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O livro foi lançado em 1989 com o título One up on Wall Street, que numa
tradução livre seria algo como “Um olhar sobre Wall Street” – referente à
rua onde fica a Bolsa de Nova York, a principal do mundo. O título no Brasil
(O jeito Peter Lynch de investir) cria uma relação artificial com O jeito
Warren Buffett de investir (The Warren Buffett way,
https://amzn.to/3oepJoE), que não foi escrito pelo acionista majoritário da
Berkshire Hathaway, mas por um de seus incontáveis admiradores: Robert
Hagstrom. Idiossincrasias do mercado editorial brasileiro.
A edição brasileira do livro de Lynch e Rothchild já traz um texto de
apresentação – escrito pelos autores em 2000 – que por si só vale como
lição e registro histórico. Nele, Lynch expressa sua preocupação com a
relação entre preços e lucros por ações (P/L) das empresas do segmento
pontocom. Ao se referir ao investidor havia pago 500 vezes os lucros pelas
ações da Electronic Data Systems, Lynch lembra que ele “teria levado cinco
séculos para retornar seu investimento, caso os lucros da EDS se
mantivessem constantes”. Se um P/L de 50 vezes já assustava um
investidor precavido, o que dizer de um P/L dez vezes maior?
Aqui resulta um dos desafios com relação à leitura do livro por parte de
quem vive a realidade brasileira, muito distinta daquela do mercado
financeiro dos Estados Unidos. No Brasil, temos apenas uma bolsa de
valores com um número reduzido de empresas de capital aberto. Disso
resulta que não temos exemplos frequentes de companhias cujas ações se
multiplicam várias vezes e rapidamente, em questão de poucos anos.
O investidor amador que fizer isso, segundo Lynch, poderá ter vantagens
para descobrir futuros casos de sucesso de empresas promissoras que
estão fora do radar, ao passo que analistas profissionais têm mais
dificuldades nesse sentido. Afinal, eles estão engessados por uma rotina
em escritório distante da realidade das ruas, com suas regras e fórmulas
para interpretar os fundamentos das ações que a maioria de sua classe já
está cobrindo.
De acordo com Lynch, “os retornos de longo prazo em ações são tanto
relativamente previsíveis quanto muito superiores aos retornos de longo
prazo dos títulos públicos”.
Essa afirmação faz mais sentido para o leitor brasileiro da segunda década
do século 21 do que para aquele que teve acesso ao livro até o fim dos
anos 1990, quando o Brasil ainda era o paraíso da renda fixa. Felizmente, a
economia brasileira vem se desenvolvendo – mesmo que lentamente – no
sentido de premiar os adeptos da renda variável, com reflexos positivos no
mercado como um todo.
A gente concorda.
Aos 38 anos de idade, embora já com uma carreira bem consolidada, Lynch
estava preocupado com a conjuntura do mercado de 1982, ano em que
daria entrada na aquisição da casa própria – o que ele defende claramente
como condição básica para alguém investir na bolsa, como constituição de
uma reserva de patrimônio. Sem ela, não seria recomendável alocar todo o
capital disponível em ações.
Em seu livro de estreia, Lynch conta sobre seus primeiros anos de vida,
sobre os lugares onde estudou e sobre a boa formação que teve nas áreas
de História, Psicologia e Filosofia. Contrariando a frieza típica que
associamos aos grandes investidores de Wall Street, Lynch não esconde a
sua fé católica, chegando a reservar linhas de agradecimento ao padre que
o aconselhou nos anos de Boston College – e que posteriormente batizou
seus três filhos.
Sem ter vivido uma infância abonada – seu pai faleceu quando ele ainda
tinha apenas dez anos de idade –, Lynch teve contato com os
investimentos em renda variável ainda na adolescência, valendo-se de seus
ouvidos atentos às conversas que jogadores de golfe (e acionistas
experientes) tinham enquanto ele carregava tacos em um clube de sua
cidade.