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Governo Federal
Secretaria de Assuntos Estratégicos
da Presidência da República
MINISTRO S amuel Pinheiro Guimarães
Impressão
Gráfica Art Printer
Daniel Castro, diretor geral da
revista Desafios do Desenvolvimento
Seções Artigos
6 Entrevista Pag 20 Política Nacional de Patrimônio Cultural: Patrimônio, 50
desenvolvimento e cidadania
14 Patrimônios Luiz Fernando de Almeida
Mundiais
Pag 21 Patrimônio Arqueológico em evidência
65 Perfil Maria Clara Migliacio
70 Indicadores Pag 25 A chancela da Paisagem Cultural: uma estratégia para o futuro
Maria Regina Weissheimer
74 Humanizando o
desenvolvimento Pag 45 A política federal salvaguarda do patrimônio cultural imaterial
Marcia Sant’Anna
Pag 54 O Iphan e seus horizontes
Dalmo Vieira Filho
Pag 63 Patrimônio cultural e desenvolvimento regional
George Alex da Guia
Pag 64 O patrimônio histórico e o Estatuto da Cidade
Carolina Bayma Cavalcanti
66
EntrEvista
Jurema Machado
“No Brasil as
relações entre cultura
e desenvolvimento são
desafiadoras”
Cora Dias – de Brasília
A
Constituição Federal de 1988 refere-se ao direito à cultura, um direito de todo cidadão
brasileiro, da seguinte forma: “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos
culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a
difusão das manifestações culturais”.
17
na Lista da Organização das Nações Unidas apresentando novas candidaturas, seja não
para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), participando ativamente das discussões,
dos quais dez são culturais e sete, naturais. essa ausência é reclamada. Ou seja, já era
A 34ª reunião do Comitê do Patrimônio tempo. O governo brasileiro foi eleito
Mundial, que será realizada entre os dias
25 de julho e três de agosto, terá o Brasil
patrimônios para presidir o Comitê do Patrimônio
Mundial e se dispôs a receber a reunião,
como sede pela segunda vez, evidenciando brasileiros estão registrados na Lista o que acontece em boa hora.
a importância do país, caracterizado por sua da Organização das Nações Unidas para
riqueza em expressões culturais. Educação, Ciência e Cultura (Unesco) Desafios - O que faz um bem ser detentor de excepcional
Para a coordenadora de Cultura da interesse, que exija a sua preservação enquanto patrimônio
Unesco (Organização das Nações Unidas cultural e natural da humanidade? Existe um padrão para
para a Educação, Ciência e Cultura) no Brasil, esses bens?
Jurema Machado, o direito à cultura vem foco privilegiado da aplicação de várias Jurema - A seleção de bens Patrimônio
como consequência de um leque de políticas das Convenções, em especial as do Patri- Mundial se baseia na presunção de existência
sociais, como o acesso à renda, à educação, mônio Mundial (1972), do Patrimônio de um valor universal excepcional, que seria
à moradia digna, à informação. Cultural Imaterial (2003) e, a mais recente o patrimônio comum da Humanidade,
Em entrevista exclusiva, por email, para a delas, a da Diversidade Cultural (2005), capaz de justificar os esforços conjuntos
Desafios do Desenvolvimento, Jurema destaca porque aqui as relações entre cultura e dos países para a sua proteção. Esse é,
o desenvolvimento de políticas culturais no desenvolvimento são particularmente sem dúvida, um conceito complexo, que
Brasil, fala sobre quais os passos para que um desafiadoras, ou seja, ao lado da riqueza merece atualizações em direção a um
patrimônio nacional entre para a Lista de Patri- das expressões culturais está, especialmente melhor reconhecimento da diversidade
mônio Mundial da Unesco, e analisa a relação nos últimos anos, um processo acelerado das culturas e da natureza, especialmente
cultural de países da América Latina. de desenvolvimento e de transformações no caso dos países em desenvolvimento. O
e ainda há muitos desafios que resultam texto da Convenção explicita de maneira
Desafios - Qual a importância da reunião do Comitê do da desigualdade social. mais concreta onde deve ser buscado esse
Patrimônio Mundial da Unesco ser realizada no Brasil? O Brasil sediou um encontro como esse valor universal, mas essa sempre será,
Jurema - O Brasil é um país muito apenas uma vez, em 1988. Essa é uma por mais cientificamente rigorosos que
importante para a implementação do reunião importantíssima, principal possam ser os dossiês de candidaturas,
mandato Unesco, especialmente na área instância decisória da Convenção de 1972. uma escolha culturalmente construída
da cultura. Podemos dizer que o país é Quando o Brasil se ausenta do debate e, portanto, passível de grandes debates.
Assim como são os tombamentos, por
isso requerem estudos, debates, conselhos
representativos e decisão posterior do
Desafios - Você acha que a história e a diversidade uma melhor representação da diversidade de um leque de políticas sociais, envolvendo
cultural brasileira estão satisfatoriamente representadas do país. Por exemplo, na última reunião o acesso à renda, à educação, à moradia
no rol de bens tombados e registrados pelo Iphan? Se não, do Conselho Consultivo, em 24 de junho digna, à informação. Isso não significa
o que ainda falta? passado, foram tombados sítios sagrados que a cultura esteja apenas a reboque
Jurema - É verdade que a política de para as comunidades indígenas Sagihengu das demais políticas e que nada possa ser
patrimônio no Brasil privilegiou, por e Kamukuwaká do Alto-Xingu, no Mato feito. O mais eficaz, e é o que tenho visto
décadas, o acervo monumental e de Grosso, e 14 bens culturais, vestígios da nas iniciativas do Ministério da Cultura, é
origem europeia, inclusive aquele que o colonização de imigrantes japoneses no orquestrar esse conjunto de ações, trabalhar
país optou por apresentar majoritaria- litoral paulista. Ou seja, algo impensável junto, trabalhar com programas culturais
mente à Lista da Unesco. Esse perfil só há algum tempo atrás. consistentes e que tenham continuidade,
começa a ser alterado, tanto fora quanto porque essa é, indiscutivelmente, uma
dentro do país, a partir de mudanças da Desafios - O art. 215 da Constituição Brasileira declara construção lenta, para a qual se exige
Historiografia, valorizando os processos que o estado brasileiro tem o dever de garantir a todos o determinação e persistência
frente à história factual, valorizando as pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes
perspectivas dos diferentes atores, a história de cultura nacional. O que os países deveriam fazer para Desafios - Recentemente foi divulgada a candidatura da
do cotidiano, das ideias, dos comporta- incentivar a valorização e a difusão das manifestações cidade do Rio de Janeiro como Paisagem Cultural da Huma-
mentos. Essas mudanças vêm implicando culturais? Quais são as principais conquistas e os desafios nidade. Quais os conceitos e impactos de tal reconhecimento
no reconhecimento do vernacular, do nessa área no Brasil? para a cidade? Qual a diferença entre Paisagem Cultural
não-monumental, das representações Jurema - Quando se fala em acesso e em sítios históricos e Centros Históricos chancelados como
das culturas tradicionais, da relação possibilidades de expressão, está envolvido Patrimônio Mundial?
entre patrimônio natural e cultural etc. um conjunto de condições sociais que Jurema - Para o Rio de Janeiro foi prepa-
Os tombamentos do Iphan nos últimos extrapolam o âmbito exclusivo das políticas rado um belíssimo dossiê, a começar pela
anos representam uma mudança radical culturais. Ou seja, essa é uma tarefa difícil orquestração dos atores envolvidos, ou seja,
no perfil dos bens tombados em direção a e seus resultados virão como consequência uma cooperação do Iphan, do ICMBio,
Do mundo para
o mundo
Cora Dias – de Brasília
Stock
Paul
Da esquerda para a direita: acima, Parque Nacional de Pirin (Bulgária); abaixo, relevo de Danxia (China); à direita, Cordilheira Pamir (tajiquistão).
Hoje a Unesco possui 890 patrimônios perigo, e deve ainda adicionar sítios cuja
mundiais em sua lista – 689 culturais, 176 preservação exija atenção especial. Essa lista,
naturais e 25 considerados um mistura das temida por Estados-parte, inclui sítios com
35
duas categorias – de 148 Estados-parte da diversos problemas como poluição, turismo
Organização. Anualmente, o Comitê do Patri- mal gerenciado, guerra e desastres naturais,
mônio Mundial, formado por representantes situações que têm impacto negativo nos
de 21 Estados-parte, reúne-se para decidir pontos e valores pelos quais esses patrimônios
quais novos sítios, como são chamados entraram para a lista da Unesco. Países em
países os locais a serem declarados patrimônios
da humanidade, entrarão para a lista da
guerra, como o Afeganistão e a República
Democrática do Congo, estão com os seus
apresentarão suas propriedades Unesco e o estado de conservação da Lista patrimônios em perigo, assim como a cidade
candidatas a Patrimônio Mundial, para dos Patrimônios Mundiais considerados em de Jerusalém. O Comitê do Patrimônio
a aprovação da Unesco.
perigo pela Organização. Mundial supervisiona a distribuição de mais
Na reunião em Brasília o Comitê também de US$ 4 milhões do Fundo do Patrimônio
deve reavaliar o estado de 31 propriedades Mundial, criado, entre outros propósitos,
que estão na lista dos patrimônios em para ações de emergência, treinamentos de
o Comitê também deve ração internacional para criar salvaguardas (Ibama), para os sítios naturais.
dos patrimônios da humanidade. Com Com o objetivo de destacar a riqueza cultural
reavaliar o estado de 31
187 Estados-parte, a Convenção é um dos e a beleza natural do Brasil, que refletem a
propriedades que estão na instrumentos legais com maior ratificação grande diversidade do país, a Desafios do
lista dos patrimônios em internacional. Cada parte compromete-se a Desenvolvimento traz nesta edição especial
perigo, e deve ainda adicionar identificar sítios com potencial de inscrição na todas as matérias dedicadas ao tema dos patri-
sítios cuja preservação exija Lista, bem como a preservar os Patrimônios mônios brasileiros, publicadas entre maio de
atenção especial Mundiais, da mesma forma que preserva as 2009 e maio de 2010, comemorando um ano
propriedades nacionais e regionais. No Brasil, da Seção Retratos. São tradições, monumentos
especialistas, e para encorajar cooperação os órgãos responsáveis por fazer essa avaliação e belezas naturais tão diferentes entre si, mas
técnica na manutenção e preservação dos são o Instituto do Patrimônio Histórico e que, ao mesmo tempo, contam um pouco do
patrimônios. Artístico Nacional (Iphan), para bens culturais, significado do que é ser brasileiro.
Sarah Ackerman
Stock
Textkultur
À esquerda: grande barreira de corais (austrália); direita: acima, Machu Picchu (Peru); abaixo, Palácio de Eggenberg (Áustria).
Elishka
■ Área Protegida das Ilhas Phoenix
(Kiribati).
■ Parque Nacional Tajik,
Cordilheira Pamir
(Tajiquistão).
O
Brasil foi um dos primeiros países Desde 2007, o Iphan retomou uma Além disso, o PAC promove a integração
a promover a preservação do seu articulação para a definição compartilhada federativa, pois pressupõe a pactuação
patrimônio urbano. Já em 1938, com governos estaduais, municipais e socie- dos Acordos de Preservação do Patri-
o antigo Serviço do Patrimônio dade civil das estratégias de preservação do mônio Cultural que definem ações a
Histórico e Artístico Nacional realizou o patrimônio cultural brasileiro tendo como serem executadas nos próximos 4 anos
tombamento de seis conjuntos no estado objetivo o desenvolvimento social, econô- em parceria com os estados, municípios
de Minas Gerais, inaugurando uma prática mico e urbano para recolocar o patrimônio e sociedade civil. Definiram-se objetivos
de defesa e conservação de sítios históricos, cultural na agenda estratégica de todos os e estratégias para enfrentar os problemas
inovadora para a época e que, em poucas governos. estruturais que afetam as “cidades históricas”
décadas, consolidou mais de uma centena Consolidou-se a Associação Brasileira de visando a promoção do desenvolvimento
de conjuntos arquitetônicos e urbanísticos Cidades Históricas (ABCH), a articulação social a partir das potencialidades do seu
protegidos em todo o país. com o Fórum Nacional de Secretários e patrimônio cultural, visando fortalecer a
Com uma ação governamental pautada Dirigentes Estaduais de Cultura e o o diálogo ação integrada de planejamento em prol
pelo enxugamento do estado nos anos 90 com todos os órgãos gestores estaduais de da preservação.
a ação pública no campo do Patrimônio patrimônio cultural, que não se reuniam Ainda em 2009, o Iphan realizou em
Cultural foi reduzida a uma atuação difusa desde a década de setenta. parceria com a ABCH e o Fórum Nacional
e fragmentada, que ora apresentava um Investiu-se também na definição de novos de Secretários e Dirigentes Estaduais de
recorte temático e territorial restrito, ora uma instrumentos de gestão do Patrimônio Cultural Cultura, o I Fórum Nacional do Patrimônio
Cultural (FNPC). Neste Fórum foi realizada
limitação na articulação interinstitucional como a chancela da Paisagem Cultural, a
a discussão e a avaliação da atual política de
e intergovernamental. ampliação das ações de registro e da política
patrimônio cultural e foram debatidos os
Para reverter este quadro o Iphan tem de salvaguarda do patrimônio imaterial, a
princípios e objetivos para a construção da
investido na construção do Sistema Nacional criação do Centro Regional de Formação em
Política Nacional de Patrimônio Cultural
de Patrimônio Cultural (SNPC) que tem Gestão do Patrimônio Cultural em parceria
(PNPC) que está em fase final de sistema-
como objetivo implementar a gestão compar- com a UNESCO e a ampliação das ações
tização.
tilhada do Patrimônio Cultural brasileiro educativas e de fomento. Outra vertente
Todas estas ações, somadas as demais
visando a otimização de recursos humanos foi a retomada de uma visão integrada no
iniciativas do setor público e da sociedade
e financeiros para a efetiva preservação de reconhecimento do patrimônio cultural pelos
civil, são estratégicas para qualificar o papel
nosso patrimônio. processos econômicos, ocupação territorial
simbólico e referencial de nossa cultura e
Nesta década, a despeito de todas limi- e eventos históricos, além de recortes temá-
para promover e acelerar o atual processo
tações, importantes ações de requalificação ticos específicos.
de desenvolvimento do país. O Iphan, ao
urbana foram realizadas em 26 conjuntos Esta articulação e ampliação conceitual
considerar as experiências do passado e ao
urbanos pelo Programa Monumenta, além propiciaram a elaboração do PAC Cidades
propor uma abordagem inovadora, cumpre
de ações voltadas para o fortalecimento Históricas, lançado em outubro de 2009,
seu papel e propõe os requisitos para que
institucional de parceiros governamentais pelo Presidente da República. Este programa
as cidades brasileiras e a nossa sociedade
com a implantação de Fundos Municipais caracteriza-se por ser uma política pública
atinjam essa meta.
de Preservação, promoção de atividades transversal que envolve os Ministérios da
econômicas e o financiamento de imóveis Cultura, Cidades, Educação e do Turismo,
privados, ações inovadoras e de grande BNDES, Banco do Nordeste, CAIXA e outras
impacto. agências e parceiros federais. Luiz Fernando de Almeida é Presidente do Iphan
U
m campo científico que vem se mais de 700 pesquisas/ano nos últimos dois no Brasil os arqueólogos são co-gestores
estabelecendo desde o fim do anos, com o advento do PAC. do patrimônio arqueológico.
século XIX, inicialmente praticada Embora apenas 10% das pesquisas arqueo- Por sua vez, o patrimônio arqueológico
por estrangeiros, a arqueologia no lógicas realizadas no Brasil sejam acadêmicas, brasileiro nunca esteve tão em evidência, por
Brasil avançou nos anos 1950 e 1960, quando enquanto 90% representam projetos da um lado sendo contemplado com numerosos
se formou a primeira geração de brasileiros chamada arqueologia preventiva, decorrente estudos e, por outro, sendo colocado em
dedicados à matéria. do atendimento à legislação de proteção ao situações de risco, e mesmo de perda, já que a
Como signatário da ONU, o Brasil acom- patrimônio cultural e ambiental, tal situação legislação específica admite a destruição dos
panha as recomendações internacionais no vem provocando uma verdadeira revolução sítios arqueológicos desde que previamente
tratamento do patrimônio arqueológico, no campo científico da arqueologia, opor- estudados. Se os sítios arqueológicos regis-
por vezes até se antecipando na criação de tunizando a ampliação do conhecimento trados no Brasil a partir do licenciamento
instrumentos legais de proteção. Já em 1937, o sobre o patrimônio arqueológico de áreas ambiental aumentaram de 5mil para 17 mil,
patrimônio arqueológico é citado no Decreto-Lei até então desconhecidas. isso também significa que muitos deles foram
nº 25, como parte integrante do patrimônio A legislação de proteção ao patrimônio destruídos pela construção de obras de infra-
histórico e artístico nacional o que seria, mais arqueológico potencializada pela legislação estrutura realizadas no período.
tarde, reafirmado pela Constituição de 1988, ambiental trouxe um desenvolvimento sem Desta forma, considerando que os sítios
que inclui os bens de caráter arqueológico no precedentes ao campo científico da arqueo- arqueológicos podem ser vistos enquanto
patrimônio cultural brasileiro. logia no Brasil, com ampliação do mercado recursos culturais não renováveis que fornecem
A arqueologia, enquanto ciência social de trabalho para arqueólogos, animação do informações sobre a ocupação do território
que recupera informações sobre as ocupações meio universitário com a abertura de inúmeros nacional nos mais diversos contextos temporais
humanas a partir de seus restos materiais, e cursos de arqueologia, aumento de trabalhos e culturais e que remetem a um percurso muito
o patrimônio arqueológico brasileiro, cons- apresentados em congressos, dos próprios mais longo do que o que sucedeu a ocupação
tituído por registros materiais associados a congressos e seminários realizados no Brasil européia nas Américas e que poderiam ser
uma trajetória de 50 mil anos, parecem ter e da participação de arqueólogos brasileiros utilizados para a construção de uma identidade
construído uma relação que vai além do em congressos em outros países. cultural mais rica e de um turismo sustentável
interesse científico, ampliando-se pelo campo A atuação da comunidade científica no Brasil, não se pode dizer que a situação
da proteção ao patrimônio cultural. imbrica-se com a área da proteção do apresenta somente aspectos positivos.
Na década de 1950, instituições acadêmicas patrimônio arqueológico, na medida em Pelo contrário, é preciso reconhecer que
como as Universidades de São Paulo e do que o modelo de gestão praticado no Brasil frente ao atual intenso processo de ocupação
Paraná, juntamente com o Iphan, uniram-se é caracterizado pela outorga, pelo Estado do território nacional que advém do projeto
no processo que culminou em 1961 com a aos pesquisadores, da atividade de pesquisa governamental de crescimento econômico e
promulgação da lei federal 3.924, de proteção e da proposição de medidas mitigadoras de da ampliação da infra-estrutura em todas as
ao patrimônio arqueológico brasileiro e impactos negativos aos sítios arqueológicos. regiões do país, o patrimônio arqueológico
que estabelece a obrigatoriedade do estudo Ao contrário do México, onde a pesquisa brasileiro requer muitos cuidados por parte
prévio dos sítios arqueológicos em caso arqueológica é atividade de Estado, e da do poder público. Tal situação põe à prova
de atividades que concorrem para a sua França, onde o Estado realiza pesquisas o próprio modelo de gestão do patrimônio
destruição total ou parcial. prévias para estabelecer que medidas arqueológico praticado no Brasil, bem como
Há 20 anos, com o estabelecimento do deverão ser realizadas pelos arqueólogos, os instrumentos normativos e as condições
Licenciamento Ambiental para empreendi- no Brasil o Estado age somente de forma estruturais de que hoje ele dispõe.
mentos causadores de impactos negativos, as suplementar, acompanhando, fiscalizando
pesquisas arqueológicas no Brasil cresceram e estabelecendo medidas de proteção Maria Clara Migliacio é Diretora do Centro Nacional de Arqueologia do
de alguns estudos de caráter acadêmico, para complementares. Pode-se considerar que Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - Iphan
Uma herança a
ser preservada Pedro Henrique Barreto - de Brasília
de sol e praias. Mas quem decide reservar um INVENTÁRIO “Roteiros” começou a ser ide-
tempo para conhecer o interior de Santa Catarina alizado há mais de duas décadas. Após as
enchentes do Rio Itajaí em 1983 e 1984,
se surpreende. A diversidade cultural presenteada o Iphan organizou um amplo estudo
em diversas áreas de Santa Catarina.
pelos imigrantes que se estabeleceram na região Foram inventariadas 1.143 edificações,
desde o século 19 é de encher os olhos. Arquitetura, com pesquisa bibliográfica, entrevistas
com a população local, obras de restauro
música, culinária, festividades e costumes singulares e levantamentos fotográficos. Iniciou-
desenham um Brasil ainda mais rico do que aquele se um processo de tombamento deste
patrimônio, com a elaboração de um dos-
imaginado pelos turistas que visitam o Estado. siê com dois volumes de 340 páginas cada.
A
chancela da Paisagem Cultural é de pactuação prévia mínima, antecedendo a saveiro da Bahia, dos países nórdicos a baleeira
dos principais avanços no campo da chancela, força os atores envolvidos a esta- de Santa Catarina, dos Árabes (tendo o luso
preservação do patrimônio cultural belecer um diálogo entre si e dar início a um como porta-voz) nomenclaturas específicas
brasileiro dos últimos tempos. processo de planejamento regional. de peças da construção naval. Técnicas de
Pela Portaria Iphan 127/2009, “Paisagem Partilha-se entre todos a responsabilidade pesca, culinária, formas de trançar a rede,
Cultural Brasileira é uma porção peculiar do das ações de preservação e valorização decor- as cestas, os balaios, tudo isso singulariza o
território nacional, representativa do processo de rentes da chancela. O órgão de patrimônio patrimônio naval e suas paisagens.
interação do homem com o meio natural, à qual cultural é apenas um dos agentes envolvidos, Nos dois casos, para que a preservação seja
a vida e a ciência humana imprimiram marcas ou responsável pelo monitoramento (e não fisca- efetiva, é preciso estabelecer uma política que
atribuíram valores.” Diante das transformações lização, pois a chancela não impõe restrições vá além dos meios tradicionais de proteção do
contemporâneas e inevitáveis das formas de vida rigorosas como o tombamento, sendo uma patrimônio cultural. Tornam-se necessárias
e paisagens do mundo, alguns lugares devem ser espécie de certificado ou selo de qualidade) parcerias com entidades de fomento agrícola,
assinalados pela relação singular estabelecida e pela renovação periódica (de dez em dez órgãos ambientais, prefeituras, associações e
entre o homem e a natureza. anos) da outorga da chancela. mais uma gama variada de instituições direta
A chancela da Paisagem Cultural representa Desde 2009, o Iphan vem desenvolvendo ou indiretamente envolvidos na questão. Como
um avanço conceitual na abordagem do patri- ações que visam a chancela da Paisagem Cultural preservar a embarcação sem o pescador, o
mônio, pois considera contextos complexos em alguns dos contextos mais singulares do pescador sem a pesca, a pesca sem o mercado?
onde não estão postos apenas valores materiais território nacional. Um exemplo é o das regiões Como garantir a permanência dos conheci-
ou imateriais, mas considera a soma desses de imigração no sul do Brasil, contextos derivados mentos da construção naval sem a matéria
dois elementos na compreensão do que seja do estabelecimento, a partir do século XIX, de prima e o interesse das gerações mais jovens
“porção peculiar do território nacional”. grupos de imigrantes de diversos países. Para pelo ofício sem o devido reconhecimento?
Este entendimento abre campo para cá trouxeram suas tradições que, adaptadas Essas são as questões centrais colocadas
o trabalho em contextos anteriormente às condições locais – topográficas, climáticas, pela Paisagem Cultural e que norteiam o
descobertos pelos instrumentos até então faunísticas, florísticas, políticas, econômicas estabelecimento do pacto, trazendo a todos a
disponíveis de preservação do patrimônio – deram origem a paisagens singulares, tradu- responsabilidade pela construção hoje do que
cultural, notadamente o tombamento e o zidas pela arquitetura, modos de produção, será usufruído pelas próximas gerações.
registro. Como, por exemplo, trabalhar com culinária, língua, manifestações culturais A chancela Paisagem Cultural busca assi-
os lugares de ocorrência do patrimônio naval, de todo tipo. Trata-se de patrimônio ainda nalar a diversidade de relações que o homem
da cultura pantaneira, caipira, caiçara, dos vivo, colocado em risco pelas transformações estabeleceu com seu meio, criando cenários
imigrantes, dentre outras? do mundo contemporâneo – urbanização, de vida que diferenciam os lugares e por isso,
A chancela apóia-se no arcabouço jurídico massificação da cultura. testemunham a inteligência, a criatividade e
já existente e em formas e instrumentos Outro exemplo é o do patrimônio naval. O contribuem para a riqueza humana. É preciso
de gestão compartilhada, dividindo entre Brasil é um dos países mais ricos do mundo em estabelecer o entendimento de que a uniformi-
cidadão e poder público a responsabilidade embarcações tradicionais. Para cada contexto zação das paisagens significa o empobrecimento
pela preservação de alguns dos nossos mais geográfico – que no Brasil são inúmeros – existe dos cenários de vida e da alma humana. O
singulares contextos de vida. Além de possuir uma forma peculiar de embarcação, derivada reconhecimento e a perpetuação de contextos
características peculiares de relação homem/ da adequação às condições de navegabilidade, singulares busca a igualdade na diferença, o
natureza, para que um lugar receba a chancela regime de ventos, matéria-prima e grupos equilíbrio pela diversidade, a compreensão de
é preciso o estabelecimento de um pacto, culturais específicos. De Angola herdamos as cada um pela existência do outro.
entendido como ferramenta estratégica para canoas baianas, dos indígenas diversos tipos
sua preservação e gestão. O estabelecimento de canoa, da Índia (através dos portugueses) o Maria Regina Weissheimer é coordenadora de Paisagem Cultural do IPHAN
Reconhecimento
à cultura negra
A
influência dos africanos e seus objetivo, o Iphan adota ações para a trans- ros, quase metade da população brasileira
descendentes é marcante na mú- missão da cultura, divulgação, melhoria (46%), possui ascendência africana, segun-
sica, dança e culinária brasileiras. das condições de produção e organização do dados da Secretaria Especial de Políticas
E é contemplada pelo Instituto do social. Para o Iphan, o patrimônio imate- de Promoção da Igualdade Racial da Presi-
Patrimônio Histórico e Artístico Nacio- rial abrange as mais variadas manifestações dência da República.
nal (Iphan), que tem um departamento populares, que contribuem para a formação Ao mesmo tempo em que reconhece a
específico para cuidar da preservação do da identidade cultural de um povo. contribuição cultural, o Brasil ainda convi-
patrimônio cultural imaterial brasileiro. Para a Organização das Nações Uni- ve com uma dura realidade, a desigualdade
“Quando pensamos no patrimônio imate- das para a Educação, a Ciência e a Cultura social entre negros e brancos. A renda dos
rial, vemos que a contribuição negra nas (Unesco), é importante promover e pro- brancos costuma ser o dobro da dos negros.
práticas artísticas e culturais foi extrema- teger monumentos, sítios históricos e pai- Na educação, a despeito das melhorias veri-
mente importante. A expressões culturais sagens culturais. Mas não só de aspectos ficadas nos últimos anos, a taxa de analfa-
eram transmitidas oralmente, não havia físicos se constitui a cultura de um povo. betismo é duas vezes maior na população
documentação, e se não fosse a transmis- As tradições, o folclore, os saberes, as lín- negra e os brancos têm, em média, dois
são oral teriam se perdido”, ressalta Márcia guas, as festas e diversos outros aspectos e anos a mais de estudo. Contudo, a expres-
Sant’Anna, diretora do Departamento do manifestações devem ser levados em consi- são mais dramática é, como indicam estu-
Patrimônio Imaterial do Iphan. deração. Os afro-brasileiros contribuíram e dos do Instituto de Pesquisa Econômica e
Quando um determinado valor cultural ainda contribuem fortemente na formação Aplicada (Ipea), a incidência da pobreza na
é registrado como patrimônio imaterial, ele do patrimônio imaterial do Brasil, que con- população negra: de cada dez pobres, seis
passa a fazer parte de um plano de salva- centra o segundo contingente de população são negros. Enquanto cerca de 20% dos
guarda e de registro documental e a integrar negra do mundo, ficando atrás apenas da brancos são considerados pobres, o percen-
um plano para sua preservação. Com esse Nigéria. Cerca de 80 milhões de brasilei- tual na população negra é de 47%.
Roda de Capoeira e Ofício dos Tambor de Crioula – envolve Partido Alto, Samba de Terreiro
Mestres de Capoeira – O plano dança circular, canto e percussão e Samba-Enredo – No começo
de preservação, consequência de tambores. Seja ao ar livre, nas do século 20, a partir de
do registro, prevê medidas de praças, no interior de terreiros influências rítmicas, poéticas
suporte: um plano de previdência ou então associado a outros e musicais do jongo, do samba
especial para os velhos mestres; o eventos e manifestações. No de roda baiano, do maxixe
estabelecimento de um programa conjunto complexo e heterogêneo e da marcha carnavalesca,
de incentivo da capoeira no das manifestações culturais consolidaram-se três novas
mundo; a criação de um centro populares maranhenses, o Tambor formas de samba: o partido alto,
nacional de referência da de Crioula destaca-se como uma vinculado ao cotidiano e a uma
capoeira; e o plano de manejo das modalidades mais difundidas e criação coletiva baseada em
da biriba – madeira utilizada ativas no cotidiano. Participam as improvisos; o samba-enredo,
na fabricação do instrumento. “coreiras”, tocadores e cantadores, de ritmo inventado nas rodas
Registrado em julho de 2008. conduzidos pelo ritmo incessante do bairro do Estácio de Sá e
dos tambores e o influxo das apropriado pelas nascentes
toadas evocadas, culminando na escolas de samba para animar
punga (ou umbigada) – movimento os seus desfiles de Carnaval; e
coreográfico no qual as dançarinas, o samba de terreiro, vinculado
num gesto entendido como à quadra da escola, ao quintal
saudação e convite, tocam o ventre do subúrbio, à roda de samba
umas das outras. É realizado sem do botequim. Essa matrizes
local específico ou calendário pré- referenciais do samba no Rio
fixado e praticado especialmente de Janeiro distinguem-se de
em louvor a São Benedito. outros subgêneros de samba
Registrado em junho de 2007. criados posteriormente e
guardam relação direta com os
padrões de sociabilidade de
onde emergem. Registrado em
Fonte: Dossiês de bens
registrados pelo Iphan (http:// novembro de 2007.
portal.iphan.gov.br/)
Desenvolvimento •Desafios
junho/julhoabril
de 2010 2979
de 2009
retratos
Índios: Resgate
cultural
Wilson Dias/ABr
culturais indígenas. “Preservar as referências
culturais dos povos indígenas significa que
estamos reafirmando nossas raízes“, diz Ana
Gita de Oliveira, do instituto
Pedro Biondi/ABr
7832Desenvolvimento julho
Desenvolvimento de 2009 de 2010
• junho/julho
quando a cartografia científica do local do Brasil” a Cachoeira de Iauaretê ou Ca-
Wilson Dias/ABr
foi comparada com a cartografia sagrada choeira da Onça, o primeiro bem cultural
desenhada pelos índios: os acidentes ge- imaterial inscrito no Livro do Registro dos
ográficos eram idênticos. Lugares. Ela fica na região do Alto Rio Ne-
Além do tombamento, há um proje- gro, município de São Gabriel da Cacho-
to para construir um corredor ecológico eira (AM), na confluência dos rios Uaupés
cultural para levar os índios até os lugares e Papurí, onde vivem dez comunidades
sagrados. “O tombamento é uma medi- indígenas das etnias de filiação linguística
da de proteção, mas o importante é que Arwak, Tukanos Orientais e Maku.
o Estado reconheça o direito dos índios As pedras, lajes e igarapés da região da
como os proprietários daquela terra”, dis- Cachoeira são sagrados para essas comu-
Wilson Dias/ABr
se José Dias. nidades, porque marcam a história de sua
O Decreto-Lei 25/1937, que organiza origem e fixação nessa região, assim como
a proteção do patrimônio histórico e ar- a história do estabelecimento das relações
tístico nacional, estabelece que as coisas de afinidade que vêm permitindo, até
tombadas não poderão ser destruídas, hoje, a convivência e o compartilhamento
demolidas ou mutiladas, nem ser repara- de padrões culturais entre os diversos gru-
das, pintadas ou restauradas sem prévia pos que habitam aquele território.
autorização do Iphan. De acordo com dados do Instituto Bra-
Em 2002, a Arte Kusiwa, técnica de sileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
pintura e arte gráfica própria da popula- atualmente vivem no Brasil cerca de 750 mil
Antonio Cruz/ABr ção indígena Wajãpi, do Amapá, foi ins- índios, distribuídos entre 225 sociedades
crita no Livro de Registro das Formas de indígenas, o que representa 0,25% da popu-
Expressão como Patrimônio Imaterial. lação brasileira. Há também 63 referências
Os grafismos podem ter como suporte o de índios ainda não contabilizados. Mais de
corpo humano, cuias, cestos, bordunas e 180 línguas são faladas pelos membros das
objetos de madeira. Para a preparação da sociedades indígenas, o que corresponde a
tinta são utilizadas sementes de urucum, 30 famílias linguísticas diferentes.
gordura de macaco, suco de jenipapo e O presidente da Fundação Nacional
resinas perfumadas. do Índio (Funai), Márcio Meira, explica
“A linguagem gráfica que os Wajãpi do que a taxa de crescimento dos povos in-
Amapá denominam kusiwa sintetiza seu dígenas é maior que a taxa da população
Antonio Cruz/ABr
modo particular de conhecer, conceber e não índia e, por isso, o órgão estima que
agir sobre o universo. Tal forma de expres- hoje essa população já ultrapasse um mi-
são, complementar aos saberes transmiti- lhão de habitantes.
dos oralmente, afirma, ao mesmo tempo, “A grande dificuldade da Funai é ga-
o contexto de origem e a fonte de eficácia rantir a integridade territorial das terras
dos conhecimentos dos Wajãpi sobre o tradicionalmente ocupadas, de acordo com
seu ambiente. Por outro lado, arte gráfica os usos, costumes e tradições dos povos
e arte verbal se completam por transmiti- indígenas, conforme está escrito na Consti-
rem os conhecimentos indispensáveis ao tuição Federal. Para a demarcação é preciso
gerenciamento da vida em sociedade. As enfrentar todo o aparato jurídico de ações
formas de expressão gráfica e oral permi- e liminares impetradas por particulares ou
tem agir sobre múltiplas dimensões: sobre por entidades, com objetivo de atrasar e im-
o mundo visível, sobre o invisível, sobre pedir esse processo. Outro grande desafio é
o concreto e sobre o mundo ideal”, relata o fator geográfico, porque muitas comuni-
documento do Iphan. dades são de difícil acesso, têm característi-
Outra ação do IPHAN em prol da pre- cas específicas de locomoção e não podem
servação da cultura indígena foi procla- ser tratadas como cidadãos que vivem em
mar, em 2006, como “Patrimônio Cultural grandes centros urbanos”, comenta.
originalmente publicada na edição 53 | jul/2009
Desenvolvimento • junho/julhojulho
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retratos
Fotos: Dalmo Vieira Filho
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Canoas e
jangadas
Iphan inicia trabalho de preservação das embarcações
tradicionais e assegura condições de sobrevivência para
os pescadores, que não conseguem competir com a pesca
predatória de grande escala
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P
aís de dimensões continentais, tor de boa parte do patrimônio naval da Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
com mais de nove mil quilô- humanidade. (Iphan), porém um inventário realizado
metros de litoral banhado pelo O Brasil, país de muitas caras, cores e no final do século XIX, pelo almirante Al-
Oceano Atlântico e com uma das jeitos. Essa miscigenação que formou a ves Câmara, registrou mais de duzentas.
maiores reservas de água doce do Plane- população também está representada nas Em um século, metade desse patrimônio
ta, o Brasil desenvolveu uma grande di- embarcações tradicionais. Somem-se am- se perdeu.
versidade de tipos de embarcações, que bientes aquáticos distintos, como Amazô- Preocupado com a preservação do pa-
espelham também a riqueza da formação nia, Pantanal, rio São Francisco, Bacia Flu- trimônio naval, um dos ramos mais des-
cultural brasileira. A história do país está vial do Paraná: teremos cada comunidade conhecidos e ameaçados do país, o Iphan
diretamente ligada à navegação: foi no desenvolvendo um tipo de barco aperfei- criou, no ano passado, o projeto Barcos do
comando de 13 caravelas que Pedro Ál- çoado para suas condições específicas. Brasil, com o objetivo principal de preser-
vares Cabral chegou, em abril de 1500, A canoa baiana, considerada a rainha var e valorizar as embarcações tradicio-
a essa terra hoje chamada Brasil. Mas o das canoas brasileiras, é uma forma deriva- nais brasileiras. Com o apoio de entidades
povo que habitava essas terras, os indíge- da diretamente dos modelos africanos. As públicas e privadas, a meta é localizar e
nas de variadas tribos, também tinha suas jangadas do Nordeste, as baleeiras do Sul, cadastrar os barcos tradicionais, seus con-
embarcações. o saveiro da Bahia. As canoas, traineiras, textos culturais e ajudar a melhorar a vida
Ao longo de 500 anos de história, novas botes e bateiras são encontrados em todas de seus usuários e detentores: marinhei-
embarcações foram desenvolvidas para as regiões do país, mas cada um diferente ros, pescadores, mestres, construtores e
atender às especificidades de cada região. do outro. As bianas e cúters do Maranhão. auxiliares.
Afinal, com tanta água e variedade de am- Todas são representações da diversidade O diretor do Departamento de Patri-
bientes geográficos litorâneos, lacustres e cultural do país, que carrega traços indíge- mônio Material e Fiscalização do Iphan,
fluviais, não é de estranhar que o país seja nas, europeus, africanos e orientais. Dalmo Vieira Filho, explica que as mu-
um dos mais ricos em diversidade de bar- São mais de cem diferentes tipos de em- danças nos contextos culturais, sociais e
cos tradicionais e se destaque como deten- barcações identificadas pelo Instituto do econômicos das comunidades de usuários
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e detentores desses barcos tradicionais benefício dos pescadores. Não é impedir
têm contribuído para o seu desapareci- o acesso à tecnologia, mas reconhecer o
mento. “A pesca artesanal tem diminuído valor cultural da tradição e sua eficiência,
ao longo dos anos, porque o pescador já e melhorar a qualidade de vida do pesca-
não consegue suprir as necessidades de dor”, afirma.
sua família”, explica. Os pescadores tradi- Vieira Filho explica que a embarca-
cionais têm dificuldade de competir com a ção tradicional nada deixa a desejar em
pesca de arrastão, com rede de malha fina comparação ao barco a motor. Tendo em
e outras formas de pesca predatória, como vista que o Brasil tem um regime regular
a feita com explosivos. de ventos, as velas e remos fazem um exce-
Outra questão importante, segundo lente trabalho. Sem contar que é mais eco-
Vieira Filho, é a restrição da extração da nômico para o pescador, que não precisa
madeira, matéria-prima para a confecção usar óleo diesel e nem gastar com mecâ-
dos barcos. Algumas já não são mais en- nico. O casco movido a motor não requer
contradas ou não podem mais ser utiliza- tanta sofisticação, o que descaracteriza o
das. “Estudos ambientais estão em curso trabalho artesanal.
para verificar as madeiras que podem ser A proposta do projeto Barcos do Bra-
utilizadas na fabricação dos barcos. A difi- sil é organizar o inventário do patrimônio
culdade é que cada parte do barco usa um naval brasileiro para proteger e valorizar
tipo de madeira. A nossa ideia é ter uma as embarcações e as atividades relaciona-
área de manejo”, explica. das a elas, como pesca, artesanato e fabri-
“O nosso desafio é fazer com que o usu- cação, e também monitorar e conservar as
ário das embarcações tradicionais tenha principais embarcações. O projeto prevê
condições dignas de trabalho. A preserva- ainda a construção de barcos tradicionais
ção deve ser feita não em prejuízo, mas em em locais públicos, com o intuito de divul-
gar e preservar as técnicas de carpintaria
naval, e o desenvolvimento de programas
Requisitos analisados: de conservação e ma enção dos barcos tra-
dicionais para pescadores, construtores e
• Estado de conservação do barco: preferência para aquelas em pior estado; usuários de barcos; e criar unidades regio-
• Estado de preservação do barco: preferência para as embarcações que mantenham suas caracte- nais do Museu Nacional do Mar.
rísticas originais; O Museu Nacional do Mar, localizado
• Renda do dono do barco: preferência para os de menor condição para pagar os reparos; em São Francisco do Sul (SC), foi criado
• Utilização da embarcação: prioridade para os barcos utilizados para pesca artesanal; em 1993, numa parceria do governo do
• Valor cultural da embarcação: quantidade de exemplares existentes. estado com o Iphan. Entre 2003 e 2004, o
museu foi revitalizado. O local recebe mais
de 60 mil visitantes por ano. Para 2010, está
Embarcações selecionadas para trabalho de restauração (será restaurado um barco de cada tipo):
prevista a construção das unidades de Ma-
ragogipe (BA) e Parnaíba (PI). No final de
Tipo de barco Local
julho, a Bahia foi sede do 3º Seminário do
Cúter do Maranhão São Luís/MA
Bote Bastardo Camocim/CE Patrimônio Naval Brasileiro, realizado em
Canoa Pernambucana Itapissuma/PE Salvador. O encontro reuniu especialistas
Canoa do Rio Real Indiaroba/SE em preservação do patrimônio naval de
Bote de São Cristóvão São Cristóvão/SE várias esferas do governo federal e do setor
Canoa Bordada Litoral de Santa Catarina privado, que discutiram alternativas para a
Saveiro de Pena Recôncavo Baiano
sustentabilidade dos pescadores artesanais,
Canoa da Orla Atlântica Salvador/BA
Saveiro de Vela de Içar Recôncavo Baiano com a valorização da produção pesqueira
Baleeira de Santa Catarina Garopaba, Penha, Palhoça, Florianópolis/SC por meio do aperfeiçoamento da armaze-
Canoa do Espírito Santo Anchieta/ES nagem e comercialização do pescado.
Desenvolvimento • junho/julho
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retratos
Rede
Ferroviária,
um patrimônio
cultural Diversos órgãos trabalham na preservação da memória da
extinta RFFSA. O Iphan cuida também da difusão da memória
ferroviária, por meio de museus, bibliotecas, arquivos,
coleções e acervos, conservação e restauração de prédios,
monumentos, logradouros e sítios
Plantas
Divulgação
A
Constituição Federal de 1988 é fundamental, pois esses bens culturais são Os bens culturais registrados fazem jus à
firmou a idéia de que o patrimônio frequentemente afetados por problemas que implementação de planos de salvaguarda que
cultural é uma construção social, estão fora da alçada da cultura e demandam a destinam-se a apoiar e fomentar sua continui-
cabendo ao Estado reconhecê-lo e intervenção de outros setores do governo. dade e sustentabilidade. São formulados a partir
protegê-lo com o apoio e a participação da Para que as ações de salvaguarda ocorram do conhecimento produzido e do diagnóstico
sociedade. Só mais recentemente, contudo, de modo integrado entre as esferas gover- realizado nos processos inventário e de Registro,
esse princípio constitucional foi absorvido namentais e a sociedade, é fundamental o em conjunto com os produtores ou detentores
nas práticas de preservação. Nesse processo, compartilhamento de métodos, categorias de do bem cultural. Contêm, basicamente, um
foi decisiva a promulgação do Decreto n° análise e informações. Por isso, as metodologias conjunto de ações, de curto, médio e longo prazo,
3.551/2000 e a consolidação no Brasil da de identificação utilizadas pelo Iphan estão destinadas a apoiar processos de transmissão
noção de patrimônio cultural imaterial. disponíveis para parceiros governamentais e não às novas gerações; a melhorar condições de
Segundo este decreto, o patrimônio cultural governamentais bastando, para tanto, encaminhar produção e reprodução do bem cultural; a
imaterial se manifesta por meio dos saberes e projeto para análise e firmar Termo de Uso e promover e difundir informações; a defender
modos de fazer, das celebrações, das formas Responsabilidade com a instituição. direitos relacionados ao uso e à difusão desse
de expressão e dos lugares de concentração O instituto do Registro, criado pelo patrimônio e a capacitar detentores a liderar
de práticas culturais coletivas, que constituem Decreto n° 3.551/2000, é um instrumento e gerir processos de salvaguarda.
referências para a memória e a identidade dos de reconhecimento patrimonial que firma o A continuidade de expressões culturais
imateriais também é fortalecida por meio de
grupos formadores da sociedade brasileira e compromisso do Estado com o fortalecimento
ações de difusão do conhecimento produzido
possuem continuidade histórica. A noção de das condições que propiciam a continuidade
ou sistematizado sobre esses bens culturais e,
bem cultural imaterial diz respeito então a dos bens culturais imateriais. Equivale, resumi-
ainda, por meio de sua promoção, inclusive,
domínios da vida social e coloca no centro do damente, a aprofundar o conhecimento sobre
nos meios de comunicação. É necessário,
processo de salvaguarda os grupos e indivíduos a história e a trajetória da expressão cultural
entretanto, garantir que essa promoção
responsáveis pela vigência dessas práticas – os em foco, sobre as condições sociais, materiais
beneficie, primordialmente, processos de
seus “detentores”. A salvaguarda desses bens, e ambientais que propiciam sua existência e a
salvaguarda e os detentores envolvidos.
portanto, está orientada para o apoio àqueles diagnosticar os problemas que comprometem
Ações de fomento a projetos de salvaguarda
que os transmitem e mantêm e, por isso, devem sua continuidade e reprodução. O Registro é
desenvolvidos pela sociedade têm sido reali-
participar ativamente da identificação, do o “retrato” de um momento e deve ser refeito
zadas, principalmente, no âmbito do Programa
reconhecimento patrimonial e do fomento após dez anos do reconhecimento oficial. O
Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI),
à sua continuidade e sustentabilidade. objetivo é acompanhar as transformações
também criado pelo Decreto n° 3.551/2000. Por
Como são as pessoas que mantêm e trans- ocorridas no bem ou no contexto que viabiliza
meio dos processos seletivos desse programa
mitem os bens culturais imateriais, é importante sua existência e reavaliar o registro realizado. É
têm sido firmadas parcerias com organismos
compartilhar métodos e instrumentos com elas. importante não se perder de vista que esse tipo
estaduais, municipais e com instituições sem
Durante o processo de salvaguarda, os grupos, de bem cultural é passível de desaparecimento
fins lucrativos, fomentando-se a pesquisa, a
indivíduos e comunidades que dele participam não somente devido a ameaças ou fatores documentação, a produção e o tratamento
são capacitados a produzir conhecimento e exógenos, mas também por eventual perda de informações, assim como iniciativas de
documentação sobre seu patrimônio, bem de função simbólica, tecnológica ou mesmo apoio à produção e reprodução de expressões
como a empreender ações de organização e econômica junto à base social que o sustenta. tradicionais e à transmissão, capacitação e
de articulação de parcerias. A articulação com Por isso, como documentação exaustiva da organização comunitária.
políticas públicas das áreas de educação, meio expressão cultural, o Registro permite preserva
ambiente, desenvolvimento econômico e social sua memória para a posteridade. Marcia Sant’Anna é diretora do Departamento de Patrimônio Imaterial do Iphan
Festa de Santa Bárbara, em Salvador (foto acima) e Festa do Divino, no Rio (ao lado), também foram registradas como patrimônio imaterial
Festas religiosas,
um bem a ser preservado
Celebrações entram nos registros de bens imateriais do Iphan
O
Instituto do Patrimônio Histórico e de Janeiro; e as festas religiosas de Ouro Preto, seu santo padroeiro. Misturando as crenças,
Artístico Nacional (Iphan), em parce- em Minas Gerais. devoções e formas religiosas trazidas pelos
ria com outras instituições, realizou A diretora do Departamento do Patrimô- portugueses e pelos escravos africanos com as
o inventário de 40 bens imateriais. nio Imaterial do Iphan, Márcia Sant’Anna, dos indígenas nativos, as celebrações religiosas
Algumas celebrações religiosas nacionais fo- explica a importância de o Estado reconhecer fazem parte do processo histórico de formação
ram registradas: o Círio de Nossa Senhora de as celebrações religiosas como patrimônio do Brasil”.
Nazaré, no Pará; a Festa de Santa Bárbara, na cultural: “Pode-se afirmar, sem medo de errar, Ela ressalta que as celebrações religio-
Bahia; a Festa do Divino Maranhense, no Rio que toda cidade no Brasil celebra, pelo menos, sas articulam outros elementos e manifes-
Brasília 50 anos
Capital projetada para 500 mil habitantes hoje tem 2,6 milhões de moradores
e tem a segunda maior renda per capita do País. Projeto arquitetônico vira
patrimônio cultural da humanidade e é tombado pelo patrimônio histórico nacional
Suelen Menezes
À
s vésperas de completar meio sé- lista de bens do Patrimônio Cultural da gregária, a residencial e a bucólica. A esca-
culo, Brasília continua a encan- Humanidade . Em 1990, a cidade foi tom- la monumental está configurada pelo Eixo
tar seus moradores e visitantes. bada pelo governo federal. Da prancheta Monumental, desde a Praça dos Três Pode-
Os traços simples do projeto de de Niemeyer nasceram projetos que se res até a Rodoferroviária. O Eixo congrega
Lucio Costa, como ele próprio definiu tornariam ícones da arquitetura mundial. os edifícios que abrigam a alma político-
Brasília foi o primeiro núcleo urbano administrativa do País e do governo local.
– “um gesto primário de quem assinala
construído no século XX incluído na lista As principais obras arquitetônicas estão
um lugar ou dele toma posse: dois eixos
dos bens de valor universal pelo Comitê concentradas nessa escala: os palácios do
cruzando-se em ângulo reto, ou seja, o
do Patrimônio Mundial, Cultural e Na- Congresso Nacional, do Itamaraty, do Pla-
próprio sinal da cruz” – valorizam ainda
tural da Unesco. Detentora da maior área nalto, da Justiça, o Panteão, os Ministérios,
mais a arquitetura de Oscar Niemeyer. tombada do mundo – 112,25 quilômetros a Catedral, o Memorial JK, o Memorial dos
As grandes avenidas, perspectivas e par- quadrados, assumiu o mesmo grau de im- Povos Indígenas e a Torre de TV.
ques permitem ver os edifícios de vários portância de cidades como as italianas Flo- A escala gregária está representada pe-
ângulos e sem obstáculos. rença, Veneza e Roma; a peruana Cuzco; as los setores de convergência da população:
A beleza, criatividade e inovação da Ca- brasileiras Olinda e Ouro Preto; e a capital comercial, bancário, de diversões e cultura,
pital foram reconhecidas pelo mundo. Em francesa, Paris. hoteleiro, médico-hospitalar, de rádio e tele-
7 de dezembro de 1987, a Organização das A escolha de Brasília como Patrimônio visão. Tem como ponto central a Plataforma
Nações Unidas para a Educação, a Ciência Mundial fundamentou-se na suas quatro Rodoviária, traço da união de Brasília com as
e a Cultura (Unesco) inscreveu Brasília na escalas estruturadoras: a monumental, a demais cidades do Distrito Federal e entorno.
A beleza da Ponte JK
erguida do nada em
formadas por conjuntos de edifícios que apenas to-
cam o solo, suspensos sobre pilotis, o que permite que
o chão seja livre e acessível em toda a sua extensão.
Há o predomínio do verde, com gramados e vegetação. As
alturas uniformes – de seis pavimentos nas quadras 100,
menos de quatro anos
200 e 300, e de três nas quadras 400 – garantem a visibili- A mudança da capital para o interior do País gerou muita po-
dade de um vasto horizonte. A unidade de vizinhança faz lêmica e foi um desafio enfrentado com bravura por aqueles que
parte dessa proposta. Formada pelo conjunto de quatro su- acreditaram nesse sonho.
perquadras, a unidade deve dispor de clube, cinema, teatro, Em 1955, o mineiro Juscelino Kubitschek, então candidato à
igreja, comércio e biblioteca. Presidência, percorria o País em campanha. O seu primeiro co-
Por último, a escala bucólica, que permeia as outras três. mício foi na cidade goiana de Jataí. Naquele dia, ao responder a
São os gramados, praças, jardins, áreas de lazer, orla do pergunta de um eleitor, JK assumiu o compromisso perante a popu-
Lago Paranoá – os espaços destinados ao deleite, descanso lação de cumprir a Constituição de 1946, que previa a transferência
e devaneio, que dão à Brasília o título de cidade parque. da capital para o interior.
“O patrimônio é o legado que recebemos do passado, “A pergunta, absolutamente inesperada, chegou, por um mo-
vivemos no presente e transmitimos às futuras gerações. mento, a perturbar-me. Já ia adiantada a elaboração de meu pro-
Nosso patrimônio cultural e natural é fonte insubstituível grama de metas, mas confesso que jamais havia pensado em mudar
de vida e inspiração, nossa pedra de toque, nosso ponto do Rio de Janeiro a Capital da República. Naquele breve instante,
de referência, nossa identidade”, descreve o site da Unesco. assumi perante o goiano que me dirigiu a palavra e perante todo o
O diretor do Conjunto Urbanístico Tombado da Se- País a maior responsabilidade pública. Daí em diante, por toda par-
cretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Meio te me renovavam a pergunta e a resposta era invariável: construirei
Ambiente do DF, Maurício Goulart, explica que quando a nova capital”. (JK em entrevista concedida ao jornalista José Leão
Brasília foi tombada, aos 22 anos, era uma cidade jovem, Filho, publicada no jornal Correio Braziliense.
incompleta, ainda em formação, por isso o tombamento A construção da capital virou a meta-síntese do governo de JK.
foi calcado nas quatro escalas para não engessar a cidade. Três meses após assumir a Presidência da República, em 31 de ja-
“As quatro escalas representam quatro formas dife- neiro de 1956, começava a corrida contra o tempo para inaugurar
rentes de ocupação. O projeto previa áreas com ocupa- Brasília no dia 21 de abril de 1960.
ções menos densas de uma borda a outra de Brasília, “Comparando-se as distâncias, medindo-se os meridianos e pa-
com lotes maiores e edifícios mais baixos, onde estão ralelos, verifica-se que não poderia ter sido mais adequada a loca-
localizados o setor de clubes e a orla do Lago Paranoá. lização de Brasília. Construída num ponto estratégico, as estradas
A maior densidade populacional ficaria concentrada nas que a servem – um verdadeiro tecido conjuntivo de artérias e veias
escalas residencial e monumental. A forma de ocupação de intercomunicação interna – realizam, com perfeição, uma ver-
é que deve ser respeitada”, completa. dadeira costura do Brasil por dentro”.
Ele explicou que Brasília não tem uma legislação única A proposta de mundança da Capital também causou resistências
de uso e ocupação dos terrenos, o que dificulta o trabalho daqueles que preferiam continuar no Rio. Era natural que a capital
da Secretaria. Como exemplo, ele citou a destinação do preterida fosse palco das principais batalhas. A novidade da cidade
setor de clubes. “Não existe mais demanda para implan- erguida no meio do nada no interior do Goiás era um atrativo para
tação de clubes. Nesses locais têm surgido comércios e aventureiros em busca de enriquecimento rápido, mas um pavor para
restaurantes, porém não há uma legislação para regular os servidores públicos federais habituados à vizinhança da praia.
essa nova demanda”. Apenas 1,1% dos servidores foi transferido para Brasília a tempo da
Outro problema é a concentração de empregos na área inauguração.
tombada. Apenas 10% da população moram em Brasília, Pesquisa realizada pelo Ibope em março de 1960 com a popu-
mas 70% dos empregos estão concentrados na capital. lação do Rio de Janeiro mostrou que, apesar das reclamações, 80%
“É preciso organizar melhor os espaços entre as cidades dos entrevistados acreditavam que JK tinha acelerado o desenvol-
e descentralizar os empregos. Brasília é o centro de toda vimento brasileiro; 73% aprovavam a mudança da capital; e 62%
uma região e isso gera diversos problemas como o de acreditavam que a nova capital traria benefícios ao País. Apenas
transporte urbano”, ressalta. 24% desaprovavam a iniciativa.
“Brasília jamais
terá energia elétrica Torre de TV, um os
pontos turísticos
ou telefonia. Nunca de Brasília
se comunicará
com o restante
do país”
Gustavo Corção, pensador católico
e na época especialista em
telecomunicações, em O Globo,
em julho de 1959
D
entre os órgãos federais poucos apre- Referenciar a história significa instigar mações e sensações, ofertadas em todos os
sentam a capilaridade do IPHAN, a reflexão, aprofundar e atualizar o auto- recantos do planeta pela sociedade de massa,
institucionalmente presente em conhecimento, empregá-lo na construção de que se impõe no mundo atual. Não se trata
todos os estados brasileiros. O uma nação mais justa e rica, que salvaguarde de negar a contemporaneidade, a miríade de
IPHAN, sem contar os sítios arqueológicos, seus atributos, reflita sobre si, aja segundo oportunidades inovadoras, mas de contra-
fiscaliza e atua na valorização de bens seus ideais e garanta padrões verdadeiros de balançar as novidades com o que resulta de
tombados em cerca de 300 cidades. qualidade de vida a seus cidadãos. acúmulos, de realizações e capacidades.
Qual a função social que legitima essa Para corresponder a desafios institucionais A base de apoio formada pela bagagem
presença em todos os quadrantes do território, dessa grandeza, o IPHAN precisa viabilizar que configura a cultura e o patrimônio
como ela se atualiza e como está inserida uma maior apropriação dos bens reconhe- disponibilizado para as atuais gerações,
nos grandes desafios nacionais? cidos como patrimônio cultural por parte não pode ser construída para retê-las nos
Ao IPHAN cabe mais do que referenciar o da população, em especial nos processos limites da tradição. A função do patrimônio,
passado: o necessário é preservar e valorizar o educacionais, na produção de riquezas e na derivada da atemporalidade, ao contrário de
que precisa integrar o futuro. A maior função formatação dos ideais de cidadania. reter, deve dotar as gerações de repertórios
do IPHAN é a de garantir o reconhecimento, Essa apropriação depende de que os bens capazes de instrumentá-la nos rumos ainda
a preservação e a apropriação dos bens protegidos gerem postos de trabalho baseados desconhecidos do futuro. Patrimônio é tudo
“portadores de referência à identidade, à ação, não só na sua conservação, mas também nas o que deve permanecer para a posteridade e,
à memória dos diferentes grupos formadores formas de transmitir significados e induzir nesse sentido, o equipamento com que uma
da sociedade brasileira...”. o interesse pela história e pela cultura de nação deve dotar seus membros vai além das
Para aquilatar a dimensão desses bens, um modo geral. Depende também de fazer premissas de nutrir e proporcionar saúde. Sendo
basta lembrar que eles abarcam o universo das com que a atividade educacional utilize o Brasil um verdadeiro caldeirão de cultura,
realizações individuais e coletivas, materiais e amplamente os bens e valores chancelados no momento em que o país se estrutura para
imateriais, estabelecidas pelo conjunto dos seres como patrimônio. dotar a sociedade dos requisitos essenciais
humanos que habitaram o território brasileiro. Matéria prima dos macro-processos educa- da cidadania, não pode faltar o estímulo ao
Esses bens constituem fatores de compreensão cionais permanentes, que abarcam mas não espírito. Parâmetros que incluem justiça,
da nação brasileira, pois sinalizam os processos se limitam à escolaridade formal, e fator que educação e oportunidades iguais, presentes
históricos e a extraordinária capacidade de cria trabalho e renda – o patrimônio ganhará em padrões efetivos de qualidade de vida que
realização criativa do nosso povo. São as significância social e poderá aspirar ao seu não sejam efêmeros, não podem prescindir
cidades históricas, , os bens arqueológicos, verdadeiro papel: gerar padrões e moldar das dimensões e horizontes da cultura.
os monumentos tombados, os bens móveis comportamentos. Uma rede formada por É nesse contexto que situamos a função do
e integrados, os documentos, os acervos elos de uma formação continuada abarca patrimônio cultural como sendo a construção
bibliográficos, as obras artísticas e científicas, o educação de qualidade, lazer, turismo e permanente que perpassa todos os processos
patrimônio imaterial reconhecido, as paisagens usufruto da cultura, que se subdivide em de cidadania e as noções de qualidade de vida,
naturais e culturais, que singularizam cada campos e atividades onde prevalece a arte que reconhece, guarda, reúne e disponibiliza
recanto do território continental. e o patrimônio, devem formar um substrato continuamente as realizações de todos os que
Este conjunto de bens proporciona cenários social e econômico de peso crescente nas nasceram, vivem ou viveram no território
que se relacionam com a geografia e o meio estratégias de desenvolvimento do país. chamado Brasil, que constituem o conjunto e
ambiente, lugares e bens que referenciam e É necessário dotar a sociedade de sinaliza- o substrato das criaturas de todos os tempos
emocionam; atua na afirmação e na auto-estima dores de lugares, bens e valores permanentes que compõem o povo brasileiro.
da população; protege acervos; congrega os e universais, impregnados de arte, ciência,
referenciais simbólicos da identidade do país e cultura e história, densos em concretude e Dalmo Vieira Filho é diretor do Departamento de Patrimônio Material e
da sociedade que habita e habitou o Brasil. autenticidade, equilibrando a carga de infor- Fiscalização do IPHAN
Cidades brasileiras e
Patrimônios da Humanidade
Suelen Menezes – de Brasília
A
riqueza do patrimônio cultural do
Brasil é um reflexo da diversidade
do País. Cada região tem uma
história, uma formação, uma
peculiaridade. Dezessete bens nacionais são
reconhecidos pela Unesco (Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e
a Cultura) como bens de todos os povos, e
receberam o título de Patrimônio Mundial
da Humanidade. Sete desses bens são
conjuntos urbanos, de reconhecido valor
urbanístico, arquitetônico e paisagístico,
e estão localizados nas cidades históricas
de Ouro Preto, Olinda, Salvador, São Luís,
Cidade de Goiás e Diamantina. A capital do
país, Brasília, também ostenta o título, tendo
sido o primeiro núcleo urbano construído
no século XX a recebê-lo.
Em 1972 a Unesco criou a Convenção
do Patrimônio Mundial para incentivar a
preservação de bens considerados significativos
para a humanidade. Os países signatários
dessa convenção podem indicar bens a serem
inscritos na Lista do Patrimônio Mundial.
As informações sobre cada candidatura são
avaliadas por dois órgãos consultivos: o
Conselho Internacional para Monumentos
e Sítios (Icomos), para bens culturais; e a
União Internacional para a Conservação
Nelson Kon
Nubia Selen
vez no Brasil – a cidade sediou a 12ª reunião,
em 1988 –, será do dia 25 de julho ao dia 3
de agosto. Durante o evento serão avaliadas
propostas para novas inscrições na lista de
Patrimônio Mundial, mas os especialistas
também vão discutir relatórios sobre o
estado de conservação de algumas cidades
ou lugares que detêm esse título. Em 2009,
na reunião do Comitê, 13 novos sítios foram
inscritos na lista do Patrimônio Mundial,
que passou a contar com 890 localidades
de grande valor universal em 148 Estados-
membros da Organização.
De acordo com assessor de relações
internacionais do Iphan, Marcelo Brito,
ouro Preto, Minas Gerais
na reunião deste ano apenas um bem
nacional brasileiro será objeto de análise
pelo Comitê: a Praça de São Francisco, Canadá. Ele explica que a Praça representa ouro Preto/MG Situada em terreno extrema-
localizada na cidade de São Cristóvão, um modelo urbanístico que é típico de um mente montanhoso e acidentado, a descoberta
em Sergipe, distante 23 quilômetros de determinado momento histórico, quando e a exploração do ouro justificaram a escolha
Aracaju. A candidatura do bem foi apro- Portugal e Espanha estiveram unidos sob dessa região para o surgimento de uma
vada na reunião de 2008, em Québec, no uma mesma coroa. cidade. Fundada em 1698, a antiga capital
da Província de Minas Gerais se destaca
pela riqueza arquitetônica e pela arte sacra
De acordo com Jurema Machado, o cultural ou de uma civilização viva ou de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho,
que torna um centro histórico patrimônio que tenha desaparecido; escultor e mestre-de-obras; e Manoel da Costa
da humanidade é seu valor universal 4. apresentar um exemplo eminente de Athayde, pintor. A história de Ouro Preto está
excepcional do ponto de vista histórico, um tipo de edifício ou conjunto arqui- ligada à Inconfidência Mineira, movimento
estético, etnológico ou antropológico. tetônico, tecnológico ou de paisagem, pró-Independência do Brasil.
Ela explica que o Comitê do Patrimônio que ilustre um período ou períodos A cidade preserva, até os dias atuais, um
Mundial estabeleceu uma série de crité- significativos da história humana; dos mais ricos conjuntos arquitetônicos do
rios, dos quais ao menos um deve ser 5. ser um exemplo eminente de um esta- país, formados por casarões, igrejas e palácios
atendido para que um sítio histórico seja belecimento humano tradicional, do erguidos durante o Ciclo do Ouro, bem como
incluído na lista: uso tradicional da terra ou do mar, que o maior conjunto barroco do mundo. Rafael
1. representar uma obra-prima do gênio seja representativo de uma cultura (ou Arrelaro, chefe do escritório de Ouro Preto
criativo humano; várias), ou da interação humana com o do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e
2. testemunhar um intercâmbio consi- meio ambiente, especialmente quando Artístico Nacional), explica que o diferencial da
derável de valores humanos, durante este se torna vulnerável sob o impacto cidade é a sua configuração espacial. O relevo
um determinado tempo ou em uma de uma mudança irreversível; bastante acidentado marca a percepção visual
determinada área cultural, quanto 6. estar direta ou tangivelmente associado que as pessoas têm de Ouro Preto.
ao desenvolvimento da arquitetura a eventos ou tradições vivas, ideias, “Esse sobe-desce evidencia uma característica
ou tecnologia, das artes monumen- crenças, ou obras artísticas e literárias marcante da cidade: os telhados cerâmicos. A
tais, do planejamento urbano ou do de significado universal excepcional cidade toda, em sua área de formação colonial,
paisagismo; (o Comitê considera que este critério é constituída por casas cobertas com telhados
3. aportar um testemunho único, ou ao deve preferencialmente ser utilizado cerâmicos. Como cada casa tem o seu telhado
menos excepcional, de uma tradição em conjunto com outros) em uma altura diferente, o resultado é que eles
formam uma movimentação visual. Outra
Anderson Schineider
dos problemas existentes e identificar as
medidas necessárias para deter a deterio-
ração do patrimônio cultural e ambiental
na cidade. Ouro Preto estava perdendo as
características que justificaram o título devido
à deficiência institucional na preservação
do conjunto arquitetônico, urbanístico e
paisagístico.
Para corrigir os problemas, o governo
local criou a Secretaria de Patrimônio e
Desenvolvimento Urbano e aumentou o
número de profissionais que trabalham com
urbanismo e preservação. Já o Iphan ampliou
os investimentos no centro histórico de Ouro
Preto, com destaque para a requalificação olinda, Pernambuco
em 6 de dezembro de 1985. detentora da maior área tombada do mundo período de estagnação econômica no início do
A área urbana, desde os tempos coloniais, – 112,25 km . 2 século XX, um número excepcional de edifi-
é dividida em dois sítios de níveis topográ- Inaugurada em 21 de abril de 1960, a cações históricas foi mantido, fazendo do local
ficos distintos: uma primeira área ao nível Cidade que se tornou ícone da arquitetura um exemplo de cidade colonial ibérica.
do mar, denominada Cidade Baixa, que mundial foi erguida em menos de quatro anos, O centro histórico de São Luís reúne cerca
forma uma estreita faixa entre o mar e uma num arrojado e audacioso plano de mudança de mil imóveis tombados pela União e mantém
colina, separada por um acentuado declive,
que constitui a Cidade Alta. A Cidade Alta é
a parte de Salvador melhor conservada, com Felipe Barreira
Malvino_CBA
Em 4 de novembro de 1997, foi incluído na
lista do Patrimônio Mundial.
O superintendente substituto do Iphan-MA,
Claudio Nogueira, explica que a cidade
distingue-se das demais, do ponto de vista
arquitetônico, por ser um dos maiores conjuntos
de arquitetura civil de origem colonial preser-
vados no país. “A quantidade de edifícios
referenciais – igrejas, palácios, conventos – é
pequena se comparada a outros sítios histó-
ricos, no entanto, o conjunto de sobrados
destinados a habitações, atividades comerciais
e serviços impressiona pela integridade – há
um grande número de quadras que mantém
preservadas as edificações originais e poucos
edifícios destoam do conjunto”.
Do ponto de vista histórico, a expansão
e a construção dos sobrados tiveram como
conseqüência o enriquecimento registrado
no Maranhão entre a segunda metade do
século XVIII e meados da primeira metade
do século XIX, em virtude da exportação
de açúcar e algodão. Nogueira explica que
Centro Histórico de São-Luis, Maranhão
nesse período ocorria a reconstrução de
Lisboa, após um terremoto que destruiu
parte da cidade em 1750, o que influenciou A cidade, inclusive, já esteve na iminência um arraial, que depois recebeu o nome de
a arquitetura da expansão de São Luís. de perder o título de Patrimônio Mundial, Diamantina. Porém, não foi a mineração de
Como exemplo, o azulejo português que em 2008, quando imóveis tombados estavam ouro e sim a descoberta de diamantes que
reveste muitos casarões e levou a cidade a sendo utilizados como estacionamentos. marcou a história da cidade.
ser conhecida como a cidade dos palácios Na época foi realizada uma operação de Diamantina foi uma das primeiras cidades
de porcelana. fiscalização conjunta pelo Iphan, o Depar- tombadas como monumento histórico pelo
Ele lembra que a cidade de São Luís e o tamento do Patrimônio Histórico, Artístico Iphan, em 1938. Em 1999, pelo seu valor
Estado do Maranhão também são ricos no e Paisagístico do Maranhão (DPHAP), a singular e autêntico, foi inscrita na Lista do
campo do patrimônio imaterial, notadamente Fundação Municipal de Patrimônio Histórico Patrimônio Mundial da Unesco.
quando se trata de manifestações populares,
(FUMPH), os ministérios públicos federal Junno Marins, chefe do escritório do
como o Tambor de Crioula, registrado como
e estadual e a polícias estadual e federal. Iphan em Diamantina, ressalta que os
Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil, e
Foram autuados 35 imóveis que possuíam
principais desafios para preservar a cidade
do Bumba-meu-boi.
uso irregular.
são a comunicação com a comunidade por
meio de educação patrimonial, a fiscalização
Patrimônio imaterial DiAMAntinA - MG Animados com a descoberta e a execução de obras exemplares nos bens
Abrange as mais variadas manifesta- do ouro, bandeirantes aventuravam-se pelo tombados. Marins disse que a comunidade
ções populares, que contribuem para interior do Brasil. No início do século XVIII, tem consciência da importância da cidade
a formação da identidade cultural seguindo o curso do rio Jequitinhonha, e ajuda o Iphan a preservar o patrimônio ao
de um povo. encontraram às margens do córrego Tijuco buscar aprovação do órgão nas intervenções
grande quantidade de minério, fundaram em seus imóveis.
Arquitetura vernacular
Cidade de Goiás, Goiás
Aquela que utiliza os materiais
disponíveis em um determinado
CiDADe De GoiáS - Go A origem da Cidade de da Humanidade em 16 de dezembro de local ou região e/ou técnicas de
Goiás está ligada à exploração do território 2001. O Centro Histórico de Goiás já havia construção tradicionais de uma
brasileiro pelos bandeirantes paulistas, que, sido tombado pelo Patrimônio Histórico cultura.
O
atual debate sobre planos de cadastramento do conteúdo cultural do de informações sobre o patrimônio cultural,
ordenamento territorial e desen- território brasileiro, deve ser considerado as maiores dificuldades concentram-se na
volvimento regional no Brasil como estratégico pelos governos nacionais gestão e disponibilização das informações a
passa, necessariamente, pelos e subnacionais para a efetiva integração das toda a população brasileira de forma acessível,
temas sociais, econômicos e ambientais. políticas públicas de desenvolvimento regional amigável e continuada.
Quando se trata de patrimônio cultural o que e preservação do patrimônio cultural. Para se ter uma idéia da urgência de
se observa nos documentos de referência das Será que a população, aí incluídos os reversão de tal cenário, nos últimos anos, o
políticas nacionais são citações esparsas ou tomadores de decisão do setor público e Iphan em parceria com os governos subna-
até a ausência deste tema nas discussões sobre privado, sabem que no Brasil temos mais cionais tem investido recursos para ações
o desenvolvimento do país. Se comparado de 92 conjuntos ou sítios urbanos históricos de reconhecimento e proteção do conteúdo
à política de desenvolvimento regional da tombados pelo Iphan? E que deste total, 46 cultural objetivando ampliar o estoque patri-
Comunidade Européia e às recomendações são Destinos Preferenciais estabelecidos pelo monial e dirimir as desigualdades regionais
das agências internacionais (UNESCO, World Ministério do Turismo para alcançar certi- de proteção do patrimônio cultural, dado que
Bank, etc.) onde a cultura é elemento funda- ficação internacional? Será que os gestores a maioria dos bens protegidos concentra-se
mental de desenvolvimento das atividades do PAC sabem da existência dos mais de 17 nas regiões Sudeste e Nordeste do país. Para
econômicas ligadas ao turismo e à qualidade mil sítios arqueológicos cadastrados ou dos isso, o Iphan desenvolve o Sistema Integrado
de vida urbana, no Brasil o conteúdo cultural diversos caminhos históricos construídos ao de Conhecimento e Gestão-SICG com
de seu território sofre de um processo de longo do processo de penetração das atividades vistas a constituir uma rede de proteção
anomia generalizada. Uma breve reflexão econômicas no Brasil? e preservação do patrimônio cultural de
leva a crer que a agenda de desenvolvimento O Brasil dispõe de mais de 1.125 bens natureza material.
econômico do país desconsidera o patrimônio tombados pelo governo federal, dentre eles É importante destacar que o conhecimento
cultural ou pelo desconhecimento acerca do igrejas, terreiros, jardins históricos, paisagens do conteúdo cultural do território brasileiro
conteúdo cultural do território brasileiro, ou naturais, lugares sagrados, conjuntos ou sítios permite romper com a convivência perversa
pela resistência, em suas políticas nacionais e urbanos dentre tantos outros bens e manifes- entre a assimetria de informações e o cenário
subnacionais, de considerar os instrumentos de tações culturais. Possivelmente se desconheça de crescimento econômico baseado em ações
proteção (inventário, chancela, tombamento, que em uma única região, a do Vale do Itajaí, com forte impacto territorial. Por isso, a adoção
registro) como medidas eficazes de promoção por exemplo, têm-se protegidos conjuntos de políticas de reconhecimento e disseminação
do desenvolvimento nacional. rurais e urbanos, pequenas propriedades de informações sobre o patrimônio cultural
Sob este contexto, cabe aqui um debate e mapeadas sabedorias tradicionais que torna-se ainda mais importante nesse momento
sobre a relevância do acesso universal à configuram uma região cultural com forte em que se observa melhoria nas condições
informação como uma medida de apropriação potencial de desenvolvimento do turismo gerais da economia. Tal condição possibilita
social e política do patrimônio cultural e rural e da produção agrícola certificada. Não uma trajetória de crescimento baseado num
como instrumento eficaz de integração das seriam condicionantes para o desenho dos modelo de desenvolvimento que associe a
políticas públicas de preservação cultural e arranjos produtivos locais? preservação do patrimônio cultural como
desenvolvimento regional. A diversidade cultural nas regiões do instrumento de promoção de outras formas
O cumprimento de tal perspectiva demanda Brasil também se revela nas embarcações de crescimento econômico e social, com base
uma ação concreta na organização e disponibi- tradicionais e sua carpintaria naval observados no Direito à Cultura.
lização das informações do patrimônio cultural. em todo o litoral e bacias hidrográficas, no
Para isto, a ampliação dos investimentos em mobiliário, arquitetura e urbanismo modernos,
tecnologias da informação, o fortalecimento nas paisagens culturais e nas manifestações George Alex da Guia é técnico do Iphan e Coordenador de Conhecimento e
de políticas nacionais e subnacionais de do patrimônio imaterial. Apesar da profusão Inventários do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização-Depam/Iphan.
U
ma questão freqüente nos racterizada e deteriorada pelas desordenadas A Transferência do Direito de Construir,
programas de requalificação de transformações urbanas. por exemplo, pode ser utilizada em parceria
sítios históricos é como tratar Com a criação do Estatuto da Cidade, com o tombamento, a fim de oferecer uma
a população que habita estes concretiza-se o conceito de função social espécie de “compensação” aos proprietários
locais, geralmente composta de pessoas da propriedade, possibilitando o surgimento de imóveis localizados em sítios tombados
de baixa renda, no âmbito de intervenções de uma espécie de “função social do patri- a fim de preservar a ambiência e impedir
cujo objetivo é valorizar a área com novos mônio histórico e cultural”, que resultou em que novas intervenções modifiquem suas
investimentos. uma série de projetos de intervenção em características.
Hoje, o desafio colocado aos gestores perímetros centrais que buscam concatenar Outra possibilidade é a utilização de
destes programas é o de buscar soluções, as necessidades de preservação com outras benefícios fiscais e tributários. Os tributos
tanto de planejamento quanto de projeto, questões urbanas, como a adequação da sobre imóveis urbanos, assim como as tarifas
que evitem que as ações de reabilitação infraestrutura, as políticas habitacionais e relativas a serviços públicos, podem ser
urbana e valorização econômica resultem a inclusão social. diferenciados em função de seu interesse
na expulsão desse contingente populacional, Nessas intervenções se entende que social. Dessa forma, é possível estabelecer
historicamente excluído das benesses preservar o patrimônio histórico é valorizar uma política de subsídios para as tarifas dos
trazidas pelos investimentos públicos no a memória de uma comunidade, fortale- serviços de energia elétrica e saneamento
espaço urbano. cendo os laços de identidade entre as suas para áreas e imóveis urbanos onde morem
A polêmica em torno da estratégia a ser várias gerações. Dessa identidade também pessoas de baixa renda. Esse tipo de política
utilizada nas ações de reabilitação de áreas fazem parte os moradores e as atividades pode ser essencial para manutenção dessa
urbanas degradadas, em especial em sítios tradicionalmente desenvolvidas nas áreas população em imóveis localizados em sítios
históricos, envolve uma disputa entre o tombadas. Esse entendimento é incompatível protegidos, cujo custo de conservação é bem
setor imobiliário e os órgãos de gestão do com a transformação dos sítios reabilitados mais alto que o de imóveis comuns.
patrimônio cultural, que parte do tradicional em cenários para turistas. Outros instrumentos como ZEIS, direito
impasse entre as políticas de preservação e as Quando – além das questões culturais – de preempção, IPTU progressivo, outorga
políticas de desenvolvimento econômico. As existe a proposta de melhorar a qualidade onerosa ou até mesmo programas de locação
primeiras tidas como um fator “engessamento” da habitação ou repovoar os centros, os social podem ser pensados a partir da lógica
da cidade, que impede o crescimento e o imóveis tombados têm o importante papel de de valorização do patrimônio através de sua
desenvolvimento econômico e urbano, e as concretizar o direito a moradia da população apropriação pela população e pela cidade.
últimas consideradas predatórias e a serviço de baixa renda em áreas bem localizadas da Assim, independente da fórmula escolhida,
do grande capital, que destrói a memória cidade, possibilitando que o patrimônio o importante é começar a pensar as ações de
da cidade e de seus habitantes em prol da edificado seja efetivamente apropriado pela preservação no âmbito das políticas de gestão
obtenção de lucros cada vez maiores através comunidade. do uso do solo, partindo do pressuposto que
da especulação imobiliária. Para tanto, é necessário pensar articula- o acesso ao patrimônio cultural faz parte
Nesse contexto, o tombamento ora é tratado damente as políticas de planejamento urbano do processo de democratização do espaço
como um mecanismo de “congelamento” e de preservação, utilizando os instrumentos urbano e promoção de cidades mais justas
da cidade sendo, portanto, visto como um do Estatuto da Cidade para compatibilizar os e democráticas.
empecilho para a sua “modernização”, ora interesses dos diversos segmentos atuantes em
é utilizado por grupos sociais como um dos uma área tombada, de modo a minimizar os
instrumentos que podem garantir qualidade conflitos existentes e promover seu uso por Carolina Bayma Cavalcanti é coordenadora do Programa de Reabilitação
de vida numa cidade gradativamente desca- todos os segmentos da população. de Áreas Urbanas Centrais do Ministério das Cidades
N
o período em que o primeiro Aquele que organizou e, durante 30 anos, do país passou a ser sua atividade principal,
governo Vargas se fecha, instau- foi diretor do atual Instituto do Patrimônio deixando em segundo plano a literatura, o
rando o Estado Novo (1937-1945), Histórico e Artístico Nacional (Iphan) nasceu jornalismo, a política e a advocacia.
contraditoriamente é criado um em Belo Horizonte, Minas Gerais, em 17 de Nos primeiros anos do Sphan, Rodrigo
dos mais importantes marcos da cultura agosto de 1898. Filho mais velho de Rodrigo contou com a colaboração de brasileiros
brasileira: o Serviço do Patrimônio Histórico Bretas de Andrade e Dália Melo Franco de ilustres, como Mário de Andrade, Manuel
e Artístico Nacional (Sphan), que congregou, Andrade, Rodrigo herdou de seus pais o Bandeira, Carlos Leão, Luís Jardim, José de
em sua fase inicial, intelectuais de pensamento gosto pelas letras e artes. Sousa Reis, Lúcio Costa, Edgar Jacinto da
de várias tendências, inclusive de esquerda, Seus primeiros estudos foram feitos Silva, Renato Soeiro, Aírton Carvalho, Afonso
liderados por seu fundador - Rodrigo Melo em casa e no Ginásio Mineiro, de Belo Arinos de Melo Franco, Carlos Drummond
Franco de Andrade. Horizonte. Em Paris, no Lycée de Sailly, de Andrade, Joaquim Cardoso, Gilberto
fez o curso secundário. De volta ao Brasil, Freire, Alcides da Rocha Miranda, Vinícius de
dedicou-se ao curso de Direito, iniciado na Moraes, Celso Cunha, Arthur César Ferreira
Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Reis e Sérgio Buarque de Holanda.
Rio de Janeiro. Foram realizados inventários, estudos e
Em 1921, iniciou sua atividade jornalística, pesquisas, além de obras de conservação,
colaborando no jornal O Dia. O movimento consolidação e restauração de monumentos;
modernista de 1922 passou a ter mais um organizou-se um arquivo de documentos
porta-voz quando Rodrigo aproximou-se e dados colhidos em arquivos públicos
de Mário de Andrade e quando, em 1926, e particulares; reuniu-se valioso acervo
tornou-se redator-chefe da Revista do fotográfico e estruturou-se uma biblioteca
Brasil, de Assis Chateaubriand, aliando-se especializada; pinturas antigas, esculturas e
à luta travada pelos artistas revolucio- documentos foram recuperados e inúmeros
nários de então. bens protegidos, com a criação de museus
Em 1936, por indicação de Mário regionais e nacionais.
de Andrade e de Manuel Bandeira, foi O período em que Rodrigo esteve à frente
convidado pelo ministro da Educação e da instituição de proteção ao patrimônio
Saúde, Gustavo Capanema, para organizar nacional, que vai de 1937 a 1967, ficou
e dirigir o Serviço do Patrimônio Histórico conhecido como “fase heróica”, refletindo
e Artístico Nacional. A proteção a realidade do trabalho realizado.
dos bens patri- Rodrigo faleceu em 1969. Em 1987 o Minis-
moniais tério da Cultura cria o Prêmio Rodrigo Melo
Franco de Andrade, que procura estimular
e valorizar todos aqueles que compartilham
com os ideais do fundador do Iphan.
de Fernando de Noronha
A
Convenção para a Proteção do que é considerado bem cultural por apre- “Devemos entender a riqueza
Patrimônio Mundial, Cultural e sentar sítios pré-históricos de arte rupestre. ambiental não só como um
Natural criada pela organização em Nessa mesma linha, órgãos responsáveis
patrimônio científico, natural.
1972 estabelece diretrizes para que pretendem sugerir regiões da cidade do
países signatários indiquem sítios, naturais
Trata-se de uma gigantesca
Rio de Janeiro, como o Jardim Botânico e
ou culturais, para entrarem para a Lista. Os o Parque da Tijuca, para tornarem-se bens
fonte de inspiração e de
bens naturais devem ser constituídos por culturais da humanidade. criatividade para o homem
formações físicas e biológicas com valor O órgão brasileiro responsável pela indicação que modelou suas culturas em
universal excepcional do ponto de vista de sítios naturais à Lista do Patrimônio Mundial função dessa riqueza”
estético ou científico. Os sítios naturais é o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente
compõem, também, habitats de espécies (Ibama), feitas por meio do Instituto Chico Aziz Ab’saber,
animais e vegetais ameaçadas. geógrafo
Mendes de Conservação da Biodiversidade.
De acordo com Celso Schenkel, coor- Para preservar e manter os bens culturais e
denador do setor de Ciências Naturais da naturais, os países signatários da Convenção Patrimônio Mundial, mas é exemplo dessa
Unesco no Brasil, assim como acontece com contribuem para o Fundo do Patrimônio conciliação entre turismo e preservação.
os bens culturais, a avaliação sobre cada Mundial. Os países comprometem-se a pagar Existem casos em que a Unesco estabelece
candidatura para bem natural é realizada ao fundo, regularmente, de dois em dois anos, patrimônios que estão em perigo. Foi o que
por órgão competente. “Os sítios naturais contribuições que não devem ultrapassar aconteceu com o Parque do Iguaçu, em 1999.
sugeridos pelos países signatários são visi- 1% do que esses países contribuem para o Celso Schenkel, da Unesco no Brasil, conta
tados por equipes da União Internacional orçamento ordinário da Unesco. que, devido a reabertura ilegal da Estrada do
para a Conservação da Natureza, que avaliam Colono por comunidades locais em 1997, a
proteção e gerenciamento locais”, explica. Organização ameaçou retirar o sítio natural
A principal diferença entre sítios cultu- PreservAção e turIsmo Conciliar preservação da Lista caso a estrada não fosse fechada
rais e naturais está no grau de intervenção e turismo é um dos grandes desafios para os definitivamente.
humana. Segundo Carlos Fernando Moura gestores desses sítios naturais. De acordo com Na apresentação do livro da Unesco
Delphim, Coordenador-Geral de Patrimônio Delphim, deve haver uma séria programação Patrimônio Mundial no Brasil, o geógrafo
Natural e Paisagem Cultural do Depam-Iphan, para as atividades turísticas, para que não Aziz Ab’Saber conclui que “devemos entender
paisagem cultural é aquela em que o homem prejudiquem o estado de conservação desses a riqueza ambiental não só como um patri-
insere marcas de suas ações. “De acordo com locais. “Em Bonito (MS), por exemplo, toda mônio científico, natural. Trata-se de uma
a Carta de Bagé, a paisagem cultural resulta visita é guiada e previamente programada, com gigantesca fonte de inspiração e de criatividade
da interação do homem com a natureza”. É o um número limitado de visitantes por período para o homem que modelou suas culturas
caso do Parque Nacional Serra da Capivara de tempo”. Bonito ainda não está na lista do em função dessa riqueza”.
PArque NACIoNAl Do IguAçu Situado no oeste mAtA AtlâNtICA: reservAs Do suDeste A área reservAs DA mAtA AtlâNtICA: CostA Do DesCo-
do Estado do Paraná, fronteira do Brasil protegida constitui-se de 25 unidades de BrImeNto Situada a lesta da costa brasileira,
com a Argentina, o Parque foi inscrito preservação, de várias categorias de domínio, na faixa litorânea que vai do norte do Espírito
como Bem Natural, na Lista de Patrimônio federal (Ibama) e estaduais (parques reservas Santo ao sul da Bahia, a costa do Descobrimento
da Humanidade, em 1986, dois anos após e estações ecológicas) e está dividida foi inscrita em dezembro de 1999, na Lista do
a inscrição do Parque Iguazú, situado em entre os estados de São Paulo e Paraná. Patrimônio Mundial. O conjunto das oito áreas
território argentino. Juntos, os dois parques Com uma área de 493.028 hectares e 200 que compõem a Costa, juntamente com a Mata
abrigam a totalidade das quedas d’água quilômetros de largura, a reserva, inscrita Atlântica do Sudeste e algumas áreas isoladas
denominadas “Cataratas do Iguaçu” e na Lista de Patrimônio da Humanidade no litoral dos estados da Paraíba, Pernambuco
formam uma das maiores áreas de floresta em 1999, é um dos mais significativos e Alagoas, representa um ecossistema bastante
subtropical preservadas no mundo, cobrindo corredores biológicos brasileiros com a ameaçado, sendo que hoje restam apenas
225 mil hectares, dos quais 75% estão em maior concentração de remanescentes da em torno de 8% do total de um milhão de
solo brasileiro. Mata Atlântica do País. quilômetros quadrados originais.
Stock
Bruna Bernacchio
Stock
Da esquerda para a direita: Farol da Barra, na Bahia; Pantanal, no mato grosso do sul; e Cataratas do Iguaçu, no Paraná
187.818
hectares
é a superfície do Pantanal,
localizado na porção sudoeste do
estado do Mato Grosso e noroeste do
estado do Mato Grosso do Sul
ÁreAs ProtegIDAs Do CerrADo O sítio é cons- ÁreAs De CoNservAção Do PANtANAl Com IlhAs AtlâNtICAs BrAsIleIrAs: reservAs
tituído por dois parques nacionais – Parque uma superfície inscrita de 187.818 hectares, De FerNANDo De NoroNhA e Atol DAs roCAs
Nacional das Emas e Parque Nacional Chapada esse sítio localiza-se na porção sudoeste Localizado ao largo da costa nordeste do
dos Veadeiros – localizados no estado de do estado do Mato Grosso e noroeste do Brasil, esse sítio natural, inscrito da Lista
Goiás, totalizando 373.953 hectares. Graças estado do Mato Grosso do Sul, adjacente à de Patrimônio da Humanidade em 2001,
à sua posição central e à variação de altitudes fronteira com a Bolívia. Inscrita em 2000, é um complexo insular tropical que possui
que as caracterizam, essas áreas serviram de a área é representativa do conjunto do 2.454.400 hectares. As áreas núcleos, referentes
refúgio relativamente estável para as espécies Pantanal e ilustra os processos ecológicos e às unidades de conservação, correspondem
quando mudanças climáticas ocasionaram biológicos em curso na região. A associação a 68.000 hectares, na Reserva Biológica
o deslocamento do Cerrado para o eixo dos montes Amolar e dos ecossistemas Marinha do Atol das Rocas, e 13.000 há,
norte-sul ou leste-oeste. O sítio, inscrito como dominantes de zonas úmidas de água doce no Parque Nacional Marinho Fernando
Patrimônio Mundial em 2001, apresenta um conferem um apelo ecológico inigualável. O de Noronha. Essas áreas destacam-se por
mosaico com todos os habitats essenciais que sítio tem ainda um papel chave na dispersão suas particularidades, constituindo singular
caracterizam esse ecossistema, abrigando das matérias nutritivas por toda a bacia sistema emerso e submerso da porção
60% de todas as espécies da flora e quase e constitui a reserva mais importante da tropical do Atlântico Sul.
80% de todas as espécies de vertebrados região para a manutenção do estoque de
descritas no Cerrado. peixes do Pantanal. *com informações do livro da Unesco: Patrimônio Mundial no Brasil
originalmente publicada na edição 60 | mar/abr/2009
Patrimônios no mundo
Com 970 sítios registrados na Lista do registrados 31 sítios, dos quais a África é a nenhum patrimônio registrado. Até hoje
Patrimônio Mundial, a Unesco (Organização região com o maior índice, com 39%. apenas dois sítios foram retirados da Lista
das Nações Unidas para Educação, Ciência e A Convenção para a proteção do patri- do Patrimônio Mundial: o Vale Dresden
Cultura) apresenta estatísticas que mostram a mônio mundial, cultural e natural, de Elbe, na Alemanha, retirado em 2009, e o
distribuição desses locais no mundo. Europa 1972, foi assinada por 187 Estados-parte. Santuário Árabe de Orxy, de Oman e que
e América do Norte possuem quase a metade As inscrições na lista da Unesco tiveram saiu da lista em 2007.
dos patrimônios inscritos, com 49% do total. início em 1978 e 39 países, daquele total que
Na Lista dos Patrimônios em Perigo estão assinou à Convenção, ainda não possuem Todos os dados foram fornecidos pela Unesco e pelo Iphan.
Estados-parte
Cultural/
9% Regiões Cultural Natural Total com propriedades
14% Natural inscritas
7%
África 42 33 3 78 29
Estados Árabes 60 4 1 65 16
21% Ásia e Pacífico 129 48 9 186 * 28
19% África 1 11 0 12
Estados Árabes 5 0 0 5
39%
6% Ásia e Pacífico 5 1 0 6
1.118
Culturais (INRC): 52 inventários realizados; 5 Pontões de Cultura
concluídos até 2009; 39 inventários implantados.
em andamento. ■ Bens incluídos na Lista Representativa
■ Bens Registrados como Patrimônio do Patrimônio Cultural Imaterial
Cultural Brasileiro: 19 bens registrados;
25 em processo de instrução técnica.
da Humanidade: Samba de Roda
no Recôncavo Baiano/BA e Arte
bens
■ Ações de apoio e fomento: 15 planos Kusiwa – Pintura corporal e arte tombados pelo Iphan no Brasil
de salvaguarda de bens registrados gráfica Wajãpi/AP.
Gráfico 4: Número de bens tomabados por região Gráfico 3: Número de bens tomabados por estado
INDO PESCAR – Depois da melhoria na qualidade da água realizada pelo governo local, pescadores em Xiapu aproveitam suas vidas de pesca.
Como você vê o desenvolvimento? exemplos de pessoas vencendo a luta contra localizada no escritório do IPC e será
Como retratar uma face humana do a pobreza, a marginalização e a exclusão aberta para visitação pública. Uma série
desenvolvimento? Como os programas e social. Chamando-se a atenção para os de exposições fotográficas também será
iniciativas do desenvolvimento melhoram sucessos obtidos, a campanha pretende organizada em diversas cidades ao redor
das pessoas uma vida? A Campanha contrabalancear as imagens frequentes do mundo.
Mundial de Fotografia “Humanizando o que mostram desolação e desespero. Uma
Desenvolvimento” busca mostrar e promover galeria de fotos será permanentemente