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Pós-Graduação em Direito Penal Econômico (Universidade de Coimbra/PT e IBCCRIM/SP)

AULA 01

Tema: Direito Penal Econômico na sociedade global: Aspectos Jurídicos e de Política Criminal

Professora: Anabela Miranda Rodrigues

1. Introdução – risco e globalização. Novos atores da política: grandes empresas


multinacionais

Primeiramente, a professora faz referência ao professor Ulrich Beck e às obras


“Sociedade do Risco” e “O que é Globalização”. Na primeira obra, Beck captou a
insegurança que penetrava as sociedades do tempo (década de 80). Esse cenário de
insegurança que está traçada nessa obra não perdeu de todo a sua atualidade
(milênio, inclusive 2020). Essa insegurança inclusive é reforçada, de uma forma
particular, na questão da saúde (pandemia, por exemplo). Outros exemplos: crises
energéticas, questões da natureza...

A outra questão tem a ver com a globalização. Nesses termos, a professora analisa que
a globalização não aponta para o fim da política, e sim, para novos atores de política
(grandes empresas multinacionais). Esse é um aspecto que não podemos perder de
vista quando analisamos a questão do direito penal econômico, afinal, seus principais
atores são as empresas. Essas têm uma localização incerta, escapam aos controles
estaduais e também não prestam contam À qualquer eleitorado. Sua lógica é de
abertura, com espaço de tratamento jurídico diferenciado, mostrando vários níveis do
direito (direito administrativo, de segurança social, penal). Ou seja, as empresas
podem, diante da abertura do mercado, procurar os ordenamentos jurídicos (em
sentido amplo) que mais favorecem o desenvolvimento de sua atividade do ponto de
vista do lucro. Ou seja, procurar ordenamentos em que os sistemas de segurança
social ou de direito laboral não são tão exigentes. E logicamente, também temos o
sistema penal que não é tão pesado (por ex., em relação às fraudes fiscais). Os países
mais favoráveis ao lucro, no que tange aos sistemas acima elencados (e outros, claro...
como o ambiental, por ex.), serão os países onde as empresas irão procurar para
desenvolver a sua atividade empresarial.

2. A segurança humana. A relação entre desenvolvimento e segurança

As opções legislativas em matéria penal condicionam a atualização dessas empresas e


são também condicionadas por essas empresas, porque muitos desses países são mais
enfraquecidos no ponto de vista do estado e do poder regulador.

Os Estados, por força do poder dos atores empresárias (que desenvolvem suas
atividades à nível global), têm uma certa tendência a perder capacidade reguladora em
face desses novos atores. Um desses aspectos notados nesses casos é da
manutenção/garantia da segurança. Um desses é da (in)segurança econômica.

Esse aspecto da segurança econômica social, que é papel do estado garantir, começa a
ser posta em causa exatamente a partir da própria forma de gestão empresarial. Ou
seja, nós assistimos a uma evolução positiva no sentido de orientação na governança
das empresas, da gestão empresarial, portanto a gestão empresarial é cada vez mais
preocupada com aspectos sociais, de realização de aspectos econômicos-social (que
cada vez mais é uma exigência para o desenvolvimento da atividade empresarial). A
origem da gestão das grandes empresas e dos modos de gestão dessas grandes
empresas estava mais ligada ao perigo de ela ser realizada em dissociação de
realização dos interesses não só dos sócios (proprietários), como também da
realização dos interesses sociais e socioeconômicos. Esse perigo alertava também no
século passado ligada ao fenômeno de crescimento social.

Diante disso, temos a ligação entre segurança e desenvolvimento, além da


consideração do conceito de segurança no tempo atual. Quando nós hoje falamos de
desenvolvimento da atividade econômica, em que o principal protagonista a grande
empresa, relacionamos com a segurança das pessoas, que é conhecida, cunhada como
segurança humana (um conceito alargado, holístico de segurança, ligado ao conceito
de desenvolvimento). É preciso destacar que o desenvolvimento deve ser visto como
algo preocupado com os direitos humanos e que não é apenas reconduzível ao
desenvolvimento econômico. Ou seja, não redutível apenas ao desenvolvimento
econômico. Isso é muito importante ao analisar o desenvolvimento econômico amplo
das grandes empresas.

O desenvolvimento econômico não pode constituir o único objetivo de um Estado e o


lucro não pode estar acima da garantia da realização dos direitos humanos, nem pode
estar acima da lei. Pode ser muito mais fácil e lucrativo para as empresas desenvolver
suas atividades econômico à margem dos direitos dos trabalhadores, da saúde pública,
da proteção do meio ambiente. Ou seja, as normas protetoras podem servir como
obstáculos ao desenvolvimento econômico. Mesmo o controle judicial pode ser visto
como inimigo do desenvolvimento econômico (se eu tiver menos proteção ambiental,
posso ter um desenvolvimento econômico desregulado, por ex.).

Quando se faz esse enquadramento, o conceito de segurança vira um conceito “novo”.


Existe uma tendência em ampliar as fronteiras semânticas do conceito de segurança
que, como é sabido, incorpora para além da “security”, além da noção de safety.Com
esse novo conceito de segurança, significa que segurança implica observar normas
científicas, técnicas, padrões de cuidado no comportamento, bem como nas omissões
de comportamento, tal qual a diminuição dos riscos associados à fruição de bens e
serviços de equipamentos de instalações. Essa noção de segurança é próxima à noção
de bem-estar. Portanto, o estado de walfare está aqui nessa narrativa. Esse estado de
walfare, com essa segurança, abrange a segurança econômica e social. Portanto,
ampliou-se o conceito de segurança e liga esse conceito às condições concretas de
desenvolvimento social e de garantia das possibilidades que as pessoas tem ou que
lhes são garantidas/oferecidas para elas terem uma vida humanamente digna. Em
última análise, o referente de segurança nesse novo conceito deixou de ser o Estado
e passa para o indivíduo. Humaniza-se o conceito de segurança. Encontram-se aqui as
sete dimensões da segurança (que foram enunciadas em 1994, no relatório do
programa das nações unidas): ordem econômica, alimentar, sanitária, ambiental,
pessoal, comunitária e política.

O grande poder tecnológico situa-se hoje muito mais nas empresas, ao nível dos
institutos de desenvolvimento das organizações empresariais... São elas que detém
muito poder tecnológico. O Estado tem poder tecnológico, mas é bem menos. O que
faz com que a administração pública tenha menos poder de controlar essa atividade
econômica? Esse poder tecnológico é uma dimensão fundamental do poder
regulatório, que hoje se dilui e se transfere em grande parte para as empresas.

3. Contra o expansionismo do direito penal econômico: uma política criminal


econômica de proteção de bens jurídico-penais econômicos. As exigências da
tipicidade (princípio da legalidade e determinabilidade).

O fenômeno de expansão do direito penal econômico é um traço, uma das linhas de


forças que define a política criminal atual. Temos exemplo dessa expansão em muitos
domínios (direito penal médico, ambiental também são linhas de força)

Dessa forma, manifestando uma tendência para acreditar que o melhor meio de
resolver os problemas sociais é o direito penal (criminalização de comportamentos
econômicos). Isso é uma lógica inversa àquela que aprendemos que deve ser a lógica
do direito penal (último instrumento de política social – ultima ratio).

Não se pode desconhecer que para efeito de tipificação dos crimes, precisamos
caminhar no sentido de identificação dos comportamentos de fraude fiscal que
merecem, carecem e são dignos de intervenção. Ganha corpo o prejuízo ao estado, o
benefício dos cidadãos de não pagarem impostos...

A característica difusa/coletiva do bem que se deve proteger penalmente é uma das


grandes dificuldades do direito penal econômico. Se os bens que eu quero proteger no
domínio econômico tem essa natureza coletiva (justiça social, igualdade no mercado),
então tenho também do outro lado as dificuldades de tipificação dos ilícitos penais.

É muito mais difícil configurar tipificamente um crime econômico.

As incriminações nesses domínios são simbólicas (são mais formais que substanciais,
não tem exatamente um conteúdo). São criações simbólicas do legislador. Todas as
tipificações do legislador ordinário são construções, feitas a partir da análise do
comportamento humano (construção normativa).

A exigência ao legislador ordinário é muito maior nesses casos. O que está em causa
aqui é a tarefa de tipificação do legislador ordinário, ao nível de um princípio
fundamental em matéria penal (legalidade), na sua faceta de determinabilidade dos
elementos constitutivos dos tipos incriminadores.
Esse desafio é uma exigência dos atuais estados como dimensão social que tem nossos
estados (Portugal/Brasil). Estados que fizeram sua responsabilidade e seu dever
assegurar a seguridade econômica e social das pessoas.

A outra dimensão é que quando nós temos tendência nesse domínio do direito (do
que é ou não DPE), restringir muito o âmbito do DPE, nós temos que apontar para um
direito penal de que ‘eu não gosto”, que é um direito penal classista.

É precisar garantir a legitimidade do DPE, que só se alcança através do equilíbrio.


Portanto, não se justifica a resistência ao DPE, entre a abstenção punitivista e o
excesso punitivista. Deve existir, portanto, o equilibro entre limitações de direitos
fundamentais e proteção de direitos fundamentais.

Na criação de crimes há uma limitação de direitos fundamentais de todos nós. Quando


eu criminalizo a difamação por meio da internet, eu estou limitando a liberdade de
expressão.

A intervenção penal traduz-se numa limitação de direitos fundamentais de todas as


pessoas (quer no sentido positivo ou negativo). Ou seja, os direitos fundamentais e o
direito constitucional são aqui também chamados para justificar incriminação. E o
princípio do direito penal do bem jurídico (critério orientador que confere legitimidade
ao DPE e À política criminal do Estado soberano) está configurado nas constituições
dos países. O princípio da ultima ratio (necessidade) deve ser analisado a fim de
salvaguardar outros direitos fundamentais constitucionalmente consagrados.

4. Política criminal econômica trans-sistemática em relação ao direito penal econômico


e intra-sistemática quanto à concepção de Estado consagrada nas constituições
(imanente aos sistemas jurídicos-constitucionais).

Qual o papel da política criminal econômica? É trans-sistemática em relação ao direito


penal econômico e intra-sistemática quanto à concepção de Estado. A política criminal
deve ser baseada nos valores consagrados da Constituição. Por ser criminal, está
subordinada ao princípio da necessidade. O Estado tem o dever de garantir os direitos
das pessoas, tem o dever de realizar a segurança das pessoas.

5. Algumas referências à Constituição Brasileira e à Constituição Portuguesa


AULA 02

Tema: Criminalidade corporativa, Criminologia e Aspectos Punitivos

Professora: Anabela Miranda Rodrigues

1. Introdução. O relevo da criminologia para a definição e punição do crime econômico

É uma criminalidade tão difícil de explicar, havendo várias teorias que ganham relevo (ex.:
crimes como objeto plural). É pouca precisão jurídica no que tange à definição desses
crimes econômicos.

Há uma convergência criminológica em torno de alguns aspectos: 1) essa criminalidade ser


ocupada por pessoas com qualificações e status e utilizam estruturas comuns à atividade
econômica lítica. Portanto, é um crime cometido por pessoas com respeitabilidade e status
social alto da sua ocupação.

Nesse contexto, a empresa é apontada como foco do perigo, no sentido que


proporcionaria o cometido de crimes, porque na empresa se desenvolvia um espírito
criminal de grupo, uma má conduta empresarial que fomentaria a aprendizagem de
prática criminais e técnicas de neutralização de culpa.

A má cultura empresarial é um conjunto de atitudes/técnica de realização de fatos


criminosos ou argumentos para justificar determinados comportamentos. Esses
argumentos incluem a terminologia autorizada pelos membros da organização (ex.:
contabilidade criativa).

Importante salientar que há danos (danosidade) relacionada com essa criminalidade. Essa
danosidade é algo identificador desta criminalidade (não é só o valor em si, o bem
jurídico). É o aporte terminológico para definição de crime. Essa danosidade que essa
criminalidade provoca é um aspecto fundamental para concepção do sistema punitivo
(adequado ao real resultado da prática desses crimes). A gravidade do ilícito é medida
também pelos danos que provoca, por isso que é tão importante esse aspecto da
danosidade social.

A “danosidade” é um dos aspectos que auxiliam a entender a gravidade dos ilícitos.

A criminologia tem apontado um aspecto importante: esses danos não são ilusórios. São
danos reais.

Esses danos não são ilusórios. São reais (Ex.: crimes ambientais, cujos danos são reais). Os
danos são maiores do que a insegurança sentida pela sociedade. Isso é fundamental
quando falamos de punição (proporcional ao grau de segurança). Por isso é necessário
separar a insegurança real e a insegurança irreal. Essa insegurança, por conta dos danos
causados, é menor que a segurança real (ex.: crimes fiscais x crimes de corrupção). Cada
vez mais a generalidade das pessoas está sensível aos danos reais que esse tipo de
criminalidade fiscal ou corrupção causam à sociedade. Toda a comunidade é uma vítima
em potencial, tendo um sentimento ais próxima da realidade daquilo que significa esse
tipo de criminalidade.
Foi criada uma ideia de que praticar crimes fiscais lá atrás de que era algo que não causava
muitos danos. Hoje há, diferente de antigamente, a pena de prisão para casos de crimes
fiscais.

Um aspecto também muito importante é a racionalidade empírica das opções legislativas.


Esta é uma tendência cada vez mais americana de conferir essa racionalidade empírica às
opções legislativas. Uma opção do legislador ordinário por incriminar um determinado
comportamento deve ser baseada na fundamentação do relevo do valor que se quer
proteger; demonstração do comportamento proibido afeta/põe em perigo de forma
negativa o bem jurídico; o legislador deve apontar uma motivação fundamentação sobre a
necessidade de recorrer à pena e não a uma outra sanção administrativa para alcançar o
objetivo pretendido que é a proteção daquele valor.

Tal garantia que estava ligada à bondade da lei não tem a ver com o órgão que emite e sim
com o procedimento que está na base da concepção da lei. É necessário inserir o controle
(dos tribunais constitucionais) na produção da lei. A garantia procedimental é a justificação
com base na análise empírica (necessidade de existência de pena para punir aquele
comportamento).

Há exemplos concretos da falta de análise empírica na adoção de leis em Portugal (não


havia demonstração empírica que seria necessário aumentar a pena de um crime sexual).
Portanto, é o fundo o princípio da necessidade da aplicação das penas (1ª coisa: essa
fundamentação sobre a necessidade da punição é tanto mais importante quanto o sistema
punitivo desses ordenamentos jurídicos se basearem num sistema preventivo de punição –
um sistema que se centra nos efeitos preventivos de punição).

Outro ponto: o princípio da necessidade da punição tem um significado preciso que é a


exigência da máxima restrição punitiva ou da proibição do excesso punitivo.

Apesar dos crimes econômicos serem cometidos através das empresas (Servindo-se as
pessoas da organização empresarial), os autores são pessoas individuais. São pessoas que
integram a categoria do colarinho branco (White collor criminals). Para além de todos os
aspectos, são pessoas

2. O significado dos programas de compliance no contexto do sistema punitivo. A


teoria da associação diferencial

Os crimes econômicos são cometidos por pessoas físicas, mas num contexto empresarial,
organizacional. Compliance é uma estratégia para fazer cumprir a lei.

Não é a intenção do compliance não é fechar a empresa a ponto do estado não poder
regular. A ideia é que os programas atuem de forma a conseguir penetrar nos pontos em
que o estado não consegue penetrar sozinho. Atuariam, assim, em conjunto, diante de um
meio inovador.

O que se pretende com esse programa de compliance é limitar o perímetro dos


comportamentos proibidos a fim deles serem sancionados. A eventualidade da sanção
penal é uma forma de incentivar os dirigentes empresariais a estabelecer mecanismos de
controle cada vez mais eficazes.
O compliance pode ser visto como uma nova forma de controle social, em que o Estado
com a intervenção penal (por estar no fim da linha) está em cooperação com esse controle
social do compliance. Essas normas internas da empresa (com códigos éticos de conduta,
etc...) ganham um sentido socializador, ou seja, é um nível de socialização que se interpõe
entre a violação da norma estadual e o desencadear das respostas pela violação da
normal. Ali há um novo nível de aplicação da lei que se passa nesse contexto empresarial
em que há então desenvolvimento da aplicação dos programas de compliance (ou seja, é
um mecanismo socializador).

A teoria da associação diferencial traduz-se num processo de aprendizagem diferencial. É o


ponto de partida do comportamento criminoso do colarinho branco. O comportamento
não é hereditário, mas é aprendido dentro de um processo cultural. Ou seja, os indivíduos
assumem determinados comportamentos criminosos ou então comportamentos
respeitadores da lei, em razão do processo de aprendizagem social (não é apenas a lei que
o dissuade de cometer crimes, tendo o processo de aprendizagem social um papel mais
intenso nisso).

Tiedemann referiu-se aos crimes ocupacionais essa ideia de que o crime está ligado ao
contexto, à ocupação, importando menos a personalidade do autor/procedência social...
Importa mais a especial maneira através da qual se dão os comportamentos criminosos
(modus operandi dos comportamentos criminosos). Nessa linha que Tiedemann fala da
special oportunities crimes – atos antisociais que podem ser cometidos por qualquer
pessoa que participa da atividade econômica-financeira, desde que haja oportunidade
para tanto, em razão da ausência de controle social.

3. O sistema punitivo: penas de prisão e de multa. A substituição da pena de prisão

As penas podem ser principais (prisão e multa) e acessórias. A pena de prisão hoje em
dia é prevista para esse tipo de criminalidade econômica (ex.: fiscais). Aqui temos que
falar dos limites mínimos e máximos para as penas de prisão (gravidade das penas de
prisão). Quem são os destinatários dessas penas? Relativamente às vítimas potenciais
desse tipo de crime é preciso entender que essas vítimas tem tendência a não se
considerar como vítimas Relativamente aos agentes potenciais desse crime, é preciso
ter atenção que eles tem uma enorme capacidade de imunidade e resistência a
identificar-se como criminosos. Não é só uma questão de neutralização de culpa, mas
também é uma questão da identificação como criminoso. Um criminoso de colarinho
branco tem tendência a dizer que quem é criminoso é quem viola determinado tipo de
crime (roubo, assassinato). Ou por ex.: apesar disso, já criei muitos empregos na minha
empresa..

Dito isso, é preciso pensar que o direito penal não é um D.P do autor. O DPE tem que
se visto como direito penal do fato (Gravidade do fato praticado). O fato geralmente é
muito grave relacionada à danosidade relativa a esses tipos de criminalidade. Temos
aqui um risco de encobrir a realidade, através da criação de normas penais.

A atividade econômica tem o risco como um vetor sempre presente.


Celeridade na aplicação da justiça: aspecto importante para garantir a aplicação da
pena.

De todos os fatores citados, é preciso entender que a gravidade da pena é uma


gravidade que tem que ser proporcional à gravidade do fato e que, para além da
celeridade na aplicação da lei, tem que levar em consideração a aplicação concreta da
pena de prisão que cabe ao juiz.

Portanto, não podemos pensar num sistema punitivo em abstrato sem pensar que no
caso concreto deve ser visto o princípio da proporcionalidade.

As penas para os crimes econômicos não devem ser penas pensadas em escalões mais
graves do que as penas para criminalidade comum. A tendência do ordenamento
jurídico português é que as penas de prisão serem previstas em grau baixo (enquanto a
burla normal é pena de X, a burla tributária é pena de X – 1, -2...)

Uma pena curta de prisão nesse tipo de delinquente já dá um “choque” suficiente, sem
os efeitos nefastos da dessocialização.

Na criminalidade fiscal há uma tendência contrária em Portugal...

A diferença da pena de multa: é uma pena que tem dificuldade de que se atinja o
efeito preventivo (principalmente contra as empresas gigantes). Se a responsabilidade
penal for de uma pessoa individual, tem que ser aplicada para alcançar os efeitos
preventivos.

A suspensão da pena em vários ordenamentos, no que diz respeito aos crimes fiscais,
está sujeito a condição de pagamento do imposto em dívida. Esse tipo de suspensão
traz problemas de constitucionalidade em Portugal (o argumento é que no fundo não é
uma pena e sim uma forma de arrecadar o imposto em dívida – sanção fiscal travestida
de pena). Apesar disso, entende-se como constitucional hoje em dia lá.
AULA 03

Tema: Responsabilidade Penal Individual na Criminalidade Corporativa

Professora: Anabela Miranda Rodrigues

1. Introdução. A crescente importância dos programas de compliance para efeitos


da responsabilidade penal corporativa e/ou dos administradores, dirigentes e
empregados.

O compliance surge num contexto de autorregulação regulada. Ou seja, o Estado não está
ausente, mas utiliza essa forma de autorregulação por causa da dificuldade de penetrar no
Âmbito das empresas para averiguar a prática de fatos delituosos.

Vale salientar que o que está em causa nos programas de compliance é que eles devem
integrar todas as medidas que objetivamente atestem que a uma empresa está organizada
(não só com as normas legais, mas também as éticas) e que também tem a finalidade de
desincentivar os dirigesntes/empregados de atuações à margem da legalidade. É preciso
termos a ideia de que implantação desses programas de compliance em determinadas
empresas leva obrigatoriamente a necessidade de compliance officer (implantação e
implementação dos programas de compliance) e temos toda uma cadeia de agentes de
compliance (pessoas que também tem deveres que resultam da institucionalização dos
programas de compliance que no fundo são programas que estabelecem, mediante
delegações, essa rede de deveres que diversas pessoas dentro da empresa precisam cumprir).

Não se trata apenas de criar e mostrar que tem um programa de compliance, é preciso que
seja um programa efetivo. Não há benefício penal à empresa que implante um bom e efetivo
programa de compliance (não há previsão legal).

2. Criminalidade (econômica) corporativa e deveres de garante (os arts. 10º nº², CP


Português; Art. 13, 2, CP Brasileiro; e 11, 2, CP Espanhol: o problema da omissão
e da responsabilidade dos dirigentes empresariais por comissão por omissão.

3. Criminalidade econômica corporativa e responsabilidade penal corporativa:


modelos e apreciação crítica. Um sistema punitivo bi-direcionado: a
responsabilidade autônoma da pessoa coletiva e a responsabilidade individual
da pessoa física.

É necessário analisar algumas coisas para que se ateste a efetividade do programa de


compliance:

a) (primeira parte do teste de efetividade) Efetividade abstrata do programa e análise da


forma que estão implantados seus mecanismos (canal de denúncias, sanções internas
e disciplinares). Análise da cultura instalada dentro da empresa. Detecção de falhas no
sistema;

b) (segunda parte do teste de efetividade) Tem que ser demonstrado que a empresa, de
maneira continuada, não tomou as medidas especificas para prevenir fatos da espécie
que foram contidos e fatos que foram contidos.

Modelo autônomo de responsabilidade penal das empresas traz um aspecto importantíssimo


relacionado à eficácia que está exatamente contido nos programas de compliance. Aqui, como
já dito, precisa ser de fato efetivo.

4. O critério da imputação da responsabilidade penal às pessoas coletivas: a lei e a


jurisprudência – referências às legislações portuguesa, brasileira, espanhola e
italiana.

5. Responsabilidade penal de dirigentes, administradores e empregados no


contexto empresarial (relevância de programas de compliance).

AULA 04

Tema: Responsabilidade penal das pessoas jurídicas

Professora: Maria João Antunes

Em Portugal, inexplicavelmente não há normas de natureza processual penal para quando uma
PJ é acusada em um processo penal... portanto, essa questão tem sido deixada para a doutrina
e jurisprudência com prejuízos evidentes no ponto de vista das garantias processuais penais
das PJ... O mesmo se passa no Brasil. A não solução (do BR e do PT) não é a regra nos outros
países.

No CPP francês existe normas processuais específicas no que tange à responsabilidade penal
da pessoa jurídica.

Na Espanha, em 2011 a lei processual penal espanhola foi alterada no sentido de prever
normas de natureza processual específicas em matéria de regras competência, representação
da pessoa jurídica, declaração das pessoas jurídicas, medidas cautelares, domicílio, etc. Há um
leque muito extenso de matérias que foram alteradas em função da natureza jurídica da
pessoa arguida. O CPP Espanhol traz que a PJ tem direito ao silêncio.

A professora cita a lei processual penal de outros países e tece alguns comentários.
O Brasil mantém a regra de que só as pessoas físicas são passíveis de resp. criminal (Lei
9105/98 – Lei crimes ambientais, que prevê resp. penal das PJ no brasil apenas para crimes
ambientais).

A lei de crimes ambientais é omissa no que tange às leis processuais penais, não há nada
específico.

O princípio do devido processo legal no brasil não é cumprido devidamente relativamente às


PJ, haja vista que sobre as PJ nada é dito nessa lei de crimes ambientais.

Há ordenamentos jurídicos que não tem em suas CF uma palavra sobre direitos, liberdades e
garantias das pessoas jurídicas (CF espanhol, CF brasileira)... Temos CFs, como a alemã, que
nos diz que as PJ, tais como as PF, são também titulares de direitos fundamentais, mas
acrescenta-se que esses direitos (pelas sua natureza) sejam aplicáveis a pessoas jurídicas. Não
é todo e qualquer direito fundamental que se aplica à PJ. Um dos direitos que não é aplicados
às PJs: direito à vida, direito de constituir família...

O modelo português nos diz que as PJ gozam dos direitos das PF e estão sujeitos aos mesmos
deveres das PF, desde que os direitos e deveres sejam compatíveis à sua natureza.

O direito do sigilo à correspondência é compatível com direito de uma PJ, mas não tem
necessariamente que ter o mesmo conteúdo quando está titulado por uma PJ. A professora
traz jurisprudência do Tribunal Constitucional Português:

E, 2010, o T.C.P. entendeu que seria necessário fazer essa distinção entre PJ e PF, e que a PJ
não poderia ter a mesma proteção da PF. Apesar disso, em 2018 inverteu essa jurisprudência e
por uma decisão não unanime entendeu que seria inconstitucional não admitir proteção
jurídica das PJ com fins lucrativos. O tribunal também entendeu que as PJ gozam da presunção
de não culpabilidade (inocência). O tribunal reconheceu também o direito de inviolabilidade
de correspondência, apesar de que o conteúdo do direito pode ser diferente por se tratar de
PJ.

Outra matéria interessante é a matéria das buscas domiciliares. Foi levada ao TCP a questão
acerca da validade da extensão norma da Constituição portuguesa que autorizava ao juiz a
busca domiciliar da PF também às PJs. Foi aqui que o TCP que não valia para as pessoas
jurídicas. O TCP entendeu que inviolabilidade de domicílio exprime numa área multiparticular
o direito da reserva da intimidade da vida privada e familiar. Portanto, como o TCP considerou
domicilio como uma projeção espacial da pessoa física, entendeu que não é compatível com a
titularidade da PJ o direito da inviolabilidade do domicílio tal como está consagrado no art. 34
da Constituição Portuguesa.

A equiparação da posição processual penal da PF e da PJ traz algumas discussões... Umas


pessoas entendem que, a partir do momento que se fez a opção de responsabilizar
penalmente as PJ, então devemos equiparar seu instituto ao das PF... A partir do momento
que preciso responsabilizar penalmente (disparar bala de canhão) ao invés de responsabilizar
meramente administrativamente (balas comuns), eu devo sim equipará-las do ponto de vista
de sua posição processual às PF que são também responsabilizadas penalmente.

Do outro lado das coisas, outras pessoas entendem que não deve ter equiparação, porque
quando estamos tratando das PJ estamos tratando de alguém que não tem corpo para
golpear, nem alma para condenar. Dizem ainda que as PFs foram colocadas numa situação “de
fraqueza” em relação ao Estado, o que justificaria tantas garantias... E que esse pensamento
não faz sentido quando substituímos as PF’s pelas PJ’s porque muitas vezes as PJs são tão ou
mais poderosas que o próprio Estado.

As normas constitucionais de onde decorrem pretensões de defesa são típicas de direitos


subjetivos fundamentais de natureza processual também consagram princípios constitucionais
objetivos de processo penal, que garantem que o Estado administre a justiça penal segundo
determinadas regras. Ou seja, hoje defende-se que os direitos fundamentais tenham uma
dimensão objetiva além de terem uma dimensão subjetiva.

A partir do momento que reconhecemos a dimensão objetiva dos direitos fundamentais, uma
norma constitucional como aquela que consagram um princípio como o da presunção de
inocência, consagra o direito subjetivo à presunção de inocência...

No fundo, temos uma série de princípios que conformam determinados processos penais
(Contraditório, devido processo legal, ampla defesa)... São todos princípios gerais de processo
penal que decorrem do reconhecimento de uma dimensão objetiva dos direitos fundamentais.
No processo penal só faz sentido equiparar a posição processual da PJ à posição processual da
PF que também seja acusada no processo penal.

Nos EUA as PJs são representadas pelo defensor, havendo confusão entre o defensor e a PJ.

Quem é que representa a PJ num processo penal? A lição de direito comparado mostra que a
pessoa que representa a PJ não tem que ser necessariamente seu representante legal,
portanto a regra que hoje é defendida (e está no CP espanhol desde 2011) é que cabe à PJ
dizer quem é que vai representar no processo. É até vantajoso que não seja o representante
legal, já que o representante poderia ser processado também (no mesmo processo) e gerar
uma situação de conflito.

A professora entende que o melhor modelo é o que dá liberdade à PJ de escolher quem será
designado para representar a PJ num processo penal. A PJ precisa desse “rosto” que não pode
se confundir com o defensor da PJ.

Quem é o sujeito do processo? A pessoa jurídica (e não seu representante no processo). O


representante é um mero participante processual (e não sujeito). Relativamente à uma
medida de coação, quem podemos sujeitar no processo penal? Podemos sujeitar a PJ mas não
podemos sujeitar o representante.

A PJ tem o direito a não autoincriminação? Estamos nos referindo ao direito que as PJ terão ou
não de prestar declarações em processo penal... Seria o direito ao silêncio... Lembrando que a
CF Brasileira diz que o direito ao silêncio é um direito dos presos. Mas a jurisprudência e
doutrina estende isso para todos.

Nos EUA entende-se que o direito ao silencio (5ª emenda) só pode ser gozado por pessoas
físicas.

A professora entende que as PJ são titulares desse direito e que deveríamos fundar esse
direito para as PJs.

Precisamos estender o direito ao silencio às testemunhas que serão chamadas e que fazrem
parte da PJ.
AULA 05

Tema: Recuperação de Ativos

Professora: Maria João Antunes

Esse instrumento de recuperação de ativos resulta da insuficiência das sanções penais. Qual é
a natureza jurídica do confisco de bens? Hoje a doutrina duvida que a natureza seja penal. Isso
será abordado em breve.

O objetivo da medida de confisco de bens é de que o crime não compense. Com isso, podemos
fazer com que o agente do crime fique com a situação patrimonial igual ao que tinha antes da
prática de crimes.

Do ponto de vista do direito europeu, temos dois instrumentos fundamentais: a) diretiva de


2014 do parlamento europeu e do conselho, sobre o congelamento e a perda dos
instrumentos do crime na União Europeia; b) regulamento do parlamento europeu e do
conselho, de 2018, relativo ao reconhecimento mútuo das decisões de apreensões e de perda.

O direito penal do inimigo (Jakobs) é um instrumento descritivo/analítico/crítico-denunciador


do direito positivo. Dessa forma, através desse conceito, podemos perceber nessas matérias
que já estamos utilizamos um direito diferenciado para esse tipo de criminalidade.

Obs.: a expressão recuperação de ativos é uma expressão pouca abrangente.

No que tange à evolução verificada nos diversos ordenamentos jurídicos, vale ressaltar que as
sanções penais tem se mostrado insuficiente para combater esse tipo de criminalidade. Ou
seja, pode compensar ao agente a prática de um crime de corrupção ser punido com uma pena
de prisão se nada mais for acrescentado à pena de prisão. A perda das vantagens obtidas com
o crime visa, em última instância, colocar o agente na situação em que estaria se não tivesse
praticado o crime. Só nessa situação, então, podemos garantir que não compensa praticar o
crime. Além de cumprir uma pena, o Estado irá confiscar o produto que o criminoso obteve
com o crime.

Aqui é uma realidade distinta da situação de perda dos instrumentos do crime (ex.: se eu
matava alguém usando uma arma, o Estado declarava a perda da arma). O ordenamento BR e
PT não fez a distinção entre essas duas realidades: instrumentos do crime e vantagens do
crime.

O congelamento dos bens durante o processo serve para que o estado possa garantir que a
decisão de perda possa se tornar efetiva. No direito brasileiro se distingue o instituto da
apreensão do instituto do sequestro de bens móveis/imóveis.

A distinção torna-se imperiosa por outra razão, principalmente no direito PT: quem deve ser
competente no processo para decretar a apreensão ou medida cautelar que leve à perda do
produto/vantagens do crime? O juiz das garantias.

Essa questão supracitada foi objeto de discussão no T.C.P.: quando eu congelo uma vantagem
de um crime no âmbito de um processo (Sequestro), para garantir no final que esse bem é
declarado perdido em favor do Estado, a questão aqui é se eu estou ou não a restringir o
direito à propriedade privada. Foi alegado que por se tratar de restrição a um direito
fundamental, a competência seria sempre de um juiz. O entendimento da professora é que
não faz sentido, no Âmbito do processo penal, partir do pressuposto de que os bens
sequestrados/apreendidos são bens ilícitos (presunção da inocência). Ou seja, sobre esses
bens não pode impender uma presunção de ilicitude. Outra coisa é que depois da condenação
pela prática do crime, aí sim, a perda de vantagens já tem a ver com a prática dos crimes.
Assim, nesse momento, já podemos dizer que não podemos tutelar a propriedade ilícita.

Depois do trânsito em julgado, ainda podemos investigar financeiramente o agente para ver se
tem mais bens para serem declarados perdidos.

Em 2012 o legislador brasileiro incluiu no CP que poderá decretar a perda de valores caso os
bens e produtos dos crimes não sejam encontrados.

No instituto da perda alargada, o que sucede é que são declarados perdidos bens em favor do
Estado sem que relativamente a esses bens tenha havido condenação pela prática de um
crime. Isso abre um novo leque de soluções, interrogações... No fundo estamos admitindo
perda de bens sem ligarmos diretamente à condenação da prática de um crime.

O art. 7 da Lei portuguesa traz esse instituto da perda alargada. Esse instituto permite que, a
partir do momento em que o agente é condenado pela prática desses crimes, poderá ser
avaliado pelo Estado esse patrimônio e se chegarmos a conclusão que o patrimônio não é
congruente com seu rendimento lícito, podemos declarar perdido em favor do Estado o valor
dessa incongruência. Presume-se que esse valor constitui uma vantagem de uma atividade
criminosa anterior. O fundamento, assim, é uma atividade criminosa anterior presumida. Esse
instituto tem como base a punição ao enriquecimento ilícito.

A perda alargada é uma medida administrativa aplicada devido ao processo penal. Portanto, a
doutrina portuguesa majoritária tem o entendimento que não se trata de uma medida de
natureza penal e sim administrativa. A pena alargada correspondente a algo muito distinto do
que estávamos habituados em relação à perda tradicional, clássica, por se perder a ligação à
condenação da prática de um crime, bastando aqui uma atividade criminosa anterior.

Qual a natureza do confisco de bens? Temos a situação que podemos ter o confisco de bens
sem condenação. O C.P. Português traz momentos que nos fazem duvidar da natureza penal
do confisco. A morte do agente processado não extingue o processo que irá declarar a perda
em favor do Estado. Ou seja, sem condenação podemos ter a perda.

O entendimento de hoje é que a medida tem a natureza civil. Vai se buscar a situação
patrimonial que existia antes da prática do crime, o que lembra o instituto civil da indenização.

AULA 06

Tema: Jurisprudência Europeia e Criminalidade Econômico Financeira

Professora: Maria João Antunes

O parâmetro do princípio da proporcionalidade é também um parâmetro adequado para


avaliar a legitimidade da intervenção penal.
AULA 07

Tema: Lavagem de Dinheiro

Professora: Anabela Miranda Rodrigues

1. Introdução – Aspectos criminológicos e de política criminal. Modelo unitário ou dual


de luta contra a lavagem.

Quando falamos de lavagem, o núcleo dessa atividade de lavagem reside em alguém


querer ocultar/dissimular vantagens provenientes da prática de crimes, com finalidade
de dificultar significativamente a detenção, perda, confisco dessas vantagens e
perseguição penal/punição dos autores dos crimes que foram origem dessa vantagem.

Um pequeno traficante de drogas que faz depósitos na conta bancária de um familiar...


Ou um traficante de drogas grande que faz vários depósitos em contas de laranjas
pode estar cometendo a lavagem de dinheiro.

Um outro traço criminológico da lavagem é que esta se liga à uma criminalidade grave.
O crime de tráfico de drogas estava lá na origem do crime de lavagem de dinheiro. O
tráfico é a criminalidade que mais preocupava os Estados em geral... Foi contra essa
criminalidade gravíssima e que gerava proventos enormes que criou a primeira
preocupação internacional, ao nível das nações unidas que se originou a lavagem de
dinheiro para responder a essa realidade criminológica. Acontece bastante na lavagem
a mistura entre as vantagens lícitas e ilícitas (superfaturação).

O GAFI (Grupo de Ação Financeira contra Lavagem de Dinheiro) publica uma série de
relatórios, como relatórios com tipologias sobre a lavagem, providencia informações,
etc.

São três fases de execução da lavagem:

- Colocação/conversão/transferência (placement stage)

- Ocultação/dissimulação/estratificação (layering stage)

- Utilização/integração (integration stage)

O número de condenações por lavagem de capitais é muito baixa. É um crime


simbólico, cuja aplicação efetiva é muito baixa. Apesar da lavagem ser um crime
relacional (que depende de outros), precisa ser entendido de forma autônoma. Se o
crime de branqueamento não tiver um fundamento que, por si só, o justifique, ele
perde legitimidade como incriminação e nesse caso temos a crítica de que a lavagem
só serviria para punir agentes duplamente por crimes que não foram descobertos, ou
seja, seria um crime instrumento.
O crime de lavagem deve ser autônomo, ter uma legitimidade própria, apesar de sua
relação com criminalidade antecedente.

Ademais, quanto à expansão da incriminação pela lavagem, observando-a


principalmente em relação à criminalidade antecedente. Como a lavagem “nasceu” com o
tráfico e depois foi “evoluindo”, não mais deixou de crescer em relação ao delito antecedente.
Hoje em dia pode ter qualquer delito antecedente para existir a lavagem.

Observamos assim a tendência expansiva da incriminação da lavagem de capitais.

2. A legitimidade da incriminação da lavagem. O bem jurídico-penal e a danosidade do


crime.

Qual o bem jurídico-penal que justifica a incriminação de comportamentos ligados a


essas atividades (três fases da execução) que objetivam dissimular bens provenientes
da prática de delitos?

A partir do momento que incrimino por lavagem com qualquer crime anterior, eu
tenho que dizer que estou protegendo o interesse de tráfico lícito de dinheiro/bens
para um sistema econômico-financeiro para um determinado estado.

Nessa modalidade de lavagem, terei um bem jurídico para proteger, que seria esse
sistema econômico-financeiro, além de sua credibilidade, estabilidade, etc. Isso é a
justificação para a existência do crime de branqueamento.

Pela caracterização criminológica feita das atividades de lavagem, é evidente que esse
bem jurídico não é o único que será a base da lavagem. Aquilo que se quer incriminar
e punir é a dissimulação das vantagens e ocultação as vantagens, pois isso dificulta que
as instituições de controle desconheçam a criminalidade antecedente.

O interesse é atingir as vantagens obtidas com a prática dos crimes, para no fundo
satisfazer a finalidade político-criminal que é impedir que o crime compense. Os
agentes da prática desses crimes podem entender como a pena de prisão suportável
se pudessem manter os proventos obtido com a prática desses crimes. Esse é o bem
jurídico penal no sistema penal português (sempre aberto à uma interpretação crítica).
Se o bem jurídico, assim, for a administração da justiça, o branqueamento.

O bem jurídico da administração da justiça não justifica qualquer atuação do Estado.

Do ponto de vista da proibição, a prática de condutas de lavagem é bastante inelástica.


O que justifica a punição de crimes cumulativos é a que a não punição de uma conduta
origina a massificação dos comportamentos ensejados, cuja tradição vai provocar a
lesão aos bens jurídicos.

Portanto, temos essas opções em confronto. Logo aqui temos emergindo um


problema com a luta da lavagem: u sistema de prevenção da lavagem pode (deve)
corresponder o interesse de assegurar a estabilidade do setor financeiro-econômico
do país. É legítimo que um Estado (ou até a U.E.) para a defesa de um mercado ou de
outros espaços regionais, estabeleca mecanismos de prevenção de lavagem de
capitais, porque para a estabilidade do sistema econômico, bancário, etc, é importante
que não circulem bens e capitais provenientes da prática de crimes. E mais: a
criminalidade é tão grave que, se tivermos um sistema de prevenção robusto, permite-
se detectar comportamentos, a partir de diversas atividades, que despertam alertas,
mecanismos... A partir dai, poderia perseguir os crimes que estão sem perseguição...
Estaria ai atingindo os proventos, a partir de um sistema preventivo robusto. Este
sistema não tem que corresponder necessariamente ao sistema punitivo. As proibições
não tem que ser punições ao nível repressivo. Aquilo que constitui crime (Atividades
criminosas de lavagens) devem ser atividades de lavagem para efeitos preventivos.
Essa relação deve existir. Aquilo que deve ser prevenido para proteger o sistema
financeiro não tem que ser exatamente um crime... Nem tudo que está a se prevenir
deve ser crime. Principalmente porque devemos evitar incriminações simbólicas
(ultima ratio). A criminalização deve proteger diante da danosidade.

A grande danosidade que justifica a incriminação e que faz que a incriminação não seja
menor do que aquilo que precisa ser prevenido é exatamente que há atividade de
ocultação/dissimulação das vantagens que fazem com que essas vantagens não sejam
conhecidos... A danosidade dessas condutas... Não se justifica que se incriminem todas
as condutas de ocultação, se essas atividades não são, elas próprias, altamente
danosas.

A incriminação da lavagem permite “alcançar” as vantagens do crime, mas não deve se


esgotar ai. A atividade de lavagem tem que ser perigosa, se não está incriminando
atividades que fazem parte normal da prática do crime.

3. Contexto internacional e referência específica à União Europeia

Convenção de Viena (1988): primeira vez que se fez referência ao crime de lavagem, mas
sem usar essa terminologia. Aqui que foram denominadas as três atividades de lavagem
anteriormente citadas.

Diretivas (não penais): não decorre nenhuma dessas diretivas a obrigação dos Estados
Europeus incriminares comportamentos descritos como lavagem. São diretivas para efeito
de prevenção. As atividades de lavagem aqui são para efeitos de serem prevenidas.

Na diretiva de 2018, a EU alargou a incriminação para os três tipos de atividades de


branqueamento. Quanti às infrações antecedentes, infere-se que em todos os
instrumentos internacionais as infrações antecedentes eram graves que se identificavam,
por sua atividade, através de um modelo misto. Não só os instrumentos internacionais,
como a EU, sempre se procurou consagrar a linha político criminal que considera a
lavagem ligada às infrações antecedentes graves.

Qual o limiar da pena de prisão aplicável? São todas os crimes puníveis com uma pena de
prisão cujo limite máximo seja superior a um ano. Nos sistemas que conhecem molduras
penais, ou seja, limiar mínimo de penas de prisão, então esse limiar deve ser superior a
seis meses. É isso que está sendo consagrado (por ex. a convenção de 2005 fala também
em pena de prisão superior a 4 anos de prisão).

Relativamente ao crime de lavagem, importa, desde já, salientar que a punição por crime
de lavagem tem lugar ainda que os fatos ilícitos típicos de onde provém as vantagens,
tenham lugar fora do território nacional.

(CP português) Se os fatos antecedentes ilícitos forem cometidos fora do território


nacional, eles precisam ser ilícitos também no país em que foram realizados.

Qual é o sentido do desvalor jurídico-penal do fato ilícito típico antecedente?

O que se exige desse fato antecedente para haver crime de lavagem? Como a lavagem é
um crime autônomo, significa que esse fato típico ilícito antecedente não tem que ser
provado como crime que se realizou relativamente ao qual se tenha que identificar, como
que o branqueador obteve as vantagens... Não interessa qual a concreta subsunção
jurídica do fato, desde que seja certo que integre necessariamente um desses crimes.
Portanto não é necessária uma condenação anterior, simultânea, em relação ao fato ilícito
antecedente.

Salienta-se que deve haver ao menos indícios do crime ilícito antecedente.

Atividades de branqueamento (evolução em Portugal – Lei 10/2002).

4. Tipo objetivo de ilícito

5. Tipo subjetivo de ilícito (referência à teoria da cegueira deliberada)

A exigência do dolo específico inviabilizaria muitos casos de punição por crimes de lavagem.
Isso por uma razão manifesta: é uma criminalidade é altamente complexa, portanto, se
fizéssemos a exigência de dolo específico (é preciso que o agente saiba que as vantagens
provêm de atividades criminosas, então teríamos dificuldade em constituir crimes de
branqueamento). Basta que o agente suspeite e atue... Ou seja basta dolo eventual.

AULA 08

Tema: Insider Trading

Professora: Anabela Miranda Rodrigues


1. Introdução. A crise de 2007/2008 e as necessidades regulatória e de supervisão
financeira.

Houve um estado de negação generalizado sobre o que estava acontecendo com o mercado
financeiro, levando à uma crise e a queda do Lehman Brothers em 2008. Essa queda teve um
impacto nas bolsas de mais de 50% e no sistema financeiro de vários países, iniciando uma
recessão econômica global. Desde então, houve progressos no sistema regulatório... De
qualquer modo, doze anos depois dessa crise financeira, verificamos duas coisas que não
mudaram: existência de entidades financeiras de enormes dimensões. As maiores entidades
financeiras cresceram e a concentração aumentou. Depois, pelo lado dos investidores
individuais, não houve muita aprendizagem no que toca aos comportamentos individuais...
Ainda não se pode dizer que teve aprendizagem. Dessa crise, percebemos a necessidade de
reformar na supervisão e regulação dos sistemas financeiros, os mercados devem ser mais
regulados e mais transparentes... Se a regulação do sistema financeiro não fez parte na Europa
das respostas iniciais à crise, é verdade que a mudança da agenda foi notória a partir de um
certo momento, isso para incutir confiança nos mercados financeiros... Nós temos em 2009,
portanto, verdadeiramente no ano seguinte à crise, a constituição do grupo larosière (pessoas
que analisaram melhorias na regulamentação financeira no âmbito da UE). A sua
reorganização se concentrava na melhoria da integridade do mercado e na proteção do
investidor. Nos Estados Unidos se consolidou o caráter ilícito do insider trader (década de
1930?). Portanto, temos nos EUA aquilo que podemos classificar como um modelo de security
law, determinando deveres de informação às empresas que atuam no mercado financeiro.
Uma estratégia de controle é essencial e nela a informação que circula nos mercados é um
valor fundamental para que os mercados sejam transparentes.

2. A agenda regulatória da União Europeia

A Europa passou a conhecer desenvolvimentos na regulação na década de 1980. Com o


estabelecimento de um quadro legislativo que se consubstanciou nas diretivas 89/592/CEE
(1989) E 2003/06/CE (2003). São diretivas que falam do insider trader especificamente.

Foram definidos em 1989 noves ilícitos na matéria do insider trader. Eram ilícitos inéditos.
Aqui não são CRIMES e sim ilícitos.

Estabeleceu-se uma harmonização ao nível de incriminação de insider trader e manipulação do


mercado na UE. Houve assim esse movimento de incriminação ao nível de comportamentos. A
Harmonização é necessária ao nível de quantidade de pena (belgica tem pena máxima de 1
ano pelo insider trader e na Itália temos 12 anos de pena máxima).

A diretiva 2014/57/UE não trouxe tantas novidades, tendo pecado em utilizar uma técnica que
não leva a uma verdadeira harmonização das penas em relação as punições dessas condutas.
Se prevê desde essa diretiva que os crimes relativos ao abuso de mercado tiveram seus limites
de pena aumentados.
Tudo que é matéria de prevenção deve ser vista à luz do regulamento nº 596/2014. A Lei
28/2017 portuguesa não só trouxe a matéria do regulamento citado anteriormente sobre o
abuso de mercado, como também trouxe a adaptação ao sistema nacional das normas
preventivas constantes do regulamento.

Uma crítica generalizada que se faz contra essas normas preventivas na UE é o fato de serem
muito minuciosas... Isso tem levado nossa entidade reguladora (correspondente brasileira:
CVM)

A regulação do mercado financeiro não é uma pura criação especulativa ou legislativa, sendo
essa regulação necessário ao desenvolvimento econômico e social.

O funcionamento eficiente do mercado deve ser também eficaz, correto. As ações de insider
trading são incompatíveis com a igualdade dos investidores no mercado. Com práticas de
insider trading são os interesses das empresas também que podem ser postas em causa.
Temos também os interesses coletivos, pondo em causa a confiança dos investidores.

Em resumo, são postos em causa interesses individuais, da sociedade e coletivos. Todos esses
interesses prendem-se no assegurar a confiança dos mercados.

3. A necessidade de intervenção penal. O bem jurídico-penal protegido.

É um bem jurídico referente à “ordenação” econômica: integridade do mercado. Na


dimensão da igualdade de oportunidade em relação a todos os investidores, em
relação às assimetrias provocadas pelo privilégio da informação ao dispor dos insider,
enquanto tais.

O mercado de valores mobiliários vive da informação. As informações são essenciais


para as decisões das empresas e dos investidores. Essa informação às vezes é reserva a
um ciclo limitado de pessoas, e depois de certo tempo são espalhadas para a
população em geral.

O momento da divulgação da informação e a sua qualidade é que vão influencias as


decisões dos agentes do mercado e tem reflexos significativos sobre os preços que se
formam no mercado. A formação desse preço de mercado, por força dessa divulgação
dessa informação, são bens públicos (base das transações em condições justas) e que
nascem da qualidade da informação e do momento de divulgação da informação.

Portanto, as ordenações em gerais proíbem o uso indevido dessas informações,


enquanto elas não forem tornadas públicas. Com isso, se pretende a garantia do
acesso à informação em igualdade para todos os investidores. No mercado, deve
ganhar o mais dotado observador e não aquele que por causa de um insider trader
consegue comprar/vender dos papéis sem risco. Com isso, busca-se a igualdade do
mercado no que toca à distribuição de riscos.

Qual o bem jurídico, assim, passível de proteção penal: informação.

As normas de abuso de informação punem uma situação de distorção da livre


concorrência por assimetria quanto a posse e uso de informações relevantes.
A criminalização do insider trader busca a regularização dos mercados, onde todos os
investidores gozam das mesmas oportunidades de investimento.

A área de tutela típica do crime de insider trader tem três vetores:

a) Com a incriminação não se trata de garantir uma igualdade geral e


indiscriminada entre os investidores no mercado. Portanto, não está
em causa uma igualdade de oportunidades e em face de todas as
assimetrias... Claro que existem fontes de desigualdade nos mercados,
como a própria diferença incontornável de fortunas. Está em causa
apenas a desigualdade de oportunidades induzida pela informação. Só
deve assumir importância a desigualdade diante de informação
privilegiada, portanto, a informação obtida por insiders enquanto tais.
Seria utópico pensar num mercado sem nenhuma desigualdade.

b) A operação que um insider leva a cabo já põe em causa essa igualdade


entre os investidores, já que eu tomo a decisão de investir com base
numa informação relevante que só ele conhece. Assim, o que define o
insider trader é o aproveitamento abusivo de uma posição de
superioridade radicada na qualidade do insider que por qualquer
razão, tem melhores informações que os outros.

c) O crime é configurado um crime de ação. O “non-trader”, ou seja,


aquele que deixa de investir (omissão) por causa de uma informação
privilegiada, não tem relevância penal, afinal se já é difícil rastrear o
que utiliza informação privilegiada para comprar/vender, é
praticamente impossível rastrear quem deixa de investir por conta de
uma informação privilegiada.

4. A incriminação do insider trading. A estrutura típica das incriminações no direito


português e no direito brasileiro.

Um aspecto importante é a comercialização da informação privilegiada (insider trader) e a


necessidade de sua regulamentação e eventualmente da sua criminalização. O insider trader
pode ser definido como o comércio do que está “dentro”. Seria a comercialização por um
individuo com uma posição especial (insider), com a compra e venda de valores mobiliários,
ações, etc, com base numa informação especial, de tanta relevância que é desconhecida dos
investigadores. Em posse dessa informação, resulta-se para o investidor uma vantagem em
relação a outra parte.

O crime de abuso de informação está previsto, não no CP Português, mas no Código de Valores
Mobiliários Porutuges (CMVM), que entrou em vigor em 2018.
Quem são os agentes do crime de insider trader, em Portugal: Temos uma clara distinção
entre:

INSIDERS PRIMÁRIOS: 1 – a), b), c) e d)

1- Quem disponha de informação privilegiada:

a) Devido à sua qualidade de titular de um órgão de administração, de direção ou de


fiscalização de um emitente ou de titular de uma participação no respetivo capital (corporates
insiders ou insiders internos);

Desses corporates insiders, vale ressaltar que isso levanta dificuldades de prova...
Afinal, precisa provar que aquela informação derivou do fato de ser acionisita. Vem se
falando que não deveria ser qualquer acionisita, e sim um acionista qualificado. Há
quem critique essa posição da doutrina, pois isso levaria à uma presunção de culpa, se
o tipo legal falasse em acionista qualificado... A professora entende que isso é
demasiado amplo. Essa informação deve estar ligada à qualidade do agente

b) Em razão do trabalho ou do serviço que preste, com caráter permanente ou ocasional, a


um emitente ou a outra entidade;

c) Em virtude de profissão ou função pública que exerça

Deve-se provar à ligação ao trabalho que o agente desempenha com a informação


privilegiada compartilhada.

d) Que, por qualquer forma, tenha sido obtida através de um facto ilícito ou que suponha a
prática de um facto ilícito;

e a transmita a alguém fora do âmbito normal das suas funções ou, com base nessa
informação, negoceie ou aconselhe alguém a negociar em valores mobiliários ou outros
instrumentos financeiros ou ordene a sua subscrição, aquisição, venda ou troca, direta ou
indiretamente, para si ou para outrem, é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena
de multa;

Por exemplo, o conhecimento de um atentado terrorista que trará repercussões na


bolsa de valores...

O tipo objetivo do ilícito é uma ação de transmissão de informação privilegiada e essa


transmissão em si mesma já é crime. Ou seja, temos um crime de perigo abstrato, apenas
com a mera transmissão da informação.

Outra forma da ação típica é a utilização da informação privilegiada, podendo essa utilização
ser feita por duas formas: a) aconselhamento ou b) emissão de ordem de compra/venda de
valores mobiliários

Outra forma da ação típica é a negociação que desemboca depois em compra/venda/troca...


A negociação já é, em si, o resultado lesivo do bem jurídico que é a informação. Aqui
teremos, portanto, a configuração típica já tem em si um dano. Essa configuração típica está
pré-ordenada e já tem em base que o bem jurídico penal é a informação. Em última análise
temos o bom funcionamento do mercado, a análise do mercado... Esse crime é sempre um
crime de bem jurídico abstrato, mas outra coisa é a configuração típica do crime. Como o
legislador penal dá à incriminação uma configuração faz com que essa incriminação respeite o
princípio da legalidade? Essa configuração típica está nessas formas que acabamos de elencar
anteriormente.

INSIDERS SECUNDÁRIOS:

Temos também os agentes secundários, que estão no número 3 desse artigo:

3 – Qualquer pessoa não abrangida pelo nº1 que, tendo conhecimento de uma
informação privilegiada, a transmita a outrem ou, com base nessa informação,
negoceie ou aconselhe alguém a negociar em valores mobiliários ou outros
instrumentos financeiros ou ordene a sua subscrição, aquisição, venda, troca ou a
modificação ou o cancelamento da ordem, direta ou indiretamente, para si ou para
outrem, é punida com pena de prisão até 4 anos ou com pena de multa até 240 dias.

Com isso, alarga-se o instituto do insider para as pessoas que tem conhecimento através de
um insider ou independentemente de fontes... Portanto, basta que a pessoa tenha
conhecimento que a informação é privilegiada para que o crime exista. Deixou-se, assim, de
exigir que os insiders secundários obtivessem a informação a partir de insiders primários. Essa
qualidade de insider é hoje uma qualidade alargada e expansão, bastando o mero
conhecimento do privilégio da informação.

O que é informação privilegiada:

• 4 – Entende-se por informação privilegiada toda a informação não tornada pública que,
sendo precisa e dizendo respeito, direta ou indiretamente, a qualquer emitente ou a valores
mobiliários ou outros instrumentos financeiros seria idónea, se lhe fosse dada publicidade,
para influenciar de maneira sensível o seu preço no mercado, nos termos do Regulamento (UE)
nº596/2014 …. e respetiva regulamentação e atos delegados.

Precisa-se, assim, cumprir três pressupostos cumulativos:

1) O agente precisa ser detentor de uma informação privilegiada que, ela é si mesmo,
tem que ter quatro características para ser privilegiada.
2) Essa informação que satisfaz essas quatro características tem que ser naturalmente
adquirida de forma tipicamente relevante.
3) O agente tem que atuar com base nessa informação privilegiada.

Quais são as quatro características da informação privilegiada?

a) Informação não tornada pública (ou seja, reservada);

b) Tem que ser uma informação que diz respeito à uma ou mais entidades emitentes ou
de valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (ou seja, precisa ser
específica)
c) A informação precisa ser precisa (ou seja, não podem ser meros rumores, sem
concretização). A informação “precisa” permite tirar uma conclusão acerca do impacto
dos preços. Portanto, permite uma decisão de investimento que envolve um risco
financeiro muito reduzido. Essa informação não precisa ser completa. A informação
que dizer respeito à apenas uma fase de uma operação já é uma informação precisa e
privilegiada.

d) A informação precisa ser idônea e precisa influenciar de maneira sensível o preço do


mercado (price sensitivity). Obviamente isso não se trata só de uma característica do
comportamento proibido. Ou seja, não é necessário provar que o uso daquela
informação influenciou diretamente o curso das negociações. É necessário provar que
a informação tinha idoneidade para influenciar o preço dos valores. Isso coloca
dificuldade na questão probatória, tendo que o juiz fazer um juízo de prognose,
comparando o uso das informações reservadas e os efeitos previsíveis da reação do
mercado à publicidade dada àquela informação. Se essa informação, quando
publicitada, fosse suscetível de influenciar em função da cotação dos preços do
mercado, então temos aí uma informação price sensitivy. Aqui se trata de prever uma
hipotética modificação do fluxo negocial com impacto na formação dos preços no
mercado. Isto que está de acordo com o fim da norma (sancionar uma assimetria
qualitativa quanto à posse e uso dessa informação reservada, que é violadora do
princípio da igualdade dos mercados).

A professora começa a falar sobre a questão probatória dos crimes de insider trader.

Quanto à legislação brasileira, observa-se que desde 2001 temos o crime de abuso de
informação (Lei 10.303/2001). A punição é de 1 a 5 anos de prisão e multa (de até 3 vezes o
montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime).

Aqui a professora fala do crime ser de perigo concreto, pois a informação é para proporcionar
vantagem indevida. Mas, no caso, o referente é a vantagem indevida. No Brasil, assim, pode-
se ver como tutela patrimonial dos investidores e não como uma tutela da
igualdade/confiança dos investidores.

É, por um lado, um crime concreto (ponto de vista da professora), sendo completamente


diferente do que se passa em Portugal. Na legislação portuguesa nunca se fala em vantagem...

Temos um tipo incriminador ABERTO... Uma norma penal em branco. A característica da


administrativização penal está evidente.

AULA 10

Tema: Bis in idem: Sanções administrativas e sanções penais

Professora: Helena Lobo da Costa

I. Introdução
No nosso sistema, estamos muito acostumados a trabalhar com a ideia de independência
entre as instâncias. Muitos julgados dizem que isso é um princípio, sendo que o DP e o D.Adm
deveriam ser aplicados de forma independente.

Em casos que existam decisões penais condenatórias, elas podem ser utilizadas no proc.
administrativo. No caso de crimes tributários, por ex, preciso ter a decisão na esfera fiscal para
que eu possa iniciar a investigação e processamento no âmbito criminal. Isso ocorre em
diversas instâncias, principalmente no âmbito do Dir. Penal Econômico...

Nos crimes ambientais, é comum que haja aplicação de uma sanção penal e
concomitantemente a aplicação de uma multa por um órgão administrativo.

Nos crimes de cartel, temos que as sanções aplicadas pelo CADE são vistas como
independentes em relação ao Dir Penal.

Outros exemplos de independência entre as penas e sanções: CVM, BACEN, PROCON,


Improbidade Adm.

Enfim... Quantas vezes pode o Estado sancionar pelo mesmo fato?

II. Direito Penal e Direito Administrativo Sancionador: diferenças e aproximações

Existe aqui o fenômeno da administrativização do direito penal e aumento do âmbito


sancionador do direito administrativo. Quanto ao primeiro fenômeno, temos especialmente
no D.P.E um uso excessivo de complementação normativa. Ou seja, para conseguir definir os
elementos do tipo penal, não me basta recorrer apenas à norma penal. Eu acabo trabalhando
com muitas normas penais em branco, com elementos normativos (Ex.: No direito penal
ambiental temos o crime de pesca proibida. O tipo não diz nada por si só. Devem ser
observados regramentos supralegais). Esse excesso de complementação acaba fazendo que
seja necessário recorrer à figura do administrativo para entender o tipo penal.

Quando estabeleço uma figura de crime financeiro, para entender modalidades de evasão de
divisas, precisarei abranger regulações administrativas para entender o que é o crime.

O Direito Penal tem uma racionalidade muito própria, com leituras e institutos próprios, com
olhares específicos de princípios jurídicos.
Os choques de realidades entre o Direito Penal e outras searas do direito pode levar muitas
vezes à desconsideração dos limites próprios do direito penal (como por ex. a impossibilidade
de aplicação analógica de conceitos de direito financeiro, comercial).

Quando é muito complicado compreender o conteúdo de uma norma penal, o destinatário


daquela lei fica numa situação de patente insegurança... Ele não sabe se a conduta dele se
amolda ou não ao tipo penal. Essa insegurança é muito grave, mas é importante entender o
aspecto de inefetividade da norma, pois se meu destinatário não compreende o que pode ou
não fazer, as pessoas não vão conseguir cumprir essa norma adequadamente, pois falta o
pressuposto de entendimento da norma. O problema da administrativização do direito penal
não é um problema apenas de garantias e sim de eficiência do direito penal. Quanto mais
difícil para o destinatário, maior será a falta de efetividade dessa norma.

Temos também alguns casos que esses problemas aparecem mais no âmbito processual.
Quase sempre o órgão administrativo que identifica esses ilícitos e comunica ao MP, levando
em conta apenas as nuances do direito administrativo (ou seja, sem uma filtragem para a
norma penal).

Um exemplo disso acontece no âmbito dos crimes tributários, em que os tribunais estão
começando a consolidar o entendimento que a esfera administrativa fiscal tendo se encerrado
e tendo dito que determinado comportamento configurou o não pagamento do tributo,
estaria aí a materialidade do delito. Mas, em alguns casos, isso é completamente inadmissível,
já que o fisco precisa, em algumas situações, autuar por presunção (ex.: não encontro o
contribuinte, ele não apresenta os livros fiscais, presumo o débito, etc.)... Isso não pode entrar
no direito penal sem passar por um filtro de racionalidade penal. Se estou trazendo esse dado
para um campo do direito que não admite a aplicação de presunções contrariamente ao
acusado, não posso aceitar essa autuação sem ao menos permitir um contraditório. Não se
pode aceitar no direito penal essa presunção que existe no direito tributário.

De outro lado, do âmbito do Dir. Adm. Sancionador, temos visto que o espaço de sanção vem
crescendo de forma marcante. Existe um claro alargamento de funções estatais
(principalmente desde a CF/88), impondo ao Estado uma série de obrigações positivas. Para
poder prestar esse “serviço”, o Estado precisou alargar suas funções. Ao fazer isso, precisa
regular novos âmbitos de comportamento, criando deveres que, uma vez descumpridos, serão
sancionados. Tenho, assim, um aumento do âmbito punitivo do Dir. Adm.

Num segundo momento, tenho uma onda de privatizações, concessões, etc, por parte do
Estado. Quando o Estado faz isso, mantém uma competência residual regulatória. Como
regulador, o Estado precisa fazer regras de conduta, fiscalizar o ente privado e, nas situações
em que esse ente privado não estiver cumprindo com suas obrigações, o ente será sancionado.
Tenho claramente um motivo para uma aplicação desse aspecto sancionador no âmbito do Dir.
Administrativo.

O Dir Adm. tem uma série de princípios que “automatizam” alguns atos (fé publica, etc)... Mas
essa lógica não pode ser imposta quando houver uma questão punitiva.

Se conseguirmos reestabelecer a relação entre esses dois âmbitos (penal e adm), realizando
trocar respeito as racionalidades específicas, poderíamos melhorar esse cenário. O Dir Penal
precisa começar a respeitar as decisões tomadas em outros âmbitos (respeitando as
racionalidades, claro)... Ex.: quando um órgão administ afirma que “Não houve um ilícito”, é
claro que o DP não poderá afirmar que houve um ilícito penal, já que o Dir Penal tem um
âmbito menos amplo. Quando o órgão admin, por exemplo, diz que aquilo é ilícito, deve ser
considerado um ponto de partida criminal.

Não são aproximações simplistas, e sim, aproximações respeitando as individualidades de


cada sistema.

Em relação às delimitações:

a) Distinção entre as várias funções do Estado (função administrativa e sancionadora)


b) Entender qual a diferença entre ilícito penal e ilícito administrativo (o penal não se
distingue do administrativo em relação a características da realidade. O ilícito
crime/administrativo é, por definição, é um ente normativo. Só no âmbito normativo,
poderei observar a diferenciação. O penal tem uma exigência de substrato material,
qual seja, o comportamento precisa colocar em perigo ou lesionar um bem jurídico
fundamental. Isso não é exigido do ilícito administrativo.

O ilícito administrativo vai poder aplicar uma série de sanções que encontramos no
âmbito penal, mas não poderá utilizará pena privativa de liberdade nem prestação de
serviços.
c) Refletir sobre a finalidade da sanção penal e da sanção administrativa.
Hoje em dia entende-se que a sanção penal não deve ser apenas retributiva.
Majoritariamente entende-se com uma finalidade preventiva.

III. Ne bis in idem transversal: fundamentos


O princípio do ne bis in idem não é uma regra expressa do direito penal brasileiro, mas ele vem
sendo aplicado com muita tranquilidade pelo judiciário, aceito pela doutrina. Todavia, em
alguns pontos específicos temos algumas menções à aplicação (ex. Art 8, CP).

O Pacto de São José da Costa Rica não traz a vedação do ne bis in idem transversal (apenas
penal). Mas a própria CIDH já teve decisões no sentido de que não se pode ter uma pena
contra uma pessoa por determinado fato e uma sanção militar aplicada contra a mesma
pessoa sobre o mesmo fato.

A Corte Europeia julgou vários casos falando que não importa se naquele estado específico a
sanção é regulatória, etc... Se ela tem um caráter sancionatório, punitivo, o Estado não pode
aplicar duas vezes (Caso Engels – estabeleceu critérios para analisar a existência de bis in
idem).

O Panorama Mundial nos dá claramente a percepção de que é possível aplicar de um ne bis in


idem entre o direito penal e o direito administrativo sancionador.

IV. Possibilidades no direito brasileiro

Análise do Direito Brasileiro: Como podemos, olhando para nosso ordenamento, observar essa
linha de pensamento? Existem pessoas que dizem que a dignidade da pessoa humana seria
fundamento para o ne bis is idem.

A professor particularmente não concorda com essa fundamentação. Alguns outros autores
vao dizer que o princípio da legalidade e a existência de tipicidade impõe a utilização do ne bis
in idem. Mais uma vez a professora não concorda. A legalidade nos diz pouco em termos de
conteúdo.

A professora também não vê fundamento no princípio da culpabilidade, haja vista que a


culpabilidade (como reprovação de uma conduta) é parte apenas do direito penal, sem
equivalência no direito administrativo.

Para a professora, é muito evidente que a fundamentação para a ideia da vedação do bis in
idem transversal (penal – administrativo) vem do princípio da PROPORCIONALIDADE, já que
este impõe que o Estado tenha uma atuação moderada.

Critérios para identificação da necessidade de aplicação do ne bis in idem:

a) Identidade de sujeitos;
b) Identidade de objeto;
c) Efeitos jurídicos das sanções (afinal, pode ser que eu não esteja diante exatamente de
uma sanção... Ex.: Auto de infração tributária. O valor do tributo, juros, não tem
caráter sancionatório.. Mas uma multa tem uma função sancionatória.

V. Política sancionadora integrada

Simplificar legislação para tornar procedimentos mais ágeis?

Vantagens para o administrado e para o próprio poder público, além da maior segurança
jurídica e organização sistêmica.

AULA 11

Tema: Crimes contra a Administração Pública: Corrupção, Peculato e Concussão

Professora: Daniela Cury

Como exemplo de crime funcional próprio temos a corrupção passiva: A condição de


funcionário público figura-se como uma elementar do tipo.

Crime funcional impróprio, caso não tenhamos um funcionário público, passa a ser um crime
comum que pode ser praticado por qualquer pessoa (peculato – furto).

AULA 12

Tema: Crimes contra a Administração Pública: Licitação, Improbidade e Anticorrupção

Professor:

Aula sem anotação.


AULA 13

Tema: Acordos de leniência e delação premiada

Professor: Víctor Gabriel Rodríguez

A delação premiada é um instituto de direito penal (material).

A delação premiada entra no sistema penal com a Lei de Crimes Hediondos (à época restrito
no crime de formação de quadrilha) – Lei 8.072/90.

A segunda lei que traz a Delação Premiada ao Brasil foi a Lei 9.080/95. A Eficácia também era
muito baixa.

A Lei 12.850/13 é uma lei mista, mas que se apresenta muito mais como uma lei processual.
Com essa lei trazendo de forma muito mais ampla a delação premiada, juntamente com todos
seus limites, ela se torna muito mais eficaz no Brasil.

O maior acordo de leniência da história foi feito por conta da operação lava jato (4,5bi de
dólares).

A Lei 13964/19 não conseguiu evitar a palavra delação. Na operação lava jato (HC 12483/2015
– Rel. Dias Toffoli) o STF decide não interpretar o instituto da delação premiada como um
instituto de direito penal material, complicando bastante a interpretação. Para se concluir que
se tratava de um negócio jurídico processual de caráter personalíssimo, o acórdão traz uma
doutrina absolutamente privatista, comparando-o a um negócio jurídico.

O professor realiza uma série de críticas sobre isso de entender a delação premiada como
negócio jurídico e meio de obtenção de prova.

AULA 14

Tema: Autoria e Participação no Direito Penal Econômico

Professor: João Daniel Rassi e Ana Carolina Oliveira

Nos Delitos de Empresa temos também os delitos ambientais, de relações de trabalho, etc,
que sempre vão levar a problemas de imputação de autoria e responsabilidade.
Quem são os autores, quando tratamos da teoria unitária: todo aquele que intervém para
concreção do resultado. Tem o mesmo peso aquele que segura a porta e deixa o carro ligado e
aquele que ameaça...

Quando entramos nas teorias restritigvas de autoria e participação temos uma série de
diferenciações necessárias para se chegar, inclusive, a um conceito de partícipe. Afinal, no
conceito unitário de autor dependemos muito do elemento subjetivo (o que queria cada
autor) e todos acabam recebendo a mesma pena. Num contexto de empresa, às vezes uma
participação muito pequena, num conceito unitário de autoria essa pessoa acaba recebendo a
mesma pena dos outros. Como os códigos penais estrangeiros resolvem? “Nós vamos
diferenciar todas as categorias de partícipes, explicar o que cada um desses representa,
definindo de forma nuclear quem é o autor e ai, se por uma questão de política criminal,
decidiremos que o partícipe merece uma mesma quantidade de pena que o autor.”

Autoria em sentido estrito: Autor que tem o domínio do fato, que tem capacidade de intervir.

Partícipes:

1. Indutor: É a pessoa que desperta no autor a resolução para cometer o crime. Essa
resolução não existia anteriormente. Dolosamente a pessoa induz a outra para
realizar o crime.
Sobre o duplo-dolo: a) tenho uma pessoa para convencer a praticar o crime; b) e
tenho uma pessoa que realize exatamente esse crime que eu quero que ela
realize.
O indutor convence e o autor, por livre vontade (de forma autônoma), decide
praticar o crime. Essa diferenciação é importante quando estudarmos autoria
mediata (quando uma pessoa utiliza outra como instrumento para a prática do
crime)
2. Cooperador necessário: É uma pessoa que aporta uma contribuição essencial para
o crime. Sem ele o crime não existiria da forma que ele existiu (Ex.: Num crime
contra a propriedade intelectual – roubo de software, o engenheiro informático
que conhece a brecha daquele software ou que criou o programa e dá instruções
específicas explicando como que eu, autor, poderia entrar naquele software
sigiloso, acaba se tornando um cooperador necessário. Eu até poderia descobrir
como entrar por outra pessoa, engenheiro... mas a cooperação que ele dá é
relevante e determinante para que eu realize o crime. Acontece que o cooperador
necessário não tem o controle dos fatos, não tem o domínio do fato... Depois que
ele dá a informação, esta sai do controle dele. Por isso, ele não entra na categoria
de autor.
3. Cúmplice: é a pessoa que oferece uma contribuição de menor importância,
oferecendo um bem que não é essencial... Não é algo “exclusivo” como é na
situação de um cooperador necessário. Temos aqui uma linha tênue entre o
cooperador necessário e o cúmplice.
Aplica-se muito pouco essa participação de menor importância

No Código Penal Alemão existe um tipo penal para um deles: Autor, Partícipe, indutor...

No Código Penal Espanhol: estão todos juntos no tipo penal

O que temos no Brasil hoje em dia é um conceito extensivo de autor. Nesse conceito, a base
de imputação penal dos autores se chama Teoria da Equivalência das Condições (art. 29, CP).
Isso significa que não importa o que você faça, tudo tem o mesmo peso (igualmente
reprovável). Quando pensamos no conceito extensivo de autor, precisamos pensar nas escolas
causalistas do delito (“Eu produzo um movimento corpóreo e meu movimento produz um
resultado”).

O conceito extensivo de autor é bastante criticado pelos finalistas que dizem “Eu preciso saber
que intenção, finalidade o autor tinha quando realizou esse movimento... As vezes teve dolo,
as vezes não.”

A partir daí, esse conceito extensivo de autor começa a se depurar no sentido de que é autor
quem tinha vontade de ser autor (animus domini) e o partícipe era a pessoa que tinha a
vontade de colaborar (animus de colaborar). E ai entrávamos num problema: “O que define a
diferença entre autoria e participação, se existe uma teoria da equivalência das condições”... O
que define um e outro é a questão da intenção, do elemento subjetivo, entrando justamente
na questão do finalismo, de provar o elemento subjetivo de cada um dos intervenientes.
Continuava sendo o conceito de autor “aquele que realiza o delito”. Então, nessa trajetória de
evolução dos conceitos da teoria do delito cada escola penal vai colocando um “tijolinho” no
que temos hoje em dia.

Para entendermos a relevância das teorias funcionalistas e da teoria do domínio do fato,


temos os seguintes apontamentos:

Teorias Formais (realização de atos típicos nucleares)  Finalismo (Mas perai... Qual a
intenção dos autores?)  [...]
A teoria formal deixava de fora àquele que tinha participado do crime, mas não tinha
executado o delito, restringindo muito a aplicação da lei. Essas Teorias Formais ficaram
vigentes na Alemanha até os anos 70/80, quando se começou a se discutir a imputação
objetiva, passando-se para a análise das teorias matérias, classificando a autoria e participação
de acordo com a contribuição/importância de cada um. Temos que lembrar sempre que:
autoria e participação é um critério de atribuição de responsabilidade (Basicamente é estudar
a teoria da imputação objetiva). Nessa, existe um resultado a quem em que medida posso
atribuir a responsabilidade pelo resultado. Interessa, aqui, o que que a conduta de cada um
representa para a realização do risco proibido do núcleo do tipo penal. Então, como cada um
se organiza ao redor do crime de roubo, homicídio, sonegação fiscal... Como a intervenção de
cada uma dessas pessoas afeta o núcleo proibido, o bem jurídico... E como posso atribuir a
cada um seu pequeno pedaço da contribuição para o crime, independente da intenção que a
pessoa tinha ou independente dela ter utilizado “corporalmente” algo para intervenção do
resultado. A imputação objetiva não substitui o nexo de causalidade. Nenhuma dessas teorias
(Extensiva, formal, domínio do fato) se desconecta da necessidade de causalidade.

Primeiro elemento para se observar a responsabilidade: nexo de causalidade. Depois que


analisamos a imputação objetiva e a subjetiva, nessa ordem. A conduta da pessoa tem uma
relação de causalidade (conditio sine qua non) para realização desse resultado? Se existe essa
relação, vou entrar na discussão da imputação objetiva (a realização de uma conduta proibida
que afeta ao núcleo do risco proibido por um tipo penal)... Depois disso, olho para a
responsabilidade subjetiva, a fim de identificar se existe o dolo ou a culpa... Uma vez definido
que eu tenho vinte pessoas que tem nexo de causalidade, posso atribuir a todas/algumas essas
pessoas a realização de uma conduta que afeta o núcleo do risco? Se sim, passo a analisar se
tem dolo ou culpa.. Só analisado esses três pontos, começo a distinguir quem são os autores e
quem são os partícipes, mas não vou em nenhum momento, na distinção de autores de
partícipes, me esquecer que estou num contexto de atribuição e de imputação de
responsabilidade. Isso que gera a confusão na doutrina brasileira sobre o domínio do fato. Isso
porque muitas pessoas confundem nexo de causalidade, critério de imputação de
responsabilidade e a teoria do domínio do fato (desenvolvida no contexto da imputação
objetiva, para distinguir entre autoria e participação).

Conceito Restritivo de Autor


Teoria do Domínio do Fato: teoria objetivo-subjetiva - auto quem tem em suas mãos o curso
dos acontecimentos típicos.

Domínio do fato: Quem executa de própria mão todos os elementos do tipo ou quando está
numa situação específica de controle do risco, onde eu posso interferir no curso de realização
desse crime. Tenho, assim, que ter a capacidade de interromper o iter criminis, já dado início a
tentativa. Está nas minhas mãos transformar os atos preparatórios no início da tentativa e
transformar a tentativa no início do resultado.

A ideia aqui é que o crime pertence à pessoa. Cada um dos intervenientes realiza uma peça
essencial do delito e sem elas o curso do crime não acontece da mesma forma e sem elas
existe uma possibilidade do fato não chegar ao resultado pretendido.

Santigo Mir Puig facilita a interpretação do domínio do fato com a palavra pertencimento. Ele
diz: “Esse crime pertence àquela pessoa?” “Ela entende esse crime como dela?” “Ela tem
palavra ativa para definir os rumos do crime?” “Existe plano conjunto, etc..?”. Se não tem
domínio do fato, mesmo que minha participação seja importante (ou seja, se não posso
intervir), então não tenho o domínio daquele fato. Se as pessoas

Quais são os problemas grandes da Teoria do Domínio do Fato na compreensão da dogmática


penal: domínio da vontade e domínio funcional do fato.

Domínio da vontade: Quem utiliza a um terceiro como instrumento (autoria mediata). O que o
Roxin vai dizer? Apesar do atirador ter realizado o “ato típico nuclear”, ele não tinha a
capacidade de decidir sobre o curso dos acontecimentos. Eu me aproveito de um déficit de
culpabilidade que já existe sob aquela pessoa ou eu crio nessa pessoa esse déficit. Quais são as
formas de utilizar o outro como instrumento.

A autoria mediata é uma forma da aplicação do domínio da vontade para definir quem é o
autor, segundo a teoria do domínio do fato. Esse é o caso específico de pessoas que usam
menores de idades, ou utilizam ameaças ou utilizam pessoas que não tem mais culpabilidade
por algum motivo.

Se o erro de tipo era vencível, se castiga como crime imprudente.

A ideia da autoria mediata é aproveitar a falta de culpabilidade da pessoa ou um erro


essencial.
Ex.: Na fila do aeroporto, alguém diz para você: “to com duas malas, pode despachar uma no
seu nome? Mala cheia de droga... Tráfico Internacional de Drogas... Tenho que provar que
estava atuando no erro de tipo invencível.”

Qual é o problema grave da autoria mediata dentro do contexto empresarial? Temos muitas
situações em que o conselho de administração ou o representante da empresa vai atuar
baseado no que o advogado orientou, contador orientar.. Quem seja seu assessor técnico. E se
esse assessor por atecnia ou dolosamente dá uma informação suficiente para convencer uma
pessoa a atuar em erro de tipo... Como funciona aqui se acontece sesse delito? É autoria
mediata ou não? Uma coisa é o Conselho De Administração desqualificado tecnicamente (que
não tem dolo de realizar a conduta)...

Os casos mais fáceis de autoria mediata por domínio da vontade são evidentemente a coação
ou o menor de idade.

Domínio do erro de tipo: pessoas tomando decisão em espaço curto de tempo para controlar
um hospital inteiro, por exemplo.

Autoria Mediata e Domínio da vontade só existem quando a pessoa da frente é absolutamente


irresponsável pelo que está fazendo, seja porque ela não tem culpabilidade, seja porque ela
não atuou sem conduta humana (ameaça, etc), seja porque atuou em erro de tipo invencível.

Ex.: se um médico fez uma transfusão de sangue, sabendo que esteve estava contaminado,
atuando de forma imprudente, ai já não tenho a instrumentalização. Como só existe autoria
mediata quando existe instrumento e o da frente conhece, suspeita, pode reconhecer ou
pode impedir, ele não está sendo totalmente “marionete” do outro, existindo uma estrutura
de autoria mediata (com dolo/imprudência) e participação (com dolo/imprudência), podendo
existir um autor culposo com partícipe culposo. É muito importante separar onde existe dolo e
onde existe culpa.

Domínio funcional do fato: O autor que realiza uma parte necessária da execução do plano
global, ainda que não seja fato típico em sentido estrito – estruturas organizadas. Essa é a
terceira escala que Roxin cria para definir a possibilidade de imputação como autor. Qual é a
ideia do domínio funcional do fato? Tenho uma estrutura organizada de tal forma que existem
certas pessoas que são absolutamente prescindíveis... Que podem participar dessa
organização, mas não tem o domínio do fato.

O domínio funcional do fato não pode ser de nenhuma forma entendido como
responsabilidade objetiva do superior hierárquico. Essa responsabilidade tem que ser no
sentido de organizar o crime, dentro de organizações à margem de qualquer legalidade. É
necessário que todas as pessoas envolvidas no crimes tenham voz ativa e capacidade de
interromper o curso dos acontecimentos e que algumas das pessoas que atuam na execução
desse plano possam ser peças dispensáveis.

Isso foi muito distorcido na AP 470 (Mensalão) pois a Teoria do Domínio do Fato foi utilizada
para tapar um monte de lacuna de prova que não existia... Ela foi utilizada para substituir o
nexo de causalidade, substituir a necessidade de prova do conhecimento e da intervenção de
cada um nesse contexto, além de ter sido utilizada também para eximir de prova de
dolo/imprudência (“todo mundo deve saber porque é superior hierárquico”). O superior
hierárquico tem o dever de delegar e não o dever de controlar tudo e conhecer tudo.

O que é um conceito do funcionalismo? Observar as relações de risco como uma coisa serve à
outra. Como uma conduta relaciona-se com o risco. Isso é o que Roxin está pensando quando
desenvolve a teoria do domínio do fato, porque ele se depara com uma teoria suprafinalista e
com uma teoria com um conceito extensivo de autor. Qual o outro problema que Roxin está
ligando quando cria a teoria do domínio do fato? “Ela começa a narrar a história do Muro de
Berlim” e questiona “quem teria a responsabilidade se alguém atravesse pelo muro de Berlim
de fosse fuzilado? É o soldado que atirou ou o comandante que estava na sala do comando
autorizando o fuzilamento.

É nesse conflito que ele desenvolve uma parte da Teoria do Domínio do Fato (Domínio
funcional do fato). Essa parte foi adotada no Brasil e mal interpretada. A famosa Teoria dos
Aparelhos Organizados Do Poder.

Princípio de acessoriedade limitada da participação: Sem autor não existe participe. A


participação é acessória ao fato antijurídico (exige tipicidade e antijuridicidade, mas não
culpabilidade).

Os crimes econômicos acabam admitindo um conceito de autor um pouco mais amplo, tendo
em vista a natureza do núcleo dos tipos penais.

As condutas neutras são oblíquas, acontecem a qualquer hora em qualquer lugar. Em


determinadas circunstancias podem ser questionadas sobre sua eventual cumplicidade. A
questão da participação neutra é um problema de participação criminal em sentido estrito.

Vale destacar os fundamentos da participação. Se a questão da ação neutra é ligada à


participação, então preciso saber quando eu puno o partícipe.
Por que eu puno o partícipe?

Teorias:

a) Teoria do Ataque Acessório ao Bem Jurídico Protegido: o que fundamenta a pena do


partícipe é a sua contribuição à lesão do bem jurídico (ou seja, o que ela fez para
ajudar o autor). Assim, nessas teorias da causação, o partícipe é ligado ao autor
porque ele contribui ao autor quando este lesiona o bem jurídico. Acontece que,
especificamente na teoria do ataque acessório ao bem jurídico, diz-se que o injusto do
partícipe, no entanto, parte é o mesmo do autor e parte é o injusto dele mesmo, com
características próprias do partícipe, levando a entender que podemos valorar a
conduta do partícipe no critério de imputação de uma forma diferente do autor. Claro,
é acessório... Ele contribui com o injusto do autor, então parte precisa ser relacionado
com isso. O que essa Teoria sustenta (E o professor acolhe) é que essa outra parte do
injusto é dele mesmo, com características especiais...
A solidariedade pode ser objetiva e criminalizada (Ex.: Abandono de incapaz)
O legislador também pune a falta de solidariedade no art. 13, §2º (omissão penal
relevante).
Se o interveniente incrementou o risco de forma ilícita: partícipe
Se o interveniente incrementou o risco de forma lícita: conduta neutra

O interveniente vai ser considerado como aquele que incrementou um risco


(permitido ou não permitido) se existe uma lei dizendo que ele tinha uma obrigação de
evitar o resultado. Então, sendo mais evidente, se não tiver uma lei dizendo que o
taxista precisa noticiar à autoridade toda vez que tiver suspeita de roubo, a conduta é
neutra.
E tivesse uma portaria ou regramento... Não serviria, precisaria ser uma lei específica.

AULA 15 – Justiça Negocial no Direito Penal Econômico

Professor: João Paulo Martinelli

O acordo de colaboração premiada é negócio jurídico processual e meio de obtenção de prova,


que pressupõe utilidade e interesse públicos (art. 3º-A, Lei 12.850/13, alterada pela Lei
13.964/19).
O pacote anticrime ressalta entendimento do STF (Ementa: Negócio jurídico processual
personalíssimo. Impugnação por coautores ou partícipes do colaborador. Inadmissibilidade).

Por ser negócio jurídico, a parte interessada tem vontade livre para celebrar o acordo, de
acordo com seus interesses. É necessário, por óbvio, voluntariedade, para realização desse
negócio.

Se o possível colaborador estiver preso, pode ser realizada uma audiência (com ou sem
presença do MP) com a finalidade do magistrado analisar não só a legalidade, regularidade e a
voluntariedade do colaborador, especialmente nos casos em que o colaborador esteve
cumprindo alguma medida cautelar (Real ou Pessoal – especialmente no caso da prisão
preventiva).

O juiz, assim, precisa verificar se houve algum tipo de pressão (não precisa ser ameaça
explícita)... Pode ser um mero comportamento da autoridade, como requisição de prisão ou
cautelar contra uma pessoa próxima ao colaborador. Assim, a voluntariedade é requisito
essencial, bem como a existência de defensor regularmente autorizado à celebrar acordo
mediante procuração.

O acordo como meio de obtenção de prova: A prova é manifestação de um fato. A maneira


como o fato é demonstrado é um meio de prova (testemunha, foto, etc). O meio de prova
deve convencer o magistrado que determinado fato aconteceu.

A colaboração premiada não permite, por si só, o magistrado receber denúncia, decretar
cautelar, condenar as pessoas delatadas. As informações obtidas por meio da colaboração
premiada funcionam como um caminho inicial para obtenção de outros meios de prova, que
devem corroborar aquilo que está na colaboração e, aí sim, é possível receber denúncia,
decretar cautelar, condenar, etc.

Se a Polícia celebrar o acordo sem a participação do MP (e este não concordar) pode levar a
um problema grave, tendo em vista que o MP como titular da ação penal pode não se
convencer da suficiência das informações e até deixar de oferecer denúncia (ou, no caso de
haver processo, requerer a absolvição do réu).

Só pode haver qualquer tipo de acordo quando houver legitimidade para oferecimento da
denúncia (e para isso precisa existir justa causa). OU seja, se não existir justa causa, sequer
pode existir acordo de colaboração.
O marco de confidencialidade acontece quando há o recebimento da proposta para
formalização de acordo da colaboração. Ou seja, a partir desse momento deve haver total
sigilo entre colaborador, defensor e MP. A proposta de colaboração pode ser indeferida pelo
MP, desde que essa decisão seja justificada pelo MP (ex.: porque a informação é irrelevante ou
já é de conhecimento). Havendo indeferimento sumário, dentro dos princípios do processo
acusatório, não há meios para recorrer ao judiciário. É possível que, havendo mudança do
Promotor e Procurador na condução do caso, haja nova tentativa de acordo de colaboração.
Se o MP não indefere sumariamente, há, ao menos, um interesse.

A colaboração não é um direito subjetivo do colaborador.

O art. 4 da mesma lei fala sobre o perdão judicial.

O benefício maior é o da imunidade, presente no mesmo artigo, §4º. Só pode ser concedida a
imunidade se ele não for líder da OrCrim e se for o primeiro a colaborar em relação a
determinado fato. Na redação anterior não estava muito claro isso.

Considera existente o conhecimento prévio da informação quando o MP ou a Autoridade


competente tenha instaurado Inquérito Policial ou Procedimento investigatório para apuração
dos fatos apresentados pelo colaborador.

Nessa audiência inicial, o juiz deve:

a) Analisar a regularidade e legalidade do acordo;


b) Analisar a adequação dos benefícios do acordo aos previstos no caput e nos §§4º e 5º
do art. 4º;
c) Verificar o resultado prático da colaboração de acordo com as consequências dos fatos
descobertos;
d) Confirmar a voluntariedade da manifestação de vontade, especialmente nos casos em
que o colaborador está ou esteve sob efeito de medidas cautelares.

Se for caso de imunidade processual, o juiz ao rejeitar a denúncia deve sinalizar que houve
acordo de colaboração com esse “prêmio”.

Da decisão que homologa o acordo, cabe recurso (por exemplo, o colaborador pode entender
que não foi avisado sobre algo específico, etc).

O juiz pode recusar a homologação à proposta que não atender aos requisitos legais, ou
adequá-la ao caso concreto, encaminhando novamente para a MP e para o colaborador, a fim
de adequar para o que está na lei. Essa recusa deve ser recusada, na medida que é uma
decisão interlocutória.

O magistrado deve analisar fundamentalmente o mérito da denúncia. O MP só pode negociar


a colaboração se houver justa causa para oferecimento de ação penal. Isso é absolutamente
fundamental.

No parágrafo 10-A (art. 4), temos a previsão legal no caso de pluralidades de agentes
realizando acordo de colaboração. Diz o art. que em todas as fases do processo, deve-se
garantir ao réu delatado a oportunidade de manifestar-se após o decurso do prazo concedido
ao réu que o delatou.

O STF definiu em 2019 que quando há mais de um réu e eles são acusados de OrCrim, todos ou
qualquer um podem delatar... Mas se a colaboração envolver uma pessoa que também está já
na fase de saneamento, aguardando a denúncia (acredito que o professor quis dizer
sentença)... neste caso, aquele que delatou e que prestou informações que podem
comprometer o delatado, abriu aqui um novo conflito entre o Réu Colaborador que assume as
vezes da acusação e o Réu delatado que não teria tempo/oportunidade para saber o que se
passou naquele acordo que foi celebrado posteriormente. Então, se há uma denúncia no
acordo contra mim, tenho interesse de saber até para me defender nas alegações finais. Se o
outro réu não tem mais uma oportunidade de se manifestar, esse último réu deve se
manifestar sempre após a manifestação do acordo que ele aparece, possibilitando o
contraditório e a ampla defesa.

A colaboração não é meio de prova e sim de obtenção de prova. Isso é corroborado pelo fato
de que o juiz não pode condenar unicamente pela colaboração.

Deve sempre utilizar a presunção de inocência nos casos em que o colaborador omite
informações (omissão culposa). Havendo condições de provas que ele quis prejudicar o
acordo, o acordo homologado poderá ser rescindindo (omissão dolosa). Dolo pode ser
observado na intenção de prejudicar a colaboração ou atrapalhar a própria atividade
jurisdicional ou para proteger alguém que seria citado no acordo. O dolo abrange a consciência
de atrapalhar a própria investigação.

O acordo de colaboração pressupõe que o colaborador cesse o envolvimento em conduta


ilícita relacionada ao objeto da colaboração, sob pena de rescisão. Esta depende de prova
produzida pelo Ministério Público de que a atividade criminosa continua.
São direitos do colaborador (art. 5): usufruir das medidas de proteção, ter informações
pessoais reservadas, etc...

ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e
circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com
pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de
não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção
do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;


(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como


instrumentos, produto ou proveito do crime; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente


à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser
indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 (Código Penal); (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei


nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse
social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como
função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo
delito; ou (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público,
desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada. (Incluído pela Lei
nº 13.964, de 2019)

 Não ser caso de arquivamento: tem lastro probatório mínimo (justa causa)
 Confissão do investigado
 Ausência de violência ou grave ameaça
 Pena mínima inferior a 4 anos
 Acordo deve ser necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: O MP
costuma alegar que havia necessidade da reparação do dano ou que havia a
necessidade de confessar perante o juiz (não bastaria confessar perante a Autoridade
Policia), mas não fazia qualquer referência à necessidade do acordo.

O fundamento do ANPP é o mesmo da Pena Restritiva de Direitos (PRD), já que esta tem como
fundamento a suficiência para reprovação e prevenção.

O ANPP, com essa finalidade, deve ser considerado um direito subjetivo do acusado quando
presentes os requisitos legais, da mesma forma como é a conversão da pena privativa de
libredade em PRD.

Ao não oferecer o acordo, o MP não pode simplesmente alegar que é uma discricionariedade
para o caso concreto ao entendimento que não cabe porque não houve ressarcimento do
dano, não houve confissão formal ainda, porque a confissão perante a autoridade policial é
insuficiente... O MP deve fundamentar sua negativa na insuficiência e na desnecessidade do
ANPP e fundamentar o porquê da pena ser melhor para a reprovação e a prevenção de
outros crimes. Inicialmente há a necessidade de justa causa, afinal não pode ter acordo se não
houver a possibilidade jurídica de existir Ação Penal... Mas também em caso de recusa o MP
deve fundamentar a sua decisão.

Num ANPP que envolva um crime com um valor alto de ressarcimento... O professor parte do
entendimento que o MP, ao negar o acordo, deve fundamentar a negativa, afastando todos os
argumentos que sejam favoráveis ao acusado.

No ANPP, não seria o caso também de ouvir a vítima para saber se essa abre mão do
ressarcimento do dano? Por exemplo, se o MP celebra um ANPP com o acusado, sem ouvir a
vítima, pode atrapalhá-la já que não teria mais o título executivo extrajudicial.

Se houve confissão perante autoridade policial ou administrativa, há necessidade de uma nova


confissão perante o representante do MP e a homologação dessa confissão pelo juiz? O
professor acha que não há necessidade, já que o MP pode valorar essa confissão e reconhecer
que já houve o reconhecimento do ato ilícito praticado. Uma nova eventual confissão
posteriormente perante a autoridade judiciária pode, no momento do acordo, induzir a
imposição de condições mais graves pelo motivo falso que o acusado teria acusado prática do
crime...

O professor ve a ANPP como direito subjetivo do acusado, não sendo mera discricionariedade
do MP. Podemos fazer uma analogia com o art. 44 CP.
A pergunta que deve ser respondida pelo MP no caso concreto ao recusar:

“Porque, no caso concreto, o acordo não é necessário e suficiente para reprovação e prevenção
do crime?”

Confissão: qual sua finalidade?

a) Se não for caso de arquivamento, há justa causa pra ação penal;


b) Se há justa causa, a confissão é desnecessária;
c) A confissão é faculdade do réu para obter atenuação da pena;
d) Se houver processo, a confissão realizada pode ser utilizada contra o réu.

A confissão parece mais uma arma do MP para utilizar contra o acusado se ele não cumprir
com sua parte do acordo. Ou seja, no processo as informações seriam utilizadas para buscar
outras provas ou utilizá-la como fundamento.

O professor sinaliza que na impossibilidade do ressarcimento, deve ser impostas novas


condições para realização do ANPP. Infelizmente, caso o MP não queira tentar outras
condições, a pena se transforma em algo meramente vingativo.

O professor sinaliza que a retroatividade do ANPP vale para qualquer situação que dê para
extrair um benefício para o acusado, independente de oferecimento de denúncia ou instrução
em curso ou recurso.

AULA 16 – Novas tecnologias e Direito Penal Econômico

Professor: Carlos Eduardo Japiassú

Sem material interessante para anotar.

AULA 17 – Crimes Tributários

Professora: Débora Motta

Parte 1 – Aspectos gerais

1. Notas introdutórias.
Ser fragmentário significa que o Direito Penal deve se ocupar apenas das ofensas
graves, praticadas contra bens jurídicos relevantes. Por isso dizemos sempre que o
direito penal é a ultima ratio. Roxin: “O direito penal é a última das medidas
protetoras que deve ser considerada”.

Através da fragmentariedade, conseguimos demonstrar a autonomia dos crimes


contra a ordem tributária frente ao ilícitos tributários. Ou seja, esse tipo específico de
crime não corresponde a uma mera infração tributária e sim uma conduta que afeta
um bem jurídico digno de proteção penal.

2. Bem jurídico.

Principais correntes:

a) Arrecadação tributária: como justificar o crime de excesso de exação (que é o crime


que garante ao contribuinte o direito de só pagar aquilo que só de fato é devido, como
sendo lesão à arrecadação tributário)? Não parece essa ser a melhor opção.

b) Função social do tributo: funcionamento = tutela penal do bem jurídico só existirá se


estiver ligado a interesses concretos. CRÍTICA: Abstração.

c) Ordem tributária: diversos fatores: interesse da fazenda na arrecadação; proteção das


funções que o tributo deve exercer de acordo com os dispositivos constitucionais; e a
liberdade do contribuinte na interpretação da lei tributária (opção mais coerente para
a professora).

3. A posição do STF frente a discussão acerca do encerramento do processo


administrativo-fiscal para prosseguimento da ação penal pelo crime do art. 1º da Lei
8.137/90. Prescrição.

Durante muito tempo se discutiu a natureza jurídica do lançamento definitivo do


tributo após o esgotamento da via administrativa para que o crime de sonegação fiscal
fosse passível de persecução penal. Para uns seria condição objetiva de punibilidade
(portanto, uma questão de ordem social). Para outros seria um elemento normativo
do tipo (questão prejudicial). Para o professor Gustavo Badaró, seria uma condição de
procedibilidade.
Súmula Vinculante 24: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária,
previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do
tributo.

Ou seja, com essa súmula, tenho como obrigatório o encerramento do Procedimento


Administrativo Fiscal.

A extinção de punibilidade se dá pelo pagamento do tributo. O STF também decidiu no


sentido de que o delito somente se consuma no momento definitivo do tributo. Se há
pendência de recurso perante a Autoridade Fazendária, não se pode falar de crime.
Então não seria legítimo ao Estado instaurar o procedimento penal se não tiver sido
encerrada na esfera administrativa. O termo de inicial da prescrição dos crimes
materiais previstos no art. 1º da Lei 8.137/90 é a data de consumação do delito, ou
seja, a data da constituição definitiva do crédito tributário.

4. Questões comuns aos crimes contra a ordem tributária: trancamento de IP e ação


penal por falta de justa causa; princípio da insignificância em matéria tributária; o
falso como crime meio para a prática da sonegação fiscal; concurso de crimes;
continuidade delitiva; representação fiscal para fins penais.

A insignificância é um critério para afastar investigação criminal por falta de justa


causa. O STF firmou entendimento que para aplicação do princípio da insignificância
(HC 115.319 – 2013):

a) conduta minimamente ofensiva ao bem jurídico (não pode haver desproporção


entre o bem jurídico tutelado no direito penal e os interesses da Fazenda no setor
fiscal). A Fazendo impõe alguns patamares específicos para buscar os tributos na seara
administrativa;

b) grau de reprovabilidade do comportamento do agente (ou seja, não pode ser uma
conduta reiterada);

c) ausência de periculosidade da ação social;


d) lesão jurídica inexpressiva (Custo-benefício econômico de um Procedimento Judicial
para cobrança do débito tributário e de uma Ação Penal).

Vemos na prática uma resistência forte dos tribunais para aplicar a insignificância... Estes
acabam fundamento no fato das normas tributárias serem muito complexas.

** O falso como crime meio para prática de sonegação fiscal: pune-se a sonegação e a
falsidade? Há crimes que são praticados como meio para outros delitos, sem terem, em si
mesmo, um potencial autônomo de lesividade... Em matéria tributária, é muito comum que a
falsidade ideológica de um documento seja utilizado para prática de uma infração fiscal. Esses
precisam ser absorvidos pelo crime fim.

É preciso ter em conta se o falso irá ou não se exaurir no sentido de seu potencial lesivo no
crime fim. Se ele não se exaurir no crime fim, ele tem que ser punido de forma autônoma.

** Concurso de crimes ou crime único na sonegação de diversos tributos? Continuidade


delitiva? Há situações em que o lançamento de diversos tributos decorre de um mesmo fato.
Quando uma empresa omite receita, deixando de contabilizá-la, isso terá várias implicações
tributárias (Ex.: implicação no IRPJ, contribuição sob o lucro líquido, no Cofins/PIS).

Muito embora eu tenha com a mesma omissão eu tenha atingido vários tributos diferentes,
não faria sentido considerar ocorridos diversos crimes pelo simples fato da conduta ter
implicado na supressão de mais de um tributo. O fato dos créditos relativos aos tributos serem
lançados conjuntamente no mesmo auto de infração ou a partir de ações fiscais
distintas/autuações distintas, não tem o condão de fazer que se tenham diversos crimes.

Ainda que se tratassem de vários crimes, teríamos um concurso formal e não um material,
como pretendem vários julgadores.

Como os tributos são devidos pelas empresas mensalmente, invariavelmente teríamos uma
continuidade delitiva quando tratamos de crimes contra a ordem tributária. Como as
obrigações se repetem mês a mês, de modo que o contribuinte adota a mesma prática que
implica na sonegação, essa única prática acaba sendo repetitiva, devemos admitir a
continuidade delitiva e não um concurso de crimes.

Verificada a ocorrência de condutas compreendidas como crime, tem a autoridade fiscal a


obrigação legal de proceder à representação fiscal para fins penais. O encaminhamento da
representação está condicionado ao prévio exaurimento do PAF. O art. 83 da Lei 9430/96
dispõe o seguinte:
“A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária
previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137/90, e aos crimes contra a Previdência Social,
previstos nos arts. 168-A e 337-A do CP será encaminhada ao Ministério Público depois
de proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do
crédito tributário correspondente”.

Isso porque, como já falamos, tratam-se de crimes materiais (que exigem resultado
naturalístico para sua existência). Figurando então a supressão ou redução do tributo como
elementar do tipo penal. Ou seja, antes do exaurimento da esfera administrativa, não se pode
afirmar com certeza que houve a prática de um crime. Assim, no momento em que o MP toma
ciência do crime fiscal, na maioria das vezes determina a instauração de um IP ou ele próprio
instaura um PIC, a fim de determinar a autoria delitiva. O PIC determina a materialidade
delitiva, no entanto, a autoria necessita ser perquirida e investigada para que a Ação Penal seja
legítima...

Hugo de Brito Machado diz que a imputação no processo penal deve ser prévia pois a
instrução destina-se para comprovar os fatos imputados e não a sua identificação. Ou seja, a
responsabilidade do administrador não resulta de seu status e não pode ser presumida, sob
pena de inequívoca responsabilização penal objetiva. Muito embora os crimes societários
admitam uma denúncia geral, sem detalhamento das ações de cada um dos imputados, não se
pode admitir uma denúncia genérica.

5. Extinção de punibilidade.

Além das causas gerais de extinção de punibilidade (art. 107 do CP), temos também a causa
especial de extinção de punibilidade pelo pagamento do tributo (art. 34 da Lei 9.249/95):

Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº 8.137/90, e na Lei nº
4.729/65, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive
acessórios, antes do recebimento da denúncia.

No art. 34, temos um limite temporal.

Uma lei posterior (Lei 10.684/03), em seu art. 9, que não revoga a anterior, por outro lado, diz
o seguinte:

        Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts.
1o e 2o da Lei no 8.137/90, e nos arts. 168-A e 337-A do CP, durante o período em que a pessoa
jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de
parcelamento.
        § 1o A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão
punitiva.

        § 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica
relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e
contribuições sociais, inclusive acessórios.

Há um posicionamento muito claro hoje nos tribunais superiores: não havendo um marco
temporal, o pagamento pode ser feito a qualquer tempo (mesmo após o advento de trânsito e
julgado de uma sentença penal condenatória:

(5ª Turma do STJ – Rel. Jorge Mussi)

O pagamento nem sempre é feito em uma única parcela... é possível parcelar essa dívida.
Durante todo o parcelamento, fica suspensa a pretensão punitiva do Estado referentes aos
crimes tributários, sendo que ao final do parcelamento (com o pagamento total dos débitos)
declara-se extinta a punibilidade.

Parte 2 – Crimes em espécie

A Lei 8.137/90 revisitou a Lei 4.729/65, criando novos tipos penais com penas mais severas.

Tipos comuns de fraudes:

Meia nota – emissão de NF com valores menores

Calçamento da nota – emissão de documentos fiscais com adulteração, tanto no preço,


quando nas descrições de mercadoria.

Doação irregular – efetuada a entidades que não são habilitadas e que o valor do comprovante
ultrapassa ao que foi de fato doado.

Utilização de laranjas – empréstimo do nome de uma determinada pessoa/empresa ou conta


bancária para fazer intermediação de uma negociação fraudulenta ocultando a identidade de
um outro indivíduo.

** Todo devedor é um infrator penal? Não.


Até meados de 2018, o posicionamento majoritário que vigorava nos tribunais superiores era
de que o tributo declarado e não pago não configuraria crime, mas mero inadimplemento
fiscal. Ou seja, se o contribuinte confessasse a existência de um débito e não realizasse o
pagamento, não haveria interferência do direito penal.

O STF no fim de 2019, por meio do RCH 163.334, inicialmente analisando apenas o ICMS
próprio (mas pela lógica utilizada nesse julgamento, o não pagamento de outros tributos como
I.R., ISS, ou qualquer outro que tenha repercussão econômica no preço do produto, também
serão considerados delitos), entendeu que ao imbutir o valor do ICMS na mercadoria, o
comerciante estaria cobrando esse valor do consumidor, portanto se apropriando deles ao não
repassar para ao fisco. Acontece que não é bem assim... Existem tributos que são descontados
do contribuinte para facilitar a arrecadação (Ex.: IRPF na fonte e ICMS na substituição
tributária). Tais recursos não integram patrimônio daquele que cobra ou desconta... Nesses
casos o não repasse caracteriza algo alheio, mas não é isso que acontece no caso que foi
analisado pelo supremo (ICMS próprio). Nesse caso, o consumidor não é o contribuinte, não
tendo relação nenhuma com o fisco. Ele não é devedor do tributo e não tem capacidade
contributiva.

Essa decisão foi parcialmente mitigada, felizmente, diante de uma recente decisão do STJ (de
agosto/2020): Agravo em HC 97903/SC: baseado no posicionamento do STF, adotou critérios
para tipificação do crime de apropriação indébita tributária, mais precisamente, a contumácia
e o dolo de apropriação, tornando-se possível o trancamento da Ação Penal nos casos em que
os critérios não tenham sido observados.

Assim, entendeu por unanimidade a turma do STJ que para a configuração do crime de
apropriação indébita tributária a conduta deve ser dolosa e reiterada, estabelecendo que
quem não paga tributo por situações alheias a sua vontade (dificuldade financeira, equívoco
no preenchimento de guias, etc...) não cometeria o crime... O STJ passou assim a diferenciar
duas condutas diferentes: a daquele que não paga porque não consegue paga ou cometeu
algum erro sem querer e daquele que não recolhe tributos intencionalmente por interesses
pessoais.

Esse dolo também deve ser provado pela acusação??? A defesa deve demonstrar que o réu
estava em crise de fato, etc...

Uma tese é a inexigibilidade de conduta diversa, excluindo a responsabilidade do autor na


situação em que diante de um conflito de deveres igualmente relevantes (pagar o tributo e
manter a empresa funcionando), não seja possível atuar de outra forma.
Essa simples alegação não vai salvar o cliente da condenação penal. Existem critérios que
devem ser provados pela defesa do réu, no que diz respeito a dificuldades financeiras da
sociedade empresária.

Outra tese mais concreta é a de ausência de dolo. Sem a fraude eu não tenho crime. Não
podemos presumir o dolo. A fraude consiste em omitir uma declaração, proceder uma
declaração falsa, como instrumento para uma sonegação fiscal.

Gestão de risco criminal voltada para área do compliance consiste numa atuação preventiva
do advogado, ao lado do gestor da empresa, para avaliar os riscos de não estar com o
compliance. Através dessa avaliação, deve ser tomada uma decisão estratégica. Cada empresa
vai mapear as consequências de não estar com o compliance e decidir diante desse estudo.

AULA 18 – Crimes Previdenciários e financeiros

Professora: Ilana Müller

A maioria dos crimes de DPE são tipos abertos, gerando insegurança e instabilidade jurídica.

Teoria da associação diferencial: o comportamento delituoso é um comportamento


apreendido a partir de definições favoráveis da conduta criminosa – visa explicar todo o
comportamento criminoso.

Klaus Tiedemann explica que o DPE tem uma característica que o diferencia dos delitos
clássicos, já que trata de bens jurídicos difusos ou coletivos – ofensa a bens jurídicos
econômicos sob uma perspectiva difusa, pode gerar impacto em pessoas indeterminadas. Essa
teoria tem algumas criticas da doutrina, já que os crimes também podem ofender muitas vezes
bens jurídicos individuais.

Em reforço à teoria do bem jurídico, é necessário entender o bem jurídico como elemento
limitador da atividade punitiva do Estado.

Deve-se evitar a criação de tipos genéricos para evitar abstrações genéricas que levam a
insegurança jurídica.

O DPE incide sobre realidades já reguladas juridicamente, se inter0relacionando com direito


econômico, tributário, etc. Trabalha com bens jurídicos complexos.

Há necessidade de complementação de outras normas administrativas para a tipificação do


delito.
- A atividade bancária é regulada por normas específicas, que determinam como se deve agir e
cominam sanções a atos considerados ilícitos.

- A atividade tributária é regulada por normas específicas, que auxiliam na compreensão da


configuração do crime.

O DPE é muito interdisciplinar, havendo necessidade de compreender as normas


administrativas – importante no campo da tipicidade, da ilicitude e por vezes da culpabilidade.
Embora exista essa interrelação, essas instâncias (penal e administrativa) são independentes.

Teoria dos círculos concêntricos: nem todo ilícito administrativo ou civil constitui crime.

O tipo penal de Gestão Fraudulenta é extremamente aberto... A professora cita uma violação
ao princípio da taxatividade, ficando o acusado refém de uma interpretação judicial para saber
qual é o ato de fato coibido efetivamente pelo direito penal. Nem é necessário gerar um
prejuízo ou ter um resultado... Envolve a fraude, utilização de documentos falsos, etc..

A gestão temerária está mais interligada com uma má gestão (arriscada)... Ex.: inúmeros
financiamentos para pessoas que não tem bens para pagar (sem contrapartida).

É indispensável o elemento subjetivo dolo nesses tipos penais. Nesse sentido, já teve decisão
do STJ admitindo dolo eventual.

Existem situações em que você vai aplicar apenas um dos crimes e em outros casos em
concurso formal, tomando cuidado para não incidir em bis in idem.

Por vezes, o aplicador do direito vai aplicar em concurso de normas o art. 16 da Lei 7492 (fazer
operar, sem a devida autorização, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores
mobiliários ou de câmbio.

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