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CAPÍTULO III

NA ÉPOCA CLÁSSICA, MOBILIZAR


PARA EXCLUIR. SOBRE ALGUNS
PROBLEMAS DO OSTRACISMO
Os antigos gregos inventaram
a política ou, pelo menos, a nossa política. 1 O fato de a
política, em sentido amplo, ser central na vida humana,
era algo de óbvio para este povo, e, quando Aristóteles
coloca, no ponto de partida de sua enquete global sobre o
tema, que o homem é um animal político, que tem por
destino viver em sociedade (Política, I, 1, 9), ele só faz
exprimir o sentimento geral dos gregos. Esta dimensão
política é até o que vai distinguir o homem dos deuses e
dos animais.
.. Esta dimensão política ,
está tão on·1
que, outrora, os historiad Preseme nas font
ores Inarxistas es
uma explicação do mund . , Preocupados~ da
. o antigo que l . r
incorporasse a visão dos . evasse em conta e
antigos sobres· - •
afj.tnna.r que a política J propnos, puderam
. era preponderante An .
isso porque ela é que . . na- tíguidade· e
organiza as rela - d ·· '
política seria então para a G é . çoes e produção, A
- . . r eia e para Roma pel
para parte de suas histórias (trata-se entretant'o dasºmenos
· · · ' , partes
mais importantes, ou SeJ·a as de formaça~ )
. ' o , portanto o
equivalente ao que foi a religião para a Índia ou do qu~ é
a _econo~ para o mundo contemporãn~. 2 Outros afinaram .
amda mais esta visão das coisas, mostrando que a política
é fundadora, pois é neste campo que se forjam os modelos
ou os esquemas de pensamento que vão, mais tarde,
organiz.ar, estruti.Jrar outras esferas da vida humana. 3 É óbvio
para mim que a política está presente sempre, em qualquer
sociedade, mas rião esta política, a greco-romana, a nossa, .
que é fundada na noção de cidadão e seu corolãrio, ou
seja, a idéia de participação. O problema do direito à
cidadania foi o ponto central das lutas sociais da época
arcaica na Grécia e na República romana. Ora, não basta
ter o estatuto de cidadão, de ser livre da ameaça_ que
decorre de sua perda, ou seja, da escravidão, como vemos
na época de S6lon; trata-se também de dar um conteúdo
positivo a esta situação. Em outras pala_vras, participar de
maneira ativa nos destinos de sua comunidade. Sabemos
que é segundo o púmero dos que participam no governo
que os gregos classificam, de Heródoto a Aristóteles,
suas constituições:'

ENMIOSOliltE A MOlilUZAÇÃO... 82
A participação política era sentida como um dos bens
mais desejáveis que existem. E isso desde muito cedo.
Assim, vimos no fün da Odisséia o medo dos pretendentes
de que Telêmaco fizesse votar seu exílio pela Assembléia
de ftaca, por causa de suas -violências: "Quem quer, longe
do país, ir ao estrangeiro?"... (XVI, 264). Há aqui duas coisas: o
apego ao seu país sentido de maneira afetiva, mas também,
sem dúvida, a vergonha de ser excluído. Em outro contexto,
a participação aparece de novo como fundamental à
salvação pública, quando Sólon exige que todos tomem
partido, quando ocorre um conflito na cidade:
Vendo que o Estado estava com
freqalncia dividido e que, por
indiferença, alguns cidadãos se
contentavam em obseroar os
aconlectmenlos, S6lon estabeleceu
contra eles uma let especial:
-- "Aquele que numa guerra ctvt/
(st1sia1ooses) nãopegar em armas
com um dos partidos (hetéron)
será atingido por attmia e não
terá mais nenhum direito político.
(Constituição de Atenas, Vil/, 5)
A busca da participação polftica não é um dado gratuito,
oa
de vaidade pes.,oal. Para os camponeses Atenas soloniana,
é sua liberdade, mas sobretudo suas terras que estão em
jogo; e, muito provavelmente, a situação era a mesma
para os pretendentes na Odtsséia. Mas.é verdade que os
homens nem sempre agem de forma "razoável"
e, uma

83
Capitulo Ili
de a

eorotiet: e 2. Pa::Jeil::a Q;e:-;; .Y.t:m:::a:::. -;,a:


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vez seu sistema de valores co~tituÍdo ·a partir de critérios
objetivos, eles podem matar por pouca coisa. Freqüente-
mente, então, a violência e o ardor do engajamento
parecem desmesurados em teiação às vantagens que eles
podem obter. ~ a impressão que podemos ter, com um
certo recuo, de alguns conflitos na história, assim como o
nacionalismo europeu e a Primeira Guerra Mundial, por
exemplo. Com efeito, o "parecem desmesurados" da minha
frase an~rior é essencial; o historiador deve, por necessi-
dade profissional, ter sempre do~ critérios: examinar as
situações a partir d o s ~.de yalores dos atores históricos,
para compreender suas motivações; examinar também a
partir de seus próprios critérios, para não se tomar prisio-
neiro das rep~~tações mentais dos atores e poder, assim, ·\
avaliar a distânciâ que se instaura muitas vezes entre os 1
valores e as realidades históricas.
Tomemos eritão como ponto de partida a idéia de que
a participação política era, para os gregos, essencial e até
critério de humanidade. Chegamos à idéia inversa de que
a exclusão era uma grande priv~çào. Não é o nosso
objetivo falar aqui dos excluídos da polisem geral (mulheres,
jovens, metecos, escravos), mas daqueles que, tendo o
direito de participar, são repentinamente dele privados.
Havia várias modalidades de privação de direitos, mais ou
menos totais, mais ou menos duráveis, segundo os casos.
A que vai nos ocupar agora não era nem total nem muito
durável na prática, mas, em função de suas características
próprias, ela exerceu um grande fascínio sobre os antigos,

ENWOSOIIRl 1t.M081UZAÇÃO.. 84
e constitui para ná, uma fonte de reflexão muito rica. Trara-se
do ostracismo ateniense.
Origens e Objetivos
A lei do ostracismo é uma lei democrática. Aristóteles
diz a seu respeito:
Em seguida a essas mudanças, a
constituição se tornou bem mais
/avor4uel ao povo do que o era
a de Sólon. Aamteceu, com efeiJo,
que a tirania tinha fetto cair em
desuso as leis de S6lon e que
Clístenes estabeleceu novas,
para ganhar ofavor da multidão.
Entre outras foi então estabele-
cida a Jet' sobre·o ostracismo.
Inicialmente, no quinto ano
depois desta refonna, sob o aram-
tado de Hermocreonte, fez-se
para o Conselho dos Quinhentos
a fórmula do juramento que
ainda hoje é uttltzada. Em se-
guida, elegeram-se os estrátegos
por tribo, um de cada tribo
(sendo Q polemarca o chefe de
todo o exército). Quando, onze
anos mais tarde, os atenienses
venceram a batalha de Maratona,
sob o arcontado de Fenipo, eles
deixaram passar dois anos
após a vitória e, com o povo
ganhando mais audácia, então
pela primeira vez aplicou-se a
lei sobre o ostracismo qu h
s,'do estabelecid ' e avta
a Por desconfi-
ança em relação aos fJod
'á erosos
J que Ptsístrato era chefe d~
partido popular
e estrátego
quando se tornou tirano . O
primeiro que foi atingido pelo
ostracismo entre as seus familiares
foi Hiparco, filho de Carmo, do ·
démos de Colito; foi, aliás, sobre-
tudo, por causa dele que Clístenes

J
tinha estabelecido a lei, tendo a
intenção de expulsá-lo de Atenas.
Com efeito, os atenienses, usando
nisso a humanidade habitua/ à
democracia, deixavam morar
no país os amigos dos tiranos
que não se tinham envolvido nos
conflitos; e seu guia e chefe era
Htparco. Imediatamente no ano
seguinte, sob o arcontado de
Te/estno, tirou-se por sorteio e
por tribo os nove arcontes entre
os quinhentos candidatos desig-
nados pelos eleitores dos démos,
pela primeira vez depois da tira-
nia (os anteriores foram todos
eleitos), efot ostracizado Mégacles,
ftlho de Htpócrates, do démos de
Alopece. Então, por três anos
foram ostracizados os amigos
dos tiranos, em vista dos quats a

ENSAIO SOBRE A MOBILIZAÇÃO... 86


let Unha stdo estabelecida; no
quarto ano foram a/astados
também dots dos outros que
pareciam mats poderosos; e o
prtmetro a ser ostracizado entre
os que nada tinham a ver com a
tiranta fot Xanttpo, /tlho de
Ari/ron. Dois anos depois, sob
o arcontado de Ntcodemos,
quando foram descobertas as
minas de Maronila, e que o
Estado retirou da exploração
cem talentos de lucro, alguns
aconselharam distribuir o dinhei-
ro ao povo, mas Temístocles se
op&: sem dizer para o que ser-
viria o dtnhetro, eie aconselhou
que se emprestasse um talento a
cada um dos cem mats ricos
atentenses; em seguida; se o
emprego fosse aprovado, a
despesa correria por conta da
cidade, e no caso contrário, o
dtnbetro seria cobrado aos que
o haviam recebido empresta-
do. Quando ele teve assim os
recursos, ele construiu .cem
lrirremes, cada um dos cem
construtndo uma; foi com .elas
que os atenienses combaleram em
Salamina contra os bárbaros.
Neste momento, A rtstldes, filho

87 Cap(tulo Ili
de Lisfmaco, foi atingido pelo
ostracismo. No quarto ano, os
atenienses chamaram de volta
todos os que tinham sido ostra-
cizados, sob o arcontado de
Hlpsíqutdes, em razão da expe-
dição de Xerxes; e, quanto ao
futuro, eles ordenaram aos ostra-
. ttzados que permanecessem
além dos cabos Geresto e Cileu,
sob pena de serem definitiva-
mente privados de seus dtrettos
políticos. (Aristóteles, Constituição
de Atenas, XXIO

Vemos, portanto, que Aristóteles situa a introdução do


ostracismo no CQnjunto das reformas d ocráti s de
Clístenes. Ora, ele diz também que dois ano epois de
Maratona, ou seja em 488/487, e como o povo adquiria
mais audácia, aplicou-se pela priJ::neira vez a lei sobre o
ostracismo (tóte prôton ecbrésanio tô nómo tô peri tõn
ostrakismón). ·
Haveria uma distância muito grande entre o estabele-
cimento da lei e sua primeira aplicação, talvez vinte anos.
Alguns autores duvidaram então da paternidade clistênica.
Não haveria sentido em imaginar tal arma para em seguida
privar-se dela durante vinte anos (opinião de Beloch,
por exemplo). 5A questão é tanto mais perturbadora quanto
0 próprio Aristóteles estabelece a precisão de que a
primeira vítima da lei foi Hiparco, filho de Carmo, e que
foi por desejar expulsá-lo de Atenas que Clístenes criou a lei.

ENSAIO SOHRE A MOWUZAÇÃO... 88


temidade de Cltsten tem apoios sólidos além do
6
t ~ Aristótel , sobretudo Filocoro, mas outros "pais"
O
t m~m foram invocados. Hfpias, o que é totalmen~e
f: n io O e. contrãrlo a toda a tradição; Teseu, que tena
do tamb6n primeira vftima, o que é ainda mais fantasioso'.
ma muito reve1 dor,' pois ficaria evidente que, se o herói
fundador foi ~tradzado, não haveria nenhuma vergonha
ni o. Que não havia vergonha no fato de ser ostracizado
a opiniào de alguns autores, mas bastante contestável.
Par.1 outros historiadores, a distância de vinte anos é
· lnaceltAvel, e eles encontram um argumento num frag-
mento de Andródon citado por Harpocrácion (Fragmentos
dos Historiadores Gregos, frag. 6) no qual se diz que a lei
sobre o ostracismo tendo por objetivp ataçar Hiparco,
filho de Canno, foi passada tóte prôton seu ostracismo de
488/487. Portanto, a lei teria sido aprovada neste momento,ª
e não em 508. Ora, tóte escrito a mais de 150 anos de
intervalo pode, como já dizia Carcopino, aplicar-se a vinte
dias como a vinte anos.
Por um lado, portanto, nada se opõe à tradição que faz
de Clístenes o fundador do ostnicismo ao mesmo tempo
que da democracia. Por outro lado, convém voltar ao texto
de Aristóteles. Ele diz CXXII, 8) que em 481/480, em razão
fa p diçào de Xerxes, os atenienses chamaram todos
que tinham ido vftimas de ostracismo. Devemos então
pensar m oulrJ possibilicbd . Escrevendo por volta de 325,
Ari cóteles r onstiluía talvez a história do ostracismo a
a rtir do tt:xto da l i lisl · nica, por um lado, e do decreto
1
d n b tia d e 1/ , por outro lado. É portanto pos.sível

Capiii,/o 1/1
(~s não pro~ável, na ~inha opinião) que o ostracismo
de ffiparco nao tenha sido o primeiro, mas o pnme1ro • .
conhecido por Aristóteles e pela tradição posterior.
Ainda que aceitemos o ostracismo de Hiparco como o
primeiro, e sempre fiéis a Aristóteles, nada indica que se
trata da primeira tentativa de ostracismo, t6teprôton echré- \
santo pode muito bem querer dizer a primeira vez que o \
ostracismo foi aplicado (ou seja, com sucesso), mas não
necessariamente a primeira votação (ostracoforia).
De duas uma: ou houve outras tentativas anteriores
(mas nós não temos o menor traço), talvez até contra
Hiparco, mas sem sucesso até o momento em que a
oposição ao grupo de Hiparco foi forte o suficiente para
ter sucesso no ostracismo; ou então a simples existência
da lei teve o efeito desejado por seu criador, ou seja,
manter a di§tânc~ os potenciais tiranos. 9
Com efeito, a tirania tinha estado ao longo de todo o
século VI no centro da política ateniense. Já bem antes das
longas tiranias de Pisístrato e de seus filhos, a ameaça era
bem presente, para que Sólon se gabe de ter evitado à sua
pátria a "violência tirânica" (Constituição de Atenas, XII, 3).
Depois da expulsão dos Pisistrátidas (511/510), a ameaça
continuava certamente muito forte já que, expulsos por
tropas estrangeiras, os tiranos dispunham ainda de um apoio
interno considerável. Vemos isso claramente no relato de
Aristóteles que, falando da primeira aplicação da lei
(segundo ele em 488/487), diz da mesma que "tinha sido
estabelecida por desconfiança em relação aos poderosos

ENSAIO SOBRE A MOBILIZAÇÃO... 90


(dunámesin) po·15 p· ~
( , ISlStrato era o chefe do partido popular
demagog6s) e estrátego quando se tornou tirano~
( Constttutção de Atenas, XXII, 3).
O que aconteceu logo depois confuma mais es:a idéia
tom os ostracismos sucessivos de: Hiparco, filho de
Carmo e Mégacles, filho de Hipócrates (478/476). São os
amigos ~ tiranos (tôn tyrannon phüous) que são inicial-
mente visados, e Aristóteles repete, "em vista dos quais a
lei tinha sido estabelecida". Mas, em seguida, passa-se a
outros, fora ~ círrulos tirânicos, e o primeiro foi xantipo ,
filho de Arífron (485/484).
O aspecto antitirânico é importante. Os tiranos gregos
do arcaísmo souberam desenvolver uma imagem de "paiS
do povo" que tinha, é_claro, uma correspondência na
realidade das relações políticas, mas que era sem dúvida
exagerada. Tomemos o "retomo" de Pisistrato sob a
conduta da deusa PalasAtenéia "em pessoa". Sem insistir
aqui quanto aõ papel ~cial do "apoio divino", a dinâ-
mica do oortejo, do triunfo criava a impressão de um apoio
popular enonne, de uma força irresistível. Deste ponto de
vista, ostracizar um potencial tirano era mostrar antecipa-
damente que ele não dispunha de apoio para se impor
no poder.
Mas, além da luta antitirânica, há um outro aspecto de
igual importância; Aristóteles mistura os dois, mas nós
podemos individualizá-lo facilmente: é a desconfiança
em relação aos poderosos (dunámesin). É inútil tentar
hierarquizar os dois "perigos": ainda que as reformas de

· 91 Capítulo m
Sum tlu,,ulu Ja 1,wil,,w1 o 1,r,1x,,
orsulboso pelu vllôrlu a/11111111

,ando as matore~ protemr,c•f,


• • uportava mal aqueles quo µo/o
nome , psla r,putaçào eram
1/t!MdOS acima da multtdão. Foi
assim qu, os atenienses, tendo
vindo d, toda parti e reunin-
do• , na ctdad,, pronunciaram
o ostracismo contra Aristides,
dt ifarçando com o nome âe
medo da tirania o cfúme que
lbes inspirava sua/ama. (Aris-
tides, 7, 1-2)
n."Ud iúm orno ausa dos acontecimentos em
Pluta{CO, pod mos discutir longamente. O que é certo,
im, que el s puderam formular como pretexto e,
p rtmt , mo um argum nto público e polêmico eficaz
c.!J·ce" de poder.
°
Contmriamente a uma autora recente, 1 Farrar, penso
que ' l democr.icia grega foi uma prática antes de se tomar
um "pensamento", e que, todas as coisas sendo solidárias
no proce o histórico, ela só foi um "pensamento" muito
dificilmente trabalhado pela pratica. No conjunto, a ideologia
rega foi, mesmo no regime democrático, competitiva,
litlsta e antidemocrática no sentido que nós podemos
atribuir a e.5ta palavra. Isso dito, um certo grau de elaboração
int lectual era indispensável e, se as reformas de Clístenes
n parecem tão abstratas e intelectuais, é porque faltava
muito para preencher o atraso.

93 Cupftulo Ili
Entretanto, é indiscutível
"
no que se re1ere ao esp' . que . ele não p artia
• do zero e
Into igualitá . ,
impõe-se a analogia co no no ostracismo
Heródoto e Aristóteles pm a P_aráboJa das espigas e~
. ouco unporra qu d
recebe o conselho de em á e quem
altura méd' conar
, as espigas que u trapassam a
1
ia como metáfora para a elimin ~ d
rosos. No contexto tirânico trata d açao os pode-
. , -se e manter uma certa
ig_u~ldade no rebaixamento diante do tirano. É extraordi-
nano e muito significativo da evolução histórica que o
espírito igualitário seja agora utilizado pelo démos soberano
como anna de defesa antitirânica. o que há de comum
aos dois casos, ostracismo e "conselho" implícito na pará-
bola das espigas, é o caráter preventivo.
Com efeito, o ostracismo não é castigo para um crime
cometido, mas, antes, um mecanismo destina~o a evitar
que alguém esteja em condições de atentar contra a sobe-
rania do démos. Em relação ao ostracismo de Temístcx:les,
Plutarco explica:
Pois o ostracismo não era uma
punição, mas um meio de acal-
mar, de altvtar este Ciúme que
gosta de rebaixar homens multo
grandes e que exala sua maldade
ao atingi-los com esta indigni-
dade. (f emístocles, 22, 5)
"O ostracismo não era a punição
de um crime. (Aristides, 7, 3)"

repete Plutarco. , . " ., "


Convém talvez não dar muito credito a este cn~~e ,
. como a esta "indignidade"; Plutarco exagera; eu
assim

ENSAIO SOIIRE A MOBILIZAÇÃO... 9,4


P nso, cnt~ tanto qu .
, e o ostrncismo oa<J na a hrmra qui·
alguns autores enxergam nele; qu • •le •r;i, apesar d1• tud, J,
um :>cílio ou uma allmla atenuada; ora, a panklpaçiio
pólitica era considerada boa demaLc; para que a sua privaçào
seja recebida como sinal de honra. A id6ia da "nobr :n" clr>
ostracismo vem talvez de uma má interpretação do mesmrJ
Plutarco. Com efeito, quando ele fala do último ostracismo,
o de Hipérbolo, ele vê a[ uma má aplicação da lei. Ele
começa dizendo:
Na hora, os atenten.ses apenas se
dtverttram e riram da desventura
dele, mas mats tarde /tcaram
contrariados em ver que esta
tnslttutçdo do ostracismo estava
avt(tada pela tndtgntdade do
extlado, pots esta sançdo possuía
uma certaforma de nobreza( ..)
E é aqui que se velo buscar esta expli~ção da "~obrei.a:•'
~as sem observar que é algo de muito relativo, po1S
Plutar~o prossegue da seguinte maneira:
(. ..) ou antes, se se constderava
o ostractsmo como um rebaixa-
mento (kolâseos), quando se era
aplicado a um Tucfdtdes, a um
✓ Arlsttdes, ou a pessoas de seu
valor (kal tois homoíois), para
um Htpérbolo, ao contrdrlo, era
. uma honra (itm~n) e um tema
de vanglória, ser asstm tratado,
por causa de sua peroerstdade,

95 Capt1ulo11/
da mesma forma que a elite
dos cidadãos (tois arlstols) .
(Nl'clas, I I,ó)
Tudo é muito claro: para um qualquer, é até ttmen,
mas para os aristoi, é koláseos.
O medo da tirania, cujos apoios deviam ainda ser
consideráveis no momento do estabelecimento da lei, explica
o caráter preventivo antes que punitivo do ostracismo. É
interessante notar que a tirania modela outro aspecto
desta lei: ela atinge um indivíduo, e não todo um génos,
como era freqüente nas lutas políticas do arcaísmo. Como
a própria figura do tirano, que exasperava as tensões polí-
ticas ao concentrar todo o poder sobre uma cabeça, da
mesma maneira, a lei sobre o ostracismo concentrava um
pouco arbitrariamente num indivíduo, o tirano potencial
presumido, toda a carga, e fazia cair sobre ele todo o peso
político da cidade, e exorcizava o perigo ao expulsá-lo.
Temos aqui uma transposição política muito interessante
do mecanismo (mas não da carga semântica, que é
diferente) do pbarmakós.
Processo Institucional
O exame dos procedimentoS que levavam ao ostracismo
esclarece vários problemas da mobilização política na
Atenas clássica. As questões de.erudição são numerosas e
difíceis, mas não impedem a análise. 11
Sabemos que todos os anos colocava-se a questão ao
a
démos quanto saber se convinha, naquele ano, excluir
um cidadão por ostracismo (Filocoro, frag.79 b; Constituição
de Atenas, XLIII, 5). Segundo Filocoro, é antes da oitava

FN."-410 lttlRRP. A MORnJ7.AC".ÃO. . CJ6


ritania que O povo toma esta decisão. Segundo Aristóteles,
P
que é mais preciso: "na mesma Assemblé'ia, na sexta pntarua,
· ·
além dos muntoS indicados, os prítanos colocam na ordem
do dia um voto sobre o ostracismo, para decidir se se deve
ou não proceder (. ..)"
Portanto, numa assembléia nonnal há uma deliberação
preliminar. A expressão Utiliza.da· por Aristóteles nesta
passagem, kai peri tês ostrakophorias epicbeirotonían
didóasin, nos faz pensar12 que havia voto por levanta-
mento de mãos (e não psêphos, voto com cacos), sem
debates, nem antes, nem depois do voto (contra, And6cides,
N, 3). Se a Assembléia votava, levantando.as mãos com
maioria simples, o princípio da realização, a ostracoforia se
, desenrolava seja na sexta pritania (mas nunca na mesma
reunião), seja na sétima, se os auspícios não fossem favoráveis,
mas em todo caso, como diz Filocoro, antes da oitava.
Que o ostracismo, inserido nesta data, tenha por obje-
tivo afastar os ambiciosos da eleição para a Estratégia•é
possível, mas não é o que me interessa agora. Parece-me
que a .e~~olha da data era "estratégica" de outra maneira.
Obseivemos ·o calendário: sexta pritania • 28 Posideon a 4
Antestérion; sétima pritania • 5 Antestérion a 11 Elafebólion.
Es~rr;ios em pleno inverno (janeiro, fevereiro, março),
época em que os trabalhos dos campos se acalmam e em
que é até necessário se estar mais na cidade para vender
os produtos. É também a época das festas muito populares
das Lenéias (sexta pritania) e da Antestérias (sétima),
festividades essenciais do ciclo dionisíaco. 13 O dia da
ostracoforia podia assim ser fixado num momento em

97 Capftulo lll
que a afluência poderia s .
ermáx1ma•
dia em que um movun·ent . b , em todo caso1 num
o ma itual
desse a impressão de mente forte na ágora
que toda a cid d
Curioso paralelo ª e estava lá.
entre este vot
excluía um indivídu o pe1o qual a cidade
ocomoperig
essas festas com t; . . oso para a democracia e
Orte Participação p la -
alienante! Essa ~ opu r e de mecanismo
. õe s estas onde o unanimismo é buscado nas
Proc1ss s nas represe ~ ·
' ntaçoes teatrais, onde a alienação é
provocada pelo consumo exagerado de bebida (pithoigia
choes), se
. mostram pr6ximas• do ostracismo,
. esta espécie'
de unanimismo vingador e profiJático em que o suposto
futuro tirano é expulso como os Khéresno último dia das
Antestérias, numa espécie de exorcismo coletivo.
Uma vez a maioria dos votos na assembléia tendo
decidido Relo sµn, a ostracoforia era organizada. Vários
aspectos distinguem a ostracoforia de uma ekk/esía normal
(kyrla o~ não) e contribuem para atribuir-lhe um caráter
especial, excepcional. A reunião era presidida pelos nove
arcantes e pela Boulê completa, e não, como de hábito,
..
pelo ep'istate da Boulê e pelos pritanos. O ostracismo se
desenrola na ágora e não na Pnyx, o que, além do caráter
solene (pois a ágora era o antigo local de reunião), multi-
plicava a capacidade de público.14 Isso era necessário pois
a afluência era, nessas ocasiões, excepcional. Trata-se
de uma reunião que poderíamos chamar, seguindo a
terminologia de Hesichius, uma kataklesía, "reunião de
população vinda do campo para a cidade quando se devia
resoiver uma questão mais importante que as habituais" .15•

ENSAIO SOBRE A MOWUZAÇÃO... 98


Barreiras can pranchas de madeira dispo5t.as em círculo
eram erguidas, com dez portas de entrada; o voto se fazia
por tribo (Plutarco, Aristides, B; Pollux, 8, 20). Provavel-
mente os buleutas se agrupavam por tribo na entr~da,
nos locais onde os outros membros da tribo deviam se
apresentar. Eles podiam assim controlar a identidade dos
Votantes com o auxílio dopínaxekklesiastikospara evitar
qualquer fraude. Este controle na entrada teria permitido
também a contagem dos votantes, para saber se pelo
menos seis mil votos tinham sido exprimidos. Mas eu não
creio que isso fosse necessário, por não acreditar muito na
hipótese do quórum de seis mil votos.
Os votos eram feitos por incisão nos cacos de cerâmica
(ostraca), de fonna e tamanho variados, do nome do cidadão
que se desejava ver ostracizado. Podia-se trazer consigo o
caco já escrito, para simplesmente depo$itá-lo na uma. O
que permitia o voto a todos os cidadãos, pois, ainda que
sejamos muito "otimistas" sobre o grau de alfabetização na
Atenas clássica, é certo ·que unia parte pelo menos do
corpo cívico não sabia escrever.16
Uma vez fechada a votação e a contagem dos votos
realizadà, o resultado era proclamado. Aqui, caímos num
debate que sempre, desde a própria Antiguidade, dividiu
os hfstortadores. Para alguns, havia ostracismo se o quórum
de s~ mil votos fosse atingido. Neste caso, quem tivesse
o maior mlmero de votos, devia, num prazo de dez dias, e
por dez anos, deixar a Ática. 17 Segundo Plutarco, trata-se
exatamente de quórum:

99 Capítulo Ili
Os magistrados ~ m inicial-
mente a totalidade dos cacos
depositados. Se o número de
ooÍantes .,-a Inferior a seis mt~
não bavta ostracismo. Depois,
contava-se separadamente os
cacos com cada ncme, e o homem
que tinha contra si o mator
número de votos era procla-
mado banido por dez anos,
mas sem perda dos seus bens.
(Aristides, 7, 6)
Q_
Nesta hipótese, a contagem na entrada permitiria sabe_r
CI'.)
::::, se o quórum havia sido atingido, já que devemos considerar
.......... improvável u~ primeira contagem de seis mil votos apenas
:::t: o
para saber se quórum ti~ sido atingido, seguida da
<..) contagem dos nomes escritos nos cacos.
--.J Segundo Pollux (8, 20), quem obtinha seis mil votos
LL
L.L com seu nome é que devia partir. A mesma formulação é

-- dada pelo escoliásta de Aristófanes ( Os Cavaleiros, verso


855) e, sobretudo, por Filocoro que é, sem dúvida, de
todas as fontes em jogo, a mais preciosa. Ele diz (frag.79b)
que aquele que tinha a majoria dqs votos, maioria não
inferior a seis mil sufrágios, devia deixar a cidade.
Muita tinta foi gasta para pesar os méritos, as lacunas,
as probabilidades e as impossibilidades des.sas fontes e suas
interpretações. Eu não tenho nenhum dado novo a acres-
centar a esse respeito, mas apenas algumas conclusões a tirar.

ENSAIO SOUIAMOIIIIUAÇÃO... J OQ
Quórum ou maioria, seis mil votos é muita gente. A
afluência às reuniões e a participação dos cidadãos devem
ser sempre sin.iaclas no contexto histórico. Alguns historia-
dores avaliam em três mil o núm~ro médio de participantes
numa assembléi;a nonnal. Mas podia haver fortes oscilaçôes,
segundo a importância dos 3.S.5Ufltos. 18 Tomemos um dado
numérico de Tucídides (8, 72). Diz-se que, num lapso de
tempo muito grande, nenhuma reunião em Atenas atingiu
cinco mil participantes. Alguns autores tomaram este dado
para afumar que seis mil votos era muita coisa, e que só
podia se tratar de quórum, e não de maioria. Mas cinco mil
não são seis mil. Se é para levru: q dado a sério, nunca teria -
havido ostracismo. Ora, o dado numérico está em Tucídides
'
mas na boca .de um polemist.a que quer convencer os
atenienses em Sarnas que o golpe oligárquico era legítimo.
Isso mostra, de qualquer fonna, que seis mil era um número,
não"impossível ou raro, mas elevado em relação à média.
Qualquer debate em tomo de dados numéricos antigos
é espinhoso, 19 mas sempre podemos retirar deles _algumas
informações. Carcopino~ estimou o corpo eleitoral em doze
· mil cidadãos para a Atenas de Clístenes, número que a ·
quantidade suposta de combatentes em Maratona parece
confirmar. O número de seis mil não seria, portanto, gratuito,
mas representaria a metade dos cidadãos. Portanto, a maioria
simples da Assembléia da sexta pritania devia ser reforçada
pela maioria dos votos totais possíveis na ostracoforia'7 Se
considerannos que a afluência de todo o corpo cívico a
uma re.união é uma quime~ que nunca se realizou, e que,

Capitulo Ili
101
diversas razões, um certo número de 'd d' -
.ões r; c1 a aos nao
~ às reuru "ª
que voto não era obrigató . )
a.ssemblé. de fi no , mesmo
numa ~ orte mobilização, seis mil votos deviam
representar do15 terços dos votantes ou . b
· , · d ma1S, so retudo
no 111ac10 o século V. Talvez seja a razão do ostracismo ter
levado tanto tempo para ser aplicado pela P . .
nme1ra vez.
O ~ento mais podeI050, já avançado por Carcopino,
mas negligenciado pela maior parte dos autores subse-
qüentes, em favor da hipótese da maioria e não do quórum,
é o seguinte: vamos supor que a Assembléia tenha votado
a realização da ostracoforia e que, segundo os defensores
desta hipótese, seis mil votos no total sejam necessários.
Se houver uma grande dispersão dos votos, um número
muito pequeno de votos pode exilar um homem, enquanto
que no século IV, seis mil votos no. mesmo homem. são
necessários, por exemplo, para a concessão do direito de
cidadania. TÕmerrios agora o outro extremo do leque, e
consideremos o caso, mais provável no início do ostracismo,
em que os votos se concentram muito numa só pessoa,
de cal maneira que cinco mil e oitocentos votos tenham
um nome, apenas duzentos outro nome, duzentos votos
ju tamente dos partidários daquele chefe que teve os
in o mil e oitocentos contra ele.21 Teríamos no total os
i mil do quórum e aquel cujo nome mais apareceu
( mco mil e oitocentos) seria ostracizado. Ao contrário, se
u du nt amigos tivessem ficado em casa, o qu~rum
o terl ido atingido e ele não seria ostracizado. Ora, a
bre o tra ismo cem por objetivo a participação dos
o , u mobilização pela defesa da democrac ia, e

10 111:A MOW:.IZA O ]0
não a apatia, que seria estimulada, já que muito proveitosa
a uma parte dos eleitores.
Mas há um caso ainda pior. Suponhamos que os amigos
daquele que terá cinco mil e oitocentos votos contra si
tenham compreendido esta incitação à apatia e tenham
ficado em casa. Com cinco mil e oitocentos votos, seu
líder não seria ostracizado, enquanto que em outra situação,
tão v_erossímil quanto .a primeira, e com os votos ficando
um pouco mais dispersos, de seis mil votos exprimidos (e,
portanto, levando ao ostracismo do mais vota~o, de acordo
com esta hipótese), o mais votado tendo recebido três mil
ostraca com seu nome,. um .outro·dois mil, outro enfim mil
votos. Um homem seria, cóm três mil votos, privado
durante dez anos de seus preciosos direitos políticos,
enquanto que o primeiro, 'com seus cinco mil e_oitocentos
votos, continuaria tranqililamente sua carreira política.
Temos o direito legítimo de duvidar que a cabeça dos
antigos funcionasse exatamente como a nossa, mas
·sempre a partir de análises concretas, e, neste caso, eu
não encontro explicação.
Portanto, seis mil votos num nome específico, no mínimo,
ou então, com mais de um "candidato" além desta quantidade,
o mais votado. De fato, é um número muito elevado, e é
talvez por Jsso que, previsto desde as refonnas de Clístenes,
o ostracismo só será aplicado pela primeira vez em 488,
vinte anos mais tarde, o que não afasta outras tentativas
de ostracismo neste lapso de vinte anos. A instituição não
ficou forçosamente esquecida durante este tempo. É também,
talvez, a rai.ão dele só ter s·i do aplicado uma dezena de

. 103 Capítulo Ili


vezes, mais ou menos, no primeiro século de sua história;
seu declínio ulterior é expliclvel por outras razões.
Mu este número, ou seja, a maioria de seis mil votos,
que supõe pa.rucipação total superior a esta cifra, não é
ecaFflldo <Xll1lO da.em alguns aurores.33 0s contemporâneos
si.o muíto impres.,ionados por nossos parlamentos vazios
e pelas esrarfsdcas de abstençlo eleitoral, assim como pelas
teorias sobre as "virtudes• da apatia em demoaacia, como
mostrou Plnley. 35 Na Atenas clássica, os debates sobre certos
asaunros tinham resul~ importantes e, sobretudo, muito
imediatos aobre a vida privada dos cidadãos, e até sobre
sua fonuna; é:la mesma forma, a atividadC: política tinha
uma •aura" especial nesta cultura. De tal forma que nós
podemos imaginar participações em massa sem medo de
nas enganar.
ED exlgencia de participação em massa, oom maiorias
elevadas, era necessiria para criara idéia de que a cidade,
de fonna quue unlnime, tomava urna decisão tão grave.
ta maioria de seis mil V0t05 da lei sobre o ~cismo que
mspirou maiorias de mesmo número exigida pelos
n6mol ,p' andrl, ooncesdo de atleta, atribui do direito
de ádadanla.
MeC:an.tlfflOI de Mobilização
procedimento institucional que
, uma grmde mobiJiTJ.ção
os meainismos da
mo situação para que a
n U detemunado homem

J
Todas as vocações da lei sobre o ostracismo, inicial-
mente o voto para saber se haveria ostracoforia ou não,
em seguida o voto do ostracismo propriamente dito, se
desenrolavam sem qualquer deliberação, nem antes, nem
depois. Ora, a mobilização devia ser considerável para que
o ~cismo fosse alcm~do. IS&> era perfeitamente possível,
pois, para o voto da ostracoforia, a data era fixada numa
época do ano em que todos os cidadãos sabiam que a
questão seria fonnulada, 24 ou seja, votava-se o princípio
da realização da ostracoforia já com alguém em mente;
mas os candidatos podiam ser vários, sobretudo mais
tarde. Podemos saber algo sobre isso a partir d~ um relato
de Plutarco: · ·
Quanto a Aristides, sua alcunha
inicialmentefez quefosse amado,
em seguida suscitou contra ele a
inveja, sobretudo quando Temís-
tocles fez correr entre o povo o
rumor que Aristides, julgando
e decidindo sobre tudo, linba -
redUZido a nada os tribunais e
se tinha constituído clandesti- -
namente uma monarquia sem
guarda-costas. Já, sem dúvida,
o povo, orgulhoso pela vitória e
• • alimen1ando as maiores preten-
sões, tolerava mal aqueles que
o nome e a repuiaçào elevavam
actma da multidão. (Aristides,
7, 1).

105 Capilulo Ili


ft ;usciça e a time de Aristides, que são a base de seu
~scfgio, tomam-se grandes demais, até provocar um mal-
esf3f no povo. Ele se toma a espiga mais alta que as outi:as!
Mas isso é apenas o terreno favorável. É Temístocles que,
por uma campanha bem orquestrada, faz "correr entre o
povo o rumor" ... E quais são· as a·cusações precisas; pois
elas eram necessárias neste rumor. É que ele retira uma
p~rte da soberania do démos em matéria de justiça (e
sabemos que este era um domínio conseivado com ciúme
pelo povo) e que ele constitui para si uma monarquia
adoruphâreton; ou seja, ele não chega a ser como Pisístrato,
que tomou o poder com tal guarda, mas mesmo com a
negação que se justapõe, a simples menção dos guarda- .
costas é suficiente para aproximar sua imagem à de um
tirano. A campanha·é muito hábil; o "rumor" possui o tom
e o ritmo ne-cessários para ir direto aos ouvidos do dêmos.
Além do mais, temos a prova de que isso funcionou. ~uito
bem, já que Plutarco continua:
No momento em que, nesta
.ocasião, escrevia-s_e os nomes
nos cacos, diz-se quê um cam-
ponês, um verdadeiro caipira

- que não sabia escrever, estendeu


seu caco a Aristides, como se este
fosse qualquer um, e pediu a
ele que escrevesse o nome de
Aristides. Este último, surpreso,
perguntou-lhe se Aristides tinha
feito a ele algum mal: "Nenhum,

ENSAIO SOllRE A MOlllUZAÇÀO... } 06


respondeu o camponês, e cu
nem conheço este homem; mas
eSlou cansado de ouvi-lo sendo
cbarr,ado o Justo em toda parte."
(Aristides, 7, 7)
Plutarco cone .
a em seguida que Aristides escreveu
seu próprio nome no caco e o entregou ao camponês.
Em
outra versão do mesmo episódio (Cornelius Nepos
Arlstfd es, I), ele só observa e não escreve ele próprio seu'
nome. De qualquer forma, a mobilização é excepcional, e
chegam à cidade pessoas que não possuem ·o hápito de
freqüentá-la. O camponês nem conhecia Aristides, um dos
chefes mais famosos do momento.
Neste caso, a campanha pára no rumor, na propaganda
política. Mas sabemos que isso podia ir muito mais longe
e, a partir de uma descoberta excepcional de um lote de
cacos, foi pos.5ível afirmar, com muita verossimilhança, que,
por vezes, ia=-se até ao ponto de preparar cacos prontos
com o nome do adversário que se queria ostracizar, para
apenas distribuí-los aos cidadãos um pouco antes da votação,
o que também resolvia o problema dos que não sabiam
escrever. Trata-se, aliás, de uma peça'-chave·no debate
sobre o grau de iletrismo na Atenas clássica. 25
Esta propaganda, estas articulações políticas que lev~m
à mobilização do démos, tendo em vista um procedimento
de ostracismo, são em grande parte realizadas no âmbito
das hetairias, essas malhas de relacionamento social
constituídas pelos políticos·mais ativos e suas famílias para

107
dar-lhes apoio político, o que inclui a atividade es.sencial da
justiça, rãa intimamente ligada à política na Atenas clássica.
Ora, pode acontecer que a propaganda política degenere
no que nós hoje chamariamos "manobra politiqueira". É o
que ocorre no caso do ostracismo de Hipéroolo:
Em ~ü:úi, quando se começou
a submeter a este vo.ro bomens
sem nobreza e sem valor, Hipér-
boio foi o último a ser atingido,
e deixou-se de recorrer ao ostra-
cismo. Diz-se que Hipérbola /01
ostracizado pelo sigutrue mo&c.
Alcibíades e Nictas, os bomens
mais tnj}uenles da cidade, encon-
travam-se em conjliJo. Ora, como
o povo deven·a se pronunciar
quaruo ao osrractsmo e que ele
ta, com toda evidência, proscrever
um dos dois, eles eruraram em
acordo para unir suas duas
Jacçiies, e fizeram recatr o ostra-
cismo sobre Hipérbolo. (Plutarco.
Aristides, 7, 3-4)
Em outro lugar, o mesmo Plutarco dá outra versão:
Quando ele teve certeza que o
OSlractsmo atingiria um dos três
oradores, Alcibíades reuniu os
diferentes partidos, e, tendo-se
altado a Níctas, fez recair o
ostracismo sobre Hipérbola .

Plll~Aln Y'IHRF. A MOBWZACÃO.. J 08


Alguns afirmam que nào foi
com Níctas, mas com Féax que
Alcibíades se aliou, e que foi ao
Juntar ao seu o partido de Féax
que ele fez expulsar Hipérbolo,
que não esperava isso de fonna
alguma. (Alcibíades, 13, 7-8)
Temos outros detalhes numa terceira versão, na qual, após
ter explicado as razões do conflito entre Nícias e A..lcibíades,
as queixas do démoscontra um e outro, Plutarco diz:
Este homem (Hipérbolo) acre-
dita-se então ao abrigo do ostra-
cismo, pois o que ele merecia era
o pelourlnho, e ele esperava que,
se um dos dois /1JSse banido, ele
estaria em situação de lutar
contra o que sobrasse. É a razão
pela qual ele se deliciava osten-
sivamente com a briga e excitava
o povo contra um e contra o
outro. Nessas cond.tções, Nicias
e Alcibiades, constatando sua
malignidade, colocaram-se secre- ·
tamente em relação um com o
outro, e reuniram seus dois
partidos (stáseis) num só bloco,
de tal maneira que não foi um
dos dois, e sim Htpérbolo que
foi atingido pelo ostracismo. -
(Nfcias, 11,4-5)

109 Capítulo Ili


# versões de Plutarco são e
·--a.s o que elas possuem em m pan: contraditórias, 26
p,- comum e suf1 1·
,-rá um conflito no topo do Estad ~ ente aqui.
0
homens diferentes _,, entre onentaçôes e
· O uemos tem q ·
Um político de segunda orde u~ixas contra os dois.
maneira muit . m expora, mas talvez de
. o .ostensiva e com pouca habil'd 1 d
descontenta a e, este
. menco. Há um acordo no topo (diretamente ou
por mtennédio de subalternos), e o 05tracismo é desviado
sobre Hipérbole. Observemos que ele é desviado de
surpresa, o que não pode nos surpreender, pois não.há
debate público e, para orientar um voto de ostracismo as
teias do tipo das hetairias são muito mais eficazes.
Ora, é muito claro que Plur.arcó diminui muito Hipérbolo,
que não era um político assim tão baixo e desprezível. 27
Devemos então evitar uma interpretação que, seguindo
esta via, apresentaria o ostracismo do final do século V
como um desvio em direção às lutas políticas de um 1
1
1

mecanismo elaborado por Clístenes para fins mais nobres.


É certo que os trabalhos sobre as hetairias mostram que 1
houve uma evolução e que, em especial, 05 golpes oligãrquico.5
do fim do século são de certa forma uma reação contra a
ligação mais direta com o démos, que certos líderes
conseguiram estabelecer, no período posterior a Péricles,
contornando assim as relações sociais tradicionais e suas
malhas. 28 Mas não se deve exagerar, pois estamos de fato
numa grande continuidade. Voltemos um pouco no tempo,
ao ostracismo de Címon:

ENSAIO SOIIRf A MOISIUZAÇÃO... 11 0


Com a força do apoto do povo,
Nricles aumentou sua apostção
a este Conselho e conseguiu,
pelo tntermldto de Eftaltes, retirar
dele a mator parte de suas atri-
buições, em seguida ele acusou
C{mon de ser amigo dos I.acede-
mdnios e tntm(IJo da democracia,
e fez banir por ostracismo este
homem que não ficava abaixo
de nenhum outro quanto li
fortuna e ao nascimento, que
havia conseguido sobre os
bdrbaros as vtt6rtas mais glo-
riosas, e que ttnba enchido a
cidade de riquezas e de despojos
abundantes, como eu Já contei
na sua vida, Tal era o ascen-
dente de Pértcles sobre o povo.
(Péricles, 9, 5)
Ainda aqu~ no ostracismo de Cúnon, vemos que é através
de redes pessoais que a campanha se desenvolve ("ele
acusou C'tmon"), já que não há debate público oficial.
Mas, voltemos ainda um instante até à origem da lei
sobre o ostracismo. Sabemos que na luta feroz entre
Clístenes e Iságoras pelo poder, foi Iságoras que teve a
vantagem inicial, e que Clístenes só venceu no final por
ter "feito entrar opovo na sua hetairia"; em outros termos,
ele inchou sua rede pessoal pela entrada de um contin-
gente numeroso saído das camadas populares.

111
Acerca da dimensão dessas redes pessoais e familiares,
podemos ter uma idéia aproximativa (apenas isso) a partir
das indicações de Aristóteles. Lá pelo meio da luta entre
Clístenes e lságoras, Aristóteles diz:
Quando Clistenes fugiu, Cleô-
menes, chegando com uma
pequena tropa, bantu como
sacrílegas setecentas famfltas
(oikías) atenienses,- depois ele
tentou dispersar o Conselho e
dar plenos poderes sobre o Estado
a·Iságoras e a trezentos dos seus
amigos (tôn phílon). (Constituição
de Atenas, 20, 3)

Setecentas farnilias de um lado, trezentos amigos prontos


para governar juntos de outro, são números que podem
ser discutidos até à exaustão (o que muitos já fizeram), mas
que dão uma ordem de grandeza dessas redes familiares e
de anúzade prontas a apoiar alguém, eventualmente a se
constituir em alavanca para uma campanha de ostracismo.
O ostracismo traz uma·novidad~ radical a essas lutas do
fmal do arcaísmo. Ele evita a violência intracomurútária pela
manifestação em massa do povo, concentrada num homem,
donde a importância da imagem de "cidade unânime" que
os procedimentos do voto buscavam criar.
Os atenienses dispunham, assim, de um mecanismo muito
eficaz para evitar a tirania, mas também eventualmente
descartar uma linha política pelo afastamento de seu chefe.
como sublinhava faz muitos anos Carcopino, era uma

ENSAIO SOBIIII A MOWUZACÃO... J J2


medida infinitamente
. mais branda que um exílio ou, mais
ainda, que uma atimia. A gradação é muito clara, quando
vemos uma mudança na lei prescrevendo que, se uma
interdição prevista na pena do ostracismo fosse violada, o
ostracismo se transformaria em atimia.
Sabemos que a política antiga era, ainda mais que a
nossa, concentrada em pessoas. Ouçamos Plutarco uma
última vez:
No fim, Pérlcles entrou em luta
com Tucídides, assumindo os
riscos e perigos, por um ostra-
cismo; ele obteve o banimento
de seu adversário e a dissolução
do partido, que lht fazia oposição
(katéluse de ten antitetagménen
hetaireían)
Como vemos, é o grupo, a hetairia de Tucídides que,
privado de seu chefe, perde a razão de ser: "As divisões
tendo, desde então, cessado completamente, e a cidade
tendo se tomado, por assim dizer, harmoniosa e perfeita-
mente una( ...)." (Péricles, 14, 3; 15, 1)
Outra vez mais, é o medo da stasis e de suas conse-
qüências, a busca do bom entendimento cívico, esta
busca sem fim que atravessa a história da cidade grega,
que ilumina a instituição do ostracismo. Para afastar um
cidadão influente que não fosse culpado de um crime, era
·a única alternativa ao assas.5inato. O ostracismo foi, portanto,
um mecanismo que, pela grande mobilização política que
implica, ajudou a consolidar o poder do démos, ainda que

111 r.12níti, /r, Ili


~zes a manipulação tenha ido longe. o ostracismo
~lida o poder do démos, é verdade, pelos seus efeitos,
,nas nem tanto, já que só houve uns dez durante um sép..ilo;
eJe o consolida principalmente pelo fato de ser possív~l,
uma virtualidade anualmente ao alcance do povo. Para
nós historiadores, pelo estado de_ espírito e -pelo. ~ipo de
ética que o sustentam, é um caso interessantíssimo. Ele
ajuda a explicar a surpreendente estabilidade do regime
~democrático em Atenas, no século V com certeza, mas
talvez ainda no século IV, já que no tempo de Aristóteles
ele não tinha sido abolido. É talvez aqui que devamos
buscar a razão do fascínio, desmedido em relação à sua
importância real e à sua freqüência, que esta instituição
suscitou ao longo de toda a Antiguidade, e de novo nos
tempos moderno~. '

ENSAIO SOBU. A M0811JZAÇÃO._ 114


CAP1TUto IV

QUANDO OS EXCLIBDOS CONTAM: .


ESCRAVOS, CIDADÃOS E A
MOBILIZAÇÃO ; POLÍTICA
NA GRÉCIA
1 '

..

O homcrn (; um ~nJií1ítl f/..,.:.


tlco, ou seja, destinado a vjver em sociedadé, v.:g r,dr,, ~,
célebre expressão de Arist6teles. Fonnulação que mtrr-_.,d ...z
uma dificuldade, por utilizar no fundo a n esma fAtlá·1ra,
polis, para definir a uma só vez a vida social e a •;ida v,;' .,..2,.
O p;oblema é explicito para nós, que sendmú<; a net-K>~1'¼1f..:e
de desdobrar a fórmula de Aristóteles para torná-la :r~M..
clara, mas ele já se colocava, de forrna irr plícita, f.1í-lra ,. .,"-
.
gregos clássi.COS. De um lado o "homem", o ger1ero
,. n' rr.i:.r ,. ,
de outro, a polis. Entre os dois, uma equivalênc.ia irúp--.H,í·1é.,
só uma pequena parte dos seres h
como corpo político, se não tem um~nos constitui a
. ,.. . os receio da r .,
~ equ1valencia é tão problemática . epetiÇao.
que o própno Arist6 1
chega a produzir sua teoria tão el b. te es
. ~ ' a orada e com li da
.da escravidão natural. o escravo não é . P ca ,
" 1 . .d " , com efeito o único
exc u1 o , mas enquanto caso Jim1·r é ' .
.' • • . e, e1e que cristaliza
-mmtas vezes o imaginário do mundo da 1 ,
, . . . . exc usao, que
/compreende também os estrangeiros as m lh
·. : , u eres, os
·!Jovens, por vezes também os anciãos e os dependentes
Famponeses, tais como essas categorias são entendidas
~los verdadeiros "políticos", os machos, adultos, nacionais,
~om direito de participação nas decisões comuns, definição
~ue pode englobar uma massa humana maior ou menor,
~egundo os casos específicos.
Eis as duas palavras-chave: ~xdusâo e participà.ção. E,
sem dúvida,_seria. necessário distinguir dois píveis de
anãlise: de um lado, o direito e a ideoldgia; de outro, a
realiêfud~.'Entre os dois, um descompasso, já que uma
se
ideologia, ela infonna a elaboração de um direito positivo,
se ela é até um dos princípios de interpretação e de inte-
ligibilidade do mundo, não pode jamais esgotar em sua
explicação a complexidade do real, não pode nunca
controlá-lo inteiramente. É pqr_~.~~ -~ ~o. qµ_e realidade e
ideo~~~ _f)ãp _~ q @óveis. E;··i d~logia é, por outro lado, um
,instruf!l~~~<?..de_controle de _uma p~e sot:,re o todo social.
· No caso da Grécia antiga, a ideologia nobre alargada
que prevalecerá ao longo de toda a época clássica terá a
pretensão de ser muito clara. De um lado, os que possuem o
~ireito de pa1~ti~ipar, de outro, os..que não o poss.uem. Ela

ENSAIO SOIIRJ! A MOIIIU2.AÇÃO... 118


oonsegue em parte modelar o mundo segundo seus desejos
e, quando os gregos (e nós mesmos, depois deles) falam
de p o l í t i c a , ~ ~ ~ e ~brerudo n ~ d ~
~s-<~~tés~ty__iç~t ~ l~~- Entretanto, ~pesar de
seus esforços e das garras que essa ideologia tera sobre os
espíritn5, os excluíél~ pemam, têm fom~~M>~· Além
do mais, eies vivem num mundo frágil, feito de pequenas
comunidades numerosas, ameaçadas por vizinhos pode-
rosos. Se a ideQJ~ da exclusão deve tanto mais se fazer
presente e premente (donde sua imagem todo-poderosa
para nós), isso se deve ao fato de que a realidade muicas
vezes resiste a ela. Eis a razão de não podermos, numa
. reflexão sobre a m~@H7.ãçãÕ-pôfrtic2., e~u~re.~: q papel
.
dos~ num domínio de onde, teoricamente, eles
-.!--- ~· .-.----:-· ·.
deveriam
____... ..
, . ...estar
. .. .
~~-
ausentes.
~ ...
A mobiliz.açâo política não é um fim em si. Age-se, em
certas condições concretas, na medida das possibilidades
do momento-, em vista de algum resultado. O agir não
é, ponanto, dissociado dos móveis da ação. O esforço
estimado necessário e o cálculo das possibilidades de
sucesso são pennanentemente avaliados em relação aos
resultados esperados.
Partamos, então, do "ponto de vista" dos escravos. A
eset2vldão é uma condição jurídica que coloca um ser
humano sob controle de outro; além disso, é uma situação
socialmente julgada muito ruim. De um ponto de vista
"racional•, os escravos deviam ter por objetivo final a
ª,boliçio des.,e Jaço jurídico e o acesso à liberdade. Deve-
~ por consegu·
' mte, esperar ações tão vigorosas e

119
Cap{tulo IV
freqO t quanto possível, com um máximo de organli.ação
ntre os interessados, tendo por objetivo a liberdade.
;ntretanto,·esta "razão" é a nossa, ~-não a do mundo
a.ntiao..J';,leste mundo, a posslbllldade de sucesso dessas
a ~ era quase sempre fraca demais para que os interessados
Julgcissem ter o interesse em se arriscar. A mobilização dos
escravos tendo em vi~ta a liberdade foi, portanto, rara. As
revoltas de escravos existiram, é verdade, mas elas foram
pouco nu.merosas e conçentradas no tempo. A. revolt.J ele
AristônicÔ, a rev«:>lta de Eunus ou a de EspãÍtaco foram
acontecimentos espetaculares e muito importantes, por
terem questionado, provisoriamente, o mundo elitista e
hierárquico, tal como ele se organizava naf~ãlfç{ãdc! e na
jdeoiogia dominante. Os historiadores muitas vezes se
interrogaram.acerca da raridade das revoltaS. Hoje em dia,
conhecemos bem algumas das razões. As grandes concen-
trações de escravos eram evitada$, escravos de origens
diferentes eram misturados em dosagens próprias, para que
1
• l. · a diversidade de línguas, de co.stumes e de religiões retardasse
1, , . ., a comunicação a formulação de esperanças e a organização
.- i da resistência. Os escravos, em certas atividades, eram bem

.,\r~ênquadrados e vigiados. Mais tarde, a construção, por parte


dos senhores, de uma expectativa de alforria, contribuiu para
acalmar os ardores. Sem dúvida, tão importante quanto tudo
isso era a diversidade de empregos da mão-de-obra setvil,
que tomava difícil a elaboração de "reivindicações" comuns.
Finalmente, é preciso pensar na questão, levantada por
Welskopf, 1 das relações entr.e a ~aavidão e o lazer. Numa
contribuição que provocou vivos debates no C:Olóquio de

~-.,c••n cnuDD" 1•nvn,-r•rln 1?/l


Besançon, em 1973~~~-~.~~9~ s~ste_nta,_ql}~ _é a falta de
lazer dos esaavos qu_e ~~?.:~ u~~~P..~~~~-~ ento das
'reflexões sobre. sua.copg!çã9 d~ ._ grupo e .qu~ limita a
...tomada ~ consciência~de -sua .....situaçã~
•· ..
SÇ>ciai.
.. Aexpressão
ou scboll doú/ots, "os escravos não possuem lazer", ou
"os escravos não precisam de lazer", ou ainda "os escravos
não devem ter lazer'', esta expressão, que opõe assim sebo/e
a1Jt>Íiíeiti/apresenta uma vez mais o positivo e o negativo.
Scho/eé uma noção positiva (parada que pennite ativi~des
criativas). Quando do Colóquio, no debate que se seguiu à
conferência em questão, alguns participantes quiseram
demonstrar que algu~s 81"\lpoS de escravos (os pastores,
por exemplo) tinham uma rotina bastante flexível, que
lhes permitiria vários tipos de atividade paralelas à escra-
vidão. Eu não vejo o interesse desta crítica-e concordo
ª·
co~ opinião da autora, a saber, qu~__tempo livt'e e lazer
(-S!.:,!:-~-/~~ não CQ.~~.lç!c:m, O escravo -~stando sujeito à
vontade do seu senhor, ainda que ele tenha eventual-
mente tempo livre, não tem controle sobre o mesmo. O
que caracteriza o escravo é o seiviço de seu senhor; o que
caracteriza o senhor é o comando e a organização deste.
seiviço em seu proveito, para ficar livre de qualquer limi-
tação. A atividade produtiva do escravo é apenas um meio
de tornar possível a sebo/e do senhor.
Mas eu me pergunto também até que ponto devemos
seguir esta análise. É certo que houve poucas revoltas seJ.Vis;
mas algumas aconteceram. Ora, a aceitação total da teoria
de Welskopf tornaria qualquer tomada de consciência
coletiva impossível e, por conseguinte, impossível qualquer

1?1 ,,....... ,... ,.. ,,,


de escravos. Eu me inc1· .
marta a to
lskopf como um ele mar a expiicaça'0
menta a ma·
nada, de obstáculos à mobfüz, is na lista, muito
por is.so fazer dela urna . ação dos escravos sem
espécie de J • É '
saber até que ponto os es e1. muito delicado
cravos em qu stã .
realmente a ideologia d . e o mcorporavam
. ommante que t .
a dicotomia sebo/e-dou/eia ' entava impor-lhes
caiamos na armad'Jh . Que pelo menos nós não
1 a.
Uma coisa é certa· q
p d . . . , uer a revolta de escravos se
ro uz~ md1v1duaJmente {mesmo em grande número) e
se ~nifeste pela fuga em ordem dispersa, quer ela se
manifeste através de ações organizadas que estabeleçam
u~ relação de força mili~~-~~~turas políticas estabe-
lecidas, nos dois casos,..-·â"liberdade pennanece sendo 0
.objetivo maio!·. Não ve~;fu~üiãçãocie"ümã ÕigãriizaÇ2ó
social alternativa que realize a abolição da escravidão como
instiruição. Evidentemente, a perda de um grande número
de escravos. era um fato grave, pois, se, teoricamente, outros
escravos podiam vir substituí-los, objetivamente as condições
históricas nem sempre o permitiam de imediato. 2 E,
sobretudo, o exemplo era detestável. Então, o melhor a
fazer era reprimir o mais depressa possível. E, de prefe-
rência, não ser mesquinho na repressão. O prejuízo material
do massacre em massa dos escravos representava uma
perda enorme; mas quanto maior fosse a destruição de
valor mobiliário em escravos mortos, mais brilhante era a
manifestação de força dos senhores. A primeira coisa a ser
feita para reconstituir um sistema posto à prova é salv~-1~
ideologicamente.

ENSAIO SOISRE A MOISIUZAÇÃO... J.22·


f: ilmTornada de consciência difícil, revolta rara. Podemos
ac ente concluir que · ... •
a res1stenc1a dos escravos passava
poroutros meios,
· que não examinaremos em sua maioria
nos lirni d ' ,
tes este ensaio. Mas seria muito fãcil se a história
se deixasse encerrar nesses esquemas globais que é

~~oa:,~l~i~~~T:
' " -• ••• .,,.._...,..,.-1..-.,...,_.. _,......,_.,,r..,,., .• .,,. ......
J. . - • "··· - •"''-- ~ - - - - - -..... , , .,,

~ Isso é sem dúvida verdadeiro, mas trunbém


é verdade que este caminho foi rude. A estaS considerações
globais sobre o interesse dos senhores e as limitações dos
escravos, juntam-se outras questões que complicam
singulannente o quadro, pois são freqüentemente cidadãos
livres que suscitam a mobilização de escravos.
Muito mais freqüente que a mobilização seivil tendo
em vista a revolta, a n:iob.iliza_ção de escravos, suscitada
por cidadãos, para~-
intervenção nos assuntos da cidade
não é também, se adotamos uma visã~ de conjunto da
. história grega, muito corrente. É só a contragosto que a
cidade se decide, apesar de tudo, a ver não-cidadãos
desempenharem um papel nós seus assuntos. É preciso
que haja uma aise particularmente grave para que possamos
constatar a convergência da mobilização dos escravos e
dos cidadão:;. Nestes casos extremos, somos capazes, mais
facilmente, de medir os sintomas das crises políades, pois
que são mais claros. :
Dfgmlos, para smplif1car, que há três tipos de mobilização:
em primeiro lugar, em circunstâncias de perigo militar; em
seguida, quando de reconstituições do corpo cívico;
finalmente, quando há stasts. Eu faço esta distinção entre

.· 12.3 Capitulo IV
trb ~ puros por comodidade, pois na realidade eles
misturam muilJs vezes. Mas, na medida em que podemos
distlngui-1~, eu diria que a ordem na qual eu os enumerei
é tamb&n uma dassifkação de freqüência, a mobilização
cm momentos de perigo militar sendo a mais comum.
Palando da gueaa, estamos também falando de política.
Nlo se trata de seguir Clausewitz neste caso, mas simples-
mente de se situar no universo ideológico do mundo grego,
uma vez que guerra e política, p(t)ólemos e p(t)ólts são
termos liga~ desde, pelo menos, a época núcênica. Num
belo paradoxo, não foi o "realista" Aristóteles, que neste
dcmfnio foi muiro longe com sua teoria da ~vidão natural,
mas, ao contrtrio, o "idealista• Platão que reconhecia, com
-~·-····~•"· ........ .
~ bela clarividência~ que a -única explicação para a
csrabilidade do ~er dos senhores sobre os escravos era
.a existência eia jJo#i.
Constatamos que quando a polis está
em perigo, esra estabilidade é sacudida. Inicialmente, ela
agrava singularmente o problema da fuga de escravos,
10luçlo individual e desesperada, mas que, em grande
n\lmero, nlo deixa de ameaçar o sistema escravista
nquanto tal. O~ possulmos vários testemunhos.
Em seu belo estudo sobre as relações entre guerra e
vidão, Garlan dá uma lista muito interes.sante.3 Quando
da gu rra do Peloponeso, por exemplo, ranto espartanos
qu nto t nicnse o atingidos pela fuga de escravos
(Tu (di , IV, 41, 3; VII, 27, 5). Eu não vou multiplicar os
empl , ufidenternente n ~ para que, ainda na
poca em qu Roma nvolvc nas questões do Oriente,
trata~ de paz prevqam a restituição~ esaavos no

A .....-•zM"..IO 124
finl. das hostilidades. Mas a fuga é uma solução desesperada
que •só raramente desemboca na liberdade. A escravidão
era "universal" na Antiguidade; estimular a fuga de escravos
do adversário, prometer-lhes a liberdade, era expor-se
também a esta calamidade. Além disso, era violar uma
"lei" da guerra e provocar um enonne escândalo. Deixemos
então de lado a fuga.
Muitas vezes, quando as circuns!ã,~~~ ~~ graves, os
-~sciavos eram chamados a participar da defesa da cidade,
em combates de terra e mar. NãQ falamos aqui da partici-
11
pação normal" dos escravos, que em seu papel social
habitual de servidores, ajudavam ós.senhores nos diversos
serviços ligados à preparação do combate. O que nos
interessa, é a mobilização para a lura, enquanto combatentes.
A participação de escravos na marinha, como remado-
res, é mais que certa. Na batalha das Arginusas, em 406
(Xenofonte, Helêntcas, 1, 6, 24), os atenienses fazem uso
deles; Córcira, em sua luta contra Corinto, em 433 (Tucídides,
1, 55, 1); os espartanos também, como percebemos num ·
~rso do ateniense Cefisodoto (Xenofonte, Helênicas, VII,
12-13). Soinos ainda melhor informados sobre a participação
dos escravos nos combates em terra, o que é em parte
su,rpreendente, pois esta fonna de luta tem mais prestígio
que a naval, mas apenas aparentemente; como mostrou
Garlan, 4 somos, por um lado, melhor informados quanto
aos combates terrestres e, por outro lado, estes eram os
combates mais desesperados, nos quais a sobrevivência
da cidade era jogada, e portanto onde a necessidade de
apelar aos escravos era mais premente.
Capitulo IV
125
11\ 1 ' qu.tnro il isso e , fi
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•' ' ~ s, lV 80 5) "
UU.t l ~l~,, gund . ' ' · Em 369, no conílito
onr (Ho/6nica,ç, vr, 5, 28-29),
~ç magtstmdos decidiram Cbf8a,·
(I an1mclm·JJ0rproclamaçilo aos

hllótas que, aquoles dontm aios


que desejassem se arma,· e tomar
/Jnrtr nas fileiras, receberiam
~omnlias assegurando a liber-
dade• pam rodas os que tomassem
j)fl11<' r,a lllla. E, para começa,·,
houve, df:r-se, mais de seis mfl
engajados, do talfonnc, quo, po,·
reaçilo, eles inspiraram temores,
11ma vez que foram vistos todos
juntos, e que se considerou que
emm numerosos demais.
t xt , qu conflrm:1 uma vez mais, se ainda foss~
1e(.'l!,.SS:lrio, ve.rdad ira esquizofrenia dos espartanos em sua
la , a s hll ta , mostra uma particularidade.
mo muitas vezes· os "rµét.axu", s~o menos
munidadc na ional que os chattel-slaves,
" m ·-mermd ria". Por i , apesar de perigosa e proble-
mlt(.1, ·u~t parti ipaç.1 na defe a era menos aberrante.
s · rav s si\ tamb m utilizados por Atenas em ...
t· rat na, s gundo Pau ânia (1, 32, 3); é um fato tão
:tr.t rdln ri qu todo os autor s clássi os o escondem.
Conhecemos também vários exemplos de mobilização de
. ~s~~os__q~~do do .cerco de cidades, momento em que a ~

<~~-~ ·~1:,·1r1:~~ii: ;;.·;~~~~;~~i~~~~Çf!_ ~,


1t..~ênc1a da rnmun•da·,.te · d

Dos numerosos exemplos que possuímos de partic01


pação de escravos (os que eu acabei de citar e muitos )
outros), podemos retirar •algumas tendências e algumas !
constantes. Os escravos são mais facilmente utilizados na !
marinha do que no combate terrestre; em terra, eles são
com maior freqüência armados de forma leve, e não como
hóplitas (mas isso pode acontecer). Os escravos "comu-
nitários" são utilizados com maior freqüência que os escravos
"mercadoria". O caso em que a mobilização dos escravos ·.
se impõe realmente é quando a cidade está sitiada. Quando '.
a situação chega a este ponto crítico, aqueles dentre os
escravos que ainda não fugiram não podem esperar mais
nada e ainda podem perder algo (a vida ou uma mudança
de senhor que tende ainda a piorar suas condições de vida).
O m_,Qvel de sua,as;ãg t.~mpre..au..quas.e§~.ropre.aconquista
~ . 1!1-Ui~.ms.4~~-~L9-9ê9ª.Ili~~.E, aqui, vemos
uma distinção interessante: enquanto que a alforria é muitas
vezes uma condição necessária à sua participação na luta
em terra (mais prestigiosa, e que não poderia comportar a
participação de escravos), ela é, no combate marítimo, o
prêmio pelo esforço fornecido, em caso de sucesso, mas .
./
só depois da ação.
O segundo caso de intervenção de escravos na vida da
cidade é a necessi~ad.e er;n. . que se·encontram
. certas poleis
de reconstiruir seu corpo cívicq. Aqui, para os escravos o
··--··· - ··-· - --·
·• ' . .. . .. - ,

127 Capítulo IV
móvel é ainda mais sedutor. trata-se não apenas de ganhar a
1 ~ mas também de cooquistar este mel do homem
~ntia.q_g~ -~ a ~dania. &te tipo ·de ·medida sempre
enconcrou adversãrios ~~e aparece quase sempre em
drcunstindas de l\l{a
-........·civil interna, n9550 terceiro modelo.
··• ....
Tomemos o caso de Esparta. Sabemos que a sociedade
espr,utana entra. especialmente dep:>i.s da derrota de Leuctras,
num processo de crise que vai se prolongar até o final da
independência grega. Hã uma concentração da riqueza
que agrava as diferenças entre os bomotoi e lança um
grande número dentre eles para fora da elite cidadã; hã
~ um controle reforçado de espartanos individuais
sobre os hilotas, com enfraquecimento da meaiação cívica;
finalmente, há uma diminuição dramática do número dos
cidadão,, que implica uma diminuição do poderio militar da
ddade. 6 \émos, então, o aparecimento de uma suces.5ão de
"reis refonnadores" que querem restabelecer o poderio da
cidade com base na restauração do modelo ancestral. 7
Abolição das dívidas, partilha das tenas, admissão de hilocas
à cidadania provocam muito.5 conflitos. Agis IV é rapida-
mente derrubado; Ocômenes m completa seu programa,
mas tambffll é derrubado. Mais tarde, Nabis, que já é ~
um soberano helenístico do que um rei tradicional, age
orno um catalisador das esperanças e dos descontenta-
mentoS no Peloponeso, e encontra o ódio de tcxioo os
on rvadores, tanto aqueus como romanos. Apesar de
nio eswmos diante de wna contra-ideologia estruturada -
bem <1'C no de · e tlmbml no caso de Aristônico,
na · algumas influ&lcias filosóficas e religiosas tenham

1
podido dar uma certa coerência ideológica que os tomava
mais perigosos que seus predeces.5ore~ - , o simples fato de
libertar bilotas e os admitir como cidadãos era escandaloso.
O objetivo em si era o mais tradicional possível: fundar o •
poderio da cidade sobre um corpo cívico numeroso, prós-
pero, capaz de. defender-com . ardor
. a cidade no campo de
baralha. Os reformadores espartanos são um pouco como
um Sólon ou um Cüstenes, com atraso de alguns séculos, e
num mundo no qual as relações de força internacionais não
estavam mais na medida da força possível de sua cidade.
O caso de Nabis, que liberta os hilotas e os casa com as
mulheres e filhas dos cidadãos banidos (Políbio, XVI, 13,
• 1)1 e faz deles cidadãos no lugar dos exilados (Plutarco,
Filopomeno, XVI, 4), não é isolado. ClearcÔ de Heracléia
havia feito a mesma coisa em 364: morte ou exílio de
aristocratas, substituídos por escravos, provavelmente
os mariandinoi,9 portanto de tipo hilótico, mais aptos a
substituir os senhores, por serem gregos e nacionais como
eles sem que por isso as reações sejam menos veementes
(Justino, Histórias Filípicas, XVI, 5, 2-4) .
. Mas o fato não é exclusivo dos escravos "comunitários";
Aristodemos de Cumas (na Itália) faz a mesma coisa em
505-504 (casamentos com filhas e mulheres de aristocratas
massacrados) (Dênis de Halicamasso, Antiguidades Romanas,
VII, 6-11); Dênis, o Antigo, age da mesma forma.em
Siracusa (Diodoro, XIV, 7; XIV, 66). Há ainda outros fatos
de mesma ordem provocados por tiranos (Ateneu, XI, 509b;
Plutarco, Mora/ia, 402E; 245B-C)1º.

1 ?O
r,.,..,,.,,,. "'
ele i alguns exemplos da época helenística em
,rca p0r serem mais documentados (especialmente por
,ucarco), e por terem ido mais longe na lógica da substi-
cuição de cidadãos por hilotas, mas, para pennanecer ainda
um pouco em Esparta, o fato não é recente. Segundo
Tucídides, já o próprio regente Pausânias "tinha-lhes (aos
bilotas) prometido liberdade e cidadania, caso eles se
sublevassem com ele, e o ajudassem a realizar o conjunto
· do seu projeto" (1, 132). Mais tarde, em 398, Cinadon, um
inferior que pensa "que toda a massa dos bilotas, dos
neodamodes, dos inferiores e dos periecos pensavam ..
como ele (e os membros do complô): cada vez que se
chegava a falar dos espartanos, ninguém podia dissimular
o fato que teria prazer em devorá-los, ~ até crus (Xenofonte,
Helênicas, m, 3, 6); ele tenta um golpe, rapidamente abafado.
Mais interessante ainda é um caso típico de stasis. Erri
Córêira, democratas e aristocratas estão em conflito durante
a guerra do Peloponeso e, segundo Tucídides (III, 73, 74),
cada partido envtava ao campo
recrutadores de escravos prome.
tendo-lhes a liberdade; a massa
servtl se alinhou com o povo,
mas o outro campo recebeu
· oitocentos auxiliares do conti-
nente. Após um dia de tntervalo,
o combate recomeçou, e O povo
venceu, graças à Jorça de suas
posições e pela superioridade
numérica.

ENSAIO SOllKE A MOtllUZAÇÃO... JJQ


m int rt ~~:mt ', pois mos, 1., q11c , M" O.'> dois p.u 11tl, 1•,
u m int r ssc puram nt • L'Onjuntural t•m wl.11,. .1,,
::t 1~\Vo~. st s, pod •ndo •~L't>llwr, Iwns:111I qlll' e- d11
bd l p::trti I p pular lll • ·ks podem lu<:rar mais.
A li rdad , •lc; o qu • vemos d • novo cm outro <•plst'11. li1 1.
n n,mm rc nMio m •ss nlos, atn ·a "de.• surpt<·sa",
m d m ratas, s p:u1ld:'\ri se.los l:wc•Lklll nios, 111 >
mom nto m qu a ::\~orn scava ·lwl:, c.1 • ~t·ntt ; t·lt·s
• pturnm alguns, matam outros, e ·xllam mais d · mil;
n d m a lib rdad aos escravos, a ·iclad:1nb :1os
trnng iros, "paras premunir contra o núm ·ru t· a Íl)tc,;a
doo ilados" (Diodoro, XIII, 48, 7). 11
Vemos, por contraste, que os escravos cl tipo hllótiL:o
eram mais susc ptfveis de rcccb r a cidadania ai m da
liberdad . Mas este nem sempre é o caso. Em Samos, as
lutas políticas do fim do século VI enfra,queccm a cidade.
O corpo c{viço foi então reforçado pela venda dos dir itos
polftlcos aos escravos. Segundo~ nofonte (Helênfcas, vn,
3, 8), em Siclone, Eufron atribuiu ~ liberdade aos scravos
e fez deles cidadãos. · · · · ·
Podemos, portanto, constatar que os escravos nem
sempre estiveram afastados dos assuntos políticos. Por
vezes, eles eram incitados ou convidados a participar deles,
o mais das vezes para ajudar a defender a cidade contra o
inimigo, por vezes para substituir ou reforçar a camada
dos cidadãos, para remediar uma situação de oligantropia
que enfraquecia uma polis; por vezes, enfim, "utilizados"
por facções em luta pelo pod r no interior ele u1na cidade.

131 Capf111l0 1\1


bi <.:oloqu i ''utilizados" cnt, aspas, pois é quase sempre
t nno usado p los historiadores quando é preciso tratar
d ~. s plsódios •O ra, o termo não me parece conveniente,
pms 1 d ixa a Impressão de que a única coisa que conta
a iniciativa de um tirano ou de uma facção política. O
que não é correto. Se as fontes deixam pensar que eles só
fazem responder a uma convocação, que há, então, de
um lado os livres, cidadãos, ativos, e de outro lado os
escravos passivos, isso se deve ao fato de que as fontes
são parciais, fontes "de classe".__.....
Parece-me
afümarque, nas condições de ação J)<)lítica existentes nessas
__
..... .,_.. . ..... . . .....mais correto
.,...._... ,. _ ... .... ... . ...
_.~, ~

~Õci~dad~~~:. ~.~Ê~5!~.()-~-~l?~~r PQf.:~Jt_µêǧ~~- c_rí~!(;~S, que


abalam a estabilidade do mundo livre, para que se abra a
possibilidade de uma intervençãb servil na ação política e
militar. A pr.ova disso é que, a. cada vez que acontece, há
escândalo e ~p~v~ç~o ...
Passados esses momentos de perigo, uma vez de volta
à segurança militar e/ou às relações internas habituais, tudo
muito problemático, no mundo grego, volta-se às condições
normais da vida política, onde os escravos não possuem
lugar próprio. As relações entre a política e os escravos
voltam a ser relações estruturais. Completamente afastados
da soberania e até da vida cívica em Atenas, salvo em
algumas festas religiosas, eles são, em Esparta, chamados
a participar com maior freqüência na defesa, apesar de
sempre muito vigiados~~~~2....~. .r~spe~t.9. disso, que
Esparta, fonnidável máquin~ de guerra, não poderá jamais .
fompater durant~ EJ,U_ito tempo longe d~. !-l.!J.§JLQnt~JI!~,
~ f\lnção da indispensável vigilância sobre.os hilotas pronto.$"

ENSAIO SOIIR! A MOIIIUZAÇÃO... J32


e,aav1dão antiga, com o qual ele pretendia conrribuir para
a luta contra a escravidão moderna , adotou uma posição .
fortemente moralista contra a "ms
· c·ru .M ·1»
1 1)-...0 servi , acusada
de corromper os livres e de envenenar a vida política.da
Anti 'dad 12 · .
gui e. Qua15quer que se1am os méritos científicos
do seu trabalho, que são enormes, e os méritos de seu
combate moral, que é louvável, do ponto de vise~ da
análise histórica, a pesquisa do século XX mostrou o
con·trário do que ele defendia. A saber que, se existe uma
......--..... - - - - · - - - - -··- ··- - - ..
oposiçàó entre;pi)Jis'e e~vidão, _é_l:!~ <?P?Sição dialética,
_onde a inte~-~?.. e_a _c ontraposição não são díssg~íáv~~- A
]!!!!is se ~erine co_mo o inverso da dependêi:i~}a e, por isso
..
mesmo,
,.,...-~........não existe senão
-. . . . .. .
. .,,,
em
. - rettlç~o aQ seu .. - - - - .
. --cont~rip
Há alguns anos houve um debate ferrenho para saber
se, por um lado, o mundo antigo tinha por base a escravidão
e, por outro, para decidir se os escravos antigos eram UITLl
classe. Justiça seja feita, não foi Finley, como se pensa,
que pela primeira vez formulou a questão e fo~eceu a
resposta aliás, excelente, 13 mas exatamente Wallori, um
' '
século antes dele. Ele escreveu mil páginas sobré o assunto
e eis a sua pr~~ira frase: "A escravidão era o fundamento
da sociedade antiga (. ..)." 14 Os escravos eram uma classe?
um artigo admirável, Pierre VidaJ-Naquet15 examinou todos
0 a peclo da qu t:lo, e eu não voltarei ao problema.
sabemo hoje qu :i Antiguidade não foi sempre e em
• parte cf'3vi ra. Finley, por seu lado, contribuiu para
111 trar que os debates qu~ncilativos sobre .º número e a
propor o <le es ravo não esgotam a questão, e ·que a
escra 'dã . ·
VI o antiga foi mais global mais . .
SOCial do que no Velh • disseminada no corpo
p é . . o Sul none-americano, por exemplo.
or m, mais 1mpona t d O . .
existiri ne que discutir se o cidadão
0
ª se~ 0 escravo de um ponto de vista fisiológico -
. que na minha opinião é evidente - é reconhecer que o
-~~P.?.
existe~?.cial,_~_
1
ps_~~o_l?gico em que se c~tiniTc;'cid;dão só fl<V~
. -·-·---·-·· ... -·· .•, .....
·o- V""
. em re a~o ao m11n.clo_da. dependên,çµ,._~.pref~rimps
falar d_e _fo,r~. TTl~J,s. aQ~_ílgence. toqa a ética .do mundo
- ~ffiig9$_Í\!n~_n.isso ..,. ~
Mais que isso, para falar como Godelier,16 a política
funciona coi:rio-."infra-es_trutÚra" :· é ela_gu~_d.ete.rmina..as
condições de ª~SS? aos m:!~ dei.Õ~çã9 Çp~is o ~~sso
~~ terrà é condicionaçio à_éJdadaniaJ, e isso de maneira tão
poderos~_.<:!.~~ ~~:.~~~~--ç!:!~{~ -~,nqyjçlaq~. qµ~_é _~:fü~q
.?:. proprie<;i,3:2,~..P,D..X..~- A ação política chama muito a
atenção, a nossa, mas jã a dos antigos, porque é o seu
resultado que organiza a distribuição dos papéis sociais e
. econômicos. A participação política dos escravos só é limitada .
porque ela écontirui'eCõm5atida perrnanêntemente pelos
•'ddãdãos, tão ciÜmentÕs·em relação a suas.prerrogativas,
sabendo perfeitamente que lá residia a chave de seus
privilégios..Mas o mundo grego era tão di\Tld.ido_,~tão ir.15~v~l,
· que foi preciso se .~esign~r ·ª .todo tipo d~ .c:ompr()misso:
•·ã lârgarÕ número de cidadãos, aceitar,·gostando ou não, a
·participação dos inferiores quando era necessário; todas
essas idéias ~e pa~tilha de terras,_abolição de dívidas,
-Übertação de escravos. 17
Se seguimos Wallon numa abordagem moral que pode
ainda se mostrar necessâría, devemos insistir no fato de

135 Capítulo IV
que o mundo clássico tinha por base a escravidão. Mas se
nós ampliamos o no~o ângulo de visão e observamos o
mundo em tomo dos gregos, n9 ~paço e no tempo em
que eles viveram, o que impressiona (e é por isso que
eles nos interessam tanto ainda) é exatamente o inverso,
ou seja, ~~ problemática, limitada, frágil, mas
imensa -d(fibercjaçfe.
14.,..::.::::.:.--..•

"RE f. MOBIU7.ACÃO...
ENSf.lOSOu
NOTAS

Introdução
1
FINLEY. Dlmocrall8anttq,,u, et dlmo-
aqueus a, mesmo sem Aquiles, Irem
cratte moewrns.
sob o seu próprio comando,. virar o
z F1Nl.EY. Politu:s ln tbeanctent world. destino da guemi, então desfavorável.
Assim, no v.378, "Ele disse, e todos
com entusiasmo ouviram e obedeceram".
Ca,pítulo I 12
1 Ver o coment.\rlõ da edição Budé.
FINLEY. O mundo de Ulisses.
2 u VLACHOS. Les soclétA.s poliliques
VLACHOS. Les socl4tés pollttques homériques, p.203-204, para uma biblio-
bomérlques. grafia da questão.
JVLACHOS. Les soctétés pollttques 14 FINLEY. O mttndo de Ulisses, p.173.
bomérlques, p.41.
is Ostra~ de "modemlsmo" são abun-
◄ LÉVtQUE. LaPensée, 217-218, p.24. dantes na Qdlsséta. Não é o meu tema
j AMPOLO. La citlà antica. Guida aqui, ent1o eu passo rapidamente quanto
storlca e c:rltiça, p.99. a certos sinais. Mas M um que merece
duas ·palavras; no lrúdo da utopia feãcia
6
Jbidem. p.100-101. (Odlsséla, VI, 7): "Assim Nausítoo de
7 Ibidem. p.102-104. fonna divina os tinha transplantado
longe dos pobres humanos e os fixara
R FIN!.p'. o mundo de Ulisses, p.52. na Esquéria: ele tinha cercado a cidade

9 //íada, II, 200. com uma muralha, construído casas,
criado santuários e dividido os campos."
10 VLACHOS. Les sociétés poUtiques
Podemos ver aqui, de fonna clarís.sima,
bomérlques, p.188-189, pensa que o a aventura colonial araiica já em march.1,
"cenário" é o mesmo. e a angústia agrária, excelente argu-
11 Na Ilíada, XIV, 361, aproveitando-se mento para os que fazem da O,füséia
do sono de Zeus, Poseidon exorta os uma contemporânea de Hesíodo.
,, VLACHOS. ús IOCtltl1 J)Olfllques 1
bomlrlqu.s, p,92. Vários artigos reunidos em FINLEY.
'

&onomfe et socféléen Grece ancfenne.


"FINLEY. OmundodeC!ltsses, p.182. 16
Para a reconstituição do período,
ver FAUSTO. A revolução de 1930,
Capítulo II p.227-255.
1
FlNLEY. Anctent slave,y and modem 17
FAUSTO. A revolução de 1930, p.235.
tdeology, p.86.
8
' Ibidem. p.241.
lGARLAN. l.esesclavesen Greceanci- 19
enne, p.53. Santa Rosa, V. Osentido do tenentts-
3
m&, ver FAUSTO. A revoluç-.lo de 1930.
ASHERI. Distrlbuztonf di terre
hell'anttca Grecta. lll FAUSTO. A revolução de 1930, p.254.
21
4
DETIENNE. En Grêce archa"ique:
WEFFORT. Revista Cfllf/fraçdo Bra-
stletra, p.7.
géométrle, politlque et soclété,
p.425-441. 21 CARONE. Revoluções do Brasf/ con-
tempordneo.
' Sobre a stasfs, ver LEGON. Demos and
stasts: SlUdles in the factional politics of ~ SOLA. o golpe de 37 e o Estado
clas.slcal Greece e BARNARD. Stasisfn Novo, p.256-287.
7bucydldes. 2
• Ibidem. p.278.
6
Ver Parte l.
is Sobre ccxlos estes exemplos, ver

1 LÉ~QUE. La Pensle, p.24~32. minhas próprias análises e urrui blblio-


gr.ifia completa em DABDAD TIW3UISI.
MDETIENNE. En Grece archa'l que:
Dfonystsme, poiwolret socfétéJusqu 'à
géométrle, ·politique ec soclété.
la jln de l'époque classfque.
9 BARNARD. Stasts ln 1bucydides, P·2· 26 Heródoto, V, 92, "conselho" que
10
Ibidem. p.28. aparece Invertido em Aristóteles.

i I Tradução de Wlll (Ed.). Korinth~.

Recherches sur l'hlscoire el la c1vlli- Capítulo III . .· ·


satlon de Corinthe des origines aux i FINLEY. Pol(tfcs ln lheancient world.
guerre mc!dlques, p . ◄45 .
z GODEUER. Horlzon. TrajelS mancls-
u MERWAHR. Form and tbouaht res en anthropo\ogle, v.1, p.51-136.
Ht1rod ou
• tn IM t s WATERS. Historia,
p .157-171 . ' VERNANT. les ori/Jfnes de la pensie
groc:q11e.
i, Para este episódio, ver 11~QUE.
◄ ROMIUY. Revue des ÉJudes Grecques,
Historia, XXVII, p.522•549·
,.,,..,,,.111 dém<>-
LXXII, p.81-99.
•◄flNIEY. IJl,noaaJiean."1-
· XXX • p ·393-401 ·
s KAGAN. Hespena,
crane modtlmc.

RAZÃO E CONHecJMEHT'O • 138


• Sobretudo, f'ílocoro, fra~ 79bapud. "'l1 r.ir:i Jflf'A 1fo1,11~1>tr. 1, 1 11',,.;,,,;;.
MlJELL!R: Fra1Jtn11nk>s dót h tslllrladt1· 11-.i• :i t:Jlr.11/n, li':1 HJ..~f;l'.'1
r,,,-,;,
rel81W8011, p.m. flfJ11Uln and IJyz«ntlnlf ~tu✓Jú,, / li:'
7 r,,ll$·134
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1
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rriat~,b r,,,,rr;;,. .i:. ,r.Jn,1/,,,., ;/h½
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Mlfant1,11, d'IIUtr/!rt .Arv..f.mrw, / / I
11 Pata wna boadiloll!Oc), verHIGNIDT.
p.l~.
Húlory o/ tbe atbenlan c:onst#UJkm 1D
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12
AJene deJ I'/ 'AV/4 a e
CARCOPINO. Mélan!Jf!S d111.stctre
Anctenne, XXV, p.129.

u OABDAB TRABlJL.51. Dfonysúme, .lt L:n VA ~ e=. (Jj/"..,' •. f/,:',Tr/4-


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srecque. ,naJe /1aJlaw., d, P.r.Jr-11',a IJ,e:v.Á:1/. z,:.
p/46..5';; ~ : . ;:,.142...1f2.
"Idem.
16
ª co. ~ '0R. 1be '1.e'.J, 7.At:~:.a,.._; -;,{
Debate em FL--0.EY. Poltttcs tn zhe .ftftb-c,enturyAlhem.. S>-~~ Ú:?:,2r.Ji,
anctent world, p.28. nelJa lliJa JY.1llttc:a ~ ~ ', 7 fc /
17
Para uma cntica da! fontes, v~ ~a,C
CARCOPINO. Mélanges d'Hutotre
Ancíenne, XXV, p.15C.

139
Capítulo IV I◄ WAUON. Hlstolredel'Bsclawsedans
1 l'Amlqullé, p.87.
WP.L'iKOrF. Lolslr et esdavage dans
1
la Gr~ antique, p.161-178. ' VIDAL-NAQUET. Le cbasseur nolr,
1 p.211-221.
Nas servldões comunlltrias de tipo
16
hllótlco, a <X>ba era ainda mais dellc:acla. GODEUER. Horlron. Trajets mar-
VIDAL-NAQUET. u cbtll#Ur notr. xi,,tes en anthropologle; GODEUER.
Polltlcs as "lnfrastructure": an
' GARLAN. Les esclaves grecs en tcmpa
anthropologlst's thoughts on the exem-
de guerre.
ple of classlcaJ Greece and the notions
4
Ibidem. p.42. of relations of production and econo-
mlc detennlnatlon, p.13-28.
~ Numero~ exemplos levantados e
comeniados por GARLAN. Les escla• 17 PUKS. Classlcal Quarter/y, xvm,
ves grccs en temps de guerre, p.4;. p.207-223; ASHERI. Dtstrlbuztonl dl
terre ,u,ll'anllca Grecta.
'MARASCO. A.nliqut/1 Classique, XI.IX,
p.131-145; MOSSE. La tyranniedans
la Gricttantlqu41, p.179; fl!KS. Anci•
ent Society, 5, p.51-81.
7
Numa bibliografia desmesurada, wi-
nalemos alguns trabalhos Importantes:
TEXIER. Nab~ SHIMRON. Classlcal
Pbllology, LXI, p.1-7; DAUBIES. Htsto- .
ria, XX, p.665-696; SHIMRON. Clam-
cal Quarterly, XIV, p.232-239; PUKS.
Classlcal Quanttrly, XII, p.118-121.
1
MOSSE. RtNUe Hlstorlque, XCIII,
p.297-308.
' GARLAN. ús BSClautJS en Grkearu:I~
enne, p.173.
10 ASHERI. Tynmnle et marlage í~.
Eslai d'hiaoire soclale grecque, p.21-
48.
11 GARLAN. úst1sela1Jt1Sen Grlceanct-
•nrw, p.177.
11 WALLON. Hlsloiredsl'es;clau:lgedans
l'AntlqUUé.
u FINLEY. F.conomte et soctlléen GriJce
ancsenne, p.145-171.

RAZÃO E CONHIOMINTO-
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RAZÃO E CONHECIMENTO...
142
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