Você está na página 1de 157
C mcd no Brsl depois da publiengior de Laronja mevdnie. ny Bags revela una ane inglesa, Primmeien lara adredivel carrera com A i Aidatea do Autor tambo profesor de erature aa lange dhe Beas ce emvare oor com wn Fngugern deer tela ¢ vt, capa de lice» swear sfc de itulos curtos. divididos eon items que cca inti etras do Reina Unie sed «p em fre rain, en prio, © 12. Minel, camo everitor de lkento, Burgess eonsefue lager m8 sério e eoneiso dor prineipais autores ¢ movin ingen eon ator colouile a infrmalidade de urna cathe nmin Area deinteresse do volume © Literatura ® 2s-ns-osaue-s tn A Literatura | Anthorty Burgess “AE A Literatura Inglesa © Anthooy Burgess 1958, Esa ead de Engl Stotere — A trey fetes, 2, fi pabicala 2 aordo com Longman Grou Limited, Lacon ‘de Andrade: Preparacio de texto Cldudin Carvalho Neves Revisiio écnica ‘Joba Milton Revisao tim de Carvalho M. de Souza fas Zilli Rosemary Cataldi Machado Filigfo de arte (miolo) Diving Rocha Corte Capa Beco Bottini 2 (SBN 85 08 05884 5 1996, “Tados os diteicor reservados Edieora Avia S.A, Ru Batio de Iguape, 110 — CEP 01507.900 Tel: PABX (O11) 278-9322 — Caina Postal 8656 End. Telegeifico “Bo fax (O11) 277-4146 ‘Sto Paulo (SP) TALVEZ YM 305 MATORES TRUNFos DESTE LivRo SETA 0 Fate DE ANTHONY BURGESS TER siP0 CAPAZ DE PRDUZIR UM ESTYDO Hista’R:0g sem LANGAR Miko Dos NABITUAIS RECURSOS ACADEM 005 NUMA LING VAGEM FLY ENTE OBJETIVA E SEMPRE AGRADAVEL ELE OFERECE UMA INTRODU CHO A LITERATUR A INGLESA com a in FORMALIDADE DE QUEM MANTE'M UMA GonVERSA ENTRE AM/GoS. ESSA HABILIDADE TORN A AiNDA MAIS FASC] NANTE A,NIAGEM @JE AUTOR LEIToR pee ENDEM ATRAVES Dos SECVLOS, NUM Pe Rion, Que VAT DA BRETANHA DomiNADA PELO iMPERI9 ROMAN ATE 4 DECADA DE 1950. : BURGESS , TOREM, Nao SE LiMity SAGAR UM PAN - RAMA DAS LETRAS INGLE SASAU ANG A BEA HISTORIA, PELA GEOGRAFIA TELA Mite Dey A E ATE PELO op_ RATER Do Povo PARA MoSTRAR DE QUE MANEI RA ESSES FATO RES ,REUNID5, DERAM FoRMA ’ CITE RA TURA Como EXPRESSA® ARTIST/CA, VAI ALEM : BUSCA ARGUMENTOS PARA EXPLICA-LA WA FORMACT. DA LINGUA NA FoRGA DAS CONSOANTES,MA INFLUEN. CIA Do FRANCES E De LAT/M. Dos BRETSES ‘4 CoN QUISTA NoRMANDA, DoS PRIMELROS TEXTOS LITE- |RARioS CONHECID®S, GUARDADOS EM MONA STE RIas 4s |iMoVAGSES DE JAMES YCE E Ao EXPERIMENTAL Ts mo DE HENRY GREEN, DESFILAM 05 AVTORES E ESTiLoS [QUE MAIS ConTRiBu/RAM PARA DAR LITE RATURA INGLESA A GRANDEZA QUE SEMPRE TEVE. Para Liana OUTRO MERITO DE ANTHONY BURGESS E CoNTEX. TUALIZAR ToDod ESSES TEMAS,DE Modo A ofe- RECER Ao LEITOR NAO So’ NOMES E FATOS, MAS TAMBEM AS CONDI GSES EM QUE BLES SURG|RAM. ASSIM, ANTES DE DEPARAR Com MARLOWE ov SHAKESPEARE, VAMOS ENCONTRAR UMA BREVE E PRECISA ExPLicaeho SOBRE A ORIGEM DO DRAMA ELISA BETANO, DA CATARSE ARISTOTELI cA A iNFLUENCIA DE SENECA, Sumario Prefécio 7 1 O que é literatura? 8 2 O que éa literatura inglesa? 17 4 A primeica literatura ingles 23 4 A chegada dos normandos 31 5 Chaucer e depois 39 Incerlidio— A Biblia inglesa 51 6 Os primérdios do drama 55 7 Oalvorecer do drama inglés 63 B Os primeitos dramas clisabetanos 74 9 Willian Shakespeare 89 UO Outros dramaturgos elisabecanos 100 1A Poesia e prosa no perfodo Todor 111 12, A época de Milton: fim de um periodo 122 13 A épocade Dryden 144 14 O novo drama 158 15 Poesia na fipoca da Razdo 167 16 Prosa na Fipoca da Razio 183 17 Os romanticos 196 18 A época vitoriara 213 19 Vida nova no drama 232 20 A chegada da época moderna 244 2 Acéa época atual 253 22 O romance inglés desde 1950 265 A versificagio inglesa 274 Sugestoes de leitaca 288 Quadro cronolégico 295 fndice onoméstico 309 Prefacio Ere tii agian xe em 1957, cm Kelantam, urn clos estados do nordeste da Malésia. Na época, eu trabalhava como chefe do Departamento de Inglés no Federal Training em Kora Bharu © compreendi que meus estudantes, que eram de ragas e culturas diferentes, pre- cisavam de um livro fécil que Ihes fornecesse o contexto histérico capaz de tor- ‘nar mais inteligiveis alguns dos livros de seu exame final. O resultado foi esta breve histéria da literatura inglesa que, ns treze anos ou quase desde que apa- receu pela primeira vez, tem sido amplamence usada na Europa assim como no ue costumava sero império britinico. Talvez seja descorés pata com os esta dantes europeus fazer com que esta obra ainda se apresente como uma espécie de produgio tropical, as ela foi escres em um ambience de cobras e tambores da selva, € me parece malicia inofensiva deixar que eles continuem silvando e bax tendo em algum lugar como fando de uma discusséo sobre o Parafie perdido, No entanto outtas mudangas se fizeram necessicis, particularmente a atualizagio do balanco da literatura britanica contemporines. Estou consciente da intocada ingermidade da prosa ¢ de certos julgamentos litetérios que foram proferidos, mas tudo isso s6 pode ser corrigido quendo um novo liveo viet a sr escrito, uma rarefa para a qual sinda ado estou preparado, Os fatos permanecem suficiente- mente slides, e espero que eles contiruem a alimentar, por maior que seja a fox _me por fatos que os estucantes de literatura inglesa possum, Quero me referi, E claro, aos estudantes de nivel elemertae, Se aprenderem a ficat mais famintos, espero que se dirjam & grande Hiszéra da literatura imgltca de Cambridge 0% 20 trabalho mais breve de Legouis e Cazamien. Anthony Burgess Brctiano, Ieilia Ide agosto de 1971 1 O que é literatura? Dee a aca ser grosseiramente divididos em dois grupos — as ciéncias e as artes. As cién- rei Artur continua to poderoso como 0 foi no passado — pademes ver isso nfo 36 nos filmes camo nos livtosinféntis, como também mo Curioso rumor que circulou sm Inglacerra em 1940: que Artur voleara para expulsar o esperado invasor, que ele jamais morrers. Tambémn um outro mito Ppoderoso — mas no to poderoso — iria surgi entre os ingleses —-o de Robin Hood e seus seguidotes, os fora-da-lei que nio aceitatam o dominio notmando « ue viveram, livres como as folhas verdes, na floresta (O tempo passa. Os normandos aprenderam a Ifagua dos ingleses, e alguns ingleses aprenderam a agua dos normandos. Mas o inglés, nia o francés nor, ‘mando, iria prevalecer. Vemos entdo descavolversse lentamente tum tipo de inglés que se enriquece com os empréstimos tomados ao francés normando, ve. ‘mos as palavras engatinhando nos livros, em geral introduzidas ao lado de sua tsadlucio em inglés arcaico: "Despair, that is to say, wanhope” ("Desespero, s- {0 €, wanhope"). Mas, 2s vezes, até mesmo hoje a miscura no pasece completa (Palavras como *wal io — parecem mais natucais pata os ingleses do ue palaveas como ‘promenade”.) A chegada do francés normando Inglaterra também abrin a porta para o empréstimo de palavras latinas (0 latim sendo a Uinigua matriz do frencés), de modo que o que 6 de fato, bor ingles povle soar éstranho ¢ até mesmro absusdo ao ouvido inglés. Ds. Johnson, no séeulo XVIII, comencou uma certa pega, dizendo: “Tem vicalidade insuficiente para se pre. «servar da puttefagio” (‘Te has insuficiene vitality to preserve ie from putrefac. tion”). Ble poderia ter dito, e de Fao jé 0 dissera antes: “Nao tem suficiente ex. piticuosidade para se manter doce” ("Ie has not wit enough to keep it sweet") A segunda fiase & quase puro inglés arcaico; a primeira é umn mistuta de fran. «fs latim, A. data que devemos lembrar como assinalando o comeso do inte fesse normando na lingua dos conquistados é 1204, quando a Noemania fol derrorada ea ligasio dos notmandos com 0 continente foi cortada HA muico o que dizer sobre a lieravura esctita no inglés médio —a lin. ‘gua da transiglo — mas, como nio estamos hoje em dia interessados em ler qualquer coisa escrita, digamos, entte 1200 e 1340 (0 ano do nascimento de 8 4. A catecapa Bot NORKANDOS Chaucer), ice formular sumariamente o que é peeciso saber sobre os eseti- ho para o primeiro grande poeta inglés. ores gue abrem cam ©) Inglés médio — Escritos veligiosos % — obras como 0 Ormilim, Hé um grande aimero de textos religiosos — ob uma tradugio de algans evangelhos lias na miss, feita pelo monge Orm por volta de 1200, Hé o Ansene Ricle—conselhos dados por um padre a trésse- hors elgiosas qe vite oem um content, mas em mpegs casa perto de uma igreja, Este altimo chega a ser encantador, parece que, nessa época na literatura da Inglaterra, hd ura conscincia da mulher enquanto mu- thet — acinar que deve se tate crise delcaamente, om nal. ‘guage geatil. Hé urna ligacdo aqui com a devogto 2 Viegem Maria, Mic de Cristo, um culto que os normandos teeuxeram, praticado por eles em oragbes & homenagens mesmo quando eta proibido por Roma. A cavalaria, que exigia uma dedicagfo mulher quase chegando & adoragio, € wm outro mito ds ant ‘ga Europa, liquidado Finalmente por Cervantes em sua sética Dare Quis, es- rita na época de Shakespeare. Hii um livro curioso escrito por volea de 1300 urn elugtodo fae fled na nglaera —, de Robt Mannyng, che tnado Exame do pecado, historias em versos sobte os vétis caminhos do pecado ~ sai, dvestid, asim como eicante, HO ema dom, erove velmente escrito por Richard Rolle por volta de 1340, que versa sabre as dores no infor cm dates pasos as alms danas, eorturada ele sede, a0 descobsie que o fogo nao ir sacid-hs, chupam as cabegas de cobras veneno- sas. Os dem@nies gritam, batem com mattelos em chamas, enquanto suas vsti mas derramam ligrimas de fogo, naussadas por urna imundicie indizivel e por cheieos de um horcor indescrtivel — Esoritos ndo-religiosos OD Inglés médi Entre os escritos nio-Feligiosos, pode-se assinalat, em primeiro Igat, cer- cas cancies, escritas com grande delicades e habjlidade, enas que nifo foram as- sinadas, que ainda hoje tém o poder ce nos encancar e que ainda sto cantadas Esta, por exemplo, é conhecida em toda parte, junco com sua mdsics: Somer i oem in, ude ing cvea! Grousth sed and ilewesh red, ‘Ane springch the wnde na — Sing seen! % ALUITERATURA GKESA 0 werto es chegando,/Canta aleo cucol/A semente exes sa/B agora 0 bosque floresce —/ Canta cuco!) feet ae Hi poesia amoross bela cangi 8, como a bela cangio Alison (um nome comum pata ‘moses na [dade Média), que tem 0 refi: ‘ a ‘An bendy ap ibe y-brt, {ches fro beveze iis we rent, From alle wyomen my dove fs kent Ant bybe on Akioun ‘Vamos traduzi-la assim: {or sorte eu zonsegui — sei que me foi envied ue me foi enviado pelo céu. De todas as outras mulheres eu resguardei meu amor: mas ele se acenieu com Alison} __ Hd cangdes pacridticas, cénticos para o Natal e a Péscoa, até mesmo can- Bes politica ©) 0s poemas longos do inglés médio (sperms longs so A aes rind — sia dl inl — aris dea dpa fa entre os dois a ‘para ver quem cantava melhor; Pérolt — um longo la- reneo em uns ingungem muito omen sae soe dean ee isto do céu para onde ela foi. Inclufda no mesmo manusctito de Paola e toms bem pence, ome laa meaion do stele RIV) hee akee eh i excita em dalero de Lancashitechamata St Gavsyh ta Corns Wook Ibs deriva ds mites da Tale Romie fl do core Goene se curin econo om o Caaeito Vere dotulo un vines es de, de ter sua cabega cota por Gavan, apanhaes taejlaneoce, cles eke baixo de set brago e vai embora. Mas ele jura que possado um ano ele voleatia scone Cp ed de Gam reas i Ctl. Ele rite stots, mat, quando senor to sattonerea ee ee a Graleio Ved, Gain se dea do cnt de nmuloublicede ste sae, the dra O ppc Cale Verde plens tenteren eos don fla, Six Ganainreche um golpe que ne enantio ee fe ne nen eon aise pnca eps nee um golpe faral poema estd escrito (de maneira bem adequada) em head- rave (ae i exrinn) em wn inguagem de mst oa ie rorrmas mis no entant,€ noel pls even do tone a en nt ‘mot e um grande poder de descricZo. cee 4. A cxtoaDA Dos NoRMANDOS aT Das outras obras do século XIV, 16 iremos mencionat un livre muito es~ seanho de viager escrito por um cert “Sic John Mandeville” — cojo nome & provavelmente fictici. O escrtor parece terse enamorado de seu proprio livro, pois aparentemente cleo escreveu primeiro em latim, depois ex francts e ft halmence em inglés. E um liveo incerssante sob vatios aspectos € parece cer i dlo populas, pois foi copiado wits veres (a imprensa nfo tinha sido ainda in- ventada), € bd no Museu Brivinico, atualmente, vinte ou mais cépias tnanascritas dele, Mandeville introdu um grande mimero de palavrs france- as em seu inglés — palavras que agora so moeda corrente,tais como ca1se (causa) e quantity quantidade). Como relao de viagem a0 Oriente € uma obra ridicula; hi contos fantésticos de canibais e de homens com um s6 pé — to _prande que serviam pata se proteger do sol —, homens com cabesas de eachor- fc os Monsttos mais incriveis. Apesar disso, alimentou a fome de conbeci mento de reras estrangeiras, e— ns que vivernos em um mundo onde se co- hece qualquer canto — sentimo-nos inclinados a invejar a emogio que 0 leitores de Mandeville devem ter ext-aido a0 se maravilharem com as regides cstrangeitas que s6 uns poucos podiam visita. O inglés é bastante inteligivel 5s leitores muculmancs podem se inceressar pela seguinte translieracfo do rome da profec: Macharte was lorn in Arabye, that was a pore Kase that byt camel that wenn swith marchante for marchandlse. [Machamere nasceu na Arabia, er um pobre tipo que guardava os camelos que seguiam com os negaciantes de mercadorias.) O) Pedro, 0 lavrador Por fim, devo mencionat William Langland (1332-1400), lkimo esei- torde algum mérito a usara técnica da bead-rhyme paca um poema longo. A vi- sig de Pad, o laadorstaca 08 abusos da Igeeja crit na Inglaterra, mas con- lama também as pessoas comuns — os leigos — para abandonar seu inceresse pelas coisas deste mundo e seguir @ nica cosa que valia@ pena— “a verdade Sagrada’, O lavrador que dé seu nome ao poema sc pée diante de ur “field fol of fk” (“campo cheio de gente”), que epresenta 0 mundo, Ihes mostra 0 ca- tminho para a salvacio, O poema é aegirco: isto é como no Pilgrin’'s progress, 6 progres do peregrine, de John Bunyan, encontrames figuras com nomes como Cobige, Glaconetia, Teologia, e, também como nessa outra obra, eraracse da hisedria de uma peregrinagio — a cavessia do dificil carninho pars a salva. Pedrs, 0 leerader, no entanto, desvia-se muitas vezes do caminho, x hst6ria se torna sem forms, mas o poder deamético do autor & considerével e seu verso 7 cm sea asin one vigor ae ipl pl por oe fey Char ut ane iene de ange Cs rol ro free nnd sb see ec ppusado, O fututo est nos pedrds de cimas regulaes, nas formas hes francesas, no conhecimento classic es Omens mies a oe com sta feaeby, sua falta de forma, sua preacupagio com 0 pe o cn ‘seu amor pelo sermio, possui no entante c de sok ae pee de Langland. Esta mGsica me persegue quase desde minhs inane In habite as an bermite, unbaly of were, : Wide rice er tNoveo, quale n/m vem tot, Vestide como ib x ’ mein om bar hg he ‘para ouvir macavilhas.) Devries como se eu fosse pas adei por este mundo, 5 Chaucer e depois Gosstey Chaucer vivew em uma época rica em acontecimentos. Ele nasceu, como se cré, em 1340 ou por volta disso, quando a Guerra dos Cem Anos com a Franca jé tinha comesado, Trés vezes acante sua vida, a praga conhecida cemo a Peste Negra ("Black Death”) dizi- rou o pais. Quando estava na casa dos vinee, a agua inglesa se estabelecera, pela primeira vez, como a lingua dos tribunais de justiga. Quando j& no fim da asa dos trnta, 0 jovem e infeliz Riea-do II subiu ao trono, para ser depasto e assassinado por Bolingbroke, o rebelde que se tornou Hentique IV, us aro an- tes da morte de Chaucer, Em 1831, .trompeu a Revolta dos Camponeses, ¢ com ela, o reconlrecimento de que os teaballadores € os lavradores tinham di- ‘eitos hnimanos al como a classe média ea nobreza. Chaueet morreu em 1400, cerca de quarenta anos antes de um acontecimento realmence importante em nossa hist6tia literdria — a invengio da imprensa Chaucer pertencia aquela classe em ascensio da qual, nos séeulos seguin- tes, tantos grandes escritores derivavam. Ele no era camponés, nem sacerdore, rem um atistoctata, mas filho de um homem ligade 40 comércio: seu pai era tum negociante de vishos. Mas 0 jovem Geoffrey iri aprender bastante sobre a aristocracia ao se tornar um pajem dacondessa de Ulster, Recebeu promogio € fo servie no estrangeiro como um jovem soldado (Foi feito prsioneiro na Fran- a mas foi libertado pelo priprio rei da Inglaterra) 20 se casar enttou para a fa~ imiflia de John de Gaunt e teve a oportunidade de observar as manciras polidas, estudarcléncias e eres, as literacaras da Franga eda Telia todas esas cosas ddesempenhiaram seu papel para fazer de Chaucer um das mais bem equipados poetas ingleses. Conferiram também inteligencia, um forte senso de humor, tum bom outido musical ea capacieade de contar uma histéria — como pode- ria 0 jovem poecafracassat? 0 AluTERATORA INoLESA So muitas a seazagdes de Chauces, Em primeizo luge, apesa de seu conhecimento de lings mais “poidas” do contineate, ele ge limitou patron, camence a usar 0 daleto do inglés East Midland que et falado ein Londres. O dlaleco que ele encontrou no era rico em palavza, eno poss uma liera, tra importante da qual ele pucesse aprender algo, Em um cetta sentido, ele teve de iar a lings inglesa tal como a conhcemos hoje extabeleer suse tra, digas licerdsas, Pea fzé-o, ele precsou se volta, principalmete, pars a Ii feratuca da Frangaeeazet algo de sua elegncia para o inglés do Fast Midland, teve também de esquadintat os contos e a histéits da Furopa para enconteat, ‘seu assunto, Mas, finalmente, em sua obra-prima Os coutos de ‘Canterbury, ele en- controu sew proprio tertitério e deu & literatura algo que nunca fora visto antes — 2 observagio da vide como era de fato viva, imagens de pessoas que eramn reais (nto meres abteagdes lvresces) ¢ wma visio da vc que, com #08 toletin €ia, humor, ceticismo, paixio e amor pela humanidae,s6 podemos charnar de “moderna”. Chauce:€ um poeta vivo fala para nds hoje com uma vor tio clare como a qi foi cuvia em sua pedpriaépoca. E esa qualidade viva que The com, fere grandczs OA bingua de Chaucer Chaucer € também modetno, pois « lingua que usa pode ser, pela primei- 1 ver ta historia dk literatura inglesa, reconhecida como a lingua de nossa época. Pelo menos 60 que free; escuré-la ainda 6 ouvir algo que soa como um. idioma estrangeiro. Olhd-la ¢ ouvi-la a0 mesmo tempo € talvez o dinico modo cde aprecié-ta de fate. Mas certamente o crecho a seguir pode see chamado de “inglés modetno”, Perrence ao “Conco do vendedor de indulgéncias”; 0 narra- dor da historia esté ctacando o pecaclo da glutonetia: Ada on fade, ond bis wxf av, ro Paradys to labeur and to wo Wore driven for that wy, i is mo dred, For whyl thas Adam fated, a I rede He was in Pavadys; and whan shat be Eat of the frat dsended on the tre, ‘Anon be was owcst to and pee {Adio nosso paize cambém sus mulher/Do paraiso para o trabalho e para a des- ‘seaga/Foram expulsos por causa daquele pecado, no ¢ de espattar/Pois en quanto Adio ejvava, como eu li/Ble estars no Parafso; ¢ quando ele/Comen o rato proibide daquela vore /Bntdo foi condenado a desgraca e& dor} 5. Cuauern & pnrois a ‘A modernidade do inglés de Chaucer € também atestada pelo néimero aque se cornaram parte da fala cocidiana: “Murder will, 8 cona”), “The sniler with the knife beneath his cloak (O homem sortidente com a faca sobo manta"), "Gladly would he learn and iladly teach” (“Alegremente aprenderia ¢ alegremente ensinatia”) ¢ assim por diante. ) Pronincia de Chaucer Para a leitura em vor alta de Chaucer, eu recomendaria que se sexuissem algumas egras simples de prontincia. Dé as vogais uma qualidade “continen- cal, isto 6, faga-as soar como se pertencessem 20 italiano ou a0 espanhol ou, en- {Go 20 malaio romanizado, 20 chins ox 20 urdu, E muito importante pronun- ciat 0 “eno fim de palavras como “shorte” (cucto), “erthe” (terra), "throte (earganta), “bathed” (banhedo), “croppes" (colheitas), para ado perder o ritmo de Chaucer, Um “c” bem no fim de uma palavts, no etanto, nlo deve ser pro- rnunciado se for seguido de um “h” ox de outra vogal. As consoantes si0 pro- ‘nunciadas quase como no inglés atual, exceto que o “gh” em “cough” (esse), ‘ough’ (siso) e “deoghte” (carga) tem um som gututal fechado, ¢ “ng” & pro- rnunciado como se fosse soletrado “ogg”. Em outras palavras, “singer” (cancot) e “finger” (dedo) imam, Tente ler alto o trecho a seguir a abertara de Os con- 10s de Canterbury) Wha thas Aprile with bis shoures vee ‘The doghte of Manche hath pened tote rote, ‘And barbed evry eoyne in sich licoar Of whicb vert engntad iste flor; ‘Wha Zaphirns ek with bir suet bao Iupived hash in every bale and beth ‘The endre crops, and the yange sonme Hatin the Ram bis balfe cous yon, ‘And tmale fouls maker reed That slepen atthe ght swith open ye, (Si priketh hem nature in ir corage ‘Than longen folk to goon on pilgrimage: [Quando o chuveso abril corcou Fel2/A secura de marco na sai, /E banboa cada vein no licoQue tem 0 dom de produzir a ilor/Quando Zire com o alento do- ‘celPara as copas € os campos também trouxe/Tentos brotos, eo sol de pouca idscerDo curso em Aries percorteu metadey passarada fz 0 seu concerto/B. dorme @ noite inceia de olho abereo:A(Que anacureza acende 0 coregioNEntio te vai em petegrinacio!.) 2 Acavmazuma miciesa As diferengas entre o inglés de Chaucer eo inglés atual podem see vistas claramente ness trecho e itéo nos marcar como muito importantes. Pot exemn. plo, os verbos no plural tém uma terminagio en) que o inglés atual nao mais possui, Podemos ver isso em “maken” (Fazer), “slepen” (dormir), * Sin) Bn er de them (se), Chae wn <2 "ick em” (chuce-s). “Hath” (tem) e “priketh" (aguithose)conhiecemos d Sbakespeate da Biblia “Yon” com eu prefs ent bem mis oreo alemao da Alea Tdide Média ou do holandés do que do inglés atual;o alemao 4k Alea dade Média por exerplo, nos dé gemmnen gener por “rn (cor fido) ¢ “won” (vencido), quando essas palavras sio usadase lavrassio usadas como partitpios pase sedos. O “hie” de Chaucer serornou “theit” (seus, deles) Mas, quanto wo rove sua lingua € igual & nossa, usar o inglés modemo, ‘quanto a0 resto, € iss0 nos autoriza a chamé-lo o primeito poeta a ©) 0 realismo de Chancer [Em todo caso, quando estamos de fato imersos em um conto de Chaucer, seus bilantes dns descrtivs ese hamor os ennaletn er en ene cer que estamos lendo um poeta que viveu ha seiscente mi por exemple, um techo do “Conto do padee da fe fo punhado por uma tapos 5 em eae anos. Vamos examinar, © galo, Chauntecler, netalizado: tat dors arn sey aon ‘Ana sen the foward be grove goo, ‘And bar upon bt be th cb ace Andnden, “Orc! Harve! and Wea! ial Fal The fe!” and after im they ra, ‘And ek with tzxe many anotber ma Ren Call, or digge, and Talbt, end Gorland, Ard Malkin witha defn bi hen, Ram ead alana ek th ey bo, So were they fer for Barking of the dogs And honing of he mcr and women ce Thay rats, be hanger bre bee Thay ldo as ences don in ble, he aches ren men ud bam gle The gos for frelon over he rer, Ot of be Become these of bs So bidiows wash rive. {.. Jfetavam tador do Indo de orl viram a rapos ir até oarvoredo/Levando 1 galo nas suas enstasyE todos grtatem: "Fora! Socorro! Aide mimi/Ey Eita ra, 5. Cuaucen 8 oprO%S “a posal” estes dela corteram /E moitys homens codes com bascdes/Correu Cotte, nosso fo, e‘Talbor, ¢ Geeland,/E Malkin, com wa roce na mioyCorseu vac €, bezerro, ¢ até mesmo os porcos/Pois estavam assustados com 0s latidos dos esIE com as gritos dos homens e dis mulheres (Correram tanto, que pensayam que seus coragbes fosem arrchentar/Gritavam como 08 diabos If no infernayOs pator betravaim como se o§ homeas fossern macé-los(Os gansos com medo ‘yosvam em cima das Areores/Da cole saiv um enxame de abelhas;Tio cersi- vel er 0 barulho..) Ese vigor esta agilidade sio algo novo na poesia ingles ‘A obbra Or contas de Canterbury € longa, mas ainda inacabada quando da morte de Chaucer. Traa-se em parte de uma idéla nova e, em parte, de urna idéia também antiga, Colecées de contesjé cram populares bé muito tempo no continence (e tambéen no Isla, como Ar mile ama nites nos fembram). A obra prima ce Chaucee no pasta de uma colegio de hist6rias, ¢ poucas delas sto ori- sinais. Essa é uma maneiza de ver Os conas de Canterdury. Maso que nunca fora feito antes era tomar wm grupo de seres humanos — de todos os temperamen- tos e posigies sociais — e misturé-los todos, faz8-los contar hist6ras, ¢ fazer com jue esas histérias iuserassem se3 caciter, suas personalidades. A obra dé ‘Chaucee brilha com drama e vida: os eemperamentos se chocam, cada pessoa tem seu préprio modo de falar sua propria filosofia, eo eesultado no € ape- nas um quadeo da Alea [dade Média — com todo sea colorido e variedade — mas do proprio mundo. {As peregrinagées eram parte integrante da vida cristina época de Chau- ‘er tal come ainda sfo da vida dos mugulmanos e dos hindus. Quando a prima- ‘vera chegava, quando a neve, «.geada € mais tarde as enchentes desimpe 10s caminhos da Inglaterra eos tornavam mais seguros para serem percortidos, centio pessoas de todas as classes da sociedace empreendliam suas viagens para os lugares sages. Uma dessas cidadks sagradas na Inglaterra era Canterbury, conde Thomas a Becket, este “santo marti abencoadlo” assassinado durance 0 reinado de Henrique Il, estava sepultado. Para os peregeinos era conveniente andar em compaahia, pois era costume encontrarem-se em algum ponto de partida como na Tabard Inn (Estalagem ‘Tabaed) em Southwark, Londres. Por ceasido da peregrinacio imortal de Os conos de Gantorry, Hacty Bailes, 0 pro- prietério da Tabard, jé que cle préptio participava da peregeinagio, oferecea lum jantar para o peregtino que contasse a melhor hist6ria durante o Fong tra jeto até Canterbury. Nio descobrimos quem ganiou 0 prémio da proprietirio; 6 temos certoz de uma coisa — nio foi Chaucer. Ble, um peregtino cfmido, Conta uma histéria em verso tio tettivelmente mon6tona que Harry Bailey faz com que ele pate no meio dela. Entio Chaucer —o grande poeta-— conta uma histéria em praua que mal chega ser menos monétona. (Isso, eu acho, €0 pri= meiro exemplo ne literatura do peculiar humor inglés que se deleita de manei- ‘i afiada na auto-itrisio. E um tipo de humor cuja melhor expressio se encon- “4 Averenaruns moussa ‘ea no exército brisnico, com sua cangéo que diz “No podemos lua, nfo po- dlemon atta” e seu grito "Gragas a Deus, temos uma macinha”. Os ingleses de {aro nfo se levam muito a série.) Os outros contos sio deliciosos e vatindos — 2 rico humor do “Conto do Catpinteizo"e do “Conco do Moleiro", 0 conto pa téeico da “Abadesia”, o conto romantico do "Cavaleito" © todos 0s outtos. O pprélogo aos contos é uma maravilhosa galeria de reteacos das pessoas eipicas a Epoca — 0 monge corcupto, a abadessa enjoada, o jover fidalgo folgexto —, pessoas cujas profisdes em sua maioria no mais exister, pois a sociedade que 4 produaiu cambém nfo existe mais, Nio temos mais meitinhs, nem predic dloces, nem vendedores de indulgéncias hoje, embore tenhamos médica, pio cos ¢cozinheios, Mas, além dos costumes e das profissdes estranhas, 0 queen contzamos sio seres humanos atemporais. Nao ihé fantasmas em Chaucet; sua cobra palpita com singe, & tio quente como a carne com vidi. ) Troilus e Cresida — Poemas de amor A segunda grande obra de Chaucer € Troilus ¢ Cresida, uma histéria de amor recothida dos anais da Guerra de Tia, uma guetta que alimentou os es- titores enropeus com inumeréveis mitos. Shakespeare também narrow o conto amargo desses doisamantes em tempo de guerra, A versio de Chauicer, com sua moral sobre a infidelidade das mulhetes, nao s6¢ erfgica mas também cheia de bhumor, e sua psicologia é tio impressionantemente modetna que pode ser lida, sob varies aspectos, como um romance moderna. De fato, pode ser chamada de ‘ primeira peca de grande extensio da ficclo inglesa. Sobre as outtas obras lon- {gas de Chaucer, nfo direi nada, Em muieas delas, depois de um bom inicio, ele parece se entediar subicamence ¢ deixf-las inacabadas, Mas aio deveros igno- rar seus breves poemas de amor, esctitos em formes francesas,exaleando a for~ ‘mosura de alguina beldade mitica, impregnados pela convengzo do amor cor- «és que exagecava oculto as mulberes até quase&religio: Your en tue wt ss meade, Tay the Beauté bem not stn, Se woumdet hit tanghont my bere hen. {Seus dois olhes info me macar subitamente/E poderei no suportar « belesa deles/Pois abritam uma ferida agada no meu co°asi0.] ‘Mas, mesmo no muro sério do amor, o humor de Chaucee transparece: Siw Ifo love ecepd am ft, naver think olen ibis pri lene Sin Lam fiw, Lone bie wt as Be 5. Cuawems © nevo%s 4% (Desde que escapei do amor fiquei fo gorda/Nio penso mais em ficer na sua cadeia magray/Desde que estou livre, nlo 0 considero mais como um set) Chaucer abriu caminho para uma nova ere da literatura, mas levou muito ‘empo para que um poeta to grande quanto ele pudesse construir sobre as ba- ses que criara. O ano de 1400 deveriacondusir — somos levados a pensar —a tum grande século, mas nfo foi o que aconteceu. Chaucer parece estar 8 frente de sua época, jamais sendo apreciado integralmente até mesmo pelo’ homens ue se intitulavam seus discipulos. E, infelizmente pata a obra de Chaucet, ‘ocorteram grandes mudangas na prontincia inglesa, mudangas que muito rapi-

Você também pode gostar