Você está na página 1de 16

O que vem a ser Nação no contexto atual?

Daniella S. Dias

Sumário
1. Introdução. 2. Estado e Nação. 3. Novas
reflexões sobre o conceito de Nação. 4. Consi-
derações finais.

1. Introdução
Este artigo tem por objetivo enfrentar
um tema complexo e extremamente atual:
o conceito jurídico de Nação, em tempos
globais.
Trata-se de uma proposta de análise
doutrinária acerca do conceito de Nação
a partir de autores clássicos – cujo maior
expoente é Renan – para, então, realizarmos
uma “desconstrução” do conceito, apon-
tando a urgente mudança paradigmática
do entendimento de Nação, uma vez que
o conceito jurídico – até hoje ensinado nos
manuais de Teoria Geral do Estado – não
é mais adequado à realidade.
A necessidade de novas bases para o
entendimento do conceito, tratado como
conteúdo justificador da existência do
poder político estatal, é analisada em face
das transformações nos padrões culturais,
econômicos, políticos e sociológicos causa-
das pela globalização. Se, na Modernidade,
os paradigmas estruturantes do Estado
Daniella S. Dias é doutora em Direito Público estavam consolidados sob a ideologia da
pela UFPE, Professora de graduação e pós-gra- Nação, na atualidade, há uma “erosão”
duação na UFPA, Professora de pós-graduação no conteúdo político da Nação para a
na UNAMA e Promotora de Justiça. consecução dos fins comunitários, o que

Brasília a. 49 n. 196 out./dez. 2012 53


requer a redefinição do conceito por meio objeto de estudo é analisado sob diferentes
de propostas inovadoras. perspectivas. Ressalta que há uma profusão
de estudos muito maior do que o próprio
2. Estado e Nação conhecimento do nacionalismo, com
aportes teóricos muito difíceis de serem
Rinesi (2004, p. 169-70, 172) afirma que integrados ou comparados. O problema se
a palavra Nação é ilusória, uma ficção, um potencializa por razões metodológicas e
enigma. Trata-se de uma ideia falsa, uma históricas. Segundo Smith, as dificuldades
ideologia. É uma palavra ambivalente. Ele de definição, classificação e explicação
chega a afirmar: “... la nación, evidentemen- do tema Nação estão relacionadas com o
te, no refleja una realidad preexistente dura, problema temporal-geográfico, pois o es-
cerrada e idéntica a sí misma” (RINESI, tudo da Nação implica o manejo de vários
2004, p. 171). idiomas e também um amplo conhecimento
Bobbio, Matteuci e Pasquino (2004, p. histórico2 (SMITH apud LVOVICH, 2004,
798), por sua vez, salientam que a análise p. 67).
histórica do termo Nação permite perce- Vernik (2004, p. 13-14) utiliza-se dos
ber o verdadeiro paradoxo que a palavra ensinamentos de Max Weber para afirmar
encerra e consideram o fato de que, apesar que o autor, nas primeiras décadas do
de a palavra apresentar conteúdo emocio- século XX, já falava das dificuldades para
nal forte, seu conteúdo semântico ainda é se apreender o conceito de Nação. Weber,
confuso e incerto no dicionário político1. segundo Vernik, afirmava que o termo
Vernik (2004, p. 19), ao tratar da Nação, Nação, por ser multívoco, dependeria da
afirma: “Quizá lo interesante del concep- sociologia para a interpretação da ação so-
to de nación y de sus potencialidades y cial, pois a Nação seria também uma forma
peligros para el accionar político, sea su de ação social.
carácter indeterminado”. Para Weber, haveria elementos so-
Lvovich (2004, p. 66) afirma que a Nação ciológicos para se conseguir apreender o
é um fenômeno multiforme, o que cola- significado de Nação; todavia, o povo de
bora para limitar as construções teóricas. uma Nação não necessariamente deveria
Sob a perspectiva das ciências sociais, as coincidir com o povo de um Estado. Tratava
dificuldades refletem-se na conformação Weber de afirmar que a definição de Nação
de conceitos básicos, justamente porque o como uma ideia relacionada ao povo de um
Estado gerava uma tensão constitutiva em
1
O dicionário jurídico de Maria Helena Diniz
(2005, p. 372), ao tratar do termo Nação, apresenta
sua formação. “La tensión entre el pueblo
as seguintes definições: “Ciência política. 1. Conjunto
de pessoas que habitam o mesmo território, ligadas 2
Sobre a temática, afirma Lvovich (2004, p. 66):
por afinidades culturais, linguísticas etc., seguem “… la nación y el nacionalismo han sido considerados
os mesmos costumes e obedecem às mesmas leis. 2. como producto de alguna necesidad psicológica
Povo de um país. 3. Sociedade organizada política e universal de pertenencia; como sustitutos modernos
juridicamente que constituiu o Estado. 4. Governo de la religión; como la variable dependiente de
de um país. 5. Sociedade politicamente organizada algún proceso más general que actúa como factor
que tem consciência de sua própria unidade e explicativo – la modernidad y la erosión de los modos
controla, com soberania, seu território. 6. Território de vida tradicionales, la modernización, el desarrollo
habitado por um povo, que tem autonomia política; del capitalismo, el carácter desigual y combinado de
país. 7. Pátria. 8. Raça. 9. Grupo social que constitui su expansión, el colonialismo y el imperialismo, la
um Estado, pois dele emana o poder. 10. Substrato lucha de clases, el desarrollo de nuevas formas de
espiritual ou cultural em que se forma o Estado (Pinto comunicación y cultura, entre otros – como el tránsito
Ferreira). 11. Substância humana do Estado (Carré de de una doctrina filosófica y política hace el poder,
Malberg).12. É um meio composto de tantos elementos además de las múltiples explicaciones singulares
quantos os fatores capazes de influir na gênese de um que se despliegan en las historias de nacionalismos
indivíduo humano (Delos). particulares”.

54 Revista de Informação Legislativa


de una Nación como comunidad política Vernik (2004, p. 13) afirma, ao citar a
y el pueblo de un Estado como sociedad obra de Renan, que duas ideias principais
política” (VERNIK, 2004, p. 14-15). do autor foram discutidas por muitos pen-
Em perspectiva similar, leciona Maluf sadores. A primeira, a de que Nação é um
(2003, p. 15) que os conceitos Nação e Es- plebiscito cotidiano. A segunda, a de que
tado são realidades totalmente distintas, “la nación requiere una dosis de recuerdo
que não se podem confundir. Para o autor, como una de olvido”.
a Nação é “uma realidade sociológica”. E Para Renan, a Nação é um princípio
o Estado, “uma realidade jurídica”. Este espiritual, um princípio que resulta de com-
apresenta um caráter necessariamente ob- plicações profundas na história. Segundo
jetivo, enquanto aquela é um conceito de Vernik (2004, p. 13-14),
ordem subjetiva. “Un principio espiritual que se ancla
Maluf aponta os fatores de formação do en el pasado común, un largo pasado
conceito de Nação. São fatores naturais (ter- de sufrimientos en común y de gloria
ritório, unidade étnica e idioma comum), (gloria: héroes y antepasados que ‘nos
históricos (tradições, costumes, religião, han hecho lo que somos’). Pero al
leis) e psicológicos (aspirações comuns, mismo tiempo, la nación se ancla en
consciência nacional) (MALUF, 2003, p. 15). un presente que nos proyecta hacia el
Com base nos ensinamentos de Maluf futuro. Hete aquí el otro componente
(2003), poderíamos afirmar que Nação é a esencial de la nación: futuridad, deseo
expressão da reunião dos habitantes que de vivir juntos, voluntad. La nación es
possuem a mesma língua, são regidos pelo una voluntad específica: la voluntad de
mesmo sistema jurídico e apresentam, por constituirnos día a día como nación”.
assim dizer, uma “identidade nacional”. Salienta Argumedo (2004, p. 181) que a
Trata-se da confluência de interesses e sen- análise da concepção de Renan sobre Nação
timentos de uma comunidade em função não pode ser realizada de forma descontex-
da identidade de origem. tualizada. Em outras palavras, o trabalho de
É interessante ressaltar que Maluf faz Renan “?Qué es una Nación?”, publicado
citação direta da obra de Renan, autor em 1882, trazia ínsita a necessidade de con-
mundialmente conhecido e ainda hoje solidação da unidade nacional como forma
celebrado por ter analisado o conceito de de afrontar e justificar o imperialismo.
Nação. Para Renan, os fatores subjetivos Quando Renan afirma que a Nação é
são bastante fortes para a definição do um sentimento, um princípio espiritual,
conceito. Ele considera que a Nação é uma relacionado ao passado, às recordações, aos
alma, um princípio espiritual. Essa alma, sacrifícios, afirma também que a Nação é
esse princípio espiritual, é composta pelas formada por um presente – o consentimen-
ricas lembranças e pelo consentimento to em viver juntos e o desejo de manter a
atual, pelo desejo de juntos viverem, pela herança histórica recebida. “Por lo tanto,
vontade de fazer valer a herança histórica, la nación se sustenta en el recuerdo de las
recebida em decorrência das glórias do pas- glorias y pesares comunes en el pasado y en
sado (RENAN apud MALUF, 2003, p. 16). la voluntad de convivencia en el presente;
Trata-se também da vontade de, no ambas condiciones decisivas para constituir
presente, realizar coisas em conjunto, pois un pueblo” (ARGUMEDO, 2004, p. 182).
a Nação nada mais é do que esse senti- Renan, em sua construção teórica,
mento de pertencimento, de agregação, alinha-se ao pensamento colonialista e
essa consciência moral que une os homens justifica as ações do poder estatal e a hege-
em razão do passado e em função de um monia da Nação a partir das lembranças,
futuro comum. recordações, glórias e vitórias do passado.

Brasília a. 49 n. 196 out./dez. 2012 55


Bobbio, Matteuci e Pasquino (2004, p. Para Maluf (2003, p. 16), a Nação é an-
796), ao tratarem da Nação, afirmam ser terior ao Estado, é “a substância humana
ela uma reunião de pessoas ligadas por do Estado”. A Nação “é uma entidade de
laços naturais e eternos “ou pelo menos direito natural e histórico. Conceitua-se
existentes ad immemorabili”. como um conjunto homogêneo de pessoas
A Nação não é necessariamente a ex- ligadas entre si por vínculos permanentes
pressão de uma comunidade linguística. de sangue, idioma, religião, cultura e ide-
Vernik (2004), ao analisar a perspectiva ais”. E aduz: a Nação pode perfeitamente
de Weber sobre Nação, afirma que, para a existir sem o Estado, pois são realidades
conformação de uma Nação, são necessá- completamente distintas. E, por serem
rios um conceito de comunidade de origem realidades distintas, há a possibilidade
e uma semelhança de caráter, com conteú- de várias Nações reunirem-se em um só
do indeterminado. Estado, assim como uma única Nação pode
Pode-se concluir, sob essa perspectiva, dividir-se em vários Estados.
que somente se pode entender o que signifi- Para Reale (2000, p. 132-33), a Nação
ca Nação a partir de uma análise sociológica, não é uma noção artificial ou uma simples
isto é, indagando-se, em sociedade, os senti- ficção política. Trata-se de uma realidade
mentos de solidariedade e de comunidade existente como formação cultural e histó-
existentes e as atitudes que se congregam rica. E afirma:
para a definição do laço social em direção “Ao contrário do que diz Jellinek, ela
ao sentimento ou à ideia de Nação. possui uma realidade exterior, resul-
Afirma Vernik (2004, p. 17): “... se apre- tante de fatores múltiplos, de ordem
cia que Weber piensa, como Renan, que una econômica, racial, linguística, reli-
nación no puede identificarse ni con una giosa etc., mas sobretudo de ordem
lengua, ni con una raza, ni con fatores étni- histórica, por todos esses laços sutis
cos o antropológicos, ni con una estructura e fortes que ligam os homens estabe-
social o de costumbres”. lecidos em um mesmo território com
Percebe-se que o conceito de Nação, uma comunhão de usos e costumes.
por albergar inúmeros fatores objetivos Representa, pois, também, um valor
e subjetivos, mantém-se nebuloso, pois de ordem espiritual, que Renan viu
não somente fatores étnicos, históricos, renovar-se perenemente como um
políticos, culturais, éticos e econômicos são ‘plebiscito de todos os dias’”.
suficientes para defini-lo. Pode-se afirmar Reale considera que a Nação se apresen-
que a solidariedade entre semelhantes e o ta como uma realidade subjetiva e objetiva,
interesse de viver em comunidade em ra- e é o elemento subjetivo que caracteriza a
zão de desejos, valores e costumes comuns “consciência nacional”. E, por considerá-la
possibilitam a comunhão de ideias, sonhos uma realidade, o autor chega à conclusão
e aspirações; no entanto, esses valores e a de que a Nação já contém em si, de forma
unidade étnica e social são insuficientes latente, a personalidade estatal, persona-
para a definição do conceito de Nação. lidade essa que só se completa, que só se
Ainda assim, inúmeros autores se esfor- realiza por meio do ordenamento jurídico.
çam para defini-lo. Sobre a questão, afirma Reale (2000, p. 135):
Streck e Morais (2001, p. 154) afirmam “Devido ao fato inegável da Nação
que a Nação apresenta caracteres relaciona- constituir uma realidade, o grau mais
dos à origem, aos interesses, às aspirações alto de integração social até hoje al-
e aos credos. Para os autores, a Nação cançado pela convivência humana, e
apareceria como um conceito “psicossocio- ao fato não menos importante de que
antropológico”. a Nação já contém em esboço ou em

56 Revista de Informação Legislativa


forma latente a personalidade estatal, De acordo com os ensinamentos de
que só se torna completa mediante Dallari (2006, p. 132), o conceito de Nação
o ordenamento jurídico, é que se atingiu importante significação e recebeu
costuma dizer que a Nação é titular uma conotação emocional forte como forma
da soberania. O termo “titular” neste de justificar a afirmação dos Estados como
caso não é empregado em sua acep- ordens territoriais soberanas, cuja sobera-
ção técnica, mas para indicar a sede, nia residia na unidade popular, no povo.
a fonte originária do poder estatal. A constituição de unidades políticas
É por isso ainda que dizemos que a estáveis, sólidas, dependia da afirmação
soberania é da Nação, não em sentido do Estado como ordem soberana; por con-
contratualista-liberal, mas em senti- sequência, o conceito de Nação – criação
do histórico-sociológico, visto como artificial – foi instrumento explorado no
reconhecemos que toda Nação é um século XVIII para que a burguesia pudesse
Estado em potência, tem o poder de conquistar o poder político. Em nome da
se atualizar como pessoa jurídica Nação, segundo Dallari, lutava-se contra
na unidade de um ordenamento de a monarquia absoluta, e justificava-se a
Direito objetivo”. assunção do poder político pelo povo:
Reale justifica seu posicionamento te- “... a Nação, em cujo nome se pre-
órico afirmando que o fato de a soberania tendia o governo do Estado, passa
advir da Nação e, por consequência lógica, a ser identificada com o próprio
comunicar-se com o Estado propicia a aná- Estado. Esse conceito era mais difícil
lise da soberania em seus momentos social de ser atingido pelo povo, por ser
e jurídico. E chega a afirmar: uma construção científica muito
“Como pensamos ter demonstrado elaborada, enquanto que o termo
em um de nossos trabalhos, não há Nação, muito vago e já utilizado com
motivos para se contrapor a doutrina êxito como símbolo de reivindicações
da soberania nacional à doutrina da sobe- populares, prestava-se muito mais
rania do Estado. Pelo contrário, é o estu- para despertar reações emocionais.
do de uma em função da outra, como E foi assim que, resolvido o proble-
momentos de um único processo ma interno com a derrubada ou o
dialético de implicação e polaridade, enfraquecimento das monarquias,
que nos permite ver mais claro nesse os novos governantes dos grandes
problema, dos mais árduos da Ciência Estados passaram a utilizar a força
jurídica” (REALE, 2000, p. 135-36). mística da expressão para justificar
É interessante perceber que o posicio- suas investidas sobre os pequenos
namento teórico de Reale, um dos mais Estados” (DALLARI, 2006, p. 132-33).
brilhantes pensadores da cultura jurídica Pode-se perceber que o conceito de Na-
brasileira, segue as influências produzidas ção, apesar de conter elementos subjetivos
desde a Revolução Francesa, momento de e objetivos profundamente complexos, é
nascimento do termo Nação no discurso absorvido pela teoria política e pela ciência
político europeu. jurídica como um conceito objetivo para
Na Declaração dos Direitos do Homem justificar e legitimar o conceito de sobera-
e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789, nia. A soberania não mais reside no poder
está claramente disposto que a soberania político exercido pelos monarcas, mas sim
do Estado reside na Nação. Dessa forma, no poder político oriundo da Nação.
nenhum poder político poderia ser legítimo Nesse diapasão, podemos entender
se não estivesse embasado na autoridade claramente a opção teórica de Reale por
que emanava da Nação. defender o conceito de soberania em

Brasília a. 49 n. 196 out./dez. 2012 57


seus aspectos social e jurídico. Sob essa a extensão de sua soberania para fora dos
perspectiva, a soberania deixa de ser um limites territoriais, alcançando outros do-
termo duro e frio para expressar os valores mínios e comunidades. A conquista das
sociais, o ethos cultural, a consciência nacio- colônias – como anexação ao seu território
nal. Porém, é preciso que se diga que essa e forma de submissão – foi fórmula exem-
perspectiva resolve o problema do conceito plar da utilização do termo Nação como
teórico de soberania, mas não soluciona legitimação do exercício do poder político.
nem desvenda o significado de Nação. A palavra serviu a contento para justificar
Como acentua Dallari (2006, p. 133), o imperialismo de potências europeias e
não se podem questionar a importância do consolidar o capitalismo moderno.
conteúdo sociológico da realidade Nação O trabalho teórico de Renan é prova
e a influência desse como este conceito cristalina de que a concepção teórica de
sociológico sobre a organização e o funcio- Nação nasceu objetivando a legitimação
namento do Estado. Porém, é preciso que do poder político estatal para, em nome
se diga: o conceito de Nação não possui da Nação, subjugar outros povos. Quando
significação jurídica. Renan afirma que a Nação pressupõe certa
Com embasamento nos estudos de dose de recordação e esquecimento, acaba
Ferdinand Tonnies, nas obras Comunidade por propor a perspectiva de Nação sob o
e sociedade e Princípios de sociologia, Dallari ponto de vista do colonizador. Nesse senti-
afirma que a diferenciação entre Estado e do, Argumedo (2004, p. 182-83), ao analisar
Nação se impõe, pois Nação é uma comu- a concepção de Renan, afirma:
nidade, enquanto Estado é uma sociedade. “... con referencia al pasado el concep-
Logo, não se pode afirmar que o Estado seja to de Renan muestra una aparente
a evolução da Nação ou mesmo produto da contradicción o una paradoja, donde
Nação. Ele assevera: resalta la clara intencionalidad políti-
“Assim, a submissão a um governo ca de sus razonamientos. Afirma que
comum, o uso da mesma língua, a el olvido – e incluso el error histórico,
aceitação de muitos valores culturais la eventual distorsión de la historia
comuns, bem como a comunidade de – es un factor crucial en la creación
interesses, tudo isso é insuficiente de una nación y el progreso de los
para fazer do Estado uma Nação, mas estudios históricos puede transfor-
é útil para a obtenção de maior solida- marse en un peligro para la naciona-
riedade na persecução dos objetivos lidad: es preciso olvidar los hechos
da sociedade política” (DALLARI, de violencia ocurridos en el origen
2006, p. 137). de todas las formaciones políticas,
A fórmula encontrada àquela época en tanto la esencia de la nación es
para abrigar em termo tão plurívoco – Na- que los individuos tengan muchas
ção – a ideia de legitimidade do exercício cosas en común y también que todos
do poder certamente foi instrumento para hayan olvidado otras muchas cosas.
legitimar regimes democráticos e antide- Pero, al mismo tiempo, también
mocráticos. habla de la necesidad del recuerdo
Marxistas, desde o século XX, já repu- como factor crucial de la nación; en
diavam o conceito de Nação, pois diziam consecuencia, establece una especial
que ele seria produto da ideologia burguesa relación entre olvido-recuerdo, por la
(ÁLVAREZ, 2004, p. 136). cual el sentimiento de nacionalidad
Deve-se ressaltar que o conceito de Na- se construiría mediante una ficción,
ção serviu para legitimar o imperialismo una determinada versión de esa
das potências europeias, que objetivavam historia. Es lo que Arturo Jauretche

58 Revista de Informação Legislativa


denunciara como política de la historia; colonialismo. Considera o autor a necessi-
un relato que tiende a distorsionar la dade da análise histórica, o não esqueci-
historia real, imponiendo qué se olvi- mento dos fatos do passado. Não se pode
da y qué se recuerda en función de la falar em identidade nacional esquecendo-se
concepción del mundo y los intereses os fatos traumáticos do passado, a domina-
presentes de los sectores dominantes ção exercida pelos colonizadores.
o las potencias imperiales, para los Ariza ressalta que, para Fanon, a análise
cuales esa historia tiene capacidad de sobre o que seja Nação deve ser realizada
legitimación. Una política de la historia considerando-se que os dominadores fa-
elaborada en favor de las glorias y zem parte da trama ideológica da constitui-
la legitimidad de los intereses hege- ção do sentido de sujeito nacional. Portanto,
mónicos, como un saber que nutre para que os colonizados pensem no sentido
determinadas relaciones de poder, de Nação, é necessário levar em conta que
eventualmente amenazadas por los a análise não pode ser apartada do passado
estudios historiográficos”. histórico, das práticas colonialistas, dos
A obra de Renan, ao ocultar o passado, resquícios da colonização.
objetiva distorcer o relato do curso da his- Segundo Ariza (2004, p. 124),
tória. Sob a perspectiva do colonizador, é “... es posible pensar en Fanon que
interessante que se olvidem a dominação e colonizador/colonizado no es tanto
a opressão. Porém, sob o ponto de vista do una diferencia que atañe a quienes
colonizado, o caminho deve ser totalmente sí y quienes no formarán parte de
inverso: a busca da identidade nacional la nación futura, pues ambas figuras
deve partir do conhecimento histórico coexisten dentro de cada sujeto de la
desse passado como forma de construir nación. Siguiendo a Zizek, podría
sociedades integradas e independentes. pensarse que el problema no es tanto
Nesse sentido, salienta Argumedo la distancia radical que hay entre los
(2004, p. 191): dos rostros de la sociedad colonizada,
“No es posible entonces plantearse sino la extraordinaria cercanía que hay
el tema de la nación sin un análisis entre uno y otro”.
crítico de nuestra propria historia y Leciona Ariza, ao estudar a obra de
de la historia del Occidente central; Fanon, que, para o autor, o estudo da
porque todo indica que para salir de Nação requer a compreensão da realidade
esta encrucijada es necesario actuar histórica do povo colonizado e que a Nação
en un sentido exactamente inverso não necessariamente deve ser uma cópia
al que propone Ernest Renan, con sus da metrópole. Fanon considera que, para
olvidos y sus recuerdos interesados”. a construção da realidade da Nação, é ne-
cessária uma descolonização, uma interfe-
rência histórica dos sujeitos que compõem a
3. Novas reflexões sobre o
Nação – antes colonizada – para concretizar
conceito de Nação a realidade futura não como uma cópia ou
Ariza (2004, p. 117), ao escrever artigo imposição exterior do modelo de produção
sobre a Nação com base nos estudos das colonizador.
obras de Fanon e Renan, afirma que Fanon “... la nación en Fanon es tanto dife-
apresenta a visão do colonizado, pois afir- rente del pasado – entendido como
ma que a Nação representa um corte (hen- cuerpo de tradiciones inmemoriales,
didura), uma ruptura da ordem colonial. veladas para la historia por las tinie-
Fanon realiza análise crítica do passado blas de la conquista – como del futuro
daqueles que foram oprimidos em razão do entendido como ilusión mítica o reli-

Brasília a. 49 n. 196 out./dez. 2012 59


giosa, lejana e inconmovible. El texto Mariátegui realiza análise da Nação a
de Fanon es, entre muchas otras cosas, partir da realidade cultural de seu povo,
una exhortación feroz a provocar la o que implica considerar grande parte da
conmoción por el choque de estos dos população excluída – os campesinos indí-
tiempos con un presente tensionado, genas. Logo, a condição desoladora de vida
ajustado alrededor de sus proprias dos indígenas permite compreender que o
fronteras y verdades. A esta eclosión conceito de nacionalidade é frágil3.
Fanon denominó nación. Porque la Apesar de Mariátegui não apresentar
nación es sinónimo de lo que en el uma definição do conceito de Nação, é
presente es incómodo, sinónimo de possível, segundo Álvarez (2004, p. 140-41),
una batalla que debe llevarse adelante compreender que, para o autor peruano, a
en el trabajo, y de lo que en el trabajo ideia de Nação só pode ser revelada com
es para los pueblos alumbrar las pro- base no conhecimento das distintas relações
mesas incumplidas. De alguna forma, de produção, que outorgam especificidades
la nación de Fanon no se corresponde histórico-sociais a cada Nação. Nação tam-
ni siquiera con el presente, en tanto lo bém é a expressão dos conflitos resultantes
actual siempre está ya en viaje hacia da reunião de diversas culturas. Logo, saber
el porvenir” (ARIZA, 2004, p. 132). o que é Nação requer identificar, conhecer e
O que propõe Fanon, sob nossa óptica, é resolver o problema da identidade cultural
uma revisão do sentido de Nação, que não no Peru, marcado por exclusões, pelo lega-
pode mais ser analisado sob a perspectiva do colonial e pela própria modernidade.
dos colonizadores, sob o paradigma concei- Para Mariátegui, pensar em Nação
tual dos colonizadores. Nação é um viver pressupõe a capacidade e o direito que
histórico contextualizado, o que implica toda Nação tem de defender sua existência
análise histórica do passado, dos eventos perante outras nações opressoras4.
traumáticos, frutos do colonialismo, para
que se busque um caminho próprio, que 3
Sobre a questão, afirma Álvarez (2004, p. 139):
deverá ser realizado com o trabalho da- “En el campesinato indígena y en la tierra, esa nación
queles que, com sua inteligência, com sua se hacía cuerpo, un cuerpo que debía realizarse, y para
formação, podem transformar o espaço na- ello era necesario transformar el modo de producción
cional a partir das necessidades reais. Logo, de forma tal que las masas indígenas quedaran
o sentido de progresso deve ser buscado incluidas en la vida política y económica del Perú.
Para Mariátegui la realización de la nación no puede
de acordo com a historicidade desse povo llevarse a cabo con la solución liberal, que implica el
e não com um modelo imposto desde fora. fraccionamiento de los latifundios gamonalistas para
Essa perspectiva também é evidenciada crear la pequeña propiedad y el pequeño productor. El
por Álvarez (2004, p. 136), ao tratar dos tiempo liberal ya ha pasado. La solución al problema
peruano se encuentra en el socialismo”.
estudos do peruano José Carlos Mariátegui, 4
Segundo Álvarez (2004, p. 140-142), “Nación y
autor que apresenta uma visão renovadora revolución conforman el resultado final de la ecuación
da teoria marxista aplicada à realidade desarrollada por Mariátegui para resolver el enigma
latino-americana. del Perú. La revolución socialista debe encargarse de
lograr la segunda y verdadera independencia debido
Álvarez ressalta que o interessante
a que la República burguesa ha fracasado y con ella la
na obra de Mariátegui é como o autor posibilidad de que el Perú sea ya una nación”. (...) “La
conseguiu realizar uma análise da Nação nación y revolución son tareas conjuntas. Entonces,
sob a perspectiva marxista. E afirma: “Sus si la nación se realiza con la revolución socialista su
trabajos producen un quiebre en el mar- lugar no está en el pasado sino en el futuro”. (...) “El
proyecto de un nuevo Perú, de un Perú socialista
xismo latino-americano al introducir el pertenece a la joven generación, a la vanguardia, que
tratamiento del tema nacional” (ÁLVAREZ, debe resolver el problema de la nación incorporando
2004, p. 138). al indio a la peruanidad. En tanto y en cuanto el Perú

60 Revista de Informação Legislativa


Verifica-se que Mariátegui apresenta É interessante considerar que o discurso
uma ideia de futuro que não está desco- de Mariátegui se assemelha bastante à visão
nectada das tradições culturais do passado. que hoje se tem de justiça social. Não pode
Para o autor peruano, a tradição é impor- haver justiça social com grandes desigual-
tante, mas deve ser transformada para que dades entre cidadãos.
a ideia de Nação consiga expressar a reali- Qualidade de vida, inclusão social, bem-
dade concreta do Peru, de seus cidadãos. A -estar, exercício da cidadania dependem de
Nação é um processo, é “apertura, diálogo um fazer humano, de uma transformação
constante con el resto de las culturas del social que concretizem uma “revolução”
mundo”5 (ÁLVAREZ, 2004, p. 143). – mudança dos padrões capitalistas, ob-
Conclui-se que, para Mariátegui, Na- jetivando a inclusão social dos exclusos,
ção nada mais é do que processo vívido dos que verdadeiramente só possuem
em construção, processo democrático, nacionalidade e cidadania em concepção
por consequência inclusivo e dependente jurídico-formal. E esse processo de trans-
da atuação humana. A posição do autor formação social deve partir do contexto
peruano é tão contundente que ele chega histórico-cultural, de um reconhecimento
a afirmar que o Peru só será uma Nação da própria cultura nacional – que é fruto de
quando alcançar o bem-estar material de uma história de conquistas, lutas, opressão
seus habitantes. e, também, de libertação.
Vimos, a partir da análise de diversas
perspectivas teóricas sobre Nação, que o
no resuelva este problema no será una nación, será
sólo un proyecto inconcluso”.
sentido multívoco do termo pode ser utili-
5
Para Álvarez (2004, p. 143), “La nación real es zado tanto para a legitimação de poderes
el indio pero también lo es la lengua española, la políticos opressores como para a legitima-
religión cristiana, la democracia, las vanguardias ção de poderes políticos democráticos.
estéticas, las ideas socialistas y otros elementos
culturales que no tienen inscripto su nacimiento en
Rinesi (2004, p. 172) salienta que a pa-
el Perú pero que ya conforman su realidad concreta”. lavra Nação pode ser utilizada tanto como
De maneira fabulosa, Álvarez (2004, p. 144-45) instrumento para legitimar o poder político
realiza síntese sobre o pensamento de Mariátegui: estatal quanto como uma ideia de Estado-
“Utilizando ese enfoque tan particular que conjuga
un análisis materialista con concepciones culturalista
-Nação, de população. Salienta o autor o
ajenas al marxismo clásico, Mariátegui articula una fato de que há uma ambivalência e que a
respuesta sobre la nación que supone a la vez una oposição existente entre a palavra Nação –
búsqueda de la identidad cultural peruana y una como expressão da legitimidade do poder
respuesta a los dilemas socio-económicos y políticos
de la modernidad capitalista. Así la nación es vista
político, do poder estatal – e Nação – como a
como un proyecto inconcluso pero que no busca en ideia de povo-Nação – expressa claramente
el futuro su completa constitución sino que recupera essa tensão presente no espaço político.
del pasado la base para la futura nacionalidad. Un “El Estado nación y el Pueblo-nación,
pasado que, en el caso del Perú y de América Latina
en general, resulta heterogéneo en cuanto a sus
estamos proponiendo, constituyen
tradiciones culturales y conflictivo por la exclusión mecanismos de interpelación a través
y parcial eliminación de los pueblos indígenas. de los cuales (y en la pugna entre los
Esta nación mariateguiana no pretende restaurar el cuales) se constituye la misma nación
pasado ni ceñirse a la recuperación exclusiva de las
tradiciones de las masas oprimidas, sino que se abre
como sujeto colectivo” (RINESI, 2004,
a los elementos que la historia ha dispuesto para p. 173).
reorganizarlos introduciendo las ideas socialistas. (...)
Ideas estas que implican la necesaria incorporación “Entonces: pensar, digo, la tensi-
del indio y el bienestar material de toda la población,
objetivos cuya cristalización supondrán la definitiva
ón entre esos dos mecanismos en
constitución de la nación en el Perú, estableciendo los cuales se construye siempre la
un límite a la voracidad de los intereses capitalistas”. identidad nacional. Por un lado, la

Brasília a. 49 n. 196 out./dez. 2012 61


apelación o interpelación estatal, que o prisma ideológico que podemos analisar
actúa siempre como un principio de o termo Nação.
sutura y de cierre del sentido y que Utilizamos o pensamento de Anderson,
busca, a través de los mecanismos que afirma que a Nação é um artefato cul-
discursivos y prácticos que venimos tural de uma classe determinada, criado
de mencionar, la construcción de no século XVIII, fruto de complexas forças
una armonia nacional: la ideología históricas. Para o autor, o conceito de Na-
del Estado-nación o de la nación es- ção, uma vez criado, foi transplantado para
tatalmente definida y sancionada es vários terrenos sociais e também para uma
una ideologia consensualista. Por el variedade de “constelaciones ideológicas y
otro lado, la apelación o interpelación políticas”6 (ANDERSON apud LVOVICH,
nacional-popular, que actúa siempre 2004, p. 75).
como un principio de ruptura de ese Bobbio, Matteuci e Pasquino (2004, p.
sentido único, de quiebre de esa idea 797) ressaltam que a Nação pode ser vista
de harmonia, y que postula siempre como uma entidade ideológica, o “reflexo
una tesis conflictivista de la historia, na mente dos indivíduos de uma situação
en la medida en que siempre opone de poder”.
la nación, el pueblo-nación, a alguna Para os autores, a Nação é reflexo de um
otra cosa que no lo sería: la anti- tipo de situação de poder. Logo, a Nação
-nación, el anti-pueblo, los cipayos, revela-se como a ideologia de um determi-
la oligarquía, los vendepatrias o los nado tipo de Estado, pois é ao Estado que
cómplices del imperialismo” (RINE- a Nação dirige o sentimento de fidelidade.
SI, 2004, p. 173-74). Eles afirmam: “A função da idéia de Nação,
A análise realizada por Rinesi (2004, p. como vimos, é a de criar e manter um com-
176) permite-nos pensar que o conceito de portamento de fidelidade dos cidadãos em
Nação – sob as duas perspectivas – é salu- relação ao Estado”7 (BOBBIO; MATTEUCI;
tar na medida em que revela uma tensão PASQUINO, 2004, p. 797).
existente no próprio processo político, e a
política, segundo o autor, está intrinseca- 6
Para Lvovich (2004, p. 76), “La nación se imagina
limitada por tener fronteras finitas, aunque elásticas,
mente relacionada ao poder e ao conflito. más allá de las cuales se ubican otras naciones, y
Tratar da Nação como Estado ou como se piensa soberana porque el concepto nació en
expressão do povo, população, é um modo una época en que la Ilustración y la Revolución
de revelar essa tensão. estaban destruyendo la legitimidad de los reinos
dinásticos. A su vez, se imagina como comunidad
Das reflexões acima realizadas, depre- porque, ‘independientemente de la desigualdad y
ende-se que a definição de Nação estreita- la explotación que en efecto puedan prevalecer en
mente relacionada ao conceito de soberania cada caso, la nación se concibe siempre como un
não explica – mas potencializa ainda mais compañerismo profundo, horizontal’”.
7
Afirmam Bobbio, Matteuci e Pasquino (2004, p.
– a ambiguidade que o termo apresenta. 797): “A função de idéia de Nação, como vimos, é a de
Afirmar categoricamente a relação criar e manter um comportamento de fidelidade dos
direta e necessária entre Nação e Estado cidadãos em relação ao Estado. A idéia de laços naturais
é um equívoco. Pode-se inclusive argu- profundos, elemento integrante do núcleo semântico
fundamental do termo, desempenha esta finalidade,
mentar que o conceito de soberania como inserindo-se na esfera mais íntima da personalidade
algo diretamente relacionado ao exercício dos indivíduos, unidos justamente por estes laços, a
do poder político por meio da Nação é ponto de justificar a elaboração de um ritual ou de uma
um engodo ideológico. Se não sabemos simbologia pseudo-religiosos. Historicamente este
sentimento foi criado pela extensão forçada a todos
ao certo o que significa Nação, difícil será os cidadãos do Estado de alguns conteúdos típicos
identificar quem são os titulares legítimos da nacionalidade espontânea (por exemplo, a língua)
do exercício da soberania. E é também sob ou, no caso de se revelar inviável esta extensão, pela

62 Revista de Informação Legislativa


Ora, essa fidelidade está na razão direta evidência cada vez mais direta, para
do caráter ideológico expresso no conteúdo a necessidade de se organizar o po-
Nação. E mais: as exigências de justificação der político em níveis continentais e
da razão do Estado estão intrinsecamente conforme modelos federativos.
relacionadas à ideologia da Nação, pois É, portanto, previsível que a his-
a Nação nada mais é do que “a ideologia tória dos Estados nacionais esteja
de um tipo de Estado”. “A Nação seria a chegando ao fim e que esteja para
ideologia do estado burocrático centralizado”8 começar uma nova fase em que o
(BOBBIO; MATTEUCI; PASQUINO, 2004, mundo se organizará em grandes
p. 798). espaços políticos federativos. Porém,
Porém, Bobbio, Matteuci e Pasquino se o federalismo significa o fim das
(2004, p. 798-99) chamam a atenção para Nações no sentido até aqui definido,
o fato de que, se a Nação é a ideologia do significa também o renascimento, ou
Estado burocrático centralizado, “a supera- o revigoramento, das nacionalidades
ção desta forma de organização do poder espontâneas que o Estado nacional
político implica a desmistificação da idéia abafa ou reduz a meros instrumen-
de Nação”. tos ideológicos a serviço do poder
E afirmam: político, e, conseqüentemente, a volta
“Existem fundamentos concretos àqueles autênticos sentimentos gre-
para esta desmistificação. É um gários dos quais a ideologia nacional
dado de fato que a atual evolução se fez única detentora e que foram
do sistema de produção na parte por ela transformados em valores
industrializada do mundo, após ter dependentes” (BOBBIO; MATTEUCI;
levado à dimensão “nacional” o âm- PASQUINO, 2004, p. 798-99).
bito de interdependência das relações No mesmo sentido, afirma Ferrajoli
pessoais, está atualmente ampliando (2002, p. 50):
este âmbito, tendencialmente, para “As idéias de ‘nação’ e de ‘nacionali-
além das dimensões dos atuais Es- dade’, não menos do que a noção de
tados nacionais e aponta, com uma ‘Estado’, são também uma invenção
ocidental: nascidas da Revolução
imposição da falsa idéia de que alguns conteúdos Francesa, serviram para fornecer, no
típicos da nacionalidade espontânea eram comuns a século XIX, um embasamento ‘natu-
todos os cidadãos (por exemplo, os costumes). Este ral’ aos Estados europeus e para legi-
processo se concretizou, nos Estados que o levaram
até às últimas conseqüências, mediante a imposição
timar sua soberania como ‘nacional’
a todos os cidadãos dos conteúdos característicos da e/ou ‘popular’. Hoje, essas mesmas
nacionalidade espontânea predominante e mediante idéias estão se voltando contra os Es-
a supressão das nacionalidades espontâneas menores tados: concebidos e legitimados como
( a esse respeito é paradigmático o caso da França)”.
8
Nessa perspectiva, afirma Rinesi (2004, p. 171-72):
instrumentos de pacificação interna
“La ideología de la nación, el reflejo distorsionado de e de unificação nacional, eles, enfim,
las cosas implicado en la idea de nación, constituye revelam ser não apenas as principais
un tipo de pensamiento ilusorio y falso del que saca ameaças à paz externa, como também
provecho el Estado para conseguir la obediencia y la
lealtad de los ciudadanos”. (...) “... la palabra ‘nación’
fontes de perigo para a paz interna e
suele usarse muchas veces en asociación con la fatores permanentes de desagregação
palabra ‘Estado’ y el sentido de esta asociación es, en e conflito”.
efecto, el de reflejar el modo en que el Estado sostiene Ora, o que os autores conseguem res-
la pretensión de legitimidad de su poder sobre la
ideologia que lo imagina representando una entidad
saltar é que, na Modernidade, o Estado
anterior a él y de la que él sería la expresión política, nacional configurava o poder político e ju-
que es la nación”. rídico, alicerçado na identidade cultural, no

Brasília a. 49 n. 196 out./dez. 2012 63


sentido da nacionalidade. Hoje, em função as pautas culturais e econômicas frustram
da globalização – como complexo fenôme- essa vontade.
no, conjunto de transformações econômicas Se, como leciona Beck (1998, p. 19), a
por meio da aplicação de novas tecnologias globalização gera o deslocamento do polí-
e por meio da força livre do mercado – inú- tico – antes diretamente relacionado ao es-
meras implicações nos campos político, ju- paço nacional – para o espaço do mercado,
rídico, econômico, social, ambiental foram uma redefinição ideológica do conceito de
produzidas. As consequências e os efeitos Nação precisa ser estruturada como forma
transformadores causados pela globali- de justificação do poder político. Em ou-
zação afetam diretamente os paradigmas tras palavras, a ideologia da Nação sobre
estruturantes do Estado Moderno, no qual os limites territoriais do Estado não serve
a ideologia da Nação estava consolidada. mais a contento como conteúdo ideológico
Como salienta Giddens (1998, p. 156), justificador das ações políticas estatais.
a globalização é um fenômeno que vem Dallari (2006, p. 135) ratifica essa pers-
reestruturar os modos de viver de forma pectiva, ao afirmar que a coincidência entre
bastante profunda. Significa dizer que esse Estado e Nação é algo cada vez mais raro
fenômeno – que não é somente econômico, em função da possibilidade de comunica-
mas sobretudo cultural, político e jurídico – ção e de mobilidade dos indivíduos entre os
transforma o cenário nacional, assim como Estados. E assevera que o conceito jurídico
afeta diretamente a soberania nacional. A de Estado nacional, fruto da modernidade,
globalização econômica conseguiu destruir serviu a contento na Europa do século XIX
o projeto da modernidade do Estado Na- em razão da estabilidade política e das
cional, alicerçado na identidade cultural, fronteiras territoriais bem definidas.
no sentido de nacionalidade, provocando Hoje, a realidade que se nos apresenta
o colapso do modo de vida ocidental. Se- é outra. O enfraquecimento da soberania
gundo Beck (1998, p. 18), “A nadie se le estatal é acompanhado do surgimento de
oculta que se ha producido una especie de outros atores políticos, não estatais. Logo,
toma de los centros materiales vitales de las a justificação do poder político do Estado
sociedades modernas que tienen Estados nacional já não se pode dar como outrora e
nacionales…”. urge que se encontrem novos paradigmas
David (2004, p. 153) considera que a de- para solucionar os problemas advindos
sagregação da figura estatal – consequência desse novo modelo econômico global.
do neoliberalismo – é problema político que É interessante considerar a urgência
afeta e provoca inúmeras interrogações em dessa mudança paradigmática porque,
torno da palavra Nação. se mantivermos o entendimento de que a
A desestruturação do Estado e a difi- Nação é a reunião de uma comunidade sob
culdade crescente de regular o poder social padrões culturais idênticos, que expressam
têm provocado uma lesão na eficácia polí- a soberania de um determinado Estado,
tica do termo Nação para a consecução dos estaremos ratificando um conceito jurídico
fins comunitários, afirma David, ao analisar que já não é mais adequado à realidade.
a situação concreta da Argentina. Lvovich consegue relatar, de forma
Lvovich (2004, p. 78), ao estudar a crítica, o descompasso existente entre o
obra de Anderson, argumenta que, com conceito jurídico e a realidade quando nos
a transnacionalização das forças produ- referimos à Nação.
tivas – fruto do capitalismo avançado –, “Por lo tanto, ahora las comunidades
há a deterioração do sentido de Nação. se tornan ‘imaginadas’ sólo en el mal
Ainda que exista a vontade, o desejo de sentido, esto es, deconectadas de
pertencer a uma classe, a uma identidade, cualquier sentido de la realidad social

64 Revista de Informação Legislativa


y de la posibilidad de una transfor- “Habremos de decir por último, que
mación social. Estas identidades ya no hay nación sin creación nacional,
no están basadas en ninguna expe- sin literaturas y artes libres, sin es-
riencia sustancial de un destino polí- tructuras de comunicación, sin cami-
tico compartido, con lo que el anhelo nos, medios de información, escuelas
de identidad nacional deviene una y universidades, sin una voluntad de
muestra de etnicidad pseudo arcaica. intervenir armoniosamente sobre la
En nuestros días, el enorme desar- naturaleza, sin técnicas, sin humani-
rollo de las migraciones hacia el zar el paisaje que nos rodea. Y la naci-
mundo más desarrollado se combina ón es entonces una voluntad de serlo
con la revolución de la comunica- desde un marco socio-geográfico y
ciones, afectando profundamente la desde una historia a reconfigurar.
experiencia subjetiva de la migración. Una nación es para afuera un debate
En efecto, la posibilidad de residir en pendiente con las otras naciones, y
el extranjero y mantener un contacto para adentro, es por fin, arrojarse a
– físico o imaginario – con la tierra un destino, a una praxis libertaria: al
natal posibilitará que, desde el punto trabajo siempre arduo e inconcluso
de vista del inmigrante, la calidad de de la organización práctica con los
ciudadano se separe de la lealtad a un que menos tienen.
estado-nación” (LVOVICH, 2004, p. La nación es así un concepto pe-
78-9, grifo nosso). ligroso, es una voluntad. Es una
Se, na atualidade, se fazem necessárias construcción peligrosa, es arrojarse
novas bases para o entendimento e a solu- políticamente a un futuro incierto.
ção dos problemas existentes, bases essas Somos los que habitamos la nación
que ultrapassem – transponham – os limites es también la pregunta por los que no
territoriais do Estado, a própria definição do tienen nación, los excluidos de toda
conceito de Nação, como conteúdo ideológi- nación. La Argentina es lo que somos,
co justificador da existência do Estado como o acaso lo que todavía podamos ser”
poder político, sofre significativo impacto. (VERNIK, 2004, p. 22).
O conceito deve ser redefinido em face das Essa é uma definição de Nação que
transformações paradigmáticas causadas muito nos agrada, pois consegue ampliar o
pela globalização ou mesmo “implodido” conceito de Nação. Ela consegue ampliá-lo
para renascer ante as novas fronteiras de forma revolucionária.
culturais, econômicas, políticas e jurídicas A definição proposta pelo autor permite
que se descortinam neste novo século. Isso entender que Nação é um verdadeiro pro-
se aplica também ao conceito de cidadão. cesso, um constante devir, que depende,
Propostas inovadoras surgem. claramente, da cultura política, da produção
Vernik (2004, p. 22) apresenta definição do conhecimento, do ethos cultural de uma
de Nação, considerando a realidade da comunidade, mas, acima de tudo, de práti-
Argentina. Contudo, trata-se de definição cas democráticas. Quando Vernik (2004, p.
extremamente feliz por responder, de for- 22) afirma que a existência da Nação depen-
ma crítica, atual e embasada no contexto de da produção do conhecimento nacional,
político, o que necessariamente o conceito da existência da cultura, de um conjunto de
de Nação deve expressar para o povo ar- serviços, possibilidades e direitos que pos-
gentino. Arriscamos-nos também a afirmar sibilitem aos cidadãos daquela comunidade
que o conceito de Vernik ou a proposta que desenvolverem sua personalidade, sua
oferece sobre o que seja a Nação se estende dignidade como condição para o exercício
também aos povos da América do Sul: da cidadania, deixa antever que Nação é,

Brasília a. 49 n. 196 out./dez. 2012 65


sobretudo, um processo em debate – para Para o autor alemão, o extraño é jus-
dentro dos limites territoriais, para fora dos tamente aquele indivíduo que, apesar de
limites territoriais. Trata-se de uma prática fazer parte da comunidade cultural em que
libertária porque é inclusiva. E, acima de vive, de estar devidamente relacionado e
tudo: essa prática inclusiva e libertária integrado, de falar a língua, não reflete a
deve ser contextualizada – um olhar para o identidade nacional porque não preenche
passado tendo em vista um futuro comum. o sentido de pertinência, de fazer parte da
A Nação somente pode ser concebida identidade cultural. E essa diferença é real-
como tal se revelar o valor da igualdade çada por estereótipos ou por expressões que
entre os que nela habitam, e isso depende indicam a delimitação do que é ser extraño,
também da inclusão dos que nela estão trazendo latentes impressões negativas e
exclusos. muitas vezes a imagem de “inimigo”.
Sob essa perspectiva e considerando que Beck deixa bem claro que os imigrantes
o conceito de Nação deve ser revisado, a que já vivem e estão aculturados nos países
igualdade, tão necessária para se viver em para onde imigraram acabam por romper
comunidade, depende também da inclusão com os estereótipos do mundo dos que vi-
daqueles que vivem no país, mas ali não vem naquele lugar. Em outras palavras, eles
nasceram. fogem do padrão, do modelo, dos estereóti-
Vivemos numa sociedade que se carac- pos existentes de uma determinada ordem
teriza pelas relações laborais temporárias, social. Muitas vezes, são pessoas nascidas
flexíveis, pois cada vez mais trabalhadores naquela comunidade, que falam a língua,
migram de um país para outro. É necessá- no entanto são excluídos da comunidade
rio que se revise o sentido de identidade social por serem “extraños”10.
coletiva em âmbito nacional justamente
em função dos fluxos migratórios hoje ‘¿Tú entender?’. Extraños son también los americanos
chinos que, orgullosos de su identidad étnica, no
recorrentes. tienen ni idea de China, pero que en la calle tienen
Beck, em seu livro La democracia y sus ene- que soportar constantemente la pregunta de dónde
migos (2000, p. 129-130), realiza importante está el restaurante chino más cercano. Extraños son,
abordagem e trata, em capítulo específico, finalmente, los judíos alemanes, que con entusiasmo
se alistaron y cayeron por Alemania en la Primera
da condição dos extraños. A visão do autor Guerra Mundial, pero que sólo recientemente han sido
remete-nos ao esfacelamento da identidade honrados con una corona por un Ministro de Defensa
coletiva em âmbito nacional, diretamente alemán. Extraños son los judíos alemanes que, con su
relacionada aos fluxos migratórios9. condecoración en el pecho ganada en la Primera Guerra
Mundial, sin poder creer que unos patriotas pudieron
matar otros compatriotas, fueron llevados a campos de
9
Beck (2000, p. 128-129) faz a seguinte indagação: exterminio. Extrañas son las personas que se ven a sí
“¿Qué significa la categoría “extraño”? Comencemos mismas como judías, se encuentran como extraños en
con algunos ejemplos. No son extraños los prusianos Europa y en Alemania y de esa sensación de extrañeza
en Prusia, sino los prusiamos en Baviera (o, al reves, obtienen su (frágil) identidad. Un día podrán aparecer
los muniqueses en Berlín). No son extraños los turcos por China y, para sorpresa suya, e incluso espanto,
en Turquía, sino los turcos en Berlín-Kreuzberg. Y comprobarán que en China la categoría ‘judío’ no
extraños son los turcos alemanes, los hijos de turcos quiere decir absolutamente nada; allí entran a formar
que han nacido y crecido en Alemania y aquí han ido parte, junto con sus antagonistas alemanes, del gran
a la escuela e incluso, tal vez, hablan un muniqués magma de los ‘europeos’, de los ‘blancos’. Y entonces
auténtico, pero tienen pasaporte turco y en su ‘patria’, sufrirán una fuerte crisis de identidad”.
Turquía, se encuentran como turistas. Extraños son 10
Beck (2000, p. 128-129, 134-135) afirma
los afroalemanes que, por su idioma, su identidad categoricamente: “En general se puede decir que
y su gusto por las navidades alemanas y la cocina la categoría de extraño rompe desde dentro con las
alemana, son ‘alemanes’, pero no lo son en una nota categorías y los estereotipos del mundo de los del lugar.
social muy importante: tienen el color de la piel Los extraños no encajan en ninguno de los moldes
negro, y por eso el resto de la gente se dirige a ellos en los que deberían encajar”. (…) “… el extraño es
y los trata como se suele hablar y tratar a los negros: una refutación viviente de los perfiles aparentemente

66 Revista de Informação Legislativa


O que é interessante ratificar, a partir jurídicos criados para refutar ou para dis-
da visão de Beck, é que o conceito de na- tinguir aqueles que fazem parte do mundo
cionalidade – que deveria ser analisado sob local e da ordem social. Nação é muito mais
a perspectiva sociológica – é considerado do que um frio conceito jurídico. É uma
como um conceito jurídico. Transforma- experiência, é um experimentar e viver
-se em um conceito jurídico os sentidos de em sociedade. Logo, não se podem criar
identidade e comunidade, tão complexos categorias que levem à exclusão ou que
e conflitivos. Assim, acaba-se rotulando a “absolutizem” o que é relativo.
ideia de nacionalidade em determinados A direta identidade entre pátria e Nação
estereótipos de uma ordem social. deve ser revisitada.
O estereótipo, pela própria definição Os “extraños” são os exemplos latentes
semântica – a de clichê (FERREIRA, [1975], da fragilidade da ordem social construída
p. 580) –, deturpa a realidade social, não a sobre estereótipos como o de nacionalida-
revela em sua complexidade. E gera, por de, como o de Nação.
que não dizer, maiores desigualdades e O conceito jurídico de Nação precisa
conflitos. ser desmistificado, pois revela somente o
Beck, realizando citação direta da obra convencional, um artifício ideológico que
de Georg Simmel, demonstra ser o “ex- serve, na maioria das vezes, para discrimi-
traño” um elemento que faz parte do corpo nar, para oprimir11.
social, como os pobres. Todavia, o que o David (2004, p. 155) chega a afirmar que
diferencia é que ele desrespeita os estereó- a Nação é um mito12.
tipos cultivados e formados no espaço da
Nação (BECK, 2000, p. 131). 11
É por isso que tão bem conclui Beck (2000, p.
137): “La construcción social del extraño se realiza
aquí en contextos de relativa claridad: los de aquí
3. Considerações finais tienen su sitio en el entramado del orden social del
que se distingue y excluye lo ‘extraño’. Ahora bien,
Mas, então, o que vem a ser Nação no
es precisamente este entramado de exclusiones y
contexto atual? pertenencias, concebido normalmente en claves de
Tratar de Nação requer, primeiramente, Estado nacionales, los que tanto en el interior de cada
desmistificar os estereótipos e os limites país como internacionalmente, está siendo minado o
alterado por procesos de ‘modernización reflexiva’”.
12
“Un mito situado en un territorio muy preciso,
claros y de los principios naturales por los que se sujeto al albur de su propria temporalidad, ligada a las
definen las pertenencias e identidades en los Estados tradiciones míticas previas que subsume en su seno,
nacionales”. (…) “ Lo que fastidia es que el extraño no que en la articulación hegemónica en la comunidad
es, precisamente, un extranjero, de la nacionalidad que imaginaria de la ciudad futura diseña el entramado
sea, según los estereotipos de los Estados nacionales. histórico en el que se ha de consumar nuestro destino.
Incluso los enemigos, llevadas las cosas al extremo, Ese mito tiene su origen, su forma, su devenir sujeto
son menos peligrosos que los extraños, porque histórico; ese mito, el de ser nacional, en su recorrido
respetan el orden establecido de estereotipos de lo mutante, nos traza la senda del persistir en la historia
propio y de lo extraño. ‘Con su sola presencia – escribe como entidad soberana. Una estética, una poética
Zygmunt Baumann –, que no encaja en ninguna de las política que podemos conjugar con las disposiciones
categorías establecidas, los extraños atacan la validez literarias que hemos sabido conseguir, es la mediadora
de diferencias y límites generalmente aceptados. Y del pacto de lectura de la realidad provisto por el
con ello privan las oposiciones al uso de su carácter mito. Ese sistema regulatorio que modula el decir, el
‘natural’, ponen de manifiesto su equivocidad y pensar, el desear y el hacer colectivo, atravesado por
dejan al descubierto la fragilidad del orden social’. la pasión, el pathos trágico de nuestra condición actual,
En otras palabras: el extraño es una prueba nítida de es la precondición de una épica. Épica utópica que
que ‘lo natural’ del ‘orden de los de aquí’ es artificial, aún en sus formulaciones organicistas tradicionales
convencional. Con la contradicción que (medida funciona en las imaginaciones públicas como garantía
por contraste con las imágenes de identidad del de cohesión territorial, de integración multi-étnica,
orden social) encarnan, los extraños son una prueba de universalidad y pluralidad linguística, como
constante de que el mundo podría ser de otra manera”. conjunción armónica de memorias y olvidos comunes.

Brasília a. 49 n. 196 out./dez. 2012 67


A definição dada por David sobre o mito nación: la pregunta de Renan revisitada. Buenos Aires:
da Nação é muito interessante. Segundo o Prometeo Libros, 2004.
autor, por meio desse mito, é possível a con- ARIZA, Lúcia. La nación interpuesta. In: VERNIK,
ciliação do corpo social, a existência de um Esteban (Org.) et al. Qué es una nación: la pregunta
comunitarismo, que é regido pelo jogo insti- de Renan revisitada. Buenos Aires: Prometeo Libros,
2004.
tucional estatal. O mito da Nação consegue
desfazer hostilidades porque ela expressa BECK, Ulrich. La democracia y sus enemigos: textos
escogidos. Barcelona: Paidós, 2000.
um pacto. Porém, quando esse pacto se
corta com a ruptura dos laços comunitários, _____. ¿Qué es la globalización?: falacia del globalis-
com a desarticulação da sociedade civil, mo, respuestas a la globalización. Barcelona: Paidós
Ibérica, 1998.
difícil se torna a existência do mito como
forma de justificar o poder soberano, o que BOBBIO, Norberto; MATTEUCI, Nicola; PASQUINO,
leva o autor a afirmar: “El fracaso de las Gianfranco. Dicionário de política. Brasília: UNB, 2004.
ilusiones democráticas y la flagrante caída DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral
moral del modelo republicano de gestión do estado. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
social, incitan la búsqueda del fundamento DAVID, Guillermo. Carlos Astrada y el mito fundante
perdido” (DAVID, 2004, p. 156). de la nación. In: VERNIK, Esteban (Org.). Qué es una
Desfaçamos o mito e reconstruamos, na nación: la pregunta de Renan revisitada. Buenos Aires:
realidade, o sentido de Nação. É necessário Prometeo Libros, 2004.
que o povo redescubra sua historicidade – DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. 2. ed. São
único meio para o resgate de sua cultura. Paulo: Saraiva, 2005.
Mas, para tanto, precisamos pensar a Nação FERRAJOLI, Luigi. A soberania no mundo moderno. São
“desde dentro”, buscando interagir com Paulo: Martins Fontes, 2002.
aqueles que fazem parte de nossa identida- FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo
de tão multiforme e facetada. É necessário dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova
reconstruir o conceito de Nação – inclusivo, fronteira, [1975].
revolucionário, justo, que desmistifique os GIDDENS, Anthony. Socialdemocracia y neoliberalis-
mitos, quebre os estereótipos e transponha mo. Claves de la razón práctica, Madrid, n. 89, p. 10-15,
paradigmas jurídicos pensados para uma enero/feb. 1998.
realidade já passada e que são mais adequa- LVOVICH, Daniel. Nación e imaginación. In:
das à urgência de se buscar a nacionalidade VERNIK, Esteban (Org.) et al. Qué es una nación: la
como expressão da dignidade humana. A pregunta de Renan revisitada. Buenos Aires: Prometeo
nacionalidade que liberta deve romper com Libros, 2004.
as diferenças que oprimem. MALUF, Sahid. Teoria geral do estado. 26. ed. São Paulo:
Saraiva, 2003.
REALE, Miguel. Teoria do direito e do estado. 5. ed. São
Paulo: Saraiva, 2000.
Referências
RINESI, Eduardo. Nación y Estado en la teoria y en la
ÁLVAREZ, Emiliano. Mariátegui: la nación como política. In: VERNIK, Esteban (Org.) et al. Qué es una
futuro. In: VERNIK, Esteban (Org.) et al. Qué es una nación: la pregunta de Renan revisitada. Buenos Aires:
nación: la pregunta de Renan revisitada. Buenos Aires: Prometeo Libros, 2004.
Prometeo Libros, 2004.
STRECK, Lenio Luiz, MORAIS, Luis Bolzan de. Ciên-
ARGUMEDO, Alcira. Naciones y miradas de la cia política e teoria geral do estado. 2. ed. Porto Alegre:
historia. In: VERNIK, Esteban (Org.) et al. Qué es una Livraria do Advogado, 2001.
VERNIK, Esteban. La nación que somos. In: _____ et
al. Qué es una nación: la pregunta de Renan revisitada.
Es decir, concita la textualidad coordinada de los Buenos Aires: Prometeo Libros, 2004.
factores que resuenan en la idea de Nación” (DAVID,
2004, p. 155).

68 Revista de Informação Legislativa

Você também pode gostar