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29/01/2019
Foto: Darlan Brito Cientistas concluíram que a presença das cinzas das
queimadas altera a composição química do solo e,
quando ocorre o escoamento superficial após uma
chuva, substâncias presentes nelas atingem as águas
subterrâneas e superficiais, contaminando-as.
Compostos nitrogenados e potássio, especialmente, se
solubilizam na água e, em altas concentrações, se
tornam tóxicos às espécies aquáticas e aos organismos
do solo e também afetam a qualidade da água.
Apesar desses pontos positivos, pesquisas desenvolvidas pela Embrapa Cerrados (http://www.embrapa.br
/cerrados) (DF) apontaram que as cinzas de queimadas provocaram na água subterrânea baixa oxigenação,
aumento de pH (potencial hidrogeniônico) e presença de compostos químicos, como potássio e nitrato
(nitrogênio nítrico). Os microcrustáceos e os peixes foram os mais sensíveis às mudanças no ambiente
aquático e as alterações também afetaram espécies da macrofauna do solo, como os enquitreídeos
(“minhoquinhas brancas”).
A primeira consequência das cinzas nos ambientes aquáticos é a redução de oxigênio dissolvido na água em
ambiente lêntico, ou seja, em água parada como em lagos, açudes, poços e reservatórios. O oxigênio
dissolvido é essencial para a subsistência de peixes e outros seres aquáticos, além de auxiliar na
decomposição natural da matéria orgânica.
As cinzas também provocaram aumento de pH, que influencia a qualidade da água. O potencial hidrogeniônico
é uma escala que mede o nível de acidez da água. A recomendação da American Public Health Association é
que o pH varie de 7 a 10, o que caracteriza uma água neutra ou alcalina. “Só por baixar o oxigênio, a cinza já
afeta as espécies aquáticas, pois aquele local estará ’morto‘ por um tempo”, ressalta o pesquisador da Embrapa
Eduardo Cyrino de Oliveira Filho.
Para fazer as análises, foram desenvolvidos experimentos em laboratório. As cinzas retiradas de locais de
queimada foram colocadas em recipientes de água com oxigenação. A espécie mais sensível foram os
microcrustáceos. Cyrino esclarece que faltaram nesses experimentos testes com algas. Assim como as plantas,
as algas precisam de nutrientes para seu crescimento e, portanto, teoricamente, a população de algas deve
aumentar em uma água contendo cinzas.
Dando continuidade às pesquisas, nos anos de 2013 a 2016 foi executado o “Projeto Cinzas: aspectos
motivacionais de uso do fogo e efeitos sobre a água e o solo como subsídios para mitigação dessa prática na
agricultura”, também financiado pelo CNPq.
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Convém salientar que o uso do fogo é permitido em atividades agropastoris, quando for utilizado em processos
de queima controlada, isto é, o uso do fogo em áreas com limites físicos previamente estabelecidos. Para tanto,
a autorização deve ser obtida no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais (Ibama
(https://www.ibama.gov.br/)) ou em órgão ambiental estadual.
O objetivo do Projeto Cinzas foi integrar dados ambientais a sociais. “A integração dos dados obtidos na
temática ambiental aliados aos da análise do aspecto comportamental permitirá a elaboração de instrumentos
de transferência mais sólidos, contendo não só indicações técnicas, mas informações próximas da realidade
que possam gerar maior impacto nas comunidades visando à mitigação do uso do fogo na agricultura”, destaca
o cientista.
Os pesquisadores realizaram testes laboratoriais de toxidade crônica em larvas de peixe, caramujo e larvas de
vermes de solo. As espécies ficaram maior tempo expostas às cinzas para verificar os danos causados ao
organismo. Em alta concentração de cinzas (a partir de 50 gramas de cinza em um litro de água), as espécies
aquáticas e os organismos de solo não sobrevivem.
A matéria orgânica foi alta na área queimada em todo o período analisado, em função da grande quantidade de
material vegetal ainda remanescente, bem como raízes queimadas. Também foi observado grande aumento
nas concentrações de nitrogênio no solo logo após o evento de queimada. Entre as formas de nitrogênio, o
nitrato foi aquele que mais aumentou, retornando aos níveis do solo da área não queimada após 60 dias.
A qualidade da água é determinada pela quantidade e pela qualidade dos minerais que ela contém. O aumento
desses elementos pode tornar a água tóxica. Para monitorar a presença dos minerais foram construídos dois
poços artesianos. Um no local em que ocorreu a queimada e outro em área paralela que não sofreu ação do
fogo, usada como área controle.
A água do poço aberto em local de queimada apresentou aumento de cálcio, magnésio, nitrato e, em alguns
meses, de potássio. Cyrino explicou que os valores de nitrato observados na água subterrânea podem ter sido
decorrentes da lixiviação desse componente, principalmente pelo fato de o solo do Cerrado ser mais arenoso.
Os níveis de nitrato na água, como acrescenta o pesquisador, podem também ser decorrentes da alta
decomposição da matéria orgânica queimada no solo, o que gerou nitrato no solo como resíduo da
decomposição. Apesar do aumento da concentração de nitrato na água do poço, o valor foi abaixo do máximo
permitido para uso da água subterrânea no consumo humano. De acordo com Resolução do Conama
(396/2008), o limite máximo é de dez partes por milhão (ppm).
A concentração maior de potássio na água subterrânea foi verificada logo após a queimada. Nos meses
seguintes, os valores sofreram redução, e, próximo de um ano após a queimada, a concentração foi
praticamente semelhante à verificada na área de controle. “Essa água ficou contaminada por um tempo. Em
alguns meses, a concentração de potássio passou do nível permitido para água potável. Isso significa que essa
água não podia, nesse período, ser usada para consumo in natura. Para se tornar água potável, precisaria de
tratamento específico”, conta o pesquisador.
Os valores de cálcio e magnésio foram maiores no período chuvoso e bem baixos no período seco. Os
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pesquisadores concluíram que não houve uma influência da presença de cinzas no solo sobre esses
parâmetros na água subterrânea, o que indica ausência de lixiviação de cálcio e magnésio em área de
queimada.
Os resultados apontaram que os agricultores fazem uso do fogo para limpeza e preparo do solo antes do
plantio e para a construção de aceiros nas áreas de produção. Os aceiros são faixas livres de vegetação
(o solo fica descoberto), que atua como barreira para retardar ou impedir o progresso de incêndio florestal.
Além disso, eles também utilizam o fogo para queima do lixo doméstico e dos resíduos oriundos da
agricultura (técnica da coivara).
Dos 34 entrevistados, 18 fazem buraco em sua propriedade para queimar o lixo agrícola e doméstico e 15
adotam a prática para limpeza de solo da área de produção. Embora concordem que a prática do fogo
gera impactos negativos ao meio ambiente, os agricultores afirmaram que a mantêm por causa de sua
facilidade.
“Torna-se perceptível que há um dilema entre decidir por fazer ou não o uso do fogo, uma vez que esse
recurso é um facilitador das atividades a serem desempenhadas”, comenta o pesquisador da Embrapa
Francisco Eduardo de Castro Rocha, ao acrescentar que há também uma forte influência do sentimento
de controle, isto é, excesso de confiança de que se pode controlar a situação e que não existe fator de
perigo ou pode-se minimizá-lo.
Na análise do discurso dos entrevistados percebeu-se que os agricultores são fortemente influenciados
por pessoas conhecidas que utilizam o recurso e instituições ou pessoas que apoiam o uso do fogo de
forma controlada. As crenças são elementos de peso na decisão do agricultor em adotar ou não o fogo,
pois eles têm como recursos motivadores o comportamento de outros, como os vizinhos, e condições
propícias para a realização dessa prática.
Outra demanda é a instrução de como utilizar corretamente os equipamentos para reduzir a ocorrência de
acidentes nas propriedades rurais, como incêndios e morte de animais, bem como os impactos
ambientais.
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