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O MAIS EDUCAÇÃO ENQUANTO POSSIBILIDADE DE AQUISIÇÃO DE

CAPITAL CULTURAL: UMA ANÁSE DO PROGRAMA NAS ESCOLAS PUBLICAS


DE SOBRADINHO

Guilherme Ernesto de Andrade Neto

Carlos Alberto Ribeiro

INTRODUÇÃO

Com esse estudo pretendemos discutir a importância do Programa Mais Educação para
a aquisição de capital cultural pelas crianças de duas escolas do pequeno município de
Sobradinho, localizado no Norte da Bahia. Desse modo, pretendemos questionar se
efetivamente o programa, que prevê a realização de uma gama de atividades culturais alarga a
percepção dos educandos para a realidade.

A realização da pesquisa que ensejou a escrita desse texto demandou a mobilização de


duas técnicas de coletas de dados próprias das pesquisas de natureza qualitativas. Nosso
primeiro passo foi à realização da revisão de literatura acerca do programa. Foram
examinados artigos que abordaram os diversos aspectos do Programa Mais Educação
enquanto política pública educacional.

Após a realização da revisão de literatura foram realizadas quatro entrevistas


semiestruturadas. Trabalhamos com essa modalidade de entrevista por considerar que ela
confere certa liberdade para os entrevistados, ao passo que permite a condução do raciocínio
do mesmo pelas perguntas do pesquisador. No total foram realizadas quatro entrevistas com
duração média de sessenta minutos cada.

Construído a partir dessa questão, as reflexões tecidas ao longo do texto estão


distribuídas em três partes articuladas entre si. Na primeira, realizamos uma breve
caracterização do programa. Destacamos, essencialmente, os pressupostos filosóficos que
informaram sua construção. Na segunda parte, sumariamos o contexto histórico de
surgimento de Sobradinho. Ponderamos que o mesmo mantém relações estreitas com as
condições sociais das crianças que estudam nas escolas contempladas pelo programa. Por fim,
consideramos os relatos tanto das professoras, como dos monitores acerca de alguns aspectos
relativos ao programa, a partir dos quais discutimos sua efetividade

CARACTERIZAÇÃO DO PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO

Convém ressaltar que o Programa Mais Educação está estreitamente relacionado a


debates históricos acerca da participação do Estado como proponente de projetos voltados
para a transformação da realidade social. De modo geral, esses debates são realizados por
pensadores alinhados a duas perspectivas antagônicas. A primeira perspectiva reúne os que
advogam a restrição da participação do poder público na sociedade, pois o mercado seria
capaz de sanar o conjunto de assimetrias sociais que caracterizam a realidade brasileira. A
segunda perspectiva reúne os que advogam a importância de aparelhos estatais consolidados,
que através das políticas públicas devem induzir mudanças sociais.

De saída, consideramos a participação do poder público imprescindível para a


construção de programas visando à superação da gama de mazelas que assolam o país. Mas, é
relevante ressaltar a importância do engajamento dos agentes sociais no processo de
construção das políticas públicas. Em pesquisas anteriores constatamos que as dificuldades de
execução do Mais Educação relacionava-se com o pouco envolvimento dos docentes,
motivada pela falta de participação dos mesmos no fomento do programa. Não por acaso, a
grande maioria se quer conheciam suas propostas. Assim, antes de seguir com as discussões,
nos próximos parágrafos tentaremos caracterizá-lo.

As propostas do programa em questão foram inspiradas pelos pressupostos


pedagógicos do Movimento Escola Nova, cujo principal expoente foi o educador Anísio
Teixeira. Fomentado na década de trinta do século passado o “Escola Nova pretendia o
desenvolvimento de uma escola integral que despertasse interesses em diferentes áreas como
saúde, resistência e vitalidade física relacionando esses interesses à alegria de viver”
(PESSOA; KLUMPP; FERNANDES; ANDRADE, 2017:89).

Entretanto, as proposições filosóficas que concebem o homem enquanto ser


multidimensional que se realiza apenas mediantes o desenvolvimento de suas potencialidades
cognitivas, afetivas e sociais data dos grandes pensadores gregos: Sócrates, Platão e
Aristóteles. No Programa Mais Educação a formação total dos educandos devem ser
perseguida a partir da concretização na escola de três dos dez macrocampos previstos. São
eles:

1) Acompanhamento pedagógico; 2). Maio ambiente; 3). Esporte e Lazer; 4).


Direitos humanos em educação; 5). Cultura e artes; 6). Cultura digital; 7).
Preservação e promoção da saúde; 8). Comunicação e uso das mídias; 9).
Investigação no campo das ciências da natureza; 10). Educação econômica
(PESSOA; KLUMPP; FERNANDES; ANDRADE, 2017: 88)1.

As escolas devem escolher três macrocampos, que informarão o desenvolvimento das


atividades a serem realizadas no contraturno dos estudantes. Das atividades listadas acima a
única obrigatória será o acompanhamento pedagógico. Dessa forma, a escolha das demais
caberá a cada unidade de ensino contemplada. Espera-se que as experiências realizadas a
partir da execução do programa orientem a construção de um projeto de educação integral,
definida nos seguintes termos:

Ação educacional que envolve diversas e abrangentes dimensões da formação dos


indivíduos. Quando associada à educação não-intencional, diz respeito aos processos
socializadores e formadores amplos que são praticados por todas as sociedades, por
meio do conjunto de seus atores e ações, sendo uma decorrência necessária da
convivência entre adultos e crianças. Quando referida à educação escolar, apresenta
o sentido de relação entre a ação intencional da instituição escolar e a vida no
sentido amplo (TEIXEIRA apud LECLERC; MOLL, 2012: 94)

Considerando os princípios apresentados pela definição acima, a princípio a educação


integral se caracteriza pelo reconhecimento dos processos de socialização que ocorrem para
além da escola, enquanto espaço físico circunscrito. Reconhecer a importância desses
processos será o primeiro passo para superar a descontinuidade entre a escola e o mundo das
vivencias dos educandos.

Não por acaso, uma das propostas do Mais Educação visa atrair pessoas da
comunidade dotadas com um conhecimento específico para ministrar atividades. Por sua vez,

1
Criado pela portaria interministerial nº 17/2007, sendo regulamentado pelo decreto 7.083/10, sua criação está
relacionada com a construção de medidas governamentais que visam ampliar a jornada escolar. Nesse sentido, o
programa possui enquanto principal prerrogativa, lançar as bases para o fomento de uma educação em tempo
integral, nas redes estaduais e municipais do ensino básico. Para cumprir tal meta o Mais Educação definiu eixos
de atuação ou macrocampos, que compreendem áreas como cultura e arte, cultura digital; promoção da saúde;
comunicação e uso de mídias, investigação no campo das ciências da natureza e educação econômica, além do
acompanhamento pedagógico ou letramento, única atividade constante e obrigatória dentre as previstas pelos
macrocampos. Assim, a partir dos eixos, cada escola deve definir seis atividades, que devem ser substituídas
anualmente. Coordenado pela Secretaria de educação básica (SEB/MEC), em conjunto com as secretarias de
educação dos estados e municípios, o Mais educação recebe recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola
(PDDE), do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Sua estrutura de gestão prevê a formação de
comitês regionais ou metropolitanos, formados pelos representantes das secretarias, gestores escolares e
universidades, comitês locais, compostos pelos coordenadores, professores e monitores do programa, além de
representantes da comunidade (ANDRADE NETO; ALMEIDA; OLIVEIRA, 2014: 501).
os resultados obtidos a partir da realização dessas atividades deveram orientar a construção
dos princípios basilares de uma escola em tempo integral, definida nos seguintes termos:

Em sentido restrito refere-se à organização escolar na qual o tempo de permanência


dos estudantes se amplia para além do turno escolar, também denominada, em
alguns países, como jornada escolar completa. Em sentido amplo, abrange o debate
da educação integral - considerando as necessidades formativas nos campos
cognitivo, estético, ético, lúdico, físico motor, espiritual, entre outros – no qual a
categoria tempo escolar reveste-se de relevante significado tanto em relação a sua
ampliação, quanto em relação à necessidade de sua reinvenção no cotidiano escolar
(MOLL apud LECLERC; MOLL, 2012: 95).

Desse modo, partindo das premissas contidas na definição acima o desenvolvimento


das múltiplas potencialidades dos educandos impõe enquanto imperativo a ampliação da
jornada escolar. Desse imperativo surge a proposta da escola em tempo integral. Assim,
realizadas as devidas categorizações, nos próximos parágrafos abordaremos a importância da
educação integral na realidade estudada.

CONTEXTUALIZAÇÃO DA REALIDADE ESTUDADA

No início da década de 1970, a política desenvolvimentista dos governos militares,


cuja principal meta era potencializar a indústria de base exigiu a ampliação das matrizes
energéticas nacionais, sobretudo no Nordeste, região em que as poucas indústrias dependiam
da produção das custosas usinas termoelétricas. Nesse período, o Complexo de Usinas
Hidrelétricas de Paulo Afonso, localizadas no baixo médio São Francisco já estavam
funcionando. Porém, as oscilações na vazão do Rio preocupavam os técnicos do Estado.

Logo, a necessidade de regular a vazão do “Velho Chico” justificou a construção de


um imenso reservatório com extensão de aproximadamente 350 km de extensão. A largura do
mesmo pode chegar a 40 km, dimensões que lhe possibilita armazenar cerca de 34 bilhões de
m³ de água. Após o início das obras, decidiram construir nas paredes do reservatório casas de
força para a instalação de mais uma Usina Hidrelétrica (SIGAUD, 1989).

A construção da Barragem de Sobradinho atraiu para o imenso canteiro de obras que


se formou mais de nove mil homens. Para abrigar o contingente humana mobilizado no
processo de construção da barragem a Companhia Hidrelétrica do Vale do São Francisco
(CHESF) construiu três espaços distintos, estratificados de acordo com a qualificação
profissional dos trabalhadores.

Para os engenheiros, profissionais com maior qualificação técnica foi construída a Vila
Santana. A única que deveria permanecer após a construção da barragem para obrigar os
técnicos responsáveis pela operacionalização da Usina. Essa Vila destaca-se das demais,
essencialmente, pelas excelentes moradias que a constitui. Para os técnicos menos
qualificados foi construída a Vila São Francisco, caracterizada por suas casas pré-moldadas,
que deveriam ser desmontadas com o termino das obras. Por último, a Vila São Joaquim
ocupada pelos trabalhadores menos qualificados: pedreiros, armadores, carpinteiros e
ajudantes.

Durante o período de construção da barragem o dinheiro dos trabalhadores atraiu tanto


os comerciantes de mercadorias diversas, como de mulheres. Profissionais do sexo que
vinham trabalhar nos bares da zona de prostituição do acampamento chamada de chililique.
Localizados em um dos limites da Vila São Joaquim. Com o termino das obras, a grande
maioria das empresas terceirizadas partiram para novos empreendimentos. Mas, grande parte
dos trabalhadores, cujas famílias já estabelecidas, resolveram permanecer no enorme
acampamento.

No início da década de 1980, os conflitos insurgentes entre indivíduos destituídos de


vínculos de solidariedade, visto que eram oriundos de realidades diversas foram intensificados
pelo desemprego. Nesse período, a fome, violência e insegurança passaram a caracterizar o
cotidiano das famílias moradoras da Vila São Joaquim. As mortes violentas, motivadas por
banalidades ocorridas durante esse período marcaram a consciência coletiva. Não por acaso, a
Vila São Joaquim passou a ser chamada de “caí duro”. Segundo os que vivenciaram esse
período “eram executados cerca de seis pessoas por noite, sendo que mais seis ficavam
amarradas para serem executadas na noite seguinte.

A compreensão desse conturbado contexto histórico requer pesquisas rigorosas.


Assim, não tomamos os mencionados relatos como expressão da verdade, mas como
evidências a serem investigadas. Porém, passadas mais de quatro décadas as marcas do
passado nos salta aos olhos. A estratificação da população a partir das vilas caracteriza a
estrutura física da cidade.

Com o passar dos anos, a Vila São Joaquim, por ser a mais populosa tornou-se a
centro comercial de Sobradinho. Além disso, com a emancipação recebeu uma série de
instituições: prefeitura, bancos, delegacia etc. Mas, apesar de ser considerada a principal vila
da cidade, nela estão também os principais problemas sociais, pois nessa vila mora grande
parte da população mais carente da cidade.
Não por acaso, as quatro escolas que a princípio foram contempladas pelo Mais
Educação estão localizadas na Vila São Joaquim. São elas: a Escola Maria José de Lima
Silvera, a Escola Prefeito Geraldo Silva, a escola Vinte Quatro de Fevereiro e o Centro
Educacional Luiz Eduardo Magalhães.

O PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO EM SOBRADINHO

De acordo com Bourdieu (1996: 20) os agentes sociais são socializados em “conjunto
de posições distintas” nos espaços sociais. Durante esse processo de socialização, que se dará
por meio de constrangimentos sucessivos, os agentes incorporam de modo inconsciente tanto
na sua dimensão corporal, quanto psíquica um conjunto de estruturas, que se manifestam nas
suas disposições para o agir. Essas disposições que dependem do meio no qual os indivíduos
são socializados são os habitus.

Compreendemos o quanto eles podem diferir quando comparamos o processo de


socialização de crianças nascidas no seio de famílias pobres, com o processo de socialização
de crianças nascidas no seio de famílias abastadas. Pressupomos que as segundas terão acesso
a uma gama de bens culturais: livros, visitas a museus e exposições artísticas, viagens
internacionais, inacessíveis para as crianças nascidas no seio de famílias pobres. Diferença
que marcará o desnível de seus capitais culturais.

Segundo Bourdieu (2008) esses desníveis serão aprofundados pela escola, pois ela
valorizará, essencialmente, aqueles que reconhecem os códigos culturais mobilizados para
interpretar as linguagens das artes e ciências. Códigos que serão compreendidos apenas por
estudantes consideradas naturalmente inteligentes. Aqueles que se mostrarem incapazes de
compreender tais códigos serão considerados inaptos para a vida intelectual, sofrendo
violência simbólica. Com o passar do tempo eles também se perceberão enquanto
naturalmente incapazes.

Assim, considerando que o Programa Mais Educação possibilita a circulação de um


amplo conjunto de conhecimentos no âmbito escolar, nos coube questionar se as atividades
propostas pelo programa contribuem para a ampliação do capital cultural dos estudantes de
duas escolas públicas localizadas na Vila São Joaquim? Como veremos as opiniões acerca
dessa questão foram diversas. Vejamos trechos dos relatos de duas professoras:

É um projeto interessante! Mas ele acaba sendo prejudicado pelos vícios políticos.
Esse programa veio para que o menino tivesse no contraturno uma atividade extra,
que essa atividade pudesse auxiliar em seu desenvolvimento. Mas acaba que os
estudantes do mais educação são escolhidos para cobrir uma vaga de emprego. Não
é feita uma seleção mais adequada para saber se a pessoa tem capacidade de
executar aquela tarefa. Então falta gerenciamento do que é feito, pois as crianças
abusam, acabam deixando o programa. A escolha dos monitores é fundamental. É
um programa muito bom, mas é aplicado vergonhosamente (Professora M. R. C. S.
Sobradinho, 23/02/2019).

Amplia sim! É um excelente programa porque possibilita que os estudantes


estendam o tempo na escola participando de diversas atividades no contraturno:
acompanhamento pedagógico, esportes, artes. Possibilita a crianças que antes
ficavam nas ruas ampliar suas possibilidades de aprendizagem a partir dessas
atividades que não estavam previstas na matriz curricular. Então, apesar das
dificuldades com a questão da estrutura da escola, de encontrar profissionais para
coordenar e monitores, acho que o programa contribui para ampliar a perspectiva
dos estudantes (Professora E. S. L. B. Sobradinho, 25/03/2019)

Como vimos as opiniões acerca da efetividade das atividades desenvolvidas pelo Mais
Educação não são Uníssonas. Isso porque, o sucesso do programa dependerá da convergência
de um conjunto heterodoxo de variáveis como relataram as professoras. Enquanto na escola
da primeira, as atividades não tiveram o êxito esperado, essencialmente, pela cooptação
política do programa que serviu de “cabide” de empregos. A segunda considerou importante o
conjunto de atividades que são realizadas em sua escola para ampliar o capital cultural dos
estudantes.

Nesse caso, a docente apontou que esses alunos não teriam acesso as várias oficinas
desenvolvidas pelo programa fora do âmbito escolar. Além disso, a ampliação da jornada
escola diminui os impactos de um cotidiano violento em crianças que vivem em situação de
risco social. Contudo o caráter diversos das opiniões sobre as contribuições do programa
também foram percebidos nos relados dos monitores. Vejamos trechos das entrevistas deles:

Quando nos realizamos as atividades, oferecemos para aquelas crianças objetivos de


vida. Isso é muito importante, pois viver sem propósito pode ser o mesmo que está
morto. Então ajuda muito, tira a criança do comodismo. Nos ensinamos pra eles
coisas novas, voltada para arte. Apesar de muitos criticarem, a arte salva vidas. Eu
mesmo foi salva pela arte. Ela nos permite ver a vida com outros olhos (Monitor do
Programa Mais Educação, W. S. S. Sobradinho, 20/02/2019).

Olha, em nosso cenário nos lidamos com crianças que vivem na extrema pobreza.
Muitas a principio só freqüentavam as atividades do programa pela comida que era
oferecida no lanche. Então, tinha muito desinteresse, as crianças que mais se
interessavam não eram de famílias tão pobres. Mas notei que no final de um ciclo de
atividades voltadas para música nenhuma criança saiu da maneira como entrou.
Notamos que os horizontes foram abertos para as questões culturais. Tinha alunos
que não conheciam as músicas trabalhadas, não tinham acesso a instrumentos
musicais, mas passaram a gostar de música nas oficinas de flauta (Monitor do
Programa Mais Educação, G. W. A. S. Sobradinho, 25/02/2019).

O relato do primeiro monitor nos chama a atenção para a importância da arte enquanto
elemento diverso em um espaço escolar marcado pela prevalência de um conjunto de rotinas
monótonas, previamente estabelecidas. Contudo, o segundo descreveu as dificuldades de litar
com o desinteresse de crianças famintas que a princípio freqüentava as oficinas do programa
pelo lanche oferecido aos participantes, após as oficinas. Em todo caso, para eles as atividades
proporcionam novas experiências para crianças que dificilmente teriam acesso as expressões
artísticas trabalhadas fora do espaço escolar.

No tocante a relação dos mesmos com os professores eles ponderaram que:

Na verdade nos dialogamos bastante nos planejamentos ne? Nos trocamos muitas
informações sobre os alunos, quais as dificuldades de cada um. Nesse ponto os
professores colaboraram bastante, aqueles que tinham mais dificuldades nos
procuramos dar um tratamento diferenciado (Monitor do Programa Mais Educação,
W. S. S. Sobradinho, 20/02/2019).

Eu não tive dificuldade com professores, não vou mentir! Na verdade eles
colaboraram bastante comigo ne? Chegamos a desenvolver muitas atividades juntos,
como apresentações artísticas em datas comemorativas. Com os professores não tive
nenhuma dificuldade (Monitor do Programa Mais Educação, G. W. A. S.
Sobradinho, 25/02/2019).

As falas dos monitores revelaram avanços significativos no que se refere à


participação dos docentes na elaboração das atividades previstas pelo programa. O que pode
ser considerado um avanço, pois como mencionamos em estudos anteriores constatamos a
falta de interesse dos docentes para com o Mais Educação, relacionamos esse desinteresse a
ausência da participação dos mesmos no processo de construção da política pública
educacional em questão. Com relação às dificuldades o monitores ponderaram que:

Existem dificuldades. As escolas nem sempre dispõem de tudo que precisamos para
realizar as atividades. Em algumas escolas não tinha o material, mas eles
conseguiram, quando não tinha jeito acabei levando meu material. Mas não
deixamos de realizar o projeto (Monitor do Programa Mais Educação, W. S. S.
Sobradinho, 20/02/2019).

Nos sabemos que o programa dispõe de verba, mas nem sempre a gente tem o
material necessária para os trabalhos. A única coisa que não foi difícil foi às flautas
compradas com o dinheiro do programa. Mas precisei de caixas de som com
microfones sem fio. Não tive esses equipamentos a disposição, tanto que o
encerramento das atividades foi realizada na capela. Então, teve essa dificuldade
(Monitor do Programa Mais Educação, G. W. A. S. Sobradinho, 25/02/2019).

Não queremos lançar dúvidas sobre a importância das iniciativas individuais descritas
no relato acima, mas um programa que pretende lançar as bases que possibilitarão a transição
de uma educação de meio período para a educação integral não pode ser dependente do
voluntarismo dos monitores. Desse modo, a falta dos equipamentos e matéria necessários para
a realização das atividades é preocupante, principalmente porque o Mais Educação recebe
recursos do programa Dinheiro Direto na Escola. Esse aspecto mostra o quanto às políticas
públicas são desvirtuadas quando transposta para a realidade. Aspecto que revela a
necessidade de repensar permanentemente o programa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente trabalho realizamos algumas considerações acerca da realização das


atividades do Programa Mais Educação em duas escolas de Sobradinho. Nosso ponto de
partida foi à caracterização do programa com breves apontamentos sobre os pressupostos
filosóficos que nortearam seu processo de construção. Após isso, definimos tato o que
conceito de educação integral, como do que escola de tempo integral.

Consideramos relevante defini-los, pois apesar de estarem relacionados essas chaves


de análise não podem ser confundidas. Elas abordam aspectos distintos da realidade. A
educação integral diz respeito à totalidade do processo formativo dos docentes, que
transcende os limites das unidades de ensino. A escola de tempo integral diz respeito à
ampliação da jornada escolar, enquanto prerrogativa fundamental para o desenvolvimento de
atividades que possibilitem o pleno desenvolvimento de todas as potencialidades dos
docentes.

Na sequência tecemos algumas considerações sobre o contexto histórico da realidade


estudada. Nesse ponto, ponderamos que as condições históricas nas quais a cidade surgiu
possibilitam a compreensão mais acurada da carência das crianças que frequentam as duas
escolas contempladas pelo “Mais Educação”. Nesse contexto de carência, o mesmo tornou-se
imprescindível para ampliar o capital cultural das crianças atendidas.

Com relação à efetividade das atividades realizadas pelo programa nas escolas
percebemos que os relatos não foram uníssonos. Entre os professores entrevistados as
opiniões foram diversas. Porém, apesar dos contrastes discursivos contidos nas falas dos
monitores constatamos que eles conceberam mudanças significativas nas crianças com as
quais trabalharam.

De acordo com eles, as atividades oferecem novas perspectivas para os estudantes.


Assim, ressaltamos que mudanças devem ser realizadas no processo de execução do
programa. Mas, não podemos negar sua importância tanto para revelar os aspectos positivos,
como as dificuldades do processo de transição para o modelo de educação integral, o qual
deverá se estabelecer com os pontos falhos já corrigidos.
REFERENCIAS

ANDRADE NETO, Guilherme Ernesto de; ALMEIDA, Sara de Barros; OLIVEIRA, Kleyton
Gualter de. O Programa Mais Educação enquanto Política Pública Educacional e seus
Desafios. Anais do VIII Simpósio Nacional Estado e Poder: educação, política e movimentos
sociais – Juazeiro/BA, 2014.

BOURDIEU, Pierre. Razões Praticas: sobre a teoria da ação – Campinas, SP: Papirus, 1996.

BOURDIEU, Pierre. A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino –


Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.

LECLERC, Gesuína de Fátima Elias; MOLL, Jaqueline. Programa Mais Educação: avanços
e desafios para uma estratégia indutora da Educação Integral e em tempo integral Educar em
Revista, Curitiba, Brasil, n. 45, p. 91-110, jul./set. 2012. Editora UFPR.

PESSOA, Patrícia dos Santos; KLUMPP, Carolina Ferreira Barros; FERNANDES, Janaína
da Silva Gonçalves; ANDRADE, Márcia Siqueira de. PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO:
revisão de literatura. Psic. Da Ed.,45, 2º sem. De 2017, pp. 87-94. São Paulo.

SIGAUD, Lygia. Efeitos Sociais de Grandes Projetos Hidrelétricos: as Barragens de


Sobradinho e Machadinho. In: ROSA, LuizPinguelli. SIGAUD, Lylia. MIELNIK, Otávio.
Copyright 1988 by COPPE.

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