fe Pee Ist, ‘moore de pecfena em relagio 20 centro. 235, ope ig Sg inte Comma ae oer aro, extretanto, que ao se caiv na ingenuidade de sudmitr na bistina da” Amica Latina uma on ‘peo aos paises desemvevides em teres to simples que cree oes sas deatesvelateas 20 tivel o sala em ‘au fize em que, por comparagio com 0 que ocomren nes pul 4 de “desenvelvioento crigisa, nfo era “normal” que aim Fnosdesse. Ao sieso tempo, a urbantzagio aoslerada da Amd $s Tang ‘go precede crcl 2 20 Dormntneu = Desmwenimeneo Asda, Larne Geo de daseralvnento da mda Lata" Tse fal de 0 ~ sobreado nos aspects 20- dhs ~ spotuente iar 20 doe pater certaelevew 0 pensar que attavds do rmesuo sea triads ta epice de Ponte qe tenders stra semelantes as peuts. socials es exentagdes vloratvs nas soeedader deseayavidas © mas ais adaquado, a sedimento metoeligco que acaba srdice das conttey ‘Asiise Dereon 20 Destvoevnene3 a Sa oe oe aye co cea ib ree & cae tel Poe eps ae oe er aay oe nai eolete grin sta i an me 9 ae te She te oes Se ge ee ee so eer UE demoostaglo" onde outras varéves exdgenas, sobre 0 fame geerh cates Seca SEE itieaisies histbace eeuvturais que gira Sie cepa Neocon ou = oor 9, Eemenma # Processo: Dersmancagbis Recimmocas ara 4 anélize global do desenvolvimento nio 6 sufciente, centretaato, agregar 40 eochecimento Gos condicinaates est- fare a compreensio Got “fstores socials, entendidas estes ‘memo load © 90 place eter; per outa compeender, wat Sage Leas Macs age & Sache sath © ie oes St Seis simeats Teele prin ee iowa ams Soa soa He te Se, Dominate Sees RoR ete ate Tee ™ Se gr snp iar om pret ge eee ee ropes todas to oh jutpbbs. Tao ampSe que © agile Seepace a’ cheng qos 0 pose. chumar' cnoqoe ‘estrotural, relate 2 uma Interpretagio feta em te i { | 22 Devmspihicaa » Desevoumnamro Na Ancimca Lames mos de “processo histérico”, Tal inte 0 néo signifi aceitar 0 ponto de vista ingéauo dose tyson da seqiéncia temporal para a explicacdo cientifica — origem e desenvolvimento de cade situacéo social — mas que o devir histérico 56 se explica por categorias que atribuam slgnlfi- ‘agdo 20s fatos e que, em ncia, sejam historicamiente referidas. Dessa mancira, considera-se 0 desenvolvimento co- mo resultado da interagio de grapos e classes sociais que tém um modo de relagao que Ihes 6 proprio e, portanto, in- ‘teresses materiais ¢ valores distintos, cuja oposicio, concilia~ ‘edo on superacio 2A vida ao sistema sbcio-econémico. A. es- ta sel eee elas scien os ete ferentes classes e grupos socials conseguem impor seus ieee, soe forge st Gominaio ao conjnto dr soc ‘través da andlise dos interesses e valores que orientam ou que podem orientar 2 a¢io, 0 processo de mudanca deica de tar-se como resultado de fatores “naturais” — isto © inependentes das alterativas histricas ~ © comopa a per- filarse como um processo que nas terisies entre grupos com interesses sociais € politicos e orientagdes divetgentes encontra @ fluo pelo qual pusario os influsss meramente ecoudmi Para chegarse a um enfoque tedrico desta natureza — em que a temitica parece alcangar extenséo e complexidade cerescentes — é necessirio buscar categorias que os diferentes momentos e caracteristicas estrotarais 80 pro- ‘cess0 histdrico — alguns de natureza intema aos paises ¢ 00- teas externa ~ signicatvs para o desenvolvimento. De acox enfoque 2té agora descrito, 0 problema teérico fandamental 6 constitaido pela determinagéo dos modos que adotam as estrutures de dominagio, porque por seu inter- médio que se compreende a dinkmica das relagdes de classe. Adena, gmap em wm, momeato deteminao ds Jnstitucionais no ser_compreendida sehio em ngio des exrorras do Ginini ‘Em conseqiién- ia, também 6 por intormédio de sua andlize quo 20 pods ‘captar 0 processo de transformacio da ordem polities Jnsti- tucional, Esta opelo tedriea fica apoiada empiri pelo fato de que as taunoragées hiscicas sguativa do pro 3 Pen wan antl dao pent do vite, ve FH, Cardo, 5 presério Industral @ Dosencoloinente Econimico, &80 Pailo, Dikisto Eu roptia do Livro, 1984, capitulo: 1 e 2. ee a Asiusse Iireceapa po Desevouvnento 3 cesso de desenvolvimento latino-americano ttm sido sempre Seompanbadas, senzo de uma mudanga radical na estrutura de dominagdo, pelo menos pela adocio de novas formas de yelagées, e portant de conflito, entre as classes e grupos. E evidente Gue a explicagio tedrica das estruturas de dor nagao, 00 caso impli Teoer as conexdes que se dio entre os determinantes intemnos exteros, mas esas vincalagdes, em qualquer hipétese, néo Gevem ser entendidas em termos de uma relagio “causal-ana~ Iitiea”, nem muito menos em termos de uma determinagio ‘mecinica © imediata do interno pelo extemo. Precisamente © conceito de dependéncia, que mais adiante serd examinado, pretende outorgar significado a uma série de fatos ¢ situagtes fue aparece conjuntamente em um momento dado e bus- ‘case estabelecer, por seu intermédio, as relagées que tormam fnteligiveis as. situagSes empiricas em fungio do modo de conexio entre os componentes estruturais internos ¢ externos. Mas o externo, nessa, perspectiva, também como um modo particular de relago entre grupos ¢ classes sociais zo ambito das nagSes subdesenvolvidas. E por isso que tem validez centrar 2 andlise da dependéncia em ‘sua manifestagdo intema, posto que 0 conceito de dependén- ‘cia utilizase como um ‘tipo especifico de conceito “causal- Significante” — implicagées determinadas por um modo de relagio historicamente dado — e nao como conceito mera- mente “mecinico-causal”, que enfatiza @ determinagio exter- nna, anterior, que posteriormente produziria “conseqiiéncias” in- temas. ‘Como 0 objetivo deste ensaio é explicar os processos’eco- némicos enquanto process0s sociais, requer-se buscar um ponto de interseogao teérico, onde 0 ‘econémico se expresse ‘como dominagéo social, isto & como politica; pois é através do processo politico que uma classe ow grupo econbmico tenta estabelecer um sistema de relagées sociais que The per mita impor ao conjunto da sociedade um modo de produgio wréprio, on pelo menos tena ‘estabelecer aliangas ou subor- nar os demais grupos ou classes com o fim de desenvolver ‘uma forma coondmica ivel com sens interesses € ob- jetivos. @s modos de relagio econémica, aor sus, Yer, deli- itam os marcos em que se d& a ago politica. Por conseguinte, os temas que se com maior vigor sao: os condicionantes econbmicos do mercado mundial, Joclusive 0 equilibrio internacional do poder; a estrutura do sistema produtive nacional e seu tipo de vinculagdo com 0 2% Depew x Desmevouvmemero NA Ancénca Lammea mercado externo; a configuragéo histérica-estrutural de tai fociedades, com’ suas fornas ‘de distibuigio © manutengio do poder, ¢ sobretudo os movimentos politico-sociais que pres- sionam para a mudanga com suas respectivas orientagies ¢ cbjetivos. A andlise direta dos principals fatores, processos @ movirentos presetes na situagio de subdesenvolvimento ou nas soci ies em: vias de desenvolvimento é uma tarefa imensa e sem limites precisos. Entretanto, é possivel deter- tainer problemas definidos, que podem constituir um nicleo de significacso fundamental para compreender as possibili- dades de desenvolvimento, na medida em que certos temas, ‘mesmo que de caréter particular, expressam o condiciona- mento global acima mencionado, e por isso mesmo sua expli- ‘Sito tina 0 conjutn de stvagdes de subtesenvolvmento, 0 ceritério para selecionar esses temas ou situagies dependerd dos elementos que se oferecer para a formulagio da perspectiva integrada de andlise antes formulada, HA que se Dasoar os pontes de, interveogio do items eecnbain con © sistema social, através dos quais se revelem os neros ¢ a dintmica dos diferentes aspectos e niveis da realidade que Ga as possibilidades eae squematicamente, pode-se dizer que o problema do con- tre soa! da produgio ¢ do consumo condituen 0: oxo de una auc socolégca do desenvolvimento, ocientada desta perspectiva. Com efeito, a interpretagio socfolégica dos pro- Xessoe do tranformagio’ econémen requer a anise dat a ‘tages onde a tensto entre os grupos ¢ classes sociais revele as Bases de sustentacdo da estrutura econémica e politica. Deste angulo & possivel efetuar a andlise dos “mecanismos de decisio”, atualmente tio em voga. A problemitica socio- gica do desenvolvimento, entretanto, longe de reduzir-se este enfoque, implica, como se disse, o estado das estruturas de dominagio © das formas de estratificago social que con- dicionam os mecanismos.e os tipos de controle © deciso do sistema econdmico em cada situagGo particular, Dentro da perspectiva geral’ aludida, essa problemética compreende ne cessariamente 2 andlise dos comportamentos politicos que in- cidem na relagio entre as classes e grupos sociais que mantém um pau dp de controle © as que se Thes opée zeal ou vi m7 >. Supse, ademais, a considera: - 0 ‘aborativas due Gateigam 1 ogo seus mesons de relabacs A compreensio de tais movimentos e forcas constitu’ parte fundamental da ali soioligice do desenvolvimento, que ‘Aschuase Inrtonapa Bo DESEWoLvDMENTO 8 ceste implica sempre alteragées no sistema social de domina- qo ¢ a tedefinigao das formas de contcle organizagio da produgio © do consumo. 4. Sospeseyvonvmcento, Penmrena 2 DEPENDENCIA Para permitir a passagem da anélise econdmica ou da interpretagio soiolgice usuais pera uma interpetacio global do desenvolvimento é necessirio estudar desde 0 inicio as conexies entre 0 sistema econémico e a organizacao social © politica das sociedades subdesenvolvidas, nfo s6 nessas $0- ciedades ¢ entre clas, mas também com relagdo aos paises desenvolvidos, pois a especificidade histérica da situagio de Subdesenvolvimento nasce precisamente da relagéo entre, so- ciedades “periféricas” e “centrais”. E preciso, pois, redefinir a “situagéo de subdesenvolvimento”, levando em: consideragio ‘Seu significado histérico particular, pondo em diivida os enfo- ques que @ apresentam como um possivel “modelo” de, orde- fagio de variveis econdmicas e sociais. Nesse sentido, hé que se distinguir a situagdo dos paises “subdesenvolvidos* com Heepeito aos “sem desenvolvimento”, ¢ em seguida diferencier fs diversos modos de subdesenvolvimento segundo as relagGes articulares que esses paises mantém com 03 centros ecané- nica e polticamente hegemdnicos. Para os fins deste ensaio £6 é nevessario indicar, no que se refore 4 distingao entre os ‘conceites de subdesenvolvimento © “sem desenvolvimento”, ique este Gltimo alude historicamente a situagio das economias f povos — cada ver mais escassos — que a0 mantém relagées de mercado com os paises industrializados. Quanto 20 subdesenvelvimento, « perpectiva de proceso histésico de formago do sistema produtivo mundial propicia tuma istinggo fundamental; em certas situagSes, a vineulagéo das economias periféricas 20 mercado mundial verifica-se em termes “colonias", enquanto que em outras as econemias pex_ riféricas estdo enguadradas em “sociedades nacionais”. Sobre estas tltimas, caberia acrescentar que em determinados casos realizou-se a formagio de vincalos entre os centros dominantes mais deseavolvidos © os paises periféricas quando jé existia eles una sociedade nacional; a0 passo que em outros, algu- mes colénias transformaram-se em nagdes, mantendo-se em sua situagio de subdesenvolvimento. Em todo caso, @ situacio de subdesenvolvimento produ. ziuse historicamente quando 2 expansio do capitalismo co- mercial ¢ depois do capitalismo industrial vinculot a um mes- 26 Devexntxcut x Desmvvorvnenro wa Ancéuca Lama mo mercado economizs que, além de apresentar graus varia- ds do diferenaagzo do Sutoma prodtivo, pasarcin a compar Posiges distnias na estutura gobal do sstema capitalise Desta forma, entre as economias desenvolvidas e as subdesen- volvidas no existe uma simples diferenca de etapa ou de estigio do sistema produtivo, mas também de fugio ou po- ig30 dentro de uma mesma estrutura econémica internaciotal de producéo e distribuigio. Isso supée, por outro lado, uma estrutara definida de relagées de dominagio. Entretahto, 0 conceito de subdesenvolvimento, tal como & usualmente em- pregado, refere-se mais a estrutura de um tipo de sistema ‘ecoaémico, com predomfnio do setor primério, forte concen- ‘tagio da renda, pouca diferenciacio do sistema produtivo e, sobretudo, predoiinio do mercado externo sobre. 0 intemo. Isso manifestamente insuficiente. © reconhecimento da historicidade da situago de subde- senvolvimento requer mais do que assinalar as caracteristicas estraturais des economias subdesenvolvides. HA que se ana- sax, com efeito, como as economias subdesenvolvidas vin- cularam-se historicamente so mercado mundial ea forma em que se constitufram os grupos sociais internos que consegui- ee etiam pep sosa te ge Se desenvolvimento supée. ‘Tal enfoque implica recoshecer que xo plano politico-social existe algum tipo de dependéncia nas situagées de subdesenvolvimento e que essa dependéncia teve inicio historicamente com 2 expansio das economias dos pale ses capitalstas origindrios, A dependéncia da situagto de subdesenvolvimento impli- a socialmente uma forma de dominagio que se manifesta por uma série de caracteristicas no modo de atuagio e na orien- tagio dos grapos que uo sistema econdmico aparecem como produtores ou como consumidores. Essa situagio supGe nos casos extremos que as decisses que afotam a producio ou 0 consumo de uma economia dada sio tomadas em fungio da Ainimica © dos interesses das economizs desenvolvides. AS economias baseadas em enclaves coloniais constituem o exem- plo tipico dessa situagio extrema, Frente & argumentago apresentada, o esquema de “eoo- rnomias centrais” e “eoonomias periféricas” pode parecer mais soo de significacdo social que 0 esquema de economizs de- senvelvidas ¢ economias subdesenvolvidas. Nele pode-se in- war de imediato a noglo de desigualdade de posicées e de fungSes dentzo de uma mesma estrutura de producio Asduase Inrzcnapa 20 Desmvoryneenro a ypal. Entretanto, no seria suficiente nem correto propor PMeubstituigio dos conceitos de desenvolvimento © subdesen Volvimento pelos de economia central e economia periférica ‘ou — como se fossem uma sfntese de ambos — pelos de eco- homias auténomes e economias dependentes. De fato, sio Gistintas tanto as dimensdes a que estes conceitos se referem ‘quanto sua significagio tedrica. A nogao de dependéncia alude diretamente as condigées de existéncia ¢ funcionamento do sistema econdmico e do sistema politico, mostrando vin- cculagéo entre ambos, tanto no que se refere 20 plano interno dos paises como ao externo. A nogio de subdeseavolvimento caracteriza um estado ou grau de diferenciagdo do sistema produtivo — apesar de que, como vimos, isso implique algu- en fiencias” sociais — sem acentuar as pautas de fas “conseq’ F Controle das decisées de producio © consumo, seja interna. mente (socialismo, capitalismo etc.) ou extemamente (colo- nialismo, periferia do mercado mundial ete.). As nogdes de “centro” & “periferia”, por seu lado, destacam as fungdes que Sen’ sS Eitomay Ribdecavalvides ao, mereado mundal ‘em levar em conta os fatores politico-sociais implicados na situagio de dependéncia. Ademais, uma sociedade pode sofrer transformagies pro- fundas em seu sistema produtive sem que se constituam, 20 mesmo tempo, de forma auténoma os centros de decisio © os mecanismos que os condicionam. Tal & 0 caso da Argentina e do Brasil ao terminar 0 processo de substi- fuigéo de importagées ¢ iniciarse 0 da produgio de bens de ‘capital, momento que Ihes permitiu alcancar determinado grau de maturidade ecmnimice, ncuve no que respetta & ist buigdo da renda (como ocorreu até certo ponto ua Argentina). For our Tado, em cass lines, wie sociedad nacional ‘er certa autonomia de decisdes, sem que por isso 0 Bekins produto © av fonnes de. dstibuigo’ da renda The permitam equiparar'se aos paises centrais deseavolvides, nem Sequer a alguns paises periférioos em processo de desenvol- Vimento, Acontece essa hipétese, por exemplo, quando um is rampe os vinculos que 6 ligam a um determinado sistema Be dominado sem se totalmente a outro (Tugos- livia, China, Argélia, Egito, Cuba e inclusive 0 México revo- Iuciondrio). Como consegiiéncia dessa colocacio, se trata de interpretar globalmente um proceso de vimento, & necessério ter presente que néo existe um nexo imedisto entre 28 Depmwixen x Dusvouvmano xA Ascionca Lara 2 diferenciagio do sistema econémico a formagio de centros auténomes de decisio e, portanto, que as andlises devem de- finir nfo s6 0s graus de diferenciagéo estrutural que as eco- nomias e gs sociedades dos paises que se acham em fase de ransigéo alcangaram no provesso de integragio ao mercado mundial, mas também 0 mado através do qual se logrou his- toricamente essa integracéo. Tal perspectiva aconselha uma gee oe interpretagéo ae como se tem efetuado 0 vimento econbmico e a modemizagio da sociedad na Diversos autores ressaltaram o cardter de “resultado im- Brevis que 0 desenvolvimento assume na América Latina. Iguns paises, por exemplo, ao projetar a defesa de seu prin- cipal produto de exportago, propuseram uma politica de desvalorizagio que teve como jaéncia indireta, ¢ até certo ponto no deliberada, a condigdes favorkveis 20 creseimento industrial. " Entretanto, seria dificil sustentar que 2 diferenciagéo econdmica assim alcangada — em fangio de varidveis conjunturais do mercado e sem implicar um pro- jeto de autonomia crescente ¢ uma mudanga nas relagdes ‘entre as classes — possa por si s6 alterar de forma substantiva as relagdes de dependéncia. A esfera politica do comporta- ‘onto foil infu necessariaments na forma do proceso de vim or 1880, se se parte de ums interpreta {obal do desenvolvimento, os axgementos basrades Ca pace stianloe @ reagées do mercado séo insuficientes para explicar j0 € © progresso econémico. Para que tai estinules ou saecanianes de defese. da. economia siesen volvida possam dar inicio a um processo de industrializacio que reestruture 0 sistema econdmico e social, é necessério que se hajam produzido no mesmo mercado intemacional trans- fonmagies ou condigées que favorecam 0 desenvolvimento, mas lecisivo que 0 jogo politico-social nos paises em: vias de desenvolvimento contenha em sua dindmica elementos favo- ete A obtengio de graus mais amplos de autoniomia, eve terse em conta, como foi visto anteriorm o enfoque propesto neste ensaio ‘no considera adequate, sem mesmo de um ponto de vista analitico, separar os fatores denominados “externos” ¢ os “internos”; 20 contréxio, propde- se achar as caracteristicas das sociedades nacionais que ex- Pesan as relagdes com 0 extern. ‘io justemente os fatores politico-sociais intemos — vin- culades, como natural, 4 dindmica dos centros Tegemaioos Axduise Inrmerap 90 DESENVOLYREENTO 29 = os que podem prodvzir politicas que se aproveltem das Thovas condigées” ou das novas oportunidades de crescimento econémico. De igual modo, 25 forgas intemas sio as que Selefinem 0 sentido e 0 alcence politico-social da diferen- Gngdo “espontinea” do sistema econdmico. £ posstvel, por Gxemplo, que os grupot tradiciouais de dominasio oponham-se Gm principio a entregar seu poder de controle aos novos gra pos socials que surgem com 0 prooesso de industrializagéo, Bias também podem pactar com estes, alterando assim as ‘conseqiiéncias renovadoras .do desenvolvimento n0 plano so- cial e politico. ‘As aliangas dos grupos e forgas socials intemas estio fects por sua vor pele tipo e intensidade das mudangas, @ estas dependem, em parte, do modo de vineulagio das eco- homias nacionais a0 mercado mundial; a articulaggo dos gra- fos econdmicos naciouais com os grupos e forgas externos Rraliza-se distintamente e com conseqléncias diferentes, antes fe depois de comegar um processo de desenvolvimento, O sis- tema intemo de aliangas politicas altera-se, além disso, muitas yezes em conseqiéncia das alisngas existentes no plano inter- nacional ‘Tal perspectiva implica que nfo se pode discutir com precisio 0 processo de desenvolvimento de um éngulo pura: Frente econdmico quando 0. objetivo proposto ¢ compreender 2 formagao de economias nacionais. “Tampouco € suficiente, ara a descricéo, a, andlise do comportamento de variéveis ivadas -- dependentes, portanto, dos fatores estruturais ¢ Go. processo histérico de mudanga ~ come & 0 caso das tazas de produtividade, poupanga e renda; das fungSes de consumo, de emprego ete. Para que os modelos econémicos construides com varié- veis dessa matureza possam ter significagio na andlise inte- pada do desenvolvimento devem estar referidos as situagdes Elobais — sociais e econdmicas — que Thes servem de base 2 les dio sentido, A inter-relacio do econfmico © do social tmanifesta-se notoriamente na situagio de “enclave colonial”, onde a designaldade da situagao politica entre a colonia ¢ a metrépole faz que o sistema econbinien seje perosbido come diretamente ligado 20 sistema politico, pondo assim mais cla- ramente em relevo a relagio entre ambos. Pelo contrério, quando o desenvolvimento ocorre em “estados nacionais”, a face econdmica toma-se mais “visive!” ¢ os condicionantes politicos e socials apazecem mais fhuidos; néo obstante, estes 90 Darema, = Desmvonvnanro na Ancéruca Lara ‘itimos mantém uma influéncia decisiva com respeito 20 apro- veitamento e continuagio das oportunidades que ocasional- ‘mente se manifestam no mercado. Por conseguinte, ao considerar a “situagio de dependéa- cia’, na andlise do desenvolvimento latino-americano, 0 que se pretende ressalter € que o modo de intogragio das eco- nomias nacionais no mercado intemacional supe formas de~ finidas e distintas de interrelagio dos grupos sociais de cada pais, entre si e com os grupos externos, Pois bem, quando Se aceita a perspectiva de que os influxos do- mercado, por si mesinos, ndo so suficientes para explicar 2 mudanga nem ara garantir sua continuidade ou sua diregéo, a atuagio das grupos ¢ instituigGes sociais passa a ser decisiva para 12 amtlise do, desenvolvimento. 5. O “Sumpesexvorvimento NACIONAL” ‘Toma-se. necessério, portanto, definir uma perspectiva de interpretaco que destaque os vinculos estruturais entre 2 situagao de subdesenvolvimento ¢ os centros hegeménicos das ‘economias centrais, mas que ndo atribua a estes ultimos a deteminagio plena da dinimica do desenvolvimento. Com feito, se nas situagdes de dépendéncia colonial é possivel afirmar com propriedade que a histéria — e, por conseguinte, fe mudanga — aparece como reflexo do que se passa na me- trdpole, nas situagses de dependéncta das “nagdes subdesen- volvidas” a dindmica social é mais Neste’ dltimo caso hé desde 0 comego uma dupla vinculagio do processo histérico que cria uma “situagio de ambigiidade”, ou seja, ‘uma nova contradigéo. Desde o momento em que se coloca como objetivo instaurar uma nagio — como no caso das Tutas anticolonialistas — 0 centro politico da agao das forgas sociais tenta ganhar certa autonomia 20 sobrepor-se situagio do mereado; as. vinculagies econfmicas, entretanto, continuam sendo definidas objetivamente em fungio do mercado externo ¢ limitam as possibilidades de decisio e aco auténomas. Nis- s0 radica, talvez, 0 miicleo da problemitica sociolégica do processo nacional de desenvolvisnento na América Latina. A situagdo de “subdesenvolvimento nacional” supée um. modo de ser que por sua vez depende de vinculagées de subordinacdo 20 exterior e da reorientagio do comportamento politico e econémico em funoio de “interesses nacio- nais"; isso caracteriza as sociedades nacionais subdesenvolvi- as nio 6 do ponto de vista econémico, mas também da pers. Anise Trem 0 Desewouvmenro aL iva. do comportaments ¢ da esruturagio dos grupos s0- iis, ise pov due blade sdlse ead pro- cesso de desenvolvimento nacional consiste em determinar as ineulagdes econdmicas e politico-sociais que se dio no ém- bito da nagdo, Essas articulagSes se dio através da acio dos grupos sociais que, em seu comportamento real, igam de fato 2 esfera econdmiica 2 politica. Convém ressaltar que tal acio refere-se sempre & nagio e as suas vinculacées de toda ordem com 0 sistema politica e econdmico mundial. A dependéncia encontra assim no 36 “expressio” interna, mas também seu Verdadeiro cardter como modo determinado de relapses es- truturais: um tipo especitico de relagdo entre as classes ¢ gupos que implica uma situagio de dominio que mantém Estruturalmente a vineulaglo econdmica com o exterior, Nes- ta iva, a anélise da dependéncia significa que nia, se deve considerdla como uma “variével externa”, mas que & pos- sivel analisi-la a partir da configuragio do sistema de zela- g6es entre as diferentes classes sociais no Ambito mesmo das ages dependentes. Para fazer essa anilise deve-se excluir 2 idéia de que a ago das classes e as relagies entre estas tenham nos paises dependentes um caréter semelhante 20 que se de nos paises cents em suq fase de desenvolvimento origindrio, A bipétese mais generalizada sobre 0 modo de creates io Srna pallscoe econdmi nos priors do processo de desenvolvimento nos paises centrais eupse que 0 livre jogo do mercado atuava, por assim dizer, como ézbitro para dirimir 0 conflito de interesses entre os grupos domi- nantes. Por isso que a racionalidade econdmica, medida pelo ucro, impunha-se como norma 2 sociedade e que o consumo @ a inversio definiram-se dentro dos limites estabelecidos pelo crescimento do sistema econtmico, Supunba-se, ademais, que a possibilidade de expansio do sistema devia-se & existéncia ‘de um grupo dintmico que controlava as decisoes em matézia de inversio © que dominava as posigées de poder necessésias~ @ suficientes para imprimir ao coajunto da sociedade uma orien- taco coincidente com seus interesses. A classe econdmica as- cendente possuia, pois, eficiéncia e consenso. Conf toda a simplificagio inerente a esse esquema, con- siderava-se que os grupos ditigentes expressavam o interesse eral e que, nessas condigées, 0 mercado funcionava adequa- te como mecanismo regulador dos interesses gerais dos interesses particulares. Nesse caso entendia-se por “fun- cionamento adequado” a capacidade de servir ao crescimento 92 Durexmixera = Desvonemamero a Aninaca Lerma eeondmico, descartando’a hipétese de que existissem outros ‘grupos que pressionavam para participar dos frutos do “pro- gresso” e do controle das decisdes. $6 muito depois de zeali- zado o esforgo inicial de industrializacio estiversm as classes populares em condigoes de fazer-se presentes nas sociedades Industriais como forga politica e social participante.® .O que contribuiu para o éxito das economies nacionais nos paises de “desenvolvimento originério” foi o fato de que estas Se conso- lidassem simultaneamente com a expansio do mercado mun- dial, de maneira que tais ‘passaram a ooupar as, princi pais posigtes no sistema de dominagio internacional que se ‘estabelecia. Sem confiar demasiado no valor do esquema apresentado para caracterizar as condigdes gerais do “desenvolvimento ori- initio", que & pouco preciso e de caréter muito amplo, & evidente que hé diferencas significativas entre esse esquema © 0 que ocorre na América Latina. Com efeito, dado que existem relagées de subordinagio entre as regides desenvolvi- das e as insuficientemente desenvolvides — ou melhor, entre as sociedades centrais ¢ as dependentes — e que essa subordi- nagio assenta, em wtima andlise, em formas da exploragio eco- némica, a andlise-néo pode desconhecer essa caracteristica ‘bisica, para apresentar como uma anomalia 0 que realmente € uma maneira de ser. _, Entre os conceitos “desenvolvimento” ¢ “sistema capitalis- ta” produziu-se tal confuséo que se chegou a supor que para se lograr 0 desenvolvimento nos pafses da periferia & necessé- rio repetir a fase evolutiva das economias dos paises centrais. Entretento, é evidente que o processo capitalist supés desde seu infcio uma relacdo das economias centrais entre sie outra com as periféricas; muitas economias “subdesenvolvidas” — como 6 6 cas0 das latino-americanas — incorporaramn-se a0 sistema capitalista desde que se formaram as colénias e depois os Estados nacionais ¢ nele permanecem 20 longo de_ todo seu transcarso histérico, mas no se deve esquecer que o fazem ‘como economias periféricas. Os diferentes momentos historicos do capitalismo nao de- vem ser estudados, pois, com o afi de encontrar sua repeti¢do retardada nos paises da periferia, mas para saber como se roduziu, em cada momento particular, a relagdo entre perife- ia e centro. Sdo varios os aspectos por analisar; um deles se ® Sobre este ponto, ver Alain Toursine, “Industialisation et cons- lence omvriive & Sse Paulo”, 2m Sociologie du Travail, abri, 1961, Asduise Tsrmcnana no Desmrvourpnro 3 yefere 205 caracteres do capitalismo como sistema econémico Fntermacional. Se no processo de constituicio do capitalismo podem distinguirse momentos de predominio de um tipo de Pititaliamo sobre os outros, tas como o capitalisme mereanti, Sreapitalicmn industrial e financeiro, nio mos corzes- onde indagar 2 qual desses momentos aproximam-se, 2s Ponomias Intino-americanas na atualidade, posto que de fato ‘nko constituem economias separadas do mercado capitals Internacional. Entretanto, 6 necessério esclarecer o que signi- icon em termes de “estruturas da economia” e “estrutura 30- ‘cal’ a velagao de dependéncia pare os paises latino-americanos Gurante esses distintos momentos. O mesmo sucede com of Cconceitos “capitalismo competitive” e “capitalismo monopolista”, gue podam fet extdo cono tendéncia nas trés etapas assi- thladas do capitalismo, mas que predominaram mais em umas do que em outras formagies sociais concretas. Comesponde J allise determinar a signficacto desses conceitos com rele- réncia aos sistemas nacionais dependentes. (© que se expés também tem conotagdes histbricas de certa importincia. Os paises latino-americanos, como economias dependentes, ligam-se nestas distintas fases do processo capi falta aos difereates paises que atuam como centro © cujas cetruturas econdmicas incidem significativamente no carter que Sdota 2 relagéo. O predominio da vinculacdo com as metté- poles — Espanha ou Portugal — durante 0 periodo colonial, Prdependéncia da Inglatensa mais tarde e dos Estados Unidos yer, iting, tema significagdo. Assim, por exemplo, a glaterra, no processo de sua expansio industrial, exigia em alguma medida o desenvolvimento das economias dependentes des, posto que as necesstava para se abusteoet de matérias primas. Requeria, por conseguinte, que a produ. so das ecouomiss deprndenter lograsse certo grea fe dina: Inismo © modemizaca0; essas mesmas economias, além disso, integravam 0 mercado comprador de seus produtos manufa-~ os, portant, tambén ea evidentemente necessario que se dese nelas certo dinamismo. A economia norte-americana, 20 conteirio, comtava com recursos naturals e com um mercado comprados interno que Ihe permitia iniciar um desenvolvimento mais auténomo com relacao as economnias periféricas, ¢ ainda mais, em alguns casos, colocava-se em situagéo de concorrén- Ga com 05 paises produtores de matirias-primas. A relagao de Gependéneia . adquire assim uma conotagio de controle do Gesenvolvimento de outras economias, tanto da producto de matérias-primas como da possivel formagao de outros centros 34 —-Dewenntxem = Dismwouwnanro wa Ascésica Laraca econtmicos. © papel dinamizador da economia dos Estados Unidos referente &s economias latino-americanas na etapa que anteceden a formagao dos conglomerados atuais é, por conse guinte, menos importante que io caso anteriormente descrito. Metodologicarents nfo 6 Heit supor, portmte — isco deve ser acentuado — que nos paises “em deseavolvimento” se festeja repetindo a histéria dos patses desenvolvidos. Com feito, as condigées hist6ricas sio diferentes: em um caso se estava criando o mercado mundial paralelamente a0 deseavol- vimento, gragas A agio da denominada as vezes bourgeoisie uérante, e em oato tenta-se o desenvolvimento quando Hh exsem relagies de meread, de indole cpt, ente ambos os paises e quando o mereado rmundial a seotase. divibdo cite 0 mindo capitalita eo” scala, Tampouco basta considerar as diferenges como desvics em relagio a um padrio geral de desenvolvimento, pois os fatores, as formas de conduta ¢ os processos sociais e econdmicos, que & primeira vista constituem formas desviadas ow imperfeitas de realizagio do padrio clissico de desenvolvimento, devem ser considerados fundamentalmente como niicleos da anélise destinada a tornar inteligivel o sistema econdmico-social. 6. Os Twos"pe Varcuragio pas Eoononms NACIONAIS Ao ‘Mencapo Deve ter-se.em conta que, 20 romper o “pacto colonial”, a vinulgo entre as economia peifrics¢ o mercado Sater assume umn cardter distinto, j4 que nessa relagio a condicgo de “economia periférica” deve agregarse a nova condigéo de “nagio independente”. ‘A ruptura do que os historiadores chamam de “pacto co- lonial” e a primeira do capitalismo industri so, pol, bs euracterbtkag histodas dominantes no perioco de formagio das “nagées novas” no século XIX. A expansio das economias centrais industrializadas — primeiro a da Ingla- terra, e mais tarde a dos Estados Unidos — no se realizou xno vazio, posto que se encontrou com sistemas econémicos sociais jf constitufdos pelo efeito da expansio colonial ante- rior. A partir do perfodo da independéncia, do ponto de vista tosblggbo, a dadnice des econohias dad soobsias sent apresenta-se simultaneamente como reflexa © autic- tone, medida em que a expansio do centro encanta ituagGes aacionais que tomam possiveis diferentes 4 aliange, de resisting @ de tense, a Avinise IorpseaDs po Dzsmrvonvnanrro 35 © tipo de vinculagéo das ecoaomias nacionais periféricas as distintas fases do processo capitalista, com os diversos mo- Jos de dominagao que este supée, implica que a integragio & nova fase ealiza-se através de uma estrutura social e econd- faiea que, apesar de modificada, procede da situagéo anterior. Seo Uistingos o modo ¢ as possibilidades de desenvolvimento So uma nagio que se vineula ao setor exportador internacional fom um produto de alto consumo, segundo se verifique no peviodo do capitasmo predeminantemente competitive ou no Periodo predominantemente monopolsta, Da mesma forms Bee distintas, comparadas com as “coldnias de exploragio”, 4s possibilidades de integracio nacional ¢ de formagio de um Jnereado interno naqueles paises cuja economia nacional orga- nizou-se miais como “colénias de populacio”, isto é, formadas jobre a exploracdo (coatrolada por produtores ali radicados) de produtos que xequerem mao-de-obra abundante, Nesses casos, € 00 posterior & independéncia, foi mais facil a organizagio de um zparato politico-administrativo interno para promover ¢ executar uma “politica nacional”. Ademais, 4 propria base fisica da economia — como, por exemplo, o tipo @ as possibilidedes de ocupacdo da terra ot 0 tipo de riqueza mineral dispontvel — influiré sobre a forma e as conseqiiéncias da vincolagéo 20 mercado mundial posterior a0 perlode de formago nacional Em cada um dos 'tipos possiveis de vinculagio segundo ‘esses fatores, as dimensées essenciais que caracterizam a de- pendéncia refletirse-do sobre as condigses de integragio do Sistema econdmico e do sistema politioo. Assim, a relacio entre as classes, muito jalmente, assume na América Latina formas e fungies diferentes Gas dos paises centrais. Em répido esbogo, podersevia dizer que cada forma histérica de depen- Aéncia produz um aranjo determinado entre as classes, néo ‘estético, mas de caréter dinfmico. A passagem de um para~ outro modo de dependéncia, considerada sempre em uma pers- pectiva histérica, deve ter-so fundado em um sistema de rela- Rees entre classes ou grupos gerados na situagio anterior. Desse odo, por, exemplo, quando se rompe a dependéncia colonial e passe-se’ para @ dependénca da Inglaterra, esta tem como apoio social o grupo de produtores nacionais, que pelo eresci- ionto de sua base econémica — crescimento jé dado nz situa (Gao colonial — estava em condigGes de suscitar um novo arranjo Entre as diferentes forcas sociais, gragas 20 qual estava desti- ado a ter, seno 0 dominio absoluto, pelo menos uma situagdo 36° Devenobxcxa x Desesvouvmenro xa Ansénuca Larisa, privilegieda. Ao passar da hegemonia da Inglaterra a dos Eftadee Unidos entra em jogo novos Starcteue tem sua origem na situaeo anterior. Com efeito, como entiéo, junto a0 crescimento dos grupos exportedores, produziu-se um cresci- mento significative des setores urbanos, ¢ essa nova situagio estava presente na relago com os Estados Unidos. © que se Ber assalar brevencate por enguanto ¢ que, se 2 nova de dependéncia tom explicagses exteriores & nagio, por outra parte a relacio interna entre as classes nao The 6 alhefa; 20 ‘ontrario, a relagdo intema entre as classes 6 que torna possivel ¢ di fisionomia 2 dependéncia. Fundamentalmente, a dintmica que sdquiir 6 sistema econdmico dependente, no Ambito da nacio, esti determinada — dentro de certos limi- tes — pela capacidade dos sitemas interos de aliangas para proporcionarlhe capacidade de expansio, Dessa maneira se dé, por exemplo, o caso, paradoral s6 na aparéncia, de que a pre- fenga das massas nos limos anos haja constitido, por causa sua pressio pata incorporat-se ao sistema politico, em um dos elementos que provocaram 0 dinamismo aE Toma coonboses vigente. Admitindo como valida essa interpretagZo, obter-se-& um mareo da atividade das presses em favor do desenvelviments na América Letina que mostra, a respeito dos padrées euro- [peus ou norte-americanos, nfo um desvio que se deve corrigir, mas um quadro distinto ‘por sua situagio periffrica, O “en frentamento” que resulta das presses a favor da moderiizacéo é produzido na atualidade entre as classes populares que ten- tam impor sua participacio, geralmente em alianga com os ‘novos grupos economicamente Gominantes, e 0 sistema de aliangas’ vigente entre as classes predominantes na situacéo Na fase inicial desse processo os grupos industriais apare- cam em alguna mea tne sto targa Entretanto, pelo fato de fazerem parte dos novos setores wrbanos, seu apel alcanga certa importincia porque, de fato, neste conglo- merado, constituem 0 tinico grupo que possui uma base econd- ‘mica real, se bem que esta nio seja decisiva se a relesimus & totalidade do sistema eccntmico vigente apesar também de sew caréter conjuntural. Por ser 0 grupo industrial 0 que dispde da possibilidade de absorver de forma produtiva os setores urbanos populares, situa-se em uma posigao estratégica que lhe permite estabelecer termos de alianga ou compromisso ‘com, 0 resto do sistema social vigente e isso explice ‘sua im- Awhzsse Ierzenap, no Desmwownes70 st iano periods posterior & crise do sistema agro-ex: portador. 7, Penspecrivas pana tts ANhuise Evrecnapa 20 [DESENVOLVIMENTO Em sintese, reconhecendo a especificidade das distintas formas de comportamento, a, anélise sociol6gica trata de ex- plicar of aparentes “desvios’,. através da inagio. das Ricteristicas estruturais das’ sociedades subdesenvolvidas nediante um trabalho de interpretacio. Nao é exagerado afir~ imar que é necessixio todo um esforgo novo de anilise a fim de ir 0 sentido ¢ as fungSes que as classes sociais tém no contexto estrutural da situagao de subdesenvolvimento ¢ as iliangas que elas estabelecem para sustentar uma estrutura de poder e gerar a dinimica sociale econdmica. ‘As duas dimensies do sistema econémico, nos paises em ‘processo de desenvolvimento, a intema e a externa, expressam-se fo plano social, onde adotam uma estrutura que, se organiza P fenciona em’ termes de una dupla conexdo: as ressdes ¢ vinculagées extemas e segundo o condicionamento Mie fatores internos que incidem sobre a estratficagdo social. ‘A complexidade da situagio de subdesenvolvimento dé Ingar a orientagées valorativas que, apesar de contraditérias, coexistem. Pareceria que se produzem, por seu tumo, certas situagoes nas quais a atividade dos grapos sociais corresponde as pautas das “sociedades industrializadas de masses”, ¢ out em que tém preponderincia as normas sociais tpicas das “ tages de classe” e até das “situagGes estamentais”, ‘A. int a aqui sustentada salienta que essa an Sie ae situagio de subdesenvolvimento ¢ ‘que, portanto, & necessério elaborar conceitos e propor bipé- tases que a expressem e permitam compreender o subdesenvol~ vimento sob essa perspestiva fundamental, Esta deve realgar a contradigio entre 2 nacio concebida como uma unidade social relativamente auténoma (0 que obriga, portanto, a refe- Hise de janeira constante A situagio interna de poder) e 0 desenvolviinento considerado como” processo ou que se esti logrando através de vinculos de novo tipo com as ec0- nomias centrais. ‘A perspectiva em que nos colocamos poe em divide achente 0 qué so gosta como necessxlo pa. concepgio Jisnal da andlise das etapas de desenvolvimento. Com efeito,

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