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Conceitos e Controvérsia 

        

Sugestões e perguntas devem ser enviadas a


Que são grandezas proporcionais? Elon Lages Lima
Instituto de Matemática Pura e Aplicada
Estrada Dona Castorina, 110
  22460 Rio de Janeiro, RJ

Em seus dois últimos artigos para a RPM, o Professor Geraldo Ávila discute o conceito de grandezas proporcionais e ilustra
seus pontos de vista com exemplos e comentários interessantes. No todo, sua contribuição é positiva no sentido de
esclarecer um tipo de problema tradicional, que ocorre com freqüência no ensino da Matemática, nas suas aplicações às
outras Ciências e mesmo na vida prática.

O ponto crucial da questão se situa na definição precisa de “grandezas proporcionais”. Uma vez entendido com bastante
clareza este conceito, todos os problemas relativos a regra de três e proporções se resolvem naturalmente, sem haver
necessidade de regras mnemônicas ou quaisquer outros artifícios, como foi tão bem colocado nos artigos anteriormente
citados.

A definição dada deve ser simples e de fácil utilização. Noutras palavras, ela deve permitir que se reconheça, num
problema proposto, sem grande dificuldade, se uma determinada grandeza é (ou não) direta ou inversamente proporcional
a outras. A definição do Professor Ávila, embora irretocável do ponto de vista matemático, a meu ver, deixa a desejar sob o
aspecto de aplicabilidade. Para maior clareza, transcrevemos literalmente abaixo a definição por ele dada (RPM 8, p. 3 –
Definição 3) :

“Se várias variáveis, digamos, x, y, z, w, r, s estão relacionadas por uma equação do tipo z=k.xyw/rs, onde k é constante,
então dizemos que z é diretamente proporcional a x, y e w; e inversamente proporcional a r e s.”

A dificuldade desta definição na resolução de problemas é a seguinte: para saber (segundo ela) que uma grandeza z é
diretamente proporcional a x, y, w e inversamente proporcional a r, s, é necessário primeiro conhecer-se a fórmula z = k .
xyw/rs. Ora, em primeiro lugar esta fórmula não é dada no enunciado do problema. É preciso deduzi-la. Em segundo lugar,
para deduzi-la é preciso saber propriedades das grandezas em questão, propriedades essas que encerram a verdadeira
essência da proporcionalidade. E, em terceiro lugar, se já estamos de posse desta fórmula, pouco importa saber de
proporcionalidade; a fórmula contém todas as informações que venham a ser solicitadas.

No meu entendimento, definir grandezas proporcionais a partir da fórmula acima é pôr o carro adiante dos bois. A fórmula
é o resultado final. Não começa aí a solução do problema. Ela não aparece no enunciado. No começo da resolução é preciso
identificar, por um critério simples, a proporcionalidade (direta para algumas grandezas, inversa para outras). A partir daí
é que se pode garantir a validez da fórmula.

Se examinarmos as soluções dos problemas apresentados como exemplos no trabalho acima citado, veremos que a fórmula
usada para definir proporcionalidade aparece sem maiores justificações. E teria de ser assim pois, como já dissemos, só se
pode chegar a ela utilizando propriedades das grandezas que exprimam as proporcionalidades alegadas.

E qual é, então, esta definição adequada de grandezas (direta ou inversamente) proporcionais?

É a seguinte:

Suponhamos que uma grandeza z dependa de várias outras: x, y, w etc. Isto significa que o valor de z fica determinado
quando se conhecem os valores de x, y, w etc. Nesta situação, diz-se que z é uma função das variáveis x, y, w etc. e escreve-se
z = f(x,y,w, ...).

Nas condições acima, diz-se que z é diretamente proporcional a x quando, ao multiplicarmos x por uma constante c
(mantendo fixas as outras variáveis), o valor correspondente de z fica multiplicado pela mesma constante c.
Analogamente, diz-se que z é inversamente proporcional a x quando, ao multiplicarmos x por uma constante c
(mantendo fixas as outras variáveis), o valor correspondente de z fica dividido por aquela constante c. (Definições
semelhantes para as demais variáveis y, w etc.)  

Por exemplo, a área A de um retângulo é função da base b e da altura h Se multiplicarmos a base por uma constante c (e
mantivermos a altura fixa), a área fica multiplicada por c. Logo, a área A é diretamente proporcional à base b. Neste ponto,
alguém poderia alegar que, sendo a área do retângulo expressa pela fórmula A = bh, a proporcionalidade resulta daí.
Argumento enganoso. Para chegar a esta fórmula, é necessário passar pela etapa preliminar que consiste em verificar a
afirmação anterior. Já Euclides (que estudava as áreas das figuras planas sem jamais utilizar fórmulas) dizia assim: “as
áreas de dois retângulos com a mesma altura estão entre si como suas bases”. Isto significa, em nossa terminologia, que a
área do retângulo é diretamente proporcional à sua base. Uma afirmação análoga vale, evidentemente, para a altura.

Outro exemplo: o tempo gasto para ir de um ponto A a um ponto B, em linha reta, com velocidade constante v, é
inversamente proporcional a essa velocidade. Com efeito, se dobrarmos a velocidade, o tempo se reduzirá à metade; se
triplicarmos a velocidade o tempo ficará dividido por três, e assim por diante: se a velocidade em vez de v fosse cv, o tempo,
em vez de t seria t/c.

O último exemplo sugere o seguinte: para verificar que uma grandeza z = f(x, y, w, ...) é diretamente proporcional à variável
x, talvez não seja preciso verificar a alteração que z sofre quando se substitui x por cx, onde c é uma constante arbitrária,
isto é, um número real qualquer. (Para simplificar nosso raciocínio, vamos restringir-nos a problemas onde as variáveis
assumem apenas valores positivos.)
Em quase todos os problemas que ocorrem naturalmente, a grandeza z depende continuamente das variáveis x, y, w etc.
Isto quer dizer que pequenas perturbações nessas variáveis provocam pequenas alterações em z. Neste caso, aquilo que
suspeitávamos acontece:

(*) Para constatar que z é diretamente (ou inversamente) proporcional a x, basta verificar que, substituindo-se x por nx, ONDE
n É UM NÚMERO NATURAL, z fica substituído por nz (ou por z/n).

Para não perder o fio da meada, deixamos a demonstração deste fato para o fim desta nota.

A observação (*) acima simplifica grandemente o trabalho de verificar a proporcionalidade. Por exemplo, um retângulo de
altura h e base n b, onde n é um número natural, é formado pela justaposição de n retângulos, todos de base b e altura h,
logo sua área é n vezes a área de um retângulo de base b e altura h. Portanto é trivial concluir que a área do retângulo é
diretamente proporcional à base (e, do mesmo modo, à altura). Método análogo se aplica ao exemplo da velocidade, que
demos acima. Aliás foi isto que fizemos.

A partir da definição que demos, provaremos o seguinte

Teorema. Se uma grandeza z = f(x, y, r, s) é diretamente proporcional a x, y e inversamente proporcional a r, s então existe
uma constante k tal que z = kxy/rs. A constante k chama-se coeficiente de proporcionalidade.

Demonstração: Seja k = f(l, 1, 1, 1) o valor assumido por f quando se toma x = y = r = s = 1. Observando-se que x = x . 1, y = y .
1, r = r . 1 e s = s . 1, a definição de grandezas direta e inversamente proporcionais nos fornece sucessivamente

Observação. A recíproca do teorema acima também é válida: se existe uma constante k tal que z = k . xy/rs, então resulta
imediatamente da nossa definição que z é diretamente proporcional a x, y e inversamente proporcional a r e s. Isto mostra
que, do ponto de vista estritamente matemático, a definição dada pelo Prof. Ávila é equivalente à que proponho. Minha
discordância situa-se no nível metodológico. Estou de acordo com quase, tudo o que ele diz. Inclusive, apoio plenamente
sua opinião de que o fundamental é ter-se uma fórmula do tipo z = k . xy/rs e tudo o mais decorre daí, sem artifícios,
tabelinhas ou truques. Mas acho que existe um passo crucial anterior à fórmula. Os argumentos que apresento nesta nota
têm a dupla finalidade de chamar atenção para isto e esclarecer muitos outros aspectos desta importante noção
matemática.

Vejamos o Problema 2 do trabalho do Professor Ávila (RPM 8, p. 4). O número D de dias necessários para produzir P peças
em M máquinas que trabalham H horas por dia é diretamente proporcional a P porque para dobrar, triplicar, quadruplicar
etc. o número de peças produzidas é necessário dobrar, triplicar etc. o número de dias de trabalho (supondo,
evidentemente, M e H fixos). Por outro lado, se dobrarmos, triplicarmos etc. o número M de máquinas, o número de dias
(necessários para produzir as P peças, trabalhando H horas por dia) fica reduzido à metade, a um terço etc. Logo, D é
inversamente proporcional a M. Analogamente se verifica que D é inversamente proporcional a H. Feitas estas simples 
constatações, se chamarmos de  k o número de dias necessários para produzir uma só peça, usando uma única máquina e
trabalhando apenas uma hora por dia, resulta do teorema acima demonstrado que

Desta fórmula retira-se qualquer informação que se deseje sobre o assunto. (Note que nosso k não é o mesmo do artigo
citado.)

Nos seus artigos, além de mostrar que regras e nomes específicos para estes problemas são resquícios históricos já
superados pelo desenvolvimento da Aritmética e da Álgebra, o Professor Ávila, muito apropriadamente, também chama a
atenção do leitor para o erro comum que consiste em confundir “função monótona” com “função linear”.

Se z depende de x e se, quando aumentamos x, z também aumenta, então dizemos que z é uma função (monótona)
crescente de x. Mas isto não significa que z tenha que ser diretamente proporcional a x. Analogamente, se sabemos que z
decresce quando x aumenta, não temos o direito de concluir por causa disto que z seja inversamente proporcional a x.
Podemos apenas dizer que z é uma função (monótona) decrescente de x.

A lei da atração universal (Newton) diz que “a matéria atrai a matéria na razão direta das massas e na razão inversa do
quadrado da distância”. Isto significa que se F é a força de atração (gravitacional) entre dois corpos, um com massa m e
outro com massa m’, situados a uma distância d um do outro, então, em primeiro lugar, F é diretamente proporcional a m e
m’. Além disso, F decresce quando a distância d aumenta. Se dobrarmos a distância d, a força F fica dividida por 4. Mais
geralmente, se multiplicarmos d por uma constante c, F fica dividida por c2. Por isso, F é inversamente proporcional a d2.
Resulta, então, do teorema acima que F = k . mm’/d2, onde a constante k depende do sistema de unidades utilizado para
medir as massas e a distância.

Noutro exemplo, podemos considerar o tempo t que uma pedra leva para atingir o solo ao cair de uma altura h.
Evidentemente, t é uma função crescente de h: quanto maior a altura, mais demora a pedra a chegar no chão, mas se nos
dispusermos, como Galileu, a fazer uma série de experiências com alturas h, 2h, 3h etc., veremos que os tempos
correspondentes são t, ,  etc., e concluiremos que t não é diretamente proporcional a h e sim a . Assim, se um
prédio é 9 vezes mais alto do que outro, uma pedra que caia do seu topo leva apenas 3 vezes mais tempo para chegar ao
solo do que se tivesse caído do prédio menor. A fórmula neste caso é t =  k , onde a constante k está relacionada com a
aceleração da gravidade.

Voltando a Euclides, ele diz também que “as áreas de dois círculos estão entre si como os quadrados dos seus raios”. Em
nossa terminologia, isto significa que a área do círculo é diretamente proporcional ao quadrado do raio. Do teorema acima
resulta então que se r é o raio do círculo e A a sua área, então A = k . r2, onde  é a área de um círculo de raio 1. Como se
sabe, tem-se k = p, logo A = pr2. Mas Euclides nunca deduzia fórmulas para as áreas porque isto exigiria usar números reais
como resultados das medidas e a Matemática Grega de sua época não conhecia os números reais. Em vez de números,
usavam-se “razões entre duas grandezas”. Por isso o enunciado euclidiano que acabamos de reproduzir era o estágio final
da discussão do problema da área do círculo. A esta altura convém reler os artigos do Professor Ávila, bem como o livro
“Episódios da História Antiga da Matemática”, de A. Aaboe.

Os exemplos acima exibem situações em que uma grandeza z é função monótona crescente (ou decrescente) de uma
variável x, sem que se tenha z diretamente (ou inversamente) proporcional a x. Entretanto, nesses exemplos, z é
diretamente ou inversamente proporcional a alguma potência de x (x2,  etc.). Para que não se faça um juízo equivocado
da questão, parece-nos de bom alvitre encerrar estas considerações com um exemplo bastante relevante, no qual uma
grandeza z é função crescente de três variáveis x, y, w, sendo diretamente proporcional a y mas não a potência alguma x ou
w.

Seja z o capital que se obtém depois de x anos, quando se investe uma quantia y à taxa de w por cento ao ano (juros
compostos). Evidentemente, z = f(x, y, w) é função crescente de cada uma dessas três variáveis. Em relação à variável y
(capital inicial) temos

f(x,n y, w) = n . f(x, y, w)

porque, evidentemente, n pacotes iguais com a mesma quantia y devem produzir o mesmo rendimento que um pacote
único com ny cruzados. Logo, z é diretamente proporcional ao capital inicial y. Já em relação às outras variáveis, o mesmo
não acontece. Vejamos, por exemplo, o número x de anos. Temos

f(2x,n y, w) > 2  . f(x, y, w)

porque, ao empregarmos o mesmo capital y durante 2x anos (à mesma taxa de juros w), nos últimos x anos o rendimento é
maior porque corresponde a um capital já cresceu em relação ao inicial. Se estudarmos a questão cuidadosamente,
veremos que, na realidade, tem-se  f(nx, y, w) =   f(x, y, w)n. Isto caracteriza o que se chama crescimento exponencial. A
fórmula que exprime z como função de x, y e w é z = y . exw. (Veja meu livro “Logaritmos”, publicado pela SBM, p. 105.) Daí
resulta que z não é proporcional a potência alguma de x ou de w.

Para encerrar, provaremos o resultado (*) que foi enunciado acima. Ali temos uma grandeza z = f(x, y, ...), que é função das
variáveis x, y, ... Sabemos que se substituirmos x por nx, onde n é um número  inteiro,  o valor  correspondente  de  z  fica
alterado para nz. Isto equivale a dizer que 
f(nx, y, ...) = n . f(x, y, ...) quando n é inteiro. Como as demais variáveis y, ... não vão entrar nesta discussão, nossa escrita
ficará grandemente simplificada se escrevermos apenas z = (x) e então teremos (nx) = n . (x) quando n é inteiro.
Queremos, a partir daí, provar que (rx) = r . (x) quando r = p/q é um número racional. Isto se faz assim:

logo

Mas nosso objetivo é mais amplo. Queremos provar que (cx) = c . (x) para qualquer número real c, racional ou irracional.
Para provar esta igualdade no caso de c irracional teremos de usar a noção de limite e a hipótese de que é contínua.
Assim, podemos escrever  c = lim rn, onde (rn) é uma seqüência de números racionais.

Conforme acabamos de provar, tem-se (rn . x) = rn . (x), para todo n.

Logo,

(cx) = (lim rn . x) = lim (rnx) = lim rn . (x) = c . (x).

A passagem correspondente ao segundo sinal de igualdade se justifica por causa da continuidade da função .

Observação: São muitas as situações, principalmente em Geometria, nas quais se tem uma função que cumpre a condição
(nx) = n . (x) para n inteiro. Daí resulta imediatamente, como vimos acima, que (rx) = r  . (x) para  r racional. Se
soubermos que é contínua, concluiremos que  (cx) = c  .  (x) para c irracional também (ainda visto acima). Mas às vezes
não é fácil provar diretamente que é contínua. Existe outro tipo de hipótese que permite a mesma conclusão, com a
vantagem de ser mais fácil de constatar. É a monotonicidade de . Se soubermos que x < x’ implica (x) < (x’), então de
(nx) = n . (x) para n inteiro, passaremos para (rx) = r . (x) com r racional como acima e, em seguida, para (cx) = c . (x)
com c irracional, do modo seguinte. Suponhamos, por absurdo, que fosse (cx) < c . (x). Então tomaríamos um número
racional r < c tão próximo de c que tivéssemos

(cx) < ‘r . (x) < c . (x).

Daí viria (cx) < (rx) < c . (x), o que é uma contradição, pois r < c acarreta rx < cx e daí 
(rx) < (cx). De modo semelhante, vemos que (cx) > c . (x) também levaria a uma contradição. Conseqüentemente, deve
ser (cx) = c . (x).
Por exemplo, vimos que, se n é um número natural, a área de um retângulo de base nb e altura h é igual a n vezes a área de
um retângulo de base b e altura h. Além disso, é claro que se b < b’, então a área de um retângulo de base b e altura h é
menor do que a área de um retângulo de base b’ e mesma altura.

Segue-se, portanto, do que foi provado acima que para qualquer número real positivo c, a área de um retângulo de base cb e
altura h é c vezes a área de um retângulo de base b e altura h.

O princípio contido na observação anterior é de fundamental importância nas questões de proporcionalidade em


Geometria. Um grande número dessas questões se baseia no Teorema de Tales, cujo enunciado clássico é o seguinte: “Se um
feixe de paralelas é cortado por duas secantes, os segmentos determinados pelas paralelas sobre as secantes são
proporcionais.”

Em linguagem atual, isto se exprime assim: duas retas quaisquer r e r’ (as


“secantes” do enunciado) cortam uma terceira nos pontos A e A’ respectivamente.
(O “feixe” significa todas as retas paralelas a AA’.) Para cada ponto X da reta r
traçamos uma paralela a AA’, que corta a reta r’ no ponto X’. O Teorema de Tales
afirma que o comprimento de A’X’ é proporcional ao comprimento de AX.

Se fôssemos depender de conhecermos primeiro uma fórmula do tipo A’X’ = kAX para
podermos afirmar então que A’X’ é proporcional a AX, estaríamos em dificuldades. Mas, se
usarmos a nossa definição de proporcionalidade, como é claro que AX < AY implica A’X’ < A’Y’,
basta provar que AX = n . AZ implica A’X’ = n . A’Z’, para todo número natural n, o que se faz muito facilmente com
“igualdade de triângulos” (v. RPM 7, p. 7).
Agora sim. Sabendo que A’X’ é proporcional a AX (ou  seja, sabendo que AX=n . AZ implica A’X’  = n . A’Z’) podemos afirmar
que existe um número real k tal que A’X’ = k . AX  para todo X   na reta r. Que número k é este? É simplesmente a razão
A’X’/AX, ou seja, o quociente da divisão do comprimento A’X’ pelo comprimento AX. Não importa qual o X tomado,  o
resultado é sempre o mesmo k. Nisto reside precisamente a proporcionalidade.
Finalmente, achamos oportuno dar mais um esclarecimento sobre o assunto.
Ao aplicarmos um modelo matemático para analisar uma situação concreta, convém ter sempre em mente os limites da
validez do modelo. Em particular, quando afirmarmos que uma grandeza z é diretamente proporcional a outra x, devemos
deixar claro (ou, pelo menos, subentendido) que isto se dá dentro de certos limites da variação para z e x.
Por exemplo, a “lei de Hooke” diz que a deformação sofrida por um corpo elástico (digamos, uma mola) é diretamente
proporcional à (intensidade da) força empregada. A fórmula matemática que exprime este fato é d = k . F . (d = deformação,
F = intensidade da força, k = coeficiente de elasticidade da mola.) Esta equação é um modelo matemático para representar o
fenômeno. Este modelo é sujeito a restrições evidentes. A força F não pode ser muito pequena porque então, mesmo
positiva, não seria suficiente para deslocar a mola. Noutras palavras, se F for pequena, tem-se d  = 0 com F   > 0, logo não
vale o modelo d = k . F. Também não se pode tomar F  muito grande porque a mola então arrebentaria.
Outro exemplo é o clássico problema de operários construindo uma casa. Em geral, supõe-se que o tempo necessário para
isto é inversamente proporcional ao número de operários. Se tal fosse verdadeiro sem restrições então, empregando-se um
número suficientemente grande de operários, poder-se-ia construir uma casa num tempo arbitrariamente pequeno: um
segundo, por exemplo. Mas não é bem assim. Um número exagerado de operários vai trazer confusão e, conseqüentemente,
casa nenhuma se construirá.
É conveniente que o professor, ao ensinar este tópico, alerte os alunos sobre tais cuidados, deixando bem claro que as
conclusões obtidas pressupõem uma hipótese subjacente: a de que o modelo matemático se aplica à situação estudada.
Nem sempre o modelo da proporcionalidade é o mais adequado. Em certas situações econômicas, por exemplo, vale o
“princípio dos retornos descrentes”, segundo o qual, se aumentarmos muito os investimentos, os lucros adicionais
crescerão cada vez menos. Como ilustração: se, num certo terreno, plantarmos o dobro de sementes, poderemos dobrar a
colheita, mas, se continuarmos dobrando, ano a ano, o que plantamos, não é razoável esperar que dobrem sempre as
colheitas. A partir de um certo ponto, começa-se a notar a lei dos retornos decrescentes. A mesma situação ocorre em
fisiologia: quando aumenta o estímulo, aumenta a sensação, mas, depois de um certo ponto, o acréscimo das sensação é
cada vez menor em relação ao acréscimo do estímulo.
Uma situação oposta ocorre com o imposto de renda que pagamos. A renda líquida do contribuinte é classificada em
intervalos, chamados “faixas”. Em cada faixa, o imposto a pagar é proporcional à renda líquida. Mas o coeficiente de
proporcionalidade varia de uma faixa a outra; na realidade, cresce quando se passa de uma faixa de renda a outra maior.
Uma atividade interessante (e extremamente educativa) consiste esboçar o gráfico da função y = f(x) nas situações que
examinamos acima. No caso de y ser diretamente proporcional a x, temos y = k .x. Quando y é inversamente proporcional a
x, temos y = k/x. No primeiro caso, o gráfico é uma reta e no segundo é uma hipérbole.

Numa situação de “retornos decrescentes” temos y = f(x) onde f é uma função “côncava”; embora crescente, cresce cada vez
mais lentamente. No caso do imposto de renda, o gráfico é formado por uma poligonal que se torna cada vez mais próxima
da vertical. Aqui, tem-se uma função convexa.
Curiosidade matemática
Em visita à minha cidade natal, no interior de Minas Gerais, contou-me um amigo, Professor Roberto Bianchi, que
estava se distraindo com uma calculadora eletrônica, quando se deparou com um fato interessante.
As dízimas periódicas de geratrizes com denominador 7 possuem, em cada período, os mesmos algarismos: 1, 4, 2, 8, 5,
e 7, nessa mesma ordem, conforme passamos a mostrar abaixo, através das setas:
É possível a existência de outro exemplo análogo?
(enviado por Joel Faria de Abreu, Brasília, DF)
A colega Terezinha Vânia Chassot, Montenegro, RS, conta-nos mais fatos curiosos sobr o número 142.857:
Multipliquemo-lo por 2. O produto é 285714. Os algarismos permanecem os mesmos, só a ordem sofre pequena
alteração. O mesmo ocorre com:
142857 x 3 = 42857 1; 142857 x 4 = 57 1428; 142857 x 5 = 7 14285;
142857 x 6 = 857 142; 142857 x 7 = 999999.
Efetuando 142857 x 8 obtemos 1 14285 6 – todos os algarismos aparecem, com exceção do 7. Este foi decomposto em
duas partes: 6 e 1.
Efetuando 142857 x 9 obtemos 1 2857 13 – todos os algarismos aparecem, com exceção do 4. Este foi decomposto em
duas partes: 3 e 1.
E há mais...

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