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DIREITOS TRANSACCIONÁVEIS “NÃO-EMISSÃO”


no quadro de Economia do Ambiente

P2G3
Margarida CARIA
Pedro ALMEIDA

1. Resumo
Este trabalho destina-se à exploração do conceito de direito transaccionável e
a algumas da suas aplicações. Também se pretende retratar a gestão de
mercados bem como as suas falhas.

2. Introdução
Por direito transaccionável tem-se o privilégio que um agente possui sobre um
bem, que lhe permite limitar o uso e acesso desse recurso, associado à
capacidade de o transferir para outros.

Assim, os direitos transaccionáveis encontram-se divididos em diversos


sectores como: os de propriedade, de exploração, de emissão, de
desenvolvimento, de extracção e outros, cada qual com o seu mercado próprio.

Um mercado de direitos visa abranger áreas e propósitos variados, em que são


negociados direitos adquiridos ou atribuídos segundo quotas transaccionáveis,
as quais representam uma porção de propriedades que podem ser compradas,
vendidas e/ou exploradas.

3. Direitos de Propriedade
Definição: Conjunto de regras com direitos e obrigações que regem o uso de
recursos.

Figura 1: Ilustração dos direitos de propriedade.

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Um mercado económico funcional deve possuir três características (Tietenberg,


2000):

- Exclusividade – todos os benefícios e custos acrescidos como resultado da


posse e uso dos recursos devem pertencer exclusivamente ao dono, seja de
forma directa, ou indirectamente por vendas a outros;

- Transmissibilidade - todos os direitos de propriedade devem ser transferíveis


de um dono para outro, numa troca voluntária;

- Carácter executório – os direitos de propriedade devem estar seguros de


apreensões involuntárias ou usurpações por parte de outros;

O proprietário de um recurso com direitos de propriedade bem definidos, tem


incentivos a usar esse recurso de forma eficiente porque a sua desvalorização
representa uma perda pessoal.

4. Sistemas de Direitos Transaccionáveis


No sentido de melhor gerir estes mercados de transacções, têm surgido alguns
sistemas que visam conservar e proteger propriedades através de trocas ou
acordos voluntários.

4.1 Transferable Development Rights/Purchase of Development Rights

As preocupações acerca das crescentes perdas de terras de cultivo levaram ao


estudo de meios para a protecção dos recursos. Uma das muitas opções
consideradas é designada por direitos de desenvolvimento transferíveis.
Refere-se portanto a um método em que os direitos para desenvolver são
transferidos de uma área para outra, deste modo o que acontece é que as
áreas agrícolas são conservadas, havendo transferência desses direitos para
áreas em crescimento. Os custos associados a estas transacções são
recuperados em bónus de construção.

Figura 2: Esquema de um sistema TDR.

O conceito de TDRs garante compensação financeira ao proprietário, em


contra-partida a sociedade impõe regulamentos para controlar o crescimento
do território. O direito de desenvolvimento é uma característica separada da

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propriedade privada e pode ser mudado de área, eventualmente tendo valor


económico.

Os TDRs são ferramentas criadas para facilitar o planeamento territorial. A


transferência de direitos de desenvolvimento necessita de certeza quanto aos
locais onde irão ocorrer. Estes programas fazem mais do que preservar zonas
agrícolas ou recursos naturais, eles alteram o modo como o desenvolvimento
se processa numa comunidade.

Os TDRs são muito semelhantes aos “purchase of development rights” (compra


de direitos de desenvolvimento). O valor de PDR é a diferença entre valor do
espaço aberto ou o terreno de cultivo e o valor para o desenvolver. Por
exemplo, se o espaço aberto custasse 2000€ por hectare e o investidor
pagasse 6000€ para comprar essa propriedade, então o valor do direito de
desenvolver seria de 4000€, no entanto são as forças do mercado que vão
determinar esse valor final. Os PDRs requerem que uma agência
governamental ou outra organização sem fins lucrativos compre a um privado
os direitos que depois serão “retirados” através de uma acção restritiva.

Uma propriedade associada aos direitos de desenvolvimento é o facto de


permitirem que o comprador os possa transferir entre propriedades que
possua. Existe um segundo método em que os governos locais estabelecem
um banco de TDR, permitindo a que quem pretender adquirir direitos de
desenvolvimento o faça investindo em algo cujo retorno passa pelo aumento da
capacidade dos próprios governos locais em adquirir “sending areas”.

Há 4 elementos principais num programa TDR:

1 – Zona a preservar;

2 – Área de crescimento;

3 – Uma série de direitos de desenvolvimento que estão legalmente separados


da propriedade;

4 – Procedimentos pelos quais os direitos de desenvolvimento são transferidos


de uma propriedade para outra.

Vantagens?

• Compensações financeiras para os donos das propriedades pelas suas


perdas;
• Facilitam a implementação do planeamento territorial;
• Providenciam fundos privados para protecção;
• Tornam o desenvolvimento mais previsível;
• São mais duradouros que o planeamento territorial;

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Desafios?

• Não reduzem a necessidade de planeamento;


• Mais recursos humanos na administração e gestão;
• Requerem investimentos na educação pública;
• Comunidades podem não suportar os programas TDR;
• Protegem os valores de preservação de forma permanente;

4.2 Conservation Easement

Um “conservation easement” é um acordo voluntário que visa a doação ou


venda de direitos de desenvolvimento de território, celebrado entre o
proprietário e uma instituição (pública ou privada) de modo a que estes
garantam a protecção da área. Quando assinado é registado em sede própria e
é aplicável a todos os eventuais futuros compradores.

Outra abordagem seria pensarmos nos direitos que temos sobre uma
propriedade como sendo um conjunto de “pauzinhos” que seguramos com a
mão, em que cada pauzinho representa um direito a fazer algo no terreno. O
dono pode abrir mão de alguns direitos, pauzinhos portanto, associados à
propriedade, através dum documento chamado “conservation easement”.

Porquê concessionar um “conservation easement”?

São pessoas que têm interesse em proteger a sua propriedade de


desenvolvimento indesejado mas com o intuito de se manterem na posse das
mesmas. Deste modo garantem a protecção por tempo “infinito”
independentemente de quem tem a tutela das terras, beneficiando
financeiramente com a situação.

Quais os retornos financeiros?

Deduções nos impostos para os casos em que o acordo é perpétuo e com fins
de conservação exclusivamente.

Quais os encargos?

O proprietário, na qualidade de detentor da totalidade dos direitos, é também o


responsável por todas as despesas associadas à posse e manutenção do
terreno. A entidade que monitoriza a propriedade apenas assegura que as
condições acordadas são mantidas, não tendo qualquer tipo de intervenção na
gestão ou controlo das actividades na área.

Quais as áreas habilitadas aos “conservation easements”?

Os regulamentos do IRS requerem que a propriedade tenha um valor de


preservação significativo, como quem diz florestas, pantanais, habitats de

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espécies em vias de extinção, etc. A tutela possui critérios próprios para aceitar
ou não os acordos, sendo que os terrenos são sempre sujeitos a avaliação
antes da decisão.

4.3 Transferable Water Permits

As licenças transaccionáveis de água permitem traduzir a quantidade total de


água a ser extraída de modo sustentável, mediante um número de direitos
emitidos para os utilizadores da água, possibilitando assim a transferência dos
direitos de toda a água que não usem.

Analisando um caso de estudo de 1997, realizado por Mike Kearney, NZ


Horticultural Economic Service, Nelson Jim Sinner, Resource Consultant,
Nelson, sobre um plano de captação em Oroua, Nova Zelândia, apresentado
ao Ministério do Ambiente, que retrata o conflito entre privados e industria
relativamente à exploração de águas de um rio local, retira-se da criação deste
sistema pontos positivos e negativos tais como:

Algumas vantagens:

• Promove uma maior eficiência do uso da água durante períodos de


menor abundância;
• Sistema menos burocrático, mais autónomo e flexível para os
intervenientes;
• Sistema baseado no historial de cooperação entre equipamentos
existentes, além do potencial na manutenção das relações entre a
comunidade;
• Inclusão de políticas e regras no planeamento de modo a que a
transacção de licenças sejam processos relativamente simples;

Algumas desvantagens:

• Receio que os maiores compradores possam adquirir grande parte das


licenças de água;
• Sistemas que representam desafios administrativos e de monitorização
acrescidos.
• Sazonalidade, dependem das condições disponíveis na época do ano;

5. Gestão de mercados
A gestão de mercados deve ser assegurada por uma entidade reguladora que
tem como funções:

- Realizar a afectação inicial dos direitos em questão;

- Avaliar e aprovar todas as transacções;

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-Assegurar o cumprimento das regras do mercado;

Em Portugal, as SGMs (sociedades gestoras de mercado) estão sujeitas a


registo junto da CMVM (Comissão de Mercado de Valores Mobiliários), cujas
responsabilidades passam pela supervisão das regras de conduta e
prudenciais impostas por lei àquelas sociedades e a regulamentação dos seus
deveres de informação à CMVM e ao público.

A legislação sobre Sociedades Gestoras de Mercados e sobre Mercados


baseia-se em:

• Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 489/99,


de 13 de Novembro;
• Decreto-Lei n.º 394/99, de 13 de Outubro;
• Portaria nº 1429/2001, de 19 de Dezembro;
• Regulamento da CMVM N.º 5/2000;
• Regulamento da CMVM N.º 4/2001:

5.1 Mercado de Concorrência Perfeita


Em condições ideais, os mercados estariam em situação em que não se
verificassem diferenças operacionais e de custo para as empresas, que os
cidadãos estivessem igualmente informados sobre a oferta existente no
mercado, não existiriam barreiras à entrada e saída de empresas e os serviços
e produtos seriam homogéneos.

Empresas e cidadãos seriam, portanto, incapazes de influenciar o preço de


mercado, de resto, perante este caso as empresas enfrentariam uma curva de
procura horizontal, o que não traz incentivos à pratica de diferenças de preço.
Um preço mais elevado resultaria na quebra da procura e consequentes
prejuízos, preços mais reduzidos implicariam incapacidade em suportar os
custos de produção dado que os preços são homogéneos e os consumidores
têm informação perfeita sobre o mercado.

5.2 Oferta/Procura
Em economia, a Lei da Oferta e Procura, é a lei que define a relação entre a
procura de um produto - e a quantidade que é disponível, a oferta. É possível
então descrever o comportamento dos consumidores na aquisição de bens e
serviços, em função de quantidades e preços. Quando a oferta de um
determinado produto é muito superior à procura, o preço tende a diminuir. Em

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períodos nos quais a procura passa é maior que a oferta, a tendência é o preço
aumentar.

Por definição:

- Preço de compra: valor máximo que o utilizador está disposto a pagar,


considerando que o produto
produto tem uma utilidade superior a esse montante;

- Preço de venda: valor mínimo pelo qual o proprietário está disposto a


prescindir dos direitos sobre um bem ou propriedade;

- Procura: Função da utilidade face ao consumo, o utilizador consome até ao


limite em que desvaloriza o produto;

- Oferta: Relação
elação baixo custo de produção/maior
produção/maior rentabilidade, lucro. O
fornecedor diminui os preços quando a quantidade disponível é grande e
aumenta quando esta diminui.

Figura 3 – Gráfico que relaciona oferta, preço e tempo.


temp

5.3 Falhas de Mercado


Quando os mecanismos que regulam o mercado não funcionam, surgem falhas
que produzem resultados negativos economicamente e do ponto de vista
social. São geralmente provocadas pela existência de externalidades, por
agentes económicos icos mal informados,
informados, mercados imperfeitos, existência de
monopólios,
ios, oligopólios e cartéis.
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5.3.1 Externalidades
Por definição, segundo Tietenberg, estamos perante uma externalidade sempre
que o bem estar de um agente não depende só da sua actividade mas também
de uma a actividade controlada por outro agente.

As externalidades serão negativas se gerarem custos a terceiros e positivas, se


pelo contrário, outros agentes beneficiarem com as mesmas. Por norma
compete ao estado estimular as actividades que constituam externalidades
positivas, através de renúncia fiscal ou subsídios e inibir a formação de
externalidades negativas impondo taxas e sanções.

5.3.2 Bem público


Trata-se de um bem acessível a todos os indivíduos que tem como
características principais a não-rivalidade e não-exclusividade.

Por não-rivalidade compreende-se o facto do consumo de um agente não


reduzir o consumo de outro.

A não-exclusividade surge por não existirem possibilidades economicamente


viáveis de excluir algum consumidor que não queira pagar pela utilização de
um bem.

Por não ser possível impedir que quem não pretenda pagar pelo uso destes
bens/serviços o faça, o Estado cobra pela via dos impostos por forma a garantir
todos contribuem.

O fornecimento por privados é mais complicado, na medida em que tendo em


conta a relação custo-benefício, os financiamentos são difíceis de suportar.

5.3.3 Recurso comum


Recursos comuns são bens não-exclusivos mas rivais, ou seja, se por um lado
não é possível excluir quem não tem capacidade para pagar, por outro,
contrariamente aos bens públicos, o consumo de um prejudica o consumo de
um terceiro.

Em 1968, Garret Hardin, designou por tragédia dos comuns o fenómeno de


sobre-exploração dos recursos comuns de forma desordenada e competitiva.
Dado que não se aplicam direitos de propriedade sobre os recursos, não
existem incentivos para um uso equilibrado.

A privatização é uma forma de poder garantir a conservação destes recursos.

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Como exemplos mais frequentes surgem a caça e pesca furtivas, poluição


ambiental.

Figura 4 – gráfico que relaciona produção/ambiente. [apontamentos professor


José Martins 2008]

A análise da figura 4, permite-nos verificar duas situações, uma primeira em


que a produção não afecta os stocks e um segundo caso em que é excedida a
capacidade de regeneração do ambiente, provocando escassez nos stocks, o
que leva a aumento de preços e diminuição da procura.

5.4 Falhas de Governo


Numa economia de mercado os governos têm três funções principais:

- O Aumento da Eficiência;

- A Promoção da Equidade;

- O Estímulo do Crescimento e da Estabilidade Macroeconómicos;

No entanto, resultam algumas falhas como:

• Distorção de mercados bem comportados por taxas, subsídios, quotas,


regulações e empresas estatais ineficientes;
• Não consideração dos efeitos ambientais de outras políticas (agrícola);
• Más intervenções, muitas vezes não fazer nada é a melhor política;

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6. Custos de Transacção/Teorema de Coase


Entende-se por custos de transacção, os custos inerentes às externalidades
numa relação bilateral e surgem, em parte, devido ao facto dos agentes não
disporem de plena informação para tomarem decisões. Em 1985, Williamson
afirmou que “os custos económicos são o equivalente ao atrito nos sistemas
físicos”.

A economia neoclássica defende a não existência de custos de transacção,


mas apenas custos de produção. Por outro lado, a nova economia institucional
aplica o conceito de racionalidade limitada dos agentes económicos que os
leva a despender tempo e recursos para a obtenção de informação, ao que se
junta a capacidade limitada de processar a informação e delinear planos,
considerando ainda que poderão estar implícitos erros que resultarão em
algumas ineficiências nos resultados.

Coase (1995) defendeu a ideia de que caso os custos de transacção não


existissem, os lucros poderiam ser maximizados. George Stigler resumiu essas
ideias no que designou por Teorema de Coase. Na eventualidade de não haver
custos de transacção, o teorema de Coase funcionaria perfeitamente, e os
agentes alcançariam um ponto de equilíbrio considerado óptimo de Pareto.

Por Krognon Regueira: ”A configuração das instituições é decisiva para


determinar em que grau os custos de transacção diferem entre economias.
Espera-se que nos países subdesenvolvidos, cujas leis nem sempre estão bem
definidas, sistemas judiciários lentos e ineficientes, que desrespeitam os
contratos celebrados, os custos de transacção sejam consideravelmente mais
elevados.”

7. Referências Bibliográficas:
CASTRO, E. “Apontamentos de Economia do Ambiente 2008/2009”, SACSJP,
Universidade de Aveiro.

DENTINHO, Tomaz P. “Economia dos Recursos Naturais e Ambientais”,


Universidade dos Açores, Angra do Heroismo (Portugal).

KEARNEY, M. SINNER, Nelson (1997) “Transferable Water Permits: Two Case


Studies of the Issues”, pp 05-13.

MARTINS, J. “Apontamentos de Economia do Ambiente 2008/2009”, SACSJP,


Universidade de Aveiro.

SAMUELSON & NORDHAUS (1993) “Economia”, cap.2.

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SANTOS, R. ANTUNES, P. MATEU, P. BAPTISTA, G. MADRUGA, L. (2003)


“Desenvolvimento de um Sistema de Instrumentos de Política de Ambiente
para o Sector Suinícola de Montemor-o-Novo”, Centro de Economia Ecológica
e Gestão do Ambiente, Departamento de Ciências e Engenharia do Ambiente
Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade Nova de Lisboa, pp 19-24.

SCHAUFFLER, F. (1993), “Conservation Options: A Landowners Guide”.

TIETENBERG, Thomas H (2000) “Environmental and Natural Resource


Economics”, pp 61-68.

CMVM “Sistema de Difusão de Informação: Mercados”

http://www.cmvm.pt/NR/exeres/AF79E64A-140E-4702-8707-
4B06E2D16A91.htm

HANLY-FORDE, J. HOMSY, G LIEBERKNECHT, K. STONE, .R “Transfer of


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http://government.cce.cornell.edu/doc/html/Transfer%20of%20Development%2
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Nunes, P. “Conceito de Concorrência Perfeita”.

http://www.knoow.net/cienceconempr/economia/concorrenciaperfeita.htm

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http://landtrust.org/ProtectingLand/EasementInfo.htm

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http://www.eumed.net/tesis/2008/kwsr/OS%20CUSTOS%20DE%20TRANSAC
AO%20E%20A%20NOVA%20ECONOMIA%20INSTITUCIONAL.htm

REGUEIRA, K. “Os direitos de propriedade e os recursos naturais: um paralelo


com a questão urbana”.
http://www.eumed.net/tesis/2008/kwsr/Os%20direitos%20de%20propriedade%
20e%20os%20recursos%20naturais.htm

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