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Unis - MG
Centro Universitário do Sul de Minas
Unidade de Gestão da Educação a Distância – GEaD
Av. Cel. José Alves, 256 - Vila Pinto
Varginha - MG - 37010-540
Mantida pela
Fundação de Ensino e Pesquisa do Sul de Minas – FEPESMIG
Varginha/MG
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Avaliação de Aprendizagem
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Avaliação de Aprendizagem
REITOR
Prof. Ms. Stefano Barra Gazzola
GESTOR
Prof. Ms. Wanderson Gomes de Souza
Supervisora Técnica
Profª. Ms. Simone de Paula Teodoro Moreira
Design Instrucional
Prof. Celso Augusto dos Santos Gomes
Rogério Martins Soares
As Autoras
SIMONE DE PAULA TEODORO MOREIRA – simoneteodoro@sabe.br
Licenciada em Matemática, Física e Desenho Geométrico, especialista em Educação
Matemática e Redes de Computadores pelo UNIS/MG e em Informática em Educação pela UFLA.
Mestre em Tecnologias para Educação. Supervisora Técnica da Educação a Distância e professora
universitária nos cursos a distância e presenciais do UNIS/MG.
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Avaliação de Aprendizagem
ÍCONES
REALIZE. Determina a existência de atividade a ser realizada.
Este ícone indica que há um exercício, uma tarefa ou uma prática para ser
realizada. Fique atento a ele.
PENSE. Indica que você deve refletir sobre o assunto abordado para responder a
um questionamento.
HIPERLINK. Indica um link (ligação), seja ele para outra página do módulo
impresso ou endereço de Internet.
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Avaliação de Aprendizagem
Sumário
APRESENTAÇÃO ........................................................................................................................................... 7
EMENTA........................................................................................................................................................... 8
1 TEORIA DO CONHECIMENTO ....................................................................................................... 9
2 O CONHECIMENTO E SUAS VÁRIAS DIMENSÕES ................................................................... 15
3.1 CONCEPÇÕES DE CIÊNCIA .................................................................................................... 25
4 LEITURA E EXPRESSÃO ESCRITA ............................................................................................. 29
4.1 LEITURA, ESCRITA E PROBLEMA DE PESQUISA ................................................................ 30
4.2 RESUMO ................................................................................................................................... 37
4.3 APONTAMENTOS SOBRE A PRÓXIMA UNIDADE................................................................ 37
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................... 38
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Filosofia E Educação
APRESENTAÇÃO
Caro (a) aluno (a),
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Filosofia E Educação
EMENTA
O conhecimento científico, a ciência e o senso comum. O Método e Metodologia
científica. Técnica de esquematizar e resumir. Tipos de fichamentos e referências
bibliográficas. Redação do trabalho: estrutura lógica, estilo e citações. Apresentação
formal do trabalho. Seminário Normas da ABNT.
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Filosofia E Educação
TEORIA DO CONHECIMENTO
1 TEORIA DO CONHECIMENTO
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Filosofia E Educação
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Filosofia E Educação
O quadro acima nos deixa ver como o surgimento da filosofia modificou a forma
de conceber o que sabemos sobre o mundo. No paradigma anterior, o da mitologia,
havia uma relação direta entre crença e verdade (como se no quadro acima não
existisse a parte amarela): a verdade era tudo aquilo em que acreditamos por vontade
ou forçados. Com o surgimento da filosofia, uma nova noção se interpõe entre crença e
verdade: o conhecimento. Partindo das crenças (pressupostos), o filósofo analisa de
forma metódica e racional as supostas verdades para chegar ao conhecimento
“verdadeiro” a respeito dela.
Podemos dizer que a epistemologia e ciência se confundem. Ambas se voltam
para o aspecto da validação da verdade a respeito da vida. Opondo a crença ou opinião
("doxa", em grego) e o conhecimento, o pensamento grego nos dá a ver que a crença é
um ponto de vista subjetivo e não justificado a respeito das coisas, e que para
“conhecer” de fato o mundo, é preciso usar de métodos comprováveis.
O conhecimento filosoficamente atestado resulta naquelas informações que
descrevem e explicam o mundo natural e social que nos rodeia com riqueza tal que nos
permite entender o que ocorre e como (diferente dos artesãos, que criavam ferramentas
funcionais, mas sem se preocupar em saber como elas funcionavam). Portanto, a
epistemologia trabalha com evidências que não se confundem com um sentimento de
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Filosofia E Educação
que estamos próximos da verdade. Evidência, aqui, tem o sentido forense, exige provas
consistentes, mesmo que elas contrariem nossas impressões primeiras.
O modo sistemático e abstrato de olhar para o mundo que floresceu na Grécia,
posteriormente disseminou-se pela (hoje) Europa através do Império Romano (27 a.c –
476 d.c). Embora a Grécia tenha sido dominada pelos romanos, sua cultura prevaleceu,
por ser mais forte, e o mundo romano traduziu para o latim toda a sabedoria grega,
inclusive os modos de fazer ciência.
A sabedoria grega foi cultivada no império romano até o ano de 313, quando o
Imperador Constantino foi acomedido pela hanseníase, doença mortal àquela época. Os
médicos pagãos, que seriam imolados caso não salvassem o rei, aconselharam o
déspota a se banhar no sangue de três mil crianças para se curar. Na iminência da
carnificina, os cristãos romanos convenceram o rei de que ele seria curado caso se
convertesse ao cristianismo, uma crença proibída no império. Conta a história que o rei
se converteu e curou-se. A partir de então, o conhecimento científico sofreu um revés e
refloresceu no ocidente a orientação messiânica, o que durou até o final da idadé
média, nos idos do século XV.
Havendo passado por esta breve história da primeira ascenção e queda do
conhecimento científico no ocidente, podemos retomar a questão das evidências, que
vínhamos discutindo. Mesmo com o renascimento do conhecimento religioso, a ciência
não parou de desenvolver-se longo da história, e a reflexão sobre a objetividade das
evidências levou os filósofos a assumirem diferentes posturas diante dos seus objetos
de estudo. Tais diferenças ficaram conhecidas como atitudes científicas.
Vamos conhecer melhor algumas atitudes científicas possíveis?
Ainda seguindo Lakatos (2000), ante a questão da possibilidade do
conhecimento, o sujeito pode tomar, entre outras, as seguintes atitudes:
Dogmatismo: atitude filosófica defendida por Descartes segundo a qual
podemos adquirir conhecimentos seguros e universais,e ter absoluta certeza disso.
Cepticismo: atitude filosófica oposta ao dogmatismo, que duvida que seja
possível um conhecimento firme e seguro (no sentido de definitivo) a respeito do
mundo.
Relativismo: atitude filosófica defendida pelos sofistas (opositores ao
pensamento platônico) que nega a existência de uma verdade absoluta e defende a idéia
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Filosofia E Educação
de que cada indivíduo possui sua própria verdade. Esta verdade depende do espaço e do
tempo.
Perspectivismo: atitude filosófica que defende a existência de uma verdade
absoluta a qual nenhum de nós pode conhecer inteira, só podemos compreender
pequenas partes. Cada ser humano tem uma parte da visão da verdade.
Essa gama de atitudes filosóficas frente ao conhecimento nos mostra que,
conforme o objeto de estudos ou a natureza do problema pesquisado, podemos
desenvolver essa ou aquela postura para circunscrever o alcance do nosso rigor, de
modo a não deixar que ele avance para o campo da crendice. Assim, o estudo de objetos
do mundo natural ou do universo completamente abstrato da matemática podem ter
como abordagem a atitude dogmática. Porém, em se tratando de objetos sociais, isto é,
do nosso universo cultural, essa perspetiva não pode prevalecer, sendo mais adequadas
as atitudes perspectiva ou relativista. O ceptismo foi a abordagem que fez a filosofia
caminhar, ao lado do perspectivismo. Entre essas duas últimas, temos duas direções
racionais opostas. No perspectivismo analisa-se os objetos em particular pela descrença
no universal. No ceptismo, pesquisa-se os casos particulares em sua relação universais
conceituais dos quais o particular participa.
Até aqui, vimos que o conhecimento científico nasce por oposição ao
conhecimento reliogiso, e conhecemos um pouco dos conflitos internos do fazer
científico. Agora, vamos estudar um pouco sobre as fronteiras externas desta forma de
conhecimento, relacionando-a com outros modos de saber também bastante praticados.
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Filosofia E Educação
O CONHECIMENTO
2 O CONHECIMENTO E SUAS
E SUAS VÁRIAS DIMENSÕES
VÁRIAS DIMENSÕES
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RESPOSTA COMENTADA
O primeiro aspecto que chama nossa atenção ao pensar o poema em relação aos
conceitos de conhecimento científico e religioso que estudamos é o título do poema.
Ao passo que a ciência tem a questão da verdade, e portanto do que é certo, como
finalidade, o poema se anuncia como um “Erro”.
Lendo o poema, depreende-se que, pela metáfora ou metonímia da roupa, o poeta
discute a imposição da cultura científica européia ao índio. Relacionando com a
questão das formas de conhecimento, é como se o poema sugerisse que os portugueses
cometeram um erro ao não deixar os índios despí-lo de sua cultura (cientifica) para
vestí-lo com a cultura (popular, indígena).
Entretanto, mesmo tento os portugueses colonizado culturalmente os povos nativos e
outros trazidos para o trabalho escravo basta olhar para nossas ruas para notar a
presenta destas duas formas de conhecimento em nosso mundo. As ruas serpenteiam
pela paisagem, traindo sinuosamente a retidão dos quarteirões cartesianamente
planejados. As casas, quando mais antigas, mais assimetrias apresentam, sinalizando
que, apesar de todos os esforços, o conhecimento popular de antes da ciência ainda é
bastante presente na organização do nosso mundo.
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Filosofia E Educação
sujeito aprendiz com seu objeto de aprendizado em cada uma das formas de
conhecimento que estudamos acima.
O SENSO
A RELIGIÃO A
A CIÊNCIA COMUM
(o mito) FILOSOFIA
(popular)
Critérios de A cultura ética e
A experimentação A Fé A razão
verdade moral
As crenças
A experiência A dialética (O
Metodologia A observação silenciosas
pessoal discurso)
(Ideologias)
Relação
Relação suprapessoal, na qual Relação
Relação
interpessoal, na a Revelação do transpessoal na
“impessoal”, A
qual a ideologia Sagrado se manifesta qual a palavra
isenção do cientista
Relação é estabelecida (revela) diz as coisas.
diante de sua
sujeito-objeto pelas idéias sobrenaturalmente ao O mundo se
pesquisa: O mito da
dominantes e profano através do manifesta
neutralidade
pelos poderes rito (Dramatização pelos
científica.
estabelecidos. do mito, ou seja, da fenômenos.
liturgia religiosa).
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CONHECIMENTO RELIGIOSO
CONHECIMENTO FILOSÓFICO
(TEOLÓGICO):
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DEFINIÇÕES DE CIÊNCIA
DEFINIÇÕES DE CIÊNCIA
OBJETIVOS
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“De acordo com esse ponto de vista, se alguma coisa não pode ser observada então de nada
adianta tentar explicar fenômenos naturais ou de qualquer outro tipo” (JOHNSON, 1997, p.83).
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Filosofia E Educação
e dos experimentos, mas elas não se colocam na obrigação de confirmar conceitos, mas
sim na função de produzi-los (CHAUÍ apud AUED, 2006). Assim, “tudo o que se pode
fazer é compreender empaticamente uma seqüência de acontecimentos”
(WALLERSTEIN, 1999, p. 454). Se retornássemos Platão, poderíamos acusar uma
divergência entre o empirismo e o pensamento do filósofo grego, posto que ele
criticasse a sensibilidade como instrumento do saber para depositar todas as fichas na
racionalidade. Porém, a sensibilidade, no empirismo, fica a serviço do método, e não do
senso comum, o que recoloca essa corrente na chave científica.
Em contraste, a concepção do RACIONALISMO, cujo modelo de objetividade
se origina da Matemática, entende que a ciência é conhecimento dedutivo e
demonstrativo (portanto, é conhecimento capaz de provar a verdade necessária e
universal de seus enunciados e resultados). Em outras palavras, o racionalismo é a
unidade sistemática de axiomas, postulados, definições (que determinam a natureza e as
propriedades de seu objeto) e demonstrações que provam as relações de causalidade que
regem o objeto investigado. Aqui, objeto científico é a representação intelectual
universal, necessária e verdadeira das coisas representadas, correspondendo à própria
realidade (que é racionalmente e inteligível). Assim, as experiências científicas são
realizadas para verificar e confirmar demonstrações teóricas, e não para produzir o
conhecimento do objeto uma vez que esse só pode ser conhecido exclusivamente pelo
pensamento (CHAUÍ apud AUED, 2006). Para as ciências exatas e para a filosofia, a
concepção racionalista serve feito uma luva. No campo das ciências sociais, porém,
outras abordagens ganham espaço e questionam a lisura abstrata dos enunciados
puramente racionais. Por isto, dentro das ciências sociais, o racionalismo tem nomes
específicos, como o método nomotético, que preconiza a existência de regularidades no
mundo social (WALLERSTEIN, 1999) ao focalizar enunciados gerais que expliquem
padrões sociais mais amplos (JOHNSON, 1997).
A concepção de ciência CONSTRUTIVISTA, iniciada no XXI, se diferencia das
concepções empirista e racionalista porque entende que a ciência é uma construção de
modelos explicativos da realidade, e não uma representação da própria realidade. Nas
duas definições anteriores, essa idéia já estava expressa, porém não era assumida. Nesse
sentido, o trabalho científico exige que o método permita construir axiomas, postulados,
definições e deduções sobre objeto (coerência entre os princípios) e, ao mesmo tempo,
que a experimentação empírica guie e modifique axiomas, definições e demonstrações
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Filosofia E Educação
(os modelos dos objetos ou estruturas dos fenômenos são construídos com base na
observação e na experimentação empírica). Em síntese, a concepção construtivista não
espera que o trabalho cientifico apresente a realidade em si, mas que ofereça estruturas e
modelos do funcionamento da realidade (CHAUÍ apud AUED, 2006). Essa concepção
demonstra a evolução da compreensão do papel do conhecimento científico no mundo
contemporâneo. A partir do século XX, passa-se a entender que o discurso científico,
por seus rigores, configura antes um campo fechado de interpretação da realidade do
que um discurso acerca da realidade propriamente dita. O advento do construtivismo
relativiza a ambição grega de dizer “a verdade” sobre mundo e recoloca a ciência ombro
a ombro com as outras formas de conhecimento que foram desprestigiadas por ela ao
longo história, e que serviram de apoio para que o saber científico pudesse construir a
autoridade de que goza nos dias de hoje.
Vejamos abaixo um quadro comparativo das três concepções de ciência que
vamos discutindo.
Combinação do empirismo e
Se todas as premissas são
Se todas as premissas são racionalismo com acréscimo:
verdadeiras a conclusão é
verdadeiras a conclusão deve conhecimento aproximável e
provavelmente verdadeira,
ser verdadeira. corrigível.
mas não necessariamente.
Toda conclusão, ou conteúdo Definições, axiomas, etc. podem
A conclusão tem informação
factual, já estava implícita nas ser modificados pela
que não estava implícita nas
premissas. experimentação.
premissas.
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Neste capítulo, vamos buscar entender melhor como cada um de nós, estudantes,
se inscreve no universo do conhecimento científico. Até aqui, passamos por grandes
nomes, conceitos e concepções de ciência. Tanta autoridade muitas vezes provoca
desconforto e medo, o que é equivocado: ciência se faz com o trabalho cotidiano de
cada agente envolvido com o universo dos estudos e da pesquisa. Através da leitura e da
escrita, problemas de pesquisa com diferentes níveis de complexidade são investigados
por alunos, professores e pesquisadores, entretecendo de modo solidário e crítico a
infindável teia do saber.
Mas, porém, é importante ter em mente que os problemas científicos não surgem
da leitura que “apreende” conteúdos nem são resolvidos pela escrita que narra o já
sabido. Em ciências, lê-se até saber aquilo que o texto já não revela e escreve-se para
além do sabido, explorando os limites da compreensão daquilo que foi entendido.
O modelo de alfabetização a que somos submetidos, seja no ensino público ou
particular, nos prepara para ler as informações da imprensa, onde tudo é positividade.
Isto se deve, também, ao fato de que as teorias da leitura disseminadas na pedagogia e
nos cursos de comunicação tornaram-se ultrapassadas. Os modelos que entendem o
texto como um reservatório de conteúdos a serem decifrados e apreendidos vigoraram
no mundo do conhecimento desde o pensamento da Grécia Antiga até os idos dos anos
sessenta do século passado (Séc. XX).
Foi quando sugiram as Teorias da Recepção e do Efeito Estético, que
revolucionaram a compreensão do processo da leitura. Criadas na Alemanha, elas ainda
não foram muito difundidas por aqui. Mas já possuímos um grande representante
brasileiro nesta área do saber: Luiz Costa Lima – renomado professor de literatura
carioca e colunista eventual da Folha de São Paulo.
Entretanto, aqui não estudaremos as teorias da leitura propriamente. Teremos
notícias das novidades que ela traz por meio da compreensão do texto professada no
texto que segue, sobre leitura, escrita e problema de pesquisa.
Vamos lá?
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Filosofia E Educação
2
Por Renato de Brito
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Filosofia E Educação
Como se vê, ciência é produzida por gente como eu e você. E se não parece, é por
conta de certas tradições acadêmicas que, na tentativa de reduzir a subjetividade do
processo da ciência em busca da objetividade absoluta, acabam contribuindo para a
formação de um imaginário desumanizado do fazer científico.
Uma das práticas que contribuem para isto mais explicitamente é aquela que
ordena a retirada das marcas de identificação do sujeito do discurso científico. Para
conquistar o lugar de respeito que ocupa na sociedade contemporânea, ao longo da
história da ciência essa prática simplória ganhou importância e legou conseqüências
vastas, especialmente para os iniciantes na prática acadêmica. Vejamos um exemplo.
“A ciência é todo um conjunto de atitudes e atividades racionais, dirigidas ao
sistemático conhecimento com objeto limitado, capaz de ser submetido à verificação”.
Na frase acima, o sujeito enunciador está oculto, não é possível identificá-lo na
sentença, o que faz parecer que a ciência é uma instituição capaz de afirmar-se por si no
mundo, como se ela não fosse um conceito completamente abstrato, questionável pela
própria natureza e, nos termos acima apresentados, fruto da ação de um sujeito
enunciador. O que há por trás dessa frase é a voz de um pesquisador que, embasado na
sua experiência e formação, define ciência nos dizeres apresentados. Em discursos
assim, o que fica excluído é somente a marca textual da pessoa, mas é sempre um
sujeito de carne e osso aquele que escreve como, você e eu.
Um cientista é um sujeito que iniciou a vida acadêmica cursando a educação
superior, como estamos fazendo aqui, e que extrai sua autoridade muito mais dos anos
de prática e dedicação ao trabalho científico do que de uma superioridade intelectual
qualquer. Ciência é um fazer cotidiano, um trabalho como outro qualquer.
As pessoas que se dedicam a fazer ciência, dentre as quais agora nos incluímos,
orbitam em sua prática em torno de três grandes pontos articuladores: a leitura, a escrita
e o problema de pesquisa. Ainda que o pesquisador tenha por objeto aquilo a que nos
acostumamos chamar de “realidade”, em sua abordagem ele procederá com uma leitura.
De outra parte, independentemente da área do conhecimento a que ele pertence, seu
trabalho deverá ser registrado por escrito. E o que mobilizará ambos os gestos do
pesquisador será a discussão de um problema de pesquisa.
Primeiramente, convém saber que um “problema de pesquisa” não se assemelha a
um problema da vida cotidiana. Parece mesmo que “problema” não seja o termo mais
adequado para este conceito acadêmico. “Limite” talvez fosse mais adequado, uma vez
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que a invenção do “problema de pesquisa” está situada na junção entre aquilo que a
ciência já produziu e a necessidade obstinada de levar esse corpo de conhecimento a
novos horizontes.
Assim, para entender como se inventa um “problema de pesquisa” é preciso
lembrar que cada pesquisador fala em nome de certa ciência. Seu trabalho é o de
expandir o corpo de conhecimentos da área do saber em nome da qual ele fala, de
expandi-lo em direção à diferenciação. Duas responsabilidades, portanto, estão em
questão no jogo da invenção do problema de pesquisa: repetir e diferenciar. Para fazer
ciência é preciso repetir e repetir até ficar diferente. Só repetir não é o suficiente. Não
repetir não é admissível. Pensamento científico é sistematicidade e diferença.
Resumindo em uma frase: fazer ciência é ler o que já foi escrito a respeito do que foi
pensado e encontrar nesse texto uma dobra, um ponto cego, uma zona de não dito que
sirva de problema para o pesquisador.
O “problema de pesquisa”, portanto, não pode ser encontrado no mundo apenas,
deve nascer sempre do diálogo com os textos acadêmicos. E a parte encontrada no
mundo, quando houver, deverá ser transgredida a discurso (interpretada) para que possa
ser criticada. Portanto, para enlear a ciência o pesquisador deve fazer seu trabalho
pendular com entrega entre a curiosidade e a confissão, isto é, entre a leitura e a escrita,
sempre. Trata-se de, primeiramente, evocar o já feito, ou um pouco do que já foi feito,
para, em segundo lugar, desdobrá-lo em comentários acerca daquilo que ficou por dizer.
São essas as bases movediças do saber acadêmico, um incessante movimento de
impressão e expressão, de desconstrução e construção, de repetição e diferença. E aqui,
ainda nos primeiros parágrafos de nossa travessia, assistimos a morte de um mito: o
fazer científico não exige a competência de um talentoso, mas a dedicação de um
humilde. Explico-me.
Ocorre que não se exige que o estudioso acumule vasta erudição para que seu
trabalho seja considerado pertinente. A pesquisa acadêmica dispõe de uma gama de
registros diferentes, tais como, teses, dissertações, monografias, artigos, resenhas,
resumos, ensaios. Cada tipo de documento exige determinado esforço de pesquisa e tem
objetivos distintos. Alguns demandam grande labor, como a tese, em que se exige que o
pesquisador discuta um problema inédito para a área do saber evocada. Para um
trabalho assim, naturalmente, é preciso ter certa erudição do corpo científico. Por isto,
as teses, no Brasil, são trabalhos acadêmicos cobrados apenas de quem aspira ao título
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Filosofia E Educação
Todo texto é uma estrutura de apelo produzida precisamente para contar algo ao
leitor, é uma matéria generosa da qual, inicialmente, não é preciso desconfiar. Essa
regra é válida para todo e qualquer texto, seja ele literário, jornalístico, fotográfico ou
cinematográfico. Com relação ao texto acadêmico, outros aspectos são interessantes.
Um texto acadêmico, pensado abstratamente, apresenta a seguinte estrutura básica: uma
introdução que narra resumidamente tudo aquilo de que o trabalho trata, um resumo,
que narra introdutoriamente aquilo que se discute, uma descrição minuciosa do
“problema” e, por fim, a conclusão tirada da celeuma. Por conta deste arranjo, é comum
que os leitores de textos acadêmicos iniciantes desistam da leitura no meio da
empreitada, o que quase sempre acontece durante a fase de “problematização” do
trabalho, antes que o autor tivesse a oportunidade de narrar o desenredo do “problema”
e a conclusão a respeito do assunto. Independentemente de ser acadêmico ou não, um
texto é uma unidade que só entrega seu sentido aos que têm a paz de fazer a travessia
(leitura) completa. Por vezes a travessia é longa, centenas de páginas. Porém,
convenhamos, ela não cobra do leitor mais que a atenção devota (ouvir com os olhos)
àquilo que a escritura confessa. Na economia dos textos acadêmicos, a fase da
compreensão de texto serve ainda para cumprir outra tarefa: a construção dos
referenciais teóricos, ou seja, a parte evocativa do trabalho de pesquisa, na qual o
pesquisador presta seus respeitos à ciência em nome da qual ele fala. Atropelar a fase de
compreensão da leitura ou confundi-la com a interpretação na hora da escrita resulta em
que o pesquisador se sinta sem palavras para estender sua discussão por várias páginas.
Oxalá teremos paz-ciência para não cometer esse reducionismo em nossos trabalhos.
Paz-cientemente trabalhada a compreensão, podemos então passar à nossa
segunda fase inventada: a da interpretação do texto. Em nossa economia narrativa de
brincadeira, equivale ao momento de confessar as impressões pessoais acerca dos
argumentos ouvidos (com os olhos) durante a compreensão. A interpretação volta-se
reflexivamente para a compreensão, e conta a ela as perguntas constrangedoras que toda
leitura bem feita faz surgir. Tarefa igualmente diáfana, puro trabalho de invenção, a
interpretação costuma colocar alguma dificuldade para os acadêmicos, sobretudo os
demasiado ambiciosos. A impossibilidade de retomar as idéias do autor diante da
emergência de criticá-las solicita do estudioso antes um novo gesto de humildade que de
sagacidade. Uma compreensão do texto bem feita faz com que o leitor chegue ao final
da travessia naturalmente com algumas perguntas em mente. E não é preciso
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Filosofia E Educação
empreender esforço racional para que as perguntas surjam. Sempre que escrevemos, nos
vemos diante da obrigação de fazer passar um pensamento denso pelo espaço estreito de
uma palavra. Neste espaço estreito de linhas que formam parágrafos e que compõem
textos completos, a seleção do que é dito sempre deixa em sombras toda uma zona de
não dito.
Para dar um exemplo prático de interpretação, retomemos o trocadilho que nos
socorreu ao começar esse texto: “Pensamento Científico é o cão, e o cachorro é o
melhor amigo do homem.”
A interpretação do trocadilho seria satisfatória se referisse ao fato de que os
termos “cão” e “cachorro”, utilizados na composição, são sinônimos e ao mesmo tempo
operam uma inversão de sentido: na primeira parte da expressão, ele serve para
caracterizar depreciativamente o Pensamento Científico, e que no segundo momento,
serve para revalorizá-lo. Nesta interpretação, percebe-se que o texto gerou perguntas
sobre a função dos termos sinônimos na economia narrativa do período, e que não
houve paráfrase do período analisado, isto é, o trabalho de compreensão não foi
realizado. Para fazer a compreensão desse mesmo trecho, poderíamos dizer que o autor
afirma, através de expressões populares, que a metodologia científica é desagradável,
mas que ao mesmo tempo é de grande ajuda.
E Se desejássemos dar mais dignidade científica para nossa análise, seria preciso
buscar na literatura dos gêneros textuais a caracterização do conceito de “trocadilho”,
ou pelo menos confessar que, se classificamos a frase como um “trocadilho”, é tão
somente por apreço à palavra “trocadilho”, sem o menor compromisso coma acepção
acadêmica ou mais recorrente do termo.
Como podemos perceber, sempre que narramos, seja lendo o texto ou o mundo,
abrimos naturalmente espaço para o comentário crítico: tal fenômeno é da natureza da
comunicação verbal (á qual estamos submetidos desde que aprendemos a falar), daí
podermos dizer que para compreender e interpretar não é preciso pensar: basta se deixar
levar pelas sugestões. O texto escrito é como o peso das asas necessário ao vôo. As
letras impressas são como que as asas, o feno fino da compreensão. O sentido
interpretado, este é o “voar para fora da asa” de que o poeta Manuel de Barros (2007)
fala.
Feito este percurso inicial, esperamos ter desenhado um lugar mais confortável
para o estudo e a pesquisa. A disciplina Introdução ao Pensamento Científico tem como
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Filosofia E Educação
http://caderno.josesaramago.org/2009/03/11/sentido-comum
Compreensão:
Interpretação:
RESPOSTA COMENTADA
Compreensão: O texto de José Saramago apresenta uma discussão que envolve três
elementos principais. A política, o conhecimento científico e o conhecimento religioso.
Ao anunciar que a o presidente americano Barack Obama decretou o fim de barreiras
ideológicas para pesquisas da área de saúde, o autor destaca que isto equivaleu à
devolução das decisões científicas a este ramo do saber, o que contraria as diretrizes do
conhecimento religioso, como fica evidente a leitura que o periódico do vaticano fez do
caso. O autor mostra-se favorável à decisão do presidente americano, o que fica
explícito no último parágrafo da crônica.
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Filosofia E Educação
Interpretação: Esta crônica de Saramago nos deixa ver o intrincado jogo de poder
disputado entre três grandes instituições humanas Estado, Igreja e Ciência. O tom
amplamente favorável à ciência tem uma justificativa biográfica: Saramago sempre foi
declaradamente ateu. Porém, não é neste dado que ele embasa sua argumentação. É em
defesa dos enfermos que o autor defende a decisão do presidente americano,
mencionando que, com ela, as decisões e responsabilidades da ciência voltam ao
âmbito desta instituição social, onde a Igreja costuma tentar interferir com freqüência,
na tentativa defender seus dogmas. Remontando à história, encontramos que, durante a
Idade Média, Igreja e Estado trabalhavam juntos a organização da sociedade, donde
vem a forte presença do ponto de vista religioso no mundo científico. Foi a evolução
das ciências que engendrou novas formas de organização dos Estados, como a
democrática, por exemplo, o que teve o efeito de retirar a instituição religiosa da
organização legal das sociedades, configurando-se assim uma nova dupla dominante:
Estado e Ciência. Olhando assim, retrospectivamente, entendemos com maior riqueza a
peleja que a crônica de Saramago encena.
4.2 RESUMO
Neste capítulo conhecemos um pouco da história das ciências, alguns conceitos
de ciência e entendemos que ela se diferencia das outras formas de conhecimento
(religioso, filosófico e popular) pelos seus métodos. Conhecemos, também as
concepções empiricista (experimental), racionalista (abstrata) e construtivista (
interpretativa) do saber científico. Por fim, compreendemos como, em nossa rotina
acadêmica, entramos em contato com o universo dos rigores científicos através dos
gestos da leitura, da escrita e da elaboração de problemas de pesquisa.
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. 13. ed. São Paulo: Ática, 2003.
ECO, Umberto. Como se Faz uma Tese em Ciências Humanas. Trad. Ana Falcão
Bastos e Luís Leitão, prefácio de Hamilton Costa. Lisboa: Editorial Presença, 1977
GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1999.
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SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 12. ed. São Paulo:
Autores Associados, 1985.
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