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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
EHRHARDT JÚNIOR, Marcos; PEIXOTO, Erick Lucena Campos. Breves notas sobre a
ressignificação da privacidade. Revista Brasileira de Direito Civil (RBDCivil). Belo Horizonte. V. 16,
p. 35-56, abr./jun. 2018.
CNPQ. Currículo do sistema de Currículos Lattes. Informações sobre o Me. Erick Lucena Campos
Peixoto. Disponível em: <http://lattes.cnpq.br/5929056794191111>. Acesso em: 31 jul. 2020.
CNPQ. Currículo do sistema de Currículos Lattes. Informações sobre o Dr. Marcos Ehrhardt Júnior.
Disponível em: <http://lattes.cnpq.br/7254531183116373>. Acesso em: 31 jul. 2020.
Marcos Ehrhardt Júnior é Advogado, Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE) e Mestre pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Professor de Direito Civil dos cursos
de mestrado e graduação da Universidade Federal de Alagoas. Professor de Direito Civil e Direito do
Consumidor do Centro Universitário CESMAC. Pesquisador Visitante do Instituto Max-Planck de
Direito Privado Comparado e Internacional (Hamburgo ? Alemanha). Líder do Grupo de Pesquisa
Direito Privado e Contemporaneidade (UFAL). Editor da Revista Fórum de Direito Civil (RFDC).
Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Civil (IBDCIVIL). Presidente da Comissão Nacional
de Enunciados do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), Membro Fundador do Instituto
Brasileiro de Direito Contratual (IBDCont) e do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade
Civil (IBERC).
OBJETIVO PRINCIPAL
Tecer considerações acerca do possível conceito de privacidade, assumindo seu caráter
plurifacetado, entendendo a mesma a partir de três dimensões diversas, com o fito de identificar
problemas específicos a cada dimensão, sendo a localização do direito violado a melhor forma
de reparar o dano em um contexto da sociedade da informação.
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OBJETIVOS SECUNDÁRIOS
Discorrer sobre a possibilidade de um conceito de privacidade, identificando-se seu caráter
plurívoco e geral, assumindo a privacidade um valor localizado para cada tempo e espaço;
Abordar a privacidade como dividida em três dimensões distintas, mas correlacionadas,
objetificando delimitar os problemas de cada dimensão, assim como suas determinantes,
pretendendo, com isso, localizar com precisão o direito violado por uma lesão à privacidade;
Defender ser a teoria tridimensional da privacidade idônea o suficiente para, através do
detalhamento do dano e do direito lesado, compor a extensão da lesão sofrida, conforme as
circunstâncias de cada caso;
Defender a necessidade da atualização da abordagem acerca da privacidade na nova sociedade
da informação, baseada no processamento massivo de dados dos sujeitos, a partir da
hiperconectividade, do garimpo informacional e da vigilância ostensiva.
Abordar, como primaz, a dimensão informacional da privacidade, considerando a importância
assumida por tal dimensão da privacidade na sociedade informacional contemporânea,
localizando nessa dimensão as condutas mais comuns e complicadas de violação da privacidade.
PALAVRAS-CHAVE
Teoria tridimensional da privacidade; controle de acesso; dados pessoais; autodeterminação
informativa.
palavra que se liga, por fim, ao adjetivo privatus da língua latina. Na sociedade romana, o termo
caracterizava aquilo que era adverso ao publicus, o público, pertencente ao povo romano.
Privatus, ainda, dizia daquele cidadão romano cuja atividade não se referia a uma função estatal
romana. Esta condição, por sua vez, não era bem vista à época antiga, sendo digna de desaprovação a
conduta não orientada para o exercício de funções públicas.
Assim, vê-se que o conceito de privacidade gera-se no Ocidente, de maneira singular. A
privacidade, nessa monta, não é universal, assumindo os contornos com os quais se apresenta na
contemporaneidade a partir do tratamento do caso Olmstead v. United States pela Suprema Corte dos
Estados Unidos da América.
Cabe ressaltar, de toda forma, como a privacidade, mesmo no séc. XIX, colocava-se como
restrita às camadas mais privilegiadas da sociedade. Nos anos do reinado da Rainha Victoria, gozar de
um espaço restrito para si era prerrogativa de grandes senhores, enquanto era regra a impossibilidade de
desfrutar de mínima privacidade em meio à pobreza.
Como já abordado em outros trabalhos da corrente disciplina, a Warren e Brandeis deve-se o
pioneirismo teórico nos assuntos da privacidade. Ambos compilaram decisões antigas acerca do direito
de estar só, calcadas na violação de direitos como da propriedade e sobre situações de difamação,
elaborando, depois, o artigo o qual entraria para a posteridade como marca da retomada teórica acerca
do right to be let alone.
Para ambos, havia um princípio histórico e amplo na commow law cuja existência respaldava a
proteção da privacidade, a partir de uma salvaguarda do indivíduo em seus mais verdadeiros direitos
fundamentais.
O direito da privacidade, identificado por Warren e Brandeis estaria relacionado à proteção do
indivíduo na dimensão de seus pensamentos, sentimento e emoções serem mantidos de forma segura.
Cuidava-se, assim, da possibilidade de uma tutela abusiva acerca de determinadas informações do
sujeito causar danos profundos a seus direitos fundamentais.
Dessa maneira, a abordagem dos autores evidencia um tratamento psicológico/espiritual de um
instituto jurídico, o que não era corrente à tradição jurídica da época, acostumada que estava a institutos
exteriores ao indivíduo, como a propriedade ou a liberdade.
Na Europa, a Alemanha Ocidental inaugura a proteção de dados de maneira legislativa, em
1970, por meio da Hessisches Datenschutzgesetz. Em 1973, a Suécia passa a ser o primeiro país na
Europa a ter uma legislação nacional de proteção de dados, sendo esta a base para o desenvolvimento
de outras legislações nesse sentido no continente europeu.
Há uma diferença de aspecto temporal entre o tratamento da privacidade na Europa e nos
Estados Unidos. Nos EUA, já havia uma preocupação com a privacidade desde o séc. XIX, enquanto
que na Europa a privacidade será eleita como alvo determinante apenas após o fim do período das
grandes guerras, mormente depois da invenção do computador.
Vê-se, nesse sentido, ser a privacidade ao estilo americano mais direcionada ao direito de não
ser incomodado, direito este a derivar do próprio direito à vida ou à integridade corporal, os quais, em
tal aspecto,, expandem-se para assumir faceta moral. Já na Europa, o aspecto físico ressaltado na
vertente da privacidade americana perde espaço em razão da preocupação com a potencialização das
forças tecnológicas.
Com a invenção do computador, estava-se diante de uma maximização da capacidade de
processamento e coleta de dados individuais. Ademais, no Velho Mundo, a proteção à privacidade
direcionava mais à proteção das informações individuais contra o Estado, a partir de uma tutela
protetiva vertical, enquanto que nos EUA, busca-se desenvolver uma proteção do direito da privacidade
mais atrelada à segurança do indivíduo contra intervenções de particulares.
Nos EUA, ainda, observa-se emanar o direito de privacidade dos direitos individuais,
possuidores de caráter negativo. Já na comunidade europeia, a proteção da vida privada advém de
valores coletivos, sendo marcada por aspectos de direito público, arguindo proteção positiva estatal para
salvaguarda de dados. Na Europa, assim, há uma razão positiva da proteção da privacidade em seus
mais diversos aspectos. Busca-se estabelecer, aí, proteção contra os órgãos estatais de controle, em
especial, proteção de minorias em face desses órgãos. Há, portanto, um “aspecto social da privacidade”
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(Pág. 42).
Os anos 70 serão marcados pelo debate aguerrido tanto na doutrina quanto na legislação acerca
da proteção, da coleta e do uso de dados pessoais. Nesse momento, deu-se tal amplificação das
discussões devido aos desdobramentos da tecnologia. Neste contexto, o fluxo de dados tornou-se maior,
não se limitando às fronteiras dos Estados, principalmente, através da criação de diversos bancos de
dados.
Em 2013, a OCDE, por sua vez, atualizará as diretrizes legais determinadas em 1980 sobre a
gestão de riscos na proteção da privacidade, visando empolgar uma abordagem ampla da privacidade,
mediante o tratamento de suas mais diversas dimensões.
Nessa conjuntura, elaborou-se o direito à privacidade como direito à autodeterminação
informativa, considerando os aspectos da sociedade da informação, os quais conformam a informação
como um bem autônomo de estratégico espaço na vida humana.
Em semelhante conjuntura, tornou-se comum a massificação das informações compartilhadas
entre universos infinitos de sujeitos, assumindo a coleta de informação um caráter abstrato. Destarte, a
coleta e o processamento de dados diversos assumiu, também, um aspecto deletério, considerando a
possibilidade mau uso das informações garimpadas. Cunhou-se, portanto, o conceito de tecnologias
sujas, na medida em que se torna possível fazer uma analogia entre as mesmas e severos poluentes
industriais. Mais determinante, ainda, para o contexto marcado por essas tecnologias sujas é sua
inserção e difusão na vida privada, atuando, inclusive, para dissolver a separação palpável entre a esfera
privada e pública da vida.
Utilizando-se dos pressupostos levantados por Rodotà, os autores concluem para identificação
de alguns paradoxos nessa sociedade informatizada. Primeiro, o aumento da coleta e do processamento
de dados e informações possibilitou mais transparência nas atividades dos coletores de dados, sejam
eles públicos ou privados.
Depois, informações de caráter público passaram a receber a proteção oferecida outrora
somente a dados privados, indicando, assim, uma preocupação para que não se use esses dados de
maneira discriminatória. Como resultado, a privacidade assumirá um aspecto social e político para além
da vida individual, constituindo, dessa forma, uma das dimensões da própria cidadania.
Para os mesmos autores, a privacidade, como direito, abrange as garantias de proteção de um
conjunto de dados pessoais, assim como um controle individual das informações e dados concernentes a
si.
Um direito fundamental é erigido, nesse diapasão, um direito à autodeterminação informativa,
encaixado como pressuposto da cidadania, impossibilitada, então, sua tutela relegada à
autodeterminação pessoal ou à autorregulamentação mercadológica e negocial.
Nesse contexto, algumas estratégias são reputadas como mecanismos reais de proteção à
privacidade na sociedade da massificação da produção e da coleta de dados. 1. Há que se falar de um
“direito de oposição” (Pág. 44), isto é, uma garantia de viés negativo contra a coleta e a circulação de
informações pessoais; 2. Há um “direito de não saber” (Pág. 44), fluindo do direito de oposição,
consubstanciando, assim, proteção contra as formas de marketing abusivo, a proteção de dados de saúde
e contra informações não solicitadas ou desejadas; 3. Direito à soberania acerca da finalidade dos dados
coletados, estabelecendo uma salvaguarda preventiva da privacidade informacional, exigindo-se o
controle sobre o motivo e o destino da coleta de dados pessoais por terceiros; 4. Existe um “direito ao
esquecimento” (Pág. 44), significando a necessidade da destruição de certas informações, uma vez que
sua finalidade seja alcançada ou que se compute determinado lapso temporal de seu primeiro
processamento.
De toda maneira, as estratégias exemplificadas supra necessitam ser solidificadas em
mecanismos concretos de proteção. Nessa situação, porém, discute-se a natureza dessa proteção devida,
se levada a diante por mecanismos públicos ou privados de ação? Seria a tutela por meio desses
instrumentos confiadas à coletividade ou ao próprio indivíduo?
Concluem os autores pela necessidade de conjugação dos mais diversos mecanismos de tutela da
privacidade informacional, assumindo os instrumentos já utilizados na proteção aspectos dinâmicos de
abordagem e se descobrindo novos mecanismos para concretizar a proteção da informação nas suas
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assume apenas uma figura física no contexto ora trabalhado, mas uma interseção, tendo em vista a
consubstanciação de duas dimensões, de caráter decisional e também espacial da privacidade.
CITAÇÕES EMBLEMÁTICAS
“As raízes da privacidade nos Estados Unidos estão em um direito do indivíduo, de caráter negativo, enquanto
que as raízes europeias estão também na sociedade, apresentando características de direito positivo, no qual se
exige do Estado que se tomem medidas para garantir a proteção de dados pessoais, como a instalação de órgãos
de controle, além de a proteção visar grupos minoritários que podem sofrer discriminações com a exposição de
seus dados pessoais. Na Europa se desenvolve o aspecto social da privacidade” (Pág. 42).
“[...] A privacidade, segundo o professor italiano, passa a se impor como um direito fundamental, especificando-
se como ‘direito à autodeterminação informativa’, e, mais especificamente ainda, ‘como direito a determinar as
modalidades de construção da esfera privada na sua totalidade’. Apresenta-se, também, ‘como precondição da
cidadania na era eletrônica’, não podendo ser confiada à lógica da autorregulamentação ou das atividades
contratuais” (Pág. 44).
“Na maioria das vezes, quando se diz que um indivíduo sofreu uma violação da privacidade, na verdade, o que se
está querendo dizer é que ocorreram várias violações em vários direitos da privacidade, e até em dimensões
diferentes desta. Uma pequena postagem em uma rede social pode facilmente ferir o direito à honra, à imagem, à
proteção de dados pessoais, à intimidade etc. Por conseguinte, determinada violação à privacidade, alcançado
mais de uma dimensão, exige uma resposta mais complexa, compreensiva de todos os matizes da violação” (Pág.
53).
EVENTUAIS DÚVIDAS
Sendo o texto em questão claro, conciso e preocupado em tecer classificações de maneira organizada,
não restaram dúvidas significativas acerca do mesmo após sua leitura e análise, pedindo o aluno
permissão para que calado permaneça.